Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 176/2023-T
Data da decisão: 2023-11-20  IMT  
Valor do pedido: € 1.934.070,56
Tema: IMT- Arts. 8º e 11º, nº 6 do CIMT – Isenção aplicável às aquisições de imóveis por instituições de crédito.
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SUMÁRIO:

1.A isenção de IMT prevista no art. 8º do CIMT está condicionada às duas condições estatuídas no art. 11º, nº 6 do CIMT – uma de carácter temporal (a alienação ocorrer no prazo de 5 anos a contar da data da aquisição) e, outra de carácter negativo (desde que não se verifiquem “relações especiais” entre alienante e adquirente), nos termos do art. 63º, nº 4 do CIRC.

2. Esta isenção caduca por o adquirente ser uma entidade com “relações especiais” com o alienante, no caso de haver uma participação deste alienante naquele adquirente, que permita, ainda que indirectamente, exercer uma influência significativa nas decisões de gestão do adquirente, nos termos do art. 63º, nº 4 do CIRC

 

DECISÃO ARBITRAL

 

REQUERENTE: A..., S.A.

 

REQUERIDA: AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA

 

I - RELATÓRIO

 

A. AS PARTES. CONSTITUIÇÂO DO TRIBUNAL. TRAMITAÇÃO DO PROCESSO.

 

  1. No dia 17 de Março de 2023, A..., S.A., contribuinte fiscal nº ..., com sede na ..., nº ..., ...-... Lisboa (doravante, abreviadamente, designada por Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2º e 10º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente, designado RJAT), imediatamente, contra o acto de indeferimento expresso da reclamação graciosa, proferido no processo nº ...2022..., datado de 12/12/2022, e, mediatamente, contra os actos de liquidação de IMT, no montante total de 1.934.070,56 euros, com referência aos DUCs nº..., ... e ..., que estão na origem da reclamação, efectuados pela Autoridade Tributária (doravante, designada, abreviadamente, por Requerida), visando a anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada e a anulação das liquidações de IMT subjacentes, com as consequências legais, nomeadamente com a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios contados desde o indeferimento da reclamação graciosa.
  2. No dia 20/03/2023, o pedido de constituição do tribunal arbitral, apresentado em 17/03/2023, foi aceite e automaticamente comunicado à AT.
  1. A Requerente apresentou a petição inicial assinada e com a indicação do valor da utilidade económica do processo, juntando procuração, comprovativo do pagamento da taxa de arbitragem, quinze documentos em anexo e rol com duas testemunhas.
  2. Em 21/04/2023, a Requerida comunicou a designação de juristas para a representar.
  3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º e da alínea a) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os árbitros membros do tribunal colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
  4. Em 12/05/2023, as Partes foram notificadas destas designações não tendo manifestado vontade de recusar.
  5. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 30/05/2023.
  6. Em 30/05/2023, o Tribunal Arbitral proferiu o despacho a que se refere o art. 17º do RJAT, o qual foi notificado às Partes nessa data.
  7. No dia 03/07/2023, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação, tendo procedido à junção do processo administrativo (PA).
  8. Em 07/07/2023, o Tribunal Arbitral proferiu um despacho determinando a notificação da Requerente para informar se mantinha interesse na produção de prova testemunhal, e, em caso afirmativo, indicar os pontos da matéria de facto sobre os quais essa prova deve incidir.
  9. Em 11/07/2023, a Requerente informou o Tribunal ter interesse na produção de prova testemunhal e indicou os números dos artigos do PPA sobre os quais as testemunhas deveriam ser ouvidas.
  10. Em 17/07/2023, o Tribunal marcou para o dia 19/10/2023, às 10 horas, a reunião a que alude o art. 18º do RJAT, para efeito da inquirição das testemunhas arroladas pela Requerente.
  11. No dia 19/10/2023, realizou-se a reunião a que alude o art. 18º do RJAT, tendo sido ouvidas as testemunhas arroladas pela Requerente: B... e C... e ordenado o prosseguimento do processo com a apresentação de alegações escritas, sucessivas, com o prazo de prazo de 10 dias, solicitado o envio das peças processuais em formato word, e fixado o dia 30/11/2023 para a prolação da decisão arbitral.
  12. Em 30 /10 /2023, a Requerente apresentou as suas alegações escritas, reiterando a sua posição.
  13. Em 14 /11/2023, a Requerida apresentou as suas alegações escritas, reiterando a sua posição.

 

 B. PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS                                        

Para fundamentar a sua pretensão, alega a Requerente, em síntese, o seguinte:

- Em 4 de outubro de 2016, a Requerente, na qualidade de exequente, adquiriu no âmbito do processo de execução n.º.../14...TBALM, por negociação particular, os imóveis sub judice ao executado D...– Fundo de Investimentos Imobiliário Fechado.

 - Os imóveis em questão compõem um aparthotel conhecido por “Hotel ...”, que estava arrendado a uma terceira entidade que explorava o hotel, tendo ficado arquivados no notário três documentos comprovativos de liquidações de IMT, dos quais não resultou imposto a pagar por aplicação do artigo 8.º, n.º 1, do CIMT

 - Em 1 de outubro de 2021 a Requerente revendeu os imóveis em questão

 - Como é prática comum no setor, o valor de referência deste tipo de ativos – i.e. activos hoteleiros – é calculado tendo por referência a aplicação de um múltiplo de 10 ao respetivo EBITDA.

 - Ora, sendo o resultado operacional (i.e. o gross operating profit ou GOP, que é equivalente ao EBITDA) do hotel em 2019 de 1,78 milhões euros (já que o EBITDA de 2021 em razão da pandemia não era relevante) a Requerente chegou ao valor arredondado de 18 milhões euros.

 - Valor este ligeiramente acima do valor a que chegou um terceiro independente a quem foi pedida uma avaliação e que chegou a um valor entre os quinze e os dezassete milhões de euros, mas que tinha em linha de conta que o ativo necessitava de algum investimento para se reposicionar no segmento desejado.

 - Depois a Requerente lançou um processo competitivo de venda seguindo as melhores práticas internacionais, tendo sido enviada informação sobre o ativo a 180 potenciais interessados.

 - Desses 180 potenciais interessados, 24 mostraram interesse e passaram para a fase seguinte do processo, tendo assinado um non disclosure agreement (NDA).

 - Dos 24 investidores que mostraram interesse, apenas 5 apresentaram non binding offers (NBO), a saber: a E..., a F..., a G..., S.A., a H... Limitada e a I... .

 - Dos cinco interessados que apresentaram ofertas não vinculativas, a Requerente selecionou três — os três que apresentaram as propostas mais altas (i.e. a E..., a H... Limitada e a G...) — para passarem à fase seguinte, i.e. a fase da auditoria (due diligence)).

 - Desses três, a E... depois de efetuada a due diligence, decidiu não avançar para uma oferta vinculativa.

 - Pelo que sobraram a H... Limitada e a G..., tendo a primeira apresentado uma oferta vinculativa de € 14.600.000, com o pagamento de € 14.000.000 diferido até abril de 2022.

 - Por sua vez, a G... apresentou uma oferta vinculativa de € 16.585.000, com o pagamento da totalidade do preço na data da escritura.

 - A Requerente limitou-se a escolher a proposta mais alta.

 - Como as ofertas vinculativas tardavam a chegar e a Requerente estimava que a negociação das cláusulas contratuais do contrato de compra e venda iria demorar mais do que o prazo que havia sido inicialmente fixado (30 de setembro de 2021), decidiu, à cautela, proceder à liquidação do IMT relativo à aquisição que havia efetuado em 2016 para a eventualidade de a isenção caducar

 - E assim, em 3 de setembro de 2021, foram emitidas as guias para o pagamento do IMT em conexão com a aquisição dos imóveis no âmbito do processo de execução em 2016, tendo o imposto sido pago no mesmo dia.

 - A 1 de outubro de 2021, a Requerente vendeu à sociedade U..., S.A., os imóveis que havia adquirido em 4 de outubro de 2016 não tendo a Requerente financiado a adquirente para efetuar esta aquisição.

 - A 28 de dezembro de 2021, a Requerente apresentou reclamação graciosa das liquidações de IMT aqui em causa com fundamento em ter mediado menos de cinco anos entre a compra efetuada em 2016 e a venda realizada em 2021 e, por isso, a aquisição dos imóveis em 2016 estar isenta de IMT ao abrigo do artigo 8.º do CIMT com a consequência de o IMT, pago à cautela, não ser devido.

 - A 12 de dezembro de 2022 a AT indeferiu a reclamação graciosa apresentada com fundamento no artigo 11.º, n.º 6, do CIMT que dispõe que «deixam de beneficiar de isenção as aquisições a que se refere o artigo 8.º, se os prédios não forem alienados no prazo de cinco anos a contar da data da aquisição ou o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do nº 4 do artigo 63.º do Código do IRC».

 - Ora, a estrutura de controle da Requerente é a seguinte: o capital social da Requerente em 2021 era detido por dois acionistas: o Fundo de J... com 25% e a K... Holdings, SGPS, S.A. com os remanescentes 75% do capital social.

 - Por sua vez, o capital social da acionista K... Holdings, SGPS, S.A. é detido, na íntegra, pela sociedade L... S.à.r.l., cujo capital social é detido, também integralmente, pela M..., L.P., sedeada no Canadá que, por sua vez, é controlada pela Lone Star, uma firma de private equity estadunidense (https://... funds.com), com múltiplos investidores pelo mundo e cujo beneficiário efectivo é o Sr. N... .

 - Em 2021 o Conselho de Administração da Requerente era composto por O..., P..., Q..., R..., S... e T... .

 - A adquirente dos imóveis - sociedade U..., S.A., tinha a estruturade seguinte:

 Foi constituída em 13 de setembro de 2021, tendo como sócio único a sociedade G..., S.A.

 Esta última, por sua vez, é integralmente detida pela V..., S.A., uma entidade cujo capital é integralmente detido pela W... Fund, (abreviadamente, de ora em diante, “Fundo”) um fundo de investimento de capital variável (société d’investissement à capital variable – fonds d’investissement spécialisé), constituído de acordo com a lei luxemburguesa, sob a forma de sociedade em comandita por ações (société en comandite par actions).

 - De acordo com a informação extraída do Registre de Commerce et des Sociétés, o Fundo é gerido pelo acionista comanditado (o General Partner e, abreviadamente, de ora em diante “GP”), que, no caso concreto, é a Y..., uma sociedade anónima com sede no Luxemburgo.

 - De acordo com a informação disponibilizada à Requerente pelo GP, os participantes do fundo são (e eram à data): A Z... CRL, com 1%;

  1. O AA..., S.A., com 2%;
  2. O BB... Bank, S.A., com 2%;
  3. A CC... S.A. com 15%;
  4. A DD..., S.A., com 21%
  5. O EE..., S.A., com 22%
  6.  A Requerente, com 37%.

 - Como consta do Placement Memorandum do Fundo os administradores do GP eram: FF..., GG..., HH…, II… e JJ... .

 - Finalmente, o Investment Advisor do Fundo era a KK..., S.C.R., S.A., com sede na Av. ... ..., em Lisboa.

 - A KK..., S.C.R., S.A. é uma conhecida firma de private equity que tem como sócios fundadores FF... e MM... (https://www...com/pt/equipa/) e cujo conselho de administração em 2021 era composto por FF..., MM..., NN..., LL... e OO... .

 - Como resulta da cláusula 1.1. do Placement Memorandum do Fundo

«As a Luxembourg corporate partnership limited by shares (société en commandite par actions), the Fund has two categories of Shareholders:

(i) the Unlimited Shareholder or General Partner (associé gérant commandité) holding one Management Share (action d'associé gérant commandité), which is liable without any limits for any obligations that cannot be met out of the assets of the Fund; and

(ii) the Limited Shareholders (actionnaires commanditaires) holding the Ordinary Shares (actions ordinaires de commanditaires), the liability of which is limited to the amount of their investments in the Fund.

According to the Law of 10 August 1915, the Fund shall be managed by the General Partner in its capacity as General Partner of the Fund.»

 - Ou seja, a forma jurídica deste Fundo de direito luxemburguês é semelhante às sociedades em comandita por ações portuguesas, com sócios comanditários com responsabilidade limitada e um sócio comanditado de responsabilidade ilimitada e que, no caso concreto, é quem gere o fundo, como é normal neste tipo de estrutura e como resulta da cláusula acima citada e, mais desenvolvidamente, da cláusula citada no artigo seguinte.

 - Com efeito, como se extrai da cláusula 1.5.1. do Placement Memorandum do Fundo:

«The General Partner has the sole exclusive power to administer and manage the Fund and to determine the Investment Objective, Policy and Restrictions applicable to the Fund and the Sub-Funds, as well as the course of conduct of the management and business affairs of the Fund, in compliance with the Articles and the Placement Memorandum, and any applicable laws and regulations. All powers not expressly reserved by law or by the Articles to the Limited Shareholders rest with the General Partner Other than as otherwise explicitly set out herein, where the General Partner or the managers of the General Partner are referred to in the Placement Memorandum as taking any action, it shall be understood that the General Partner will be taking action in its own name and on behalf of the Fund and, as the case may be, in relation to a particular Sub-Fund.»

 - A corroborar que o domínio do Fundo pertencia ao GP, vejam-se as cláusulas 13 e 14 dos estatutos do Fundo:

«13. POWERS OF THE GENERAL PARTNER

The Company shall be managed by Y…, a Luxembourg public limited liability company (société anonyme), in its capacity as Unlimited Shareholder and General Partner (associé gérant commandité) ai the Company.

Within the limits set out in these Articles and the Placement Memorandum, the General Partner will have the broadest powers to administer and manage the Company, to act in the name of the Company in all circumstances and to carry out and approve all acts and operations consistent with the Company’s object, in particular in compliance with the investment policy, objectives and strategy and the investment restrictions as determined in these Articles and the Placement Memorandum.

All powers not expressly reserved by law or the present Articles to the general meeting of Shareholders fall within the competence of the General Partner. The Limited Shareholders shall neither participate in nor interfere with the management of the Company.

The General Partner will have the power, in particular, to decide on the investment objectives, policies and restrictions and the course of conduct of the management and business affairs of the Company and the Sub-Funds, in compliance with the Articles, the Placement Memorandum and the applicable laws and regulations. The General Partner  will have the power to enter into administration, investment and advisory agreements and any other contract and undertakings that it may deem necessary, useful or advisable for carrying out the object of the Company.

14. TERMINATION OF THE GENERAL PARTNER

The General Partner  may be removed for Cause by means of a resolution of the general meeting of Limited Shareholders adapted as follows:

(a)          the quorum shall be at least seventy-five percent (75%) of the share capital being present or represented; and

(b)          the resolution must then be passed by at least seventy-five percent (75%) of the votes. For the avoidance of doubt, the approval of the General Partner is not required to validly decide on its removal.

A resolution of the general meeting of the Limited Shareholders shall not be required in case of the General Partner insolvency, administration or bankruptcy.

In the event of the removal of the General Partner, the general meeting of Shareholders will appoint a new general partner by means of a resolution adopted in the manner required to amend the Articles as described in Article 38 hereof, subject to prior the approval of the CSSF.»

 - E sobre os poderes residuais dos sócios comanditários veja-se o que estabelece a cláusula 20

«20. POWERS OF THE GENERAL MEETING OF SHAREHOLDERS

Any regularly constituted meeting of Shareholders of the Company shall represent the entire body of Shareholders of the Company. The general meeting of the Shareholders shall deliberate only on the matters which are not reserved to the General Partner by the Articles or by the law.

Such matters shall include the determination of the applicable Preferential Remuneration (as defined in the Placement Memorandum), which shall be subject to the requirements set forth in Article 34 for any amendment to the Articles. For the avoidance of doubt, where the change of the Preferential Remuneration as determined by the general meeting of Shareholders results in an increase in fees and/or expenses payable by the Company, the Shareholders that voted against the change of Preferential Remuneration shall not have the right to request the redemption of their Shares.»

 - Por sua vez, o Investment Advisor tem por funções, nomeadamente:

«(i) identifying, analysing and structuring of new Investments;

(ii) preparing and assisting in negotiating the terms and the financing of Investments;

(iii) making recommendations as to capital improvements, financing, refinancing, acquisition and disposition of Investments;

(iv) reporting on a regular basis to the AIFM and on a bi-annual basis to the Investors;»

 - Mas para além do Investment Advisor, que desempenha um importante papel de coadjuvação do GP, o Fundo em questão tem ainda um Investment Committee, com funções consultivas de “review and advise on all decisions relating to property acquisitions, disposals and any relevant asset management matters” no qual a Requerente não tem qualquer participação.

 - Finalmente, a estrutura de investimento adotada pelo Fundo consiste em:

«Investments will be made by the Fund indirectly through local or foreign intermediate vehicles, which will only be Subsidiaries including Special Purpose Vehicles. The sole purpose of the Subsidiaries shall be directly or indirectly to own investments acquired by the Subsidiary in accordance with the Investment Policy of the Fund and the relevant Sub-Fund. The Fund will assure, at any time that it can control the investments made through Subsidiaries. The securities of the Subsidiaries will be issued in registered form or in a similar form acceptable to the Luxembourg supervisory authority.

The majority of the managers of the Subsidiaries, excluding the jointly owned companies, will be appointed by the General Partner or its Affiliates. The accounts of the Subsidiaries are audited by or under the supervision of the Fund's auditor's group. For the avoidance of doubt, the Subsidiaries will respect the principles set forth in the Placement Memorandum.»

 - Em suma, a Requerente é um dos investidores do Fundo juntamente com as outras instituições de crédito suas concorrentes a operar em Portugal, Fundo este que é controlado pelo GP, que não tem qualquer relação com a Requerente.

 - Após a aquisição, a adquirente U... efetuou obras de monta e adquiriu equipamento por forma a colocar novamente o hotel em funcionamento e a gerar receitas.

 - Relativamente à decisão que impugna, a Requerente afirma que a AT indeferiu o reembolso do IMT erradamente pago por considerar existirem “relações especiais” entre a Requerente, enquanto vendedora do ativo imobiliário e a entidade compradora.

 - Sustentando, concretamente, que:

«54. Num momento em que o setor imobiliário à data se encontrava em valorização crescente, o confronto do valor da transação subjudice por um valor substancialmente inferior, em comparação com o preço que seria fixado ou acordado entre entidades independentes no seio de um mercado livre, impõe a aplicação do artº 63º nº 4 do CIRC, em referência ao normativo que versa sobre a caducidade da isenção de IMT, concretamente o artº 11º nº 6 do CIMT, devido à “(…) existência de um pressuposto objetivo – que preside à operatividade do instituto – que é constituído pela “anormalidade” do valor acordado entre empresas vinculadas que realizam uma determinada operação” (cf. Guglielmo Maisto, Il “Transfer Price” nel diritto tributario italiano e comparato, op. Cit. Pp. 85)”

55. Conforme dispõe o nº 4 ao artº 63 do CIRC, considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se encontra verificado, uma vez que a sociedade adquirente é detida em 100% por entidades em que o A... detém participações sociais relevantes.

56. Assim, por via indireta, o ora Reclamante tem o poder de influenciar as decisões de gestão da adquirente dos imóveis, a sociedade U...; S.A., NIPC ... .

57. Não nos restam dúvidas que o U... tem o poder de exercer, direta/indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da U..., S.A., NIPC ..., uma vez que detém participações sociais relevantes em entidades que controlam a sociedade adquirente.

58. Além destas evidências de relações especiais, salientamos que não foram celebradas outras aquisições de imóveis, mantendo-se a sociedade adquirente U..., S.A., NIPC ..., praticamente inativa, conforme consulta ao site da AT, para efeito da liquidação de IMI, os prédios continuam na sua esfera patrimonial.

59. E, tal como consta da escritura pública, a adquirente foi financiada pelo A..., onde se verifica existirem cláusulas pouco habituais, em termos de prazos de pagamento do valor contratado, bem como de resolução do contrato por incumprimento. Assim,

60. Concluímos, pois, que o ora Reclamante e a sociedade U..., S.A., NIPC..., se encontram em relações especiais, o que implica a caducidade da isenção de IMT, nos termos do disposto no nº 6 do artº 11º do CIMT, devido a constatarmos que foram estabelecidas condições diferentes, das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes

61. Analisados os documentos em anexo e outras diligências internas dos Serviços da UGC, somos do entendimento de estarmos perante um adquirente com relações especiais com o alienante, o que impõe a caducidade da isenção, nos termos previstos no nº 6 do artº 11º do CIMT, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A....»

- Pronunciando-se juridicamente sobre a decisão impugnada e as liquidações de IMT, entende a Requerente que as mesmas estão inquinadas do vício de violação da lei por erro nos pressupostos de facto e de direito de aplicação do art. 11º, nº 6 do CIMT, pois, em sua opinião:

 - Dispõe o número 6 do artigo 11.º do CIMT, que tem por epígrafe «Caducidade das isenções», que:

«6 - Deixam de beneficiar de isenção as aquisições a que se refere o artigo 8.º, se os prédios não forem alienados no prazo de cinco anos a contar da data da aquisição ou o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC.»

 - No caso concreto a AT considerou existirem relações especiais entre a Requerente e a adquirente do imóvel em 2021.

 - O artigo 63.º, n.º 4, do CIRC, sobre o conceito de relações especiais, dispõe:

«4 - Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:

a) Uma entidade e os titulares do respetivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20 % do capital ou dos direitos de voto;

b) Entidades em que os mesmos titulares do capital, respetivos cônjuges, ascendentes ou descendentes detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20 % do capital ou dos direitos de voto;
c) Uma entidade e os membros dos seus órgãos sociais, ou de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, e respectivos cônjuges, ascendentes e descendentes;

d) Entidades em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha recta;

e) Entidades ligadas por contrato de subordinação, de grupo paritário ou outro de efeito equivalente;

f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos termos do artigo 486.º do Código das Sociedades Comerciais;

g) Entidades cujo relacionamento jurídico possibilita, pelos seus termos e condições, que uma condicione as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheios à própria relação comercial ou profissional;
h) Uma entidade residente ou não residente com estabelecimento estável situado em território português e uma entidade sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável residente em país, território ou região constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.»

 - E que – ao contrário do que a AT invoca – não se verifica no caso concreto a situação de relações especiais, conforme a mesma vem definida no Código do IRC.

 - Com efeito, qualquer das alíneas do número 4 do artigo 63.º que alude a uma participação societária [i.e. as alíneas a), b) e f)] exige, para a constatação da existência de relações especiais, uma participação direta ou indireta de não inferior a 20% do capital ou dos direitos de voto.

 - Pelo que, importa atentar ao número 5 do artigo 63.º que estabelece que:

«Para efeitos do cálculo do nível percentual de participação indirecta no capital ou nos direitos de voto a que se refere o número anterior, nas situações em que não haja regras especiais definidas, são aplicáveis os critérios previstos no n.º 2 do artigo 483.º do Código das Sociedades Comerciais.»

 - Importa, pois, atentar no que dispõe a referida norma do Código das Sociedades Comerciais (CSC) para qual a norma acima citada do Código do IRC expressamente remete.

 - Ora, o número 2 do artigo 483.º do CSC dispõe que:

«À titularidade das quotas ou acções por uma sociedade equipara-se, para efeito do montante referido no número anterior, a titularidade de quotas ou acções por uma outra sociedade que dela seja dependente, direta ou indiretamente, ou com ela esteja em relação de grupo, e de acções de que uma pessoa seja titular por conta de qualquer dessas sociedades»

 - Esta última norma, ao aludir ao conceito de dependência, invoca (em certa medida duplicando a análise exigida pela alínea f) do número 4 do artigo 63.º) a noção de “influência dominante” prevista no número 1 do artigo 486.º do mesmo compêndio normativo, especificada pelo respetivo número 2, que estabelece que:

«Presume-se que uma sociedade é dependente de uma outra se esta, direta ou indiretamente:

a) Detém uma participação maioritária no capital;
b) Dispõe de mais de metade dos votos;
c) Tem a possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou do órgão de fiscalização.»

 - Sucede que, mesmo admitindo que o Fundo poderia ser equiparado a uma sociedade comercial (e, como veremos, não deverá ser admitido), à Requerente não só está vedado, por força dos documentos constitutivos do fundo, exercer qualquer influência (e, muito menos, influência dominante), como aquela:

  1. não detém uma participação maioritária no capital do Fundo;
  2. não dispõe mais de metade dos votos; e,
  3. não tem a possibilidade de designar mais de metade dos órgãos de administração

 - Acrescendo que, pela factualidade descrita, não consta que estejamos perante alguma das situações descritas nas alíneas c) e d) do número 4 do artigo 63.º.

 - Por outro lado, não consta que a Requerente e a Adquirente – ou qualquer outra entidade desse grupo empresarial – tenham celebrado um contrato de subordinação ou estejam ligadas por um contrato de grupo paritário, referidos na alínea e) da norma por último referida.

 - Como demonstrado acima, também não existe qualquer relação de domínio nos termos do artigo 486.º do CSC, como refere a alínea f) do número 4 do artigo 63.º do Código do IRC.

 - Finalmente, no entender da Requerente não há qualquer indício da existência de um relacionamento jurídico entre a Requerente e a Adquirente que possibilite, pelos seus termos e condições, que uma das duas entidades condicione as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheios à própria relação comercial ou profissional, como resulta da alínea g).

- Pelo contrário, os documentos constitutivos do fundo são claros não só quando reservam à sociedade gestora, e só a esta, a capacidade de gerir o Fundo, mas também quanto ao facto de aquela apenas poder ser destituída com justa causa (e, mesmo nessa circunstância, apenas se tal destituição for aprovada com, pelo menos 75% dos votos numa reunião em que o quórum constitutivo é de 75%, o que em caso algum estaria na disponibilidade da Requerente).

 - Pelo que a situação de facto não se subsume a nenhuma das alíneas do número 4 do artigo 63.º e, como tal, a decisão da reclamação ao fundamentar-se nesta norma é ilegal, devendo ser anulada, o mesmo sucedendo com as liquidações de imposto efetuadas na medida em que a aquisição pela Requerente foi isenta de IMT ao abrigo do artigo 8.º do CIMT.

 - Mas, ainda que assim não se entenda, é hoje pacífico que as diferentes alíneas do número 4 do artigo 63.º do Código do IRC consagram presunções iuris tantum.

 - Nos demais casos, a administração fiscal terá de provar e fundamentar a existência de uma influência significativa de uma entidade sobre outra suscetível de determinar uma fixação de um preço que se afasta do preço de mercado, como decorre das regras previstas no artigo 74.º e 77.º, n.º 3, al. a), da LGT.

 - In casu, não só a AT se dispensou de indicar e demonstrar a situação prevista nas diferentes alíneas em que se arrima, mas a Requerente demonstrou também cabalmente que não existem relações especiais entre si e a compradora, porquanto:.

  1. a Requerente é controlada faz tempo por um fundo de private equity americano denominado PP...;
  2. a Adquirente é controlada por uma entidade que nenhuma relação tem – por mais remota que seja – com a PP...

 

 - Acresce que o facto de a Requerente ser investidora no Fundo não permite concluir sobre a existência de uma influência significativa.

 - Com efeito, como é sabido e resulta evidenciado nos documentos do Fundo, «dada a concentração dos poderes de gestão e de representação na sociedade gestora, os participantes não podem dirigir instruções específicas quanto à gestão do fundo».

 - Depois, é por demais evidente, pois resulta das regras da experiência, que sendo os restantes participantes no fundo, instituições de crédito concorrentes da Requerente, jamais estariam dispostas a aceitar participar num organismo de investimento coletivo em que a Requerente tivesse uma influência dominante.

 - Pelo que, tendo sido demonstrada a inexistência de uma qualquer influência significativa da Requerente – ou de qualquer entidade do seu grupo – sobre a Adquirente – ou de qualquer entidade do seu grupo – fica ilidida qualquer presunção de relações especiais constante do artigo 63.º, n.º 4, do Código do IRC, devendo, consequentemente, a decisão de indeferimento da reclamação graciosa ser anulada, por violação do artigo 11.º, n.º 6, do CIMT e, do mesmo modo, anuladas as liquidações de IMT por erro efetuadas pois a aquisição efetuada pela Requerente beneficia de isenção de IMT ao abrigo do artigo 8.º do CIMT.

 - A título subsidiário, para o caso do Tribunal entender não se encontrarem verificados os vícios de violação de lei acima demonstrados, a Requerente vem ainda invocar o vício de forma da decisão aqui impugnada por falta de fundamentação, em contravenção do disposto no artigo 77.º da LGT, o que, também por esta via, deve levar à anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa.

 - Com efeito, muito embora a AT espraie a fundamentação da decisão recorrida por 44 artigos (32.º a 76.º), na verdade, até ao artigo 54.º, a AT ocupa-se de generalidades ou considerações sobre o regime de preços de transferência, ao ponto de dar a impressão de o imposto em causa na reclamação ser o IRC e não o IMT

 - Na verdade, a AT alicerça o indeferimento apenas considerando o valor da operação baixo no confronto, por um lado, com um valor pelo qual a Requerente havia adquirido anos antes e, por outro lado, tendo em mente uma ideia de valorização crescente e generalizada dos activos imobiliários.

 - A este respeito, a AT mais não diz do que generalidades, insinuações vagas que obliteram que o valor pelo qual a Requerente havia comprado anos antes corresponde ao montante que o executado tinha em dívida para com o Requerente e, por outro lado, que o imóvel em questão não se trata de um equipamento residencial, mas sim de um equipamento hoteleiro vendido numa fase em que se vivia uma pandemia que muito afetou o turismo.

 - Isto, para além do valor pelo qual o ativo foi vendido em 2021 estar em linha com a avaliação recebida de um terceiro independente.

 - Depois, no que respeita à verificação de relações especiais, a AT não indica a alínea do número 4 do artigo 63.º do Código do IRC na qual se arregimenta, limitando-se a referir que «a sociedade adquirente é detida em 100% por entidades em que o A... detém participações sociais relevantes».

 - Para além de nem sequer se indicar a norma em que se louva, a AT não descreve, minimamente, a suposta relação de controlo que permitiria à Requerente exercer uma influência significativa nas decisões de gestão da Adquirente, tudo contra o exigido pela lei e deveria estar rotinada para fazer face ao disposto no número 3 do artigo 77.º da LGT.

 - A AT não descreve nem invoca quaisquer indícios dessa relação de controlo que permitiria influenciar as decisões da adquirente.

 - Percebe-se a omissão, pois tais indícios não existem: por a Requerente não controlar ou influenciar – minimamente – a Adquirente.

 - De seguida, a AT destaca que «não foram celebradas outras aquisições de imóveis, mantendo-se a sociedade adquirente U..., S.A., NIPC..., praticamente inativa, conforme consulta ao site da AT, para efeito da liquidação de IMI, os prédios continuam na sua esfera patrimonial».

 - Após a aquisição a Adquirente contratou obras de monta para a recuperação do hotel com vista à sua subsequente exploração, pelo que não esteve praticamente inactiva.

 - Finalmente, a AT vem invocar a existência de um financiamento efetuado pela Requerente à adquirente «onde se verifica existirem cláusulas pouco habituais, em termos de prazos de pagamento do valor contratado, bem como de resolução do contrato por incumprimento».

 - É falso que a Adquirente tenha sido financiada pela Requerente para efetuar a aquisição pelo que não se percebe que cláusulas pouco habituais são essas a que a AT faz referência.

 - Como é entendimento jurisprudencial corrente, a fundamentação dos atos em matéria tributária é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, sendo que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu num certo sentido e não de forma diferente.

 - Nesta linha de orientação, um ato administrativo está suficientemente fundamentado desde que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe optar conscientemente entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação

 - No caso sub judice, a Requerente não percebe as razões que sustentam a decisão tomada, pois a AT mais não fez do que invocar generalidades e vaguidades manifestamente insuficientes para fundamentar o indeferimento aqui contestado.

 - Pelo que, caso o Tribunal entenda não estar verificado o vício de violação de lei da decisão impugnada e das liquidações de IMT por erro nos pressupostos de facto e de direito de aplicação do artigo 11.º, n.º 6, do CIMT, então, subsidiariamente, requer-se a anulação da decisão da reclamação por vício de forma por falta de fundamentação.

 - No que aos juros indemnizatórios diz respeito, se as liquidações de IMT são imputáveis à Requerente e, por isso, não se verificando, no momento em que foram efetuadas, o «erro imputável aos serviços» no qual se funda o regime dos juros indemnizatórios previsto no artigo 43.º da LGT, o mesmo não se verifica a partir da decisão de indeferimento da reclamação graciosa.

 - Com efeito, a partir da decisão de indeferimento da reclamação graciosa o erro das liquidações passou a ser imputável à AT ao ter persistido em manter essas liquidações na ordem jurídica.

 - Pelo que nos termos da lei e da jurisprudência unânime sobre este tema, são devidos juros indemnizatórios, calculados desde a data de indeferimento da reclamação graciosa até à emissão da nota de crédito, como preceitua o artigo 61.º do CPPT, juros esses que aqui também se peticionam..

 - Termina requerendo que deve o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado procedente por provado e, consequentemente, anulada a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada e anuladas as liquidações de IMT subjacentes, tudo com as demais consequências legais, nomeadamente com a condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios contados desde o indeferimento da reclamação graciosa.

 

A Requerente arrolou 2 testemunhas, juntou 15 documentos e procuração

 

 C. RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS

 

Notificada para responder, a Requerida veio defender-se por impugnação, requerendo a absolvição de todos os pedidos, alegando, em síntese o seguinte:

 - O Requerente é uma sociedade cujo objeto social é o exercício da atividade bancária, incluindo todas as operações compatíveis com essa atividade e permitidas por lei.

 - No contexto da sua atividade e na qualidade de exequente, adquiriu, em 04-10-2016, no âmbito do processo de execução n.º .../14...TBALM, por negociação particular, os imóveis identificados no ponto 1.º da informação ao executado D...– Fundo de Investimento Imobiliário Fechado.

 - Os imóveis em causa compõem um aparthotel conhecido por “Hotel ...”, que estava arrendado a uma terceira entidade que explorava o hotel.

 - No âmbito das referidas aquisições, o Requerente beneficiou da isenção de IMT prevista no n.º 1 do artigo 8.º do CIMT que, contudo, está condicionada à efetiva alienação dos imóveis no prazo de 5 anos, ou à inexistência de relações especiais com o adquirente, nos termos do n º 6 do artigo 11.º do CIMT.

 - Em 03-09-2021, o Requerente procedeu à liquidação do IMT relativo à aquisição que havia efetuado em 2016.

 - Assim, nesse mesmo dia, foram emitidas guias para pagamento do respetivo IMT e efetuado o pagamento do respetivo imposto.

 - Em 01-10-2021, vendeu à sociedade U..., SA. os imóveis que havia adquirido em 04-10-2016.

 - O Requerente apresentou, em 28-12-2021, reclamação graciosa, que tomou o n.º ...2022..., diretamente contra os referidos atos de liquidação do IMT, emitidos em 2021, onde alega ter mediado menos de cinco anos entre a compra efetuada em 2016 e a venda realizada em 2021 e, por isso, considera que a aquisição dos imóveis em 2016 está isenta de IMT ao abrigo do artigo 8.º do CIMT com a consequência de o IMT pago não ser devido.

 - Analisado o mérito do peticionado, os serviços da Requerida procederam à elaboração do “Projeto de Decisão de Indeferimento”, que passamos a transcrever na parte mais relevante:

“(…)

42. Começamos por constatar que os 129 imóveis adquiridos pelo A... em processo de execução, pelos quais foi liquidado IMT no montante de no montante de € 1.934.070,56, em referência aos DUC’s nºs..., ... e ..., foram alienados para a sociedade U..., S.A., NIPC..., por um montante substancialmente inferior.

43. Conforme consta dos IMT DUC’S de IMT ... e ..., no montante de respetivamente, € 1.070.584,50 e € 7440,45 (montante total de € 1.078.024,95), para efeito de realização da escritura pública em 01.10.2021, para a adquirente sociedade U..., S.A., NIPC... .

44. Esta transmissão para a sociedade U..., S.A., NIPC ...6, por um valor substancialmente inferior ao preço de aquisição remete-nos para o disposto na segunda parte do nº 6 do art.º 11º do CIMT, ou seja, (…) o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC.”.

45. Essa constatação de se estar perante um adquirente que seja uma entidade com relações especiais com o alienante, impõe a caducidade da isenção, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A... .

(…)

53. A norma sobre os preços de transferência releva essencialmente quanto ao juízo de ponderação da administração, sobre a não correspondência da realidade da matéria coletável declarada, como elemento determinador do critério ou regime legal de tributação.

54. Num momento em que o setor imobiliário à data se encontrava em valorização crescente, o confronto do valor da transação subjudice por um valor substancialmente inferior, em comparação com o preço que seria fixado ou acordado entre entidades independentes no seio de um mercado livre, impõe a aplicação do artº 63º nº 4 do CIRC, em referência ao normativo que versa sobre a caducidade da isenção de IMT, concretamente o artº 11º nº 6 do CIMT, devido à “(…) existência de um pressuposto objetivo – que preside à operatividade do instituto – que é constituído pela “anormalidade” do valor acordado entre empresas vinculadas que realizam uma determinada operação” (cf. Guglielmo Maisto, Il “Transfer Price” nel diritto tributario italiano e comparato, op. cit., pp. 85)”.

55. Conforme dispõe o nº 4 do artº 63 do CIRC, considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, uma vez que a sociedade adquirente é detida em 100%, por entidades em que o A... detém participações sociais relevantes.

56. Assim, por via indireta, o ora Reclamante tem o poder de influenciar as decisões de gestão da adquirente dos imóveis, a sociedade U..., S.A., NIPC... .

57. Não nos restam dúvidas que o A... tem o poder de exercer, direta/indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da U..., S.A., NIPC ..., uma vez que detém participações sociais relevantes em entidades que controlam a sociedade aquirente.

58. Além destas evidências de relações especiais, salientamos que não foram celebradas outras aquisições de imóveis, mantendo-se sociedade adquirente U..., S.A., NIPC ..., praticamente inativa, conforme consulta ao site da AT, para efeito de liquidação de IMI, os prédios continuam na sua esfera patrimonial.

59. E, tal como consta da escritura pública, a adquirente foi financiada pelo A..., onde se verifica existirem cláusulas pouco habituais, em termos de prazos de pagamento do valor contratado, bem como de resolução do contrato por incumprimento.

Assim,

60. Concluímos, pois, que o ora Reclamante e a sociedade U..., S.A., NIPC..., se encontram em relações especiais, o que implica a caducidade da isenção de IMT, nos termos do disposto no nº 6 do artº 11º do CIMT, devido a constatarmos que foram estabelecidas condições diferentes, das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes.

61. Analisados os documentos em anexo e outras diligências internas dos Serviços da UGC, somos do entendimento de estarmos perante um adquirente com relações especiais com o alienante, o que impõe a caducidade da isenção, nos termos previstos no nº 6 do artº 11º do CIMT, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A... .”

 - Através de ofício de 03-11-2022, da Unidade de Grandes Contribuintes, foi o Requerente notificado do mencionado projeto de decisão para, no prazo de 15 (quinze) dias, exercer, querendo, o seu direito de participação, na modalidade de audição prévia, sob a forma escrita, nos termos e efeitos do preceituado na alínea b) do n.º 1 e dos nºs 4 a 6 todos do artigo 60.º da LGT, conjugado com o preceituado no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

 - No decurso do prazo concedido para o exercício do direito de participação, o contribuinte carreou para os autos elementos que, no seu entendimento, colocam em causa o projeto de decisão.

 - Após análise do direito de audição, por despacho datado de 12/12/2022, do Chefe de Divisão da Justiça Tributária, junto da UGC, exarado na informação elaborada por aquele Serviço, foi indeferida a reclamação graciosa com fundamento no artigo 11.º, n.º 6, do CIMT que dispõe que «[d]deixam de beneficiar de isenção as aquisições a que se refere o artigo 8.º, se os prédios não forem alienados no prazo de cinco anos a contar da data da aquisição ou o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do nº 4 do artigo 63.º do Código do IRC».

 - O Requerente foi notificado, em 15-12-2022, do referido despacho de indeferimento, pelo ofício n.º ... – DJT/2022, de 12-12-2022, da Unidade de Grandes Contribuintes, remetido através de carta registada, com AR (RF ... PT, de 14-12-2022).

 - Discordando desta decisão, o Requerente, apresentou o presente pedido de pronúncia do Tribunal Arbitral em 17-03-2023.

 - Pronunciando-se sobre a matéria de direito, a Requerida alega o seguinte:

 - Estão sujeitas a IMT, ainda que dele isentas, todas as aquisições onerosas de bens imóveis, quer isto dizer que incide sobre todas as aquisições jurídicas do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito sobre bens imóveis relativamente aos quais se verifique a transferência do direito de propriedade, bem como a resolução, invalidade ou extinção, por mútuo consenso, dos respetivos contratos.

 - O IMT - prevê além dos factos que integram a regra geral da incidência objetiva, o CIMT continua também a ficcionar, como transmissões sujeitas a imposto, determinadas operações que direta ou indiretamente implicam a transmissão de bens imóveis e que se revestem de características económicas que justificam o seu enquadramento no âmbito da incidência. São exemplos, as cedências de posição contratual, as promessas de aquisição e alienação acompanhadas da tradição dos bens, do contrato de locação em que seja desde logo clausulada a posterior venda do imóvel, dos arrendamentos em longo prazo e da aquisição de partes sociais que confiram ao titular uma participação dominante em determinadas sociedades comerciais se o seu ativo for constituído por bens imóveis, a celebração dos contratos promessa em que seja clausulado que o promitente adquirente poderá ceder a sua posição contratual a terceiros.

 - O artº 8° do CIMT versa sobre a isenção de IMT concedida ao setor bancário aquando da aquisição de imóveis. Pese embora o facto de a aquisição deste tipo de bens não fazer parte do leque de atividades típicas das instituições bancárias, a verdade é que, não raras vezes, ocorrem transmissões de imóveis para essas entidades, motivadas pelo interesse legitimo da banca, para efeito de satisfação dos seus créditos, ou de parte deles, quando comprovadamente os devedores não conseguirem fazê-lo.

 - Por vezes, os bancos acabam por serem "obrigados” a alargar o seu património imobiliário pelo que, o legislador entendeu que, nestas situações, o outorgante adquirente deve beneficiar da isenção de IMT.

 - O nª 6 do artº 11° do CIMT tem a seguinte redação:

"6 - Deixam de beneficiar de isenção as aquisições a que se refere o artigo 8.º se os prédios não forem alienados no prazo de cinco anos a contar da data da aquisição ou o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC."

 - O A... efetuou três liquidações (DUC'S de IMT nºs ..., ... e  ..., estando em causa a transmissão de 129 imóveis) em 03.09.2021, que agora contesta por ter alienado os imóveis antes do prazo de caducidade da isenção para a sociedade U..., S.A., NIPC ....

 - O A... alienou os 129 imóveis para a adquirente sociedade U..., S,A., NIPC ..., tendo sido apresentados os DUC'S de IMT ... e ..., no montante de respetivamente,€ 1.070.584,50 e € 7440,45 (montante total de 1.078.024,95), para efeito de realização da escritura pública em 01.10.2021.

Analisando,

 - Começamos por constatar que os 129 imóveis adquiridos pelo A... em processo de execução, pelos quais foi liquidado IMT no montante de € 1.934.070,56, em referência aos DUC's nºs..., ... e ..., foram alienados para a sociedade U..., S.A., NIPC..., por um montante substancialmente inferior.

 - Conforme consta dos IMT DUC'S de IMT ... e ..., no montante de respetivamente, € 1.070.584,50 e € 7440,45 (montante total de € 1.078.024,95), para efeito de realização da escritura pública em 01.10.2021, para a adquirente sociedade U..., S.A., NIPC ... .

 - Esta transmissão para a sociedade U..., S.A., NIPC..., por um valor substancialmente inferior ao preço de aquisição remete-nos para o disposto na segunda parte do nº 6 do artº 11° do CIMT, ou seja, (... ) o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do n.0 4 do artigo 63.0 do Código do IRC.".

 - Essa constatação de se estar perante um adquirente que seja uma entidade com relações especiais com o alienante, impõe a caducidade da isenção, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A... .

 - O artigo 63° do CIRC encontra-se inserido no capítulo referente às correções para efeitos de determinação da matéria coletável, versando esse artigo sobre "Preços de Transferência", cuja redação transcrevemos, dada a importância que reveste para a situação concreta:

"1 - Nas operações efetuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticas aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis.

2 - As operações a que se refere o número anterior abrangem operações comerciais, incluindo qualquer operação ou série de operações que tenha por objeto bens tangíveis ou intangíveis, direitos ou serviços, ainda que realizadas no âmbito de um qualquer acordo, designadamente de partilha de custos e de prestação de serviços lntragrupo, bem como operações financeiras e operações de reestruturação ou de reorganização empresariais. que envolvam alterações das estruturas de negócio, a cessação ou renegociação substancial dos contratos existentes, em especial quando impliquem a transferência de bens tangíveis, intangíveis, direitos sobre intangíveis, ou compensações por danos emergentes ou lucros cessantes.

3- Para a determinação dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes, o sujeito passivo deve adotar qualquer dos métodos seguintes, tendo em conta, entre outros aspetos, a natureza da operação, a disponibilidade de informações fiáveis e o grau de comparabilidade entre as operações ou séries de operações que efetua e outras substancialmente idênticas, efetuadas entre entidades independentes:

a) O método do preço comparável de mercado, o método do preço de revenda minorado, o método do custo majorado, o método do fracionamento do lucro ou o método da margem líquida da operação;

b) Outro método, técnica ou modelo de avaliação económica de ativos geralmente aceites, sempre que os métodos previstos na alínea anterior não possam ser utilizados devido ao carácter único ou singular das operações ou à falta ou escassez de informações e dados comparáveis fiáveis relativos a operações similares entre entidades independentes, em especial quando as operações tenham por objeto direitos reais sobre bens imóveis, partes de capital de sociedades não cotadas, direitos de crédito e intangíveis.

4- Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:

a) Uma entidade e os titulares do respetivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20% do capital ou dos direitos de voto;

b) Entidades em que os mesmos titulares do capital, respetivos cônjuges, ascendentes ou descendentes detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20% do capital ou dos direitos de voto;

c) Uma entidade e os membros dos seus órgãos sociais, ou de quaisquer órgãos de administração, direção, gerência ou fiscalização, e respetivos cônjuges, ascendentes e descendentes;

d) Entidades em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha reta;

e) Entidades ligadas por contrato de subordinação, de grupo paritário ou outro de efeito equivalente;

f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos termos do artigo 486.º do Código das Sociedades Comerciais;

g) Entidades cujo relacionamento jurídico possibilita, pelos seus termos e condições, que uma condicione as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheias à própria relação comercial ou profissional;

h) Uma entidade residente ou não residente com estabelecimento estável situado em território português e uma entidade sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável residente em pais, território ou região constante da lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.

5- Para efeitos do cálculo do nível percentual de participação indireta no capital ou nos direitos de voto a que se refere o número anterior, nas situações em que não haja regras especiais definidas, são aplicáveis os critérios previstos no n.º 2 do artigo 483.º do Código das Sociedades Comerciais.

6- Para efeitos de justificar que os termos e condições das operações efetuadas entre entidades com relações especiais são estabelecidos com observância do princípio enunciado no n.º 1, os sujeitos passivos devem manter organizada, nos termos estatuídos para o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º, a documentação respeitante à política adotada em matéria de preços de transferência.

7- Os sujeitos passivos devem indicar, na declaração anual de informação contabilística e fiscal a que se refere o artigo 121.º, a existência ou inexistência, no período de tributação a que aquela respeita, de operações com entidades com as quais está em situação de relações especiais, devendo ainda, no caso de declarar a sua existência, designadamente:

a) Identificar as entidades em causa;

b) Identificar e declarar o montante e a tipologia das operações realizadas com cada uma;

c) Identificar as metodologias de determinação dos preços de transferência utilizadas e as alterações ocorridas às metodologias adotadas:

d) Indicar o valor das correções efetuadas na determinação do lucro tributável pela não observância do princípio da plena concorrência na fixação dos termos e condições das operações;

e) Declarar se organizou, ao tempo em que as operações tiveram lugar, e mantém, a documentação relativa aos preços de transferência praticados.

8- Sempre que as regras enunciadas no n.º 1 não sejam observadas, relativamente a operações com entidades não residentes, deve o sujeito passivo efetuar, na declaração a que se refere o artigo 120.º, as necessárias correções positivas na determinação do lucro tributável, pelo montante correspondente aos efeitos fiscais imputáveis a essa inobservância.

9-Sempre que as regras enunciadas no n.º 1 não sejam observadas, a Autoridade Tributária e Aduaneira pode efetuar as correções na determinação do lucro tributável, pelo montante correspondente ao que teria sido obtido se as operações se tivessem efetuado numa situação normal de mercado.

10- As correções a que se referem os n.ºs 8 e 9, devem ser imputadas ao período ou períodos de tributação em que os efeitos das operações se tornem relevantes para efeitos da determinação do lucro ou do rendimento tributável dos sujeitos passivos de IRC ou de IRS.

11- As regras previstas no presente artigo são igualmente aplicáveis nas relações entre:

a) Uma entidade não residente e um seu estabelecimento estável situado em território português, ou entre este e outros estabelecimentos estáveis situados fora deste território;

b) Uma entidade residente e os seus estabelecimentos estáveis situados fora do território português ou entre estes.

12 - O disposto nos números anteriores aplica-se igualmente às pessoas que exerçam simultaneamente atividades sujeitas e não sujeitas ao regime geral de IRC.

13- Quando a Autoridade Tributária e Aduaneira proceda às correções necessárias para a determinação do lucro tributável por virtude de relações especiais com outro sujeito passivo de IRC ou do IRS, na determinação do lucro tributável ou do rendimento tributável deste último, devem ser efetuados os ajustamentos adequados que sejam reflexo daquelas correções.

14- Pode a Autoridade Tributária e Aduaneira proceder igualmente ao ajustamento correlativo referido no número anterior quando tal resulte de convenções internacionais celebradas por Portugal e nos termos e condições nas mesmas previstos.

15- São objeto de regulamentação por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças:

a) A definição das regras para a aplicação dos métodos de determinação dos preços de transferência;

b) A avaliação do grau de comparabilidade;

c) As regras para a aplicação do princípio referido no n,º 1 aos acordos de repartição de custos, às prestações de serviços íntragrupo e às operações de reestruturação;

d) Os procedimentos aplicáveis em caso de ajustamentos nos termos dos n.os 9, 13 e 14;

e) O tipo, a natureza e o conteúdo da documentação referida no n.º 6, bem como as situações em que é dispensado o cumprimento desta obrigação."

 - Conforme consta do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 252/05, de 10 de maio de 2005, a ratio do artigo 63º do CIRC (anterior artº 57° do CIRC), é impedir a evasão e a elisão fiscal.

 - A previsão constante do nº 4 do artº 63° do CIRC, tem por fundamento uma maciça intervenção normativa e administrativa, acolhendo, ao nível do seu direito interno, um conjunto de normas que estabelecem a obrigação, a cargo de sujeitos ligados por um vínculo de independência, de observar, nas relações económicas estabelecidas entre si, critérios de determinação do valor de cada operação que não sejam diversos dos praticados ou dos que seriam praticados entre operadores independentes, ou seja, entre operadores com interesses e escopos contrapostos.

 - O legislador fiscal consagrou no artigo 63.º do CIRC a possibilidade de a Administração Fiscal realizar as diligências que sejam necessárias para a determinação do lucro tributável sempre que, em virtude das relações especiais entre o contribuinte e outra pessoa, sujeita ou não a IRC, tenham sido estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, conduzindo a que o lucro apurado com base na contabilidade seja diverso do que se apuraria na ausência dessas relações.

 - O artigo 63.º do CIRC insere-se num particular momento da vida do imposto, dizendo diretamente respeito à questão da determinação da base material que há-de estar sujeita à imposição fiscal.

 - A delimitação do conceito de incidência relevante para a tutela garantística que o princípio da legalidade empresta a este âmbito dogmático passa pela abrangência dos pressupostos de facto geradores do imposto e da respetiva matéria tributável, sendo que, quanto a esta, como refere Cardoso da Costa «sempre foi entendimento tradicional na doutrina portuguesa (...) o de distinguir entre a sua "definição" e a sua "determinação":

na primeira, está em causa a identificação da entidade económica (...) sujeita a Imposto, e, consequentemente, um elemento "substantivo" e "essencial" da normação tributária;

na segunda, trata-se já do método ou dos métodos a adotar no cálculo e no estabelecimento do respetivo valor e, portanto, de um domínio "instrumental", com carácter fundamentalmente "procedimental" e "adjetivo"», devendo também este domínio da determinação da matéria tributável «respeitar as específicas e estritas exigências do princípio da legalidade fiscal, quando o seu conteúdo e alcance transcender a pura esfera "processual" e assumir já, afinal, um carácter "material ou substantivo".

 - As exigências inerentes ao princípio da legalidade fiscal, na medida em que a sua regulamentação incorpora uma substancialidade determinante da conformação do valor dos rendimentos sujeitos a tributação, permitirá o estabelecimento do rendimento sujeito a imposto.

 - A norma sobre os preços de transferência releva essencialmente quanto ao juízo de ponderação da administração, sobre a não correspondência da realidade da matéria coletável declarada, como elemento determinador do critério ou regime legal de tributação.

 - Num momento em que o setor imobiliário à data se encontrava em valorização crescente, o confronto do valor da transação sub judice por um valor substancialmente inferior, em comparação com o preço que seria fixado ou acordado entre entidades independentes no seio de um mercado livre, impõe a aplicação do artº 63° nº 4 do CIRC, em referência ao normativo que versa sobre a caducidade da isenção de IMT, concretamente o artº 11º nº 6 do CIMT, devido à"( ... ) existência de um pressuposto objetivo - que preside à operatividade do instituto - que é constituído pela "anormalidade" do valor acordado entre empresas vinculadas que realizam uma determinada operação'' (cf. Guglielmo Maisto).

 - Conforme dispõe o nº 4 do artº 63 do CIRC, considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, uma vez que a sociedade adquirente é detida em 100%, por entidades em que o A... detém participações sociais relevantes.

 - Assim, por via indireta, o Requerente tem o poder de influenciar as decisões de gestão da adquirente dos imóveis, a sociedade U..., S.A., NIPC... .

 - Não restam dúvidas à Requerida que o A... tem o poder de exercer, direta/indiretamente, uma Influência significativa nas decisões de gestão da U... S.A., NIPC ..., uma vez que detém participações sociais relevantes em entidades que controlam a sociedade aquirente.

 - Além destas evidências de relações especiais, salienta que não foram celebradas outras aquisições de imóveis, mantendo-se sociedade adquirente U..., S.A., NIPC..., praticamente inativa, conforme consulta ao site da AT, para efeito de liquidação de IMI, os prédios continuam na sua esfera patrimonial.

 - E, tal como consta da escritura pública, a adquirente foi financiada pelo A..., onde se verifica existirem cláusulas pouco habituais, em termos de prazos de pagamento do valor contratado, bem como de resolução do contrato por incumprimento.

 - Assim, conclui a Requerida que o ora Reclamante e a sociedade U..., S.A., NIPC..., se encontram em relações especiais, o que implica a caducidade da isenção de IMT, nos termos do disposto no nº 6 do art° 11° do CIMT, devido a constatarmos que foram estabelecidas condições diferentes, das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes.

 - Sendo do entendimento que de está perante um adquirente com relações especiais com o alienante, o que impõe a caducidade da isenção, nos termos previstos no nº 6 do artº 11° do CIMT, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A... .

 - Alega, ainda, a Requerida que, alienar imóveis por um valor de cerca de 42% inferior ao preço de aquisição (para efeito de diminuir a tributação em sede de IMT desse mesmo montante), mormente numa conjuntura em que o mercado imobiliário está em ascensão é uma situação questionável. principalmente, quando se trata de uma operação realizada in extremis, para efeitos de tributação de IMT.

 - A sociedade U..., S.A. foi constituída em 13 de setembro de 2021 a partir da sociedade com a designação QQ... Unipessoal, Lda., é detida pela sociedade W... Fund, constituída segundo a lei luxemburguesa e no qual a Requerente participa em 36,6%, que, é gerida por um uma entidade participante denominada Y..., S.A.

 - Tendo ficado por explicar a relação que existe entre a Y...,S.A. e a KK..., SCR, SA com o A... .

 - Em junho de 2020, o A... avaliava a sua exposição, em referência às unidades de participação que detinha na W..., com sede no luxemburgo, em 133,8 milhões de euros, já depois da correção efetuada em 2019, que nesta data correspondia a 213 milhões de euros.

 - À Requerida não restam dúvidas que o A... tem o poder de exercer, direta/indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da U... S.A., NIPC..., uma vez que detém participações sociais relevantes em entidades que controlam a sociedade aquirente.

 - Salientando que, para além destas evidências de relações especiais, não foram celebradas outras aquisições de Imóveis, mantendo-se sociedade adquirente U..., S.A. NIPC ..., praticamente inativa, conforme consulta ao site da AT, para efeito de liquidação de IMI, os prédios continuam na sua esfera patrimonial.

 - E, tal como consta da escritura pública, a adquirente foi financiada pelo A..., onde se verifica existirem cláusulas pouco habituais, em termos de prazos de pagamento do valor contratado, bem como de resolução do contrato por incumprimento.

 - Assim, a transmissão dos imóveis para U... S.A., NIPC ..., permitiria ao A... diminuir a tributação em sede de IMT, de € 1.934.070,56 para € 1.078.024,95, sendo essa diferença, a vantagem económica que pretendia obter, não fosse a Requerida constatar que o transmitente e o adquirente se encontram em relações especiais, nos termos previstos no atº 11º nº 6 do CIMT.

 - Conclui a Requerida que o Requerente e a sociedade U..., S.A., NIPC ..., encontram-se em relações especiais, o que implica como implicou a caducidade da isenção de IMT, nos termos do disposto no nº 6 do artº 11° do CIMT, devido a ficar comprovado que foram estabelecidas condições mais favoráveis para o adquirente dos imóveis ( U..., S.A., NIPC ...), das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes.

- No que à alegada falta de fundamentação diz respeito, alega a Requerida que o dever de fundamentação estatuído no n.º 3 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), garante aos administrados o direito a fundamentação expressa e acessível de todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos.

 - No entanto, importa delimitar com rigor o preciso alcance deste dever constitucional.

 - Estabelece o artigo 77.º da LGT «A decisão do procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram (...)» (n.º 1). «A fundamentação dos actos tributários deve conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e a quantificação dos actos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo» (n.º 2).

 - Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art.º 125.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), que corresponde ao atual art.º 153.º do citado compêndio legal, a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato; equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.

 - Temos, pois, que a fundamentação dos atos deverá consistir, no mínimo, numa exposição concisa dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, dando a conhecer ao interessado, o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor da decisão para decidir no sentido em que decidiu e não noutro qualquer.

 - Neste ponto, alega o Requerente que a AT considerou o valor da operação baixo no confronto, por um lado, com um valor pelo qual a Requerente havia adquirido anos antes e, por outro lado, tendo em mente uma ideia de valorização crescente e generalizada dos ativos imobiliários. Discorda, dizendo que o valor pelo qual comprou anos antes corresponde ao montante que o executado tinha em dívida para com o Requerente e, por outro lado, que o imóvel em questão não se trata de um equipamento residencial, mas sim de um equipamento hoteleiro vendido numa fase em que se vivia uma pandemia que muito afetou o turismo.

 - A Requerida entende que não cabe razão ao Requerente, pois não se trata de insinuações vagas, mas de uma significativa redução no preço, de cerca de 42% inferior ao preço de aquisição, num momento em que assistia a uma valorização crescente e generalizada dos ativos imobiliários.

 - Valorização essa que não se confinou à componente residencial, mas também aos equipamentos hoteleiros, visto que nessa altura se assistia já a um grande crescimento do turismo em Portugal.

- A pandemia não passou de uma crise momentânea que pouco afetou a procura por este tipo de equipamentos, uma vez que se previa uma retoma rápida do crescimento do turismo em Portugal, logo que fossem levantados os entraves fronteiriços ao trânsito de pessoas. Previsão que, aliás, se veio a confirmar.

 - Finalmente, alega que, ao contrário do invocada pela AT, é falso que a sociedade adquirente tenha sido financiada pela Requerente para efetuar a aquisição, pelo que não se percebe que cláusulas pouco habituais são essas a que a AT faz referência.

 - Efetivamente da escritura não se retira que a sociedade adquirente tenha sido financiada pelo Requerente, mas consta da escritura a forma de pagamento “Que o indicado preço, no montante de dezasseis milhões e quinhentos e oitenta e cinco mil euros, foi/será realizado do seguinte modo:

a) A quantia de dois milhões e quinhentos mil euros na presente data, por transferência bancária da conta com IBAN PT ... do A.... para a conta com IBAN PT ... do A... .

b) A quantia remanescente de catorze milhões e oitenta e cinco mil euros deverá ser paga até ao vigésimo dia útil a contar da presente data.”

 - Ou seja, o capital relativo à compra em causa circulou entre contas do A..., não se verificando qualquer transferência de fundos da sociedade adquirente para o Requerente, o que constitui um indício claro das relações especiais que estão na base das liquidações aqui em crise.

 - Conclui a Requerida que a alegada falta de fundamentação não se verifica, porquanto os fundamentos de facto e de direito, bem como o cálculo efetuado, que subjazem à liquidação ora em crise, foram regularmente notificados à Recorrente.

 - Por fim, não obstante seja evidente a suficiência da fundamentação no caso concreto, é de salientar, ainda, que se considera igualmente que o ato se encontra devidamente fundamentado sempre que o destinatário do ato revele ter apreendido os seus fundamentos.

 - Nesta perspetiva, e segundo a doutrina e a jurisprudência, um ato está fundamentado sempre que o contribuinte, como destinatário normal, fique devidamente esclarecido acerca das razões que o determinaram, estando, consequentemente, habilitado a impugná-lo convenientemente, não tendo, todavia, a fundamentação de ser exaustiva, mas acessível e explícita.

 - In casu, é manifesto que foi dado à Requerente um conhecimento claro da motivação da liquidação, de modo a permitir que fizesse uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato ou a sua impugnação, como se constata através do presente pedido de pronuncia arbitral.

Assim, deverá concluir-se pela inexistência de violação do princípio da fundamentação.

 - No que concerne ao pedido de juros indemnizatórios, caso a pretensão do Requerente venha a obter provimento, os juros apenas deverão ser considerados nos termos do disposto no art.º 43.º nº 3 alínea c) da LGT, dado que não houve erro imputável aos serviços, tendo em conta que o imposto foi declarado e pago pelo sujeito passivo, e as respetivas liquidações efetuadas de acordo com as normas vigentes.

 – A Requerida conclui requerendo que o pedido de pronúncia arbitral deva ser julgado improcedente por não provado e absolvida a Requerida de todos os pedidos

 - A Requerida juntou o processo administrativo

 

 D. QUESTÕES A DECIDIR.

 Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes as questões que cabe apreciar e decidir:

.

1. Questão de fundo:

Saber se uma participação indirecta, que ascende a 37%, detida pelo Requerente na entidade adquirente dos imóveis, se traduz, nas circunstâncias da situação em apreço, em “relações especiais” nos termos do nº 6 do art. 11º do CIMT.

2.  Saber se a decisão impugnada padecerá de vício de forma por falta de fundamentação.

3.  E, no caso de o Tribunal Arbitral condenar a Requerida, se haverá lugar à restituição do montante pago e ao pagamento de juros indemnizatórios, e desde quando.

 

 E. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

 - O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2º, nº 1, alínea a), 5º e 6º, nº 1, do RJAT.

 - As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4º e 10º do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 - O processo não enferma de nulidades.

 - Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

 Tudo visto, cumpre proferir

 

 II. DECISÃO

 

  1. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

 Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provados os seguintes factos:

1 - O Requerente é uma sociedade cujo objeto social é o exercício da atividade bancária, incluindo todas as operações compatíveis com essa atividade e permitidas por lei.

2 - No contexto da sua atividade e na qualidade de exequente, o Requerente adquiriu, em 04-10-2016, no âmbito do processo de execução n.º .../14...TBALM, por negociação particular, ao executado D... – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado os imóveis identificados nos autos que compõem um aparthotel conhecido por “Hotel...”, que estava arrendado a uma terceira entidade que o explorava.

3 - No acto das referidas aquisições, o Requerente beneficiou da isenção de IMT prevista no n.º 1 do artigo 8.º do CIMT

4 - Em 03-09-2021, o Requerente procedeu ao pagamento do IMT relativo à referida aquisição que havia efetuado em 2016.

5 - Em 01-10-2021, o Requerente vendeu à sociedade U..., SA. os imóveis que havia adquirido em 04-10-2016.

6 – O Requerente participa indirectamente no capital desta sociedade adquirente com uma participação que ascende a 37%

7 - O Requerente apresentou, em 28-12-2021, Reclamação Graciosa, que tomou o n.º ...2022..., diretamente contra os referidos atos de liquidação do IMT, emitidos em 2021, onde alega ter mediado menos de cinco anos entre a compra efetuada em 2016 e a venda realizada em 2021 e, por isso, considera que a aquisição dos imóveis em 2016 está isenta de IMT ao abrigo do artigo 8.º do CIMT com a consequência de o IMT pago não ser devido.

 8 -No âmbito desta Reclamação, os serviços da Requerida procederam à elaboração do “Projeto de Decisão de Indeferimento”, cujos passos mais relevantes são os seguintes:

“(…)

42. Começamos por constatar que os 129 imóveis adquiridos pelo A... em processo de execução, pelos quais foi liquidado IMT no montante de no montante de € 1.934.070,56, em referência aos DUC’s nºs..., ... e..., foram alienados para a sociedade U..., S.A., NIPC..., por um montante substancialmente inferior.

43. Conforme consta dos IMT DUC’S de IMT ... e ..., no montante de respetivamente, € 1.070.584,50 e € 7440,45 (montante total de € 1.078.024,95), para efeito de realização da escritura pública em 01.10.2021, para a adquirente sociedade U..., S.A., NIPC ... .

44. Esta transmissão para a sociedade U..., S.A., NIPC ..., por um valor substancialmente inferior ao preço de aquisição remete-nos para o disposto na segunda parte do nº 6 do art.º 11º do CIMT, ou seja, (…) o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC.”.

45. Essa constatação de se estar perante um adquirente que seja uma entidade com relações especiais com o alienante, impõe a caducidade da isenção, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A... .

(…)

53. A norma sobre os preços de transferência releva essencialmente quanto ao juízo de ponderação da administração, sobre a não correspondência da realidade da matéria coletável declarada, como elemento determinador do critério ou regime legal de tributação.

54. Num momento em que o setor imobiliário à data se encontrava em valorização crescente, o confronto do valor da transação subjudice por um valor substancialmente inferior, em comparação com o preço que seria fixado ou acordado entre entidades independentes no seio de um mercado livre, impõe a aplicação do artº 63º nº 4 do CIRC, em referência ao normativo que versa sobre a caducidade da isenção de IMT, concretamente o artº 11º nº 6 do CIMT, devido à “(…) existência de um pressuposto objetivo – que preside à operatividade do instituto – que é constituído pela “anormalidade” do valor acordado entre empresas vinculadas que realizam uma determinada operação” (cf. Guglielmo Maisto, Il “Transfer Price” nel diritto tributario italiano e comparato, op. cit., pp. 85)”.

55. Conforme dispõe o nº 4 do artº 63 do CIRC, considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, direta ou indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, uma vez que a sociedade adquirente é detida em 100%, por entidades em que o A... detém participações sociais relevantes.

56. Assim, por via indireta, o ora Reclamante tem o poder de influenciar as decisões de gestão da adquirente dos imóveis, a sociedade U..., S.A., NIPC... .

57. Não nos restam dúvidas que o A... tem o poder de exercer, direta/indiretamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da U..., S.A., NIPC ..., uma vez que detém participações sociais relevantes em entidades que controlam a sociedade aquirente.

58. Além destas evidências de relações especiais, salientamos que não foram celebradas outras aquisições de imóveis, mantendo-se sociedade adquirente U..., S.A., NIPC..., praticamente inativa, conforme consulta ao site da AT, para efeito de liquidação de IMI, os prédios continuam na sua esfera patrimonial.

59. E, tal como consta da escritura pública, a adquirente foi financiada pelo A..., onde se verifica existirem cláusulas pouco habituais, em termos de prazos de pagamento do valor contratado, bem como de resolução do contrato por incumprimento.

Assim,

60. Concluímos, pois, que o ora Reclamante e a sociedade U..., S.A., NIPC..., se encontram em relações especiais, o que implica a caducidade da isenção de IMT, nos termos do disposto no nº 6 do artº 11º do CIMT, devido a constatarmos que foram estabelecidas condições diferentes, das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes.

61. Analisados os documentos em anexo e outras diligências internas dos Serviços da UGC, somos do entendimento de estarmos perante um adquirente com relações especiais com o alienante, o que impõe a caducidade da isenção, nos termos previstos no nº 6 do artº 11º do CIMT, e consequentemente a liquidação de IMT, no montante efetivamente liquidado e pago pelo A... .”

8 - Através de ofício de 03-11-2022, da Unidade de Grandes Contribuintes, foi o Requerente notificado do mencionado projeto de decisão e para, no prazo de 15 dias, exercer, querendo o seu direito de participação, na modalidade de audição prévia, sob a forma escrita, nos termos e efeitos do preceituado na alínea b) do n.º 1 e dos nºs 4 a 6 todos do artigo 60.º da LGT, conjugado com o preceituado no artigo 100.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

 9 - No decurso do prazo concedido para o exercício do direito de participação, o contribuinte carreou para os autos diversos elementos.

 10 – Por despacho datado de 12/12/2022, do Chefe de Divisão da Justiça Tributária, junto da UGC, exarado na informação elaborada por aquele Serviço, foi indeferida a reclamação graciosa com fundamento no artigo 11.º, n.º 6, do CIMT que dispõe que «deixam de beneficiar de isenção as aquisições a que se refere o artigo 8.º, se os prédios não forem alienados no prazo de cinco anos a contar da data da aquisição ou o adquirente seja uma entidade com relações especiais, nos termos do nº 4 do artigo 63.º do Código do IRC».

11 - O Requerente foi notificado, em 15-12-2022, do referido despacho de indeferimento, pelo ofício n.º ... – DJT/2022, de 12-12-2022, da Unidade de Grandes Contribuintes, remetido através de carta registada, com AR (RF ... PT, de 14-12-2022).

12 – O Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia do Tribunal Arbitral em 17-03-2023.

 

A.2. Factos dados como não provados

Não foram dados como não provados factos com relevo para a decisão da causa.

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A.3. Fundamentação da matéria de facto provada

Os factos dados como provados estão baseados no processo administrativo, nos documentos indicados relativamente a cada um deles e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não tenha sido questionada.

 

  1. DO DIREITO

 

Fixada a matéria de facto, procede-se de seguida à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.

As orientações arrogadas pelo Requerente e pela Requerida e a sua fundamentação estão expostas com detalhe, nos pontos E. e F. do Relatório desta Decisão Arbitral, para os quais se remete.

Passemos de seguida à apreciação da primeira questão atrás enunciada:

Conforme se encontra assinalado, esta é a questão de fundo e consiste em saber se a participação indirecta de 37% que o Requerente detém na entidade adquirente é susceptível, atentas as demais circunstâncias, de se enquadrar nas “relações especiais” a que se refere o art. 11º, nº 6 do CIMT, eliminando, assim, a isenção de IMT consagrada no art. 8º do CIMT.

À questão em apreço são aplicáveis os normativos legais indicados a seguir:

- Artigos 1.º, 2.º e 4.º do CIMT, que estabelecem a incidência de IMT sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, de imóveis situados em território nacional, sendo o IMT devido, em regra, pelo adquirente dos bens imóveis.

 - Artigo 8.º do CIMT (Isenção pela aquisição de imóveis por instituições de crédito), que prevê uma isenção aplicável às aquisições de imóveis por instituições de crédito ou por sociedades comerciais cujo capital seja direta ou indiretamente por aquelas dominado, em processo de execução movido por essas instituições ou por outro credor, bem como as efetuadas em processo de falência ou de insolvência, desde que, em qualquer caso, se destinem à realização de créditos resultantes de empréstimos feitos ou de fianças prestadas.

- Artigo 11.º, n.º 6 do CIMT (Caducidade das isenções) que preceitua que deixam de beneficiar de isenção as aquisições a que se refere o artigo 8.º, se os prédios não forem alienados no prazo de cinco anos a contar da data da aquisição, ou se o adquirente for uma entidade com relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC.

Do quadro legal acima indicado, resulta claro que incide IMT sobre as aquisições de imóveis objecto do presente processo, não obstante poder ser aplicável ao caso concreto a isenção prevista no artigo 8.º deste Código.

Ora, a isenção do artigo 8.º está, no entanto, sujeita a duas condições, as quais estão previstas no artigo 11.º, n.º 6 do CIMT.

 - Primeira condição: de caráter temporal: a alienação ocorrer dentro do prazo de 5 anos a contar da data de aquisição.

 Na situação em apreço, esta condição tem-se por verificada, na medida em que os imóveis foram adquiridos em 04/10/2016 e a sua alienação ocorreu 01/10/2021.

- Segunda condição, de caráter negativo: desde que não se verifiquem “relações especiais”, nos termos do artigo 63.º, n.º 4 do Código do IRC.

Será, assim, a questão relativa ao preenchimento desta segunda condição que está aqui neste processo em apreço, importando assim aferir se há, ou não, “relações especiais” entre a Requerente e a entidade adquirente dos imóveis.

 A estrutura de controlo da entidade adquirente é a seguinte:

----------- W... Fund

------------------ V..., SA (detida a 100%)

-----------------------G..., SA (detida a 100%)

--------------------------- U..., SA (detida a 100%)

Verifica-se, assim, haver uma estrutura em cadeia, detida integralmente pela W... Fund, assumindo esta a forma jurídica de fundo de investimento de capital variável, constituído de acordo com a lei luxemburguesa, sob a forma de sociedade em comandita por ações

O Fundo é gerido pelo acionista comanditado (General Partner), no caso concreto, a Y..., sob a forma de sociedade anónima Luxemburguesa.

 

De acordo com a informação veiculada pelo acionista comanditado à Requerente, os participantes do fundo são os seguintes:

 Z... CRL, com 1%

AA..., S.A., com 2%

BB…, S.A., com 2%

CC..., S.A., com 15%

DD..., S.A., com 21%

EE..., S.A., com 22%

A..., S.A. (Requerente), com 37%

Assim sendo, a questão de fundo é saber se esta participação indireta, que ascende a 37%, do Requerente na entidade adquirente dos imóveis, poderá traduzir-se em “relações especiais”, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 6 do CIMT

 Resulta dos documentos constitutivos do Fundo que este tem duas categorias de participantes/acionistas:

Sócio comanditado ou General Partner que assume responsabilidade ilimitada e que assume a gestão e administração do fundo.

Sócios comanditários que assumem responsabilidade limitada (pelo montante dos investimentos no Fundo)

Na cláusula 13 dos seus estatutos é referido que os sócios comanditários, com responsabilidade limitada, não devem participar ou interferir com a gestão da entidade.

Ora, para se verificarem “relações especiais” deve observar-se, conforme prevê o artigo 11.º, n.º 6 do CIMT, o disposto no artigo 63.º, n.º 4 do Código do IRC, que estabelece o seguinte:

«Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:

a) Uma entidade e os titulares do respetivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20 % do capital ou dos direitos de voto;

b) Entidades em que os mesmos titulares do capital, respetivos cônjuges, ascendentes ou descendentes detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 20 % do capital ou dos direitos de voto;

c) Uma entidade e os membros dos seus órgãos sociais, ou de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, e respectivos cônjuges, ascendentes e descendentes;

d) Entidades em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha recta;

e) Entidades ligadas por contrato de subordinação, de grupo paritário ou outro de efeito equivalente;

f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos termos do artigo 486.º do Código das Sociedades Comerciais;

g) Entidades cujo relacionamento jurídico possibilita, pelos seus termos e condições, que uma condicione as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheios à própria relação comercial ou profissional;

h) Uma entidade residente ou não residente com estabelecimento estável situado em território português e uma entidade sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável residente em país, território ou região constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.»

Pergunta-se, assim, se pode, ou não, o Requerente exercer, ainda que de forma indireta, uma influência significativa nas decisões de gestão da U..., SA, na medida em que participa indiretamente no capital daquela entidade, com uma participação que ascende a 37%?

O argumento invocado pelo Requerente é que a gestão do Fundo não está cometida ao Requerente, mas sim ao General Partner, não havendo nenhuma relação de gestão ou influência por parte daquela.

 Vejamos:

Como é referido pela Requerida, as regras de preços de transferência, a que o artigo 63.º em análise dá corpo, traduzem-se em regras que enformam diversos ordenamentos jurídicos, matéria amplamente desenvolvida no plano internacional, com particular enfoque por parte da OCDE (organismo central no desenvolvimento da fiscalidade internacional), e cujas regras visam corrigir eventuais manipulações de preços e transferências entre entidades relacionadas, no quadro do combate à fraude e evasão fiscais.

Estas regras visam garantir a concretização do "princípio da plena concorrência", plasmado na Convenção Modelo da OCDE e, entre nós, no artigo 63.º do Código do IRC.

Por estas razões, o dispositivo legal previsto no n.º 4 do artigo 63.º materializa um conceito lato de “relações especiais”, numa formulação meramente exemplificativa e que não se cinge a determinados tipos jurídicos, precisamente pelas motivações que estão na sua génese de combate à fraude e evasão fiscais, num contexto de globalização e proliferação de formas jurídicas e transações comerciais.

Por conseguinte, o próprio Código do IMT veio socorrer-se daquela formulação jurídica, aplicável em matéria de imposto sobre o rendimento, visando garantir que a regra da caducidade que condiciona a isenção aplicável às entidades bancárias não é frustrada (enquanto norma excepcional), desde logo, porque na venda condicionada pelo decurso do tempo – e tendo em vista cumprir com o requisito temporal de alienação no prazo de 5 anos – o imóvel transita para uma entidade com relações especiais, promovendo-se casos de eventuais transações em carrossel entre entidades relacionadas, garantido formalmente o prazo previsto para efeitos de aplicação da isenção do artigo 8.º do CIMT, frustrando o escopo normativo.

Ora, mais do que considerações, para este efeito, quanto ao valor da transação, releva o facto de a Requerente participar em 37%, de forma indireta, na entidade adquirente dos imóveis.

Ao verificar-se uma participação superior a 20%, de forma indireta, da Requerente no capital da U..., SA, atesta-se o disposto na alínea a) do n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC, que prevê aquele limite mínimo para efeitos de uma estrutura de capital ou direitos de voto.

O próprio corpo do nº 4 do artigo 63.º do CIRC apresenta um conteúdo normativo válido por si mesmo, sendo o elenco subsequente meramente enunciativo, numa formulação manifestamente lata e abrangente face à ratio subjacente.

Veja-se que a própria formulação de “entidade” abrange as diversas formas jurídicas, como sejam inclusivamente os fundos de investimento, tendo em vista abranger as diversas estruturas que o comércio jurídico tem vindo a desenvolver, com uma aptidão o mais abrangente possível no plano subjetivo, em linha com o propósito de concretização do "princípio da plena concorrência"

 A utilização de estruturas heterogeridas seria, aliás, uma válvula de escape, no quadro das próprias regras de preços de transferência, pelo facto de a sua gestão ser cometida a uma entidade gestora própria, o que não se compadece com o racional subjacente ao conceito de “relações especiais” e aos objetivos prosseguidos por este regime.

Os próprios estatutos prevêem, na cláusula 14, ainda que sujeito a uma maioria qualificada e no quadro de uma assembleia de participantes, o poder dos sócios comanditários de elegerem ou removerem o General Partner, o que se compadece com o alinhamento de interesses que os participantes pretendem garantir na gestão do Fundo, exercendo também desta forma, ainda que indiretamente, uma influência na gestão do fundo.

Em matéria de gestão de ativos, no caso do ordenamento jurídico português assume-se, aliás, o dever de agir no interesse dos participantes por parte das sociedades gestoras (cfr. artigo 65.º do Regime de Gestão de Ativos, anexo ao Decreto-Lei n.º 27/2023 de 28 de abril).

Razão pela qual, estando, como está, preenchido o conceito de “relações especiais”, em concreto o disposto no artigo 64.º, n.º 4, é acionado o disposto no n.º 6 do artigo 11º do CIMT, e, por conseguinte, verifica-se a caducidade da isenção de IMT prevista no artigo 8.º do mesmo Código, pelo que será de improceder o pedido.

Relativamente ao vício de forma da decisão impugnada por falta de fundamentação, invocado pela Requerente a título subsidiário, há que dizer o seguinte:

Em termos gerais, lembremos que a exigência de fundamentação dos actos administrativos lesivos consta do art. 268º, 3 da CRP, quando estabelece que tais actos “carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”.

Concretizando o conteúdo da fundamentação no procedimento tributário, o art. 77º, 1 da LGT estabelece a regra geral de que “a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.

O STA tem vindo a entender uniformemente que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo, que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões pelas quais o autor do acto decidiu como decidiu, e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.

A suficiência da fundamentação centra-se na perceptibilidade das razões que imprimiram um determinado sentido à decisão – sendo que “perceptibilidade pelo destinatário” não é sinónimo de “concordância do destinatário”.

Lembrando ainda que, por força do disposto no n.º 2 do referido artigo 77º da LGT, “a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo

E sem esquecer que “equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato”, como estabelece o art. 153º, 2 do CPA, subsidiariamente aplicável nos termos do art. 2º, c) da LGT.

Na jurisprudência dos tribunais Administrativos, está também adquirido que “se do Relatório da fiscalização é possível conhecer o iter cognoscitivo que levou a AT à prática do acto, este está fundamentado. É nesta visão de conjunto que o impugnante encontrará a fundamentação dos actos tributários”.

Ao exercer o seu direito de audição prévia e desse modo participar na formação das decisões relevantes da Requerida, a Requerente demonstrou o conhecimento necessário da fundamentação e das suas implicações, contestando-as com o seu particular entendimento acerca do regime aplicável – não coincidente com o entendimento da Requerida, o que sempre se adivinharia, dada a existência do litígio que é objecto deste processo.

Em ponto nenhum desses argumentos, e dos argumentos expendidos no presente processo, surge a mais leve dúvida sobre o que estava – e está – em causa na liquidação, e sobre os valores que nela constam.

A Requerente demonstra familiaridade com o quadro normativo e com a factualidade que se lhe subsume: não há, portanto, liquidação nova, nem inesperada, nem infundamentada, nem qualquer decisão-surpresa.

Há sim, sabemo-lo, um conflito de interpretações quanto ao regime aplicável, em matéria de articulação e prevalência desse regime, A Requerente discorda da fundamentação apresentada pela AT, já veiculada na decisão final de revogação da isenção de IMT, e é isso que a Requerente contesta, desde que exerceu pela primeira vez o seu direito de audição prévia.

Mas contestar uma fundamentação é a prova de que essa fundamentação existe, não o contrário.

É contraditório, e não se coaduna com uma visão dialógica e co-responsabilizadora do processo, que se discuta o teor de uma fundamentação no exercício do direito de audição prévia, para mais tarde, no processo, se alegar que essa fundamentação não existe, ou não basta.

Face ao exposto, concluiu-se pela inexistência de qualquer vício por falta de fundamentação que a Requerente invoca a título subsidiário.

Nestas circunstâncias, o Tribunal pronuncia-se pela legalidade da actuação da Requerida e pela consequente improcedência do pedido arbitral, incluindo o pedido acessório formulado.

Foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, ou cuja apreciação seria inútil – art. 608º do CPC, ex vi art. 29º, 1, c) e e) do RJAT.

 

  1. DECISÃO

 

Termos em que decide este Tribunal Arbitral julgar integralmente improcedente o pedido arbitral apresentado e, em consequência:

  1. Absolver a Requerida do pedido.
  2. Condenar o Requerente nas custas do processo,

 

  1. Valor do processo

 

Fixa-se o valor do processo em 1.934.070,56 euros, nos termos do artigo 97º-A, nº 1, a), do Código de Procedimentos e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 29º do RJAT e do nº 2 do artigo 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

  1. Custas

 

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em 25.398,00 euros, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi totalmente improcedente, nos termos dos artigos 12º, nº 2, e 22º, nº 4, ambos do RJAT, e artigo 4º, nº 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 20 de Novembro de 2023

 

O Árbitro-Presidente

 

(Fernando Araújo)

 

O Árbitro-Auxiliar (Relator)

 

 

(José Nunes Barata)

 

O Árbitro-Auxiliar)

 

(João Marques Pinto)

 

 

(Esta decisão foi redigida pela ortografia antiga)