Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 753/2023-T
Data da decisão: 2024-03-12  ISV  
Valor do pedido: € 7.355,37
Tema: ISV – Artigo 11.º do Código do ISV – Conformidade com o artigo 110.º do TFUE – Veículos usados provenientes de outros Estados-Membros.
Versão em PDF

SUMÁRIO:

I. O artigo 110.º do TFUE estabelece a impossibilidade de fazer incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, directa ou indirectamente sobre produtos nacionais similares.

II. Sob a orientação da linha da jurisprudência constante do TJUE, a redacção introduzida pelo artigo 391.º, da Lei 75-B/2020, de 31 de Dezembro, ao artigo 11.º, n.º 1, do Código do ISV, por discriminar no âmbito do cálculo do imposto, a taxa de redução que é aplicável à componente ambiental, por confronto à aplicada à componente cilindrada, viola o artigo 110.º do TFUE.

III. O artigo 11.º, n.º 1, do Código do ISV, na redacção introduzida pelo artigo 391.º, da Lei n.º 75-B, de 31 de Dezembro, não está em conformidade com o direito da União Europeia, designadamente, com o disposto no artigo 110.º do TFUE (aplicável por força do artigo 8.º, n.º 4 da Constituição), porquanto o mesmo padece de ilegalidade na parte em que não considerou aplicável a mesma taxa de redução aplicada à componente cilindrada (75%), na taxa redução de ISV relativa à componente ambiental, onde aplicou apenas a taxa de 52%, em violação do disposto no artigo 110.º do TFUE.

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

I. RELATÓRIO

 

1. No dia 24-10-2023, o sujeito passivo A..., Lda., NIPC ..., com sede na ..., ..., ...-... Covilhã (doravante apenas designada por Requerente), apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), tendo em vista a anulação parcial da liquidação do Imposto sobre Veículos (ISV), relativamente à componente ambiental, no valor de € 7.355,37, cobrado em excesso, acrescido dos juros indemnizatórios.

 

2. Nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou o árbitro ora signatário, disso notificando as partes.

 

3. O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.

 

4. Os fundamentos que sustentam o pedido de pronúncia arbitral da Requerente são em súmula, os seguintes:

 

4.1. Entre 18-01-2021 e 17-12-2021, a Requerente introduziu em Portugal diversos veículos automóveis ligeiros de passageiros usados, provenientes da Alemanha, França, Bélgica e Itália, todos países da União Europeia.

 

4.2. Da regularização dos veículos em causa, a Requerente procedeu às respectivas declarações aduaneiras, das quais resultou a liquidação de ISV, no montante de € 72.381,42, o qual foi pago pela Requerente.

 

4.3. Do montante liquidado, € 38.493,28, corresponde à componente cilindrada e € 45.285,33, à componente ambiental.

 

4.4. Sendo que os valores resultaram das reduções referentes ao número de anos de uso dos veículos e as percentagens de redução relativamente à componente ambiental são inferiores às aplicadas à componente cilindrada.

 

4.5. Apesar da Requerente ter procedido ao pagamento do imposto liquidado, sem o qual não poderia legalizar os veículos para poderem circular em Portugal, entende que os actos de liquidação de ISV efectuados estão feridos de um vício de ilegalidade, no que diz respeito ao cálculo da componente ambiental ou CO2, porque a norma jurídica que esteve na base daquela liquidação – artigo 11.º do Código do ISV – viola o artigo 110.º do TFUE, conforme já foi declarado por acórdãos transitados em julgado do TJUE e por outras decisões proferidas pelo CAAD.

 

4.6. Não conformada, em 06-07-2023, a Requerente requereu junto da Alfândega de Vilar Formoso, a revisão oficiosa do ISV liquidado, a qual foi indeferida, por despacho proferido em 15-09-2023.

 

4.7. O indeferimento da revisão oficiosa baseou-se no facto de a AT entender que não assistia razão à Requerente na sua pretensão de anulação dos actos de liquidação de ISV pela regularização dos veículos em causa, invocando, em seu abono, o Acórdão do TJUE de 02-09-2021, proferido no Processo n.º C-169/20.

 

4.8. Entende a AT que no Processo n.º C-169/20 interposto no TJUE pela Comissão Europeia contra o Estado Português (assente no facto do sistema de tributação dos veículos usados violar o disposto no artigo 110.º do TFUE, uma vez não considerar qualquer desvalorização na componente ambiental) e em momento anterior à prolação do Acórdão de 02-09-2021, o legislador português através da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro [Lei do Orçamento do Estado para 2021] alterou o artigo 11.º do Código do ISV, introduzindo no n.º 1 desta disposição legal, uma tabela com percentagens de redução de imposto da componente ambiental que juntamente com a tabela da componente cilindrada estão associadas à desvalorização comercial media dois veículos no mercado nacional e à vida útil media remanescente dos veículos, respectivamente. Esta alteração legislativa foi ao encontro das pretensões manifestadas no Parecer Fundamentado que a Comissão enviou ao Estado Português, no sentido de conformar o sistema de tributação dos veículos usados em Portugal com o direito comunitário, nomeadamente em observância do princípio da não discriminação ínsito no invocado artigo 110.º do TFUE.

 

4.9. No referido Acórdão, o que estava em causa reconduzia-se à situação do Estado Português não aplicar qualquer desvalorização à componente ambiental, à semelhança do que já se encontrava previsto para a componente cilindrada. Assim, ao ser estabelecida legalmente a tabela de desvalorização relativamente ao imposto resultante da componente ambiental, ficou afastada a ilegalidade e a desconformidade da legislação nacional face ao primado do direito comunitário.

 

4.10. Sustenta, ainda, a AT que na alteração introduzida ao artigo 11.º do Código do ISV, o legislador português tomou a opção por estabelecer a previsão de percentagens de redução diferenciadas aplicáveis à componente cilindrada e à componente ambiental, incorporando no essencial as preocupações então manifestadas pela Comissão Europeia, compatibilizando a legislação nacional em matéria de tributação dos veículos usados admitidos no território nacional com o Direito Europeu, tendo presente, concomitantemente, a salvaguarda  dos objectivos de âmbito ambiental do pais e que actualmente se impõem a nível mundial.

 

4.11. A este propósito, saliente-se que no Acórdão de 02-09-2021 (proferido no Processo n.º C-169/20), o TJUE não expressou nem defendeu o entendimento que a percentagem de redução de imposto a aplicar a ambas as componentes teria de ser a mesma, mas sim que a componente ambiental deveria ser desvalorizada, tal como veio a suceder com a alteração ao n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, na redacção dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, termos em que não assiste razão à Requerente, quando refere que se mantém a violação do artigo 110.º do TFUE.

 

4.12. De salientar, que sobre esta matéria foi proferida decisão no Processo n.º 350/2021-T do CAAD, nos ter do qual o CAAD refere, de forma expressa, que acompanha a conclusão da AT, no sentido de que “na sua decisão o Tribunal de Justiça não entendeu que a percentagem de redução de imposto a aplicar às componentes cilindrada e ambiental teria de ser a mesma, mas sim que a componente ambiental deveria ser desvalorizada, como foi mediante a alteração ao n.º 1 do art.º 11.º do CISV, na nova redação dada pelo art.º 391.º da lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro”.

 

4.13. Razão pela qual conclui a AT que os actos de liquidação de ISV, tendo por base a nova redacção dada ao artigo 11.º do Código do ISV, foram efectuados em conformidade com a lei nacional em vigor e com o Direito Comunitário, cumprindo, designadamente o disposto nos artigos 110.º e 191.º do TFUE e nos artigos 66.º e 103.º da Constituição, não existindo, consequentemente, a alegada discriminação da tributação dos veículos usados nacionais relativamente ais admitidos de outros Estados-Membros e violação do artigo 110.º do TFUE.

 

4.14. Finalmente, a AT está vinculada ao princípio da legalidade e nesse sentido tem essencialmente como atribuição e dever, na sua relação com os administrados, executar a política do Governo (na parte que lhe compete) traduzida expressamente quer na Lei do Orçamento do Estado, quer nis vários diplomas legais existentes e naqueles que vão sendo aprovados e publicados, porquanto limita-se a aplicar a lei vigente, neste caso, o artigo 11.º do Código do ISV [na redacção dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro].

 

 

 

 

4.15. Tal interpretação constitui uma violação do princípio da não discriminação do Direito da União Europeia, presente no artigo 110.º do TFUE.

 

4.16. O Imposto sobre Veículos, criado em 2007, através da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, tem por incidência, entre outros factos tributários, a admissão de veículos tributáveis, por oposição aos veículos que, pelas sias características são isentos, em território nacional provenientes de outro Estado-Membro da união Europeia.

 

4.17. Incidência, que se aplica aos veículos novos e usados, sendo que no caso em apreço, apenas está em apreciação a admissão de um veículo usado.

 

4.18. O cálculo do ISV incide sobre a cilindrada do veículo e a sua emissão de CO2, ou seja, a componente cilindrada e a componente ambiental.

 

4.19. De acordo com a versão inicial do artigo 11.º do Código do ISV, no caso da admissão de veículos usados, aplicava-se no caso do imposto uma percentagem de redução, conforme o número de anos do veículo.

 

4.20. Redução essa equiparável à desvalorização comercial média dos veículos usados comercializados no mercado nacional.

 

4.21. Essa desvalorização era crescente, tem do o seu início após o primeiro ano de uso e o seu termo no final do quinto ano de uso.

 

4.22. Sendo que, após o quinto ano, a percentagem de redução se mantinha inalterada.

 

4.23. Ou seja, considerou o legislador nacional, à data da criação do ISV, que os veículos usados admitidos em Portugal, provenientes de outros Estados-Membros, apenas se desvalorizavam, relativamente aos veículos novos, após um ano de uso e que a partir do quinto ano não sofriam mais nenhuma desvalorização. Veja-se o teor da Tabela D do artigo 11.º do Código do ISV, na sua redacção inicial que previa para os veículos com 1 a 2 anos, uma desvalorização de 20%, mais de 2 a 3 anos, 28%; mais de 3 a 4 anos, 35%; mais de 4 a 5 anos, 43% e mais de 5 anos, 53%.

 

4.24. Desde a entrada em vigor deste artigo 11.º e da tabela anexa, que os importadores de automóveis usados admitidos em Portugal originários de outro Estado-Membro, reclamaram junto das entidades competentes o facto desta Tabela de reduções discriminar negativamente os veículos admitidos em Portugal, relativamente aos veículos usados comercializados neste país.

 

4.25. Com efeito, é sabido que qualquer veículo novo, independentemente das suas características, designadamente, marca, modelo ou cilindrada, se desvaloriza logo que é posto em circulação.

 

4.26. Pelo que, considerar-se que um veículo proveniente de um Estado-Membro só sofria uma desvalorização ao fim de um ano de uso, não respeitava a realidade do mercado automóvel e penalizava injustificadamente os veículos usados importados.

 

4.27. O mesmo se diga relativamente aos veículos com mais de 5 anos de uso, pois é sabido que um veículo com mais de 5 anos continua a desvalorizar-se nos anos seguintes.

 

4.28. Sendo que a desvalorização de um veículo com 6, 7 ou 10 anos de uso, é necessariamente superior à de um veículo com 5 anos.

 

4.29. Acresce que, na redacção inicial do artigo 11.º do Código do ISV, esta redução apenas se aplicava à componente cilindrada dos veículos e não à componente ambiental (CO2), provocando, também por este motivo, um critério desigual no cálculo do ISV relativamente a veículos usados matriculados em Portugal e aos veículos admitidos em Portugal, matriculados noutros Estados-Membros.

 

4.30. Já que, relativamente aos veículos originariamente matriculados em Portugal, a desvalorização incidia sobre ambas as componentes.

 

4.31. Perante esta opção do legislador, os importadores desses veículos, à data representados pela Associação Portuguesa de Importação de Veículos reagiram junto de várias instâncias publicas, designadamente, a Provedoria de Justiça e a Comissão Europeia.

 

4.32. No sentido de serem eliminados os tratamentos desiguais e discriminatórios dados aos veículos usados admitidos em Portugal, relativamente aos veículos usados matriculados e comercializados em Portugal.

 

4.33. E que determinava que um veículo usado proveniente de outro Estado-Membro pagasse mais ISV, relativamente aos veículos idênticos matriculados em Portugal.

 

4.34. O que se traduzia numa violação clara do disposto no artigo 110.º do TFUE.

 

4.35. Fruto destas reclamações, a Comissão Europeia instaurou o processo por infracção 2009/2296 contra a República Portuguesa, com base no facto de não ser tida em conta a depreciação dos veículos para efeitos do cálculo da componente ambiental do ISV.

 

4.36. Processo que foi encerrado após uma alteração ao Código do ISV pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011, que passou a aplicar as percentagens de redução inerentes ao aos anos de uso do veículo, também à componente ambiental.

 

4.37. Reproduz-se parte da informação prestada pela Provedoria de Justiça relativamente a esta alteração legislativa: “Na verdade, de acordo com as alterações que foram introduzidas pela Lei n.º 55-A/2010, de 31-12, que aprovou o Orçamento do Estado para 2011, ao Código do ISV, há a salientar uma alteração na metodologia de cálculo do ISV, em matéria de tributação de veículos usados portadores de outras de matriculas definitivas comunitárias, atribuídas por outros Estados-Membros da União Europeia, prevista no art. 11.º do Código do ISV, passando a aplicar-se a percentagens de redução inerentes aos anos de uso do veiculo, também à componente ambiental”.

 

4.38. Isto é, o legislador português, antecipando a decisão que iria a ser tomada pelo TJUE na acção de incumprimento pendente, introduziu a necessária alteração legislativa, pondo assim termo à ilegalidade que tinha estado na origem do referido processo por infracção.

 

4.39. E assim, com esta alteração legislativa, ficou resolvida uma parte da ilegalidade, não ficando, contudo, sanada a ilegalidade que dizia respeito à desvalorização dos veículos até ao final do 1.º ano de uso e após os 5 anos de uso.

 

4.40. Face à manutenção desta divergência entre os cálculos de ISV dos veículos usados matriculados em Portugal e os veículos usados provenientes de outros Estados-Membros, e consequente tratamento desigual destes últimos, a Comissão Europeia instaurou um novo processo que revestiu a natureza de acção por incumprimento contra a República Portuguesa, que correu termos com o Processo n.º C-200/15.

 

4.41. Tendo sido proferido o respectivo Acórdão em 16-06-2016, tendo o Tribunal de Justiça decidido o seguinte: “A República Portuguesa, ao aplicar, para efeitos da determinação do valor tributável dos veículos usados provenientes de outro Estado-Membro, introduzidos no território de Portugal, um sistema relativo ao cálculo da desvalorização dos veículos que não tem em conta uma desvalorização antes de estes atingirem um ano, nem a desvalorização que seja superior a 52% no caso de veículos com mais de cinco anos, não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do art. 11.º do TFUE”.

 

4.42. Na sequência deste Acórdão que declarou o incumprimento pela República Portuguesa do artigo 110.º do TFUE, o legislador nacional introduziu uma nova alteração ao Código do ISV, através da Lei n.º 42/2006, de 27 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2017).

 

4.43. Alteração concretizada através de uma nova redacção do artigo 11.º do Código do ISV e da Tabela D que integra o mesmo artigo.

 

4.44. Analisada essa tabela, conclui-se que o Estado Português respeitou o decidido pelo Tribunal Europeu naquele referido Acórdão, ao alargar as percentagens de redução ao primeiro ano de uso do veículo, prolongando-se até aos 10 e mais anos de uso.

 

4.45. Todavia, a par desta alteração, foi introduzida uma outra, bem mais gravosa para o cálculo do ISV.

 

4.46. Com efeito, o legislador com a nova redacção dada ao artigo 11.º, voltou a limitar a aplicação das percentagens de redução apenas à componente cilindrada, excluindo-a da componente ambiental (emissão de CO2).

 

4.47. Refere o n.º 1 daquela disposição legal, que o ISV é objecto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, com excepção da componente cilindrada, à qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na Tabela D.

 

4.48. Ou seja, com esta alteração o legislador retrocedeu ao ano de 2010 e voltou a pôr em vigor uma norma jurídica, que tinha sido já objecto de um processo instaurado pela Comissão Europeia e que esteve na base da alteração legislativa operada com a Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.

 

4.49. Limitando a tabela de redução para cálculo do ISV à componente cilindrada e excluindo-a da componente ambiental (emissão de CO2).

 

4.50. O legislador português, aproveitando o facto do Acórdão do Tribunal de Justiça apenas se ter debruçado sobre os anos que deveriam ser abrangidos pela redução do imposto, voltou a excluir a redução da componente ambiental que tinha sido já objecto de alteração legislativa anterior imposta ou recomendada pela Comissão Europeia.

4.51. Esta alteração legislativa provocou uma nova reacção da Comissão Europeia, que interpôs em Abril de 2020 uma nova acção por incumprimento contra a República Portuguesa, que deu lugar ao Processo n.º C-169/20.

 

4.52. Tendo sido proferido, em 02-09-2021 o respectivo Acórdão do TJUE, que reconheceu que este Estado-Membro “Ao não desvalorizar a componente ambiental no calculo do valor aplicável aos veículos usados postos em circulação no território português e adquiridos noutro Estado-Membro, no âmbito do cálculo do imposto sobre veículos previsto no Código do Imposto sobre Veículos, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 71/2018, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.º TFUE”.

 

4.53. Na pendência deste processo, mas antes de ser proferido o referido Acórdão, o legislador português, através da lei do Orçamento do Estado para 2021 – Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro – aprovou uma nova alteração ao artigo 11.º do Código do ISV, mediante a qual foi introduzida uma tabela de desvalorização da componente ambiental em função do número de anos de uso do veículo, com indicação das respectivas percentagens.

 

4.54. No entanto, as percentagens aplicadas à componente ambiental são inferiores às que são aplicadas à componente cilindrada, mantendo assim um tratamento desigual entre estas duas componentes do imposto.

 

4.55. A AT não pode cobrar um imposto sobre os veículos usados importados, calculado com base num valor superior ao valor real do veículo.

 

4.56. E tendo por base uma tributação mais onerosa destes veículos, relativamente à dos veículos usados similares disponíveis no mercado nacional.

 

4.57. O valor do veículo usado importado utilizado pela AT como base de tributação, deve reflectir fielmente o valor de um veículo similar já registado no território nacional.

 

4.58. O montante do imposto calculado sem tomar em consideração a depreciação real do veículo, excede o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados em território nacional.

 

4.59. Os fundamentos invocados quer no Acórdão do TJUE e na demais jurisprudência europeia, quer na jurisprudência do CAAD, aplicam-se integralmente à liquidação impugnada no caso em apreço, apesar da alteração entretanto efectuada ao n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV.

 

4.60. Foram já proferidas várias decisões arbitrais pelo CAAD, sobre a mesma matéria em apreciação que, a título exemplificativo, se indicam: Processo n.º 607/2021-T, Processo n.º 527/2022-T, Processo n.º 388/2022-T, Processo n.º 468/2022-T, Processo n.º 372/2021-T, já transitada em julgado, Processo n.º 343/2022-T, Processo n.º 384/202-T e Processo n.º 352/2022-T.

 

4.61. Entendimento que foi confirmado pelos pareceres proferidos nos autos de recurso para uniformização de jurisprudência que correm termos no STA, Secção do Contencioso Tributário do Plano, com o n.º 84/22.0BALSB, n.º 25/23.8BALSB e n.º 76/23.2BALSB.

 

4.62. Foram também proferidas duas decisões que julgaram improcedentes as impugnações, decisões essas proferidas pelo mesmo Árbitro (Processo n.º 349/2022-T e Processo n.º 571/2022-T).

 

4.63. A AT quando procedeu à liquidação do ISV em causa, não levou em consideração a totalidade do número de anos de uso dos veículos na sua componente ambiental, ao não aplicar a mesma percentagem de desvalorização que aplicou à componente cilindrada.

 

4.64. Tendo-o feito com o recurso a uma norma jurídica que viola o Direito Europeu – o artigo 110.º do TFUE – que, como tal, está ferida de ilegalidade.

 

4.65. Todavia, se subsistirem dúvidas sobre a interpretação e aplicação do disposto no artigo 110.º do TFUE, deve o Tribunal Arbitral proceder ao reenvio prejudicial desta questão ao Tribunal de Justiça para a interpretação da mesma à luz do Tratado.

 

4.66. Questão que deve ser formulada de forma ao Tribunal de Justiça esclarecer se a norma constante do actual n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, viola, ou não, o disposto no referido artigo do Tratado, porquanto discrimina negativamente os veículos usados admitidos no espaço português, proveniente de um outro Estado-Membro, relativamente aos que são matriculados e comercializados em Portugal.

 

4.67. Verificados os cálculos do ISV, entende a Requerente que, relativamente à componente ambiental, o ISV foi liquidado por mais € 7.355,37.

 

4.68. Excesso que resulta da aplicação da percentagem de redução inferiores às que deviam ter sido aplicadas, ou seja, as mesmas que foram aplicadas na componente cilindrada.

 

4.69. A liquidação do ISV deve ser corrigida, reduzindo-se o valor do ISV a pagar para o valor de € 65.026,05.

 

4.70. Devendo ser restituído à Requerente o montante de € 7.355,37 pago a mais.

 

4.71. Acrescido dos juros indemnizatórios devidos nos termos do artigo 43.º da LGT, à taxa legal de 4%, desde a data do pagamento do imposto até à efectiva restituição.

 

5. Por seu turno, a AT apresentou resposta, na qual se defendeu, em súmula, nos seguintes termos:

 

5.1. Defende a Requerente que a liquidação de ISV é ilegal por entender que, embora com a nova redação dada ao n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV o Estado Português tenha reconhecido a aplicação de uma desvalorização pelo número de anos de uso dos veículos usados introduzidos em Portugal, oriundos de outros Estados-Membros, no que diz respeito à componente ambiental do ISV afirma que as percentagens de redução devem ser iguais para as duas componentes, cilindrada e ambiental.

 

5.2. Considerando, pois, que a tabela criada para a componente ambiental do imposto, por prever uma desvalorização inferior à aplicada à componente cilindrada, não impede que a discriminação negativa daqueles veículos se mantenha, entendendo que a violação do artigo 110.º do TFUE se mantém.

 

5.3. Decorrendo dos elementos constantes do processo que, nos presentes autos de impugnação arbitral, está em causa a legalidade dos actos de liquidação de ISV efectuados de acordo com a Tabela D anexa ao artigo 11.º do Código do ISV, na redacção dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro.

 

5.4. Questionando-se, pois, no pedido de constituição de Tribunal Arbitral a alteração da redacção efectuada ao artigo 11.º do Código do ISV pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro.

 

5.5. Importando, desde já, referir que os actos de liquidação foram praticados tendo em consideração as normas estabelecidas no Código do ISV, aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho, não podendo a AT deixar de aplicar normas com base num “julgamento” de alegada desconformidade com o Direito Comunitário.

 

5.6. De facto, o princípio constitucional da legalidade, que entre nós vigora, exige que os impostos e os seus elementos essenciais (incidência, taxa, benefícios fiscais e garantia dos contribuintes) sejam obrigatoriamente criados por lei, em conformidade com o n.º 2 do artigo 103.º da Constituição.

 

5.7. Por outro lado, por força do disposto no n.º 2 do artigo 266.º da Constituição, a actuação da AT encontra-se sujeita ao princípio da legalidade tributária, prevista no artigo 8.º da LGT, o que determina a sua vinculação à lei, pelo que a AT não pode contrariar ou desobedecer às normas legais pré-existentes, devendo este princípio ser entendido em sentido proibitivo ou negativo, pois são vedadas as actuações administrativas que contrariem a lei.

 

5.8. De facto, nos termos do artigo 8.º da LGT, estão sujeitos ao princípio da legalidade tributária a incidência, a taxa, os benefícios fiscais, as garantias dos contribuintes, a definição dos crimes fiscais e o regime geral das contraordenações fiscais, pelo que a AT não pode, sob pena de cometer uma ilegalidade, deixar de aplicar as taxas que se encontram em vigor à data da introdução do veículo no consumo.

 

5.9. Sendo, ademais, de realçar que o ISV é um imposto interno de consumo, não harmonizado comunitariamente, pelo que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar, salvo autorização ao Governo, sobre inúmeras matérias, as quais se encontram expressamente previstas no artigo 165.º da Constituição, nomeadamente, a criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas.

 

5.10. Ora, constando do Código do ISV a disciplina legal do ISV, que também determina a incidência e taxas deste imposto, e considerando que os actos tributários visados foram praticados ao abrigo do artigo 11.º daquele Código, a AT não pode contrariar ou desobedecer às disposições legais nele ínsitas.

 

5.11. Assim, os actos de liquidação em causa não podem ser considerados ilegais, desde logo, porque os mesmos foram efectuados de acordo com a disciplina legal aplicável, encontrando-se em total consonância com as normas legais aplicáveis à factualidade que lhes está subjacente.

 

5.12. Por outro lado, acresce referir que, não tendo sido proferida qualquer decisão que declare com força obrigatória geral o vício de violação de lei comunitária, relativamente à nova redacção do mencionado artigo 11.º, a AT, uma vez vinculada ao princípio da legalidade, terá de proceder à tributação dos veículos usados de acordo com a legislação atualmente em vigor, que se encontra vertida no Código do ISV.

5.13. Não assistindo, deste modo, razão à Requerente, porquanto se conclui que não foi proferida qualquer decisão que declare com força obrigatória geral, o vício de violação de lei comunitária, relativamente ao artigo 11.º do Código do ISV, na nova redacção dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro.

 

5.14. Não obstante, mais se dirá que,

 

5.15. No que concerne à alteração legislativa em questão, efectuada ao n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, e, em concreto à tabela D, refira-se que o legislador nacional optou por aplicar percentagens de redução de ISV diferenciadas à componente cilindrada e à componente ambiental, na admissão de veículos usados provenientes de outros Estados-Membros da UE, porque entendeu, conforme se extrai da Proposta de Lei do Orçamento de Estado para 2021, que:

«(...) se procurou salvaguardar os ambiciosos objetivos ambientais do País e a incorporar o essencial das preocupações levantadas pela Comissão Europeia em matéria de compatibilidade com o direito europeu, prevê-se, à semelhança do que já sucede com a componente cilindrada do ISV, que os veículos usados provenientes de Estados–membros da União Europeia passem a beneficiar de um desconto sobre a componente ambiental do ISV, o qual, ao contrário do que sucede com a componente cilindrada, não estará associado à desvalorização comercial dos veículos, mas antes à sua vida útil média remanescente (medida pela idade média dos veículos enviados para abate), por se entender que a mesma é uma boa métrica do horizonte temporal de poluição do veículo, assegurando-se, deste modo, que os carros poluentes serão justamente tributados à entrada em Portugal.».

 

5.16. De facto, em momento anterior à prolação do Acórdão de 02-09-2021, no âmbito do Processo n.º C-169/20, do TJUE, interposto pela Comissão Europeia contra o Estado Português (assente no facto do sistema de tributação dos veículos usados violar o disposto no artigo 110.º do TFUE, uma vez que não considerava qualquer desvalorização na componente ambiental) o legislador português através da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro (OE/2021) alterou o artigo 11.º do Código do ISV, introduzindo no seu n.º 1, uma Tabela com percentagens de redução de imposto da componente ambiental que, juntamente com a tabela da componente cilindrada, estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos, cumprindo assim, as exigências manifestadas no Parecer Fundamentado que a Comissão enviou ao Estado Português, no sentido de conformar o sistema de tributação dos veículos usados em Portugal com o direito comunitário.

 

5.17. Sendo que, o que estava em causa no referido contencioso comunitário, reconduzia-se à situação do Estado Português não aplicar qualquer desvalorização à componente ambiental à semelhança do que já se encontrava previsto para a componente cilindrada.

 

5.18. Assim, ao ser estabelecida legalmente a tabela de desvalorização relativamente ao imposto resultante da componente ambiental, ficou afastada a ilegalidade e a desconformidade da legislação nacional face ao primado do Direito Comunitário.

 

5.19. Tendo o Acórdão do TJUE, proferido no Processo C-169/20, versando sobre o artigo 11.º do Código do ISV, na redacção anterior à atualmente vigente, decidido, em concreto, que:

“ao não desvalorizar a componente ambiental no cálculo do valor aplicável aos veículos usados postos em circulação no território português e adquiridos noutro Estado-membro, no âmbito do cálculo do imposto sobre veículos previsto no Código do Imposto sobre Veículos, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 71/20218, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110º TFUE.”.

 

5.20. Ora, na sua decisão, o TJUE não entendeu que a percentagem de redução de imposto a aplicar às componentes cilindrada e ambiental teria de ser a mesma, mas sim que a componente ambiental deveria ser desvalorizada, como já o foi mediante a alteração ao n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, na nova redacção dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro.

 

5.21. A fixação das taxas obedece aos objetivos de política fiscal e ambiental, entre outros, prosseguidos pelo Governo, desconhecendo-se a existência de qualquer Acórdão do TJUE que vede, aos Estados-Membros, a possibilidade de fixação de reduções diferenciadas para as duas componentes do ISV (componente cilindrada e componente ambiental).

 

5.22. Dessa forma, a nova redacção do n.º 1 do artigo 11.º, do Código do ISV, dada pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, já incorpora as preocupações levantadas pela Comissão Europeia em matéria de compatibilidade com o direito europeu, refletindo a doutrina que resulta do Acórdão do TJUE prolatado no Processo n.º C-169/20, porquanto já prevê na Tabela D, à semelhança do que já sucedia com a componente cilindrada do ISV, que os veículos usados provenientes de Estados–Membros da União Europeia beneficiem de um desconto/redução sobre a componente ambiental do ISV.

 

5.23. Concluindo-se, assim, que os actos de liquidação de ISV, aplicando o artigo 11.º do Código do ISV, foram efectuadas em conformidade com a lei nacional em vigor e com o Direito Comunitário, cumprindo, designadamente, o disposto nos artigos 110.º e 191.º do TFUE e nos artigos 66.º e 103.º da Constituição, não existindo, conforme o exposto, a invocada discriminação da tributação dos veículos usados nacionais relativamente aos admitidos de outros Estados-Membros, não se verificando, consequentemente, a alegada violação do artigo 110.º do TFUE.

 

5.24. Não podendo, por conseguinte, sequer, ser imputado aos actos de liquidação, ora impugnados, qualquer vício de violação do direito da União Europeia, mormente do artigo 110.º do TFUE, por não ter sido aplicada a mesma redução de anos de uso à componente ambiental, atendendo a que, além de a nova / actual redacção do n.º 1 do artigo 11.º consagrar na Tabela D percentagens de redução para a componente ambiental, tal entendimento não resulta, igualmente, da recente jurisprudência do TJUE, vertida no Acórdão do Processo n.º C-169/20.

 

5.25. Quanto à questão da conformidade da redação actual do artigo 11.º do Código do ISV com o Direito Comunitário o Tribunal Arbitral já se pronunciou nesse sentido, conforme, designadamente, decisões proferidas no Processo n.º 350/2021-T (parte IV-B, relativa a actos de liquidação de 2021) e no Processo n.º 349/ 2022-T, transitadas em julgado.

 

5.26. Tendo igualmente o Tribunal Arbitral emitido pronúncia, quanto a actos de liquidação efectuados por aplicação da redacção actual do n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, conforme se retira do seguinte segmento, extraído da decisão, já transitada, proferida no Processo n.º 209/2021-T em 10-12-2021:

“30. Com o OE para 2021 (Lei n.º 75-B/2020, de 31/12), e ao contrário do que sucedia antes, passou a haver uma redução do ISV na componente ambiental.

31. Na nota justificativa que acompanhou a proposta do PS (Partido Socialista) no sentido da alteração da fórmula de cálculo do ISV nos veículos usados importados de outro país da UE (proposta que viria a ser aprovada durante a votação na especialidade do OE para 2021), afirma-se o seguinte: “mantendo inalterada a lógica subjacente à tabela de taxas de desconto para a componente ambiental do ISV proposta pelo Governo, propõe-se uma redução do seu número de escalões e, consequentemente, reajustamento das suas taxas, por forma a que a tabela possa ser mais facilmente articulada com a tabela de descontos aplicável à componente cilindrada do ISV, já que, deste modo, ambas as tabelas passam a ter o mesmo número de escalões e as mesmas taxas, ainda que por referência a anos de uso diferentes” (sublinhado nosso).

32. Não se vislumbra, contudo, ilegalidade na referida diferença (decorrente do facto de as percentagens de redução estarem associadas, nas componentes cilindrada e ambiental, à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos, respectivamente). Com efeito, e como bem se assinala na Decisão Arbitral de 8/6/2021, proferida no Processo n.º 523/2020- T: “o primado do direito da União Europeia é absoluto e impõe-se à própria Constituição. Assim, a legalidade da liquidação em crise deve aferir-se, em última instância, pela sua conformidade com o direito da União Europeia que compete aos Estados membros, designadamente através dos tribunais, aplicar e fazer respeitar. Facto que o legislador português também já reconheceu ao alterar, através da Lei n.º 75- B/2020, de 31/12, a redacção do artigo 11.º do CISV por forma a que a mesma ficasse em conformidade com o direito da União Europeia.” (sublinhado nosso.)

33. Usando, aqui, uma terminologia próxima da que foi adoptada pela Comissão Europeia na acção por incumprimento contra o Estado Português, interposta a 23/4/2020 no TJUE, ainda que com base numa redacção anterior deste art. 11.º do CISV (que desconsiderava totalmente a redução na vertente relativa à componente ambiental do ISV): se “a tabela de desvalorização adoptada pela legislação nacional [...] conduz[ir] [agora, com a nova redacção, e ao contrário do que sucedia com a anterior,] a uma aproximação razoável do valor real do veículo usado importado” (sublinhado nosso), então também já não será evidente que “o montante pago para registar um veículo usado importado excede o montante relativo a um veículo usado similar já registado em Portugal” e, consequentemente, também já não se concluirá, em face da actual redacção do referido artigo 11.º do CISV, existir uma violação do artigo 110.º do TFUE e da jurisprudência do supra referido Tribunal de Justiça.

34. Por outro lado, e como alegou a Requerida, o Requerente também não apresentou nestes autos jurisprudência do TJUE que, atendendo ao disposto no artigo 110.º do TFUE, “vede, aos Estados Membros, a possibilidade de fixação de reduções diferenciadas para as duas componentes do ISV (componente cilindrada e componente ambiental).”

35. Acresce, ainda, que, como se referiu na factualidade não provada (vd. supra, ponto III.2), o Requerente não comprovou, nos presentes autos, a alegação, que fundamenta o seu pedido subsidiário, de que (vd. §§ 51 e 56 da p.i. e, genericamente, §§ 51 a 59) “o montante do imposto [aplicado à luz da ‘tabela de desvalorização pelo número de anos de uso, aplicável à componente ambiental do ISV’, com a ‘aprovação e publicação da Lei do Orçamento para 2021’], [teria sido] calculado sem tomar em consideração a depreciação real do veículo, [e] excede[ria] o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados em território nacional.” Acresce que o Requerente remete (vd. § 62 da p.i.) a sustentação da alegação supra citada, que seria violadora do disposto no artigo 110.º do TFUE, para um processo (C-169/20) que não incidiu sobre a nova redacção do artigo 11.º do CISV (como refere, expressamente, o TJUE, no referido Acórdão do processo C-169/20, de 2/9/2021, em resposta à “afirmação da República Portuguesa, avançada na tréplica, de que está em discussão na Assembleia da República portuguesa uma nova redação para o artigo 11.º do Código do Imposto sobre Veículos”, [tal] “argumento é irrelevante, na medida em que a existência de um incumprimento deve, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, ser apreciada em função da situação do Estado-Membro tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, de modo que as alterações posteriormente ocorridas não podem ser tomadas em consideração pelo Tribunal de Justiça”); e o mesmo se pode dizer das invocadas “inúmeras decisões arbitrais” (vd. §§ 63 e 64 da p.i.), também elas proferidas no contexto de redacção anterior do referido artigo do CISV.”.

 

5.27. Analisando em detalhe a mesma questão de direito, a decisão arbitral de 25-10-2022, prolatada no Processo n.º 349/2022-T, viria a pronunciar-se nos termos que da mesma se extraem:

(...) “19.4 Para dar resposta às exigências do direito comunitário em matéria de veículos usados admitidos de outro Estado Membro, o legislador estabelece o tempo de uso como fator de depreciação dos veículos, quer para a componente cilindrada, quer para a componente ambiental, representada pelas emissões de CO2.

A cilindrada foi sempre vista como um critério para referenciar o valor dos veículos, sendo considerado que um veículo tem um maior valor consoante tenha uma maior cilindrada, havendo, deste modo, aproximações ao valor real dos veículos.

(...)Tendencialmente um veículo consoante os anos de uso vai-se depreciando naturalmente, pelo que o critério de dez anos que o legislador estabelece para a depreciação em função da componente cilindrada, nalguns casos, não é suficiente para acompanhar a desvalorização do veículo, bastando pensar que a idade média do parque automóvel nacional tem sido sempre superior aos referidos dez anos. Ainda assim, tem sido uma base razoavelmente aceite pela Comissão, enquanto guardiã dos Tratados, e pelos importadores de veículos que, para a contestarem judicialmente, não deixam de ponderar os respetivos custos face aos benefícios que podem conseguir.

O facto de esta tendência ter sido alterada nos anos de 2021 e 2022 por efeitos da crise dos semicondutores, que implicou que a redução do fabrico de automóveis novos em razão da falta de ships, componentes eletrónicos atualmente quase imprescindíveis no fabrico de automóveis, tanto convencionais como elétricos, tenha catapultado a cotação do mercado dos veículos usados para níveis de apreciação em função dos anos de uso em vez de depreciação, tem de se considerar necessariamente passageira e como tal não é suficiente para por em causa os alicerces em que se tem fundado a sua aplicação.

(...)

19.7 Atualmente, pela Lei n.º 75-B/2020, são tidos em conta o valor comercial do veículo, o preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, o custo do impacte ambiental, o n.º de dias de uso da viatura e a média do n.º de dias de tempo de uso dos veículos contados desde a data da primeira matrícula até à data do cancelamento da matrícula dos veículos em fim de vida abatidos nos três anos civis anteriores à data de apresentação da DAV.”

(...).

“21.1 O sentido jurisprudencial começou a definir-se com um acórdão de 11.12.90, (Comissão/Dinamarca) e teve desenvolvimentos com os Acórdãos do TJCE, de 09.03.95, no Processo n.º C-345/93, em que foi impugnante Nunes Tadeu, de 23.10.97, que opôs a Comissão contra a Grécia, mas foi visando diretamente a legislação portuguesa, que o acórdão do TJCE, de 22.02.01, em que foi impugnante Gomes Valente, trouxe uma maior clarificação.

Ao apreciar a necessidade de se proceder a urna avaliação individual de cada veículo importado, o TJUE pronunciou-se no sentido de que não era inevitável proceder-se a essa avaliação, podendo os Estados membros, para evitar os encargos resultantes de um processo assim burocratizado, fixar, através de tabelas forfetárias determinadas por urna disposição legislativa, regulamentar ou administrativa e calculadas na base de critérios tais como a antiguidade, a quilometragem, o estado geral, o modo de propulsão, a marca ou o modelo de veículo, um valor para os veículos usados, que, em geral seria muito próximo do real. Na elaboração destas tabelas, as autoridades de um EM poderiam reportar-se a um ficheiro de preços médios dos veículos usados no mercado nacional ou a uma lista de preços correntes médios utilizados como referência no sector.

Embora tenha sido referido que a aplicação de uma tabela de taxas para os veículos usados fundada num critério de depreciação único não seria contrário ao artigo 95.º, foi sublinhado que era importante que fossem tomados em conta outros fatores de depreciação que não apenas a antiguidade, de forma a garantir que a tabela forfetária refletisse de modo mais preciso a depreciação real dos veículos e permitisse alcançar de uma forma mais fácil o objetivo da tributação dos veículos usados, em termos de queem nenhum caso pudessem ser superiores ao montante da taxa residual incorporada no valor dos veículos usados já matriculados em território nacional. Esta jurisprudência viria a ser reforçada com o acórdão do TJCE, de 19.09.2002, Processo no 101/00, envolvendo o Governo Finlandês e Antti Sillin.

21.2 No acórdão de 05.10.2006, processo C-290/05, o TJE apreciou a legalidade da tributação do sistema húngaro, tendo-se debruçado pela primeira vez sobre a questão ambiental face aos impostos automóveis. No referido processo, foi proferido acórdão em que se diz textualmente que «não obstante o caráter ambiental do objetivo e do fundamento do imposto automóvel e mesmo não tendo estes qualquer relação com o valor de mercado do veículo, o artigo 90°, primeiro paragrafo CE, exige que seja tida em conta a depreciação dos veículos usados que são objeto de tributação, visto que esses impostos se caracterizam por ser apenas cobrados uma vez aquando do primeiro registo do veículo para efeitos da sua utilização no EM em causa e por ser desta forma incorporado no referido valor».

Mais considerou que os EM têm liberdade para selecionar os critérios a utilizar no cálculo do imposto e estabelecer um sistema de tributação diferenciado para certos produtos, ainda que similares na aceção do artigo 110°., primeiro parágrafo, em função de critérios objetivos como sejam a natureza das matérias-primas utilizadas ou os processos de produção aplicados.

(...)”

22.2 O n.º 3 do artigo 11.º do CISV prevê que sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto excede o imposto calculado por aplicação de uma determinada fórmula pode requerer ao diretor da alfandega, mediante o pagamento prévio de uma taxa a aplicação dessa fórmula à tributação do veículo tendo em vista a liquidação definitiva do imposto, ou seja há uma alternativa para a tributação que resulta simplesmente da aplicação dos anos de uso, ainda que diferenciados em termos de componentes, possibilidade que o Requerente não requereu, não significando com isso que se tenha conformado com a liquidação, pois a referida alternativa não se circunscreve a uma ponderação de valor do veículo mas é afetada pela introdução de uma ponderação de um critério em que a própria tabela de reduções em razão da componente ambiental é considerada, o chamado «custo de impacte ambiental», além dos critérios de dias de tempo de uso e de um fator UR, que corresponde à média do número de dias de tempo de uso dos veículos contados desde a data da primeira matrícula até à data do cancelamento da matrícula dos veículos em fim de vida abatidos nos três anos civis anteriores à data de apresentação da DAV.

22.3. Este Tribunal Arbitral entende que o n.º 1 do artigo 11.º do CISV, não obstante o n.º 3 do artigo 11.º do CISV criar uma alternativa à liquidação tabelar do imposto, é, por si só, recorrível, uma vez que no n.º 3 o legislador refere «pode requerer», ou seja concede-lhe essa faculdade, que o sujeito passivo pode utilizar ou não, mas esse facto não o dispensa de efetuar a respetiva prova.

Por mais evidente que possa parecer, essa prova terá de passar necessariamente, pelo menos, pela indicação do valor comercial do veículo, tomando por base o valor médio de referência determinado em função da marca, modelo e respetivo equipamento de série, idade, modo de propulsão e quilometragem média de referência, constante das publicações especializadas do setor e pelo preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, (com o imposto já incorporado), considerando-se como tal o veículo da mesma marca, modelo e sistema de propulsão, ou, no caso de este não constar de informação disponível, de veículo similar, introduzido no mercado nacional, no mesmo ano em que o veículo a introduzir no consumo foi matriculado pela primeira vez, promovendo o apuramento da depreciação havida no referido período de tempo.

(...)

O Tribunal Arbitral considera que o Requerente não provou que o seu veículo, ao ser tributado com uma redução de 60% do ISV, em sede de componente ambiental, tenha sido objeto de uma tributação desconforme com o direito comunitário, ou seja, ainda que se admitisse que os anos de uso, enquanto referência da desvalorização do veículo, devessem ser idênticos nas duas componentes, essa redução da componente ambiental, transposta para a componente cilindrada, como se pretende ter como paradigma, não iria além dos 20%, correspondentes a mais de um a dois anos de uso.

(...)

As particulares circunstâncias do mercado levam a crer que o valor de um veículo usado similar matriculado há alguns anos em Portugal inclui um ISV residual percentualmente superior ao que, por força das tabelas, é incorporado atualmente na introdução de um veículo usado admitido, pois a redução da oferta de veículos novos não gerou um aumento do preço de venda ao público tão significativo como o que resultou da diminuição da oferta de veículos usados, alterando os pressupostos em que tinham sido concebidas as tabelas de redução por via da maior longevidade dos veículos a circular no parque nacional, o que não significa que, pelo facto do regime jurídico não ter acompanhado essa inversão valorativa, tenha perdido legalidade.

 

5.28. Ora, na senda do pugnado na decisão do Processo n.º 349/2022-T, tendo a Requerente alegado que o montante de imposto, calculado sem tomar em consideração a depreciação real do veículo, excede o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis já matriculados no território nacional, importaria comprovar tal asserção, demonstrando em que medida, apesar de terem sido aplicadas as reduções de 60%, em função dos anos de uso, de acordo com a tabela em vigor, ainda assim, no caso concreto, o montante de imposto excede o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis já matriculados no território nacional.

 

5.29. Importando, clarificar que, sendo feita referência no PPA às decisões proferidas nos Processos n.º 372/2021-T e n.º 607/2021-T, tais decisões ainda não transitaram em julgado.

 

5.30. Assim, não se verificando no caso em apreço um excesso no imposto residual, podendo, eventualmente, até, em função das circunstâncias do mercado e características dos veículos, face à actual Tabela D, que integra a redação em vigor do artigo 11.º, n.º 1 do Código do ISV, existir situação que configure um benefício em face dos veículos do mesmo tipo (similares) introduzidos como novos na data em que foi atribuída a primeira matrícula no Estado-Membro de origem / proveniência.

 

5.31. Acrescente-se que a Requerente, discordando do montante apurado através da liquidação provisória prevista no n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, nem sequer recorreu ao método de avaliação previsto no n.º 3 do mesmo artigo, de acordo com o qual, o cálculo do imposto, a pedido do sujeito passivo, é efectuado (liquidação definitiva) através da fórmula de cálculo nele indicada.

5.32. Destarte se pugnando, atento o exposto, pela desnecessidade de submeter questão a título prejudicial, junto do TJUE porquanto, como se afirmou, se conhece a existência de processo em que foi formulado pedido de reenvio prejudicial para efeitos de apreciação da conformidade da nova redacção do artigo 11.º do Código do ISV com o artigo 110.º do TFUE ou com outra norma do direito da União Europeia, cuja resposta se aguarda.

 

5.33. Assim, atento todo exposto, e também porque o Tribunal Arbitral está obrigado a julgar de acordo com o direito constituído, deve improceder o pedido formulado de anulação parcial dos actos de liquidação de ISV.

 

5.34. Requer, a Requerente, a restituição do imposto no total de € 7.355,37, que, de acordo com a tese que defende, seriam devidos por conta do montante do imposto que teria sido pago em excesso.

 

5.35. Contudo, peticiona uma condenação na restituição daquele montante.

 

5.36. Ora, quanto a esta questão importa referir que, conforme decorre do RJAT, a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação, competindo ao Tribunal Arbitral a apreciação da legalidade de actos de liquidação de tributos (artigo 2.º, n.º 1), não lhe competindo, por conseguinte, pronunciar-se sobre a restituição de valores / montantes e cálculo de imposto, por conta da anulação, total ou parcial, de actos de liquidação de ISV.

 

5.37. Assim, incumbindo às Alfândegas efectuar a liquidação do imposto, compete-lhes igualmente promover as diligências necessárias ao cumprimento das decisões arbitrais, designadamente, quanto ao cálculo dos montantes que, em caso de procedência da acção, venham a ser reembolsados ao sujeito passivo, até porque, a anulação parcial da liquidação irá determinar, em sede de ISV, a realização de uma liquidação de substituição.

 

5.38. Peticiona, ainda, a Requerente o pagamento de juros indemnizatórios. que, no seu entender, seriam devidos por conta da anulação parcial dos actos de liquidação, desde a data de pagamento do imposto.

 

5.39. Ora, no que concerne ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios, importa referir que, ainda que venha a considerar-se que o pedido arbitral deva proceder, e que os actos de liquidação venham a ser parcialmente anulados, e se entenda que há lugar a pagamento de juros, pugnando-se por entendimento divergente do vertido noutras decisões arbitrais, não poderá, todavia, aquele proceder.

 

5.40. A alínea c), do n.º 3, do artigo 43.º da LGT, ao dispor que são igualmente devidos juros indemnizatórios “Quando a revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte se efetuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária”, consagra um critério especial para os casos em que seja apresentado pedido de revisão da liquidação.

 

5.41. Deste modo, e seguindo abundante e consolidada jurisprudência do STA, mormente a vertida nos Acórdãos de 28-01-2015, no Processo n.º 0722/14, de 11-12-2019, no Processo n.º 058/19.9BALSB, e de 20-05-2020, no Processo n.º 05/19.8BALSB, e de 26-05-2022, no Processo n.º 159/21.3BALSB, entende-se que os juros indemnizatórios só serão devidos depois de decorrido um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa, e não desde a data do pagamento do imposto [cf. artigo 43.º, n.º 1 e n.º 3, alínea c), da LGT].

 

5.42. No mesmo sentido já se pronunciou o Tribunal Arbitral, designadamente nas decisões proferidas nos Processos n.º 296/2020-T, n.º 18/2021-T, n.º 785/2020-T e n.º 271/2021-T.

 

5.43. Assim, atendendo a que, no caso concreto, o pedido de revisão foi apresentado em 06-07-2023, junto da instância aduaneira competente, só haveria lugar ao pagamento de juros indemnizatórios um ano após aquele pedido se a Alfândega não se tivesse pronunciado, sobre o mesmo, dentro daquele prazo, face ao estabelecido na alínea c), do n.º 3, do artigo 43.º da LGT.

 

5.44. Concluindo-se que, independentemente de o pedido ser, ou não, favorável ao contribuinte, só há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos referidos.

 

6. Em 15-02-2024 foi proferido despacho arbitral dispensando a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como de alegações finais, por desnecessidade, ao abrigo dos princípios processuais gerais da economia processual e da proibição da prática de actos inúteis, dado estarem claras as suas posições nos respectivos articulados.

 

7. Em 26-02-2024, foi proferido despacho arbitral convidando a Requerente a pronunciar-se sobre a matéria da excepção invocada pela AT.

 

8. A Requerente não respondeu à excepção suscitada pela AT.

 

 

II – Factos provados

 

9. Com base na prova documental junta aos autos, consideram-se provados os seguintes factos, com interesse para a decisão da causa:

 

9.1. Entre 18-01-2021 e 17-12-2021, a Requerente introduziu em Portugal os veículos automóveis ligeiros de passageiros usados, provenientes da Alemanha, França, Bélgica e Itália, todos países da União Europeia, melhor identificadas em seguida:

 

 

 

 

 

9.2. A Requerente apresentou as Declarações Aduaneira de Veículo (DAV) dos referidos veículos (melhor identificadas em seguida), tendo a AT liquidado o ISV no valor de € 72.381,42, imposto que já foi pago pela Requerente.

 

 

 

9.3. A liquidação e o cálculo do montante de imposto foram efectuados de acordo com os artigos 7.º e 11.º, n.º 1, do Código do ISV, tendo sido aplicadas as reduções previstas nas Tabelas A e D para os veículos ligeiros de passageiros (cfr.  Quadro R das DAV), com referência à componente cilindrada e à componente ambiental, de acordo com as características dos veículos.

 

9.4. Das DAV em causa constam, igualmente, a identificação dos actos de liquidação e respectivas datas, assim como, os montantes, termo final do prazo de pagamento, e data de cobrança (cfr. Quadros T e V das DAV).

 

9.5. Em 06-07-2023, a Requerente apresentou, junto da Alfândega de Vilar Formoso, um pedido de revisão oficiosa relativo aos actos de liquidação de ISV em causa.

 

9.6. Por despacho de 08-09-2023, do Director da Alfândega de Aveiro, o pedido de revisão oficiosa veio a ser objecto de indeferimento, tendo a Requerente sido notificada desta decisão em 04-09-2023, por Ofício n.º ..., de 15-09-2023, da Alfândega de Aveiro.

 

9.7. Em 24-10-2023, na sequência da notificação do despacho de indeferimento que recaiu sobre o pedido de revisão oficiosa, a Requerente apresentou o presente pedido de constituição de tribunal arbitral, peticionando a anulação parcial dos actos de liquidação de ISV e a restituição do montante de € 7.355,37, acrescido de juros indemnizatórios.

 

 

III.1. - Factos dados como não provados

10. Os factos dados como provados são aqueles que o Tribunal Arbitral considera relevantes, não se considerando factualidade dada como não provada que tenha interesse para a decisão.

 

III.2. - Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

11. A matéria de facto foi fixada por este Tribunal Arbitral e a convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes, bem como nos documentos juntos aos autos.

 

Relativamente à matéria de facto o Tribunal Arbitral não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.ºs 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13, “o valor probatório do relatório da inspeção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

 

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a decisão, em relação às provas produzidas, na íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC.

 

Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g. força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

 

 

IV - Do Direito

 

12. São as seguintes as questões a examinar no presente processo.

 

- A incompetência do Tribunal Arbitral.

 

- A necessidade de desencadear o reenvio prejudicial junto do TJUE.

 

- A ilegalidade da liquidação de ISV.

 

- O direito a juros indemnizatórios.

 

Examinar-se-ão assim essas questões:

 

 

Da incompetência do Tribunal Arbitral

 

13. Sustenta a AT que que, conforme decorre do RJAT, a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação, competindo ao Tribunal Arbitral a apreciação da legalidade de actos de liquidação de tributos (artigo 2.º, n.º 1), não lhe competindo, por conseguinte, pronunciar-se sobre a restituição de valores / montantes e cálculo de imposto, por conta da anulação, total ou parcial, de actos de liquidação de ISV.

 

Incumbindo às Alfândegas efectuar a liquidação do imposto, compete-lhes igualmente promover as diligências necessárias ao cumprimento das decisões arbitrais, designadamente, quanto ao cálculo dos montantes que, em caso de procedência da ação, venham a ser reembolsados ao sujeito passivo, até porque, a anulação parcial da liquidação irá determinar, em sede de ISV, a realização de uma liquidação de substituição.

 

Com efeito, o Tribunal Arbitral restringe a apreciação à verificação da legalidade / ilegalidade da liquidação de imposto – alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT –, cabendo subsequentemente à AT dar cumprimento ao disposto no n.º 1 do artigo 24.º do mesmo diploma, caso se venha a julgar no sentido de julgar procedente a tese da ilegalidade. Não cabe, seguramente, ao Tribunal Arbitral pronunciar-se para lá disso, pelo que não implicará a eventual declaração de ilegalidade da liquidação, se for esta a decisão, que o Tribunal Arbitral venha a pretender “ditar” que disposições legais, vigentes em que data, deveria a AT ter aplicado, mas esta não pronúncia em nada afecta o cabimento legal e a pertinência e suficiência da apreciação do pedido, tal como vem formulado no PPA.

 

Nestes termos, julga-se improcedente a excepção de incompetência do Tribunal Arbitral.

 

 

Da necessidade de reenvio prejudicial para o TJUE

 

14. Solicitou a Requerente que, caso o Tribunal Arbitral assim o entendesse, fosse desencadeado o reenvio prejudicial junto do TJUE, uma vez que estaria em causa uma questão de interpretação do Direito da União Europeia.

 

Só que, conforme também refere a AT, a questão de direito em apreço, foi já objecto de reenvio prejudicial para o TJUE, o qual levou à prolação do despacho do Tribunal de Justiça de 06-02-2024, preferido no Processo n.º C-399/23. Também no Processo n.º 700/2021-T deste CAAD, perante a aplicação da mesma questão de Direito, foi efectuado em 23-05-2022 o reenvio prejudicial ao TJUE, o qual levou à prolação por esse Tribunal do Acórdão de 16-09-2023, preferido no Processo n.º C-349/22.

 

Assim, não considera o Tribunal Arbitral necessário desencadear, mais uma vez, o processo de reenvio prejudicial junto do TJUE.

 

 

Da ilegalidade da liquidação de ISV

 

15. Sustenta a Requerente existir ilegalidade dos actos de liquidação de ISV em apreciação, uma vez que a disposição do artigo 11.º do Código do ISV, mesmo após a redacção que lhe foi conferida pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, continua a contrariar o artigo 110.º do TFUE. Pelo contrário, a AT sustenta que a actual redacção do artigo 11.º do Código do ISV respeita o artigo 110.º do TFUE.

Ora vejamos,

 

O artigo 110.º do TFUE dispõe expressamente o seguinte:

“Nenhum Estado-Membro fará incidir, directa ou indirectamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, directa ou indirectamente, sobre produtos nacionais similares. Além disso, nenhum Estado-Membro fará incidir sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas de modo a proteger indirectamente outras produções”.

 

Dispõe o artigo 11.º, n.º 1, do Código do ISV, na redacção posterior à Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, o seguinte:

 

“1 - O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados-Membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, ao qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, tendo em conta a componente cilindrada e ambiental, incluindo-se o agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos, respetivamente (...)”.

 

Esta redacção do artigo 11.º, n.º 1, do Código do ISV surgiu após várias decisões do TJUE, referindo a desconformidade da tributação dos veículos usados instituída pela República Portuguesa com o artigo 110.º do TFUE.

 

Efectivamente, no Acórdão do Tribunal de Justiça (Sétima Secção) de 16-06-2016, emitido no Processo n.º C-200/15 relativo à acção de incumprimento interposta pela Comissão Europeia contra a República Portuguesa foi declarada a desconformidade da anterior redacção desta disposição com o artigo 110.º do TFUE, nos seguintes termos, referindo o TJUE o seguinte:

 

“Este artigo (110.º do TFUE) é violado sempre que a imposição que incide sobre o artigo importado e a que incide sobre o produto nacional similar são calculados de forma diferente e segundo modalidades diferentes que conduzam, ainda que apenas em certos casos, a uma imposição superior do produto importado (acórdão de 22 de fevereiro de 2001, Gomes Valente, C-393/98, EU: C:2001:109, no 21; de 19 de setembro de 2002, Tulliasiames e Siilin, C-101/00, EU: C:2002:505, no 53; e de 20 de setembro de 2007, Comissão/Grécia, C-74/06, EU:C:2007:534, no 25)” (no 24 dos fundamentos do acórdão). Assim, a cobrança, por um Estado-Membro, de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-membro é contrária ao artigo 110.º do TFUE, quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional (v., designadamente, acórdãos de 9 de março de 1995, Nunes Tadeu, C-345/93, EU:C:1995:66, n.º 20, e de 22 de fevereiro de 2001, Gomes Valente, C-393/98, EU:C:2001:109, n.º 23)” (n.º 25 dos fundamentos do acórdão).“ (...) Mais precisamente, um Estado-Membro não pode cobrar um imposto sobre os veículos usados importados, calculado com base num valor superior ao valor real do veículo, tendo como efeito uma tributação mais onerosa destes relativamente à dos veículos usados similares, disponíveis no mercado nacional. O valor do veículo usado importado utilizado pela Administração como base de tributação deve refletir fielmente o valor de um veículo similar já registado no território nacional (v. acórdão de 20 de setembro de 2007, Comissão/Grécia, C-74/06, EU:C:2007:534, n.º 27 e 28 (...)”.

 

A mesma decisão foi repetida no Acórdão do Tribunal de Justiça (Nona Secção) de 02-092021, emitido no Processo n.º C-169/20 relativo à acção de incumprimento interposta pela Comissão Europeia contra a República Portuguesa onde se decidiu que “ao não desvalorizar a componente ambiental no cálculo do valor aplicável aos veículos usados postos em circulação no território português e adquiridos noutro Estado‐Membro, no âmbito do cálculo do imposto sobre veículos previsto no Código do Imposto sobre Veículos, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 71/2018, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.º TFUE”.

 

Mais recentemente, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declarou que “[o] artigo 110.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que não tem em conta, para efeitos do cálculo do montante de um imposto sobre veículos, quando é aplicado a um veículo usado proveniente de outro Estado‑Membro, a desvalorização da componente ambiental deste imposto na mesma proporção e nos mesmos termos em que o faz em relação à componente cilindrada do referido imposto se, e na medida em que, o montante do imposto cobrado sobre o referido veículo importado exceder o montante do valor residual do imposto incorporado no valor dos veículos nacionais similares presentes no mercado nacional de veículos usados.” (cfr. despacho do Tribunal de Justiça de 06-02-2024, preferido no Processo n.º C-399/23).

 

A actual redacção do artigo 11.º do Código do ISV introduzida pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, passou igualmente a aplicar uma percentagem de redução em relação à componente ambiental, mas fê-la em termos inferiores em relação à redução da componente cilindrada.

 

Efectivamente, foi aplicada uma redução de 75% relativa à componente cilindrada, mas apenas de 52% em relação à componente ambiental.

 

Por esse motivo, a jurisprudência deste CAAD tem decidido maioritariamente no sentido de que a actual redacção do artigo 11.º do Código do ISV continua a violar o disposto no artigo 110.º TFUE (cfr., designadamente, as decisões dos Processos n.º 350/2021-T, n.º 372/2021-T, n.º 607/2021-T e n.º 352/2022-T e 469/29023-T).

 

 

Na verdade, como bem se escreveu na decisão do Processo n.º 372/2021-T:

 

"Portanto, a posição da Requerida, no entender deste tribunal arbitral, importa uma violação ao aludido artigo 110.º, do TFUE e, ao contrário do que defende, não é compatível com o modelo de tributação existente, uma vez que a jurisprudência europeia impõe que tais sistemas de tributação sejam expurgados de qualquer efeito discriminatório, por menor que ele seja, não havendo que aceitar uma discriminação menor face à situação anteriormente vigente. Sendo, por isso, que o atual artigo 110.º do TFUE se opõe a que um Estado Membro aplique aos veículos usados importados de outro Estado-membro um sistema de tributação em que o imposto que incide sobre esses veículos não atenda à depreciação real do veículo e não permita garantir sempre que o montante do imposto que fixa não excede o montante do imposto residual incorporado no valor de um veículo usado similar já matriculado no território nacional. Nestes termos, não pode este Tribunal arbitral deixar de considerar que, o que deverá aqui relevar, é que o artigo 11.º do CISV está em desconformidade com o disposto no artigo 110.º do TFUE, não havendo, de acordo com os fundamentos da Requerida, qualquer interpretação desconforme à Constituição, por parte do Requerente, nem quanto ao direito da União Europeia e direito internacional, porquanto os fins que visam não se podem assegurar com base num sistema tributário discriminatório.

É, que, o artigo 110.o TFUE não permite qualquer derrogação ao princípio da não discriminação, direta ou indireta, no que diz respeito às «importações» de outros Estados‐Membros. Por outro lado, no caso dos veículos registados como novos, a componente ambiental do imposto em causa é coletada apenas uma vez, no momento do registo do veículo em questão, pelo que, consequentemente, o montante a pagar para registar um veículo usado importado excede o aplicável a um veículo usado semelhante já registado em Portugal, o que constitui uma violação do artigo 110.º TFUE”.

 

É claramente essa a solução desta questão, uma vez que as normas do Direito da União Europeia, no caso o artigo 110.º TFUE, têm efeito directo e primado sobre o Direito Nacional, não podendo assim o artigo 11.º do Código do ISV contrariar aquela disposição. Ora, existe uma clara violação do artigo 110.º do TFUE sempre que o montante de imposto que incide sobre um veículo usado proveniente de outro Estado-Membro exceda o montante residual do referido imposto incorporado no valor dos veículos usados similares já matriculados no território nacional, o que é o caso.

 

Nestes termos, torna-se claro que o normativo do n.º 1 do artigo 11.º do Código do ISV, na redação introduzida pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de Dezembro, é incompatível com o artigo 110.º do TFUE, na medida em que sujeita os veículos usados provenientes de outros Estados-Membros a uma carga tributária superior à do imposto residual contido nos veículos usados similares transacionados no mercado nacional, o que consubstancia uma discriminação proibida pelo referido artigo do TFUE, e implica que, consequentemente, a norma do artigo 11.º do CISV seja ilegal.

 

Deste modo, os actos de liquidação de ISV impugnados, alvo de taxas diferenciadas de redução das componentes cilindrada e ambiental do ISV, encontra-se ferido de ilegalidade devendo ser anulados. Porém, tal ilegalidade restringe-se à parte do imposto decorrente da diferente percentagem de redução aplicada à componente cilindrada e à componente ambiental determinada em função dos anos de vida do(s) veículo(s), nela se centrando em exclusivo o objecto do presente PPA, pelo que os referidos actos de liquidação de ISV devem ser parcialmente anulados, o que se determina.

 

 

Do direito a juros indemnizatórios

 

16. A Requerente solicitou ainda o pagamento de juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º da LGT.

 

Decorre do n.º 1 desse artigo que “quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

Podemos entender ainda que, como decorre do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, o direito a juros indemnizatórios pode ser reconhecido em processo arbitral. Ter-se-á, no entanto, de determinar se houve, ou não, erro imputável aos serviços.

 

Como já se referiu, a AT tinha pleno conhecimento da jurisprudência existente no sentido da interpretação da incompatibilidade da redacção do artigo 11.º do Código do ISV com o artigo 110.º do TFUE, devendo por isso ter aceite a revisão oficiosa pedida pela Requerente.

 

Estamos assim, neste caso, perante uma actuação por parte da AT, que se traduz num “erro imputável aos serviços”, conforme consta do artigo 43.º da LGT.

 

Tendo em conta o estabelecido no artigo 61.º do CPPT e tendo sido verificada a existência de erro imputável aos serviços da AT, do qual resultou pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (cfr. artigo 43.º, n.º 1 da LGT), entendemos que a Requerente tem direito a juros indemnizatórios à taxa legal, calculados sobre o valor de ISV a reembolsar, que serão contados desde a data do pagamento desse montante, até ao integral reembolso dessa mesma quantia.

 

 

V - Decisão

 

Nestes termos, julga-se procedente o pedido de anulação parcial dos actos de liquidação de ISV resultantes das DAV em causa, anulando-se parcialmente os referidos actos, no que diz respeito ao cálculo da componente ambiental ou CO2.

 

Julga-se procedente o pedido de reembolso do ISV, acrescido dos componentes juros indemnizatórios, condenando-se a AT ao respectivo pagamento, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios desde o pagamento indevido até que ocorra o reembolso efectivo.

 

Fixa-se ao processo o valor de € 7.355,37, indicado pela Requerente, respeitante ao montante da liquidação de ISV cuja anulação pretende (de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, este último ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT) e o valor da correspondente taxa de arbitragem em € 612,00 nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, condenando-se a AT nas custas do processo.

 

Notifique-se as Partes e o Ministério Público.

 

Lisboa, 12 de Março de 2024

 

 

 

O Árbitro,

 

 

 

(Hélder Faustino)

 

 

 

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.