Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 257/2023-T
Data da decisão: 2023-11-27  IMT  
Valor do pedido: € 48.071,24
Tema: IMT - Cessação da Isenção; Momento a atender para liquidação – artigo 18º nº2 e 3 CIMT.
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SUMÁRIO:

1-Ocorrendo  a caducidade da isenção de IMT prevista no nº1 do artigo 7º do CIMT, por prédio não ter sido revendido no prazo previsto no nº5 do artigo 11º do CIMT (por entidade que exerce normal e habitualmente a atividade de compra e venda de imóveis),  a constituição de propriedade horizontal constitui um facto que altera a natureza  jurídica do prédio e que determina que o IMT a liquidar deve ser calculado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão nos termos do nº3 do artigo 18º do CIMT.

***

DECISÃO ARBITRAL

 

I. Relatório

1. No dia 10 de abril de 2023,  “A..., SA”, pessoa coletiva com o NIPC:... “Requerente”, apresentou pedido de constituição de tribunal e pronúncia arbitral ao abrigo da alínea a) e do artigo 2º e do artigo 10º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT)  em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, pretendendo a anulação da  liquidação adicional de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) com o n.º 2017/... e dos respetivos juros compensatórios, no montante de € 48.071,24 (que consta do doc. nº1 junto com PPA) por entender que esta  é ilegal por erro sobre os pressupostos de facto e de direito – violação do nº3 do artigo 18º  do CIMT, e a condenação da AT nos respetivos juros indemnizatórios.

 

É requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA e ADUANEIRA (doravante AT).

2. No dia 11 de abril de 2023, foi aceite o pedido de constituição de Tribunal Arbitral.

3. No dia 21 de junho de 2023, foi constituído o Tribunal Arbitral.

4. Em 23 de junho de 2023, foi a Requerida notificada nos termos dos n.º 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT, para no prazo de 30 dias, apresentar Resposta.

5. Em 11 de setembro de 2023, a Requerida juntou aos autos a sua Resposta.

 

6. Em  14 de setembro de 2023, foi proferido despacho em que foi dispensada a reunião do Tribunal Arbitral a que se refere o artigo 18º do RJAT, dado que as questões que subsistem são essencialmente de direito e, consequentemente, sem necessidade de produção de prova testemunhal e por verificar-se que que se trata de processo não passível duma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos habitualmente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais e por não existirem  exceções a apreciar e decidir antes de conhecer do pedido, nem necessidade aparente de correção de peças processuais, facultando-se às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem, alegações escritas.

7. Em 29 de setembro de 2023 a Requerente juntou aos autos alegações.

 

II. Saneamento

O Pedido de Pronúncia Arbitral é tempestivo. O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regulamente constituído, nos termos dos artigos 2.º n.º 1 alínea a), 5º n.º 1 e 2 do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

 Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

III. Matéria de Facto

 

III. A. Factos Provados

1.A Requerente é uma sociedade anónima cujo objeto social consiste na “compra e venda de prédios e revenda dos adquiridos para esse fim. Empreendimentos imobiliários. Todas as demais operações legalmente permitidas sobre imóveis”.

2. Por escritura notarial outorgada em 19.06.2017, a Requerente comprou à sociedade B..., S.A., pelo preço de 581.532,00€, o prédio urbano composto por complexo industrial com uma fábrica, anexos e logradouro, destinado a armazém e atividade industrial, sito em  ... ou ..., União das freguesias de ... e ..., concelho de Vila Nova de Famalicão, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número ..., da extinta freguesia de ..., inscrito na respetiva matriz do ... Serviço de Finanças de … sob o número ... da indicada União das freguesias de ... e..., com um valor patrimonial de 714.790,00€.

3. Na escritura notarial de aquisição do imóvel  identificada no número anterior, a Requerente declarou que o imóvel  destinava-se a revenda, tendo  a aquisição beneficiado de isenção de IMT, nos termos do artigo  7º nº1  do CIMT.

4. Em 01.08.2018, foi emitida pela Câmara Municipal de … à Requerente “Certidão de Propriedade Horizontal”, na qual se atesta que “a descrição das frações em regime de propriedade horizontal dão cumprimento ao disposto nos artigos n.º 1415º, 1418º e 1421º do Código Civil, estão reunidas as condições para ser emitida a certidão de constituição de propriedade horizontal”.

5. Por escritura notarial outorgada em 27.08.2018 o prédio identificado no número dois foi constituído em propriedade horizontal, com seis frações, a saber:

 

 

 

6. A cada fração foi atribuída a seguinte permilagem em relação à totalidade do prédio:

 

 

7. No seguimento da constituição da propriedade horizontal, a Requerente apresentou em 04.09.2018  junto do Serviço de Finanças de ..., declaração Modelo 1 para inscrição e atualização do prédio (nº de registo: ...).

8. Em consequência da constituição da propriedade horizontal ao prédio  foi atribuído um novo artigo matricial -  artigo urbano ..., frações A e F.

9. Por escritura notarial de 18.02.2019 a Requerente vendeu as frações A e B, do imóvel.

10.Por ofício n.º .../2022, datado de 02.12.2022, foi a Requerente notificada da liquidação adicional de IMT e respetivos juros compensatórios, no valor de 48.071,24€, nos seguintes termos:

 

 

 

 

 

 

 

 11. A Requerente procedeu ao pagamento da liquidação adicional de IMT 2017/... em 09.01.2023 no valor de €48.071,24.

 

 

III.B- Factos que não se consideram provados

Não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão arbitral que não tenham sido dados como provados.

 

III. C. – Fundamentação da matéria de facto que se considera provada

 

1. Os factos elencados supra, foram dados como provados com base nas posições assumidas pelas partes nos presentes autos, nos documentos juntos ao PPA e ao processo administrativo (PA).

2. Cabe ao Tribunal Arbitral selecionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica, considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. art. 123.º, 2, do CPPT e arts. 596.º, 1 e 607.º, 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi art. 29.º, 1, a) e e) do RJAT), abrangendo os seus poderes de cognição factos instrumentais e factos que sejam complemento ou concretização dos que as Partes alegaram (cfr. arts. 13.º do CPPT, 99.º da LGT, 90.º do CPTA e arts. 5.º, 2 e 411.º do CPC).

3. Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação aos factos alegados pelas partes, na sua íntima e prudente convicção formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. art. 16.º, e) do RJAT, e art. 607.º, 4, do CPC, aplicável ex vi art. 29.º, 1, e) do RJAT).

4. Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (por exemplo, quanto aos documentos autênticos, por força do artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação das provas produzidas, o referido princípio da livre apreciação (cfr. art. 607.º, 5, do CPC, ex vi art. 29.º, 1, e) do RJAT).

5. Além disso, não se deram como provadas nem não foram provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada, nem os factos incompatíveis ou contrários aos dados como provados.

 

IV. Sobre o Mérito da Causa

 

 

IV. A - Posição da Requerente

 

Defende a Requerente que o ato de constituição de propriedade horizontal apesar de não ter alterado o destino do prédio, alterou a sua natureza, razão pela qual  não só foi atribuído ao prédio um novo artigo matricial  como o mesmo foi alvo de avaliação pela AT. Pelo que ocorrendo a alteração da natureza do prédio a liquidação de IMT, a liquidar na sequencia da caducidade da isenção do artigo7º do CIMT, deveria ser efetuada ao abrigo da norma excecional constante do nº3 do artigo 18º do CIMT, com base na taxa e valor patrimonial do prédio à data da transmissão. Assim, defende  a Requerente que o IMT  deveria ter sido calculado com base no valor patrimonial tributário de cada uma das frações não revendidas à data da transmissão, por referências à percentagem atribuída em sede de escritura de constituição de propriedade horizontal em relação à totalidade do prédio, mais concretamente com base no montante de 373.120,38€ conforme pormenorização de tabela constante do artigo 21º do PPA:

 

Entendendo a Requerente que a liquidação de IMT enferma de vício de violação de lei, por erro de interpretação do artigo 18.º, n.ºs 2 e 3 do CIMT, que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

 

 

IV. B. Posição da Requerida

 

A Requerida na sua resposta contesta a posição e argumentação da Requerente. Entende a Requerida que a  constituição da propriedade horizontal não implicou qualquer alteração na natureza do prédio,   nem a Requerente juntou ao processo qualquer elemento que possa demonstrar essa alteração (como, por exemplo, alvará de licenciamento de obras de construção) sendo que a certidão emitida pela Câmara Municipal de … apenas certifica que a descrição das frações em regime de propriedade horizontal dá cumprimento ao disposto nos artigos n.º 1415.º, 1418.º e 1421.º do Código Civil.

Defende a Requerida que o  prédio em questão, não foi objeto de quaisquer obras de que resulte uma alteração da estrutura do prédio ou da sua divisão interna, passíveis de alterar a natureza do mesmo (Cfr. Informação Vinculativa 2010001009 - IVE N.º 634 de 4 de junho de 2010), pelo que  manteve a sua natureza industrial, apenas tendo sido objeto de nova configuração jurídica através da constituição em propriedade horizontal. Pelo que consequentemente a liquidação de IMT na sequência da caducidade da Isenção de IMT deverá ser efetuada nos termos do nº2 do artigo 18º do CIMT, ou seja o imposto deverá ser liquidado com base nas taxas e valores vigente à data da liquidação.  Termos em  conclui que a liquidação de IMT, impugnada não enferma de qualquer vicio devendo-se manter na ordem jurídica os atos de liquidação impugnados.

 

IV.C. Do Direito

 

Tendo em atenção as pretensões e posições da Requerente e da Requerida constantes das suas peças processuais, a questão que o Tribunal Arbitral deve apreciar (sem prejuízo de a solução dada a certa questão poder prejudicar o conhecimento de outra ou outras questões - cfr. artigo 608.º, n.º 2 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT) é determinar se a constituição de propriedade horizontal constitui um facto que altere a natureza do prédio, por forma a determinar-se, se o IMT a liquidar na sequência da  caducidade da isenção prevista no artigo 7º do CIMT deve ser calculado com base no valor vigente à data da liquidação ou à data da transmissão, ou seja, se é aplicável o n.º 2 ou o n.º 3 do artigo 18.º do CIMT.

 

O nº1 do artigo 7º do CIMT estabelece “são isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109.º  do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda.” Norma que funciona como uma exclusão de tributação com o prepósito de ser evitado a dupla tributação na área do imposto sobre o rendimento por que se encontra tributada a atividade de compra e venda de imóveis e que exige como requisitos de aplicabilidade: (1) que o prédio adquirido se destine a revenda; (2) que antes da aquisição tenha sido apresentada a declaração prevista no artigo 112.º do CIRS e 117.º do CIRC; (3) que em relação ao ano anterior tenha havido o exercício normal habitual da referida atividade; (4) que os prédios sejam revendidos no prazo de três anos.

 

No caso dos autos a Requerente beneficiou da isenção do nº1 do artigo 7º do CIMT na aquisição do prédio urbano. Porém, esta exclusão de tributação, sob a forma de isenção nos termos do nº5 do artigo 11º do CIMT:“ A aquisição a que se refere o artigo 7.º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda.”

 

No caso dos autos a Requerida entre a data de aquisição (ano de 2017) e a data de caducidade da isenção (ano de 2020) constituiu o prédio objeto da isenção, em propriedade horizontal, com seis frações, a qual a AT atribuiu um novo artigo matricial (artigo urbano ..., frações A e F). Das seis frações, duas foram vendidas dentro do prazo dos 3 anos, remanescendo quatro frações por alienar. Sendo que as frações por alienar dentro do prazo de caducidade (C; D; E; F) representavam de acordo com a escritura de constituição da propriedade horizontal uma permilagem de 522.

 

Face à não alienação da totalidade das frações no prazo de caducidade da isenção, resulta a obrigação da liquidação de IMT sobre as frações não vendidas. Liquidação  que no caso presente nos termos do artigo 17º nº1 d) do CMIT estaria sujeita à taxa de 6,5%.

 

 

O regime da aplicação temporal das taxas está previsto no artigo 18.º do CIMT, estipulando o seguinte:

Artigo 18.º

Aplicação temporal das taxas

1 - O imposto será liquidado pelas taxas em vigor ao tempo da ocorrência do facto tributário.

2 - Se ocorrer a caducidade da isenção, a taxa e o valor a considerar na liquidação serão os vigentes à data da liquidação.

3 - Quando, no caso referido no número anterior e após a aquisição dos bens, tenham ocorrido factos que alterem a sua natureza, o imposto será liquidado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão.

 

Pelo que ocorrendo a caducidade da isenção nos termos do nº5 do artigo 11º do CIMT a taxa e o valores a considerar para efeitos de liquidação pode ser: os vigentes à data de liquidação (nº2 do artigo 18º do CIMT), ou inversamente caso tenham ocorrido factos que alterem a  natureza do prédio, as taxas e os valores vigentes à data da transmissão (nº3 do artigo 18º do CIMT).

 

Para o efeito a Requerente  defende que a constituição da propriedade horizontal constitui um facto que altera a natureza do prédio, dando lugar à aplicabilidade do nº3 do artigo 18º do CIMT. Em sentido oposto a Requerida  chamando à colação a informação vinculativa nº2010001009-IVE defende que constituição da propriedade horizontal  não constitui um facto que altere a natureza do prédio, aplicando-se em consequência o nº2 do artigo 18º CIMT.

 

Vejamos então a solução jurídica para esta questão.

Desde já relevamos que nos termos do nº4 do artigo 2º do CIMI “para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.” Conceito de prédio que é aplicável ao IMT por via do nº2 do artigo 1º do CIMT.  O  que só pode significar que com a constituição da propriedade horizontal juridicamente estamos perante um prédio diferente. Aliás, facto que determinou a AT a  atribuiu um novo artigo matricial (artigo urbano ..., frações A e F).

 

Olhando para a jurisprudência não podemos deixar de ter em consideração os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo processo nº 0244/15 de 09-09-2015 que refere:

“Tendo caducado a isenção de IMT por o prédio não haver sido revendido nos três anos que se sucederam à sua aquisição por uma entidade exerce normal e habitualmente a atividade de comprador de prédios para revenda, e, entretanto haver o prédio sofrido alteração na sua natureza, visto que foi sobre ele constituída a propriedade horizontal, aquele imposto será liquidado, tendo em conta o disposto no artº 18º, nº 3 do CIMT, com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão para o adquirente que beneficiou dessa isenção.” (o sublinhado é nosso)

 

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo processo nº 0506/15 de 21-10-2015 que refere:

“Significa isto, em suma, que face às previsões contidas nos nºs 2 e 3 do artigo 18º do CIMT, ocorrendo a caducidade da isenção prevista no artigo 7º do CIMT, o VPT a que se refere o artigo 12º, nº 1, do CIMT, será o vigente à data da caducidade no caso de o imóvel não ter sofrido alteração, ou será o que se verificar na data da transmissão do imóvel na hipótese de ocorrerem, após a aquisição, factos que alterem a natureza deste. Ou seja, no primeiro caso, previsto no nº 2 do artigo 18º, o imposto incidirá sobre o valor do contrato ou sobre o VPT vigente à data da caducidade da isenção, consoante o que for maior, e, no segundo caso, previsto no nº 3 do mesmo artigo, o imposto incide sobre o valor do contrato ou sobre o VPT vigente na data da aquisição, também consoante o que for maior.

Ora, tal como se deixou já explicado no acórdão proferido por esta Secção do STA em 9/09/2015, no processo nº 0244/15 – em que se apreciou a questão da legalidade da liquidação adicional relativa ao IMT no mesmo enquadramento fáctico que ora se coloca, tendo por referência a mesma situação fáctica e o mesmo Impugnante/Recorrente, «[…] a situação sub judicie cai sob alçada do disposto no seu n.º 3, isto é, o imposto será liquidado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão porque durante o período de isenção ocorreram factos que alteraram a natureza do bem – a constituição de propriedade horizontal.[…]”

 

No mesmo sentido, jurisprudência do CAAD – vide decisão arbitral processo 534/2019-T que refere:

“Na verdade, nestes casos de transformação física e jurídica em frações autónomas de um prédio que, quando foi adquirido, estava constituído em propriedade vertical, está-se perante uma situação de acentuada alteração da natureza, que justifica que legalmente se entenda que se está perante um prédio diferente do adquirido, como decorre do artigo 6.º, n.º 4, do CIMI em que se estabelece que «cada fracção autónoma se no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio». Este conceito de prédio é aplicável ao IMT, por força do disposto no artigo 1.º, n.º 2, do CIMT, que estabelece que «para efeitos do IMT, o conceito de prédio é o definido no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI)”

(…)

Jurisprudência a qual aderimos sem reserva.

Pelo que concluímos em consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça e do CAAD que a constituição de propriedade horizontal constitui um facto que altera a natureza do prédio, devendo o imposto ser  liquidado com base nas taxas e valores vigentes à data da transmissão nos termos do nº3 do artigo 18º do CIMT.

Pelo que em consequência o IMT deveria ter  sido liquidado com base no valor de €373.120,38.

 

Não tendo a Requerida aplicado o nº3 do artigo 18º do CIMT à factualidade do autos, incorreu em erro sobre os pressupostos de facto e de direito (violação do nº3 do artigo 18º do CIMT).

 

Pelo que em consequência  a liquidação de IMT 2017/... no valor de €48.071,24 enferma de vicio de violação de lei que determina a sua anulação.

 

Pelo que, face ao exposto, julga-se procedente o PPA da Requerente  no que diz respeito à anulação da liquidação de IMT com o n.º 2017/... e dos respetivos juros compensatórios, que enfermam do mesmo vício, no montante de €48.071,24.

 

 

V. Dos Juros Indemnizatórios

 

O direito do sujeito passivo a juros indemnizatórios decorre do dever, que recai sobre a AT, de reconstituição imediata e plena da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, como resulta do disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º, n.º 1, da LGT, fazendo este último preceito referência expressa ao pagamento de juros indemnizatórios, compreendido nesse efeito repristinatório do statu quo ante.

 

Significa isto que, na execução do julgado anulatório, a AT deve reintegrar totalmente a ordem jurídica violada, restituindo as importâncias de imposto pagas em excesso e, neste âmbito, a privação ilegal dessas importâncias deve ser objeto de ressarcimento por via do cálculo de juros indemnizatórios, por forma a reconstituir a situação atual hipotética que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.

Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na lei geral tributária e no Código de Procedimento Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT.

Nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, são devidos juros indemnizatórios quando se determine que houve erro imputável à AT de que resulte pagamento de imposto em montante superior ao legalmente devido.

Ora, atento supra exposto, não pode deixar de se considerar ter havido erro imputável aos serviços, na medida em que a liquidação de imposto em causa foi consequência da errónea interpretação que a Requerida fez do nº2 e 3 do artigo 18º do CIMT.

 

Conclui-se, assim, pela procedência da pretensão da Requerente a ser ressarcida através do pagamento de juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento em 09.01.2023 das liquidações de imposto anuladas, até à data da emissão da nota de crédito, nos termos do artigo 43 nº1 LGT e do artigo 61.º, n.ºs 2 a 5, do CPPT.

 

VI. Decisão

 

Nestes termos, decide o Tribunal Arbitral Coletivo:

1- Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;

 E em consequência:

  1. anular a liquidação de IMT com o n.º 2017/... e dos respetivos juros compensatórios, no montante de € 48.071,24;
  2.  Julgar procedente o pedido de restituição das quantias pagas e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a efetuar o pagamento à Requerente das quantias em causa;
  3. Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente esses juros nos termos expostos.

 

VII. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 48.071,24, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

 

VIII. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €2.142,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido foi julgado procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT.

Registe-se e notifique-se.

 

Lisboa, 27 de Novembro de 2023

 

O Árbitro

 

 

 

António Cipriano da Silva