Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 643/2018-T
Data da decisão: 2019-07-31  IMI  
Valor do pedido: € 17.753,02
Tema: EBF – Artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do EBF – Isenção de IMI – Prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal.
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DECISÃO ARBITRAL

 

RELATÓRIO

 

1.            Em 19 de dezembro de 2018, A..., S.A., NIPC ..., com sede na ..., n.º..., em Lisboa, adiante designada por Requerente, solicitou a constituição de tribunal arbitral e procedeu a um pedido de pronúncia arbitral, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2º e alínea a) do n.º 1 do artigo 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT).

2.            A Requerente é representada, no âmbito dos presentes autos, pela sua mandatária, Dr.ª D..., e a Requerida é representada pelos juristas, Dr. B... e Dr. C... .

3.            Mediante o pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral, a requerente pretende que seja declarada a ilegalidade dos atos de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), referentes aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, no montante de € 17.753,02 (dezassete mil, setecentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos) incidente sobre o imóvel inscrito sob o artigo ... da União de freguesias de ... (..., ..., ... e ...), proveniente do artigo predial urbano ... da freguesia de ..., com a sua consequente anulação, e a revogação dos despachos de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos referidos atos de liquidação e o pagamento de juros indemnizatórios.

4.            Verificada a regularidade formal do pedido apresentado, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT e não tendo a Requerente procedido à nomeação de árbitro, foi designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, o signatário, o qual aceitou a designação.

5.            O presente tribunal foi constituído no dia 28 de fevereiro de 2019, na sede do CAAD, sita na Av. Duque de Loulé, n.º 72 A, em Lisboa, conforme comunicação do tribunal arbitral singular que se encontra junta aos presentes autos.

6.            Depois de notificada para o efeito, a Requerida apresentou a sua resposta, a 1 de abril de 2019.

7.            Por despacho de 4 de abril de 2019, o Tribunal notificou a Requerente para vir aos autos indicar a matéria de facto sobre a qual pretendia que fosse produzida a prova testemunhal, tendo a Requerente, por requerimento apresentado a 16 de abril de 2019, dado resposta ao pretendido.

8.            No dia 18 de abril de 2019, a Requerida apresentou requerimento no qual se opôs, expressamente, à inquirição das testemunhas arroladas quanto matéria de facto indicada pela Requerente.

9.            Por despacho de 24 de abril de 2019, o Tribunal, atendendo aos requerimentos apresentados pela Requerente e Requerida, a 16 e a 18 de abril de 2019, respetivamente, e constatando que a produção de prova testemunhal solicitada por aquela se mostrava desnecessária face a toda a documentação e demais informações carreadas para os autos, e por se mostrar a matéria em causa exclusivamente de direito, indeferiu a produção de tal prova.

10.          No mesmo despacho e tendo em consideração a inexistência de necessidade de produção de prova adicional, para além daquela que documentalmente já se encontra incorporada nos autos, reunindo o processo todos os elementos necessários à prolação da decisão, por razões de economia e celeridade processual, da proibição da prática de atos inúteis, o Tribunal decidiu dispensar a realização da reunião do artigo 18.º do RJAT, concedendo um prazo sucessivo de 10 dias para a Requerente e Requerida, por esta ordem, apresentarem as correspondentes alegações por escrito, designou, em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 18.º do RJAT, o dia 28 de agosto de 2019 para efeito de prolação da decisão arbitral, e advertiu a Requerente de que deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e comunicar o mesmo pagamento ao CAAD.

11.          No dia 29 de abril de 2019, a Requerente apresentou um requerimento, ao abrigo do princípio do contraditório, em resposta às exceções invocadas pela Requerida, ao qual, através de requerimento apresentado, no mesmo dia, esta vem invocar a inadmissibilidade do mesmo.

12.          A Requerente apresentou as suas alegações escritas, tendo a Requerida apresentado as suas, nos dias 7 e 16 de maio de 2019, respetivamente.

 

II. A Requerente sustenta o seu pedido, em síntese, da seguinte forma:

 

A Requerente sustenta o pedido de anulação das liquidações de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) referentes aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, no valor total de € 17.753,02 (dezassete mil setecentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos) a que foi sujeita, relativamente ao prédio urbano inscrito sobre o artigo ... da União das freguesias de ... (..., ..., ... e ...), e o pedido de revogação do despacho de indeferimento do pedido de revisão de tais atos de liquidação, por enfermarem de erro sobre os pressupostos de direito e facto, em virtude de considerar que «[e]m face da localização e da importância do prédio sub judice, (…) é entendimento da Requerente que não deveria ser cobrado IMI, porquanto este se encontra isento daquele imposto, sendo essa isenção de aplicação automática nos termos do artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho.»

 

III. Na sua Resposta a Requerida, invocou, em síntese, o seguinte:

 

1.            A Requerida vem, na sua resposta, defender-se, por exceção e por impugnação.

 

2.            Por exceção, invoca, a Requerida, a incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria, por um lado, quanto ao pedido referente à Revisão Oficiosa de ato tributário e, por outro, ao pedido de averbamento de isenção de IMI.

 

3.            Por Impugnação, rebate a Requerida os argumentos da Requerente, nomeadamente quanto ao vício invocado, impugnando pela improcedência do mesmo, concluindo no sentido de que «(…) os atos tributários em crise são válidos e legais porque conformes ao regime legal em vigor à data do facto tributário, pelo que não ocorreu in casu, qualquer erro imputável aos serviços.»

 

 IV. Saneamento

 

O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2º e dos artigos 5º e 6º, todos do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas, encontram-se regularmente representadas e o processo não enferma de nulidades.

 

V. Matéria de Facto

 

Com interesse para a decisão, dão-se por provados os seguintes factos:

 

A.           A Requerente é uma sociedade de direito português que, nos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, era proprietária de diversos prédios sitos em território português, entre os quais, do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da União de freguesias de ... (..., ..., ... e ...), proveniente do artigo predial urbano que se encontrava inscrito sob o artigo ..., da freguesia de ...– cfr. acordo das partes e processo administrativo -;

B.            O imóvel, identificado em A. supra, situa-se no aglomerado urbano denominado “Centro Histórico de ...” e faz parte da lista de Património Mundial da UNESCO, por decisão do Comité do Património Mundial de 26 de novembro de 1986, conforme publicitação no Aviso da Direção de Serviços Culturais, publicado no Diário da República, II Série, de 17-02-1988 – cfr. acordo das partes e processo administrativo -;

C.            A Requerente foi notificada para proceder ao pagamento dos atos de liquidação de IMI referentes aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, no montante global de € 17.753,02 (dezassete mil, setecentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos), conforme quadro seguinte: - cfr. processo administrativo -

ANO      COLETA NOTA DE COBRANÇA     DATA DE EMISSÃO          IMI PAGO

 

2013     

3.219,81               ...            11.03.2014          1.073,27

                               ...            10.07.2014          1.073,27

                               ...            04.10.2014          1.073,27

 

2014     

4.976,70               ...            07.03.2015          1.658,90

                               ...            06.06.2015          1.658,90

                               ...            03.10.2015          1.658,90

 

2015     

4.976,70               ...            04.04.2016          1.658,90

                               ...            10.06.2016          1.658,90

                               ...            08.10.2016          1.658,90

 

2016     

4.579,81               ...            22.03.2017          1.526,60

                               ...            10.06.2017          1.526,60

                               ...            25.10.2017          1.526,60

Total      17.753,02

 

D.           A Requerente procedeu ao pagamento dos atos de liquidação subjacentes à petição arbitral – cfr. acordo das partes - ;

E.            A Requerente apresentou quatro pedidos de revisão oficiosa das liquidações de IMI acima referenciadas, com vista à anulação parcial das mesmas, os quais foram indeferidos por despacho, de 14.09.2018, do Adjunto do Chefe do Serviço de Finanças de ..., ao abrigo de delegação de competências - cfr. processo administrativo -;

 

VI. Factos dados como não provados

 

Não existem factos dados como não provados, porque todos os factos relevantes para a apreciação do pedido foram dados como provados.

 

VII. Motivação da matéria de facto dada como provada

 

Para a convicção do Tribunal Arbitral, relativamente aos factos provados, relevaram os documentos juntos aos autos, bem como o processo administrativo, tudo analisado e ponderado em conjugação com os articulados, dos quais resulta concordância quanto à factualidade apresentada pelas partes, ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 110.º do CPPT.

 

De referir que, relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem que pronunciar-se sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe apenas, o dever de selecionar os factos que importem para a decisão, de discriminar a matéria provada da não provada [(cfr. artigo 123º, n.º 2 do CPPT e n.º 3 do artigo 607º do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 29º, n.º 1, alíneas a) e d) do RJAT)].

 

Assim sendo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são selecionados em função de sua relevância jurídica a qual é estabelecida em função das várias soluções da(s) questão (ões) de direito a descortinar. (cfr. artigo 596º do CPC, aplicável ex vi artigo 29º, n.º1, alínea e) do RJAT).

 

VIII. Fundamentos de direito

 

A título introdutório entende o presente Tribunal que deve, desde já, referir que se reserva, conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA) (Vide Acórdão do Pleno da 2.ª Secção do STA, de 07.06.1995, Recurso n.º 5239) e artigos 607.º, n.º 2 e 3 do Código de Processo Civil (CPC) e artigo 123.º, 1.ª parte, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicáveis ao processo arbitral tributário por força do artigo 29.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT),  ao direito de apreciar apenas os argumentos formulados pelas partes que entende pertinentes para a apreciação da questão aqui em causa, o que fará depois de ter identificado as partes e o objeto do litígio, ter enunciado as questões decidendas, e, depois de fundamentar a decisão discriminando os factos provados e os não provados,  mais, indicando, interpretando e aplicando as normas jurídicas correspondentes e, por fim, apresentando a sua conclusão final (decisão).

 

Vejamos,

 

I.             QUESTÃO PRÉVIA - APRECIAÇÃO DAS EXCEÇÕES INVOCADAS

 

1.            A Requerida, na sua resposta, defende-se, por exceção, invocando, por um lado, a “incompetência do Tribunal Arbitral para apreciar o indeferimento dos pedidos de Revisão Oficiosa de Ato Tributário” alegando para o efeito que «a apreciação de tal matéria extravasa as competências que lhe estão reservadas.», porquanto, «não foram precedidas de impugnação administrativa «(nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário. Como tal, as liquidações alvo de pedidos de Revisão Oficiosa não podem ser apreciadas por parte do Tribunal Arbitral.» ;

 

2.            …e, por outro, invoca a incompetência parcial do Tribunal Arbitral em razão da matéria face ao pedido formulado pela Requerente de se determinar o «averbamento da isenção prevista na alínea n) do n.º 1 do artigo 44.º do estatuto dos Benefícios Fiscais no prédio supra identificado, em estrito cumprimento do disposto no artigo 78.º da LGT, com efeitos retroativos ao ano de 2013.”, por entender que «à luz daquele artigo [2.º, n.º 1 do RJAT] resulta claramente que se encontra fora da jurisdição da arbitragem tributária a apreciação de quaisquer questões relacionadas com o registo de factos atinentes a prédios ou com o averbamento de informação matricial. Pois que se tratam de questões relacionadas com atos preparatórios e instrumentais do ato de liquidação de imposto do selo.»

 

3.            Notificada para se pronunciar sobre as invocadas exceções, a Requerente defendeu a competência do Tribunal Arbitral para apreciação do pedido ou das suas pretensões, manifestando o entendimento de que os tribunais arbitrais são competentes quanto à declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de tributos, tal como o são para apreciar o «pedido da devolução do montante pago a título de IMI, relativo ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo... da União das freguesias de ... (…) bem como do averbamento da isenção prevista no artigo 44.º, n.º1 alínea n) do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho, relativamente ao prédio acima identificado , em estrito cumprimento do disposto no artigo 78.º da LGT.»

 

Ora, vejamos a quem assiste razão.

 

A.           DA INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL ARBITRAL EM RAZÃO DA MATÉRIA (INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE REVISÃO OFICIOSA DE ATO TRIBUTÁRIO)

 

4.            Nos presentes autos arbitrais, estamos perante o pedido de declaração de ilegalidade de liquidações adicionais de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), referentes aos anos de 2013 a 2016, as quais foram objeto de um pedido de revisão do ato tributário, e após o seu indeferimento, impugnadas para o presente tribunal arbitral.

 

5.            Ora, imputa a Requerida a incompetência do Tribunal Arbitral para apreciar o indeferimento dos pedidos de Revisão Oficiosa de Ato Tributário, ao entendimento que sufraga no sentido de que «a apreciação de tal matéria extravasa as competências que estão reservadas por lei».

 

6.            Com efeito, o ato em causa nos presentes autos é um ato de liquidação adicional de IMI, não sendo, assim, um qualquer ato de autoliquidação, retenção na fonte ou de pagamento por conta, pelo que, desde logo, não está dependente de qualquer prévia reclamação graciosa.

 

7.            A autoliquidação, a retenção na fonte e o pagamento por conta carecem de prévia reclamação para garantir a sua impugnabilidade, nos termos do disposto nos artigos 131.º a 132.º do CPPT, estando assim em causa um ato de 2.º grau. Nada impede que também se aceite tal impugnabilidade quando o ato de 2.º grau em causa for o indeferimento de um pedido, tempestivo, de revisão oficiosa.

 

8.            Com efeito, neste caso a liquidação impugnada, já passou pelo crivo da análise da legalidade por parte da AT, por via da apreciação de pedido de revisão oficiosa.

 

9.            É que para efeitos da sua impugnabilidade, este ato também é considerado um ato que comporta a apreciação da legalidade do ato de liquidação.

 

10.          Esclarece-se, com manifesto interesse, na decisão do Tribunal Arbitral Coletivo, proferida no processo n.º 620/2017-T que:

 

«Por outro lado, a fórmula «declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT não restringe, numa mera interpretação declarativa, o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado directamente um acto de um daqueles tipos. Na verdade, a ilegalidade de actos de liquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um acto de segundo grau, que confirme um acto de liquidação, incorporando a sua ilegalidade.

 

A inclusão nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD dos casos em que a declaração de ilegalidade dos actos aí indicados é efectuada através da declaração de ilegalidade de actos de segundo grau, que são o objecto imediato da pretensão impugnatória, resulta com segurança da referência que naquela norma é feita aos actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, que expressamente se referem como incluídos entre as competências dos tribunais arbitrais. Com efeito, relativamente a estes actos é imposta, como regra, a reclamação graciosa necessária, nos artigos 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes casos, o objecto imediato do processo impugnatório é, em regra, o acto de segundo grau que aprecia a legalidade do acto de liquidação, acto aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do acto de liquidação. A referência que na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT se faz ao n.º 2 do art. 102.º do CPPT, em que se prevê a impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, desfaz quaisquer dúvidas de que se abrangem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos actos referidos na alínea a) daquele artigo 2.º do RJAT tem de ser obtida na sequência da declaração da ilegalidade de actos de segundo grau.»

 

11.          Conforme se retira do GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA – Revisto e Atualizado -coordenação Nuno de Villa-Lobos, 3.ª Edição, Almedina, pág. 104 e seguintes –“4.3.2. Declaração de ilegalidade de atos de liquidação de que foram apresentadas reclamações graciosas, recursos hierárquicos e pedidos de revisão do ato tributário”:

«Os atos de liquidação de tributos são atos da Administração Tributária que apreciam e conformam a relação jurídica tributária.

O mesmo sucede com os atos de autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta, embora aí a aplicação de uma taxa à matéria coletável seja efetuada pelo contribuinte ou por um substituto.

As leis tributárias preveem a possibilidade de o contribuinte impugnar administrativamente os atos de liquidação (em sentido lato, abrangendo os de autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta), através de reclamação graciosa (…) e impugnar as decisões de indeferimento das reclamações graciosas através de recurso hierárquico (…). Os atos que decidem reclamações graciosas e recursos hierárquicos das decisões sobre de reclamações graciosas serão, neste contexto, atos de segundo e terceiro graus, respetivamente, em que pode ser apreciada a legalidade de atos de liquidação, que são atos de primeiro grau. O mesmo se poderá dizer relativamente a atos que procederam à revisão de atos de liquidação de tributos, no âmbito do artigo 78.º da LGT.»

 

12.          Continuando o referido Guia, esclarecendo que:

«Não resulta do teor expresso do RJAT a possibilidade de serem apreciados pelos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD atos de indeferimento de pedidos de revisão de ato tributários. Na verdade, no artigo 2.º do RJAT não se faz qualquer referência expressa a estes atos ao contrário do que sucede com a autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, que refere «os pedidos de revisão de atos tributários» e os «atos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de atos de liquidação».

 No entanto, a fórmula «declaração de ilegalidade de atos de liquidação, de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, numa mera interpretação declarativa, não restringe o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado diretamente um ato de um daqueles tipos, pois a ilegalidade de atos de ilegalidade pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um ato de segundo ato grau, que conforme um ato de liquidação, incorporando com essa confirmação a sua ilegalidade.

Aliás, é inequívoco, pelo que se disse em relação às decisões de indeferimento das reclamações graciosas e recursos hierárquicos, que se incluem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos atos aí indicados é efetuada através da declaração de ilegalidade de atos de segundo grau ou terceiro grau, que são o objeto imediato da pretensão impugnatória. A possibilidade de apreciação da legalidade de atos primários através da apreciação da legalidade de atos de segundo grau ou terceiro grau é patente na referência que no artigo 2.º do RJAT se faz a atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, pois, relativamente a estes atos é importante, é imposta, como regra, a reclamação necessária, nos artigos 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes caso, o objeto mediato do processo impugnatório é, em regra, o ato de segundo grau que aprecia a legalidade do ato de liquidação,. Ato aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do ato de liquidação.

Foi mesmo neste sentido que a Administração Tributária, através da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, interpretou estas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, ao afastar do âmbito dessas competências « pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamentos que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código do Processo e do Procedimento Tributário» o que tem como alcance restringir a sua vinculação os casos em que esse recurso à via administrativa foi utilizado.

Obtida a conclusão de que a fórmula utilizada na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT não exclui os casos em que a declaração de ilegalidade resulta da ilegalidade de um ato de segundo grau, ela abrangerá também os casos em que o ato de segundo grau é o de indeferimento de pedido de revisão do ato tributário, pois não se vê qualquer razão para restringir, tanto mais que, nos casos em que o pedido de revisão é efetuado no prazo de reclamação administrativa, ele deve ser equiparado a uma reclamação graciosa. O mesmo sucede com a decisão do recurso hierárquico, expressamente indicada a alínea a) no n.º 1 do artigo 10.º do RJAT como termo inicial do prazo de apresentação de pedido de constituição do Tribunal Arbitral.»

 

13.          Carece, por isso, a Requerida de razão quanto a esta invocada exceção.

 

14.          Face ao exposto, entende o presente tribunal ser de improceder a exceção de incompetência material do Tribunal Arbitral em razão da matéria face ao pedido de revisão oficiosa de ato tributário invocada pela Requerida.

 

B.            DA INCOMPETÊNCIA PARCIAL DO TRIBUNAL ARBITRAL EM RAZÃO DA MATÉRIA REFERENTE AO PEDIDO DE AVERBAMENTO DE ISENÇÃO DE IMI

 

15.          A Requerente no pedido de constituição do Tribunal Arbitral que constitui os presentes autos pugna a final que:

«Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, sempre som o douto suprimento de V. Exa requer-se mui respeitosamente, se digne conceder provimento ao pedido de pronúncia arbitral, por vício de violação de lei, determinando em consequência:

a)            A anulação dos despachos de indeferimento do pedido de revisão oficiosa dos atos de liquidação de IMI, dos anos de 2013 a 2016, relativamente ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da União de freguesias de ... (..., ..., ... e ...), o qual provém do artigo predial urbano que se encontrava inscrito sob o artigo ... da freguesia de ..., o qual se situa no Centro Histórico de ... classificado como Património Mundial da UNESCO, bem como a anulação parcial das respetivas liquidações de IMI;

b)           Ser declarada a isenção de IMI ao abrigo da al. n) do n.º 1 do art.º 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”) relativa a prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da União de freguesias de ... (..., ..., ... e...), o qual provém do artigo predial urbano que se encontrava inscrito sob o artigo ... da freguesia de ..., o qual se situa no Centro Histórico de ... classificado como Património Mundial da UNESCO;

c)            O averbamento da isenção prevista na al. n) do art.º 44.º dos Estatutos dos Benefícios Fiscais (“EBF”) no prédio supra identificado, em estrito cumprimento do disposto no artigo 78.º da LGT, com efeitos retroativos ao ano de 2013;

d)           Ser a Autoridade tributária condenada à devolução à ora Requerente da quantia de € 17.753,02 (dezassete mil, setecentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos), relativa ao pagamento do IMI respeitante aos anos de 2013 a 2016;

e)           Ser a Autoridade Tributária condenada ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos previstos no art.º 43.º da LGT e 61.º do CPPT.»

 

16.          Ora, invoca a Requerida a exceção da incompetência do tribunal arbitral na apreciação do pedido respeitante ao averbamento da isenção de IMI ao prédio em causa nos presentes autos, diga-se, desde já, que lhe assiste toda a razão.

 

17.          Assim, e face à manifesta incompetência do presente Tribunal Arbitral para apreciar tal pedido - o averbamento da isenção de IMI -, face ao disposto no artigo 2.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, sobre esta questão não necessita o Tribunal de fazer quaisquer considerações complementares.

 

18.          Apreciará e ponderará, contudo, todos os demais pedidos formulados pela Requerente nos presentes autos, os quais se enquadram dentro da sua competência, nomeadamente, em razão da matéria. Ponderemos, então.

 

II. QUESTÃO DECIDENDA

 

19.          Em face do exposto nos números anteriores, há duas questões controvertidas nos presentes autos, a saber:

a)            saber se os atos tributários de liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), referentes aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016 são ilegais, na medida em que o prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da União de freguesias de ... (..., ..., ... e ...), proveniente do artigo predial urbano que se encontrava inscrito sob o artigo ..., da freguesia de ..., está classificado como Monumento Nacional em decorrência do mesmo estar inserido no conjunto comummente designado por Centro Histórico de ..., considerado Património Mundial pela UNESCO em 1996, e se, por esse facto, tal prédio reúne os pressupostos estabelecidos na lei para usufruir da isenção de IMI consagrada no artigo 44.º, n.º 1, alínea) n) do EBF;

b)           saber se a interpretação veiculada pela Requerente, incidente sobre as liquidações de IMI sindicadas violam os princípios da igualdade tributária, da justiça fiscal, da capacidade contributiva, da autonomia local e da igualdade tributária na decisão, a par de padecer de inconstitucionalidade orgânica.

 

IX. Fundamentos de direito

 

A.           DA CLASSIFICAÇÃO DOS PRÉDIOS

 

1.            Vamos determinar agora o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões acima enunciadas.

 

Ora,

2.            O artigo 44.º, n.º 1 alínea n) do EBF estabelece que estão isentos de IMI “os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável".

 

3.            Este artigo é composto por duas previsões. Em primeiro lugar, estão isentos de IMI os prédios classificados como monumentos nacionais. Em segundo lugar, estão isentos do mesmo imposto os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal.

 

4.            Atendendo à remissão para a legislação aplicável contida na mencionada norma do artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do EBF, há que ter em conta a Lei 107/2001, de 8 de setembro – Lei de Bases do Património Cultural –, mais concretamente, ao seu artigo 15.º, segundo o qual:

 "1 - Os bens imóveis podem pertencer às categorias de monumento, conjunto ou sítio, nos termos em que tais categorias se encontram definidas no direito internacional, e os móveis, entre outras, às categorias indicadas no título VII.

2 - Os bens móveis e imóveis podem ser classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal.

3 - Para os bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos, conjuntos ou sítios, adotar-se-á a designação «monumento nacional» e para os bens móveis classificados como de interesse nacional é criada a designação «tesouro nacional».

4 - Um bem considera-se de interesse nacional quando a respetiva proteção e valorização, no todo ou em parte, represente um valor cultural de significado para a Nação.

(...)

7 - Os bens culturais imóveis incluídos na lista do património mundial integram, para todos os efeitos e na respetiva categoria, a lista dos bens classificados como de interesse nacional.".

 

5.            Por sua vez, a Convenção para a Proteção do Património Mundial, Cultural e Natural, que teve lugar em Paris, e foi aprovada pelo Decreto n.º 49/79, de 6 de junho, procurou estabelecer quais os bens naturais e culturais que podem vir a ser inscritos na Lista do Património Mundial, fixando os deveres dos Estados-Membros quanto à identificação e proteção desses bens. Nesta sequência, diversos monumentos, sítios ou conjuntos vieram a obter a classificação de Património Mundial da UNESCO. Destaca-se, em particular, os conjuntos classificados, mais concretamente, os Centros Históricos classificados como Património Mundial da UNESCO, como é o caso, do Centro Histórico de ... .

 

6.            Saliente-se que os referidos conjuntos classificados como Património Mundial beneficiaram, durante vários anos, de isenção de IMI, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 44.º, n.º 1, alínea n) do Estatuto dos Benefícios Fiscais e artigo 15.º, n.º 2, 3 e 7 da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro (Lei de Bases de Proteção do Património Cultural).

 

7.            Como já referido, articulando os preceitos referidos, os imóveis situados nos Centros Históricos incluídos na Lista do Património Mundial da UNESCO classificam-se como sendo de interesse nacional, inserindo-se na categoria de “Monumentos Nacionais” e, beneficiando, por conseguinte, da isenção consagrada na alínea n) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF.

 

8.            Esta formulação veio a ser reiterada no Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro – Património Cultural Imóvel –, que estabelece o procedimento de classificação dos bens imóveis de interesse cultural, bem como o regime das zonas de proteção e do plano de pormenor de salvaguarda. De acordo com o seu artigo 3.º, n.º 1 "um bem imóvel pode ser qualificado como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal", acrescentando o n.º 3 que "a designação «monumento nacional» é atribuída aos bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos, conjuntos ou sítios".

 

9.            O facto de poderem coexistir prédios individualmente classificados, em caso de delimitação de um conjunto ou de um sítio, nos termos do artigo 56º do Decreto-Lei n.º 309/2009 apenas tem relevo provisório para delimitar a zona de proteção desse imóvel até à publicação da classificação do conjunto ou do sítio.

 

10.          Por esse motivo se compreende que o artigo 44º do EBF distinga entre "prédio classificado como monumento nacional" e "prédio individualmente classificado como de interesse público ou municipal", só exigindo a individualização em relação a estas duas últimas categorias, e não quanto à dos prédios de interesse nacional.

 

11.          Quanto ao argumento de que alguns autores defendem uma interpretação restritiva das isenções aos imóveis classificados, no intuito de excluir dos benefícios atribuídos em sede de IMI ou IMT todas as situações em que não tenha ocorrido um procedimento ou ato de classificação individual como monumento nacional, imóvel de interesse público ou municipal, razão pela qual foi nesse sentido alterado o artigo 6.º, alínea g) do Código do IMT pela Lei 55-A/2010, de 31 de dezembro, levando a que a isenção tenha deixado de abranger "as aquisições de prédios classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal, ao abrigo da Lei nº 107/2001, de 8 de Setembro" para passar a contemplar apenas "as aquisições de prédios individualmente classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável", entendemos que não colhe também este argumento.

 

12.          Aliás, nem faria muito sentido, já que a redação do artigo 44.º do EBF não foi alterada no mesmo sentido, continuando a exigir a classificação individual para atribuição da isenção apenas no caso dos imóveis de interesse público ou municipal, mas não fazendo tal exigência para os monumentos nacionais.  Antes pelo contrário, a norma do n.º 5 do artigo 44.º do EBF dispõe que "a isenção a que se refere a alínea n) do nº. 1 é de carácter automático, operando mediante comunicação da classificação como monumentos nacionais ou da classificação individualizada como imóveis de interesse público ou de interesse municipal (…)".

 

13.          Assim, verdadeiramente, entendemos claro que a intenção do legislador foi dispensar a classificação individualizada para efeitos de isenção de IMI aos monumentos nacionais, apenas a exigindo em relação a imóveis de interesse público ou de interesse municipal.

 

14.          O imóvel em questão nos presentes autos – cfr. acordo de partes - faz parte do Centro Histórico de ..., que foi inscrito na Lista do Património Mundial da UNESCO, conforme declarado pelo Aviso, publicado no Diário da República, I Série n.º..., de 17 de fevereiro de 1988.

 

15.          E, é reconhecido, pela legislação portuguesa, face ao disposto no artigo 15º, nº 7 da Lei 107/2001, de 08 setembro 2001 como «Monumento Nacional»

 

16.          Neste sentido, já se pronunciaram, entre outros, as decisões do CAAD dos processos n.º 325/2014- T, 76/2015-T, 33/2016-T, 98/2016-T, 379/2016-T, 534/2016-T e 204/2017-T, que acompanhamos.

 

17.          Com efeito e com interesse, importa referir que tem sido essa, igualmente, a posição dos Tribunais Centrais Administrativos (Norte  e Sul ), sendo que, em especial, por aplicável ao caso em apreço, traremos à colação o sufragado nos Acórdãos do TCA Norte, proferidos nos processos n.º 0063/14.1BEPRT, de 01.06.2017 e n.º 00134/14.42BEPRT, de 07.12.2016, cujo sumário deste último refere:

«1 - Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis: os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável – cfr. artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

2 - Os imóveis situados nos Centros Históricos incluídos na Lista do Património Mundial da UNESCO classificam-se como sendo de interesse nacional, inserindo-se na categoria de “monumentos nacionais” – cfr. artigo 15.º, n.º 3 e n.º 7 da Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro.

3 - Os prédios inseridos nos Centros Históricos Classificados beneficiam de isenção de imposto municipal sobre imóveis.»

 

18.          Assim, e tal como concluiu a decisão do CAAD do processo n.º 76/2015-T, bem como, nos Acórdãos do TCA, acima identificados, sendo um prédio sito no Centro Histórico de uma cidade, legalmente qualificado como monumento nacional, é manifesto que beneficia da referida isenção, sendo assim ilegal a liquidação de IMI aqui impugnada, e devendo ser restituído à Requerente o imposto que foi pago.

 

19.          E mais recentemente, veja-se o sumário do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no âmbito do processo n.º 0134/14.4BEPRT, de 12.12.2018 no qual é confirmada a posição que: «[e]stão isentos de imposto municipal sobre imóveis os prédios denominados como monumentos nacionais nos termos do disposto no artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do Estatuto dos Benefícios Fiscais.»

 

B.            DA INVOCADA INCONSTITUCIONALIDADE DA INTERPRETAÇÃO VEICULADA PELA REQUERENTE

 

20.          Invoca a Requerida na sua resposta vício de inconstitucionalidade em virtude de a «interpretação veiculada pela Requerente se mostra[r] contrária à Constituição da República Portuguesa (“CRP”), na medida em que viola os constitucionais princípios: (i) da igualdade tributária; (ii) da justiça fiscal, (iii) da capacidade contributiva, (iv) da autonomia local e (v) da participação na decisão.».

 

Ora, vejamos,

 

21.          No que toca à alegada violação do princípio da igualdade tributária, manifesta a Requerida o entendimento de que «a interpretação proposta pela Requerente é uma interpretação que ofende o basilar princípio da igualdade tributária (artigo 13.º da CRP), na medida em que, enquanto proprietária de um prédio integrado no denominado Centro Histórico de ..., destituído de valor cultural individual (uma vez que não existe um diploma classificador individual daquele prédio)(…) a Requerente pretende ser privilegiada, sem razão justificável, relativamente aos restantes proprietários de imóveis não classificados. (…) No caso sub judice, a Requerida suscita a violação do princípio da igualdade perante a lei fiscal, na dimensão da obrigação de diferenciação, na interpretação dada pela requerente.» (artigos 268.º a 279.º da douta resposta).

 

22.          Conforme refere e bem a Requerida, na sua douta resposta, «o princípio da igualdade é um dos princípios basilares do sistema constitucional português, encontrando consagração genérica no artigo 13.º da CRP.» (artigo 272.º da douta resposta).

 

23.          Com efeito, prevê o artigo 13.º da CRP que «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.», o que significa que este princípio determina que se trate de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente, na medida da diferença.

 

24.          Sucede que, no caso em apreço estamos perante um imóvel que se encontra inserido no Centro Histórico de ..., o qual se encontra incluído na Lista de Património Mundial da Unesco, facto este que, por si só, atribui ao mesmo um elevado valor cultural (antecipando já a resposta ao que seguirá infra no tocante à alegada violação do princípio da capacidade contributiva.) – algo que não sucede aos imóveis que não se encontram nas mesmas condições.

 

25.          Ora, nos termos do artigo 15.º, n.º 7 da LBPC, os bens culturais imóveis incluídos na lista do património mundial integram, para todos os efeitos e na respetiva categoria, a lista dos bens classificados como de interesse nacional.

 

26.          Ademais, e não obstante, o prédio estar inserido num conjunto, o certo é que para os bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos, conjuntos ou sítios, são todos eles considerados «monumento nacional».

 

27.          Nesta conformidade, a igualdade de tratamento do proprietário do prédio em causa tenderá a aferir-se em relação aos proprietários de todos os demais prédios inseridos no Centro Histórico de ..., e não como pugna a Requerida em relação a prédios não inseridos naquele Centro Histórico ou que não se encontrem classificados como “monumentos nacionais”, pelo que, sendo destituídos de fundamento os argumentos tecidos pela Requerida, improcede necessariamente a alegada inconstitucionalidade material, por violação do princípio da igualdade tributária.

 

28.          No tocante à defendida violação do princípio da capacidade contributiva refere a Requerida que «enquanto proprietária de prédios destituídos de valor cultural individual (uma vez que não existe um diploma classificador individual daqueles prédios) (…), pretende usufruir de uma isenção fiscal destinada a beneficiar proprietários de imóveis que efetivamente detêm valor cultural e que estão sujeitos a encargos financeiros e a procedimentos burocráticos mais gravosos do que os proprietários de imóveis de construção recente» (artigo 280.º da douta Resposta);

 

29.          … acrescentando, em adesão, como fundamento da violação do princípio da justiça na repartição da carga fiscal, que «pretender-se usufruir de uma isenção relativa a um prédio urbano destituído de valor cultural individual e só por o mesmo se encontrar nas malhas urbanas do denominado Centro Histórico de ... » subverte tal princípio.

 

30.          Ora, a argumentação da Requerida em relação a este vício prende-se essencialmente com a questão do valor cultural do prédio em causa.

 

31.          Como já referido supra, só o facto de o prédio em questão se encontrar inserido no Centro Histórico de ..., e consequentemente, na Lista do Património Mundial da UNESCO leva a afirmar com segurança que tem o mesmo elevado valor cultural.

 

32.          Sobre esta matéria, podemos compulsar o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido no processo n.º 01480/14.2BEPRT, de 04.05.2017 que o presente Tribunal Arbitral acompanha e em que se suporta, e que esclarece o seguinte:

«O princípio da igualdade perante os encargos públicos resulta da necessidade de impor sacrifícios patrimoniais, que a todos diz respeito, devendo ser afectadas, por igual, as esferas da generalidade dos cidadãos, com idêntica capacidade contributiva. Isto é, este princípio exige que os sacrifícios inerentes à satisfação de necessidades públicas sejam equitativamente distribuídos por todos os cidadãos; todos os cidadãos deverão contribuir de igual forma para os encargos públicos à medida da sua capacidade contributiva. Efectivamente, não resulta provado que, em concreto, a Recorrida, enquanto proprietária do imóvel, não esteja sujeita a regras e imposições especiais por o mesmo estar inserido no Centro Histórico do Porto, designadamente, que não suporte encargos relacionados com a conservação e restauro daquele bem, que não pode deixar de ser apelidado de cultural, na medida em que está integrado no referido conjunto. Julgamos pertinente o contra-alegado pela Recorrida a este respeito: “(…) atendendo concretamente ao benefício fiscal ora em apreço, o mesmo acarreta contrapartidas limitativas que coartam a autonomia dos proprietários dos referidos prédios, que se vêem limitados na sua actuação enquanto proprietários, maxime no que concerne à execução de obras nos prédios em causa. O que se torna compreensível por de património mundial se tratar.(…)”Reiteramos, por isso, resultar claro que o imóvel da Recorrida está em igualdade de circunstâncias em relação a todos os restantes prédios inseridos no Centro Histórico do Porto. Logo, todos os proprietários de prédios aí integrados beneficiarão, de igual forma, do benefício fiscal em causa, não se vislumbrando o desrespeito do princípio da capacidade contributiva, dado que não resultou demonstrado que a Recorrida, em concreto, não esteja sujeita a encargos financeiros e a procedimentos burocráticos mais gravosos do que outros proprietários de imóveis não inseridos no conjunto. Por outro lado, também não resultou apurado que as faculdades de disposição, transformação e fruição da Recorrida, em concreto no que tange ao seu imóvel inserido no conjunto classificado, sejam diferentes das que são permitidas ao titular de um prédio individualmente classificado; pelo que se mostra impossibilitada a apreciação da alegada subversão do princípio da justiça na repartição da carga fiscal.»

 

33.          Ora, aproveitando a fundamentação do supracitado aresto com a adaptação adequada ao caso em concreto, e constatando, por um lado, que o imóvel em questão, tem elevado valor cultural por se encontrar inserido no Centro Histórico de ..., como já referido;

 

34.          … por outro, que não resulta provado, nos presentes autos, que a Requerente não se encontre sujeita a encargos financeiros e a procedimento burocráticos mais gravosos do que os outros proprietários de imóveis não inseridos no conjunto, e,

 

35.          … por último, que não resulta, igualmente, apurado que as faculdades de disposição, transformação e fruição da Requerente, em concreto no que tange ao seu imóvel inserido no conjunto classificado, sejam diferentes das que são permitidas ao titular de um prédio individualmente classificado,

 

36.          … entende o presente Tribunal Arbitral que, no caso em concreto, se mostra impossibilitada a apreciação da alegada subversão do princípio da justa repartição da carga fiscal, nos termos aduzidos pela Requerida, improcedendo pelas razões referidas o alegado vício de violação do princípio da capacidade contributiva.

 

37.          No tocante ao alegado vício do princípio da autonomia local, invoca a Requerida que « o entendimento veiculado pela Requerente, segundo o qual o prédio urbano sub judice integra a “Lista do Património Mundial” da UNESCO como “Centro Histórico de ...” e que, como tal está classificado, então forçoso é concluir que, a ser assim, o Município de ... vê lesada a sua sua autonomia local (artigos 235.º e 238.º da CRP) na medida em que nenhuma palavra teve quanto à questão da perda da receita de IMI subjacente à área do Centro Histórico de ....»

 

38.          Continuando «Por outras palavras, a autonomia local do Município de ... e, portanto, parte da sua receita local foi de uma assentada só, decidida indiretamente por um organismo (leia-se Comité do Património Mundial da UNESCO) que não integra os órgãos do Estado Português; não dispõe de qualquer competência legal em matéria tributária no território português; não lhe foi delegada qualquer competência legal em matéria tributária pelo Estado Português no âmbito da candidatura à “Lista do Património Mundial” da UNESCO; não lhe foi delegada qualquer competência legal em matéria tributária pelo Município de ... no âmbito da candidatura à “Lista do Património Mundial” da UNESCO.»

 

39.          Mais referindo a Requerida, quanto a esse assunto que «[m]ais dado que nenhuma palavra teve o Município de ... quanto à questão da perda da receita do IMI subjacente à área do Centro Histórico de ... (…) é forçoso concluir que, por via do artigo 15.º/7 da LBPC, foi desrespeitado o constitucional princípio da participação (artigo 268.º/3 da CRP), in casu na esfera da autarquia portuense, na formação da decisão de classificação.»

 

40.          Ora, no que respeita a este invocado vício, entende o presente Tribunal Arbitral que se encontra o mesmo totalmente destituído de fundamento, dado que a Requerida não é o Município de ... – entidade que se poderá ver prejudicada com a referida isenção.

 

41.          Na verdade, a argumentação da Requerida segue a via da defesa de um terceiro quando ele próprio se absteve de se defender.

 

42.          Com efeito, aproveita, o presente Tribunal Arbitral, o sustentado no Acórdão indicado em 32 supra, quanto a este alegado vício, no sentido de que: «(…) tal como a lei indica (artigo 44.º, n.º 5 do EBF, na redacção conferida pela Lei n.º 3-B/2010, de 28/04, referido supra), o reconhecimento da isenção em causa é automático e a sua comunicação compete às Câmaras Municipais territorialmente competentes, sendo que junto aos autos existe ofício camarário no qual a Câmara Municipal de ... afirma que o imóvel propriedade da aqui Recorrida está isento de IMI. Não se podendo, igualmente, dizer que nenhuma palavra teve o Município de ... quanto à questão da perda de receita do IMI, quando abundam os documentos juntos aos autos acerca desta matéria – cfr. fls. 39 a 60 do processo físico.

Nesta conformidade, mais uma vez, falham as provas quanto aos pressupostos de facto, dado que os elementos dos autos evidenciam, antes, participação, conhecimento e “reconhecimento” por parte da autarquia portuense da isenção do Imposto Municipal sobre Imóveis quanto à situação concreta; não se vislumbrando, também, que a interpretação efectuada pela Recorrida e pelo Tribunal “a quo” enfermem da invocada inconstitucionalidade.» para dar como improcedente o vício de violação do princípio da autonomia local invocado pela Requerida.

 

43.          Por último, invoca a Requerida a Inconstitucionalidade orgânica, na medida em que a Requerente acabou por realizar uma equivalência ou equiparação entre as classificações previstas na legislação do Estado Novo e as previstas na LBPC, ou seja, pela equivalência entre a classificação Monumento Nacional (prevista no Decreto 20.3985 de 1932) e a classificação de Interesse Nacional (prevista no artigo 15.º/2 da LBPC), quando tal equivalência ou equiparação terá necessariamente de resultar da lei do parlamento ou de decreto-lei autorizado do Governo.

 

44.          Mais referindo que «[a]pesar de a LBPC permitir que a legislação de desenvolvimento possa vir a consagrar as regras necessárias para se efectuar, entre outras, a conversão das classificações (artigo 112.º/3 daquele diploma), certo é que os decretos-lei de desenvolvimento até à data publicados não prevêem nenhum mecanismo a ela atinente (…) e em decorrência directa desta omissão por parte do legislador cultural, não podia o legislador fiscal de 2008 substituir-se àquele ao fazer equivaler no artigo 44.º/1-n) do EBF a classificação de Interesse Nacional introduzida pela LBPC à classificação de Monumento Nacional prevista no Decreto 20.985 de 1932; E não podendo o legislador fiscal de 2008 substituir-se ao legislador cultural, naturalmente que também NUNCA assim o poderá fazer o intérprete da Lei e o julgador, sob pena de óbvia inconstitucionalidade, por violação da reserva de lei.»

 

45.          Ora, sem embargo de a matéria da inconstitucionalidade da lei se tratar de matéria de conhecimento oficioso, a verdade é que o Tribunal deve circunscrever-se à fiscalização concreta da constitucionalidade, uma vez que a fiscalização abstrata encontra-se na incumbência exclusiva do Tribunal Constitucional, conforme resulta do artigo 281.º da CRP.

 

46.          Não sendo, deste modo, vedada a suscitação da inconstitucionalidade das normas que definem os elementos da tributação ou a isenção.

 

47.          Com efeito, a oficiosidade do conhecimento da inconstitucionalidade das normas resulta igualmente da emanação do princípio do valor conformador dos preceitos constitucionais, que terão de prevalecer sobre outras normas legais, quando com elas se mostrem incompatíveis em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade das normas jurídicas, apreciando, por impugnação dos factos ou oficiosamente, a existência da inconstitucionalidade das normas aplicáveis ao caso concreto submetido a julgamento – cfr. Acórdão do TCA Sul, de 21/09/2010, proferido no âmbito do processo n.º 03872/10.

 

48.          Ademais, é necessário ter em conta que o que pode e deve ser objeto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa, nem tão-pouco eventuais interpretações que de tais normas possam ser efetuadas por aquelas decisões.

 

49.          Ora, a alínea a) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF menciona expressamente que os prédios classificados como monumentos nacionais estão isentos de IMI – previsão esta constatada pelo intérprete da lei e/ou julgador.

 

50.          E o artigo 15.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro e do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro dispõem que um bem classificado como de interesse nacional é designado como "monumento nacional".

 

51.          Nesta sequência e recuperando a exímia argumentação vertida no Acórdão do TCA Norte, indicado em 32 supra, e que o presente Tribunal Arbitral acompanha e adere: 

«Assim, entendemos que o paralelismo é efectuado pela própria lei vigente, não tendo nem a Recorrida, nem o tribunal, efectuado qualquer interpretação consubstanciada numa equivalência ou equiparação entre as classificações previstas na legislação do Estado Novo e as previstas na Lei de Bases do Património Cultural (LBPC), ou seja, numa equivalência entre a classificação de Monumento Nacional (prevista no Decreto 20.3985 de 1932) e a classificação de Interesse Nacional (prevista no artigo 15.º/2 da LBPC). A Lei de Bases do Património Cultural (Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro) estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural e foi elaborada pela Assembleia da República, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição da República Portuguesa, para valer como lei geral da República. Nesta conformidade, a equivalência ou equiparação que é efectuada no artigo 15.º, n.º 3 desta Lei não padece de uma inconstitucionalidade orgânica, na medida em que resulta de lei do Parlamento. Foi a própria Assembleia da República que, no artigo 15.º, n.º 3 da LBPC estabeleceu expressamente que um bem classificado como de interesse nacional é um monumento nacional».

 

52.          Continua, aquele aresto, com manifesto interesse que «[n]o desenvolvimento do regime jurídico estabelecido pela Lei n.º 107/2001, de 8 de Setembro, e nos termos das alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição da República Portuguesa, o Governo decretou, através do Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de Outubro, que a designação de «monumento nacional» é atribuída aos bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos, conjuntos ou sítios – cfr. artigo 3.º, n.º 3.» para concluir que : «[a]ssim, um imóvel classificado como de interesse nacional – cfr. artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de Outubro – é um monumento nacional, pois dessa forma é designado legalmente – cfr. artigo 3.º, n.º 3 deste Decreto-Lei e artigo 15.º, n.º 3 da LBPC, não se vislumbrando a invocada inconstitucionalidade orgânica.»

53.          Assim considerando que a exposição jurisprudencial acima transcrita é aplicável pelo seu todo ao caso trazido à apreciação do presente Tribunal Arbitral, e que este acompanha toda a argumentação nele sufragada, entende ser de improceder o alegado vício da inconstitucionalidade orgânica.

 

54.          Face ao exposto, decide o presente Tribunal Arbitral pela improcedência de todos os vícios e matéria da inconstitucionalidade alegados pela Requerida, por falta de fundamento.

 

C.            DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

1.            A Requerente peticiona ainda que seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, com fundamento em erro imputável aos serviços.

2.            Dispõe o n.º 1 do artigo 43.º da LGT e o artigo 61.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que são devidos juros indemnizatórios quando se determine em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte o pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

3.            Considera-se erro imputável à administração, quando o erro não for imputável ao contribuinte e assentar em errados pressupostos de facto que não sejam da responsabilidade do contribuinte.

4.            Ora, resultando dos atos tributários impugnados a obrigação de pagamento de imposto superior ao que seria devido, são devidos juros indemnizatórios nos termos legalmente previstos, presumindo o legislador, nestes casos, em que se verifica a anulação da liquidação, que ocorreu na esfera do contribuinte um prejuízo em virtude de ter sido privado da quantia patrimonial que teve que entregar ao Estado em virtude de uma liquidação ilegal. Em consequência, tem o contribuinte direito a essa indemnização, independentemente de qualquer alegação ou prova do prejuízo sofrido.

5.            No caso presente, será inquestionável que, na sequência da consagração da ilegalidade do ato de liquidação sindicado, haverá lugar a reembolso do imposto por força do disposto no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, e do artigo 100.º da LGT passando, necessariamente por aí o restabelecimento da “situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado”.

6.            Do mesmo modo, entende-se que será isento de dúvidas que a ilegalidade do ato é imputável à Autoridade Tributária, que autonomamente o praticou de forma ilegal.

7.            Quanto ao conceito de “erro”, tem sido entendido que só em casos de anulações fundadas em vícios respeitantes à relação jurídica tributária haverá lugar a pagamento de juros indemnizatórios, não sendo reconhecido tal direito no caso de anulações por vícios procedimentais ou de forma.

8.            Assim sendo, estando-se perante um vício de violação de lei substantiva, que se consubstancia em erro nos pressupostos de direito, imputável à Autoridade Tributária, tem a Requerente direito a juros indemnizatórios, de acordo com os artigos 43.º, n.º 1 da LGT, e 61.º do CPPT, contados desde o pagamento do imposto até ao integral reembolso do referido montante.

 

X. DECISÃO

 

De harmonia com o exposto, decide-se:

A.           Julgar improcedente a exceção invocada pela Requerida da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria para impugnar o indeferimento do pedido de revisão oficiosa de ato tributário;

B.            Julgar procedente a exceção invocada pela Requerida da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria face ao pedido de averbamento da isenção de IMI, pelo que o Tribunal não vai apreciar tal questão;

C.            Julgar procedente o pedido formulado pela Requerente no presente processo Arbitral Tributário, quanto à ilegalidade dos atos de liquidação de IMI referentes aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, no valor total de € 17.753,02 (dezassete mil, setecentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos) a que foi sujeito, relativamente ao imóvel inscrito sob o artigo ... da União de freguesias de ... (..., ..., ... e ...), proveniente do artigo predial urbano ... da freguesia de ..., e consequentemente, anular a liquidação de imposto aqui sindicada;

D.           Revogar as decisões proferidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira no âmbito das revisões oficiosas cujo objeto são os atos de liquidação aqui sindicados.

E.            Julgar procedente o pedido de condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar à Requerente o valor do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios nos termos legais, desde a data em que tal pagamento foi efetuado até à data do integral reembolso do mesmo.

F.            Julgar improcedentes todos os vícios de inconstitucionalidade invocados pela Requerida, por falta de fundamento.

 

XI. VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em € 17.753,02 (dezassete mil, setecentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Fixa-se o montante das custas em € 1.224,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Autoridade Tributária e Aduaneira, uma vez que o pedido foi integralmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 31 de julho de 2019

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O Árbitro

 

(Jorge Carita)