Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 410/2020-T
Data da decisão: 2021-05-10  IUC  
Valor do pedido: € 4.407,49
Tema: IUC – Inexistência de presunção da propriedade (art. 3.º/1 CIUC)
Versão em PDF

DECISÃO ARBITRAL

Sumário

A redacção do n.º 1 do art. 3.º do CIUC introduzida pelo DL 41/2016 de 1.8 acolhe uma ficção legal nos termos da qual a incidência subjectiva do IUC recai sobre a pessoa em nome da qual esteja registada a propriedade do veículo, seja ela ou não o seu proprietário e/ou possuidor.

 

I – Relatório

1. BANCO A… PORTUGAL, SA., sociedade anónima matriculada na Conservatória do Registo Comercial sob o número único de matrícula e de identificação de pessoa colectiva …, com sede na Rua …, n.º …, … …, apresentou, em 05.02.2020, pedido de constituição do tribunal arbitral, nos termos dos art.s 2.º, 10.º e seguintes do DL 10/2011, (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT), em conjugação com o artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

2. A Requerente pretende, com o seu pedido, a declaração de ilegalidade de 41 (quarenta e um) actos de liquidação de imposto único de circulação (IUC), relativos aos anos de 2019, no valor global de € 4.407,49, acrescido de juros compensatórios, bem como do acto de indeferimento de reclamação graciosa daqueles actos de liquidação e do respectivo reconhecimento ao direito a juros indemnizatórios.

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 06.02.2020.

 

4. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no art. 6.º/2 a) e 11.º/1 b) do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou o signatário como árbitro do tribunal arbitral, o qual comunicou a aceitação da designação dentro do respectivo prazo.

 

5. Em 29.09.2020 as partes foram notificadas da designação do árbitro, não tendo sido arguido qualquer impedimento.

 

6. Em conformidade com o preceituado no art. 11.º/1 c) do RJAT, o tribunal arbitral foi constituído em 29.10.2020.

 

7. O Tribunal Arbitral encontra-se, portanto, regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.

 

8. A fundamentar o pedido de pronúncia arbitral a Requerente alega, em síntese, o seguinte:

 

a.            A Requerente é uma instituição de crédito especializada no financiamento ao sector automóvel, sendo que parte substancial da sua actividade se reconduz à celebração – entre outros – de contratos de locação financeira e de aluguer de longa duração destinados à aquisição, por empresas e particulares, de veículos automóveis.

 

b.            Os veículos automóveis a que se referem as liquidações objecto do pedido arbitral foram dados em locação financeira (LSG) e aluguer de longa duração ALD.

 

c.            Quase todos os clientes naqueles contratos adquiriram, no termo do respectivo contrato, o veículo automóvel sobre o qual o mesmo incidia, mediante o pagamento do valor residual do bem locado, acrescido de despesas e IVA.

 

d.            No que se refere aos veículos com as matrículas …-…-… e …-…-…, não se verificou essa aquisição pelo cliente no respectivo termo do contrato por ter havido cessão da posição contratual, ou por ter sido emitida factura em nome de terceiros – o que fez com que os sujeitos que vieram a adquirir aquelas viaturas não coincidem com aqueles que originariamente celebraram o contrato (ou seja, com o anterior locatário).

 

e.            Relativamente aos veículos automóveis com as matrículas …-…-… e …-…-… ocorreu a perda total do mesmo na sequência de sinistros ocorridos antes do término do contrato, pelo que não foram transmitidos para os correspondentes locatários, mas antes para a esfera das Seguradoras com quem tinha sido celebrados os contratos de seguro.

 

f.             Assim sendo, nos meses relevantes dos anos a que reportam os actos tributários em análise, a propriedade de cada um dos veículos automóveis em causa havia sido transmitida para os seus anteriores locatários ou (por ocorrência de um sinistro, cedência da posição contratual ou por indicação expressa do locatário) para terceiros.

 

g.            A Requerente não pode, por isso, ser responsável pelo pagamento do IUC, pois já não era proprietária dos veículos a que se reportam as liquidações de imposto, já que a propriedade de cada um dos veículos havia sido transmitida para os seus anteriores locatários ou, em alternativa, por ter havido cessão da posição contratual, para um terceiro.

 

h.            Não obstante, a Requerente foi notificada para proceder ao pagamento dos IUC (o que veio a fazer) sabendo, ou devendo saber, que os veículos em causa não eram propriedade desta no momento em que os impostos deveriam ser pagos.

 

i.             O fundamento invocado pela AT nos procedimentos graciosos assenta no facto de a propriedade dos veículos automóveis em causa estar ainda registada na … em nome da Requerente nos anos em que se tornaram exigíveis aqueles IUC (apesar de os mesmos já terem sido alvo de transmissão) pelo que a falta de registo dos novos proprietários no momento da exigibilidade dos IUC determina que estes sejam assacados à Requerente.

 

j.             Ora, se a jurisprudência arbitral tem maioritariamente realçado que nem mesmo durante a vigência de um LSG ou de um ALD deve a entidade locadora ser considerada sujeito passivo de IUC, por maioria de razão menos ainda deve ser atribuída a incidência subjectiva desse imposto quando, após o término do contrato, o locatário exerce o seu direito a adquirir o bem locado pelo valor residual, acrescido de despesas e IVA.

 

k.            O sujeito passivo do IUC não deve ser aquele que consta como proprietário no registo automóvel à data do facto tributário do imposto se essa não é a realidade de facto, por ter havido uma transferência de propriedade.

 

l.             Não pode, assim, aceitar-se que o n.° 1 do artigo 3.° do Código do IUC estabelece uma presunção inilidível de incidência subjectiva porque os efeitos do registo automóvel e o princípio da equivalência não apontam nessa direcção e porque esta proposta hermenêutica não se coaduna com os elementos gerais da interpretação das leis, nos termos dos artigos 11.º da Lei Geral Tributária e 9.° do Código Civil.

 

m.          De facto, o registo de propriedade automóvel não é condição de eficácia do contrato de compra e venda do veículo, mas tem somente de eficácia declarativa por estarmos no domínio dos contratos com eficácia real, ou seja, contratos cuja celebração desencadeia um efeito real (a transmissão, constituição, modificação ou extinção de um direito real) que, de acordo com o art. 408.°, n.° 1, do Código Civil, se produz por mero efeito do contrato.

 

n.            A sujeição dos veículos automóveis a registo persegue objectivos de publicidade da situação jurídica dos mesmos estabelecendo uma dupla presunção: por um lado de que o direito existe nos precisos termos em que o registo o define, e por outro, de que aquele direito pertence ao titular a favor de quem o mesmo está registado.

 

o.            Estas presunções são ilidíveis mediante prova em contrário, como resulta expressamente do art. 350.º/2 do Código Civil.

 

p.            O registo da aquisição da propriedade por parte dos locatários tem, portanto, um valor meramente declarativo e não constitutivo, isto é, a inscrição da compra do veículo no registo por parte do novo proprietário não é condição de validade nem da produção do efeito translativo típico do contrato de compra e venda.

 

q.            Embora a lei estipule que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo (art. 5.º/1 do Código do Registo Predial), terceiros, para efeitos de registo são aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si (art. 4.º/4 do mesmo diploma) – ou seja, a falta de registo gera uma (mera) ineficácia relativa, tornando essa aquisição inoponível a um terceiro que venha a adquirir do mesmo vendedor um direito total ou parcialmente incompatível com o direito inicialmente adquirido pelo primeiro comprador (que não efectuou o registo); esta ineficácia relativa da aquisição não prejudica, todavia, a efectiva transmissão do direito de propriedade para a esfera jurídica do comprador (ainda que parcialmente inoponível a certas pessoas), o qual se tornou proprietário por efeito da celebração do respectivo contrato de compra e venda.

 

r.             Assim sendo, uma vez celebrado o contrato de compra e venda do veículo locado a favor do locatário, este adquire a propriedade do mesmo por mero efeito do contrato, e, concomitantemente, a qualidade de sujeito passivo do IUC (agora já não como locatário titular de uma opção de compra, mas como proprietário de pleno direito). Se o proprietário não proceder de imediato ao registo da propriedade a seu favor, presume-se que a propriedade continua a pertencer ao vendedor (art. 7.º do CRP), mas esta presunção é relativa, ou seja, pode ser afastada mediante prova em contrário.

 

s.            Administração Fiscal não preenche os requisitos legais do conceito de terceiro para efeitos de registo, pelo que não pode exigir ao vendedor o pagamento do imposto devido pelo comprador (proprietário) a partir do momento em que a presunção do art. 7.º seja afastada mediante a prova da respectiva venda (artigo 73º da LGT).

 

t.             Acresce que o princípio da equivalência consubstanciado no art. 1.º CIUC impõe que o sujeito passivo do imposto seja o real proprietário do veículo e não o proprietário registado, uma vez que será o primeiro que causa os custos ambientais e viários que este tributo comutativo visa compensar.

 

u.            Deve ainda ter-se em consideração o facto de o legislador sempre ter consagrado a presunção dos sujeitos passivos do imposto serem as pessoas em nome das quais os veículos automóveis se encontravam registados, mas com carácter ilidível,

 

v.            Até porque retirando-se um facto desconhecido de um facto conhecido – como é o caso – se está necessariamente perante uma presunção (349.º CC), a qual, no plano tributário, admite sempre prova em contrário (art. 73.º LGT).

 

w.           Nesse sentido, a conjugação do n.° 1 do artigo 3.° com o n.° 1 do artigo 6.° do CIUC, explicita que o facto gerador do imposto é constituído pela propriedade do veículo, tal como atestada pela matrícula ou registo em território nacional.

 

x.            Por tudo isso, tem de concluir-se que o n.° 1 do artigo 3.° do CIUC configura uma presunção ilidível, permitindo a apresentação de elementos de prova com vista a demonstrar que o titular da propriedade é diverso da pessoa inscrita no registo como tal, constituindo as facturas de venda dos veículos automóveis a prova bastante para tal ilisão.

 

y.            Este entendimento tem sido sufragado pela jurisprudência arbitral (proc. 33/2018-T, 236/2019-T, mesmo após a alteração legislativa introduzida pelo DL 41/2016 de 1.8 (cf. proc. 333/2018-T, 236/2019-T e 283/2019-T)

 

9. Conclui, por isso, a Requerente pela ilegalidade das liquidações objecto do pedido arbitral, bem como dos aludidos despachos de indeferimento, reclamando ainda o direito a juros indemnizatórios (nos termos do art. 43.º da LGT) e à responsabilização da Requerida pelas custas do processo.

 

10. Por seu turno, a Requerida veio, em resposta, alegar, em síntese:

a.            Até á alteração introduzida pelo DL 41/2016 de 1.8 (autorizado pela L 7-A/2016 – Orçamento de Estado para 2016) a jurisprudência arbitral entendia que, á luz do art. 3.º do CIUC, o contribuinte podia demonstrar que, ainda que constasse do registo automóvel como titular do direito de propriedade sobre o veículo em causa, não era efectivamente o titular desse direito à liquidação.

 

b.            O legislador fiscal entendeu, todavia, alterar aquela norma, esclarecendo definitivamente, que a tributação incide sobre o titular do direito de propriedade do veículo automóvel, tal como se encontra no registo automóvel.

 

c.            Essa alteração decorreu do DL 41/2016 de 1.8 que explicita no seu preâmbulo tal intenção e introduz no referido art. 3.º/1 do CIUC uma nova redacção determinando agora serem sujeitos passivos as pessoas singulares ou colectiva de direito público ou privado em nome das quais se encontre registada a propriedade dos veículos.

 

d.            Deixou, por isso, de se estabelecer qualquer presunção legal, fixando-se a incidência sobre a pessoa que detém o registo da propriedade automóvel.

 

e.            Ora, no caso, as liquidações de IUC reportam-se ao período de 2019 – posteriores à alteração em causa, que retirou da norma em questão a expressão considerando-se como tal, sobre a qual assentava a presunção.

 

f.             Os termos actuais do artigo 3.º/1 do CIUC são peremptórios: a incidência do IUC recai sobre a pessoa cujo nome figura no registo automóvel, sendo, por conseguinte, indiferente para efeitos de tributação se tal pessoa é, ou não, o proprietário de facto.

 

g.            A incidência apenas pode, portanto, ser afastada através das entidades competentes e pelos meios legais previstos, ou seja, junto do Instituto da Mobilidade Terreste e do Instituto dos Registos e Notariado, mediante a regularização da realidade registral – tal como o tribunal arbitral tem decidido (cf. proc.os 462/2019-T, 557/2019-T, 821/2019-T e 61/2020-T).

 

h.            Não colhe também o argumento da Requerente no sentido de existir qualquer falta de fundamentação, sendo que a necessidade da mesma varia consoante o tipo legal de acto administrativo em concreto, e, a existir deveria ter solicitada pela Requerente a emissão da certidão prevista no art. 37.º do CPPT.

 

i.             Não tendo a Requerente usado daquela faculdade conferida pela lei, forçoso se torna concluir que os actos sub judice continham, e contêm, todos os elementos necessários à sua cabal compreensão e que o apregoado vício de que padecia ficou sanado.

 

j.             Por outro lado, os documentos que a Requerente junta para ilisão de pretensa presunção não provam de forma clara e inequívoca que ocorreu a transmissão do veículo e consequentemente da propriedade do mesmo, não sendo junto um único extracto financeiro ou cheque que prove que as facturas foram pagas ou que os contratos foram cumpridos a que acresce o facto de as facturas não serem aptas a comprovar a celebração de um contrato sinalagmático.

 

k.            A interpretação da Requerente mostra-se contrária à Constituição, na medida em que tal interpretação se traduz na violação do princípio da confiança, do princípio da segurança jurídica, do princípio da eficiência do sistema tributário e do princípio da proporcionalidade, na medida em que desvaloriza a realidade registral em detrimento de uma realidade informal e insusceptível de um controlo mínimo por parte da AT.

 

l.             Os actos tributários em crise são, por isso, válidos e legais, porque conformes ao regime legal em vigor à data dos factos tributários, pelo que, não ocorreu in casu qualquer erro imputável aos serviços, não estando, em qualquer circunstância, reunidos os pressupostos legais que conferem o direito peticionado a juros indemnizatórios.

 

11. Em 16.03.2021 o tribunal arbitral dispensou a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT bem como a bem como a apresentação de alegações escritas.

 

II. Saneamento

 

12. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente.

 

13. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (art.os 4.º e 10.º/2 do RJAT e art. 1.º da Port.ª 112-A/2011, de 22.3).

 

14. A cumulação de pedidos é legal (art. 3º/1 do RJAT).

 

III. Matéria de facto

Factos provados

15. Atendendo às posições assumidas pelas partes e à prova documental junta aos autos – tendo presente que o Tribunal não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa de pedir que fundamenta o pedido formulado (cfr.artos. 596.º/1 e 607º/2 a 4, do CPC, na redacção da L 41/2013, de 26.6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr. art. 123.º, nº.2, do CPPT)] – consideram-se, com relevo para apreciação e decisão das questões suscitadas e provados os seguintes factos:

 

A.           A Requerente é uma instituição de crédito, assumindo especial relevância, na sua actividade comercial, o financiamento ao sector automóvel, designadamente através da celebração de contratos de locação financeira e de aluguer de longa duração.

 

B.            A Requerente foi notificada de quarenta e um actos de liquidações de IUC, relativos ao ano de 2019, no montante global de € 4.407,49 conforme Anexo A, junto ao pedido inicial, tendo apresentado reclamações graciosas contra os mesmos que foram parcial ou totalmente indeferidas (Anexo B).

 

C.            A Requerente emitiu facturas de venda relativamente a todas as viaturas automóveis a que respeitam as liquidações objecto do presente processo, antes da data a que as mesmas respeitam.

 

D.           A Requerente procedeu ao pagamento do imposto a que respeitam os presentes autos.

 

16. Os factos foram dados como provados com base no processo administrativo remetido pela Requerida, na análise crítica dos documentos juntos ao processo.

 

Factos não provados

17. Não há factos relevantes para esta decisão arbitral que não se tenham provado.

 

III. Matéria de Direito

18. A questão de fundo a apreciar no presente processo reside na interpretação a dar ao art. 3.º/1 do CIUC no sentido de apurar se a norma de incidência subjectiva nele contida estabelece uma presunção legal juris tantum – susceptível de ilisão – ou se, pelo contrário, contém uma definição expressa e intencional da incidência pessoal, no sentido de que é necessariamente sujeito passivo do imposto aquele em nome de quem o veículo automóvel está registado como proprietário.

 

19. A todas as liquidações se aplica a actual redacção da referida norma (art. 3.º/1 CIUC), que entrou em vigor em 02.08.2016 (DL 41/2016 de 1.8).

 

20. Dispõe essa norma que [s]ão sujeitos passivos do imposto as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais se encontre registada a propriedade dos veículos.

 

21. Sustenta a Requerente que ao retirar um facto desconhecido de um facto conhecido a nova redacção estabelece necessariamente uma presunção, ao passo que a AT considera que a nova recção deixou de consagrar qualquer presunção legal, impedindo os aqueles que constam no registo como proprietários de afastarem a incidência do IUC alegando a transmissão da propriedade.

 

22. Esta questão já foi objecto de várias decisões do CAAD (cf. proc.os 256/2020-T, 90/2020-T,  557/2019-T, 658/2018-T).

 

23. Parece claro que a alteração dos termos do art. 3.º do CIUC visou determinar que a incidência subjectiva do IUC recai sobre a pessoa em nome da qual está registada a propriedade do veículo, seja ela ou não o seu proprietário e/ou possuidor (Ac. TCA Norte de 21.2.2019, proc. n.º 00611/13.4BEVIS)

 

24. De facto, o legislador ao alterar o art. 3.º CIUC pelo DL 41/2016 de 1.8 não tinha a intenção de introduzir uma presunção legal, mas, antes, uma ficção legal, através da qual estabelece que o facto ou situação a regular é ou se considere (como se juridicamente fosse) igual àquele facto ou situação para que já se acha estabelecido um regime na lei. Trata-se da assimilação fictícia de realidades factuais diferentes, para efeito de as sujeitar ao mesmo regime jurídico (Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra: Almedina, 1983, p. 108).

 

25. Assim sendo, acolhendo-se a jurisprudência que se vem firmando nos Tribunais superiores e no CAAD quanto à incidência subjectiva do imposto na nova redacção do n.º 1 do art. 3.º do CIUC (redacção que se aplica às liquidações aqui em causa), não pode deixar de concluir-se pela legalidade das ora questionadas liquidações de IUC bem como das decisões de indeferimento das correspondentes reclamações graciosas.

 

26.  Nestes termos, mostra-se inútil proceder à apreciação das questões suscitadas pela Requerente relativas à prova de que, à data da ocorrência do facto gerador e exigibilidade do imposto, as viaturas a que este respeita já lhe não pertenciam por terem sido transmitidas a terceiros; ficando, também, prejudicada a apreciação do pedido de juros indemnizatórios.

 

IV. Decisão

Em face do supra exposto, decide-se

1.            Julgar totalmente improcedente o pedido de declaração da ilegalidade dos actos de indeferimento das reclamações graciosas, e dos quarenta e um actos de liquidação de IUC que lhe subjazem;

2.            Condenar a Requerente no pagamento integral das custas do presente processo.

 

V. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 4.407,49 (quatro mil quatrocentos e sete euros e quarenta e nove cêntimos) nos termos do disposto no art. 32.º do CPTA e no art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º/1 a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º/2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

VI. Custas

Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de 612.00 € (seiscentos e doze euros), a pagar pela Requerente, nos termos dos artigos 12.º/2, e 22.º/4, do RJAT, e artigo 4.º/5, do RCPAT.

 

Notifique-se.

Lisboa, 10 de Maio de 2021

 

O Árbitro

Rui M. Marrana

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto

no art. 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.