Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 81/2014-T
Data da decisão: 2014-11-17  Selo  
Valor do pedido: € 38.343,19
Tema: IS – verba 28.1 da TGIS / prédios com “afetação habitacional”
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

I. RELATÓRIO

1. A, com o NIF …, gerido e representado legalmente pela sociedade gestora B, S.A., adiante identificada por Requerente, solicitou em 3 de Fevereiro de 2014, a constituição de tribunal arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (adiante, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária ou RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 março, com vista:

a)      à declaração de ilegalidade das decisões expressas de indeferimento das reclamações graciosas onde contestaram as liquidações de Imposto do Selo (“IS”), nºs 2013 … (cuja colecta anual liquidada é de € 11.604,80) e nºs 2013 … (cuja colecta anual liquidada é de € 26.738,39), no valor global de € 38.343,19 e que deram origem a estes processos de reclamação graciosa; e,

b)      à anulação dessas liquidações;

 

2. As Liquidações Contestadas têm por objeto a tributação, nos termos da verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto do Selo (“TGIS”), da propriedade de “prédios com afectação habitacional” com um valor patrimonial tributário (“VPT”) igual ou superior a € 1.000.000, tendo por referência o ano de 2012.

3. Foram emitidas à Requerente, sendo a obrigação do seu pagamento fraccionada em três prestações.

4. Por as considerar ilegais, a Requerente apresentou, em 27 de Agosto de 2013, reclamações graciosas dessas liquidações a pedir a respectiva anulação.

5. As reclamações graciosas apresentadas pela Requerente foram objecto de uma decisão expressa de indeferimento no dia 26 de Setembro de 2013.

6. O prazo para apresentar pedido de constituição de Tribunal Arbitral, contado a partir da notificação do indeferimento das reclamações graciosas, foi respeitado.

 

7. No pedido, as Requerentes optaram por não designar árbitro.

 

8. Nos termos do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou o ora signatário Árbitro Singular, desse facto notificando as partes.

 

9. O tribunal encontra-se regularmente constituído desde o dia 9 de Abril de 2014, para apreciar e decidir sobre o objecto do processo.

 

10. Os fundamentos que sustentam o pedido de pronúncia arbitral das Requerente são, em súmula, e quanto aos factos, os seguintes:

10.1 A Requerente, por aquisição feita à C, em 22 de Dezembro de 2006, é dona e legitima possuidora dos seguintes prédios urbanos:

(i) Prédio urbano sito na …, Lote …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº …, freguesia … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …; e,

(ii) Prédio urbano sito na …, Lote …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº …, freguesia … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….

 

10.2 Á data da referida aquisição, os dois prédios já integravam o projecto de obras de urbanização, na …, para o qual foi emitido o correspondente alvará de loteamento (com o nº …)

10.3 No alvará de loteamento, os referidos lotes já se destinavam à construção de um campo de golfe.

10.4 Os sucessivos aditamentos efectuados a este alvará inicial, não alteraram o destino dado aos referidos lotes.

10.5 Os supra identificados lotes foram inaugurados como Campo de Golfe em 1994, pelo que à data da sua aquisição, já tinham esse destino, ou seja, já se tratavam efectivamente de campos de golfe.

10.6 Atendendo a que na data da sua aquisição, os prédios em questão ainda não se encontravam avaliados, a Requerente promoveu essa avaliação entregando, para o efeito, a respectiva declaração Modelo 1, onde, como seu destino, foi referido “Outros/Campo de Golfe”.

10.7 Em Setembro de 2010, a Requerente, ao abrigo do artigo 130º nº 3 al. a) e nº 4 do CIMI, promoveu um novo pedido de avaliação, por considerar a que o Valor Patrimonial Tributário (VPT) estava desactualizado, sendo que nas novas declarações Modelo 1 entregues para este efeito, foi, uma vez mais, declarado o destino anteriormente dado aos prédios, ou seja, Campos de Golfe.

10.8. Tendo a avaliação promovida pelo competente Serviço de Finanças sido feita com base nos elementos declarados pela Requerente, dai resultando que ambos os imóveis foram considerados, pela entidade avaliadora (Autoridade Tributária), como se tratando e estando destinados a Campos de Golfe.

10.9 O que levou a que, quando definitivamente transcritos para as matrizes foi a essa a natureza, tipo, afectação e composição que lhes foi conferida, conforme consta dos documentos anexos à petição inicial.

10.10 Em Março de 2013, a Requerente foi notificada da liquidação de IS relativas as estes prédios, emitidas ao abrigo do disposto na verba 28.1 da Tabela Geral do IS (TGIS), liquidação da qual a Requerente, por não poder concordar com a mesma, deduziu as reclamações graciosas correspondentes a cada um dos prédios em causa.

10.11 A essas reclamações foram dados os números … e ….

10.12 Posteriormente, a Requerente foi ainda notificada das liquidações referentes às segunda e terceira prestações referentes a este imposto.

 

11. Quanto ao direito, as Requerentes sustentam o seu pedido, nos seguintes fundamentos:

11.1. Como questão prévia, a Requerentes, considerando que a realidade factual e jurídica é a mesma nos dois factos tributários sub judice, pretende, ao abrigo do princípio da economia processual, submeter a sua apreciação e julgamento a ilegalidade das duas decisões de indeferimento e dos actos tributários de liquidação a elas subjacentes

11.2. A Requerente considera que as liquidações contestadas são ilegais, nos seguintes termos:

i)          A verba 28.1 da TGIS tem como previsão os prédios com afectação habitacional, sendo que não existe, no seu entendimento, qualquer definição legal, deste conceito.

ii)          Atenta esta inexistência de definição legal, deve-se, nos termos do Código do Imposto do Selo e da remissão que aí é feita no seu artigo 67º nº 2, ter em conta o conceito e a classificação dos prédios constantes no Código do IMI, mais concretamente no seu artigo 6º.

iii)          No artigo 6º do CIMI os prédios urbanos dividem-se em “Habitacionais”, “Comerciais, industriais ou de serviços”, “Terrenos para construção” e “Outros”, sendo que neste preceito se esclarece e define, de forma clara e inequívoca, cada um destes conceitos.

iv)          Neste sentido, dispõe o nº 2 do artigo 6º do CIMI, que se consideram habitacionais os edifícios ou construções para tal licenciadas, ou, na falta de licença, aqueles que tenham como destino normal este fim.

v)          A AT, no caso em apreço, e de forma inexplicável, perfilha o entendimento que, os prédios em questão têm como destino a habitação, ignorando, de forma intencional, o licenciamento aprovado para os prédios em causa, designadamente o alvará de loteamento e a inscrição constante da matriz.

vi)          Considera, assim, a Requerente que os Campos de Golfe, que é a utilização efectiva dos prédios em questão, mais não podem que consubstanciar a espécie “outros”, que é uma espécie total e completamente autonomizada e distinta da espécie de prédios tipificados como “habitacionais”.

vii)          Nos termos da Constituição da República Portuguesa (CRP), não pode a AT, por via da analogia e/ou da interpretação extensiva, alterar a incidência dos impostos, o que pretende fazer neste caso, ao alterar a incidência do tributo referido (Imposto do Selo) assimilando um campo de golfe a um prédio com afectação habitacional.

viii)          Ora, considera a Requerente, um “Campo de Golfe” não pode, de forma alguma, ser subsumível no conceito de prédio com afectação habitacional, quer olhando à letra da lei, quer olhando à vontade do próprio legislador.

ix)          Bastando, neste último caso (vontade do legislador), atender ao que foi expressamente assumido na referida Lei 55-A/2012, onde se indica que se pretende tributar o “património considerado de luxo”, o que pressupõe que o tributado (sujeito passivo) deve ser o consumidor/utilizador do mesmo.

x)          O que se pretendeu tributar, como resulta do próprio debate parlamentar prévio à aprovação daquele diploma, foi, pois, habitações, ou na terminologia ai adoptada, casas, ou propriedades de alto valor.

xi)          O conceito “casas” é, no entendimento da Requerente, bastante para esclarecer qual a espécie de prédios urbanos abrangidos pela norma criada.

xii)          O facto de ter sido utilizado um qualquer tipo de coeficiente de habitação na avaliação dos prédios, não é susceptível de confundir ou influenciar o fim a que os prédios se destinam, e que é a pedra de toque para aplicação da norma constante da verba 28.1 da TGIS.

xiii)          Ora, sendo estes prédios Campo de Golfe não reúnem as características funcionais (nem mesmo em termos potenciais) para serem habitáveis, pelo que não preenchem o requisito elementar na referida norma para a sua aplicação.

xiv)          Conclui a sua argumentação, citando a Decisão Arbitral proferida no âmbito do Processo 42/2013-T, com particular ênfase na parte onde o Tribunal interpretou a expressão “afectação habitacional”, aí considerando que a expressão prédio urbano com esse tipo de afectação se reconduz à de prédio urbano habitacional, previsto no artigo 6º nº 1, alínea a) do CIMI.

11.3. Por fim, a Requerente sustenta que a manter as liquidações contestadas, violam o disposto nos artigos 103º e 104º da Constituição da República Portuguesa (CRP), pelo que, também por isso, devem ser anuladas.

 

12. Na sua contestação, a AT defende que os prédios sobre os quais recaem as liquidações impugnadas, tratando-se de campos de Golfe, têm a natureza jurídica de prédios com afectação habitacional, pelo que os actos de liquidação devem ser mantidos.

A AT sustenta a sua posição com os seguintes argumentos:

12.1 Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano e afectação habitacional em sede de IS, deve-se, face ao disposto no artigo 67º nº 2 do Código do IS, recorrer ao CIMI na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS

12.2 No CIMI, a noção de afectação de prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que no entender da AT se justifica e compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante.

12.3 O legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral à avaliação dos terrenos para construção, pelo que lhes é aplicável o coeficiente de afectação previsto no artigo 41º do CIMI (cf., para o efeito, o Acordão nº 04950/11 de 14.02.20129).

12.3 Assim, para efeitos de determinação do VPT dos imóveis urbanos é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS não pode ser ignorada.

12.4 A verba 28 da TGIS ao remeter para a expressão “prédios com afectação habitacional”, apela a uma classificação que se sobrepõe às espécies previstas no artigo 6º nº 1 do CIMI.

12.5 Assim, a AT considera que o conceito de “prédios com afectação habitacional” para efeitos da verba 28 da TGIS, inclui quer os prédios edificados, quer os terrenos que não integrem o conceito de rústico, e cujo propósito final seja a sua afectação habitacional.

12.6 Considera a AT que o legislador ao não referir “prédios destinados a habitação”, optando pela noção “afectação habitacional”, quer integrar neste conceito outras realidades para além das que estão identificadas no artigo 6º alínea a) do CIMI.

12.7 Os prédios sobre os quais incidiram as liquidações contestadas foram avaliados como imóveis com afectação habitacional e integram um núcleo urbano de matriz habitacional.

12.8 Na inscrição matricial destes prédios, eles foram expressamente qualificados como habitacionais e, por isso, foram dessa forma avaliados.

12.9 Assim sendo, estão preenchidos os requisitos para sobre estes prédios recair a tributação em sede de IS pela verba 28.1 da TGIS.

12.10 Entende ainda a AT que a previsão da verba 28.1 não consubstancia a violação de qualquer comando constitucional, pois a verba 28 da TGIS não põe, de forma alguma, em causa os princípios da igualdade e da proporcionalidade.

12.11 Na medida em que se trata de uma norma geral e abstracta que é aplicável, de forma indistinta a todos os casos em que se verifiquem os respectivos pressupostos, quer de facto, quer de direito.

12.12 Considera a AT que a diferente aptidão de um imóvel sustenta a diferença de tratamento, tendo sido opção do legislador, por razões económicas e políticas, afastar da incidência de IS os imóveis destinados a fins que não os habitacionais.

12.13 Pelo que a medida implementada procura buscar um máximo de eficácia quanto ao objectivo a atingir, com o mínimo de lesão para outros interesses considerados relevantes.

12.14 A violação dos referidos princípios não se verifica porquanto esta medida é aplicável, de forma indistinta a todos os titulares de prédios com afectação habitacional que tenham um VPT superior a € 1.000.000,00.

 

13. Em 4 de Setembro de 2014, teve lugar a reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, na sequência da qual, a Requerente apresentou as suas alegações no dia 15 de Setembro

 

14. A Requerida não exerceu esse direito de apresentar alegações.

 

15. Nas referidas alegações, a Requerente manteve os argumentos já deduzidos no pedido de constituição do Tribuna Arbitral, já acima descritos de forma pormenorizada, pelo que o Tribunal se dispensa de os referir nesta fase.

 

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1 MATÉRIA DE FACTO

1.                  A Requerente é dona e legítima proprietária dos seguintes prédios sobre os quais incidiram as liquidações de Imposto do Selo (IS):

(i)                 Prédio urbano sito na …, Lote …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº …, freguesia … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo …; e,

(ii)               Prédio urbano sito na …, Lote …, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº …, freguesia … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….

2.                  Todos os prédios sobre os quais incidiu a liquidação de IS estão qualificados, nas respectivas matrizes, como Campos de Golfe.

3.                  As Liquidações contestadas têm por objecto a tributação dos prédios acima identificados nos termos da verba 28.1 da TGIS, por se tratarem de prédios urbanos com afectação habitacional com VPT superior a € 1.000.000,00.

4.                  Em 27 de Agosto de 2013, a Requerente deduziu reclamação graciosa destas liquidações, tendo-lhes sido atribuído os nºs … e ….

5.                  Essas reclamações graciosas foram objecto de indeferimento no dia 26 de Setembro de 2013.

6.                  Em 3 de Fevereiro de 2014, a Requerente apresentou o pedido de constituição do Tribunal Arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (adiante, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária ou RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 março, tendo em vista a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de IS e dos subsequentes actos de indeferimento das reclamações graciosas.

7.                  O Tribunal Arbitral ficou constituído no dia 9 de Abril de 2014.

 

A decisão da matéria dos factos provados baseou-se nos documentos juntos ao processo e na não oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira quanto a factos invocados pelas Requerentes.

Não há factos não provados com relevo para a decisão da causa.

 

II.2 QUESTÃO A APRECIAR

A primeira, e diga-se também que a principal questão, tem que ver com o enquadramento legal dos prédios identificados no número 1 do ponto II.1 supra, no âmbito de incidência da verba 28.1 da TGIS.

Conforme já foi referido, as liquidações contestadas pelas Requerentes foram emitidas ao abrigo da norma de incidência constante da verba 28.1 da TGIS, com a redacção que tinha na época a que se reportam os factos.

Entende a Requerente que, sendo os prédios objecto de tributação qualificados e registados na matriz como Campos de Golfe, é manifestamente ilegal a liquidação, porque esses prédios não podem, de forma alguma, ser considerados como “prédios com afectação habitacional”.

A questão fundamental é, pois, determinar se os prédios em questão podem ter uma “afectação habitacional”.

Como vimos, a Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro, introduziu diversas alterações ao Código do Imposto do Selo, e aditou à TGIS a verba 28, a que deu a seguinte redacção:

 

“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%

8.2 - ………..

 

A referida Lei veio depois, no seu artigo 6º, estabelecer algumas normas transitórias de aplicação, tendo aí, da mesma forma que na citada e transcrita verba 28, utilizado, novamente, o mesmo conceito de prédio com afectação habitacional.

Refira-se que este conceito não é utilizado pelo legislador em qualquer outra legislação de natureza tributária, designadamente no CIMI, que, em várias normas do CIS é indicado como o diploma de aplicação subsidiária relativamente ao tributo previsto na verba 28 da TGIS (confira-se, a este propósito, os artigos 2º nº 4, 3º nº 3 u), 5º u), 23º nº 7 e 46º e 67º do CIS).

Efectivamente, no CIMI, como é referido por ambas as Partes nas suas peças processuais, mais concretamente nos seus artigos 2º a 6º, enumeram-se e definem-se as espécies de prédios nos seguintes termos:

 

 

 

Artigo 2º

Conceito de prédio

1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.

2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.

3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.

4 - Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.

 

Artigo 3º

Prédios rústicos

1 - São prédios rústicos os terrenos situados fora de um aglomerado urbano que não sejam de classificar como terrenos para construção, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º, desde que:

a) Estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, tais como são considerados para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS);
b) Não tendo a afectação indicada na alínea anterior, não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica e de reduzido valor.

 

2 - São também prédios rústicos os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano, desde que, por força de disposição legalmente aprovada, não possam ter utilização geradora de quaisquer rendimentos ou só possam ter utilização geradora de rendimentos agrícolas e estejam a ter, de facto, esta afectação.
 

3. São ainda prédios rústicos:
a) Os edifícios e construções diretamente afetos à produção de rendimentos agropecuários, quando situados nos terrenos referidos nos números anteriores; 

b) As águas e plantações nas situações a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º

4 - Para efeitos do presente Código, consideram-se aglomerados urbanos, além dos situados dentro de perímetros legalmente fixados, os núcleos com um mínimo de 10 fogos servidos por arruamentos de utilização pública, sendo o seu perímetro delimitado por pontos distanciados 50 m do eixo dos arruamentos, no sentido transversal, e 20 m da última edificação, no sentido dos arruamentos.

 

Artigo 4º

Prédios urbanos

Prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.

 

Artigo 5º

Prédios mistos

1 - Sempre que um prédio tenha partes rústica e urbana é classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal.

2 - Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio é havido como misto.

 

Artigo 6º

Espécies de prédios urbanos

1 - Os prédios urbanos dividem-se em:
a) Habitacionais;
b) Comerciais, industriais ou para serviços;
c) Terrenos para construção;
d) Outros.

2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

3 - Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos. 

4 - Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.

 

 

Fácil é, pois, constatar que, como já se referiu supra, o conceito de “prédio com afectação habitacional” não é utilizado pelo legislador no CIMI.

Assim, uma interpretação literal da norma constante da verba 28.1 da TGIS leva a concluir que a intenção do legislador foi a de incluir no seu âmbito de aplicação os prédios urbanos que tenham uma afectação habitacional.

Partindo desta intenção, deve-se apurar quando é que um prédio está afectado a um fim habitacional, designadamente se é quando lhe é fixado esse destino num qualquer acto de licenciamento ou num acto com semelhante natureza, ou se é apenas quando a atribuição desse destino é efectivamente concretizada.

Da redacção dada à verba 28.1, parece claro que a intenção do legislador foi a de considerar necessária uma afectação efectiva e não apenas quando os prédios, terrenos, edifícios ou construções foram para tal licenciados - ou, na falta dessa licença, aqueles que tenham como destino normal esse fim.

Se o legislador, na verba 28.1 se bastasse com estes factos teria utilizado a expressão “prédios habitacionais” constante do artigo 6º do CIMI e não a expressão “prédios com afectação habitacional”.

Daqui resulta, pois, que prédio com “afectação habitacional” não poderá ser apenas um prédio licenciado para habitação ou destinado a esse fim, tendo que “ser algo mais que isso”, isto é, terá que ser um prédio com uma efectiva afectação a esse fim habitacional.

Tendo que ser, dessa forma, algo de efectivamente edificado.

Ora, os prédios classificados como Outro/Campos de Golfe não têm, obviamente, qualquer tipo de edificação com um fim habitacional (a não ser uma edificação afecta à prática desse desporto, normalmente denominada como “Club House”), não preenchendo, dessa forma, qualquer condição que os possam levar a ser considerados como prédios habitacionais, logo, por maioria de razão, “prédios com afectação habitacional”.

Na medida em que o entendimento correcto é o de que a norma da verba 28.1 só estará preenchida, quando a afectação habitacional estiver efectivamente concretizada.

Desta forma, não nos parece possível acompanhar a tese defendida pela Requerida (AT), de que basta ter utilizado, no processo de avaliação dos prédios, o coeficiente de afectação “habitação” para se estar perante um prédio com afectação habitacional,

Sendo, dessa forma, de acolher, a tese suportada pela Requerente de que não pode ser atribuída afectação habitacional a Campos de Golfe.

Em conclusão, considera este Tribunal que as liquidações contestadas estão feridas de ilegalidade, na medida em que incidem sobre prédios cujo destino é o de serem Campos de Golfe, realidade esta que, pelas razões que foram sendo expostas, não pode estar incluída no conceito de “prédios com afectação habitacional” consagrado na verba 28.1 da TGIS.

 

II.3 QUESTÕES DE CONHECIMENTO PREJUDICADO

Face à decisão do Tribunal d declaração de ilegalidade das liquidações contestadas, objecto do presente processo, fica prejudicada a apreciação dos restantes vícios questionados pelas Requerentes, nomeadamente de que estas liquidações violavam os princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade.

 

III. DECISÃO

Em face do exposto, decide-se julgar procedente o pedido de anulação das Liquidações Contestadas, por vício de violação de lei, e dos actos de indeferimentos das reclamações graciosas apresentadas pelas Requerentes relativas a estas liquidações.

 

IV. VALOR DO PROCESSO

 

De harmonia com o disposto no artigo 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária atribui-se ao processo o valor de € 38.343,19 (trinta e oito mil trezentos e quarenta e três euros e dezanove cêntimos).

 

 

V. CUSTAS

De acordo com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante das custas é de € 1.836,00 (mil oitocentos e trinta e seis euros).

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 17 de Novembro de 2014

 

 

 (João Marques Pinto)