Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 18/2019-T
Data da decisão: 2019-05-31  IRS  
Valor do pedido: € 2.000,00
Tema: IRS – Categoria B, alínea c) do art.º 31.º, n.º 1 do CIRS - Ónus da Prova
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DECISÃO ARBITRAL

 

RELATÓRIO

A -PARTES

A..., titular do número de contribuinte..., com domicílio fiscal na Rua..., n.º..., no Porto, doravante designado como Requerente ou Sujeito Passivo.

AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA (que sucedeu à Direcção-Geral dos Impostos, por meio do Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de Dezembro), doravante designada como AT ou Requerida.

No dia 10-01-2019, foi aceite o pedido de constituição do Tribunal Arbitral pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e automaticamente foi notificada a Autoridade Tributaria e Aduaneira, conforme consta da respetiva ata.

O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou como arbitro o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ferreira Alves, que comunicou a sua aceitação, nos termos legalmente previstos.

Em 04-03-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Deste modo, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 25-03-2019.

Ambas as partes, concordaram com a dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

B – PEDIDO       

1.            O Requerente, peticiona a declaração de ilegalidade parcial do ato tributário de liquidação, em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares referente ao ano de 2017, com o n.º 2018... .

C – CAUSA DE PEDIR

2.            A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, o Requerente alegou em síntese, com vista a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação, em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, já descrito no ponto 1, o seguinte:

2.1.        Com referência ao ano de 2017, apresentou a sua declaração anual de rendimentos, Modelo 3, onde declarou rendimentos de trabalho dependente e de trabalho independente, este último no âmbito do regime simplificado de determinação da matéria coletável.

2.2.        No Anexo A ao Modelo 3, declarou como rendimentos de trabalho dependente a quantia €26.120,92.

2.3.        No Anexo B ao Modelo 3, declarou como rendimentos de trabalho independente a quantia de €11.250,00 relativa a rendimentos provenientes do exercício das atividades profissionais especificamente previstas na tabela do art. 151.º do CIRS (campo 403) e a quantia de €14.945,61 relativa a rendimentos de outras prestações de serviços (campo 404).

2.4.        Por despacho do Chefe do Serviço de Finanças do Porto–..., os rendimentos tempestivamente declarados pelo Impugnante na declaração Modelo 3 foram objeto de correção.

2.5.        Sustenta o Requerente, que não foi notificado desse despacho de alteração.

2.6.        Em 19-09-2018, o Serviço de Finanças do Porto-... emitiu uma Declaração Oficiosa com n.º ...

2.7.        Nessa sequência, em 8-10-2018 foi proferida a Liquidação n.º 2018... relativa ao IRS de 2017.

2.8.        Sustenta o Requerente que, a Liquidação Impugnada teve por base uma alteração do rendimento de trabalho independente declarado pelo Impugnando, na medida em que considerou o campo 404 do Anexo B com valor nulo e fez inscrever no campo 403 do Anexo B o montante de € 26.195,61.

2.9.        Diz que no regime simplificado os rendimentos de trabalho independente a que se refere o campo 404 do Anexo são levados ao rendimento tributável em 35% do seu montante

2.10.      E que por seu turno, os rendimentos de trabalho independente a que se refere o campo 403 do Anexo B são levados à matéria tributável em 75% do seu montante.

2.11.      O que segundo o Requerente, significa que, por força das alterações efetuadas aos rendimentos por si declarados, o seu rendimento tributável foi – ilegalmente, como demonstrará – agravado em €5.978,75.

2.12.      De acordo com a declaração de rendimento por si tempestivamente apresentada, o rendimento líquido da categoria B teria sido de € 13.667,96, resultante: a. Da aplicação do coeficiente 0,75 aos rendimentos declarados no campo 403 do Anexo B ao Modelo 3, perfazendo assim um rendimento líquido de €8.437,00, e b. da aplicação do coeficiente 0,35 aos rendimentos declarados no campo 404 do Anexo B ao Modelo 3, perfazendo assim um rendimento líquido de €5.230,96.

2.13.      Porém, a Liquidação Impugnada teve por base o rendimento líquido da categoria B resultante da aplicação do coeficiente 0,75 à totalidade dos rendimentos brutos dessa categoria, perfazendo assim um rendimento líquido de €19.646,71.

2.14.      O Requerente defende, que as prestações de serviços correspondentes às Faturas n.º 1000000 e n.º 1000001 não foram realizadas pelo Impugnante no âmbito da sua atividade de advogado, e que isso mesmo foi declarado no teor das referidas faturas.

2.15.      O mesmo sucede quanto às prestações de serviços correspondentes às faturas-recibo n.os 38, 41 e 43, defendendo que a AT não avança um único facto ou argumento que permita sustentar a conclusão de que as prestações de serviços tituladas por tais faturas-recibos seriam “conexas” com a atividade de advogado.

2.16.      Defende que a Liquidação Impugnada está ferida: - Ilegalidade decorrente de ineficácia jurídica do ato que procedeu à alteração dos rendimentos declarados pelo Impugnante; - Ilegalidade decorrente de violação do princípio da presunção de veracidade das declarações dos contribuintes; - Ilegalidade decorrente de violação do princípio da participação procedimental.

 

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

3.            A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta, alegando em síntese abreviada, o seguinte:

3.1.        Pela análise ao registo dos códigos de atividade constantes em cadastro no registo de atividade do Requerente, verificou-se que constavam os seguintes códigos de atividade: - Código 6010- Advogado (atividade principal) e; - Código 1519- outros prestadores de serviços (atividade secundária)  - Código de atividade 69101- atividades jurídicas e código 90030- Criação artística e literária (atividade secundárias) de acordo com a Classificação Portuguesa de atividades económicas (CAE) do Instituto nacional de estatística.

3.2.        Defende a Requerida, que sendo o serviço prestado por um advogado ou jurisconsulto, pela exigência de conhecimentos e competências várias, e sujeito a princípios éticos e deontológicas próprios, com regras próprias de conduta de confiança, competência e prudência, que pela complexidade que abrange, é bem mais que uma simples prestação de serviços indiferenciada e genérica como a que se encontra prevista pelo código 1519- outros prestadores de serviços (da tabela anexa ao art.º 151.º do CIRS).

3.3.        Verifica-se que as instruções de preenchimento dos modelos de impressos destinados ao cumprimento da obrigação declarativa prevista no n.º 1 do art.º 57.º do CIRS, são claras, percetíveis e esclarecem que o “ Campo 403, do quadro 4-A do anexo B, da Modelo 3 de IRS, se destina à indicação dos rendimentos auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços que tenha enquadramento na alínea b) do n.º 1 do artigo 3.º do código do IRS, independentemente da atividade exercida estar classificada segundo a Classificação Portuguesa de Atividades Económicas (CAE),  do Instituto de Estatística, ou de acordo com os códigos mencionados na tabela de atividades aprovada pela Portaria n.º 1011/2001, de 21 de agosto, com exclusão da atividade com o código 1519- outros prestadores de serviços.

3.4.        O rendimento obtido no âmbito da atividade de advogado ou de jurisconsulto, quer seja exercida no estrito respeito pelas regras da advocacia, quer materializada noutra forma de prestação de serviços por conta própria, nomeadamente jurisconsulto, consultadoria jurídica, arbitragem jurídica, patrocínio judiciário, estão tipificados como rendimento da categoria B no código do IRS- rendimentos empresariais e profissionais  no art.º 3.º do código referido, segundo o qual são rendimentos profissionais, quando auferidos por conta própria, de atividade de prestação de serviços, incluindo os de carácter cientifico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com outras atividades e declarados no anexo B, campo 403, sujeitos a tributação pelo art.º 31.º, n.º 1, al. b) do CIRS.

3.5.        A atividade exercida pelo Requerente enquanto colaborador da entidade com o NIPC ...- B...- Sociedade Profissional de Advogados RL, cujos rendimentos foram declarados nos termos do art.º 119.º n.º 1, al. b) do CIRS, está enquadrada na atividade de advogados/ atividades jurídicas.

3.6.        O Requerente emitiu ainda no âmbito das suas competências técnicas, faturas e recibos eletrónicos a entidades cujas atividades são conexas com as atividades descritas de advocacia/ jurisconsulto, nomeadamente os emitidos a C..., a D..., S.A., e ao E..., NIPC... .

3.7.        Atenta a declaração Modelo 3 de IRS entregue pelo Requerente, verificou-se que a tributação dos rendimentos auferidos no âmbito destas atividades se encontram especificamente previsto no art.º 31.º n.º 1 al. b) do Código do IRS, assim, face à divergência declarativa detetada pela AT, o Requerente foi notificado para se pronunciar em sede de processo de divergência, bem como, em sede de audição prévia à decisão, tendo exercido esse direito através de mandatária.

3.8.        Ora, foi com recurso a esta norma que a AT fundamenta a correção de rendimentos do Requerente, uma vez que se verificou a divergências na qualificação dos atos, factos ou documentos com relevância para a liquidação do imposto.

3.9.        Donde se conclui que a AT, verificando os dados que o Requerente declarou no anexo B da declaração modelo 3 de IRS apresentavam divergências de retenção e coerência do CAE, cadastro e rendimentos declarados, instaurou processo de divergência, tendo o Requerente sido legalmente notificado para participar, fê-lo, no entanto, as divergências não foram sanadas, o que culminou com a substituição da declaração apresentada por outra elaborada AT, com os elementos que esta detinha. 

3.10.      No caso sub judice, contrariamente ao invocado pelo Requerente, a notificação do despacho do  Chefe do serviço de Finanças Porto..., em sede do procedimento de gestão de divergências de IRS, a determinar a alteração dos rendimentos declarados, foi notificado à sua mandatária conforme procuração que foi remetida à AT em 27/04/2018, sendo que nessa notificação se referenciava qua a liquidação seria notificada ao contribuinte pelos Serviços Centrais da AT, não se configurando como um acto pessoal, pelo que não existe qualquer violação do art.º 66.º n.º 1 do CIRS, inexistindo a nulidade procedimental invocada.

 

E-            FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

4.            Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas, prévias, e de mérito, dão–se como assentes e provados os seguintes factos:

4.1.        Pela análise ao registo dos códigos de atividade constantes em cadastro no registo de atividade do Requerente, verificou-se que constavam os seguintes códigos de atividade: - Código 6010- Advogado (atividade principal) e; - Código 1519- outros prestadores de serviços (atividade secundária)  - Código de atividade 69101- atividades jurídicas e código 90030- Criação artística e literária (atividade secundárias) de acordo com a Classificação Portuguesa de atividades económicas (CAE) do Instituto nacional de estatística.

5.            O Requerente submeteu em 05/04/2018 a declaração de rendimentos Mod. 3 de IRS do ano de 2017-..., onde declarou: como rendimentos de trabalho dependente a quantia €26.120,92.

6.            Mais submeteu o anexo B ao Modelo 3, onde declarou como rendimentos de trabalho independente a quantia de €11.250,00 relativa a rendimentos provenientes do exercício das atividades profissionais especificamente previstas na tabela do art. 151.º do CIRS no campo 403 a quantia de €14.945,61 relativa a rendimentos de outras prestações de serviços no campo 404.

7.            O Requerente emitiu as faturas-recibo n.º 37, 39, 40, 42, 45, 46, 47 e 48, correspondente ao código de atividade n.º 6010.

8.            O Requerente inscreveu no campo 404, relativa a rendimentos de outras prestações de serviços com o código de atividade exercida “Outras prestadores de serviços”, correspondente ao código de atividade n.º 1519, as seguintes faturas: n.º 1000000 no valor de 5.000,00€, n.º 1000001 no valor de 5.000,00€, fatura-recibo n.º 38 no valor de 250,00€, fatura-recibo n.º 41 no valor de 3.800,00€, fatura-recibo n.º 43 no valor de 895,61€.

9.            Em 24/04/2018, a declaração em causa foi identificada em sede de gestão de divergências para efeitos de comprovação do facto tributário, designadamente divergências de retenção e coerência de CAE, cadastro e rendimentos declarados, tendo a Requerente em 27/04/2018 apresentado esclarecimentos via internet a AT.

10.          Em 27/04/2018, o Requerente remeteu à AT uma procuração a identificar o seu Mandatário.

11.          Em 21/08/2018, a AT notificou o Requerente através de ofício n.º..., para o exercício de audição previa, ou, para proceder voluntariamente às correções da declaração de rendimentos apresentando uma declaração de substituição.

12.          Em 13/09/2018, a AT recebeu resposta do Requerente de exercício do direito de audição previa.

13.          Em 20/09/2018, a AT notificou a Mandataria do Requerente do oficio n.º...,  referente ao despacho proferido com referencia à divergência n.º..., referente ao IRS de 2017, conforme registo CTT n.º RH...PT, com data de entrega em 21/09/2018.

14.          A AT procedeu em 19/09/2019 à declaração oficiosa de rendimento Mod. 3 de IRS, do ano de 2017, com a seguintes correções:

14.1.      Quadro 4-A do anexo B, retirando o rendimento do campo 404 do montante de €14.945,61 para o campo 403 do mesmo quadro, passando a figurar no quadro 403 do quadro 4-A do anexo B, o valor total do rendimento auferido na categoria B no ano de 2017, que perfaz o montante de €26.195,61.

14.2.      No campo 601 do quadro 6 do anexo B, indicou o total de rendimento sujeito a retenção na fonte no valor de €20.945,61.

15.          Em 03/10/2018 foi emitida a liquidação n.º 2018..., da qual resultou a referida correção e o apuramento de imposto a receber no montante de €583,52.

 

F-            FACTOS NÃO PROVADOS

16.          Dos factos com interesse para a decisão da causa, objeto de análise concreta, inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

G-           QUESTÕES DECIDENDAS

17.          Atenta a posição das partes, assumidas nos argumentos apresentados, constituem questões centrais dirimendas as seguintes, as quais cumpre, pois, apreciar e decidir:

a.            A alegada pela Requerente:

(i)           declaração de ilegalidade parcial do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2017, n.º 2018... .

(ii)          Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

 

J                              MATÉRIA DE DIREITO

18.          Deste modo, a questão central a decidir consiste em saber se existe ilegalidade parcial do ato de liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2017, n.º 2018....

19.          O Requerente invoca a ilegalidade do ato, primeiramente por entender que a correção oficiosa efetuada pela AT foi notificada pelo Ofício n.º 2018..., apenas ao seu Mandatário.

20.          Ora, resulta da factualidade apurada, que no âmbito do processo de divergências, o Requerente para sua representação junto da AT, juntou uma procuração identificando e conferindo poderes de representação a mandatário. Nesse seguimento, a AT notificou o Ofício n.º ..., ao dito Mandatário, via carta registada com o n.º RH...PT.

21.          Nestes termos, não suscita qualquer dúvida a este Tribunal, que o Mandatário foi devidamente notificado. Contudo o sujeito passivo não foi notificado diretamente pela AT, cabendo agora determinar se é ou não obrigatória efetuar a notificação do ofício, também ao sujeito passivo.

22.          Para tanto, o dever de notificar o destinatário do ato, imposto pelo nº 3 do artigo 268º da CRP, constitui um instrumento de realização do princípio da tutela jurisdicional consagrado no subsequente nº 4. Exige-se assim que seja dado conhecimento efetivo do ato ao interessado, o que implica a transmissão dos seus elementos essenciais e a respetiva fundamentação, de modo a que o destinatário possa decidir a conveniência da impugnação contenciosa do ato.

23.          Formalidade essa que constitui um requisito de eficácia do ato, a qual resulta expressamente do disposto no artigo 268º, n.º 3, 1.ª parte, da Constituição da República Portuguesa, e no art. 77.º, n.º 6, da LGT, e do disposto no art. 36.º, n.º 1, do CPPT, nos termos do qual “[o]s atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados.”

24.          Desse modo, a notificação de um ato em matéria tributária funciona como condição de eficácia desse mesmo ato: o ato em matéria tributária apenas é juridicamente eficaz — isto é, apenas é suscetível de produzir os efeitos jurídicos para que tende — depois de ter sido notificado aos diretos interessados.

25.          Nos termos do art. 77.º, n.º 6, da LGT, “A eficácia da decisão depende da notificação.”, motivo pelo qual remetemos para as regras respeitante à notificação prevista nos artigos 35.º e seguintes do CPPT.

26.          Assim sendo, quanto à regra da notificação, quando o sujeito passivo constitui  mandatário, prevê o artigo 40.º do CPPT n.1 aliena a) , o seguinte: “1 - As notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste da seguinte forma:  a) Nos procedimentos tributários, por carta registada, dirigida para o seu escritório ou por transmissão eletrónica de dados na respetiva área reservada do Portal das Finanças;”

27.          Ora no presente processo, o Requerente constituiu Mandatário, logo todas as notificações decorrentes do procedimento tributário são feitas na pessoa do Mandatário, e dessa forma, são validamente feitas mediante carta registada.

28.          Conforme o anteriormente exposto, conclui-se que a notificação do Oficio n.º...,  referente ao despacho proferido com referencia à divergência n.º ..., em sede de IRS de 2017, com data de entrega em 21/09/2018, verificada no website https://www... foi feita mediante carta registada com o registo CTT n.º RH...PT, foi validamente efetuada na pessoa do mandatário, e produz os efeitos jurídicos para que tende, não necessitando de ser efetuada também para o Sujeito Passivo.

29.          Quanto à questão relativa à correção efetuada pela AT que levou a emissão do ato de liquidação aqui impugnado temos a dizer o seguinte.

30.          Em suma, a AT considerou que o rendimento declarado pelo Requerente, no campo 404 no montante de 14.945,61€ correspondente às faturas: n.º 1000000 no valor de 5.000,00€, n.º 1000001 no valor de 5.000,00€, fatura-recibo n.º 38 no valor de 250,00€, fatura-recibo n.º 41 no valor de 3.800,00€, fatura-recibo n.º 43 no valor de 895,61€, foram incorretamente enquadradas nesse campo, por dizerem respeito a atividade principal do Requerente de advocacia/jurisconsulto, e dessa forma corrigiu e alterou para o campo 403, ambos do Anexo B Quadro 4-A, perfazendo um total de 26.195,61€. Com a alteração seria aplicado o coeficiente do regime simplificado correspondente a atividade económica (0.75).

31.          O Requerente, sustenta, sinteticamente, que nos termos do art. 75.º, n.º 1, da LGT presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, cabendo à AT o ónus de demonstrar a inveracidade desses factos, quando pretenda fazer incidir a tributação sobre factos tributários diversos ou distintos daqueles declarados pelos contribuintes, o que não o fez.

32.          Ora perante a factualidade dada como provada e as normas legais em vigor à data dos factos, torna-se necessário a apreciação de direito sobre o enquadramento da atividade no regime simplificado.

33.          O Requerente emitiu diversas faturas, as quais enquadrou na sua atividade secundaria de “Outras prestadores de serviços” com o correspondente código de atividade n.º 1519.

34.          O Requerente considera que deve ser aplicado o coeficiente do regime simplificado respetivo (0,30), sobre as faturas emitidas às seguintes entidades: C... a, a D..., S.A. e ao E... .

35.          A AT, sobre as respetivas faturas, solicitou esclarecimentos e pedidos adicionais ao Requerente, e após os respetivos esclarecimentos, considerou que os rendimentos não se enquadravam na atividade secundaria, mas sim na atividade principal de advocacia, (Código 6010), atendendo ao conteúdo das faturas e às entidades a quem foram emitidas as faturas, aplicando-lhe assim o coeficiente do regime simplificado respetivo (0,75).

36.          Perante o exposto, vejamos o enquadramento jurídico-fiscal da atividade exercida “Outras prestadores de serviços”, correspondente ao código de atividade n.º 1519.

37.          Assim iniciamos por analisar o regime jurídico da tributação dos rendimentos da categoria B, previstos no artigo 3.º do CIRS e da escolha e aplicação do regime simplificado previsto no artigo 31.º e artigo 151.º do CIRS.

38.          São considerados rendimentos empresariais e profissionais, nos termos do artigo 3.º n.º 1 do CIRS: a) Os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária; b) Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com atividades mencionadas na alínea anterior; c) Os provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no setor industrial, comercial ou científico, quando auferidos pelo seu titular originário.

39.          Temos por certo que o Requerente declara como sua atividade principal, “Advogado” (código 6010) e como atividade secundaria “Outros prestadores de Serviços” (código 1519).

40.          Sobre a atividade de advogado ou de jurisconsulto, diga-se que quando auferidos por conta própria, na qualidade de atividade de prestação de serviços, quer seja exercida no estrito respeito pelas regras da advocacia, quer materializada noutra forma de prestação de serviços por conta própria, nomeadamente jurisconsulto, consultadoria jurídica, arbitragem jurídica, patrocínio judiciário, incluindo os de carácter cientifico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com outras atividades, estão tipificados no código do IRS- rendimentos empresariais e profissionais, previsto no artigo 3.º n.º1 do CIRS, como, rendimento da categoria B.

41.          Neste sentido, na Classificação das Atividades Económicas Portuguesas por Ramos de Atividade (CAE), respetivamente: a Atividade Principal: Atividades jurídicas  (código 69101) compreende as atividades de consultoria e o exercício do mandato geral, em representação de pessoas singulares ou coletivas, em geral por advogados, perante os tribunais ou outras entidades judiciais, no âmbito do direito civil, criminal, laboral ou outro, assim como as atividades de assessoria em geral e preparação de documentos jurídicos diversos (estatutos, pactos-sociais ou outros documentos semelhantes relacionados com a constituição de empresas, elaboração de documentos notariais, patentes e direitos de autor, testamentos, transferências de bens, serviços jurídicos relacionados com a cessão de ativos por leilão, etc.). Inclui as atividades respeitantes ao exercício de funções de advogado, oficial de justiça, solicitador de execução, peritos e procuradores, exercendo a atividade por conta própria ou em sociedade.

42.          E a atividade secundaria declarada pelo Requerente (código 90030): compreende as atividades de artistas individuais como pintores, escultores, escritores, caricaturistas, compositores, gravadores de arte ao cinzel (inclui gravadores a água forte), restauro de obras de arte (inclui objetos de coleção de museus) e outras atividades artísticas individuais similares. Inclui atividades dos jornalistas independentes.

43.          A atividade de “Outros prestadores de Serviços” (código 1519), é prevista na tabela a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS (CIRS), conforme Portaria n.º 1011/2001, de 21 de Agosto.

44.          Neste sentido a AT, emitiu a Circular n.º 5/2014, da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, de 20 de Março de 2014: «1. Encontram-se abrangidos na alínea b) do nº 2 do artigo 31º do Código do IRS os rendimentos auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços que tenham enquadramento na alínea b) do nº 1 do artigo 3º do mesmo Código, independentemente da atividade exercida estar, nos termos do artigo 151º do Código do IRS, classificada de acordo com a Classificação Portuguesa de Atividades Económicas (CAE) do Instituto Nacional de Estatística, ou de acordo com os códigos mencionados na tabela de atividades aprovada pela Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, incluindo a atividade com o código “1519 Outros prestadores de serviços” uma vez que o normativo em causa não remete para as atividades identificadas de forma específica na tabela de atividade, ao contrário do que sucede na alínea b) do nº 1 do artigo 101º do Código do IRS para efeitos de retenção na fonte.”

45.          Ressalvando, que é entendimento assente pela jurisprudência, que os Oficio-circulados e circulares administrativas emanadas pela AT, são vinculativas apenas para os respetivos serviços e não para o sujeito passivo. Os procedimentos definidos, «maxime» o “direito circulado” pela AT não pode derrogar o princípio da legalidade tributária (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido no processo n.º 02312/08 de 04/23/2008).

46.          Contudo, a atividade secundaria “1519 Outros prestadores de serviços”, é genérica, e em conjugação com a al. b) e c) do nº 1 do art. 31.º do CIRS abrange todas as prestações de serviços.

47.          Se não vejamos, se a atividade não se encontrar tipificada nos restantes códigos de atividade, terá o sujeito passivo de escolher necessariamente o código “1519 Outros prestadores de serviços”.

48.          Ao escolher esse código, será sempre enquadrado na alínea b) do n.º 1 do artigo 31.º do CIRS.

49.          Assim, coloca-se necessariamente a questão, quando é que é aplicável a aliena c) do n.º 1 do artigo 31.º do CIRS, uma vez que o código “1519 Outros prestadores de serviços”, abrange todas as outras prestações de serviços não tipificadas.

50.          Também este Tribunal Arbitral entende que, na falta de um verdadeiro conceito tributário de prestação de serviços ou de atividade comercial, tratando-se de conceitos cuja extensão nos respetivos ramos do direito de origem não são exatamente transponíveis para o direito fiscal, o recurso a listas abertas de atividades implica – assim o exige o princípio da segurança jurídica – que as atividades descritas nas tabelas ou listas sejam entendidas de forma lata.

51.          Como pode ler-se na decisão arbitral processo nº 337/2017-T, “existindo dúvidas entre qualificar uma determinada atividade como comercial ou prestação de serviços – e existem, manifestamente, zonas cinzentas – o primeiro critério deve ser o enquadramento pensado pelo legislador, ou seja, reconduzir à qualificação existente nas listas (do artigo 4.º ou da tabela a que se refere o artigo 151.º) ainda que essa qualificação exija uma leitura ampla das atividades descritas”.

52.          Assim sendo, como a sua atividade não se encontra expressamente tipificada nas atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º, e sendo o código “1519 Outros prestadores de serviços” terá necessariamente de ser permitido ao sujeito passivo identificar, esse código como sendo o seu.

53.          Contudo, coloca-se a questão do tema do ónus da prova, ou seja, a quem compete provar o tipo de atividade que o sujeito passivo realiza.

54.          Parece evidente, inclusive tendo presente a presunção de veracidade que rege as declarações do sujeito passivo, que compete ao Sujeito Passivo a prova, uma vez que é ele quem invoca, e como tal cabe-lhe prestar os elementos que constituem a sua pretensão.

55.          Vejamos então e de seguida a moldura jurídico-fiscal que rege o ónus da prova:

55.1.      Ora resulta do artigo 74.º n.º 1 da LGT que: "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.", em consonância com o artigo 342.º n.º 1 do CC, " Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado." (nosso sublinhado)

55.2.      Acresce que sobre a questão do ónus da prova, existe ampla jurisprudência, sustentando que cabe à AT o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos legitimadores da sua atuação e que cabe ao contribuinte provar os factos que operam como suporte das pretensões e direitos que invoca. (vide Processo Arbitral nº 236/1014-T de 4 de Maio de 2015).

55.3.      Nesse mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26.2.2014, proc. n.º 0951/11: “Nos casos em que a correcção da matéria tributável declarada decorra do facto de a AT ter considerado que determinadas despesas não podem integrar o valor de aquisição a considerar no apuramento das mais-valias porque respeitam a activos que não foram transmitidos (motivo por que, mediante o processo geralmente denominado de “correcções aritméticas”, expurgou tais despesas do valor de aquisição), à AT compete fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação no sentido da correcção do lucro tributável (ou seja, de demonstrar os factos que a levaram a concluir que aquelas despesas não se referem aos activos transmitidos), só depois competindo ao contribuinte o ónus da prova da existência dos factos que alegou como fundamento do seu direito de ver tais montantes relevados negativamente no apuramento das mais-valias.”

55.4.      Este  acórdão é esclarecedor quanto à distribuição do ónus da prova, para o qual se remete: “Cumpre, pois, responder à questão – meramente de direito, como deixámos já dito, e, por isso, compreendida no âmbito dos poderes de cognição deste Supremo Tribunal – de saber sobre quem recai o ónus da prova de tal facto, contra quem deve ser decidida a questão de saber se as referidas benfeitorias foram ou não transmitidas.(…)

Assim, há que recordar, de forma breve e sintética, as regras da distribuição do ónus da prova: em princípio, à AT cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) e, em contrapartida, cabe ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos, solução hoje fixada pelo art. 74.º, n.º 1 («O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque».), da LGT e que à data se devia já considerar aplicável porque correspondente à regra geral do art. 342.º do Código Civil (CC), de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contra-parte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos.

Mas nem sempre será assim. O ónus da prova variará consoante o tipo de acto administrativo em causa, havendo de ser decidida a questão da respectiva repartição «de acordo com a posição que as partes ocupam no processo e com o tipo de relação jurídica que constitui o seu objecto e, decorrentemente, no domínio do contencioso de anulação, com o tipo de acto anulando, tal qual a lei o caracteriza ou define os seus elementos constitutivos» (Cfr., por todos, o seguinte acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

– de 17 de Abril de 2002, proferido no processo com o n.º 26.635, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Março de 2004. (…) Para proceder à rectificação das declarações (e consequente liquidação adicional do imposto considerado em falta), a AT, designadamente quando entender que foram declarados custos ou proveitos que não correspondem à realidade (aqueles porque inexistentes ou superiores aos reais, estes porque inferiores aos reais), haverá de fundamentar o seu juízo formal e substancialmente, podendo a sindicância judicial recair sobre ambas as vertentes da fundamentação (a formal e a material). (…)Assim, no caso dos autos, podemos avançar as seguintes conclusões, de acordo com a jurisprudência há muito firmada nos tribunais tributários: porque a liquidação adicional de IRC tem por fundamento o não reconhecimento pela AT de uma parcela do valor de aquisição (a respeitante às despesas declaradas com a realização das benfeitorias), compete à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, demonstrar a existência de indícios sérios de que a transmissão das benfeitorias cujo valor integra o valor de aquisição não ocorreu; feita essa prova, recai sobre o Contribuinte o ónus da prova da existência dessa transmissão, que alegou como fundamento do seu direito de ver tais custos relevados negativamente no apuramento das mais-valias e, consequentemente, na sua matéria tributável; neste caso, não bastará ao Contribuinte criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o art. 121.º do CPT não tem aplicação; na verdade, o ónus consagrado nesse preceito legal contra a AT (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a AT: in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não quando, como in casu, é ao Contribuinte que compete demonstrar a existência dos factos em que se funda o seu direito de ver determinados custos relevados negativamente no apuramento das mais-valias e, consequentemente, do seu lucro tributável. Daí que tenhamos dito que à AT basta demonstrar a verificação dos “factos-índice” (indícios objectivos e credíveis) que, conjugados uns com os outros e apreciados à luz das regras da experiência, lhe permitiram concluir que a transmissão em causa não ocorreu, Se o fizer, estará materialmente fundamentada a decisão administrativa de desconsiderar as despesas em causa como parte integrante do valor de aquisição a utilizar no apuramento das mais-valias e, consequentemente, estará ilidida a presunção de veracidade da escrita, consagrada à data no art. 78.º da CPT. É este mesmo artigo que refere que a presunção nele consagrada pode ser afastada, designadamente, pela verificação de «outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte» (Ou seja, apesar de estarmos perante uma presunção legal, para ela ser ilidida não é necessária prova em contrário – diversamente do que, geralmente, se exige relativamente às presunções deste tipo (cfr. art. 350.º, n.º 2, do CC), pois o art. 78.º, in fine, do CPT estabelece, com carácter especial, regime diverso de ilisão da presunção.).”

55.5.      Conclui o acórdão no sentido: “Nos casos em que a correcção da matéria tributável declarada decorra do facto de a AT ter considerado que determinadas despesas não podem integrar o valor de aquisição a considerar no apuramento das mais-valias porque respeitam a activos que não foram transmitidos (motivo por que, mediante o processo geralmente denominado de “correcções aritméticas”, expurgou tais despesas do valor de aquisição), à AT compete fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação no sentido da correcção do lucro tributável (ou seja, de demonstrar os factos que a levaram a concluir que aquelas despesas não se referem aos activos transmitidos), só depois competindo ao contribuinte o ónus da prova da existência dos factos que alegou como fundamento do seu direito de ver tais montantes relevados negativamente no apuramento das mais-valias. À AT basta demonstrar a verificação dos “factos-índice” (indícios objectivos e credíveis) que, conjugados uns com os outros e apreciados à luz das regras da experiência, lhe permitiram concluir que os activos a que respeitam as despesas em causa não foram transmitidos e, assim, que está materialmente fundamentada a decisão administrativa de desconsiderar aquelas despesas no apuramento das mais-valias e de afastar a presunção de veracidade da escrita (à data prevista no art. 78.º do CPT). Feita essa demonstração, compete então ao contribuinte demonstrar que esses activos foram realmente transmitidos, não lhe bastando criar dúvida a esse propósito (o art. 121.º do CPT não logra aqui aplicação) pois não é a AT quem está a invocar a existência de um facto tributário não declarado ou a atribuir a um facto tributário uma dimensão diferente da declarada, caso em que seria de decidir contra ela a dúvida, mas antes é o contribuinte quem invoca o seu direito a ver relevados negativamente no apuramento das mais-valias as despesas que diz respeitarem a activos transmitidos, motivo porque a dúvida a esse propósito lhe é desfavorável.”

56.          Ainda no âmbito do já decidido, mas de relevo para a fundamentação da presente decisão arbitral, veja-se o Acórdão Arbitral, Processo 236/1014-T de 4 de Maio de 2015:“Em consequência, cabe à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos legitimadores da sua actuação, para o que deve provar os factos constitutivos de que legalmente depende a decisão administrativo-tributária com certo conteúdo e com certo sentido. Pelo seu lado, cabe ao contribuinte provar os factos que operam como suporte das pretensões e direitos que invoca..” (…) “Como tal, em conformidade com o disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT, cabe à Requerente a demonstração das bases e situações fácticas em que se sustentam os ajustamentos, desconhecimentos e regularizações que, por ela, foram promovidos e cuja relevância e consistência tributárias afirma, recaindo, pois, sobre a Requerente o ónus de esclarecer, comprovar e documentar as operações em causa e sua justificação.”. (nosso negrito)

(…) Nesta sequência, deve, ainda, assinalar-se que resulta do artigo 75.º, n.º 1 da LGT que as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, se presumem verdadeiras. Porém, esta presunção cessa nomeadamente se essas declarações, contabilidade ou escrita, ou os respectivos dados de suporte, apresentarem omissões, erros e inexactidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (art. 75.º, n.º 2, al. a) da LGT). Recorde-se ainda que, nos termos do n.º 3 do art. 75.º da LGT, “[a] força probatória dos dados informáticos dos contribuintes depende, salvo o disposto em lei especial, do fornecimento da documentação relativa à sua análise, programação e execução e da possibilidade de a administração tributária os confirmar”. (…) Ora, sempre que se aplique a al. a) do n.º 2 do art. 75.º da LGT, “será sobre o contribuinte que recai o ónus de prova dos factos declarados ou inscritos na sua contabilidade ou escrita sobre que existam dúvidas probatórias”, pelo que “as dúvidas que no processo judicial subsistam sobre a matéria de facto, não podem considerar-se dúvidas fundadas” para os efeitos do n.º 1 do art. 100.º do CPPT (vd. assim Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, vol. II, 6ª ed, 2011, p. 133).

Daí que incida sobre a Requerente o ónus da demonstração efectiva dos factos inscritos e das razões na base dos ajustamentos realizados na contabilidade, não bastando ficar a dúvida sobre a viabilidade da respectiva justificação, porquanto o disposto no n.º 1 do art. 110.º do CPPT tem a sua aplicação fulcral quando é a Administração Tributária a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação (cfr., assim, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26.2.2014, proc. n.º 0951/11). Deste modo, a prova produzida deve assegurar, com a certeza exigível, que as regularizações e ajustamentos realizados possuem consistência e materialidade bastante em face das justificações que lhe presidem.”

57.          Passeamos agora para a legislação em vigor, que nos diz que sobre as declarações do Requerente,  existe a presunção de veracidade e de boa-fé, princípio base consagrado no artigo 75.º da LGT: "Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos. (Redação da Lei n.º 80-C/2013 de 31 de Dezembro)".

58.          Contudo, prevê o afastamento da presunção quando: “as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões (artigo 75.º n.º 2 alínea a) e quando o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária (artigo 75.º n.º 2 alínea b).

59.          Esse dever de esclarecimento, adquire relevo especial, quanto aos esclarecimentos,  informação prestada informaticamente, conforme consagrado no artigo 75 n.º 3 da LGT: “A força probatória dos dados informáticos dos contribuintes depende, salvo o disposto em lei especial, do fornecimento da documentação relativa à sua análise, programação e execução e da possibilidade de a administração tributária os confirmar.”, informação que terá necessariamente de ser demonstrada pelo sujeito passivo.

60.          Caso existam dúvidas quanto ao tipo de rendimentos que são comunicados na informação transmitida à Autoridade Tributária e Aduaneira, cabe à AT nos termos do princípio do inquisitório, previsto no artigo 58.º da LGT realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, incluindo averiguar o tipo de rendimentos declarados na respetiva declaração e ao sujeito passivo cabe-lhe o dever de colaboração nos termos do artigo 59º da LGT.

61.          Com efeito, impende sobre o Requerente, o ónus da prova sobre a verificação dos pressupostos legais (vinculativos) legitimadores da sua atuação, ou seja, compete-lhe a prova do facto por si invocado, especificamente, a prova das prestações de serviço por si desenvolvidas.

62.          Face ao regime legal gizado, aplicando-o ao caso em apreço, temos por certo que recai sobre o Requerente o ónus da prova dos factos inscritos na sua declaração de rendimentos relativos ao ano de 2017, ou seja, cabe-lhe provar os rendimentos e que as respetivas faturas emitidas correspondem a serviços prestados que se inserem na atividade pelo Requerente indicada. Corroboração sempre necessária, independentemente do tipo de serviço prestado, do seu código ou Classificação.

63.          Por conseguinte, de harmonia com o disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT, cabe ao Requerente o ónus de esclarecer, comprovar e documentar as operações em causa, inclusive demonstrar e justificar a sua relevância e consistência tributárias, recorrendo a meios de prova documental e se necessário complementar com prova testemunhal os elementos fáticos que sustentam a sua correção, uma vez que foram pelo Requerente promovidos.

64.          Desta forma, o Requerente invoca que as faturas: n.º 1000000 no valor de 5.000,00€, n.º 1000001 no valor de 5.000,00€, fatura-recibo n.º 38 no valor de 250,00€, fatura-recibo n.º 41 no valor de 3.800,00€, fatura-recibo n.º 43 no valor de 895,61€, dizem respeito a outros serviços que não se inserem na atividade tipificadas no artigo 151.º do CIRS, sem ter especificado ou demonstrado que tipo de prestação de serviço foi realizada.

65.          Nos termos do artigo 75.º n.º 1 e n.º 2 alínea b) da LGT, compete ao Requerente demonstrar a que serviços essas faturas dizem respeito no código de atividade n.º 1519 (Outros prestadores de serviços), uma vez que é o Requerente que invoca na suas faturas e declaração de rendimentos que esses serviços se inserem nessa atividade.

66.          O Requerente, apenas elencou faturas, não carreou para os autos o contrato de prestação de serviços, necessário para avaliar o conteúdo e natureza do contrato subjacente às faturas, de forma a poder determinar-se em concreto  a prestação de serviço implícita, de modo a ser possível efetuar o seu correto enquadramento fiscal na atividade económica e no regime simplificado aplicável, de acordo com o disposto nas  alienas do n.º1 do artigo 31.º CIRS.

67.          As faturas não substituem o contrato e o artigo 1154.º do Código Civil fixa a noção de contrato de prestação de serviços, como sendo aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.

68.          Ora o Requerente, não juntou contrato nem foi junta qualquer prova, designadamente testemunhal que permita apurar e apreciar o conteúdo e a natureza do contrato de prestação de serviços que estará subjacente às faturas.

69.          Temos por certo que o Requerente prestou serviços às entidades: C..., a D..., S.A. e ao E..., contudo não juntou documento de suporte ou fez prova testemunhal que comprove o tipo de prestação de serviço realizado a essas entidades, assim como não fez prova que a prestação de serviço não se incluíam na sua atividade principal .

70.          Apesar do Requerente,  entender que as faturas dizem respeito a outros prestadores de serviços e como tal não se inserirem nas atividades prevista no artigo 151 e na aliena b) do art.º 31.º, n.º 1 do CIRS, antes inserindo-se na aliena c) do art.º 31.º, n.º 1do CIRS, cujo coeficiente é de 0,35%, competia-lhe, esclarecer, comprovar e documentar as operações por si declaradas, para as poder inserir na aliena c) do art.º 31.º, n.º 1do CIRS.

71.          Em conclusão, a determinação do rendimento tributável obtém-se através da aplicação do coeficiente previsto no art.º 31.º, n.º 1, al. b) do CIRS, ou seja 0,75 aos rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na tabela a que se refere o artigo 151.º, e conforme ficou demonstrado a atividade com o código 1519 encontra-se inscrita na referida tabela da Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto.

72.          Ora, da análise do probatório dos presentes autos, resulta que, a AT com base nos elementos que dispunha, relativa à atividade principal e secundaria que a Requerente exercia e das entidades a quais foram emitidas as faturas, designadamente a C..., a D..., S.A. e ao E..., todas classificadas com o código 1519, a que  corresponde  uma atividade expressamente prevista na tabela da Portaria nº 1011/2001, de 21 de Agosto, inclui-a no art.º 31.º, n.º 1, al. b) do CIRS.

73.          AT não dispunha de elementos suficientes para proceder à correção e alteração para o campo 403, ambos do Anexo B Quadro 4-A.

74.          E o Tribunal também não tem esses elementos demonstrativos, conforme anteriormente exposto, motivo pelo qual decide pela improcedência do pedido de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, referente ao ano de 2017.

75.          O Tribunal Arbitral, os termos dos arts. 608º, n.º 2, 663º, n.º 2 e 679º do Código de Processo Civil por aplicação do artigo 29.º do RJAMT, não se encontra obrigado a apreciar todos os argumentos alegados pelo Requerente ou pela Requerida, quando a decisão fique prejudicada pela solução já proferida, como é o caso dos autos, motivo pelo qual ficam prejudicadas para a apreciação as restantes questões submetidas a pedido de pronúncia.

                L - DECISÃO

Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide:

Julgar improcedente o pedido de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2017, n.º 2018..., no valor parcial de 7.955,08€ (sete mil novecentos e cinquenta e cinco euros e oito cêntimos).

Fixa-se o valor do processo em € 7.955,08, o valor da liquidação atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor da liquidação de imposto impugnada, e em conformidade fixam-se as custas, no respetivo montante em 612,00 € (seiscentos e doze euros), a cargo do Requerente de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.ºdo RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).

 

Notifique.

Lisboa, 31 de Maio de 2019

 

O Árbitro

Dr. Paulo Ferreira Alves