Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 31/2019-T
Data da decisão: 2019-06-24  IRS  
Valor do pedido: € 27.731,69
Tema: IRS de 2013 sobre indemnização por rescisão do contrato de trabalho.
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DECISÃO ARBITRAL

                                                                                                                                                                           

I - RELATÓRIO

 

1 - DAS PARTES E DA CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL

 

                1.1 -A..., contribuinte fiscal número ..., casado com B..., residentes na Rua..., n.º..., ..., ...-... Nazaré, doravante designador por Requerentes, vêm nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1 do Regime Jurídico da Arbitragem (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, solicitar pronúncia arbitral contra atos tributários da Autoridade Tributária, nomeadamente sobre a decisão de indeferimento que recaiu sobre o Recurso Hierárquico, proferida a 15 de novembro de 2017 pelo Diretor de Finanças de ... no processo de reclamação graciosa consequente à liquidação oficiosa (adicional) de IRS n.º 2016... de 15/11/2016 referente ao ano de 2013, para a declaração de ilegalidade da referida liquidação, no montante de €22.825,22, acrescida de juros compensatórios na importância de €1.941,98 e acerto de contas de no valor de €2.779,87, no valor total de €27.547,07.

                A liquidação em causa encontra-se devidamente identificada e junta aos autos (docs. n.º 2, 3 e 4).

                Esta liquidação impugnada pelos Requerentes, constitui uma segunda liquidação, por a Autoridade Tributária, em processo de inspeção, considerar uma diferente antiguidade relevante para efeitos de aplicação do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS.

 

                1.2 - O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi apresentado pela Requerente em 16/01/2019, tendo sido aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 17 do mesmo mês. O Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, foi nomeado pelo Conselho Deontológico do CAAD o signatário, Dr. José Rodrigo de Castro, em 07-03-2019, encargo que havia aceitado aceitou em 22/01/2018, do que foram notificadas as Partes.

 

                1.3 - Por despacho de 27/3/2019, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico deu por constituído o tribunal arbitral, determinando que se procedesse aos trâmites legais, conforme previsto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, o que foi feito com a notificação do dirigente máximo da Autoridade Tributária e Aduaneira para que se procedesse aos pertinentes trâmites legais.

 

                1.4 - As Partes foram notificadas da constituição do tribunal nessa mesma data de 27/3/2019.

 

                1.5 - Na data de 28/3/2019 foi proferido despacho arbitral, determinando-se a notificação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) para apresentar resposta no prazo legal e envio do respetivo processo administrativo, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT.

 

                1.6 - A Requerida juntou aos autos a sua resposta em 02/05/2019, que se dá aqui por reproduzida, tendo enviado também o respetivo processo administrativo.

 

                1.7 - Em 3/5/2019 foi proferido despacho arbitral, dispensando a realização da Reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em razão da inexistência de prova testemunhal e de se tratar apenas de matéria de direito, com notificação das partes paras alegações escritas facultativas até 3 de junho de 2019, tendo sido designado o dia 30 de abril para a prolação da decisão.

 

                1.8 - O referido despacho arbitral foi notificado às Partes na mesma data de 3/5/2019.

 

                1.9 - Foram proferidas alegações escritas por qualquer das partes, dentro da data indicada.

 

 

2 -  DO PEDIDO FORMULADO PELO REQUERENTE

 

                2.1 - O Requerentes apresentaram o seu pedido de pronúncia arbitral contra o ato tributário de liquidação de IRS n.º 2016... de 15/11/2016 referente ao ano de 2013, para declaração de ilegalidade da referida liquidação, no montante de €22.825,22, acrescida de juros compensatórios na importância de €1.941,98 e acerto de contas de no valor de €2.779,87, no valor total de €27.547,07, bem como contra a decisão de indeferimento que recaiu sobre o Recurso Hierárquico, proferida a 15 de novembro de 2017 pelo Diretor de Finanças de ... no processo de reclamação graciosa consequente à referida liquidação oficiosa (adicional) de IRS.

 

                2.2 - A liquidação impugnada respeita à tributação da parte da indemnização auferida por rescisão do contrato de trabalho, que a Autoridade Tributária considerou com sendo sujeita a tributação, com o que os Requerentes não concordam.

                  

                 

 

                2.3 - Os Requerentes pretendem, portanto, discutir se a indemnização por cessação do contrato de trabalho (por mútuo acordo) celebrado entre o Requerente A... e o C..., no valor de € 85.000,00 (oitenta e cinco mim euros), em 2/5/2013 (Doc. n.º 5 anexo à PI) se encontra ou não sujeito a tributação em sede de IRS, nomeadamente o valor de € 70.976,17 (setenta mil novecentos e setenta euros e 17 cêntimos), sendo que é esta parte que a Autoridade Tributária considera tributável.

 

                2.4 - A relação estabelecida entre o C... e o Requerente, tal como a cessação do contrato de trabalho, tem na sua origem uma relação jurídico laboral (contrato de trabalho subordinado), em que a entidade bancária assumiu a posição de entidade empregadora e o Requerente a posição de trabalhador por conta de outrem.

 

                2.5 - Está em causa a forma de contagem da antiguidade, ou seja, se deve ser considerada apenas a resultante da atividade laboral desenvolvida no banco C..., com quem celebrou contrato de rescisão ou, ao contrário, todo o tempo de serviço no setor bancário.

 

                2.6 - Mais refere que no acordo de cessação do contrato de trabalho celebrado com o C... "foi definido que no cálculo da parte sujeita a tributação, fosse considerado para a contagem da antiguidade, com uma remuneração média mensal de €4.144,37", como "uma das condições para o Requerente cessar o contrato de trabalho com o C... e que, no fundo, consubstancia uma cessação do contrato de trabalho na atividade bancária globalmente considerada".

 

                2.7 - O Requerente defende uma posição contrária à AT, fundamentada na jurisprudência tributária (incluindo decisões do CAAD), e foi isso que levou o C... a considerar o tempo de serviço prestado na atividade bancária para efeitos de contagem da antiguidade.

 

                2.8 - Donde conclui que somente parte da indemnização recebida, no valor de € 15.691,83 está sujeita a tributação nos termos da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS.

 

                2.9 - O Requerente refere que foi trabalhador da D... de 13/2/1997 a 17/8/2009 (Docs. 6 e 7) e de 18/8/2009 a 31/5/2013 no C..., data em que celebrou contrato de cessação de funções (Doc. 5).

 

                2.9.1 - Donde resulta inequívoco, em seu entender, que até à cessação do contrato de trabalho desenvolveu atividade laboral no setor bancário durante 17 anos, devendo ser esta a antiguidade a ser considerada para efeitos da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS.

 

                2.9.2 - E que, portanto, em seu entender, apenas há lugar a tributação sobre o montante de € 15.691,83, porque o montante de €70.976,17 "está isento".

 

                2.9.3 - E remete para o Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (ACTV), publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 20, de 29/5/2011, aplicável, segundo refere ao setor bancário e em vigor na data da cessação do contrato de trabalho, cujo artigo 17.º dispõe o seguinte sob a epígrafe "determinação da antiguidade":

                "1. Para todos os efeitos previstos neste Acordo, a antiguidade do trabalhador será determinada pela contagem do tempo de serviço prestado nos seguintes termos:

                a) Todos os anos der serviço, prestado em Portugal), nas Instituições de               Crédito com atividade em território português".

 

                2.9.4 - Ora, como o Requerente foi sócio do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários entre 1/9/2004 a 31/5/2013 (Cfr. doc.9), pelo que alega que lhe é aplicado o referido instrumento coletivo de trabalho - Protesta apresentar declaração solicitada ao Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários comprovativa de que foi sócio deste sindicato - declaração que fez juntar ao processo em 19/1/2019, donde consta que foi sócio do Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários de 01-09-2004 até 31-05-2013.

 

                2.9.5 - Também alega que foi sócio do sindicato dos Bancários do Centro entre abril de 1997 e setembro de 2004 (Cfr. doc. 18).

 

                2.9.6 - Mais refere que na data da cessação do contrato de trabalho com o C..., era-lhe devido o pagamento de uma compensação, conforme garantia do próprio C... s quando este foi contratado para exercer uma atividade remunerada por conta e sob a direção desta entidade bancária, considerando a antiguidade desde junho de 1997, que era a data constante da Declaração de Antiguidade emitida pelo empregador anterior, a D... (cláusula 7.ª, n.º 1 do Contrato de trabalho - Doc. n.º 8).

 

                2.9.7 - Partindo de toda a análise efetuada pelo Requerente, quando foi apresentada a Declaração mod. 3 de IRS do ano de 2013, em data atempada (Cfr. Doc.10), nela foi declarado o valor global de € 57.426,37, não integrando o valor da compensação recebida pela cessação do contrato de trabalho.

 

 

                2.9.8 - E isto porque, em seu entender e face ao disposto na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS, na redação em vigor para 2013, não teria que declarar qualquer valor da indemnização, face ao valor médio das suas remunerações regulares sujeitas a imposto, no período de dos 12 meses anteriores à cessação do contrato, de € 4.144,37 (Cfr. Relat. Insp. Trib.que constitui o Doc. 10).

 

                2.9.9 - E mais referem que quer o Código de IRS, quer a restante legislação tributária, não definem o conceito de antiguidade, isto porque, realçam, esta constitui um conceito laboral, donde considerar-se que é no direito do trabalho que se encontra a solução para a interpretação da mencionada disposição do Código do IRS.

 

                2.9.9.1 - Os Requerentes remetem, em abono da sua tese, para o que dispõe o n.º 2 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária.

 

                2.9.9.2 - Mais referem que não regulando o atual Código do Trabalho o conceito de antiguidade, os Requerentes remetem para a lei laboral como fonte primária das normas aplicáveis ao direito do trabalho, os instrumentos de regulamentação coletiva, definindo as formas que podem assumir (contratos coletivos, acordos coletivos e acordos de empresa).

 

                2.9.9.3 - Pelo que remetem para o Acordo Coletivo de Trabalho vigente à data da cessação do contrato, publicado em vários Boletins do Trabalho e Emprego, com as várias alterações, designadamente no Boletim n.º 6, de 15/2/2003 (este no âmbito dos filiados no Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários) e n.º 29, de 8/8/2003, que prevê que para os efeitos previstos no instrumento de regulamentação coletiva, a antiguidade do trabalhador é determinada pela contagem de todos os anos de serviço, prestado em Portugal, nas Instituições de Crédito  com atividade em território português [cláusula 17.ª número 1, alínea a) do referido instrumento coletivo].

 

                2.9.9.4 - Donde, concluem, que efetivamente, a Convenção Coletiva de Trabalho é um contrato gerador de obrigações para ambas as partes. No entanto, o que a distingue de outros contratos é a eficácia normativa (que a Lei lhe atribui), pelo que "a quase totalidade do clausulado aparece, não como um conjunto de compromissos (à imagem dos contratos em geral), mas um complexo de autênticas normas jurídicas endereçadas aos trabalhadores e aos empregadores que cabem no âmbito representativo dos mesmos outorgantes" .

 

                2.9.9.5 - Em reforço da sua tese, realçam que a Convenção Coletiva de Trabalho não deve ser considerada como um mero instrumento das partes que estabelece direitos e obrigações, mas tem ela, sim, um caráter normativo e que impõe direitos e obrigações, tal como a contagem da antiguidade.

 

                2.9.9.6 - Donde, concluem que "em conformidade com o exposto, a antiguidade do contribuinte tem de ser considerada a partir de Junho de 1997 (devido à eficácia normativa da Convenção supra referida), o que significa que abrange o período em que esteve ao abrigo de outra entidade patronal, no entanto, sempre no âmbito da atividade bancária [cláusula 17.ª número 1, alínea a)]".

 

                2.9.9.7 - E em reforço da sua tese, os Requerentes citam diversa Jurisprudência, designadamente:

               

                a) - O Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21/9/2010, proferido no âmbito do Processo n.º 03748, que vai no sentido que defendem, de que            se transcreve a seguinte conclusão:

                […]

                "3. E neste direito, encontrando-se tal conceito definido no ACT aplicável ao setor          de atividade em causa (bancário), que por força da norma do art.º 2.º da LCCT                constitui fonte imediata do direito laboral, é o conteúdo deste conceito tal como           aqui       e encontra definido,que é o aplicável em sede de incidência do IRS".

 

                b) - Idem, de 11/05/2004, proferido no Processo n.º 06002/01, de que extratamos a seguinte parte:

                […]

                "6. Nada sugere ou indicia que o conceito de 'antiguidade' contido no n.º 4 do artigo     2.º do CIRS não tenha sido usado em toda a sua amplitude, que não possa ter em         conta o tempo de serviço (antiguidade) alcançado noutra empresa desde que tenha            sido estipulado no contrato laboral pela entidade devedora.

                7. Não resultando da lei que esse conceito se refira restritamente ao tempo de                serviço na entidade devedora da compensação pela cessação do contrato de              trabalho, e nada justificando uma interpretação restritiva da norma de incidência,            aquela noção mais lata de antiguidade deve ser aceite para o cálculo da importância       sujeita a tributação em sede de IRS".

                […]

 

                c) - Idem, de 12/3/2013, proferido no âmbito do Processo n.º 05971/12, de que se colhe a seguinte conclusão:

 

                […)

                " 11. Não resultando da norma sob exame (cfr. art.º 2, n.º 4, do CIRS) que o conceito     de antiguidade se refira restritamente ao tempo de serviço na entidade devedora da      compensação pela cessação do contrato de trabalho, e nada justificando uma   interpretação restritiva da norma de incidência, a noção mais lata de antiguidade           oriunda do direito laboral deve ser aceite para o cálculo da importância sujeita a              tributação em sede de IRS".

 

                d) - Mais referem que existem, também, inúmeras decisões do CAAD sobre esta matéria e que são a favor dos contribuintes, remetendo para os seguintes processos arbitrais:

 

                d.1. - Decisão proferida em novembro de 2017 no Processo n.º 158/2017-T:

 

                […] "sendo este acordo (ACT) a fonte de direito à qual há que recorrer para fixar              o conceito de antiguidade no caso concreto, a antiguidade relevante para        aplicação do preceituado na al. b) do n.º 4 do CIRS não pode deixar de ser a que              abrange todos os anos de serviço prestado, em Portugal, nas instituições de      crédito com atividade em território português, ou seja 16 anos e 11 meses".

 

                d.2. - Decisão proferida em setembro de 2019 no Processo n.º 62/2018-T:

 

                " Esta última Decisão Arbitral do CAAD, cuja decisão este Tribunal Arbitral Singular         acompanha, diz mais, o mesmo acórdão refere que embora o atual Código do   Trabalho não regule, ele próprio, o conceito de antiguidade do trabalhador, coloca,       em primeiro lugar, os instrumentos de regulamentação coletiva, como as fontes de       direito donde emergem, em primeira linha, as normas aplicáveis ao contrato de             trabalho, definindo, ainda, no ser artigo 2,º as formas que estes podem assumir   (contratos coletivos, acordos coletivos e acordos de empresa). Assim, tal como bem    entendeu o TCA Sul no acórdão de 12.03-2013, proferido no âmbito do processo n.º      591/12, é hoje unânime no direito laboral que são três as fontes que podem    estabelecer a antiguidade: a Lei, o Contrato Individual de Trabalho e os Instrumentos de Regulamentação Coletiva de Trabalho. Não se podendo extrair um conceito de                 antiguidade da Lei, isto é, do Código de Trabalho, teremos que analisar, no caso              concreto, o Contrato Individual de Trabalho celebrado ou para o Acordo Coletivo de Trabalho no setor bancário.

                É, aqui também, invocada a argumentação da Decisão Arbitral do CAAD, no        Processo n.º 512/2017-T, datada de 28 de fevereiro de 2018, quando esta Decisão              diz: dessa forma será nos instrumentos de regulação coletiva aplicáveis ao setor          bancários ao qual se vinculou o Requerente que iremos buscar o conceito de                 antiguidade do trabalhador.

                (…)

                Pelo exposto, entende, por isso, este Tribunal Arbitral Singular que, após a devida          apreciação e ponderação, é de aplicar, para efeitos de incidência de IRS, ao caso         aqui em análise, relativo ao ano de 2013, a contagem da antiguidade tendo em conta           todo o tempo de serviço prestado pelo Requerente J… em instituições bancárias (no    setor bancário)."

 

                e) Os Requerentes não pagaram o IRS exigível, que se encontra em fase executiva, pelo que foi prestada garantia bancária.

 

3 - DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

                3.1 - Explicita a Requerida, Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) que os pedidos dos Requerentes visam a anulação do ato de liquidação adicional de IRS, referente ao ano de 2013, a que corresponde um pagamento de imposto de € 27.547,07.

 

                3.2 - E que está em causa a tributação de uma indemnização paga ao Requerente A... pelo C..., no montante de € 86.668,00, na sequência de uma rescisão do contrato de trabalho com a entidade empregadora.

 

                3.3 - Mais refere a Requerida que a indemnização, segundo o Requerente, deve ser calculada com base na antiguidade do Requerente A... não apenas no Banco C..., mas também na que detinha na instituição bancária onde tinha já trabalhado anteriormente.

 

                3.4 - E o que a Requerida entende e que serviu de base à liquidação adicional efetuada, é que a antiguidade a considerar para efeitos do disposto no n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, deve ser apenas a antiguidade na entidade devedora da compensação por cessação do contrato de trabalho.

 

                3.4 - E a Requerida entende que assim é, atendo o disposto no n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, segundo o qual ficam sujeitas a tributação, as importâncias auferidas "(…) na parte que exceda o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com caráter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos doze meses, multiplicado pelo número de anos ou fração de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora (…)".

 

                3.5 - A Requerida esclarece que foi em resultado de uma ação de inspeção baseada na OI2016..., emitida em 14/07/2016, com início em 18/07/2016 e terminada em 06/09/2016, que constatou que, durante o ano de 2013, o Banco C... pagou uma indemnização ao Requerente A..., em virtude de rescisão do contrato de trabalho, tendo contabilizado, para efeitos de antiguidade todo o tempo de serviço prestado no setor bancário, ou seja, 17 anos.

 

                3.6 - E apurou que no respeitante ao tempo de serviço prestado no Banco C..., este foi apenas de 3,79 anos.

 

                3.7 - E que, assim sendo, entende a AT que "a antiguidade a contabilizar, para efeitos do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, é a antiguidade devedora da compensação por cessação do contrato de trabalho (in casu, Banco C...), não sendo de ponderar, na aplicação do referido preceito legal, a antiguidade em anterior entidade empregadora, mesmo que o trabalhador e a nova entidade patronal tenham acordado ser de considerar em eventuais futuras "indemnizações" .

 

                3.8 - A Requerida fundamentou a sua atuação com base em parecer do CEF (Centro de Estudos Fiscais) e em informação da DSIRS (Direção de Serviços de IRS), segundo os quais resultou o seguinte entendimento, sobre a interpretação da alínea b) do n.ºs 4 e 10 do art.º 2.º do CIRS:

               

"as importâncias auferidas pelos prestadores do setor bancários, a título de indemnização pela cessação do contrato de trabalho, abrangidos pelo ACT, pagas pela última entidade na qual prestam serviço, sendo aplicável a regra de exclusão prevista na al. b) do n ° 4 do art. 2° do CIRS, deve ter em consideração para efeitos do respetivo cálculo apenas o número de anos ou fração de antiguidade ou de exercício de funções na última entidade devedora dos rendimentos que, por força do elemento histórico-sistemático inerente à norma do atual n.º10 do supra citado artigo, corresponde a "entidade empregadora/patrona/", com a amplitude decorrente desta norma” – cfr. p. 6 do Relatório de Inspeção Tributária.

Acrescentado, ainda: “Em relação às posições tomadas pela AT temos de salientar que existindo um parecer recente do CEF (centro de estudos fiscais) e uma informação emitida pela DSIRS (Direção de Serviços de IRS) nº 415/16, com despacho da Sr.ª Diretora Geral de 21-03-2016, divulgando o entendimento a dar a esta norma (alínea b) do n ° 4 e n ° 10 do art. 2º do CIRS), esta vincula a AT na sua aplicação a partir da data da divulgação e anula todos os possíveis entendimentos anteriores em sentido contrário” – cfr. p. 12 do Relatório de Inspeção Tributária. 

 

                3.9 - E realça a Requerida que o mesmo entendimento encontra-se já vertido na Informação Vinculativa de 10/10/2010, processo n.º 1818/10 e que, por isso, e apesar da decisão proferida nos acórdãos citados pelo Requerente do TCA Sul de 21/9/2010, processo n.º 03748/10 e no de 11/05/20045, processo n.º 6002/01, bem como no Acórdão também do TCA Sul de 10/03/2013, processo n.º 5971/12 e do conceito que neles se expressa de antiguidade, a AT "não pode acompanhar tal entendimento jurisprudencial, por desconforme com a lei aplicável".

 

                3.10 - Mais refere a Requerida que "resulta de forma clara da letra da lei fiscal que a delimitação negativa de incidência tributária de IRS se estabelece usando como fator multiplicador a antiguidade na entidade devedora dos rendimentos em causa (e não a antiguidade prevista em cláusula contratual ou em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou até em acordo de cessação)".

 

                3.11 - E mais refere que "qualquer interpretação que se elabore do regime jurídico do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS deve atender à vocação anti-abuso que lhe subjaz, própria das cláusulas especiais preventivas de evasão fiscal, sob pena de serem aceites acordos 'inter partes' que disponham sobre a antiguidade laboral e reconheçam antiguidades meramente artificiais, impondo tal reconhecimento para efeitos de delimitação negativa da incidência do imposto".

 

                3.12 - Mais refere que a inexistência no direito fiscal de uma definição de antiguidade conduziria, no entender da Requerida, ao seu preenchimento no ramo de direito do trabalho, conforme estipula o n.º 2 do artigo 11.º da LGT.

 

                3.13 - Porém, realça que o próprio Código do Trabalho não contém uma definição unívoca de antiguidade, por existirem nele inúmeras utilizações desse conceito, com amplitude e contextos distintos, sendo que uma, realça "mais coerente e sistemática, que é a que conforma o termo 'antiguidade' a 'antiguidade na empresa' (cfr. artigo n.º 6 do artigo 112.º, n.º 3 do artigo 147.º, alínea e) do n.º 2 do artigo 368.º todos do Código do Trabalho".

 

                3.14 - A Requerida remete ainda para o n.º 4 do artigo 36.º da LGT que dispõe que "a qualificação do negócio jurídico efetuado pelas partes (…) não vincula a administração tributária" e por maioria de razão, as qualificações das partes incidentes sobre o direito negocial.

 

                3.15 - E conclui, assim, assim que a questão em apreço terá de obter a sua solução na integral interpretação jurídica de todo o normativo implicado pela expressão "número de anos ou fração de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, contida na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IRS".

 

                3.16 - Significando tudo isto, conclui mais uma vez, que a entidade devedora tem de ser a entidade patronal mencionada no n.º 10 do artigo 2.º do CIRS, "o que fica explícito quando no n.º 4 se condiciona a exclusão da tributação à não criação de novo vínculo profissional ou empresarial no prazo de 24 meses com a mesma 'entidade'".

 

                3.17 - E a Requerida remete para a doutrina, citando Manuel Faustino e outros, in Fiscalidade 13/14, com artigo "Sobre o sentido e alcance da nova redação do artigo 2.º, n.º 4 do CIRS", deixando a seguinte passagem:

                 “Não é oponível à administração fiscal o clausulado ACTV sector bancário que impõe, na transferência de um trabalhador entre instituições de crédito, a contagem    do tempo de antiguidade verificada na anterior ou anteriores instituições de crédito de que tenha sido trabalhador. Como, por maioria de razão, também o não         são quaisquer acordos que, respeitando à garantia dos benefícios inerentes à                 antiguidade, hajam sido celebrados entre o trabalhador e a entidade patronal. Sem                considerações que hoje poderiam ser propiciadas pela extensão subjectiva do     conceito de entidade patronal operada pelo n.º 10 do artigo 2.º,              uma vez que aquela       assenta nas relações de domínio ou de grupo entre sociedades, independentemente     da sua localização geográfica, reafirmamos aqui a conhecida orientação da      Administração Fiscal segundo a qual o tempo de              antiguidade relevante é, tão só, o     tempo de antiguidade “adquirido” na entidade com que se cessa o contrato individual de trabalho, como literalmente decorre da lei, não parecendo haver qualquer margem       para outro tipo de interpretação”(cfr. Fiscalidade 13/14, Manuel Faustino e Outros,             “Sobre o sentido e alcance da nova                 redacção do artigo 2.º, n.º 4 do CIRS”).

 

                3.18 - Relativamente aos acórdãos citados pelo Requerente, designadamente o Acórdão de 21/09/2010, processo n.º 03748/10, alega a Requerida que mereceram a crítica da Doutrina, que, pela sua fundamentação destacam a de Cláudia Reis Duarte e Filipe Fraústo da Silva, in Revista da Ordem dos Advogados, n.º 1, 2012:

 

                "(Cfr. Anotação ao Acórdão do Tribunal Central do SUL sobre antiguidade do     trabalhador bancário (para efeitos de cálculo do montante de compensação por     cessação do contrato de trabalho não sujeito a tributação, nos termos do n.º 4 do          artigo 2.º do Código do IRS) […]: Realmente, temos por incontestável que o conceito     de antiguidade incluído na fattispecie das normas do Código do Trabalho que          estabelecem os referidos critérios de definição de indemnizações (ou               compensações) no âmbito do regime da cessação do contrato de trabalho é o da           antiguidade na empresa (…)"

E que:

                “o conceito de antiguidade de que se servem os preceitos legais do capítulo      codicístico relativo à cessação do contrato de trabalho e que estabelecem critérios de                definição de indemnizações ou compensações é o de antiguidade na empresa e que, por conseguinte, não são atendíveis, nessa definição ou cômputo indemnizatório,                 períodos adicionais de duração do vínculo que possam ter sido reconhecidos pelo          empregador por mero efeito de consenso contratual ou, até, por admissão unilateral, ou seja, que não resultem directamente da aplicação de normas legais ou       convencionais colectivas que tenham por consequência essa extensão, como    por                 exemplo sucede nos      casos já aludidos de cessão de posição contratual,           transmissão de titularidade ou exploração de empresa, estabelecimento ou      unidade económica, fusão, cisão, etc. A estes casos, as convenções colectivas            podem acrescentar vários outros. Este regime tem uma razão de ser muito clara: a antiguidade na empresa, enquanto mecanismo parcelar de tutela dos trabalhadores     mais antigos, tem a sua expressão mais radical na protecção da estabilidade do seu emprego, colocando-os, relativamente aos menos antigos, numa situação mais                 favorável em caso de cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador   (…)”

 

Para concluir, depois de uma extensa e fundamentada análise, ali se refere que:

 

                “a doutrina decorrente do aresto sob anotação nos merece as críticas antes       enunciadas, e tendemos por isso a considerar antes, quanto à questão específica da                 antiguidade, que da própria literalidade do preceito normativo resulta que esta         corresponde ao número de anos ou fracção de antiguidade na entidade empregadora                 com a qual cessa o contrato na origem das importâncias              pagas (com a ressalva da              antiguidade verificada em outras entidades em relação de domínio ou de grupo com              aquela por força da extensão do conceito operada pelo n.º 10 do artigo 2.º do CIRS).       Acresce que — e ainda que houvesse que fazer recurso, no preenchimento do          conceito em causa (o que entendemos não ser o caso na medida em que o         legislador fiscal foi claro e consagrou em letra de lei que a antiguidade é a verificada      na entidade devedora), ao direito laboral — a solução seria ainda idêntica, uma vez     que no Código do Trabalho não encontramos uma definição de antiguidade e, se           alguma tivermos que daí extrair, essa será a antiguidade na empresa, e não a    antiguidade que resulta de uma cláusula de qualquer convenção colectiva de           trabalho ou de acordo estabelecido entre as partes”.

 

                3.19 - Mais realça a Requerida que a razão que levou o legislador a conjugar, "alternativa e inclusivamente, as expressões "antiguidade" ou de "exercício de funções" na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS deve-se à necessidade de uma previsão normativa abrangente, de molde a colher as múltiplas situações geradores dos rendimentos de trabalho dependente, respetivamente o contrato de trabalho e o exercício de função, serviço ou cargo publico".

 

                3.20 - E a Requerida só aceita que se faça uma interpretação que referencie "antiguidade" à "entidade devedora" constante da norma que vem sendo citada e não admite, face ao elemento teleológico aferido pela finalidade da exclusão da incidência fiscal estatuída na norma, que outros instrumentos jurídicos negociais delimitem voluntariamente a amplitude dessa exclusão da incidência fiscal.

 

                3.21 - E fundamentam a sua asserção com base no princípio da igualmente estabelecido no artigo 13.º da CRP, que ficaria ferido com tratamentos diferenciados na diversidade de situações, se se permitisse que instrumentos jurídicos negociais pudessem delimitar antiguidade com efeitos na integração do regime de exclusão da incidência fiscal da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS.

 

                3.22 - Para além de que, realça a Requerida, a alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP fixa exclusiva competência à Assembleia da República para legislar sobre "criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas", salvo autorização ao Governo.

 

                3.23 - E remete ainda para o artigo 478.º do Regime de Contrato de Trabalho, aprovado pela lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que limita expressamente o conteúdo de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, dispondo, entre outras, que não pode:

                "a) contrariar norma legal imperativa ; e

                  b) regulamentar atividades económicas, nomeadamente períodos de funcionamento, regime fiscal , formação dos preços e exercício da atividade de              empresas de trabalho temporário, incluindo o contrato de utilização".

 

                3.24 - Remete, ainda, para o Acórdão do TCA Sul, processo n.º 94/17.OBERLA, em cuja decisão este Tribunal se pronunciou no seguinte sentido e a propósito da indisponibilidade de livre disposição dos créditos públicos (cfr. artigo 13.º e n.º 2 do artigo 266.º da CRP):

 

                “É também por esta razão - por estarmos perante uma obrigação que materializa um    dever fundamental de contribuição para os encargos públicos, segundo o princípio da                 igualdade relativa, medida pela capacidade contributiva de cada sujeito passivo de imposto - que a referida indisponibilidade do crédito tributário prevalece sobre    qualquer legislação especial (…). De resto, o artº.36, nºs.2 e 3, da L.G.T., é           peremptório ao estabelecer que os elementos essenciais da relação jurídica tributária            não podem ser alterados por vontade das partes e que a A. Fiscal não pode        conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos                 expressamente previstos na lei (cfr.artº.85, nº.3, do C.P.P.T.;ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção,       4/02/2016, proc.9100/15; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária        comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.297)”.    

 

                3.25 - E ainda sobre a jurisprudência vertida no Acórdão do T.C.A. Sul de 10/3/2013, processo n.º 05971/12, a Requerida faz mais um reparo relativamente à extensão da noção de "antiguidade" do trabalhador bancário ao estabelecido no ACT.

Diz a Requerida que na cláusula 2.ª do ACT para o Setor Bancário (2012) pode ler-se o seguinte:

 

                “O presente Acordo Coletivo de Trabalho é aplicável em todo o território nacional, no   âmbito do sector bancário, e obriga as Instituições de Crédito e as Sociedades      Financeiras que o subscrevem (adiante genericamente designadas por Instituições         de Crédito ou Instituições), bem como todos os trabalhadores ao seu serviço filiados                 nos Sindicatos dos Bancários do Centro, do Norte e do Sul e Ilhas, representados            pela outorgante FEBASE – Federação do Sector Financeiro e doravante designados           por Sindicatos, abrangendo 26 empregadores e estimando-se em 54.300 os        trabalhadores abrangidos.(…)”

 

E a Requerida realça que o decidido no Acórdão vale por dizer que, para que o aludido ACT possa ser aplicável, é necessário que o trabalhador em causa seja filiado num dos aludidos sindicatos e que a instituição de crédito seja subscritora do aludido Acordo.

 

                3.26 - Acontece, realça a Requerida, que no caso concreto, o R. pretende fazer prova nos presentes autos da sua filiação no Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários através da junção de documento onde consta “Declaração / Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários,-pessoa -coletiva n°..., com sede na Av. ... n°..., em Lisboa declara, para os devidos efeitos, que o Sr. A... NIF..., beneficiou do Serviço de Assistência médico-Social (SAMS/ Quadros) desde 01- 09-2004 até 31-05-2013”, datado 22/09/2016 (cfr. Doc. 9 da P.I.).

 

                3.27 - A Requerida conclui, no entanto, que o Requerente não provou a sua filiação no supra mencionado sindicato, o que, só por si, é motivo excludente da inovação da cláusula 17.º do ACT.

 

                3.28 - E acrescenta que o Banco C... subscreveu o ACT (2012) tendo, contudo, feito uma ressalva, nos seguintes termos:

                "Na contagem do tempo de serviço para quaisquer efeitos emergentes do ACT, contarão apenas o tempo de serviço prestado às próprias Instituições signatárias da presente ressalva, acrescido eventualmente do tempo de serviço prestado a outras instituições ou empresas, mas, neste caso, desde que tal resulte de acordo individual entre aquelas e o trabalhador" .

 

                3.29 - E a Requerida afirma que não foi o caso, conforme se verifica pela mera análise do clausulado do contrato individual de trabalho celebrado entre o Banco C... e o Requerente em 17/08/2009.

 

                3.30 - Por outro lado, apurou a Requerida que o contrato de rescisão celebrado em 2/05/2013, refere-se expressamente a esta questão tendo, então, o Banco C... e o ora Requerente acordado que:

                “Em caso de alteração legislativa que modifique o regime enunciado na presente            cláusula, ou de orientação jurisprudencial, relativamente aos arestos mencionados no n.° 2 [TCA Sul de 11/05/2004, processo n.º06002/01 e de 21/09/2010, processo n.º       03478/7 O] de que resulte diferente linha interpretativa do mesmo regime, o valor ilíquido da compensação pecuniária global estabelecido na cláusula segunda     permanece inalterado, não sendo em caso algum exigível ao C... que suporte, no            todo ou em parte, os impostos ou contribuições que sejam devidos pelo Colaborador               em virtude do pagamento da referida compensação, ou que, de qualquer outro modo,      o compense por esses factos”.

 

                3.31 - Pelo que, conclui, tanto o Banco C... como o ora Requerente admitiram e aceitaram a sujeição dos rendimentos em questão, pelo que - diz a Requerida - "a presente impugnação além de consubstanciar uma contradição com a conduta previamente preconizada, evidencia, outrossim, uma tentativa de aproveitamento de uma interpretação jurídica preconizada por alguma jurisprudência".

 

4.  - DAS ALEGAÇÕES

 

4.1 - DO REQUERENTE

 

O Requerente nas suas alegações não trouxe ao processo matéria significativa nova em termos dos seus fundamentos, limitando a remeter, adicionalmente, para as decisões proferidas nos seguintes processos:

                a) Decisão proferida pelo CAAD (P.º 321/2017-T), que contraria a interpretação que a AT faz da norma do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, em que dela faz o seguinte entendimento:

                "Este segmento da norma parece, assim, pretender considerar duas realidades                distintas (com soluções diferenciadas) para apurar o multiplicador em causa:    

             Número de anos ou fracção de antiguidade (entendida esta em termos gerais, sem se adjectivar o tipo de antiguidade); ou

             Número de anos ou fracção … de exercício de funções na             entidade devedora.

 

É que a norma acrescenta a seguir à última expressão (ou exercício de funções na entidade devedora): “nos demais casos”, conduzindo à percepção de que contém dois mecanismos distintos para se obter o multiplicador, em alternativa, existindo desta feita, pelo menos, “dois” casos, distintos, contidos na previsão da norma. Que hão-de conduzir a resultados diferentes, seguindo os destinatários da norma o regime que concretamente lhes seja mais favorável."

 

b)  Decisão proferida no processo 62/2018-T (CAAD) em que foi também foi sufragado o entendimento que é de aplicar para efeitos de incidência de IRS, a contagem da antiguidade tendo em consideração o tempo de serviço do Requerente na atividade bancária:

"Esta última Decisão Arbitral do CAAD, cuja interpretação este Tribunal Arbitral Singular acompanha, diz mais, o mesmo acórdão refere que embora o atual Código do Trabalho não regule, ele próprio, o conceito de antiguidade do trabalhador, coloca, em primeiro lugar, os instrumentos de regulamentação coletiva, como as fontes do direito donde emergem, em primeira linha, as normas aplicáveis ao contrato de trabalho, definindo ainda no seu artigo 2.º as formas que estes podem assumir (contratos coletivos, acordos coletivos e acordos de empresa). Assim, tal como bem entendeu o TCA Sul no acórdão de 12-03-2013, proferido no âmbito do processo n.º 591/12, é hoje unânime no direito laboral que são três as fontes que podem estabelecer a antiguidade: a Lei, o Contrato Individual de Trabalho e os Instrumentos de Regulação Coletiva de Trabalho. Não se podendo extrair um conceito de antiguidade da Lei, isto é, do Código de Trabalho, teremos que analisar, no caso concreto, o Contrato Individual de Trabalho celebrado ou para o Acordo Coletivo de Trabalho do sector bancário.

É, aqui também, invocada a argumentação da Decisão Arbitral do CAAD, no Processo n.o 512/2017-T, datada de 28 de Fevereiro de 2018, quando esta Decisão diz: dessa forma será nos instrumentos de regulação coletiva aplicáveis ao setor bancário ao qual se vinculou o Requerente e a instituição bancária que iremos buscar o conceito de antiguidade do trabalhador.

(…)

Pelo exposto, entende, por isso, este Tribunal Arbitral Singular que, após a devida apreciação e ponderação, é de aplicar, para efeitos de incidência de IRS, ao caso aqui em análise, relativo ao ano de 2013, a contagem da antiguidade tendo em conta todo o tempo de serviço prestado pelo Requerente J… em instituições bancárias (no setor bancário).”

 

c) Refere-se, ainda, à ANOTAÇÃO AO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL SOBRE ANTIGUIDADE DO TRABALHADOR BANCÁRIO (PARA EFEITOS DE CÁLCULO DO MONTANTE DE COMPENSAÇÃO POR CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO NÃO SUJEITO A TRIBUTAÇÃO, NOS TERMOS DO N.º 4 DO ARTIGO 2.º DO CÓDIGO DO IRS)”, DE CLÁUDIA REIS DUARTE E FILIPE FRAÚSTO DA SILVA, REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS, N.º 1, 2012).

 

"Para sustentar a sua tese - de que o conceito de antiguidade de que se servem os preceitos legais do capítulo codicístico relativo à cessação do contrato de trabalho e que estabelecem critérios de definição de indemnizações ou compensações é o de antiguidade na empresa e que, por conseguinte, não são atendíveis, nessa definição ou cômputo indemnizatório, períodos adicionais de duração do vínculo que possam ter sido reconhecidos pelo empregador por mero efeito de consenso contratual ou, até, por admissão unilateral, ou seja, que não resultem directamente da aplicação de normas legais ou convencionais colectivas que tenham por consequência essa extensão, como por exemplo sucede nos casos já aludidos de cessão de posição contratual, transmissão de titularidade ou exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, fusão, cisão, etc. - a AT tem recorrido à tese defendida pelos Dr. Filipe Fraústo da Silva e Dr.a Cláudia Reis Duarte na anotação ao acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21 de Setembro de 2010, concluindo que a interpretação adotada pela Requerida (AT) é a única conforme com o princípio constitucional da legalidade em matéria de incidência fiscal, que não pode admitir que na antiguidade na entidade devedora se considerem, para além da antiguidade inerente à efetiva duração da relação contratual outorgada por esta entidade, majorações decorrentes de instrumentos jurídicos negociais, pois admitir-se que estes instrumentos pudessem delimitar antiguidades com efeitos na integração no regime de exclusão de incidência fiscal do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS traduziria uma notória obnubilação de todos os fundamentos do princípio da legalidade, maxime na conjugação da justiça fiscal com a certeza e segurança jurídica da tributação.

 

No entanto, a tese defendida pelos Dr. Filipe Fraústo da Silva e Dr.a Cláudia Reis Duarte na anotação ao acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21 de Setembro de 2010 não é diferente da defendida pelos ora Recorrentes. Por regra, os referidos comentadores entendem que o conceito de antiguidade de que se servem os preceitos legais do capítulo codicístico Av..., ... -..., ...-... Lisboa - Portugal − Tel:(+351) ...− Fax:(+351)...– gera...pt – www...pt 11 E..., SP,RL relativo à cessação do contrato de trabalho e que estabelecem critérios de definição de indemnizações ou compensações é o de antiguidade na empresa e que, por conseguinte, não são atendíveis, nessa definição ou cômputo indemnizatório, períodos adicionais de duração do vínculo que possam ter sido reconhecidos pelo empregador por mero efeito de consenso contratual ou, até, por admissão unilateral, ou seja, que não resultem directamente da aplicação de normas legais ou convencionais colectivas que tenham por consequência essa extensão, como por exemplo sucede nos casos já aludidos de cessão de posição contratual, transmissão de titularidade ou exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, fusão, cisão, etc.

 

No entanto, acrescentam que a estes casos, as convenções colectivas podem acrescentar vários outros. Ou seja, entendem que as convenções colectivas de trabalho podem acrescentar períodos adicionais de duração do vínculo e que relativamente à compensação pecuniária por cessação do contrato de trabalho, se considere, para efeitos fiscais, a antiguidade no sector bancário (e não só numa empresa com quem cessam o contrato de trabalho).

 

O que defendem é que os períodos adicionais de duração do vínculo, estabelecidos no contrato de trabalho, não possam ser considerados para efeitos fiscais, sem que exista uma cláusula do contrato colectivo de trabalho que prevê uma forma diferenciada de contagem da antiguidade contratual

                (…)"

Quanto ao demais alegado, já é conhecida a posição do Requerente pela sua P.I., pelo que este Tribunal se dispensa de o repetir.

 

4.2 DA REQUERIDA

 

A Requerida mantém o entendimento e toda a fundamentação constante da sua Resposta, acrescentando o seguinte:

 

                a) Sobre o recente Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso do STA no Recurso n.º 407/18.7BALSB de 8 de maio de 2019 , transcreve a seguinte passagem:

                "(…) Segundo as regras estabelecidas nos artigos 9.º do Cód. Civil e 11° da LGT, bem como o princípio de que os termos próprios de outros ramos do direito, v.g. do direito do trabalho, devem manter o seu sentido originário, surpreende-se com facilidade que a norma em apreço visa tributar as prestações recebidas pelo trabalhador quando ocorre a cessação do contrato de trabalho (...) e, portanto, a noção de antiguidade usada nesta norma fiscal terá que estar relacionada com as normas do direito laboral que preveem o pagamento de quaisquer quantias monetárias em caso de ocorrência da cessação da relação laboral, independentemente do que seja estipulado pelas partes no caso de cessação por mútuo acordo, uma vez que o direito laboral não dá uma noção exacta do que se deve entender por antiguidade.

A cessação da relação laboral pode ocorrer, nos termos legais, por diversas formas, entre outras, despedimento ilícito, coletivo, por extinção de posto de trabalho, por inadaptação, rescisão pelo trabalhador com justa causa, rescisão pelo trabalhador com aviso prévio e, ainda, como no caso dos autos por mútuo acordo.

Não relevando agora as situações em que o trabalhador não tem igualmente direito a qualquer compensação por cessação da relação laboral, v.g. a rescisão com aviso prévio, resulta do Código do Trabalho, na redação à data, artigos 366°, 372º e 379º que a compensação pela cessação do contrato de trabalho correspondente a x dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, artigos 391º e 392º, que a compensação se fixa entre x e y dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade e artigo 396°, o trabalhador tem direito a indemnização, a determinar entre x e y dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.

Em todas estas situações da cessação do contrato de trabalho a antiguidade refere-se ao período de tempo em que o trabalhador esteve ao serviço da entidade patronal devedora da compensação ou indemnização a que se referem tais normas, não se refere a toda a antiguidade do trabalhador desde que iniciou funções na sua profissão, independentemente da entidade patronal.

Ou seja, a compensação atribuída pela cessação do contrato de trabalho é calculada em função da antiguidade do trabalhador ao serviço da entidade devedora da compensação, isto é, por referência à antiguidade na empresa FILIPE FRAUSTO DA SILVA e CLAUDIA REIS DUARTE em Anotação ao Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul sobre antiguidade do trabalhador bancário (para efeitos de calculo do montante de compensação por cessação do contrato de trabalho não sujeito a tributação, nos termos do n.° 4 do artigo 2.° do Código do IRS), publicado na Revista da Ordem dos Advogados, n.° 1, 2012, página 440.

Tal como nestas normas do direito laboral, na norma fiscal o legislador usou uma redação em tudo semelhante para fazer referência ao período de tempo que deve ser contabilizado para o cálculo do imposto, número de anos ou fração de antiguidade, tendo-lhe acrescentado o esclarecimento que tal período e o referente a entidade devedora -na verdade o legislador definiu claramente no mesmo artigo 2°, n.° 10 que para efeitos deste imposto, do IRS, considera-se entidade patronal toda aquela que pague ou coloque a disposição remunerações que constituam rendimentos de trabalho dependente nos termos deste artigo, tendo por sua vez especificado na norma em análise que a antiguidade se reportava a entidade devedora.

Acresce que a cláusula 17º do ACT, que a recorrente invoca em seu favor, apenas disciplina a determinação ou modo de cálculo, da antiguidade para os efeitos previstos no mesmo ACT, como bem resulta do corpo do respectivo n.° 1 onde se refere expressamente -1. Para todos os efeitos previstos neste Acordo-, sendo certo que neste ACT não se encontra regulamentada a matéria da cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo, nomeadamente a sua livre revogação pelas partes, bem como a forma de cálculo dos montantes indemnizatórios ou compensatórios que possam ser devidos pela entidade patronal a esse propósito, os quais podem mesmo resultar da livre determinação pelas partes, cfr. artigo 349°, n.° 5 do Código do Trabalho que disciplina a cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo entre o empregador e o trabalhador (aliás, como reforço deste entendimento, o n.° 4 artigo 140° do ACT ao mandar aplicar o disposto no artigo 17° as situações de cessação do contrato de trabalho, restringiu-as as que se encontram previstas no n° 1 do mesmo artigo, ou seja, as situações em que o trabalhador é colocado na situação de reforma por invalidez ou invalidez presumível).

Não é, assim, coerente que se possa interpretar com um sentido diferente as expressões usadas para editar a norma que visa tributar a compensação pela cessação do contrato de trabalho daquele que serve para interpretar as expressões usadas para editar as normas que definem o modo pelo qual se fixa a indemnização/compensação pela cessação do contrato de trabalho, uma vez que são idênticas e são utilizadas com o mesmo sentido.

Aliás e como já vimos, sendo o princípio da igualdade um princípio fundamental da tributação não permite que as normas fiscais sejam interpretadas por apelo a conceitos resultantes de contratos individuais de trabalho ou resultantes de acordos colectivos de trabalho que abrangem unicamente os cidadãos que se encontram enquadrados em determinado sector de actividade, só assim a interpretação das normas tributárias respeita a unidade do sistema jurídico, cfr. Manuel Faustino, Sobre o sentido e alcance da nova redacção do artigo 2°, n.° 4 do Código do IRS, Fiscalidade, n.° 13/14, pág. 10 (...)”

 

E conclui a Requerida que "O Venerando Tribunal deixou consignado o entendimento que a antiguidade a que se refere o disposto na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS respeita unicamente a antiguidade do trabalhador na entidade devedora da compensação/indemnização pela cessação do contrato de trabalho".

 

Termos em que conclui não merecer censura a interpretação preconizada pela AT e que, em consequência deve o pedido ser declarado improcedente por falta de apoio legal.

               

II - SANEAMENTO

 

1. - O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

 

2. - As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas, nos termos dos artigos 4 e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de março.

 

3. - O processo não padece de vícios que invalidem a sua apreciação.

 

4. - Face à prova documental junta aos autos, não contestada pelas partes, cumpre fixar a matéria de facto relevante para a decisão e proceder à prolação da mesma.

 

III - MATÉRIA DE FACTO

 

A) - Factos provados

 

O Tribunal considera como matéria de facto relevante os seguintes factos:

 

1. O Requerente A..., NIF..., exerceu funções na atividade bancária desde 12 de Março de 1997.

2. De 12 de março de 1997 a 16 de agosto de 2009, exerceu funções na D... de agosto de 2009 a 30 de maio de 2013, exerceu funções no C... .

 

3. No contrato de trabalho outorgado com o C..., consta que esta entidade bancária assumia a antiguidade decorrente da prestação de serviço a outras instituições de crédito, desde fevereiro de 1997. Por esse facto, o Requerente A... não recebeu qualquer compensação quando cessou o contrato de trabalho com a D... .

 

4. A 2 de maio de 2013, formalizou com o C... um acordo de cessação do contrato de trabalho, tendo acordado o pagamento de uma indemnização no montante de 85.068,00 €.

 

5. Até à cessação do contrato de trabalho com o C..., em 30 de maio de 2013, o Requerente A... desenvolveu atividade laboral no sector bancário durante 17 anos (ininterruptamente).

 

6. O Requerente foi sócio do Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários entre 1.09.2004 a 31.05.2013 (cfr. documento junto ao processo no dia 17 de janeiro de 2019).

 

7. Foi também sócio do Sindicato dos Bancários do Centro entre abril de 1997 e setembro de 2004.

 

8 - Os Requerentes apresentaram a sua Declaração Modelo 3 de IRS, relativa a 2013, na qual declararam como valor da indemnização sujeita a tributação, por aplicação do disposto na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, a importância de € 15.691,83.

 

9. Por força de uma ação de inspeção levada a efeito pela AT, os serviços procederam à correção do valor sujeito a IRS para € 70.976,17, por entenderem que só era relevante para efeitos da não sujeição, o período de tempo exercido na última entidade com quem foi celebrado acordo de cessação de funções - o Banco C... .

 

10. Em consequência do que foi emitida uma liquidação corretiva no valor de imposto a pagar de € 22.025,22 (incluindo € 2.466,00 de juros compensatórios), conf. Nota Demonstrativa da Liquidação corretiva, Nota Demonstrativa da liquidação de juros e Demonstração de Acerto de Contas, com valor a pagar de € 27.547,07, tendo em atenção que os Requerentes haviam recebido um reembolso de € 5.521,85.

 

11. Os Requerentes apresentaram reclamação graciosa contra a liquidação corretiva, que foi objeto de despacho final de indeferimento proferido a 15.11.2017, de que foram devidamente notificados.

 

12. Não se tendo conformado com esta decisão, os Requerentes apresentaram recurso hierárquico a 18.12.2017, dando por reproduzida a fundamentação utilizada na reclamação relativamente à contagem do tempo de serviço relevante.

 

13. Não tendo logrado também obter vencimento, apresentaram o presente Recurso Arbitral em 16.01.2019, que foi aceite a 17.01.2019 e que ora se aprecia e decide.

   

 

B) - Factos não provados

 

Não existem factos invocados que não se mostrem comprovados nos autos.

 

 

C) - Fundamentação dos factos provados

 

Todos os factos anteriormente descritos e invocados pelo Requerente têm por base prova documental junta aos autos, considerando-se, portanto, provados e não contestados e relevam para a decisão a proferir.

 

A Requerida contesta, no entanto, a prova da filiação do Requerente no Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários, por alegadamente a declaração junta não atestar as datas de inscrição e cessação da sua qualidade de sócio e por não designar o número que lhe fora atribuído enquanto tal.

 

Porém, em 17.01.2019, fez junção de uma declaração adicional, onde essas dúvidas deixam de existir.

 

IV - DO DIREITO

 

Fixada a matéria de facto, importa conhecer do direito a aplicar.

 

1 - Nos presentes autos está em causa, segundo petições de reclamação graciosa, recurso hierárquico e, em particular, de impugnação arbitral, definir o seguinte:

 

                a) Qual a antiguidade relevante para efeitos de não tributação da            indemnização (ou parte dela) auferida pela cessação de funções no C... .

 

                b) Se a antiguidade a relevar deve ser apenas a do exercício de funções no C... que lhe pagou a indemnização por cessação de funções ou se a antiguidade também resultante da função bancária também exercida anteriormente na D..., ou seja,a de toda a atividade bancária.

 

                c) Qual a legislação relevante para apurar qual a antiguidade relevante a que se referem as alíneas anteriores, ou seja, se apenas o CIRS, ou também o Acordo Coletivo de Trabalho e/ou a Convenção Coletiva de Trabalho ou ainda o contrato individual de trabalho.

 

2. Eis, pois, o que urge apreciar e decidir.

 

Desde logo, importa começar por conhecer o preceito cuja interpretação constitui a controvérsia gerada e que conduz a diferentes interpretações e, consequentemente, diferentes resultados.

 

Trata-se da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, cuja versão é a seguinte, em vigor à data dos factos:

 

Artigo 2.º

Rendimentos da categoria A

1 - Consideram-se rendimentos do trabalho dependente todas as remunerações pagas ou postas à disposição do seu titular, provenientes de:

a) Trabalho por conta de outrem prestado ao abrigo de contrato individual de trabalho ou de outro a ele legalmente equiparado;

(…)

4 - Quando, por qualquer forma, cessem os contratos subjacentes às situações referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1, mas sem prejuízo do disposto na alínea d) do mesmo número, quanto às prestações que continuem a ser devidas mesmo que o contrato de trabalho não subsista, ou se verifique a cessação das funções de gestor público, administrador ou gerente de pessoa colectiva, bem como de representante de estabelecimento estável de entidade não residente, as importâncias auferidas, a qualquer título, ficam sempre sujeitas a tributação:(Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

a) Pela sua totalidade, tratando-se de gestor público, administrador ou gerente de pessoa colectiva, bem como de representante de estabelecimento estável de entidade não residente;(Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

b) Na parte que exceda o valor correspondente ao valor médio das remunerações regulares com carácter de retribuição sujeitas a imposto, auferidas nos últimos 12 meses, multiplicado pelo número de anos ou fracção de antiguidade ou de exercício de funções na entidade devedora, nos demais casos, salvo quando nos 24 meses seguintes seja criado novo vínculo profissional ou empresarial, independentemente da sua natureza, com a mesma entidade, caso em que as importâncias serão tributadas pela totalidade. (Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

(,,,)

 

Na interpretação da norma, não pode deixar este Tribunal de concordar com a Requerida quando refere que a razão que levou o legislador a conjugar, "alternativa e inclusivamente, as expressões "antiguidade" ou de "exercício de funções" na alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS deve-se à necessidade de uma previsão normativa abrangente, de molde a colher as múltiplas situações geradores dos rendimentos de trabalho dependente, respetivamente o contrato de trabalho e o exercício de função, serviço ou cargo publico".

 

E concorda-se também quando se refere que só pode aceitar-se que se faça uma interpretação que referencie "antiguidade" à "entidade devedora" constante da norma e cuja redação não admite, face ao elemento teleológico aferido pela finalidade da exclusão da incidência fiscal estatuída na norma, que outros instrumentos jurídicos negociais delimitem voluntariamente a amplitude dessa exclusão da incidência fiscal.

 

De facto, a fundamentação da asserção que a faz a Requerida tem toda a justificação, com base no princípio da igualmente estabelecido no artigo 13.º da CRP, que ficaria ferido com tratamentos diferenciados na diversidade de situações, se se permitisse que instrumentos jurídicos negociais pudessem delimitar antiguidade com efeitos na integração do regime de exclusão da incidência fiscal da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS.

 

 O Requerente defende que deve relevar todo o tempo de serviço prestado no Setor Bancário, quer por força da interpretação que faz da norma da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, quer por força doutras normas alegadamente aplicáveis, supletivamente, designadamente normas do direito laboral e, ainda, Doutrina e profusa Jurisprudência que invoca, conforme consta da PI e das sua Alegações.

 

A Requerida, por sua vez, entende que deve apenas ser aplicada a norma fiscal citada da alínea b) do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, por ausência de total clarificação sobre antiguidade doutras normas, designadamente do direito do trabalho, e remete também a Doutrina e para diversa Jurisprudência, sendo relevante, desde já, a que em sede de Alegações refere quanto à recente decisão do Pleno da Seção do Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo no Recurso n.º 407/18.7BALSB de 8 de maio de 2019, tal como consta da Resposta e das suas Alegações.

 

E por relevante, veja-se a Jurisprudência ali firmada, que é elucidativa do verdadeiro sentido e alcance da norma fiscal em causa.

 

De facto, este recente Douto Acórdão do Pleno do STA traz luz bastante para interpretação suficientemente clara sobre cada um dos tipos de normas em causa, fiscais e laborais, pondo como que um ponto final nesta questão, em que a Jurisprudência tem sido contraditória.

 

Os Meritíssimos Senhores Conselheiros recorrem, desde logo, aos artigos 9.º do Código Civil e 11.º da LGT, como princípios norteadores da interpretação das normas aplicáveis, para separar as águas quanto ao sentido e finalidade de cada uma das normas invocadas como potencialmente aplicáveis.

 

Esclarecem, deste modo, os Senhores Conselheiros que outros ramos do direito, v.g. do direito do trabalho, "devem manter o seu sentido originário", muito embora umas e outras se relacionem e se completem.

 

E clarificam melhor realçando que "a noção de antiguidade usada na norma fiscal terá que estar relacionada com as normas do direito laboral que preveem o pagamento de quaisquer quantias monetárias em caso de ocorrência da cessação por mútuo acordo, uma vez que o direito laboral não dá uma noção exacta do que se deve entender por antiguidade".

 

E mesmo havendo cessação de funções por diversos motivos, refere-se no Douto Acórdão que "em todas estas situações de cessações do contrato de trabalho a antiguidade refere-se ao período de tempo em que o trabalhador esteve ao serviço da entidade patronal devedora da compensação ou indemnização a que se referem tais normas, não se refere a toda a antiguidade do trabalhador desde que iniciou funções na sua profissão, independentemente da entidade patronal".

 

Parece assim, desde logo, ficar claro que a antiguidade relevante do Requerente é a que se refere ao período de tempo em que exerceu funções no C..., ou seja, de 18-08-2009 a 31-05-2013 - 3 anos, 9 meses e 13 dias.

 

E isto por força do disposto do n.º 4 do artigo 2.º do CIRS, única norma relevante para efeitos de contagem da antiguidade e, consequentemente, da parte sujeita a tributação e da parte excluída.

 

Mais refere o Douto Acórdão que o ACT (Acordo Coletivo de Trabalho) "(…) disciplina a determinação ou modo de cálculo da antiguidade previstos no mesmo ACT (…) sendo certo que neste ACT não se encontra regulamentada a matéria da cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo (…)" .

 

E de forma ainda mais evidente, nele se refere também que "Não é assim, coerente que se possa interpretar com um sentido diferente as expressões usadas para editar a norma que visa tributar a compensação pela cessação do contrato de trabalho daquele que serve para interpretar as expressões usadas para editar as normas que definem o modo pelo qual se fixa a indemnização/compensação pela cessação do contrato de trabalho, uma vez que são idênticas e são utilizadas com o mesmo sentido".

 

E, recorrendo à Doutrina, a mesma que a Requerida citou, o Douto Acórdão refere ainda que "Aliás e como já vimos, sendo o princípio da igualdade um princípio fundamental da tributação não permite que as normas fiscais sejam interpretadas por apelo a conceitos resultantes de contratos individuais de trabalho ou resultantes de acordos colectivos de trabalho que abrangem unicamente os cidadãos que se encontram enquadrados em determinado sector de actividade, só assim a interpretação das normas tributárias respeita a unidade do sistema jurídico, cfr. Manuel Faustina, Sobre o sentido e alcance da nova redacção do artigo 2.º, n.º 4 do Código do IRS, Fiscalidade, n.º 13/14, pág. 10 (…)".

 

Fica, assim, mais do que demonstrado que as respostas às questões formuladas, são agora claras, quer quanto à antiguidade do Requerente a considerar para efeitos de tributação, que é apenas a antiguidade do Requerente no C..., por ser, à luz da Jurisprudência que vem sendo citado e da Doutrina, a única relevante para efeitos de aplicação da norma do artigo 2.º, n.º 4 do CIRS, alínea b), sem necessidade de dirimir quais outra fundamentação invocada pela Requerente.

 

Termos em que, e por força do que dispõe o referido artigo 2.º, n.º 4, alínea b) do CIRS, não merecem censura nem as decisões da reclamação graciosa, nem as do recurso hierárquico e, consequentemente, as liquidações efetuadas.

 

V - JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

Embora se reconheça legitimidade ao Requerente para solicitar o pagamento dos juros indemnizatórios devidos nos termos do disposto no artigo 43.º da Lei Geral Tributária, e o Tribunal ser competente em razão da matéria, a verdade é que não tendo sido proferida declaração de ilegalidade da liquidação em causa e consequente anulação do montante do IRS que reclamava como indevidamente pago, não se mostram preenchidos os pressupostos previstos no artigo 43.º da Lei Geral Tributária para exigência legal dos mesmos.

 

VI - INDEMNIZAÇÃO POR PRESTAÇÃO DE GARANTIA BANCÁRIA

 

Do mesmo modo e pelo mesmo fundamento, não há lugar ao pagamento de qualquer indemnização pela prestação de garantia bancária, visto não ter merecido qualquer provimento o presente Recurso.

 

VII - DECISÃO

 

Termos em que se decide:

                a) Julgar improcedente o pedido arbitral formulado e, em consequência,             manter na ordem jurídica a liquidação de IRS impugnada, bem como a Demonstração da liquidação de juros compensatórios e Demonstração de                 acerto de contas, com indicação do total a pagar, no valor de € 27.547,07.

 

                b) Julgar improcedente o pedido de anulação das decisões sobre a          reclamação graciosa e recurso hierárquico.

 

                c) Julgar igualmente improcedente o pedido de pagamento de juros       indemnizatórios a favor do Requerente.

 

                d) Julgar improcedente o pedido de pagamento da indemnização pela prestação de garantia bancária.

 

                e) Condenar o Requerente ao pagamento integral das custas do processo.

 

 

VALOR DO PROCESSO

Fixa-se o valor do processo em € 27.731,69, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a) do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

CUSTAS

 

Custas a pagar no valor de € 1.530,00, nos termos da Tabela I do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar exclusivamente pelos Requerentes, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT e artigo 4.º, n.º 4 do citado Regulamento, visto que o pedido foi integralmente improcedente.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 24 de junho de 2019.

 

O Árbitro do Tribunal Arbitral Singular,

(José Rodrigo de Castro)