Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 506/2018-T
Data da decisão: 2019-04-29  IMI  
Valor do pedido: € 19.101,11
Tema: AIMI – Incidência Objectiva – Terrenos para construção Inconstitucionalidade
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

O Árbitro Marisa Almeida Araújo, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar este Tribunal Arbitral Singular, toma a seguinte decisão arbitral,

 

I – Relatório

 

1. A..., S.A. (doravante, «Requerente»), com sede na ..., n.º..., ... e ..., ..., ...-... Amadora, titular do Número de Identificação de Pessoa Colectiva ..., vem requerer a constituição de tribunal arbitral a 10/10/2019, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade do acto de liquidação do Adicional do Imposto Municipal sobre Imóveis (doravante, «AIMI») n.º 2018..., referente ao ano de 2018, no valor de €19.101,12, peticionando a restituição da quantia paga e ainda a condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

 

Fundamenta o pedido nos seguintes termos,

 

  1. A Autoridade Tributária e Aduaneira («AT») dirigiu à Requerente a liquidação do AIMI n.º 2018..., de 30 de junho de 2018, no valor de € 19.101,12, que pagou a 18 de setembro de 2018.
  2. Para efeitos do apuramento do valor tributável do AIMI, a AT considerou a soma dos valores patrimoniais tributários («VPT’s»), reportados a 1 de Janeiro de 2018, dos prédios urbanos elencados liquidação e que constam nas matrizes prediais na titularidade da A..., nos termos do n.º 1 do artigo 135.º‑C do CIMI.
  3. A soma daqueles VPT’s ascendeu a € 4.775.279,51, sobre o qual incidiu a taxa de 0,4%, e assim resultou o AIMI liquidado de € 19.101,12.
  4. Para efeitos do cálculo do valor tributável do AIMI, a AT incluiu na lista de prédios urbanos sujeitos àquele adicional:
  1. O prédio urbano inscrito na matriz predial sob o n.º U‑..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, cujo VPT, a 1 de Janeiro de 2018, ascende a € 1.828.107,30;
  2. O prédio urbano inscrito na matriz predial sob o n.º U‑..., da freguesia de..., concelho da Amadora, cujo VPT, a 1 de Janeiro de 2017, ascende a € 1.350.773,63;
  3. O prédio urbano inscrito na matriz predial sob o n.º U‑..., da freguesia do..., concelho da Amadora, cujo VPT, a 1 de Janeiro de 2017, ascende a € 1.596.398,58.
  1. Aqueles prédios urbanos são todos classificados, para efeitos do CIMI, como terrenos para construção sendo o tipo de coeficiente de localização aplicado o corresponde ao de serviços.
  2. De acordo com o alvará de loteamento n.º.../... emitido pela Câmara Municipal da Amadora, naqueles terrenos para construção – que correspondem aos lotes A (U‑...), B (U‑...) e H (U‑...) – apenas podem ser construídos escritórios.
  3. A Requerente considera que sobre os terrenos para construção, acima elencados, não deveria ter incidido objectivamente o AIMI concluindo que suportou um imposto indevido no valor de € 19.101,12.

2. A AT respondeu, e juntou o PA, a 1 de fevereiro de 2019, concluindo pela improcedência do pedido arbitral.

a.       A AT conclui que sobre os prédios identificados nos autos que a 01-01-2018 de acordo com o n.º 4 do art.º 8.º, por remissão do n.º 3 do art.º 135.º-A CIMI, a Requerente era proprietária foi apuramento o VPT de acordo com o inscrito na matriz, conforme n.ºs 1 e 2 do art.º 135.º-C do CIMI.

b.      Os imóveis, segundo a AT, não se encontravam abrangidos pelas exclusões previstas no n.º 2 do art.º 135.º-B, nem pelo n.º 3 do art.º 135.º-C do CIMI e, em consonância foi realizada a liquidação em apreço nos autos.

 

3. No seguimento do processo foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e ordenado o prosseguimento para alegações por prazo sucessivo.

 

A Requerente e Requerida alegaram mantendo, no essencial, as suas posições já vertidas nas respectivas peças processuais.

 

4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro a signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído em 20 de dezembro de 2018.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

 

Cabe apreciar e decidir.

 

 

II - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

5. Cabe ao tribunal selecionar os factos que importam para a decisão da causa e discriminar a matéria provada da não provada (conforme artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (conforme anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos abaixo elencados.

  1. A Requerente é uma pessoa colectiva.

 

  1. A 1 de janeiro de 2018 a Requerente era proprietária dos seguintes prédios:

A.1. O prédio urbano inscrito na matriz predial sob o n.º U‑..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, cujo VPT, a 1 de Janeiro de 2018, ascende a € 1.828.107,30;

A.2. O prédio urbano inscrito na matriz predial sob o n.º U‑..., da freguesia de ..., concelho da Amadora, cujo VPT, a 1 de Janeiro de 2017, ascende a € 1.350.773,63;

A.3. O prédio urbano inscrito na matriz predial sob o n.º U‑..., da freguesia do..., concelho da Amadora, cujo VPT, a 1 de Janeiro de 2017, ascende a € 1.596.398,58.

  1. A AT dirigiu à Requerente a liquidação do AIMI n.º 2018..., de 30 de junho de 2018, no valor de € 19.101,12, que esta pagou a 18 de setembro de 2018.
  2. Para efeitos do apuramento do valor tributável do AIMI, a AT considerou a soma dos VPT’s, reportados a 1 de Janeiro de 2018, dos prédios urbanos elencados na alínea A. e que constam nas matrizes prediais na titularidade da A..., nos termos do n.º 1 do artigo 135.º‑C do CIMI.
  3. A soma daqueles VPT’s ascendeu a € 4.775.279,51, sobre o qual incidiu a taxa de 0,4%, e assim resultou o AIMI liquidado de € 19.101,12.
  4. Os prédios urbanos identificados na alínea A. são todos classificados, para efeitos do CIMI, como terrenos para construção sendo o tipo de coeficiente de localização aplicado o corresponde ao de serviços.

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa, considerando as possíveis soluções de direito.

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta.

 

 

            Matéria de direito

 

            6. Da posição das partes

 

            A Requerente entende que no que respeita à incidência objectiva do AIMI, o artigo 135.º‑B do CIMI estipula no seu n.º 1 que «[o] adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular».

Por sua vez, o n.º 2 do referido preceito legal dispõe que «[s]ão excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código».

Literalmente, o n.º 2 do artigo 135.º‑B do CIMI não exclui da incidência objectiva do AIMI os terrenos para construção, na medida em que esta somente compreende os «prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código», não remetendo expressamente para a alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º do mesmo Código a qual contempla os terrenos para construção (independentemente da afectação da edificação para eles autorizada ou prevista).

Não obstante, a Requerente entende que, de acordo com os princípios da hermenêutica jurídica e os princípios constitucionais fiscais vigentes, a exclusão objectiva de incidência do AIMI, prevista no n.º 2 do artigo 135.º-B do CIMI, deve abranger os terrenos para construção destinados a serviços, em particular quando detidos por sociedades que os adquiram para promoção futura de edifícios com essa afectação, como é o caso.

Em concreto, a Requerente considera que, de acordo com os princípios da hermenêutica jurídica, deverá interpretar-se extensivamente a exclusão prevista no n.º 2 do artigo 135.º‑B do CIMI relativa aos prédios urbanos classificados como industriais, comerciais e para serviços como expressando uma intenção legislativa de excluir também da tributação os terrenos para construção desses prédios.

Por outro lado, a sujeição a AIMI dos terrenos para construção de prédios destinados a fins industriais, comerciais e para serviços, de acordo com uma interpretação literal dos n.ºs 1 e 2 do artigo 135.º‑B do CIMI, é incompatível com os princípios constitucionais da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, consagrados no artigo 13.º e no n.º 3 do artigo 104.º da CRP.

 

Por sua vez a Requerida, conclui que o AIMI incide sobre os prédios classificados como habitacionais e como terrenos para construção — independentemente da sua afetação potencial (atento o facto de a lei remeter, sem mais, para o artigo 6.º do Código do IMI) — na medida em que os mesmos não constam expressamente na norma de delimitação negativa de incidência.

Pode pois afirmar-se, na perspectiva da Requerida, que no que concerne ao AIMI incidente sobre os prédios urbanos de que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários pessoas colectivas e estruturas equiparadas (n.º 2 do artigo 135.º-A do CIMI) o imposto assume a natureza de imposto real, na medida em que a modelação do quantitativo a pagar abstrai da dimensão económica das entidades, designadamente a qualificação como pequena, média ou grande empresa, bem como não atinge a totalidade do património líquido das entidades.

No que respeita às pessoas colectivas e estruturas equiparadas, o AIMI tem natureza de tributação real, reflectindo desta forma a ideia de que os elementos integrantes do património imobiliário detido por estas entidades desempenham, em regra, uma função económica, não representando, por isso, uma mera acumulação de riqueza.

O legislador afastou da incidência os prédios urbanos classificados como “industriais, comerciais ou de serviços” e “outros” mas, optou expressamente por manter outros prédios que também integram o activo das empresas, como sejam os classificados como habitacionais ou os terrenos para construção, ao não os incluir na delimitação negativa consagrada. Ou seja, não garantiu, nem pretendeu garantir, em todos os casos que não fosse atingido “o património imobiliário afeto ao exercício de qualquer atividade económica”, ao contrário do que é dito pela Requerente.

O carácter progressivo do AIMI apenas tem manifestação no âmbito dos sujeitos passivos - pessoas singulares e não quando os sujeitos passivos sejam pessoas colectivas ou estruturas jurídicas equiparadas por conseguinte, ao salientar-se que se trata de um imposto sobre a “riqueza imobiliária” é necessário reconduzir esta expressão à sua real dimensão económica, tanto mais que o conceito de “riqueza” ou “fortuna” se revela adequado quando se reporta a pessoas singulares e não a pessoas colectivas.

 

 

            7. Apreciação das questões suscitadas pela Requerente

 

            As partes, de forma fundamentada, assumem posições díspares, mormente ao nível da interpretação dos preceitos aplicáveis face aos princípios Constitucionais da igualdade e capacidade contributiva, quanto à questão da incidência objectiva do AIMI concretamente no que tange aos “terrenos para construção”.

 

No artigo 135.º-A define-se a incidência subjectiva deste imposto, estabelecendo-se que:

 

«São sujeitos passivos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis as pessoas singulares ou coletivas que sejam proprietários, usufrutuários ou superficiários de prédios urbanos situados no território português», sendo «equiparados a pessoas coletivas quaisquer estruturas ou centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica que figurem nas matrizes como sujeitos passivos do imposto municipal sobre imóveis».

           

Por sua vez, o artigo 135.º-B define a incidência objectiva deste imposto adicional estabelecendo que,

 

1 - O adicional ao imposto municipal sobre imóveis incide sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular.

 

2 - São excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados como «comerciais, industriais ou para serviços» e «outros» nos termos das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 6.º deste Código.

 

Por sua vez, o artigo 6.º do CIMI estabelece que,

 

1 - Os prédios urbanos dividem-se em:

 a) Habitacionais;

 b) Comerciais, industriais ou para serviços;

 c) Terrenos para construção;

 d) Outros.

 

2 - Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

 

3 - Consideram-se terrenos para construção os terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido declarados no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações, designadamente os localizados em zonas verdes, áreas protegidas ou que, de acordo com os planos municipais de ordenamento do território, estejam afectos a espaços, infra-estruturas ou equipamentos públicos.

 

4 - Enquadram-se na previsão da alínea d) do n.º 1 os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.

 

Na proposta de Orçamento constava para o n.º 2 do art. 135.º-B a seguinte redacção:

 

2 - São excluídos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis os prédios urbanos classificados na espécie “industriais”, bem como os prédios urbanos licenciados para a atividade turística, estes últimos desde que devidamente declarado e comprovado o seu destino.

           

A redacção que veio a ser aprovada não foi esta.

O que significa que o art. 135.º-B do CIMI (na redacção aprovada) não afasta a incidência do AIMI sobre terrenos para construção utilizados pelas pessoas colectivas no âmbito da sua actividade económica. O que se pode concluir é que, se fosse para haver qualquer distinção, o legislador teria mantido a redacção da proposta o que não veio a acontecer de facto.

            Assim, não foi com base na actividade a que estão afectos os imóveis que veio a ser definida a exclusão de incidência já que, como resulta do aludido n.º 2 cuja redacção veio, de facto a ser aprovada, a não incidência baseia-se nos tipos de prédios indicados no art. 6.º do CIMI, sem que do mesmo resulte qualquer outra alusão.

            A delimitação negativa da incidência é, o que podemos então concluir, consagrada na incidência objectiva e não subjectiva o que significa que o legislador afastou da incidência os prédios urbanos utilizados para fins “industriais, comerciais ou de serviços” e “outros”, mas manteve outros prédios que possam integrar o activo das empresas.

 

Conforme se extrai do acórdão 420/2018-T do CAAD:

 

“No entanto, não foi com base na actividade a que estão afectos os imóveis que veio a ser definida a exclusão de incidência, pois na redacção que veio a ser aprovada definiu-se a não incidência apenas com base nos tipos de prédios indicados no artigo 6.º do CIMI, sem qualquer alusão à afectação ao funcionamento das pessoas colectivas.

São conceitos distintos a afectação de um imóvel, que pressupõe uma utilização, e o fim a que está destinado, o «destino normal», subjacente às classificações dos imóveis, a que se refere o n.º 2 do artigo 6.º do CIMI.

Se tivesse sido mantida, na redacção final do Orçamento, a intenção legislativa de afastar a incidência sobre os imóveis diretamente afectos ao funcionamento das pessoas colectivas, decerto teria sido mantida a referência a esta afectação que constava da proposta e que expressava claramente essa opção legislativa.

Assim, tendo sido suprimida essa alusão à afectação dos imóveis, não há suporte legal para concluir que os prédios habitacionais e os terrenos para construção afectos à actividade das pessoas colectivas não relevem para a incidência do AIMI.

Por isso, é de concluir que a afectação dos imóveis às actividades económicas de pessoas colectivas não afasta a tributação em AIMI (fora dos casos em que se trate de prédios que no anterior tenham estado isentos ou não sujeitos a tributação em IMI, que não são contabilizados para efeitos de AIMI, nos termos do n.º 3 do artigo 135.º-B do CIMI)”.

 

Quais as razões que poderão estar subjacentes à exclusão da tributação em sede de AIMI?

 

Na senda do acórdão que temos vindo a citar:

 

“Relativamente aos prédios que têm a classificação de «outros» à face do artigo 6.º, n.ºs 2, alínea d), e 4, do CIMI, poderá ver-se uma razão para distinção no facto de se tratar essencialmente de prédios que não têm como finalidade actividades geradoras de rendimentos, designadamente os terrenos situados em aglomerados urbanos que não reúnem os requisitos necessários para a sua classificação como terrenos para construção nem estão a ser utilizados para fins agrícolas ou silvícolas e os edifícios destinados a espaços ou infra-estruturas ou equipamentos públicos.

No que concerne ao afastamento da tributação relativamente aos prédios destinados a comércio, indústria ou serviços poderá entrever-se uma explicação na finalidade invocada para a criação desta nova tributação, que é ao financiamento da Segurança Social, assegurado através da consignação de receitas do AIMI ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, prevista no n.º 2 do artigo 1.º do CIMI, na redacção da Lei n.º 42/2016, de 28 de Dezembro.

Não se pretende com o AIMI onerar a tributação de imóveis de luxo, como se visava primacialmente com a verba 28.1 da TGIS, pois o património imobiliário de valor avultado pode ser constituídos por uma pluralidade de imóveis de reduzido valor, mas sim criar mais uma via de subsidiação do sistema de segurança social, que é uma das incumbências constitucionais do Estado, prevista no artigo 63.º, n.º 2, da CRP”.

 

A incidência objectiva ou real do adicional ao imposto municipal sobre imóveis recai, de conformidade ao disposto no nº 1 do artigo 135º- B “sobre a soma dos valores patrimoniais tributários dos prédios urbanos situados em território português de que o sujeito passivo seja titular”.

Prevendo-se no n.º 2 do mesmo dispositivo uma exclusão de incidência sobre “os prédios urbanos classificados como “comerciais, industriais ou para serviços” e “outros”, nos termos das als b) e d) do nº 1 do referido art. 6º.

Estão deste modo sujeitos ao AIMI os prédios afectos à “habitação” e os “terrenos para construção” tal como definidos no mesmo artigo 6.º do CIMI, sem qualquer alusão à afectação ao funcionamento das pessoas colectivas, como já se afirmou no Acórdão Arbitral de 22.01.2019, proferido no processo 401/2018-T.

Por isso, é de concluir que a afectação dos imóveis às actividades económicas de pessoas colectivas não afasta a tributação em AIMI (fora dos casos em que se trate de prédios que no anterior tenham estado isentos ou não sujeitos a tributação em IMI, que não são contabilizados para efeitos de AIMI, nos termos do n.º 3 do artigo 135.º-B do CIMI).

A detenção de património imobiliário de valor elevado, independentemente da afectação ou não a actividade económica, é tendencialmente reveladora de elevada capacidade contributiva, superior à que é de presumir existir quando seja detido património de valor reduzido ou quando ele não exista, pelo que, em princípio, tem justificação a limitação da tributação às primeiras situações.

Não resulta, de facto, explicitamente do Relatório do Orçamento para 2017 nem da sua discussão parlamentar as razões que estarão subjacentes à distinção, para efeitos de tributação em AIMI, entre os valores patrimoniais dos prédios classificados como habitacionais ou terrenos para construção (independentemente da sua efectiva afectação a esses fins) e os dos prédios urbanos que têm outras classificações, à face do art. 6.º do CIMI.

Entende este Tribunal, quanto ao AIMI, que a literalidade das normas que conduz à incidência do imposto, e para o que aqui importa, sobre os “terrenos para construção”, independentemente da afectação que a estes venha a caber uma vez que não constam da delimitação negativa de incidência.

Este entendimento segue outras decisões, para além das citadas expressamente, onde se destacam entre outras as proferidas nas seguintes processos: 654/2017- T de 03.09.2018, 664/2017-T de 26.06.2018, 667/2017-T de 05.09.2018, 685/2017- T de 06.09.2018, 690/2017- T, de 06.09.2018, 692/2017 – T de 11.05.2018, 696/2017-T de 23.07.2018, 6/2018- T, de 26.07.2018, 306/2018- T, de 28.12.2018 e 401/2018-T, de 22.01.2019.

 

  1. Da inconstitucionalidade do AIMI

 

Pretende ainda a Requerente que sejam desaplicadas as normas em causa invocando a inconstitucionalidade do regime de tributação do AIMI, nomeadamente por violação dos princípios da igualdade e princípio da igualdade fiscal e capacidade contributiva.

Diga-se antes de, mais que, cabendo, como cabe, aos Tribunais a apreciação da (in)constitucionalidade, não pode a Administração Tributária, que se encontra na dependência hierárquica do executivo, substituir-se aos tribunais, e sindicar a constitucionalidade das leis que lhe cumpre aplicar.

Como se diz no Acórdão Arbitral n.º 664/2017-T, «o Tribunal Constitucional tem sublinhado, um dos objectivos essenciais constitucionalmente definidos do sistema fiscal, a par da satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, é o da repartição justa dos rendimentos e da riqueza, como se depreende do artigo 103.º, n.º 1, da Constituição».

Temos por assente neste âmbito que a liberdade de que goza o legislador exige que o princípio da capacidade contributiva disponha de alguma flexibilidade e possa ceder, até certo limite, perante outros propósitos do Estado.

Daí que, quando uma situação aparente ou tendencialmente igual é tratada de forma aparentemente diferente, só se pode falar em desigualdade fiscal se não houver razões atendíveis que tenham conduzido o legislador a fazer as opções que fez.

Ou seja, o que está constitucionalmente vedado ao legislador é o puro arbítrio, o que não sucederá quando tenha em vista a prossecução de objectivos a que atribui maior valor - como é o paradigmático caso dos benefícios fiscais, em que o legislador prefere abrir mão da receita fiscal para atingir outros objectivos.

É, aliás, dentro desse espírito que o legislador, no que ao caso importa, apenas pretende tributar os prédios classificados como habitacionais e terrenos para construção, abstendo-se de fazer incidir AIMI sobre os demais. Quer dizer, tomou uma medida de distinção do que é desigual, fazendo uma opção cuja justificação parece clara: não aumentar a carga fiscal sobre os sectores produtivos, visando as tão propaladas necessidades de investimento e de crescimento económico.

Como, do mesmo modo, refere aquele Acórdão Arbitral, «a titularidade de um património imobiliário, para efeitos de venda e transformação, em vista à obtenção de resultados económicos, não deixa de constituir um activo patrimonial que é revelador de uma acrescida capacidade contributiva, que vai além do imposto que incide sobre o lucro tributável em razão da actividade económica desenvolvida. O que está em causa, por conseguinte, não é a tributação do rendimento real auferido por essas entidades através da actividade desenvolvida, mas a capacidade contributiva complementar que decorre da titularidade do património e que por si só pode facilitar a angariação de crédito ou o reforço da sua posição negocial na celebração de contratos».

Acresce que a capacidade contributiva das pessoas colectivas empresariais, relevante para a aferição da aplicação do princípio da igualdade tributária, não é evidenciada apenas pelos rendimentos, designadamente pelos resultados da actividade a que se destinam os imóveis.

Na verdade, «o património proporciona ao seu titular uma capacidade contributiva especial, vantagens que pela sua natureza escapam ao imposto sobre os rendimentos pessoais: assim, a titularidade do património facilita a angariação de crédito, reforça a posição negocial do seu titular na celebração de contratos vários, torna mais fácil multiplicar a riqueza permitindo-lhe arriscar aí onde em princípio não o faria. Nesta óptica, o imposto sobre o património é visto como algo mais do que um prolongamento do imposto sobre os rendimentos pessoais - não se trata de sobrecarregar aqui rendimentos que já lhe estão sujeitos, mas de atingir manifestações de capacidade contributiva que na verdade lhe escapam» (Sérgio Vasques, Capacidade Contributiva, Rendimento e Património, em Fiscalidade, nº 23, p. 36).

Na mesma linha, concluímos que não se afigura, pois, ocorrer qualquer inconstitucionalidade.

 

 

Juros indemnizatórios

 

9. A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre o imposto, até ao reembolso integral da quantia devida.

 

A condenação no pagamento de juros indemnizatórios tem lugar, na sequência de declaração de ilegalidade dos actos de liquidação, nos termos das disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT.

 

Tendo sido julgado improcedente o pedido arbitral quanto ao acto tributário é também improcedente a condenação em juros indemnizatórios.

 

 

III – Decisão

 

  1. Termos em que se decide julgar totalmente improcedente o pedido arbitral e, em consequência, absolver a AT dos pedidos;
  2. Condenar a Requerente no pagamento das custas.

 

Valor da causa

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 19.101,11, que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 1.224,00, que fica a cargo da Requerente

 

Notifique.

 

Lisboa, 29 de abril de 2019

 

O árbitro

 

 

(Marisa Almeida Araújo)