Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 365/2018-T
Data da decisão: 2019-04-11  IRC  
Valor do pedido: € 121.674,56
Tema: IRC – Cisão; Benefício fiscal; Criação líquida de empregos
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DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

 

 

Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Marisa Isabel Almeida Araújo e Cristina Aragão Seia, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte:

 

I – RELATÓRIO

 

  1. No dia 31 de Julho de 2018, A..., S.A., NIPC..., com sede na Rua ..., ...-... ..., apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do acto de indeferimento expresso proferido em sede de Recurso Hierárquico n.º ...2017..., proveniente do deferimento parcial da Reclamação Graciosa n.º ...2016..., apresentada contra o erro na autoliquidação de IRC referente ao período de tributação de 2013, no valor de €114.667,21.

 

  1. Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, a ilegalidade da referida autoliquidação, porquanto a mesma não considerou, devidamente o benefício fiscal associado à criação líquida de emprego para jovens e desempregados de longa duração ("CLE"), previsto no artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

 

  1. No dia 01-08-2018, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.

 

  1. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. Em 21-09-2018, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.

 

  1. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 12-10-2018.

 

  1. No dia 13-11-2018, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação.

 

  1. Ao abrigo do disposto nas als. c) e e) do art.º 16.º, e n.º 2 do art.º 29.º, ambos do RJAT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT.

 

  1. Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, abstiveram-se as partes de o fazer.

 

  1. Foi indicado que a decisão final seria notificada até ao termo do prazo previsto no art.º 21.º/1 do RJAT.

 

  1. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir

 

II. DECISÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

  1. A Requerente é uma sociedade anónima de direito português, com sede e direcção efectiva em Portugal.
  2. A Requerente encontra-se sujeita e não isenta de tributação em sede do IRC.
  3. A Requerente foi criada por um processo de cisão, ocorrido no exercício de 2011, da sociedade "B..., Lda." ("B..."), a qual beneficiou, em sede de IRC, do regime especial de neutralidade fiscal, consagrado nos artigos 73.º e seguintes, do Código do IRC aplicável.
  4. Por via do referido processo de cisão foi destacada parte do património da "B...", constitutivo de uma unidade económica autónoma integrada por uma cadeia de lojas de venda de vestuário de marca “...”.
  5. No âmbito do processo de fusão foram transferidos da B... para a Requerente um conjunto de trabalhadores afectos à unidade económica destacada, que tinham sido considerados elegíveis para efeitos de apuramento do Benefício Fiscal relativo à Criação Líquida de Empregos (CLE), previsto no art.º 19.º do EBF aplicável, na esfera da "B...", nos exercícios de 2008, 2009 e 2010.
  6. No exercício de 2013, a Requerente teve ao seu serviço, com contrato de trabalho sem termo, os trabalhadores constantes do quadro infra, cujas idades, data de entrada ao serviço da Requerente, e data de saída (se aplicável), são as que contam do referido quadro, tendo a Requerente suportado com os mesmos os encargos igualmente constantes de tal quadro:

  1. No cumprimento das obrigações declarativas a que se encontra adstrita, a Requerente submeteu, em 26 de Março de 2014, a sua Declaração periódica de Rendimentos (Modelo 22) do IRC, respeitante ao exercício de 2013.
  2. Naquela declaração a Requerente apurou, no exercício de 2013, um resultado tributável de € 107.165,60, o qual foi declarado no Campo 778 do Quadro 07 da Declaração periódica de Rendimentos (Modelo 22) do IRC referida, e uma colecta de € 26,791,40, declarada no Campo 351 do Quadro 10 da mesma Declaração periódica de Rendimentos (Modelo 22).
  3. Na mesma declaração periódica de Rendimentos (Modelo 22) do IRC do exercício de 2013, a Requerente procedeu à dedução do montante de € 18.753,98, a título de Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento ("CFEI").
  4. Na sequência de um procedimento de inspecção tributária, a A... procedeu, em 18 de Agosto de 2015, à entrega de uma Declaração periódica de rendimentos (Modelo 22) do IRC de substituição, por referência ao exercício de 2013.
  5. Na referida declaração a Requerente apurou um resultado tributável de € 414.624,97 e uma colecta de € 103.656,24, inseridos nos Campos 778 e 351, respectivamente, daquela mesma declaração.
  6. Na Declaração periódica de rendimentos (Modelo 22) do IRC de substituição, a Requerente continuou a proceder à dedução, no exercício de 2013, do montante que já tinha feito constar na versão original, ou seja, € 18.753,98, a título de CFEI.
  7. Nas declarações referidas a Requerente acresceu ao lucro tributável do exercício de 2013, no Campo 710 daquelas, o montante de € 50.685,90, a título de correcções relativas a exercícios anteriores, dos quais € 32.686,37, a Requerente considerou acrescidos por lapso.
  8. A Requerente apresentou, em 24 de Março de 2016, Reclamação Graciosa, contra a liquidação do IRC decorrente das declarações que apresentou, solicitando as correcções:
    1. A consideração do benefício fiscal associado à criação líquida de emprego para jovens e desempregados de longa duração ("CLE"), previsto no artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais ("EBF");
    2. As correcções relativas a exercícios anteriores na parte em que foram declaradas por lapso; e
    3. A dedutibilidade de benefícios fiscais que operam por dedução à colecta, decorrentes das correcções solicitadas.
  9. A Requerente foi notificada do projecto de indeferimento parcial daquela reclamação graciosa, tendo exercido tempestivamente o direito de audição que lhe assistia.
  10. O referido projecto fundamentava-se numa informação prévia prestada pela Divisão de Inspecção Tributária III, da Direcção de Finanças de..., cujo teor, na parte que releva para os presentes autos, era o seguinte:

 

 

 

 

 

 

 

 

  1. O projecto de decisão da Reclamação Graciosa notificado à Requerente, remeteu para a informação precedente, na qual se fundamentou.
  2. A Requerente exerceu o seu direito de audição prévia.
  3. Em 23 de Novembro de 2017, a "A..." foi notificada da decisão final sobre a reclamação graciosa apresentada, a qual deferiu as pretensões respeitantes às correcções identificadas nos pontos b) e c) do ponto 14 que antecede.
  4. A referida decisão final manteve o projecto notificado à Requerente, aditando a pronúncia da AT sobre o direito de audição exercido pela Requerente, constando o seguinte, no que para o caso releva, da referida decisão:

 

  1. Em 21 de Dezembro de 2017, a Requerente interpôs recurso hierárquico relativamente ao indeferimento parcial da reclamação apresentada.
  2. Naquele recurso hierárquico foi proferido despacho de indeferimento, notificado à Requerente no dia 7 de Maio de 2018.

 

A.2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Em concreto, o facto dado como provado sob o ponto 6 foi devidamente alegado pela Requerente, no seu pedido subsidiário, e encontra-se suportado nos documentos 9 e 13 juntos com o Requerimento inicial, que não foram impugnados pela Requerida, e resultam de dados já analisados e validados pela AT em sede graciosa.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

 

B. DO DIREITO

            A questão que se coloca nos presentes autos de processo arbitral, prende-se com o regime do benefício fiscal que a Requerente alega ter direito, relativo à criação líquida de emprego, previsto no artigo 19º do EBF aplicável, dos anos de 2008, 2009 e 2010, apurados na esfera tributária da Sociedade B..., por cisão da qual a Requerente foi criada.

            Efectivamente, e como resulta da matéria de facto dada como provada, a Requerente foi criada por um processo de cisão, ocorrido no exercício de 2011, da sociedade "B..., Lda." ("B..."), a qual beneficiou, em sede de IRC, do regime especial de neutralidade fiscal, consagrado nos artigos 73.º e seguintes, do Código do IRC aplicável.

            Por via do referido processo de cisão, foi transmitido da B... para a Requerente um ramo de actividade daquela, constitutivo de uma unidade económica autónoma integrada por uma cadeia de lojas de venda de vestuário de marca “…”, incluindo-se aí um conjunto de trabalhadores afectos à unidade económica destacada, que tinham sido considerados elegíveis para efeitos de apuramento do Benefício Fiscal relativo à Criação Líquida de Empregos (CLE), previsto no art.º 19.º do EBF aplicável, na esfera da "B...", nos exercícios de 2008, 2009 e 2010.

            A Requerente sustenta o seu direito ao benefício fiscal referidos, essencialmente em três ordens de argumentos, a saber:

  1. o direito ao benefício fiscal em questão decorre directamente do processo de cisão verificado, não ocorrendo “uma transferência do benefício fiscal, na medida em que, sendo a unidade económica a mesma, ainda que agora na esfera da A..., o benefício fiscal associado aos colaboradores afetos a essa unidade económica segue esses mesmos colaboradores.”;
  2. mesmo que assim não se entenda, a referida transmissão deve ser admitida, porquanto “com a cisão, transmite-se a universalidade de todos os direitos e obrigações inerentes, sendo de todo legítimo (e, inquestionável) o entendimento de que os benefícios fiscais se incluem no elenco das relações jurídicas ativas e passivas objeto de transmissão!”;
  3. Subsidiariamente, “a transferência dos colaboradores para a Requerente, no âmbito da cisão da "B...", pode ser encarada como a criação de posto(s) de trabalho, dito de outro modo, correspondem a novas entradas de colaboradores na esfera de uma nova entidade, neste caso da "A...", devendo esta avaliar se cumpre, ou não, os pressupostos exigidos no artigo 19.º do EBF sobre criação de empregos.”, sendo que “neste cenário, (...) a "A..." estaria em condições de aproveitar o benefício fiscal à CLE relativamente àqueles colaboradores no exercício de 2011 e, bem assim, nos exercícios posteriores, até completar 5 anos, uma vez que (i) aqueles colaboradores, apesar de elegíveis na esfera da "B...", não foram considerados, na esfera daquela sociedade, para efeitos do benefício fiscal em apreço e (ii) reuniriam as condições para serem considerados como entrada elegível na esfera da "A..." em 2011.”;
  4. não permitir “o aproveitamento do benefício fiscal relativo à criação liquida de emprego na esfera da "A...", viola os princípios previstos na Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o princípio do Estado de Direito Democrático, na sua vertente da segurança e certeza jurídicas (artigo 2.º)”.

            Vejamos, então.

*

i.

            Relativamente ao primeiro argumento acima elencado, crê-se não assistir, manifestamente, razão à Requerente.

            Com efeito, no caso, estamos perante uma cisão simples, em que foi destacada uma parte do património da Requerente, para com ela constituir outra sociedade (cfr. art.º 118.º/1/a) do Código das Sociedades Comerciais).

            Nestes casos, não se verifica qualquer analogia ou semelhança com as situações de fusão por incorporação, a que se refere a esmagadora maioria da jurisprudência em que a Requerente se louva.

            Com efeito, não obstante afirmar recorrentemente que o expendido “a propósito de uma operação de fusão por incorporação” é “igualmente aplicável a uma operação de cisão simples”, a verdade é que não é assim.

            Efectivamente, se na fusão por incorporação, se pode afirmar que “A fusão de uma sociedade com outra, para a qual se transfere todo o seu património, implica a perda da personalidade jurídica daquela, mas não implica, necessariamente, o desaparecimento da realidade económica e empresarial que ela constituía.[2], na cisão simples, tal não ocorre, por definição, na medida em que não se verifica a transferência de todo o património da sociedade cindida para a sociedade beneficiária.

            Esta circunstância, não pode deixar de se considerar decisivamente relevante, sobretudo no que concerne a tutela dos interesses de terceiros, onde se inclui a Administração Tributária, e, consequentemente, nos condicionalismos e efeitos próprios de cada um daqueles tipos de operação.

            No caso, e como se referiu, a cisão simples consiste, essencialmente, no destaque de uma parte do património da sociedade cindida, que se torna autónomo do património que se queda na sociedade cindida.

            Nestes termos, a operação em causa terá de ser encarada como uma verdadeira transferência de património (activos e passivos, direitos e obrigações), não podendo, em caso algum, julga-se, ser enquadrada como uma mera continuidade da situação jurídica existente pré-cisão.

            Que assim é, torna-se evidente, crê-se, por exemplo, se se atentar no regime da tutela dos interesse dos credores, o qual impõe, nos processos de cisão, que quer a sociedade cindida, quer a sociedade beneficiária da cisão, sejam solidariamente responsáveis pelas dívidas que, por força da cisão, tenham sido atribuídas à sociedade incorporante ou à nova sociedade (cfr. art.º 122.º do CSC).

            O que está em causa, no que para o caso releva, é a realidade de que, com a cisão haver uma separação de patrimónios, com a afectação de parte destes a uma entidade terceira, circunstância que, como é notório, contende com a consistência das posições jurídicas dos terceiros que se relacionaram com o ente jurídico originário.

            Em todo caso, e por ora, o que será de sublinhar é que no caso da cisão simples, ao contrário do que acontece na fusão por incorporação, não se verifica uma continuidade da realidade económica preexistente, que foi cindida, passando a dividir-se entre a entidade cindida e a sociedade incorporante ou a nova sociedade.

            Deste modo, não se poderá deixar de enquadrar o processo de cisão simples como uma transferência de uma parte do património da sociedade cindida, para sociedade incorporante ou a nova sociedade beneficiárias de tal transmissão.

 

*

ii.

            Assente que, no processo de cisão em causa, se verifica uma transmissão de elementos patrimoniais da sociedade cindida, para a sociedade beneficiária da cisão, fica claro que a situação sub iudice, reportando-se a um benefício fiscal, se haverá de dirimir face às normas próprias que regulam a transmissão daqueles benefícios.

            Neste âmbito, pontifica, como é sabido, o art.º 15.º do EBF, que na versão aplicável dispõe que:

“1 - O direito aos benefícios fiscais, sem prejuízo do disposto nos números seguintes, é intransmissível inter vivos, sendo, porém, transmissível mortis causa se se verificarem no transmissário os pressupostos do benefício, salvo se este for de natureza estritamente pessoal.

2 - É transmissível inter vivos o direito aos benefícios fiscais objetivos que sejam indissociáveis do regime jurídico aplicável a certos bens, designadamente os que beneficiem os rendimentos de obrigações, títulos de dívida pública e os prédios sujeitos ao regime de renda limitada.

3 - É igualmente transmissível inter vivos, mediante autorização do Ministro das Finanças, o direito aos benefícios fiscais concedidos, por ato ou contrato fiscal, a pessoas singulares ou coletivas, desde que no transmissário se verifiquem os pressupostos do benefício e fique assegurada a tutela dos interesses públicos com ele prosseguidos.”.

            Face a este normativo, não será, manifestamente aplicável ao caso o n.º 1 da norma referida, na medida em que prevê a transmissibilidade de benefícios mortis causa, o que não está em questão nestes autos arbitrais.

            Do mesmo modo, não será de convocar para o caso o n.º 3 daquela norma, na medida em que a mesma postula a existência de autorização do Ministro das Finanças, o que, no caso não se apura, nem é sequer alegado, que tenha ocorrido.

            Daí que apenas no n.º 2 da norma em causa se pudesse lobrigar algum acolhimento para a pretensão da Requerente.

Todavia, aquele n.º 2 apenas consente transmissão inter vivos do “direito aos benefícios fiscais objetivos que sejam indissociáveis do regime jurídico aplicável a certos bens, designadamente os que beneficiem os rendimentos de obrigações, títulos de dívida pública e os prédios sujeitos ao regime de renda limitada”, sendo que, no caso, não estamos, manifestamente, perante um benefício fiscal do tipo dos elencados.

Deste modo, haverá que concluir que, face ao referido art.º 15.º do EBF, não é licenciada a transmissão do benefício fiscal do qual a Requerente pretende usufruir.

Ainda no âmbito da transmissão do benefício fiscal em questão, pretende a Requerente que a mesma seja autorizada pelo regime da neutralidade fiscal, sob a égide do qual a cisão operada se realizou.

Conforme resulta, desde logo, da Directiva 2009/133/CE do Conselho, de 19 de Outubro de 2009, o regime fiscal da neutralidade de fusões e cisões “deverá evitar a tributação das fusões, cisões, cisões parciais, entradas de activos e permutas de acções, salvaguardando os interesses financeiros do Estado-Membro da sociedade contribuidora ou adquirida.”, notando-se, desde logo, que o regime comunitário regulador da matéria não contém qualquer previsão específica relativamente aos benefícios fiscais.

Por outro lado, compulsadas as disposições dos art.ºs 73.º e ss. do CIRC aplicável (versão 2011), não se descortina nenhuma disposição da qual resulta, minimamente, que no âmbito do regime da neutralidade fiscal das cisões, se deverão ter por transmitidos para a entidade beneficiária da cisão, benefícios fiscais titulados pela sociedade cindida, fora das normas constantes do art.º 15.º do EBF vigente.

Também não resulta, ao contrário do que invoca a Requerente, da natureza, ou da ratio legis, própria do regime da neutralidade das cisões que os benefícios fiscais não enquadráveis no art.º 15.º do EBF aplicável, se deverão ter por transmitidos para a entidade beneficiária da cisão.

Assim, e desde logo, conforme se referiu já, as disposições comunitárias relativas a tal matéria não contêm qualquer previsão específica relativa aos benefícios fiscais.

Por outro lado, a teleologia própria do regime dos benefícios fiscais opõe-se a que opere a transmissão do benefício fiscal em questão, por força da mera ocorrência de uma cisão simples, como a que está em questão nos presentes autos de processo arbitral.

Com efeito, e como resulta do art.º 14.º do EBF aplicável, os benefícios fiscais, ainda que automáticos, como é o caso, deixam de operar nos casos em que:

  1. O sujeito passivo tenha deixado de efectuar o pagamento de qualquer imposto sobre o rendimento, a despesa ou o património e das contribuições relativas ao sistema da segurança social, e se mantiver a situação de incumprimento;
  2. A dívida tributária não tenha sido objecto de reclamação, impugnação ou oposição, com a prestação de garantia idónea, quando exigível.

Ora, a permissão, pura e simples de transmissão de benefícios fiscais, por via de um processo de cisão simples, como o que está em causa nos autos, redundaria numa via aberta para a fraude à lei, podendo uma entidade que tivesse deixado de efectuar o pagamento de qualquer imposto sobre o rendimento, a despesa ou o património e das contribuições relativas ao sistema da segurança social, e se mantivesse na situação de incumprimento, cindir parte ou partes do seu património, de modo a nelas manter benefícios fiscais de que usufruísse, sem que lhe fossem infligidas as penalizações próprias da situação de incumprimento fiscal em que se tivesse constituído.

Daí que no regime da neutralidade fiscal das fusões e cisões, instituído no CIRC em vigor a partir do exercício de 2014, se tenha estatuído, no art.º 75.º-A, que passou a regular expressamente a matéria em questão, que, ao contrário das fusões realizadas ao abrigo do regime de neutralidade fiscal, as cisões apenas acarretariam a transmissão dos benefícios fiscais titulados pela sociedade cindida, mediante, para além do mais, autorização do membro do Governo responsável pela área das finanças, conforme estatuído pelo art.º 75.º-A do CIRC vigente a partir do exercício de 2014, controle este que se justifica, precisamente, em ordem a assegurar que a transmissão dos benefícios fiscais por via dos processos de cisão não tenha subjacente a lesão de qualquer interesse fiscalmente atendível.

Daqui decorre, sem margem para dúvidas, crê-se, que ao contrário do que pretende a Requerente, a transmissão de benefícios fiscais da natureza do que está em causa nos presentes autos de processo arbitral, no contexto de um processo de cisão simples, não ocorre de forma automática, nem da natureza do regime fiscal de neutralidade de que aquelas operações (de cisão simples) possam usufruir, nem estava autorizada no quadro do regime legal vigente à data da cisão sub iudice.

Esta matéria, de resto, foi já analisada com pertinência e profundidade no âmbito do processo arbitral n.º 83/2013-T, do CAAD, com cujos fundamentos, na generalidade, se concorda, e que aqui, por brevidade, se opta por não transcrever.

 

*

Subsidiariamente, alega a Requerente que “a transferência dos colaboradores para a Requerente, no âmbito da cisão da "B...", pode ser encarada como a criação de posto(s) de trabalho, dito de outro modo, correspondem a novas entradas de colaboradores na esfera de uma nova entidade, neste caso da "A...", devendo esta avaliar se cumpre, ou não, os pressupostos exigidos no artigo 19.º do EBF sobre criação de empregos.”, sendo que “neste cenário, (...) a "A..." estaria em condições de aproveitar o benefício fiscal à CLE relativamente àqueles colaboradores no exercício de 2011 e, bem assim, nos exercícios posteriores, até completar 5 anos, uma vez que (i) aqueles colaboradores, apesar de elegíveis na esfera da "B...", não foram considerados, na esfera daquela sociedade, para efeitos do benefício fiscal em apreço e (ii) reuniriam as condições para serem considerados como entrada elegível na esfera da "A..." em 2011.”.

            Louva-se, ainda, a Requerente numa passagem, que invoca, da decisão do recurso hierárquico, que transcreve como afirmando que “"qualquer outra empresa para onde ele [colaborador] seja transferido terá ou não direito a benefício idêntico conforme cumpra ou não, por sua vez, os pressupostos exigidos no artigo do EBF sobre criação de empregos".”.

            Antes de mais, e concordando-se com o referido, cumpre notar que a passagem transcrita não é afirmada directamente pela decisão do recurso hierárquico, constando, antes, da transcrição que ali é feita da fundamentação da decisão proferida no processo arbitral 201/2013T, do CAAD.

Posto, isto, vejamos a questão, que não foi objecto da já referida decisão arbitral proferida no âmbito do processo arbitral n.º 83/2013-T, do CAAD.

Tal questão, centra-se no regime do art.º 19.º do EBF aplicável, cujo teor era o seguinte:

“1 - Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150 % do respectivo montante, contabilizado como custo do exercício.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se:

a) 'Jovens' os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino;

b) 'Desempregados de longa duração' os trabalhadores disponíveis para o trabalho, nos termos do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de Novembro, que se encontrem desempregados e inscritos nos centros de emprego há mais de 9 meses, sem prejuízo de terem sido celebrados, durante esse período, contratos a termo por período inferior a 6 meses, cuja duração conjunta não ultrapasse os 12 meses; (Redacção da Lei n.º10/2009-10/03)

c) «Encargos» os montantes suportados pela entidade empregadora com o trabalhador, a título da remuneração fixa e das contribuições para a segurança social a cargo da mesma entidade;

d) «Criação líquida de postos de trabalho» a diferença positiva, num dado exercício económico, entre o número de contratações elegíveis nos termos do n.º 1 e o número de saídas de trabalhadores que, à data da respectiva admissão, se encontravam nas mesmas condições.

3 - O montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida.

4 - Para efeitos da determinação da criação líquida de postos de trabalho, não são considerados os trabalhadores que integrem o agregado familiar da respectiva entidade patronal.

5 - A majoração referida no n.º 1 aplica-se durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, não sendo cumulável, quer com outros benefícios fiscais da mesma natureza, quer com outros incentivos de apoio ao emprego previstos noutros diplomas, quando aplicáveis ao mesmo trabalhador ou posto de trabalho.

6 - O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma única vez por trabalhador admitido nessa entidade ou noutra entidade com a qual existam relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC.

            Conforme decorre da norma transcrita, para o benefício fiscal em questão apenas são elegíveis os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para:

  1. jovens; e
  2. desempregados de longa duração.

Entendendo-se pelos primeiros, “os trabalhadores com idade superior a 16 e inferior a 35 anos, inclusive, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, com excepção dos jovens com menos de 23 anos, que não tenham concluído o ensino secundário, e que não estejam a frequentar uma oferta de educação-formação que permita elevar o nível de escolaridade ou qualificação profissional para assegurar a conclusão desse nível de ensino”.

No presente caso, estão apenas situações relativas a este tipo de trabalhadores, não estando em causa a contratação de desempregados de longa duração.

A Requerente foi criada, conforme resulta dos factos dados como provados, no ano de 2011, por cisão da sociedade B... .

E, desde a altura da sua criação, no ano de 2011, até 2013, começou a ter ao seu serviço, por contrato de trabalho sem termo, os trabalhadores constantes do quadro que integra o ponto 6 dos factos dados como provados, tendo, igualmente, terminado a relação laboral com os trabalhadores como tal indicados no mesmo quadro, e suportado com aqueles trabalhadores os encargos também ali discriminados.

Concluindo-se, como se viu supra, que não se verificou qualquer transferência do benefício em questão, da esfera da B..., para a da Requerente, porquanto, para além do mais, e como a AT reiteradamente afirmou, são entidades juridicamente distintas e autónomas, concluir-se-á, como consta da decisão proferida no processo arbitral 201/2013T, do CAAD, que a Requerente “terá ou não direito a benefício idêntico conforme cumpra ou não, por sua vez, os pressupostos exigidos no artigo do EBF sobre criação de empregos”.

Ou seja, considerando-se que tem sustentado a AT, e acima se ratificou, ter havido uma transmissão da relação laboral da sociedade cindida, para a sociedade criada, em termos de cessar o enquadramento jurídico fiscal que correspondia a tal relação, ter-se-á de considerar que estamos perante uma relação com relevância jurídico-fiscal renovada.

Por outro lado, dúvidas não haverá, que se encontra preenchido, no que diz respeito à Requerente, o pressuposto do n.º 1 do art.º 19.º do EBF aplicável, referente a terem sido “admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado”, ao seu serviço, os trabalhadores anteriormente ao serviço da B... .

Daí que, de entre os vários requisitos e exclusões legalmente previstos no regime do benefício fiscal em questão, apenas no quadro da norma do n.º 6 do art.º 19.º EBF, se possa discutir a existência do direito ou não da Requerente ao benefício fiscal.

À data vigorava a seguinte redacção, introduzida pela Lei n.º55-A/2010 de 31/12: “O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma única vez por trabalhador admitido nessa entidade ou noutra entidade com a qual existam relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC.”.

Esta norma sucedeu a uma redacção que dispunha, até aí que “O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma vez em relação ao mesmo trabalhador, qualquer que seja a entidade patronal”.

Ou seja, se até aí, dúvidas não haveria que a Requerente não teria direito a usufruir do benefício fiscal em questão, dado que os trabalhadores que o fundariam tinha já sido qualificados para efeitos do mesmo benefício, na esfera da anterior empregadora (a B...)[3].

 

            Todavia, à luz da norma vigente aquando da admissão dos trabalhadores em questão, ao serviço da Requerente, estes apenas não poderiam relevar para efeitos do benefício fiscal em causa, se antes tivessem estado ao serviço de outra entidade com a qual existissem relações especiais nos termos do artigo 63.º do Código do IRC.

            Sendo que o n.º 4 da referida norma dispunha, à data que:

“Considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre:

a) Uma entidade e os titulares do respectivo capital, ou os cônjuges, ascendentes ou descendentes destes, que detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto;

b) Entidades em que os mesmos titulares do capital, respectivos cônjuges, ascendentes ou descendentes detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto;

c) Uma entidade e os membros dos seus órgãos sociais, ou de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, e respectivos cônjuges, ascendentes e descendentes;

d) Entidades em que a maioria dos membros dos órgãos sociais, ou dos membros de quaisquer órgãos de administração, direcção, gerência ou fiscalização, sejam as mesmas pessoas ou, sendo pessoas diferentes, estejam ligadas entre si por casamento, união de facto legalmente reconhecida ou parentesco em linha recta;

e) Entidades ligadas por contrato de subordinação, de grupo paritário ou outro de efeito equivalente;

f) Empresas que se encontrem em relação de domínio, nos temos em que esta é definida nos diplomas que estatuem a obrigação de elaborar demonstrações financeiras consolidadas;

g) Entidades entre as quais, por força das relações comerciais, financeiras, profissionais ou jurídicas entre elas, directa ou indirectamente estabelecidas ou praticadas, se verifica situação de dependência no exercício da respectiva actividade, nomeadamente quando ocorre entre si qualquer das seguintes situações:

1) O exercício da actividade de uma depende substancialmente da cedência de direitos de propriedade industrial ou intelectual ou de know-how detidos pela outra;

2) O aprovisionamento em matérias-primas ou o acesso a canais de venda dos produtos, mercadorias ou serviços por parte de uma dependem substancialmente da outra;

3) Uma parte substancial da actividade de uma só pode realizar-se com a outra ou depende de decisões desta;

4) O direito de fixação dos preços, ou condições de efeito económico equivalente, relativos a bens ou serviços transaccionados, prestados ou adquiridos por uma encontra-se, por imposição constante de acto jurídico, na titularidade da outra;

5) Pelos termos e condições do seu relacionamento comercial ou jurídico, uma pode condicionar as decisões de gestão da outra, em função de factos ou circunstâncias alheios à própria relação comercial ou profissional.

h) Uma entidade residente ou não residente com estabelecimento estável situado em território português e uma entidade sujeita a um regime fiscal claramente mais favorável residente em país, território ou região constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.”.

Ora, dos autos não constam quaisquer elementos que demonstrem, não obstante tal ser provável, que alguma ou algumas das relações elencadas naquele n.º 4 do art.º 63.º do CIRC se verificavam entre a Requerente e a B... .

E, sobretudo, nada a esse respeito é, sequer, alegado pela AT, quer em sede administrativa quer em sede arbitral, não obstante a Requerente já no exercício do seu direito de audição em sede de reclamação graciosa ter peticionado que:

E, não obstante, já anteriormente, em sede de informação lavrada na Direcção de Finanças de ..., se ter notado que:

Sendo certo que, entre os elementos recolhidos em sede de instrução da reclamação graciosa, se encontravam:

Ou seja, a AT teve, quer em sede administrativa quer em sede arbitral, onde a Requerente formulou o pedido subsidiário agora em apreço, todas as condições e elementos para, sendo caso disso, invocar e demonstrar que se verificava, efectivamente, alguma ou algumas das relações elencadas no n.º 4 do art.º 63.º do CIRC aplicável, entre a Requerente e a B... .

Não o tendo feito, não poderá, crê-se, sob pena de incorrer em excesso de pronúncia, este Tribunal presumir ou inferir a existência de tais relações e aplicar-lhes as normas jurídicas correspondentes.

            Assim, e face ao exposto, não poderá este Tribunal concluir de outra forma senão pela procedência do pedido subsidiário, no valor €152.160,05, valor ao qual há que descontar o reconhecido e corrigido pela própria AT em sede graciosa de €30.485,49, perfazendo o total de € 121.674,56.

            Note-se, ainda, que a presente decisão apenas faz caso julgado relativamente ao ano de 2013, pelo que não prejudica que, relativamente a outros períodos que estejam ou venham a estar em discussão, a AT alegue e demonstre a existência de relações especiais entre a Requerente e a B..., daí retirando as devidas consequências legais.

            Face ao ora decidido, fica prejudicado o conhecimento da questão colocada pela Requerente relativamente à violação dos princípios previstos na Constituição da República Portuguesa, nomeadamente o princípio do Estado de Direito Democrático, na sua vertente da segurança e certeza jurídicas (artigo 2.º).

 

*

            Peticiona a Requerente, para além da anulação dos actos de indeferimento expresso proferido em sede de Recurso Hierárquico n.º ...2017..., do deferimento parcial da Reclamação Graciosa n.º ...2016..., e da autoliquidação de IRC referente ao período de tributação de 2013 que:

            - se permita o reporte do CFEI nos exercícios subsequentes, em resultando do impacto ao nível da Colecta do IRC resultante da aceitação da benefício fiscal relativo à criação líquida de emprego nos termos requeridos;

            - se mande restituir os montantes de IRC pagos em excesso, no montante de €69.811,81 e de € 70.442,47, respetivamente.

            Como se escreveu no Acórdão proferido no processo arbitral 244/2013T do CAAD:

“A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT).

Refere-se nesta norma que a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais; (redacção da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

Para além da apreciação directa da legalidade de actos deste tipo, incluem-se ainda nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD competências para apreciar actos de segundo ou terceiro grau que tenham por objecto a apreciação da legalidade de actos daqueles tipos, designadamente de actos que decidam reclamações graciosas e recursos hierárquicos, como se depreende das referências expressas que se fazem no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT ao n.º 2 do artigo 102.º do CPPT (que se reporta à impugnação judicial de decisões de reclamações graciosas) e à «decisão do recurso hierárquico». (...)

Na verdade, apesar de ser ter vindo a entender, em sintonia com longa jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal Administrativo que, na sequência de declaração de ilegalidade de actos de liquidação, proferida em processo de impugnação judicial, podem ser proferidas decisões de condenação no pagamento de juros indemnizatórios, bem como, por força do artigo 171.º, n.º 1, do CPPT, de condenação no pagamento de indemnizações por garantia indevida, o certo é que não há qualquer suporte legal para permitir que sejam proferidas condenações de outros tipos, mesmo que sejam consequências, a nível executivo, da declaração de ilegalidade de actos de liquidação.

Com efeito, como decorre do preceituado no artigo 24.º do RJAT, a definição dos actos em que se deve concretizar a execução de julgados arbitrais, cabe, em primeira linha, à Autoridade Tributária e Aduaneira, com a subsequente possibilidade de recurso aos tribunais tributários para requerer coercivamente a execução, no âmbito do processo de execução de julgados, previsto no artigo 146.º do CPPT e artigos 173.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.”

            Daí que não caiba a este Tribunal arbitral, sendo questão a dirimir, se necessário, em sede de execução de julgados, permitir o reporte do CFEI nos exercícios subsequentes, em resultando do impacto ao nível da colecta do IRC resultante da aceitação da benefício fiscal relativo à criação líquida de emprego nos termos requeridos.

            Relativamente ao pedido de restituição do imposto pago em excesso no ano de 2013, tem naturalmente a Requerente direito ao mesmo, por força do decidido na presente acção arbitral.

            Todavia, não foram alegados, nem consequentemente provados, facto que permitam a este tribunal determinar o montante do imposto pago nem, consequentemente, o montante a ser devolvido, pelo que o concreto montante a restituir à Requerente deverá, se necessário, ser apurado em execução do presente julgado.

 

*

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

  1. Julgar integralmente improcedente o pedido arbitral principal formulado pela Requerente;
  2. Julgar integralmente procedente o pedido arbitral subsidiário formulado pela Requerente e, em consequência, anular parcialmente a autoliquidação de IRC referente ao período de tributação de 2013 da Requerente, tal como subsiste após o deferimento parcial da reclamação graciosa, na medida em que não considera o benefício fiscal previsto no art.º 19.º do EBF aplicável, no montante de € 121.674,56, e, consequentemente e na mesma medida, anular também as decisões de indeferimento do Recurso Hierárquico n.º ...2017..., e de deferimento parcial da Reclamação Graciosa n.º ...2016...;
  1. Condenar a AT na restituição do imposto indevidamente pago, por força do acto de autoliquidação de imposto, ora parcialmente anulado;
  2. Condenar a Requerida nas custas do processo, no montante abaixo fixado.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em €121.674,56, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 3.060,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido subsidiário foi totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do citado Regulamento.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 11 de Abril de 2019

 

O Árbitro Presidente

 

(José Pedro Carvalho)

 

O Árbitro Vogal

 

(Marisa Isabel Almeida Araújo)

 

O Árbitro Vogal

 

(Cristina Aragão Seia)

 



[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.

[2] Ac. do STA de 13-04-2005, proferido no processo 01265/04.

[3] É certo que em sede de Reclamação Graciosa (cfr. art.º 39), a Requerente refere que “nenhum dos colaboradores selecionados para o apuramento do benefício fiscal à criação líquida de emprego, por parte da A..., foi considerado para efeitos do cálculo do benefício fiscal à criação líquida de emprego em outra empresa, nomeadamente na esfera da B...”.

                Não obstante, a partir do recurso hierárquico, e prosseguindo na presente acção arbitral, a Requerente afirma, mais do que uma vez, por exemplo, que “o benefício fiscal adquirido na B... relativo aos colaboradores que contratou sem termo e que posteriormente foram transferidos para a esfera da A..., por via de uma operação de cisão simples que beneficiou do regime de neutralidade fiscal em sede de IRC, deverá, naturalmente, transitar para a sociedade beneficiária.”[3], reconhecendo assim que havia sido adquirido na esfera da B... o benefício fiscal relativo aos colaboradores em causa.