Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 611/2017-T
Data da decisão: 2018-12-03  IVA  
Valor do pedido: € 1.065.751,04
Tema: IVA – SGPS; Afectação directa – Despesas Gerais – Pro-rata.
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Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Luís Ricardo Farinha Sequeira e Victor Simões, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte:

 

 

DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

 

I – RELATÓRIO

 

  1. No dia 24 de Novembro de 2017, A..., SGPS, S.A., NIPC..., com sede na Rua..., n.º..., ...-... ..., apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa instaurada sob o número ...2017... e dos actos de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado e dos respectivos juros compensatórios, que resultaram do procedimento inspectivo executado ao abrigo das Ordens de Serviço n.º OI2015.../... /.../..., e juntas como doc. 2 com o Requerimento inicial, no valor global de €1.065.751,04.

 

  1. Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese, que:
    1. Se verifica ausência ou vício de fundamentação legalmente exigida;
    2. os pressupostos de facto nos quais a Autoridade Tributária sustentou as correções que estão subjacentes às liquidações estão em violação de lei no tocante aos princípios gerais norteadores do direito à dedução do IVA, conforme decorre dos artigos 19.º, 20.º e 23.º do Código do IVA e dos artigos 4.º e 9.º da Diretiva IVA.

 

  1. No dia 24-11-2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.

 

  1. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. Em 16-01-2018, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.

 

  1. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 06-02-2018.

 

  1. No dia 13-03-2018, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação.

 

  1. Ao abrigo do disposto nas als. c) e e) do art.º 16.º, e n.º 2 do art.º 29.º, ambos do RJAT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT, e facultada à Requerente a possibilidade de produzir prova documental adicional, o que fez, tendo subsequentemente sido dado cumprimento ao necessário contraditório.

 

  1. Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.

 

  1. Foi fixado o prazo de 60 dias para a prolação de decisão final, após a apresentação de alegações pela Requerida, prazo esse que foi prorrogado até ao termo do prazo a que alude o artigo 21.º/1 do RJAT.

 

  1. Por despacho de 03-08-2018 foi prorrogado o prazo fixado no artigo 21.º/1 do RJAT, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo.

 

  1. Por despacho de 16-10-2018 foi determinada a junção de elementos do PA que se encontravam em falta, e prorrogado, pela segunda vez, o referido prazo a que alude o art.º 21.º/1 do RJAT.

 

  1. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir

 

II. DECISÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

  1. A Requerente é, e era entre 2012 e 2015, uma sociedade comercial, com sede no território nacional, que exerce a título principal, a actividade de gestão de participações sociais, encontrando-se registada com o CAE 70100 “Actividades das Sedes Sociais”, integrando o seu objecto social, adicionalmente e a título acessório, a prestação de serviços técnicos de administração e gestão às sociedades por si participadas.
  2. A Requerente é uma Sociedade Gestora de Participações Sociais (SGPS), resultante da parceria entre o Grupo B... e o Grupo C... para a área das concessões de transportes.
  3. A Requerente foi criada para a gestão de concessões de infraestruturas de transportes e detinha, nos anos em análise, investimentos em entidades que operam na área das concessões de vias rodoviárias, quer em território nacional quer no estrangeiro.
  4. No âmbito da sua actividade, para além da detenção de participações sociais e da obtenção de dividendos e mais-valias, a Requerente presta serviços técnicos de administração e gestão às sociedades suas participadas.
  5. A Requerente encontra-se, e encontrava-se entre 2012 e 2015, para efeitos de IVA, enquadrada no regime normal com periodicidade mensal.
  6. A Requerente tem por objectivo o controlo e a gestão directa dos negócios das participadas e a prossecução de uma actividade económica de natureza comercial.
  7. A Requerente é uma holding de direcção que assume, simultaneamente, a natureza de holding mista.
  8. A Requerente está presente nos Conselhos de Administração das entidades participadas, sessões nas quais são discutidas, deliberadas e votadas as mais relevantes estratégias e actividades dessas organizações.
  9. Existem administradores comuns à Requerente e às suas participadas, designadamente às concessionárias “D...”.
  10. Estas concessionárias têm um Conselho de Administração composto por 9 elementos, enquanto o Conselho de Administração da Requerente é composto por 7 membros, e em comum há 5 administradores:
  • E..., presidente dos Conselhos de Administração da Requerente e da “D..., S.A.”;
  • F..., vice-presidente do Conselho de Administração da Requerente e vogal do Conselho de Administração da “D..., S.A.”;
  • G..., vogal do Conselho de Administração da Requerente e da “H..., S.A.”;
  • I..., vogal dos Conselhos de Administração da Requerente e da “J..., SGPS, S.A.”;
  • K..., vogal dos Conselhos de Administração da Requerente e da “J..., SGPS, S.A.”;
  1. A Requerente tem um papel na negociação e ratificação dos contratos de concessão celebrados entre as participadas e o Estado, sendo que qualquer alteração aos mesmos deve ser aprovada em Assembleia Geral de Accionistas.
  2. A Requerente tem cerca de 80% de participações nas concessionárias suas participadas.
  3. A acta de Maio de 2013, respeitante ao início dos trabalhos de negociação para a alteração dos contratos de 6 das 7 concessões, foi assinada por dois membros do Conselho de Administração da Requerente e pelo Presidente da Comissão de Renegociação por parte do Estado.
  4. Na sua qualidade de administradores da Requerente, os 2 membros do Conselho de Administração presentes e que subscreveram a referida acta, fizeram-no ao abrigo dos seus poderes de gestão e controlo das questões estruturais e essenciais ao nível das concessões, ou seja, ao nível das participadas.
  5. Foi ao abrigo desta acta que depois se iniciaram os processos de negociação para cada uma das referidas concessões.
  6. Para se remunerar dos serviços de apoio à gestão/administração prestados às sociedades em que participa, a Requerente procedeu à facturação de serviços de administração e gestão à “L..., S.A.” (doravante, “L...”) e de valores a título de “senhas de presenças”.
  7. A Requerente emitiu “senhas de presenças” relativamente às seguintes participadas:
    1. L..., SA;
    2. M..., SA;
    3. N... .
  8. Por limitações contratuais, não pode haver facturação por parte da Requerente às suas outras participadas, sob pena de serem considerados “distribuições”, sujeitas a fortes limitações ao nível do cumprimento de rácios e de autorizações por parte dos bancos financiadores, sendo que todo e qualquer pagamento por parte das empresas aos accionistas é qualificável como “distribuição”.
  9. A Requerente, excepcionalmente, prestou, em 2013, serviços de consultoria, acessoria e assistência técnica à sociedade O..., AS, no montante de €350.000,00, tendo facturado €80.500,00 de IVA, a qual não era sua participada.
  10. O IVA incorrido pela Requerente no período compreendido entre 2012 e 2015, o qual respeitou, essencialmente, a serviços jurídicos, de assessoria financeira e de consultoria, foi objecto de dedução pela aplicação do método do pro rata de dedução.
  11. O pro rata anualmente apurado pela Requerente tem por base, no numerador, as operações efectuadas relativamente às quais liquidou IVA e, no denominador, essas operações tributadas adicionadas dos juros facturados em virtude do financiamento concedido às suas participadas, com excepção dos juros não facturados.
  12. A maioria dos contratos de suprimentos da Requerente com as participadas foram assinados nas mesmas datas em que foram assinados os contratos de concessão, isto é, até 2012.
  13. A Requerente foi objecto de um procedimento de inspecção externo, de âmbito parcial em sede de IVA, relativamente aos exercícios fiscais de 2012 a 2015, através das Ordem de Serviço n.ºs OI2015.../... /.../... .
  14. No âmbito da acção de inspecção, a AT analisou as facturas de suporte ao IVA deduzido pela Requerente, tendo limitado a respectiva análise às facturas que representam 96,25% do total do IVA, não tendo relativamente aos restantes 3,75% procedido a qualquer análise documental.
  15. Do IVA deduzido cujos documentos foram analisados, cerca de 93% do imposto corrigido pela AT respeita a quatro fornecedores, sendo que os restantes 7% respeitam a outros fornecedores.
  16. Em consequência da realização da acção de inspecção, foram efectuadas correcções em matéria de IVA aos anos de 2012 a 2015, tendo a AT invocado o seguinte:

 

 

 

                    

 

 

 

                        

 

 

 

                                                                             

 

 

 

 

 

 

 

 

                        

 

                                        

 

 

 

          

 

 

                                         

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                                                                                             

 

 

 

 

                                                                                                                                            

 

 

 

 

 

 

                                                                         

 

  1. A totalidade das correcções determinadas em sede de inspecção ascendeu a €1.004.878,11, conforme o seguinte quadro:

  1. A valor referido no ponto anterior acresceram os respectivos juros compensatórios no montante de €60.872,93, perfazendo o valor global de €1.065.751,04,
  2. A Requerente procedeu ao pagamento das liquidações adicionais de IVA no valor de €773.857,87, tendo o remanescente, que ascendeu a €231.020,26, sido objecto de compensação efectuada pela Autoridade Tributária.
  3. A Requerente pagou juros moratórios e compensatórios no montante de €60.872,93.
  4. Em 10-03-2017, a Requerente apresentou reclamação graciosa com vista à apreciação dos actos de liquidação adicional de IVA.
  5. Em 29-08-2017, a Requerente foi notificada do despacho de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2017... .

 

A.2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

B. DO DIREITO

 

  1. Da falta de fundamentação

            Começa a Requerente por arguir a omissão do dever de fundamentação por parte da AT, nas correcções que operou e que aquela contesta.

            A este propósito, sustenta a Requerente que “não se vislumbra na decisão final de indeferimento da reclamação graciosa nem no relatório de inspeção qualquer fundamento ou motivo, pelo qual a Autoridade Tributária considerou que o total dos referidos juros deve ser incluído no denominador da fração do pro rata para efeitos de cálculo da percentagem de dedução”, pelo que “face ao exposto, no procedimento inspetivo que culminou com os atos de liquidação, bem como na decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, a Autoridade Tributária violou o princípio do dever de fundamentação”.

Como é sabido, a fundamentação é uma exigência dos actos tributários em geral, sendo uma imposição constitucional (268º da CRP) e legal (art.º 77º da LGT).

            Resumidamente, pode dizer-se que é hoje pacífico na doutrina e na jurisprudência nacionais que a fundamentação exigível tem de reunir as seguintes características:

  1. Oficiosidade: deve partir sempre da iniciativa da administração, não sendo admissíveis fundamentações a pedido;
  2. Contemporaneidade: deve ser coeva da prática do acto, não podendo haver fundamentações diferidas;
  3. Clareza: deve ser compreensível por um destinatário médio, evitando conceitos polissémicos ou profundamente técnicos;
  4. Plenitude: deve conter todos os elementos essenciais e que foram determinantes da decisão tomada. Esta característica desdobra-se em duas exigências, a saber: o dever de justificação (normas legais e factualidade – domínio da legalidade) e de motivação (domínio da discricionariedade ou oportunidade, quando é preciso uma valoração).

Ora, se a fundamentação é, nos termos referidos, necessária e obrigatória, tal não pode nem deve ser entendido de uma forma abstracta e/ou absoluta, ou seja, a fundamentação exigível a um acto tributário concreto, deve ser aquela que funcionalmente é necessária para que aquele não se apresente perante o contribuinte como uma pura demonstração de arbítrio. Esta será – julga-se – a pedra de toque do cumprimento do dever de fundamentação: quanto, perante um destinatário médio colocado na posição do destinatário real, o acto tributário se apresente, sob um ponto de vista de razoabilidade, como um produto do puro arbítrio da Administração, por não serem discerníveis os motivos de facto e/ou de direito em que assenta, o acto padecerá de falta de fundamentação.

            O artigo 77.º/1 da LGT refere, assim, que: “A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.”.

            Descendo ao caso concreto, reporta a requerente o défice de fundamentação que argui à incompreensão do motivo pelo qual o total dos juros de depósitos bancários e de suprimentos não facturados, deve ser incluído no denominador da fração do pro rata para efeitos de cálculo da percentagem de dedução.

            Ora, compulsado o RIT, verifica-se que, a fls. 20, consta o seguinte:

            Consta, aqui, portanto, o porquê da actuação em causa da AT, não se podendo, portanto, concluir que a inclusão total dos juros de depósitos bancários e de suprimentos não facturados no denominador da fração do pro rata para efeitos de cálculo da percentagem de dedução, se reconduza ao puro arbítrio da Administração.

            Se o critério exteriorizado é certo ou errado, e/ou se o mesmo foi bem ou mal aplicado, são já questões que emergem a jusante do cumprimento do dever de fundamentação pela AT.

            O que releva, a esta luz, é que seja indicado o motivo porque a Administração actuou ou não actuou de determinada forma, em termos compreensíveis e congruentes, o que no caso ocorre.

            Face ao exposto, improcede, este fundamento do pedido arbitral.

 

***

  1. Da exclusão do pro rata

            Seguidamente, contesta a Requerente a exclusão da aplicação do método do pro rata para dedução do IVA do período compreendido entre 2012 e 2015, o qual respeitou, essencialmente, a serviços jurídicos, de assessoria financeira e de consultoria, e que foi pela Requerente recuperado pela aplicação do método do pro rata de dedução, sendo que cerca de 93% do imposto corrigido pela Autoridade Tributária respeita a quatro fornecedores (IVA deduzido de € 1.526.905,14), e que os restantes 7% respeitam a outros fornecedores com menor expressão (IVA deduzido de € 121.579,33).

            Previamente a apreciação desta matéria, cumpre encetar um périplo por aquilo que tem sido a jurisprudência comunitária que se debruçou sobre o assunto.

 

*

            No Acórdão Polysar (processo C60/90[2]) o Tribunal, respondendo à questão sobre se “Uma sociedade holding que não exerça outras actividades para além das relacionadas com a detenção de acções em filiais deve ser considerada sujeito passivo na acepção dos artigos 4.º e 17.º da Sexta Directiva relativa à harmonização das legislações dos Estados‐membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios”, concluiu que “o artigo 4.º da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que não é sujeito passivo de IVA, não tendo, portanto, direito a dedução nos termos do artigo 17.º da Sexta Directiva, uma sociedade holding cujo único objecto é a tomada de participações noutras empresas, não interferindo, directa ou indirectamente, na gestão dessas empresas, sem prejuízo dos direitos que a referida sociedade holding tenha na sua qualidade de accionista ou de sócio.”.

            Não obstante, em tal aresto, ressalvou o Tribunal que “a situação é diferente quando a participação é acompanhada pela interferência directa ou indirecta na gestão das sociedades em que se verificou a tomada de participação, sem prejuízo dos direitos que o detentor das participações tenha na qualidade de accionista ou de sócio.”.

            No acórdão Satam/Sofitam (processo C333/91[3]), o Tribunal, confrontado com a questão de saber “Se, face à redacção que lhes foi dada, as disposições do artigo 19. da Sexta Directiva devem ser interpretadas no sentido de que os dividendos de acções, recebidos por uma empresa que não é sujeito passivo do imposto sobre o valor acrescentado quanto ao conjunto das suas operações, se devem excluir do denominador da fracção que serve para o cálculo do pro rata da dedução, ou se, face à finalidade e à economia do sistema de deduções estabelecido pela directiva e que resulta, nomeadamente, da conjugação dos seus artigos 17.º e 19.º, as disposições deste último artigo se devem, pelo contrário, interpretar no sentido de que os dividendos em causa devem, como os produtos isentos do imposto sobre o valor acrescentado, ser incluídos neste denominador”, julgou que “As disposições do artigo 19.º , n.º 1, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios, devem ser interpretados no sentido de que os dividendos de acções, recebidos por uma empresa que não é sujeito passivo do IVA quanto ao conjunto das suas operações, devem ser excluídos do denominador da fracção que serve para o cálculo do pro rata de dedução.”, uma vez que “Não constituindo a contrapartida de qualquer actividade económica, na acepção da Sexta Directiva, a percepção de dividendos não entra no âmbito de aplicação do IVA. Consequentemente, os dividendos, que resultam da detenção de participações, são estranhos ao sistema dos direitos à dedução”.

            No Acórdão Berginvest (processo C-142/99[4]), foi ponderada a questão de saber se “Os dividendos de acções e juros de empréstimos devem ser sempre excluídos do denominador da fracção que serve para o cálculo do pro rata de dedução, incluindo na hipótese de a sociedade que os recebe ter intervindo na gestão das empresas que os pagam ou distribuem, para além do exercício dos direitos detidos por esta sociedade na qualidade de accionista ou de sócio?»”.

            A esta questão foi respondido que: “o artigo 19.º da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que devem ser excluídos do denominador da fracção que serve de base ao cálculo do pro rata de dedução por um lado, os dividendos distribuídos pelas filiais a uma holding que está sujeita ao IVA relativamente a outras actividades e fornece a estas filiais serviços de gestão e, por outro, os juros pagos por estas  últimas a esta holding relativos a empréstimos que esta lhes concedeu, quando estas operações de empréstimo não constituem, na acepção do artigo 4.º , n.º 2, da Sexta Directiva, uma actividade económica da referida holding.

            Neste contexto afirmou, ainda, o Tribunal “que se deve considerar como actividade económica na acepção do artigo 4.º, n.º 2, da Sexta Directiva a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transacções sujeitas ao IVA nos termos do artigo 2.º dessa directiva”.

            No acórdão Wheltgrove (processo C-102/00[5]), deu resposta à questão de saber se “o mero facto de a interessada intervir na gestão das suas filiais implica, como dito no n.º 14 do acórdão Polysar, que a interessada deva ser qualificada de sujeito passivo na acepção do artigo 4.º da Sexta Directiva?”, no sentido de que “se deve considerar como actividade económica, na acepção do artigo 4.º , n.º 2, da Sexta Directiva, a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transacções sujeitas a IVA nos termos do artigo 2.º dessa directiva.” e que “a mera intervenção de uma holding na gestão das suas filiais, sem que haja transacções sujeitas a IVA nos termos do artigo 2.º da Sexta Directiva, não pode ser considerada como actividade económica na acepção do artigo 4.º, n.º 2, da Sexta Directiva.”.

            No Acórdão Cibo (processo 16/00[6]), o Tribunal apreciou várias questões relevantes para a matéria sub iudice.

            Assim, à questão sobre “Qual o critério a considerar para a definição de interferência? Pode este basear-se, nomeadamente, tanto na existência de prestações remuneradas, como na animação dum grupo por uma holding, na gestão de facto que exclui toda a independência da filial, ou em qualquer outro elemento?”, reafirmou o Tribunal “que a interferência de uma holding na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma actividade económica na acepção do artigo 4.º , n.º 2, da Sexta Directiva, na medida em que implique a realização de transacções sujeitas ao IVA nos termos do artigo 2.º dessa directiva, tais como o fornecimento, pela holding às suas filiais, de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos.”.

            À questão de saber “se uma holding pode deduzir o IVA que onera as despesas efectuadas com os diferentes serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial”, respondeu o Tribunal “que as despesas efectuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo directo e imediato com o conjunto da sua actividade económica. Portanto, se a holding efectuar tanto operações com direito a dedução como operações sem direito a dedução, decorre do artigo 17.º n.º 5, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva que pode unicamente deduzir-se a parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.”.

            A este propósito, precisou o Tribunal que “É forçoso concluir que não existe uma relação directa e imediata entre os vários serviços adquiridos por uma holding no quadro de uma tomada de participação numa filial e uma ou várias operações a jusante que confiram direito a dedução. Com efeito, o montante do IVA pago pela holding sobre as despesas efectuadas com os referidos serviços não onera directamente os diversos elementos constitutivos do preço das suas operações a jusante que conferem direito a dedução. Estas despesas não fazem parte dos custos das operações a jusante que utilizam os ditos serviços.” e que “os custos destes serviços fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos produtos de uma empresa. Portanto, estes serviços têm uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo”.

            Sobre a questão de saber se “Em caso de interferência, a percepção de dividendos permanece fora do campo de aplicação do imposto sobre o valor acrescentado por uma razão que não seja a actividade económica, na medida em que não seja a contrapartida de uma operação de entrega de bens ou de prestação de serviços, ou, tendo em conta o facto de as despesas serem efectuadas para a aquisição de acções tendo como objecto directo a participação em actividades económicas, o recebimento de dividendos entra no campo do imposto sobre o valor acrescentado e, nesta hipótese, é isento nos termos do n.º 1 da alínea d) da parte B) do artigo 13.º da Sexta Directiva ou é tributado?”, respondeu o Tribunal que “que a percepção de dividendos não entra no âmbito de aplicação do IVA.”.

            O acórdão proferido no processo SKF (processo C‑29/08[7]), o Tribunal teve como objecto as seguintes questões:

Os artigos 2.º e 4.º da Sexta Directiva [...] e os artigos 2.º e 9.º da Directiva 2006/112[…] devem ser interpretados no sentido de que a transmissão de participações numa sociedade filial por um sujeito passivo que é devedor do imposto em resultado da prestação de serviços a essa filial constitui uma operação passível de IVA?

2)      Se a resposta à primeira questão for a de que a transmissão constitui uma operação tributável, tal operação é abrangida pela isenção de imposto de que beneficiam as operações relativas a participações em sociedades, prevista no artigo 13.º, B, alínea d), n.º 5, da [Sexta] Directiva [...] e no artigo 135.º, n.º 1, alínea f), da Directiva 2006/112?

3)      Independentemente da resposta às questões anteriores, pode haver direito à dedução, a título de despesas gerais, relativamente a despesas directamente associadas à transmissão?

4)      É relevante para a resposta às questões acima indicadas o facto de a transmissão das participações da sociedade filial ser feita em várias fases?

            Estas questões mereceram do Tribunal as seguintes respostas:

“1) Os artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.os 1 e 2, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, conforme alterada pela Directiva 95/7/CE do Conselho, de 10 de Abril de 1995, e os artigos 2.º, n.º 1, e 9.º, n.º 1, da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que constitui uma actividade económica abrangida pelo âmbito de aplicação das referidas directivas uma transmissão, por uma sociedade‑mãe, da totalidade das acções que detém no capital de uma filial detida a 100% e a participação remanescente numa sociedade controlada anteriormente detida a 100%, às quais forneceu prestações de serviços sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado. Todavia, na medida em que a transmissão de acções seja equiparada à transmissão da universalidade total ou parcial de uma empresa, na acepção do artigo 5.º, n.º 8, da Sexta Directiva 77/388, conforme alterada pela Directiva 95/7, ou do artigo 19.º, primeiro parágrafo, da Directiva 2006/112, desde que o Estado‑Membro em causa tenha optado pela faculdade prevista nestas disposições, esta operação não constitui uma actividade económica sujeita ao imposto sobre o valor acrescentado.

2) Uma transmissão de acções, como a que está em causa no processo principal, deve ser isenta do imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 13.º, B, alínea d), n.º 5, da Sexta Directiva 77/388, conforme alterada pela Directiva 95/7, e do artigo 135.º, n.º 1, alínea f), da Directiva 2006/112.

3) O direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de acções é conferido, por força do artigo 17.º, n.ºs 1 e 2, da Sexta Directiva 77/388, conforme alterada pela Directiva 95/7, e do artigo 168.º da Directiva 2006/112, se existir uma relação directa e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das actividades económicas do sujeito passivo. Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio determinar, tendo em conta todas as circunstâncias em que decorrem as operações em causa no processo principal, se as despesas realizadas são susceptíveis de ser incorporadas no preço das acções vendidas ou se fazem parte unicamente dos elementos constitutivos do preço das operações abrangidas pelas actividades económicas do sujeito passivo.

4) As respostas às questões anteriores não são afectadas pela circunstância de a transmissão das acções se realizar em várias operações sucessivas.

            No acórdão referido, o Tribunal cuidou de alertar, a propósito da resposta à segunda questão “que, embora as despesas de consultoria relativas às transmissões de participações sejam consideradas como parte integrante das despesas gerais do sujeito passivo nos casos em que a própria transmissão se situa fora do âmbito de aplicação do IVA, deve aceitar‑se o mesmo tratamento fiscal se a transmissão é qualificada de operação isenta.”.

            No acórdão Portugal-Telecom (processo C-496/11[8]), foram colocadas ao TJUE as seguintes questões:

1)      A correta interpretação do artigo 17.º, n.º 2 da Sexta Diretiva [...], veda que a Administração Tributária portuguesa imponha à Recorrente — uma SGPS –, a utilização do método de dedução do prorata para a totalidade do IVA incorrido nos seus inputs, com fundamento no facto de o seu objeto social principal ser a gestão de participações sociais de outras sociedades, mesmo quando esses inputs (serviços adquiridos) apresentam um nexo direto, imediato e inequívoco com operações tributadas — prestações de serviços — realizadas a jusante, no âmbito de uma atividade complementar, legalmente permitida, de prestação de serviços técnicos de gestão?

2)      Uma entidade que tenha a qualidade de SGPS e que incorra em IVA na aquisição de bens e serviços que, em seguida, são redebitados na totalidade, com liquidação de IVA, às suas participadas, consubstanciando esta uma atividade de caráter acessório — prestação de serviços técnicos de administração e gestão — à atividade principal desenvolvida — gestão de participações sociais –, poderá deduzir a totalidade do imposto incorrido naquelas aquisições, por via da aplicação do método de dedução da afetação real, previsto no n.º 2 do artigo 17.º da Sexta Diretiva?”.

            A tais questões, respondeu o Tribunal que “O artigo 17.º, n.ºs 2 e 5, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, deve ser interpretado no sentido de que uma sociedade holding como a que está em causa no processo principal, que, acessoriamente à sua atividade principal de gestão das participações sociais das sociedades de que detém a totalidade ou parte do capital social, adquire bens e serviços que fatura em seguida às referidas sociedades, está autorizada a deduzir o imposto sobre o valor acrescentado pago a montante, na condição de os serviços adquiridos a montante apresentarem um nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito a dedução. Quando os referidos serviços são utilizados pela sociedade holding para realizar simultaneamente operações económicas com direito a dedução e operações económicas sem direito a dedução, a dedução só é admitida para a parte do imposto sobre o valor acrescentado que seja proporcional ao montante relativo às primeiras operações e a Administração Tributária nacional está autorizada a prever um dos métodos de determinação do direito a dedução enumerados no dito artigo 17.º, n.º 5. Quando os referidos bens e serviços são utilizados simultaneamente para atividades económicas e para atividades não económicas, o artigo 17.º, n.º 5, da Sexta Diretiva 77/388 não é aplicável e os métodos de dedução e de repartição são definidos pelos Estados‑Membros, que, no exercício deste poder, devem ter em conta a finalidade e a economia da Sexta Diretiva 77/388 e, a esse título, prever um modo de cálculo que reflita objetivamente a parte de imputação real das despesas a montante a cada uma destas duas atividades.”.

            Definiu, a este propósito, o TJUE, que “ Cabe ao juiz de reenvio determinar se todos os serviços em causa no processo principal apresentam um nexo direto e imediato com as operações económicas a jusante que dão direito a dedução, ou se esses serviços são utilizados pelo sujeito passivo para realizar simultaneamente operações económicas com direito a dedução e operações económicas sem direito a dedução, ou ainda se esses serviços são utilizados pelo sujeito passivo, simultaneamente, para operações económicas e para operações não económicas.”.

            No acórdão relativo aos casos Larentia + Minerva e Marenave (processos C‑108/14 e C‑109/14[9]), apreciou-se, para além do mais, a questão de saber “Que método de cálculo deve ser utilizado para calcular a (parte proporcional da) dedução do [IVA] pago a montante de uma sociedade holding relativo a prestações de serviços que lhe sejam feitas no contexto da obtenção de capitais para adquirir participações nas suas filiais, quando aquela holding fornece posteriormente (como antecipadamente projetara) várias prestações de serviços sujeitas a [IVA] a estas sociedades?”.

            A este propósito, o Tribunal reafirmou que “A interferência de uma sociedade holding na gestão das sociedades cujas participações adquiriu constitui uma atividade económica na aceção do artigo 4.º, n.º 2, da Sexta Diretiva, na medida em que implica a realização de transações sujeitas a IVA por força do artigo 2.º da mesma diretiva, como a prestação de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos pela sociedade holding às suas filiais”.

            Esclareceu, também o Tribunal, que “os custos ligados à aquisição de participações nas suas filiais suportados por uma sociedade holding que participa na gestão das mesmas e que, a esse título, exerce uma atividade económica, como foi recordado no n.º 21 do presente acórdão, devem ser considerados afetados à atividade económica desta sociedade e o IVA pago relativamente a esses custos dá direito à dedução integral, em aplicação do artigo 17.º, n.º 2, da Sexta Diretiva.” e que “Só no caso de o tribunal de reenvio constatar que as participações resultantes das operações de capital a que procederam as sociedades holding em causa no processo principal foram afetadas parcialmente a outras filiais em cuja gestão as sociedades holding não participavam é que, como se afirma na primeira questão do tribunal de reenvio, o IVA pago sobre os custos dessas operações apenas pode ser deduzido parcialmente. Com efeito, neste caso, a simples detenção das suas participações nestas filiais não pode ser considerada uma atividade económica das sociedades holding e há, então, que repartir o IVA pago a montante entre o que se reporta às atividades económicas e o que se reporta às atividades não económicas daquelas.”.

            Mais foi referido pelo Tribunal que “Neste quadro, os Estados‑Membros estão habilitados a aplicar, sendo caso disso, quer uma chave de repartição segundo a natureza do investimento, quer uma chave de repartição segundo a natureza da operação, quer ainda qualquer outra chave adequada, sem estarem obrigados a limitar‑se a um único destes métodos (...). Assim, cabe exclusivamente às autoridades nacionais, sob fiscalização jurisdicional, determinar os critérios de repartição entre atividades económicas e atividades não económicas que reflitam objetivamente a parte da imputação real das despesas a montante a cada uma das duas atividades, tendo em conta a finalidade e a sistemática da Sexta Diretiva”.

            Concluindo, considerou o Tribunal “que o artigo 17.º, n.ºs 2 e 5, da Sexta Diretiva deve ser interpretado no sentido de que:

—        Os custos ligados à aquisição de participações nas suas filiais suportados por uma sociedade holding que participa na sua gestão e que, a esse título, exerce uma atividade económica devem ser considerados parte dos seus custos gerais e o IVA pago sobre estes custos deve, em princípio, ser integralmente deduzido, a menos que algumas operações económicas realizadas a jusante estejam isentas de IVA nos termos da Sexta Diretiva, caso em que o direito a dedução só deve operar segundo as modalidades previstas no artigo 17.º, n.º 5, da Diretiva;

—        Os custos ligados à aquisição de participações nas suas filiais suportados por uma sociedade holding que participa na gestão apenas de algumas delas e que, no tocante às outras, não exerce uma atividade económica, apenas devem ser parcialmente considerados parte dos seus custos gerais, de modo que o IVA pago relativamente a estes custos só pode ser deduzido na proporção daqueles que são inerentes à atividade económica, segundo critérios de repartição definidos pelos Estados‑Membros, os quais, no exercício deste poder, devem ter em conta, — o que cabe aos tribunais nacionais verificar —, a finalidade e a sistemática da Sexta Diretiva e, a este título, prever um modo de cálculo que reflita objetivamente a parte de imputação real das despesas a montante à atividade económica e à atividade não económica.”.

 

*

 

            Para a Requerente, “a vasta maioria dos recursos adquiridos nos anos 2012 a 2015 está intrinsecamente associada à gestão das participadas da ora Requerente, quer com assessoria e consultoria, quer com as renegociações das concessões.”, pelo que “a dedução por pro rata relevou-se, na verdade, uma dedução insuficiente dado que, em bom rigor, o direito a tal dedução seria efetivamente um direito total”, indicando, a título de exemplo, as seguinte facturas:

Relativamente a esta matéria, cumpre desde logo evidenciar, que a Requerente parte uma deficiente compreensão da fundamentação do RIT, na medida em que julga que “a Autoridade Tributária entende que a Requerente não desenvolve uma atividade económica para efeitos de IVA”, quando, em momento algum, a AT colocou em causa a qualidade da Requerente enquanto sujeito passivo misto, que exercia operações não sujeitas, sujeitas e isentas e sujeitas e não isentas de imposto.

Questão diferente, é a de saber se a Requerente “desenvolve predominantemente uma atividade não económica”, ou se, como pretende fazer valer na presente sede, “a sua principal essência não é (...) a mera detenção de participações sociais, mas sim a gestão das entidades em cujo capital social maioritariamente participa.”.

No que diz respeito a esta questão, julga-se que o entendimento da Requerente não será, manifestamente, de acolher. Com efeito, a Requerente é uma SGPS, usufruindo do regime legal específico deste tipo de sociedades[10], que se justifica em primeira linha, precisamente, por se tratarem de sociedades cuja actividade principal é a mera detenção e gestão de participações sociais.

E se é certo que às SGPS, e à Requerente enquanto tal, é lícita, em determinadas condições, a prestação de serviços de administração e gestão das suas participadas, menos certo não será que tal deverá constituir, sempre, uma vertente mais ou menos acessória da sua actividade[11], que deverá ser, precisamente, a de detenção e gestão de participações sociais, visando a obtenção de dividendos e mais-valias.

Uma sociedade cujo objecto principal seja a prestação de serviços de gestão e administração de sociedades, e se constitua como SGPS será, então e desde logo, uma fraude à lei, já que o regime daquelas não se destina ao exercício, a título principal, de tais actividades, pelo que, em tal caso, deverá ser constituída uma sociedade comercial ordinária, que, como se sabe, pode também deter e gerir participações sociais.      

Tendo em conta a matéria de facto apurada, haverá, em todo o caso que concluir que a Requerente se apresenta, efectivamente, como uma SGPS, tendo como actividade principal a detenção e fruição de participações sociais, e prestando, acessoriamente, serviços de administração e gestão a algumas das suas participadas, designadamente, às sociedades L..., S.A. (“L...”), a quem são facturados directamente tais serviços, e às sociedades M..., e N..., a quem foram facturadas senhas de presença.

A Requerente alega que relativamente às restantes participadas, exerce igualmente actividades de gestão e administração, que não factura unicamente por tal lhe estar vedado em função de acordos para-sociais e de limitações impostas por bancos financiadores.

Não obstante, independentemente das motivações, o certo é que tais eventuais actividades não facturadas não geram operações tributáveis em sede de IVA, e jurisprudência comunitária é cristalina no sentido de que tais actividades apenas relevarão “na medida em que implique transacções sujeitas ao IVA nos termos do artigo 2.º dessa directiva[12] e de que “a mera intervenção de uma holding na gestão das suas filiais, sem que haja transacções sujeitas a IVA nos termos do artigo 2.º da Sexta Directiva, não pode ser considerada como actividade económica na acepção do artigo 4.º, n.º 2, da Sexta Directiva.”.

Posto isto, e como se escreveu no Ac. do STA de 28-10-2015, proferido no processo 01497/12:

“I - Para efeitos da dedução do IVA contido nos bens e serviços adquiridos por uma sociedade que exerce actividades que conferem direito à dedução e outras que não conferem esse direito, deve adoptar-se um procedimento de imputação directa: faz-se a alocação directa dos inputs às actividades económicas a que se destinam, deduzindo a totalidade do IVA se o input for consumido numa actividade que concede o direito à dedução, ou não deduzindo qualquer parcela de IVA caso a actividade em que esse input é consumido não confira esse direito.

II - Só depois dessa fase, e relativamente aos inputs que subsistam, porque utilizados de forma indistinta ou simultânea (inputs promíscuos), para exercício de actividades que conferem e outras que não concedem o direito à dedução de IVA, se deve passar à segunda fase do processo, da repartição do imposto residual, com aplicação das regras do art. 23.º do CIVA, ou seja, com aplicação dos métodos da percentagem (ou do pro rata) ou da afectação real.

III - Em todo o caso, o método do pro rata só poderá ser adoptado na impossibilidade do uso de um método mais objectivo (que reflicta melhor a intensidade do uso dos bens de produção comuns aos dois ramos de actividade) e desde que não conduza a distorções de tributação.”.

            Será este, portanto, o critério legal a aplicar, no sentido de aferir da legalidade das correcções operadas pela AT, e que a Requerente contesta, à luz dos factos provados e da fundamentação do RIT.

            A própria Requerente aceita o critério indicado, referindo que “No que respeita à temática da dedução do IVA, em particular quando está em causa um sujeito passivo dito “misto”, a primeira linha de raciocínio deverá ser sempre a de identificar se há recursos diretamente afetos a determinadas operações, isto é, se são identificados custos suportados a montante que façam ou possam vir a fazer parte dos elementos constitutivos do preço de uma ou várias operações económicas a jusante que confiram direito à dedução (e, em paralelo, de operações que não confiram esse direito). Numa segunda linha, no que respeita aos custos gerais da atividade, haverá que identificar-se quais os recursos adquiridos que se qualificam como despesas gerais, isto é, despesas gerais do sujeito passivo que se refletem tanto no preço das operações económicas que conferem direito à dedução como no preço das operações económicas que não conferem aquele direito, sendo os mesmos designados por custos mistos.”.

            Face ao exposto, e tendo em conta as regras do ónus da prova (cfr. artigo 74.º da LGT), cumprirá, portanto, relativamente a cada um dos gastos da Requerente onerados com IVA, em ordem a aferir a dedutibilidade deste, verificar se se encontra demonstrada a sua afectação à actividade sujeita e não isenta da Requerente, caso em que o imposto será dedutível na íntegra, ou se se encontra demonstrado que tais gastos respeitam a recursos “utilizados de forma indistinta ou simultânea (inputs promíscuos), para exercício de actividades que conferem e outras que não concedem o direito à dedução de IVA”, caso em que o imposto será parcialmente dedutível, in casu, por não haver controvérsia a tal respeito, por intermédio do método pro rata.

Deste modo, o que haverá que fazer é, caso a caso relativamente a cada uma das facturas em questão, aplicar o supra-exposto critério, e daí retirar as devidas conclusões.

            Conforme resulta do RIT, as correcções em questão assentaram num ou mais dos seguintes fundamentos:

  1. A D... não pode deduzir imposto relativo à actividade não económica que exerce, nos termos do artigo 20.º do CIVA, o que na prática se traduz em que caso exista entre o input incorrido uma ligação a este output (actividade não económica), o imposto que esteja a ser suportado não poderá de todo ser deduzido. Quanto a inputs que se destinam à actividade da SGPS em geral sem que exista indicação expressa do destino desse mesmo input, ou ainda que seja um input que a SGPS tenha que suportar só porque existe (como por exemplo, no caso das holdings puras que não têm qualquer output tributável mas têm inputs cujo imposto não será dedutível), então o imposto relacionado com esses inputs não poderá ser deduzido por estar relacionado com a actividade principal da SGPS que é a detenção de  participações sociais com vista ao usufruto da detenção dessas mesmas participações (dividendos, lucros);
  2. Quanto à actividade tributada, caso existam inputs com relação directa com esses outputs (nexo direto, imediato e inequívoco), então o imposto poderá ser deduzido integralmente e não segundo uma percentagem de pro rata;
  3. Se existirem inputs relacionados com a actividade económica isenta (juros) então o imposto incluído nesses inputs também não será dedutível;
  4. Caso existam inputs relacionados com actividades económicas e não económicas, então o critério para encontrar o imposto a deduzir nesses inputs deverá ser um critério de afetação real conforme a alínea a) do n.º 1 do artigo 23.º do CIVA estipula, sendo que caso os inputs sejam referentes às duas actividades económicas (uma sujeita e isenta e a outra sujeita e não isenta), então o critério a adoptar será o previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 23,º do CIVA (cálculo que deverá ser efectuado pela percentagem designada como pro rata).

Note-se aqui, e desde logo, que se evidencia que a AT incorre num erro de enquadramento, em parte dos fundamentos que integram o ponto i. quando refere que “Quanto a inputs que se destinam à actividade da SGPS em geral sem que exista indicação expressa do destino desse mesmo input, ou ainda que seja um input que a SGPS tenha que suportar só porque existe (como por exemplo, no caso das holdings puras que não têm qualquer output tributável mas têm inputs cujo imposto não será dedutível), então o imposto relacionado com esses inputs não poderá ser deduzido por estar relacionado com a actividade principal da SGPS que é a detenção de  participações sociais com vista ao usufruto da detenção dessas mesmas participações (dividendos, lucros)”.

Com efeito, por definição, a actividade da Requerente, em geral, abrange, incontestadamente, como se viu, a actividade de gestão de participações, a título principal, e a actividade de prestações de serviço de administração e apoio à gestão de algumas das participadas, não existindo qualquer fundamento para, como faz a AT, restringir a actividade geral da Requerente à sua actividade principal, em contra-ciclo com a abundante jurisprudência citada ao longo da presente decisão.

Daí que, os inputs que integrem as chamadas despesas gerais da Requerente, se tenham, por definição, de reportar indistintamente a toda a actividade daquela (principal e acessória), não podendo, quanto a elas, afastar-se in totum, como fez a AT, o direito à dedução do imposto suportado.

Posto isto, conforme também resulta do RIT, a AT procedeu a correcções relativas a facturas e outra documentação emitidas pelas seguintes entidades, não colocando em causa, relativamente a qualquer delas, a efectividade dos serviços prestados, e remetendo parte da fundamentação correcções operadas para os pontos que se elencaram supra:

 

            Vejamos cada uma delas.

 

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2.i Das correcções a anular

 

As facturas n.º 2131036238 e 21310351780, foram emitidas pela sociedade P..., uma empresa de advocacia de origem inglesa com subsidiária na Holanda, e são relativas à prestação de serviços jurídicos à Requerente, relacionados com a aquisição e gestão de uma participação holandesa (Q...B.V.), tendo sido descritos na contabilidade da D... como gastos de administração.

Também a factura 400 do Banco R... se refere a serviços de assessoria na aquisição de uma participação de capital na sociedade “Q..., BV”.  

Provenientes da sociedade S... S.A, foram desconsideradas, para além do mais, as seguintes facturas, enquadradas pela AT como gastos gerais da Requerente:

- a factura 935 referente a serviços relacionados com a elaboração de relatório com implicações fiscais resultantes de transferência de participações sociais para o grupo D...;

- a factura 3117 referente a assistência fiscal em reorganização de participações sociais no México;

- a factura 13456 referente a assistência fiscal em aquisição de participação no Brasil.

Note-se que nem a sociedade Q..., nem qualquer sociedade brasileira ou mexicana se integram entre aquelas com quem a Requerente praticou operações tributáveis, designadamente relativas a apoio à administração e gestão.

A AT enquadrou estas facturas no ponto i. dos fundamentos acima elencados, considerando, portanto, que não estão em causa serviços que se possam ligar directamente à actividade sujeita e não isenta da Requerente, ou que se possam considerar como utilizados de forma indistinta ou simultânea no exercício de actividades que conferem e outras que não concedem o direito à dedução de IVA.

No entanto, como se refere no acórdão Cibo, acima citado, “as despesas efectuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo directo e imediato com o conjunto da sua actividade económica. Portanto, se a holding efectuar tanto operações com direito a dedução como operações sem direito a dedução, decorre do artigo 17.º n.º 5, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva que pode unicamente deduzir-se a parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.”.

            Deste modo, devendo, em princípio, as despesas em questão ser consideradas como despesas gerais, ou seja, ao conjunto da actividade económica da Requerente, e não resultando provado que assim não seja, não poderia a AT desconsiderá-las por completo, pelo que deverá, nesta parte, ser anulada a correcção em causa, procedendo, nessa medida, o pedido arbitral.

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Das facturas emitidas pela sociedade T..., a factura 392 reporta-se a assessoria financeira, identificado pela Requerente como um gasto com transferência de participações.

Também a factura 631 se reporta a assessoria financeira relacionada com reorganização das participações da Requerente, e foi por esta contabilizada como um gasto com transferência de participações a nível internacional, de acordo com carta de 19-12-2013, apresentada pela Requerente, o que não foi colocado em causa pela AT.

Como referiu o TJUE, no acórdão SKF acima citado, “embora as despesas de consultoria relativas às transmissões de participações sejam consideradas como parte integrante das despesas gerais do sujeito passivo nos casos em que a própria transmissão se situa fora do âmbito de aplicação do IVA, deve aceitar‑se o mesmo tratamento fiscal se a transmissão é qualificada de operação isenta.”.

            Ou seja, também estas despesas, deverão, em princípio, ser consideradas como despesas gerais, relativas ao conjunto da actividade económica da Requerente, independentemente de a operação de transmissão das participações a jusante se situar fora do âmbito de aplicação do IVA, ou de ser a mesma qualificada como isenta.

            Nada se apurando, no sentido de afastar a referida qualificação de princípio como despesas gerais, não poderia a AT desconsiderá-las por completo, pelo que deverá, nesta parte, ser anulada a correcção em causa, procedendo, nessa medida, o pedido arbitral.

 

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As facturas 415, 416 e 90000416[13], todas emitidas pela sociedade T..., reportam-se a prestações de “serviços de agenciamento”, e a factura 636, também emitida emitidas pela sociedade T..., reporta-se a “serviços de assessoria”, apurando-se que foram inscritas na contabilidade da Requerente como gastos de administração, o que a AT não pôs em causa.

A Factura 230, emitida pelo U..., S.A. (U...), refere-se a uma comissão pela prestação de serviços de assessoria financeira, tendo sido contabilizada pela Requerente como um gasto de administração, o que a AT também não pôs em causa.

Pelo R... foram emitidas e contabilizadas pela Requerente, para além do mais, as seguintes facturas:

            -  factura 258, reportada a serviços de assessoria no âmbito da reorganização das participações da D... a nível internacional;

- facturas 2061, 2820, 1644 e 5329, reportadas a serviços de assessoria financeira, tendo a Requerente identificado as duas primeiras como gastos financeiros;

- factura 7689, no montante de € 614.000,00, tendo como descritivo “comissão de agenciamento”, sendo que, conforme descriminado em carta apresentada pela Requerente, datada de 26-07-2012 e não questionada pela AT, esse gasto se refere a "recolha e tratamento de informação, análise e elaboração do respetivo estudo económico-financeiro ao desenvolvimento do financiamento da D...”. Este gasto foi contabilizado pela Requerente como um gasto financeiro, e considerado pela AT um gasto afecto à actividade financeira da Requerente, relacionada com as partes sociais.

A factura 1510219728, emitida pela sociedade V... reporta-se a serviços jurídicos de Due Diligence prestados por aquela sociedade de advocacia espanhola, relacionados com uma sociedade participada espanhola (“W..., AS”).

As facturas 3559, 5225, 5829, 6338, 6828 e 7304, emitidas pela sociedade X..., S.A., referem-se a honorários referentes a revisão de contas da Requerente e de demonstrações financeiras de participadas, gastos estes que foram considerados pela AT como sendo de administração, inerentes à existência da sociedade, ou seja, gastos da actividade geral da Requerente.

As facturas 1309, 1573 e 1981, emitidas pela OO..., S.A., referem-se a serviços de consultaria no âmbito de um projeto desenvolvido pela D... (projeto...), tendo sido consideradas pela AT despesas de caracter geral da Requerente.

A factura 8580, emitida pela sociedade AA..., reporta-se à subscrição de 2 grupos de 20 licenças de utilização de informação publicada (um sem especificação e outro relativo às Américas latinas), tendo este gasto sido imputado pela Requerente à administração, o que não foi questionado pela AT, que qualificou tais gastos como sendo da actividade geral da Requerente.

A factura 1953407, proveniente da BB..., sociedade inglesa prestadora de informações e/ou dados estatísticos sobre sites/empresas (DataSite), foi considerada pela AT como referente a análise de mercado para a aquisição de participações.

As facturas 28, 72 e 812, foram emitidas pela sociedade CC..., SA., que era uma sociedade participada pela Requerente, prestadora de serviços ao grupo, e que prestou à Requerente serviços técnicos fiscais, que foram qualificados pela AT como relacionados com a actividade geral da D... .

A factura 3336, emitida pela sociedade DD..., refere-se a serviços no âmbito de uma impugnação judicial de uma liquidação de imposto (IVA) relativa ao exercício de 2011, tendo igualmente sido qualificada pela AT como gastos da actividade geral da D... .

As notas de débito 6622 e 6623 emitidas pela EE..., referem-se, respectivamente, a cedência de pessoal e serviços de apoio técnico num projeto de execução de edifício, gastos associados internamente pela Requerente à Administração, o que não foi colocado em causa pela AT, que considerou estes gastos como gerais da D... .

As facturas 1, 123 e 6475272, emitidas pela sociedade FF... SGPS, SA, referem-se a serviços prestados no acompanhamento, consolidação anual e produção do relatório e contas consolidadas da D... nos diferentes exercícios (2011, 2012 e 2013), e foram também qualificados pela AT como gastos da actividade geral da D... .

Pela sociedade GG..., LDA foram facturados serviços de consultoria de gestão através das seguintes facturas:

- factura 455, reportada a 60% do trabalho referente à estrutura de capital da D..., não discriminando a fornecedora do serviço a prestação de serviços efectuada, mas tendo sido relacionado pela Requerente como gasto com a própria marca, o que não foi questionado pela AT, que o considerou como não sendo imputável a um gasto com um concreto output tributável;

- factura 2377[14], reportada a 30% do valor de trabalho devido com a adjudicação. A Requerente afectou este gasto a centro de custo da Administração, tendo a AT considerado o mesmo como relacionado com a actividade geral da sociedade;

- factura 33106219[15], reportada a prestação de serviços a assessoria fiscal (“serviços em sede de preços de transferência”), e tendo sido qualificada pela AT enquadrável nas actividades gerais da sociedade;

 - factura 33112936, referente a assessoria fiscal (“serviços em sede de preços de transferência”), tendo sido qualificada pela AT enquadrável nas atividades gerais da sociedade enquadrável nas actividades gerais da sociedade.

            Todas estas facturas deverão considerar-se, à luz dos critérios formulados pela jurisprudência comunitária atrás analisada como despesas gerais da Requerente, reportáveis ao conjunto da sua actividade económica, qualificação essa que, de resto, lhes é dada, em muitos casos, expressamente no RIT.

            Com efeito, como se escreveu no Acórdão Cibo, “não existe uma relação directa e imediata entre os vários serviços (...) e uma ou várias operações a jusante”, e “o montante do IVA (...) sobre as despesas efectuadas (...) não onera directamente os diversos elementos constitutivos do preço das suas operações a jusante” e que “os custos destes serviços fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos produtos de uma empresa. Portanto, estes serviços têm uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo”.

            Como também se explicou no Acórdão do TCA-Sul de 15-01-2013, proferido no processo 01949/07:

as referidas prestações de serviço se deram no exclusivo interesse da impugnante, que no âmbito da sua actividade de gestão e administração de participações sociais pretendia obter elementos que lhe permitissem decidir se certos investimentos das participadas deveriam ser concretizados ou não. Não foi, portanto, em benefício directo destas que tais serviços foram prestados. Isto é, a pergunta quanto ao “nexo directo, causal, imediato, entre as operações a montante (o fornecimento das prestações de serviços por terceiros) - inputs - e os seus efeitos a jusante (na esfera jurídica das sociedade participadas) - outputs”, merece um resposta negativa, na medida em que não existe nexo directo, mas eventualmente meramente reflexo, entre tais operações e os efeitos produzidos na esfera jurídica das participadas.

E sendo assim, tais operações não são caracterizáveis como operações de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às participadas. Quando muito podem vir a influenciar a estratégia de investimentos das participadas e as decisões a tomar nesse domínio, por um lado em função do peso específico da impugnante no capital social de cada uma delas e por outro em função dos serviços técnicos de administração e gestão que lhes presta. Dito de uma forma mais prosaica, poderão ter influência na tomada de decisões quanto a investimentos das participadas, mas não determinam por si mesmas essas decisões.

Não apresentam, pois, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade da impugnante, que abrange duas áreas: a (i) gestão de participações sociais e a (ii) de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às participadas. Com efeito. Apenas produzem resultados directos na primeira área, ou seja, na actividade principal, embora possam gerar efeitos reflexos na segunda.

Neste contexto e como observou o TJUE no acórdão Midland Bank(6) o art.º 17.º, n.os 2, 3 e 5, da Sexta Directiva “devem ser interpretados no sentido de que, em princípio, a existência de uma relação directa e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução é necessária para que o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado a montante seja reconhecido ao sujeito passivo e para determinar a extensão desse direito”, incumbindo “ao órgão jurisdicional nacional aplicar o critério da relação directa e imediata aos factos de cada processo que lhe seja presente. Um sujeito passivo que efectua simultaneamente operações com direito à dedução e operações sem direito à dedução pode deduzir o imposto sobre o valor acrescentado que incidiu sobre os bens ou serviços por si adquiridos, desde que estes tenham uma relação directa e imediata com as operações a jusante que dão direito à dedução, e sem que se deva proceder de forma diferente consoante se apliquem os n.os 2, 3 ou 5 do artigo 17.º da Sexta Directiva”, Todavia, acrescenta o Tribunal, “este sujeito passivo não pode deduzir na íntegra o imposto sobre o valor acrescentado que incidiu sobre os serviços a montante quando estes tenham sido utilizados não para a realização de uma operação com direito à dedução, mas sim no quadro de actividades que são apenas a sua consequência, salvo quando o sujeito passivo demonstre, através de elementos objectivos, que as despesas relacionadas com a aquisição destes serviços fazem parte do custo dos diversos elementos constitutivos do preço da operação a jusante”.

Neste contexto, a impugnante não tem direito à dedução do IVA suportado nos termos do art.º 17.°, n.° 2, da Sexta Directiva e art.º 23.º, n.º 2, do CIVA, mas antes nos termos do n.º 5 do mesmo artigo, como lembrou o TJUE no número 46 do acórdão de reenvio: “Quando os referidos serviços são utilizados para realizar simultaneamente operações com direito a dedução e operações sem direito a dedução, a dedução só é admitida para a parte do IVA que seja proporcional ao montante relativo às primeiras operações e os Estados-Membros estão autorizados a prever um dos métodos de determinação do direito a dedução enumerados no artigo 17.°, n.° 5, da Sexta Directiva”.

O que de resto resulta também do dispositivo do acórdão.

O art.º 17.º, n.º 2, da Sexta Directiva consagra um regime de dedução do IVA proporcional ao montante das operações com direito à dedução, relativas a bens ou serviços utilizados pelo sujeito passivo para operações com direito e sem direito à dedução(7). Neste caso o direito à dedução é calculado pelo método pro rata, determinado em conformidade com o art.º 19.° dessa Directiva.”.

            Assim, considera-se, na linha da jurisprudência exposta, estar-se, também nestes casos, perante despesas gerais, qualificação esta que, de resto, não é expressamente contestada pela AT, e é expressamente aceite por esta, em muito casos.

            O que a AT fez, conforme atrás se abordou já, foi restringir a actividade geral da Requerente à actividade de gestão de participações sociais, o que não tem qualquer correspondência na matéria de facto apurada, na medida em que, como se viu também, a Requerente se dedica, não só, a título principal, àquela actividade, mas igualmente, a título acessório, e de acordo com a lei, à actividade de administração e apoio à gestão de algumas das suas participadas, pelo que necessariamente se deverá incluir esta actividade no conjunto da actividade económica da Requerente.

            Também em sede arbitral, a Requerida, sobre esta matéria, admitindo que possam estar em causa despesas gerais da Requerente, limita-se a afirmar que “não são elementos constitutivos do preço dos seus produtos (que conferem o direito à dedução), ou seja, de serviços que preste às suas participadas”, já que “que tais inputs não têm reflexo no preço dos serviços que eventualmente preste às suas participadas, porquanto os contractos que celebrou não lhe permitem tal imputação, ou seja, reflectir o preço daqueles serviços no preço dos serviços que (...) preste às suas participadas”.

            Ora, conforme resulta da matéria de facto provada, a referida asserção não tem aderência à realidade, já que, sendo embora certo que, relativamente ao algumas das suas participadas a Requerente não pratica operações sujeitas a IVA, estando, em alguns desses casos, mesmo vedada contratualmente de o fazer, menos certo não é que foi demonstrado que relativamente às participadas L..., S.A. (“L...”), a quem são facturados directamente serviços, e às sociedades M..., SA, e N... BV, a quem são facturadas senhas de presença, a Requerente pratica operações sujeitas a imposto.

            Daí que – desde logo por força do princípio da neutralidade do IVA, tal como afirmado e desenvolvido na jurisprudência comunitária citada – nunca possa estar em causa a exclusão total do direito à dedução do imposto suportado nas despesas gerais, mas, unicamente, a medida de tal direito, matéria a definir em sede da determinação do pro-rata.

            Deste modo, nada se apurando, no sentido de afastar a referida qualificação das despesas em causa como despesas gerais da Requerente, susceptíveis de fundar o direito à dedução parcial do imposto nelas suportado, não poderia a AT, face à lei nacional e comunitária, e à jurisprudência que se analisou, desconsiderá-las por completo, devendo, igualmente nesta parte, ser anulada a correcção em causa, procedendo, nessa medida, o pedido arbitral.

 

*

O Aviso de Lançamento 434 do Z... reporta-se ao reembolso de despesas relacionado com emissão de obrigações, da sociedade “HH...B.V.”.

A factura 16111 proveniente da sociedade S... S.A., reporta-se a assistência fiscal relacionada com operação de swap.

A AT não aceitou como dedutível o IVA contido na referida documentação, por entender, em suma, que se reporta a inputs relacionados com actividade económica isenta (juros), concluindo que o imposto incluído nesses inputs também não será dedutível.

Todavia, esta qualificação não será de acolher. Com efeito, estando em causa uma obrigação obrigacionista e a outorga de contratos de swap, não se estará perante uma situação em que se aufere juros, mas, antes, perante financiamentos, obrigacionistas e por intermédio de operações com derivados.

Como se escreveu no Acórdão Larentia + Minerva e Marenave, “no caso de o tribunal de reenvio constatar que as participações resultantes das operações de capital a que procederam as sociedades holding (...) foram afetadas parcialmente a outras filiais em cuja gestão as sociedades holding não participavam (...) o IVA pago sobre os custos dessas operações (...) pode ser deduzido parcialmente”.

É certo que a operação a que se reporta o Aviso de Lançamento 434 se trata de uma operação de financiamento de uma participada da Requerente (e não da própria Requerente), e que essa participada não integra o elenco daquelas em que a se apurou a existência de operações tributáveis, correspondentes à interferência da Requerente na respectiva gestão, o que poderia levantar a questão de estar em causa uma operação directamente relacionada com a actividade de gestão de participações exercida pela Requerente.

Todavia, não foi este o fundamento em que a AT fundou a correcção em causa, e é este que este Tribunal tem de se ater ao aferir a legalidade da intervenção daquela, já que., conforme se escreveu no Acórdão do STA de 23-09-2015, proferido no processo 0134/11[16], “É exclusivamente à luz da fundamentação externada pela AT quando da prática da liquidação adicional de IVA que deve aferir-se a legalidade desse acto tributário.”.

Deste modo, enferma a concreta correcção em questão de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, pelo que deverá ser anulada.

 

***

2.ii Das correcções a manter

            Como documentos de suporte relativos a imposto suportado foram apresentados pela Requerente os Avisos 1010313 (p. 62v do Anexo 7 ao RIT) 1010317 (p. 62 do Anexo 7 ao RIT), 1010323 (p. 61v do Anexo 7 ao RIT), 1010325 (p. 61 do Anexo 7 ao RIT) 1010350 (p. 63v do Anexo 7 ao RIT), 1010352 (p. 64 do Anexo 7 ao RIT), todos do C..., as Notas de Lançamento n.º 10609631782 (p. 44v do Anexo 7 ao RIT), n.º 10592527950 (p. 43 do Anexo 7 ao RIT), e os Extractos 2012/06 (pp. 46v a 47v do Anexo 7 ao RIT) e 2013/04 (pp. 57v a 58 do Anexo 7 ao RIT), do U..., que dizem respeito a imposto suportado com comissões bancárias pela transferência de dividendos pagos pelas sociedades II..., JJ..., e KK..., SA.

A AT enquadrou estes documentos no ponto i. dos fundamentos acima elencados, considerando, portanto, que não estão em causa serviços que se possam ligar directamente à actividade sujeita e não isenta da Requerente, ou que se possam considerar como utilizados de forma indistinta ou simultânea no exercício de actividades que conferem e outras que não concedem o direito à dedução de IVA.

Compulsados os factos dados provados, ter-se-á que concluir nada haver a censurar à correcção operada pela AT nesta parte.

Com efeito, o descritivo da documentação apresentada pela própria Requerente, aponta no sentido de se tratarem de serviços relacionados com as operações de detenção e gestão de participações sociais, mormente com a percepção de dividendos emergente daquelas, praticadas pela Requerente, nada emergindo da matéria de facto provada que permita concluir que:

  1. os serviços em questão sejam distintos ou excedam os descritos na documentação em questão;
  2. as comissões em causa tenham sido qualquer relação directa com a actividade de apoio à gestão e administração das suas participadas, pela Requerente;
  3. tais comissões sejam relacionáveis com o funcionamento geral da Requerente, servindo, indistintamente, os vários tipos de serviços por aquela prestados, e, designadamente, com a actividade tributável de administração e apoio à gestão das suas participadas.

Deste modo, e em consonância com a jurisprudência comunitária previamente citada, deve entender-se que “que a percepção de dividendos não entra no âmbito de aplicação do IVA.”, o mesmo acontecendo com as despesas associadas a tais operações.

 

*

            A nota de débito emitida pela sociedade L..., SA, reporta-se custos relativos a comissão de assessoria financeira prestada pelo LL..., SA, na reestruturação da sociedade MM... detida indiretamente pela D... .

A AT enquadrou este documento no ponto i. dos fundamentos acima elencados, considerando, portanto, que não estão em causa serviços que se possam ligar directamente à actividade sujeita e não isenta da Requerente, ou que se possam considerar como utilizados de forma indistinta ou simultânea no exercício de actividades que conferem e outras que não concedem o direito à dedução de IVA.

Compulsados os factos dados provados, ter-se-á que concluir, também aqui, nada haver a censurar à correcção operada pela AT relativamente ao documento ora em apreço.

Com efeito, o descritivo do mesmo, aponta no sentido de se tratarem de serviços exclusivamente relacionados com as operações de detenção e gestão de participações sociais exercidas pela Requerente, sendo que a sociedade MM... a não integra o elenco daquelas com quem a Requerente praticou operações tributáveis, designadamente relativos a apoio à administração e gestão, nada emergindo, portanto, da matéria de facto provada que permita concluir que:

  1. os serviços em questão sejam distintos ou excedam os descritos no documento em causa;
  2. as comissões em causa tenham sido qualquer relação directa com a actividade de apoio à gestão e administração das suas participadas, pela Requerente, designadamente porquanto nada consta dos factos dados como provados relativamente à eventual intervenção da Requerente na sociedade MM...;
  3. tais comissões sejam relacionáveis com o funcionamento geral da Requerente, servindo, indistintamente, os vários tipos de serviços por aquela prestados, e, designadamente, com a actividade tributável de administração e apoio à gestão da sua participada MM... .

 

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As facturas 367 e 380 não foram apresentadas pela Requerente, tendo unicamente sido juntos avisos de débito do R..., que as mencionam, como sendo referentes a comissões por assessoria prestada, e não se identificando o serviço em causa

Do Extracto 1/2012 constam gastos com comissões do Z... relativamente aos quais a Requerente não disponibilizou a documentação de suporte (facturas), com a excepção da factura 7689, já analisada. Quanto aos outros gastos a que se reporta o extracto em causa, a Requerente apenas apresentou correspondência proveniente do banco.

            Do Extracto 1/2015, constam também diversos gastos com comissões do Z... relativamente aos quais a Requerente não disponibilizou a documentação de suporte (facturas).

            Conforme se escreveu, por exemplo, no Ac. do TCA-Norte de 29-06-2017, proferido no processo 00312/07.2BEPNF, e se tem por pacífico:

I. Da conjugação do n.º 2 do art.º 19.º n.º 2 e n.º 5 do art.º 35.º do CIVA resulta que só confere direito à dedução o imposto mencionado em faturas e documentos equivalentes passados em forma legal, desde que cumprindo os requisitos do n.º 5 do art.º 35.º CIVA.

II. De acordo com o mecanismo da liquidação do IVA a fatura ou documento equivalente que o suporta torna-se um elemento de fundamental e decisivo, pois é esse documento que vai permitir ou não a dedução e ainda vai definir a incidência subjetiva e objetiva, as taxas aplicadas aos diversos bens e serviços transacionados ou prestados.”.

Desta forma, não tendo sido apresentado o documento de suporte relativamente ao IVA deduzido pela Requerente nas situações referidas, não será de aceitar a sua dedução, conforme expressamente se mencionou no RIT, nada havendo a censurar à correcção em causa, improcedendo, nessa parte, o pedido arbitral.

 

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Pela Requerente foram ainda contabilizadas em duplicado as facturas 2377 e 33106219, emitidas pela sociedade GG..., LDA, relativas a serviços de consultoria de gestão.

            Como se referiu no RIT, não pode a Requerente deduzir duas vezes o IVA contido na mesma factura, pelo que a duplicação de dedução será ilegítima, devendo, assim, manter-se a correcção em causa, e improcedendo, por isso, nessa parte, o pedido arbitral.

 

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A factura 19 emitida pela NN..., LDA, refere-se a prestação de serviços de catering.

Esta factura foi desconsiderada pela AT, para além do mais, e conforme se refere no RIT, porquanto está relacionada com um gasto com alimentação e bebidas (catering), cuja dedução, nos termos do artigo 21.º do CIVA, não é admitida.

Nada se apurando em contrário, também nada haverá a censurar à correcção em apreço, devendo, assim, manter-se aquela, e improcedendo, por isso, nessa parte, o pedido arbitral.

 

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  1. Cálculo do pro-rata

            A Requerente insurge-se ainda, nos presentes autos arbitrais, contra a correcção operada pela AT relativamente ao cálculo do pro-rata aplicado ao imposto relativo às despesas que aquela reconheceu como sendo de caracter geral.

            Dessa correcção ao cálculo efetuado pela Requerente, cujos pro rata definitivos tinham ascendido, nos anos de 2012 a 2015, respetivamente a 56%, 52%, 33% e 6% resultaram, os valores de 33%, 34%, 5% e 3%, para os mesmos anos, atendendo à adição ao denominador do pro rata dos juros de depósitos bancários e de suprimentos não facturados, auferidos pela Requerente.

            Considerou, a este propósito, a AT que a Requerente não procedeu correctamente, pois o volume de negócios que aquela considerou que deveria constar do denominador deveria abranger o total dos rendimentos (juros obtidos e prestações de serviços efetuadas), e não, como a Requerente fez, incluir apenas os juros ganhos relativos a empréstimos efectuados às suas participadas juntamente com as prestações de serviços efectuadas, deixando de fora deste cálculo os restantes rendimentos com juros.

            Por sua vez, a Requerente sustenta que as premissas subjacentes ao recálculo efectuado pela Autoridade Tributária não se revelam correctas, já que o pro rata a apurar para a Requerente deverá ter por base, no numerador, as operações efetuadas relativamente às quais liquidou IVA (prestação de serviços de suporte à gestão) e, no denominador, essas operações tributadas adicionadas dos juros facturados em virtude do financiamento concedido às suas participadas, com exceção dos juros não facturados.

            Conforme se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 29-05-2007, proferido no processo 00833/03:

1. Estando em causa nos autos a dedução de IVA por parte de SGPS, que realiza operações sujeitas e operações não sujeitas a IVA, há que aplicar o cálculo pro-rata, tal como determina o artº 23º, nº 4 do CIVA.

2. O pro-rata é apurado de acordo com uma fracção em que o numerador é constituído pelo valor do montante anual, imposto excluído, das transmissões de bens e prestações de serviços que dão lugar a dedução e o denominador pelo montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo, incluindo as operações isentas ou fora do campo de aplicação do imposto, designadamente as subvenções não tributadas que não sejam subsídio de equipamento. No entanto, e tal como tem vindo a sustentar o TJUE, nesse denominador não devem ser incluídos os dividendos e os juros auferidos pelas holdings.

3. Tendo a Administração Tributária calculado o pro-rata com englobamento no denominador dos dividendos e juros auferidos pela recorrente - SGPS- o cálculo desse pro-rata ofende o disposto no artº 23º, nº 4 do CIVA, pelo que as liquidações posteriormente efectuadas com base naquele cálculo são ilegais, devendo, por isso ser anuladas.”.

            Também a nível comunitário, a questão foi apreciada no âmbito do Acórdão Satam /Sofitam (processo C-333/91)[17], em reenvio prejudicial suscitado pelo Conseil d’Etat francês, e onde, tendo sido constatado pelas autoridades fiscais francesas que as receitas da sociedade compreendiam vendas de produtos sujeitos a imposto e dividendos, a administração fiscal francesa quis limitar o direito à dedução de Sofitam através da aplicação de uma percentagem de dedução, em cujo denominador incluiu os dividendos, concluído o Tribunal que se os dividendos não são contrapartida de qualquer actividade económica, são estranhos ao sistema do direito à dedução e não devem, por conseguinte, ser incluídos no denominador da fracção representativa do pro rata.

            Deste modo, e pelos fundamentos expostos, não será de acolher a correcção efectuada pela AT ao pro rata da Requerente, ora em apreço, devendo, assim, a mesma ser anulada, procedendo, nessa medida, o pedido arbitral.

 

***

  1. Dos juros indemnizatórios

Quanto ao pedido de juros indemnizatórios formulado pela Requerente, o artigo 43.º, n.º 1, da LGT estabelece que são devidos juros indemnizatórios quando se determine, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

No caso, os erros que afectam os actos tributários anulados são imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, que os praticou, indevidamente, por sua iniciativa, incorrendo nos erros de facto e de direito acima assinalados.

Tem, pois, a Requerente direito a ser reembolsada da quantia que pagou indevidamente (nos termos do disposto nos artigos 100.º da LGT e 24.º, n.º 1, do RJAT) por força dos actos anulados e, ainda, a ser indemnizada pelo pagamento indevido através do pagamento de juros indemnizatórios, pela AT, desde a data do pagamento indevido, até reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

***

 

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar parcialmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência,

  1. Anular parcialmente as liquidações objecto da presente acção arbitral, na parte que reflectem as correcções descrita e apreciadas nos pontos 2.i  e 3. da parte B. da fundamentação do presente acórdão;
  2. Manter as referidas liquidações na parte restante;
  3. Condenar a AT no pagamento de juros indemnizatórios à Requerente, nos termos referidos no ponto 4. da parte B. da fundamentação do presente acórdão;
  4. Condenar as partes nas custas do processo, na proporção do respectivo decaimento, fixando-se o montante de € 5.875,00 a cargo da Requerente e de € 8.813,00 a cargo da AT.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 1.065.751,04, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €14.688,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelas partes na proporção do respectivo decaimento, acima fixado, uma vez que o pedido foi parcialmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 3 de Dezembro de 2018

 

 

 

O Árbitro Presidente

 

 

 

(José Pedro Carvalho)

 

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(Luís Ricardo Farinha Sequeira)

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(Victor Simões)

 



[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.

[10] Que inclui benefícios fiscais. Nas palavras do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 495/88, “O regime fiscal que o presente diploma adopta para as SGPS, em sequência da Lei n.º 98/98, de 17 de Agosto, tem em vista a concessão de benefícios, sem os quais, de resto, tais sociedades teriam viabilidade duvidosa ou pouco interesse prático.

[11] Nos termos do preâmbulo do mesmo Decreto-Lei: “Saliente-se, ainda, a possibilidade que se confere às referidas sociedades de, complementarmente à sua actividade principal, prestarem, em determinadas circunstâncias, serviços técnicos de administração e gestão às sociedades participadas.” (sublinhado nosso).

[12] O que, de resto, é aceite pela Requerente. Cfr., p. ex., art.º 50.º do Requerimento Inicial.

[13] Esta factura, designada no RIT como provindo do Y...(antigo Z...), consta de fls, 80 do anexo 7 ao RIT, como emitida pelo T..., SA.

[14] Esta factura foi registada em duplicado pela Requerente, apenas podendo, obviamente, ser considerada uma vez para efeitos do direito à dedução.

[15] Idem.

[16] Disponível em www.dgsi.pt.