Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 609/2017-T
Data da decisão: 2018-10-30  IRC  
Valor do pedido: € 742.793,51
Tema: IRC – Provisão para garantias de clientes. Imparidades de créditos; Provas objectivas de imparidade.
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Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)

 

 

            Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente, designado pelo Conselho Deontológico do CAAD), Prof. Doutor Rui Duarte Morais e Prof. Doutor Henrique Fiúza, designados pela Requerente e pela Requerida, respectivamente, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 05-03-2018, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

           

A..., S.A., NIPC ... com sede em ..., ...– ... ..., ... (doravante mencionado como “Requerente”), veio, ao abrigo do artigo 2.º, n.º 1, al. a), e dos artigos 10.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), em conjugação com o disposto na alínea a) do artigo 99.º e na alínea a) do n.º 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (doravante “CPPT”), pedir pronúncia arbitral sobre:

– a (i)legalidade do acto de indeferimento do recurso hierárquico subsequente ao indeferimento da Reclamação Graciosa, proferido no dia 25-08-2017;

– a (i)legalidade do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) relativa ao exercício de 2010 n.º 2014..., efetuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) com data execução de 27-01-2014, no montante global de € 957 768,65 (juros compensatórios incluídos no montante de € 79 590,94) que lhe foi notificada nos termos da “demonstração de liquidação de IRC”, da “demonstração de liquidação de juros” e da “demonstração de acerto de contas, juntas como documentos n.ºs 1, 2 e 3.

A Requerente esclarece que «considerando o acerto de contas com liquidações anteriores, a liquidação que se questiona produziu um valor efetivamente a pagar de € 742 793,51».

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA e ADUANEIRA.

O Requerente designou como Árbitro o Prof. Doutor Rui Duarte Morais, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b), do RJAT.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 22-11-2017.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e do n.º 3 do RJAT, e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro o Prof. Doutor Henrique Fiúza.

Na sequência de requerimento dos Árbitros designados pelas Partes, o Conselho Deontológico do CAAD designou o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa como árbitro presidente, que aceitou a designação.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 12-02-2018.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 05-03-2018.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defende a suspensão do presente processo e a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

            Em 27-06-2018 realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido, ao abrigo do disposto no artigo 421.º do CPC, juntar ao processo a gravação da prova produzida no processo n.º 582/2017-T, cuja matéria é parcialmente comum.

A Autoridade Tributária e Aduaneira pediu a suspensão da instância por estarem pendentes no Tribunal Administrativo e fiscal de Braga processos de impugnação judicial instaurados nos anos de 2008, 2010, 2011 e 2014, relativos a correcções efectuadas em anos anteriores, mas tal pretensão foi indeferida por despacho de 08-09-2018.

            Junta a gravação da prova testemunhal, foi decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.

            As Partes apresentaram alegações.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente,

            As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

Não há obstáculos à apreciação do mérito da causa.

 

2. Matéria de facto

 

            2.1. Factos provados

 

            Consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A Requerente exerce a actividade de “Construção de outras obras de engenharia civil, n.e.” (CAE 042990), encontrando-se enquadrada, em sede de IRC, no regime geral de tributação;
  2. A Requerente foi sujeita a uma acção inspectiva interna ao, ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2012..., no âmbito da qual foram efectuadas as seguintes correcções à matéria tributável identificadas no ponto III do Relatório da Inspecção Tributária:

III.1. Ajustamento de transição de provisões para garantias a clientes, no montante de € 163.892,57;

III.2. Provisão para garantias a clientes – gasto do período, no montante de € 542.883,03;

III.3. Contratos de construção, no montante de € 880.694,10;

III.4. Perdas por imparidade em créditos, no montante de € 2.713.252,11;

III.5.1. Reversão ajustamentos - anulação na totalidade -762.270,32;

III.5.2. Reversão ajustamentos - anulação parcial -1.119.958,77;

III.6. Gastos não documentados, no montante de € 2.317,99;

II.7. Depreciações não aceites como gasto, no montante de €1.893,03;

III.9. Tributação Autónoma, no montante de € 6.176,20;

  1. Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2010, com o número 2014 ... datada de 27 de Janeiro de 2014, bem como demonstração da liquidação de juros compensatórios e demonstração de acerto de contas (documentos n.ºs 1 a 3 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  2. No Relatório da Inspecção Tributária, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais, o seguinte:

(...)

III.2. Provisão para garantias a clientes - gasto do período

Conforme já referido no ponto anterior, no final de 2010, o sujeito passivo constituiu uma provisão para fazer face a encargos com garantias a clientes, que registou na conta de gastos "6721 - Provisões do período -garantias", no montante de 1.554.487,30 EUR.

Conforme mapa explicativo do campo 703, elaborado pelo sujeito passivo, integrante do dossier fiscal, que se junta a este relatório como ANEXO I, esse valor resultou da aplicação da percentagem de 2,1974% ao valor da faturação com garantia, de 2010 (70.741.557,27 EUR).

A percentagem utilizada pelo sujeito passivo resulta da proporção entre (i) os gastos indicados nesse quadro como suportados com garantias em 2007, 2008 e 2009 e a (ii) faturação com garantia desses mesmos anos (2007, 2008 e 2009).

Nos termos do n° 5 do artigo 39° do CIRC, o montante anual da provisão a que se refere a alínea b) do mesmo artigo e determinado pela aplicação às vendas e prestações de serviços sujeitas a garantias efetuadas no período de tributação, de uma percentagem que não pode ser superior à que resulta da proporção entre a soma dos encargos derivados de garantias a clientes efetivamente suportados nos últimos três períodos de tributação e a soma das vendas e prestações de serviços sujeitas a garantias efetuadas nos mesmos períodos.

A Circular N° 10/2011 - Provisão para garantias a clientes, de maio de 2011, da Direção de Serviços de IRC, veio esclarecer, no seu n° 9, que a referência aos "últimos três períodos de tributação" permite considerar os dados do período em que se está a constituir ou a reforçar a provisão (ano 2010, neste caso) e dos dois períodos anteriores (2009 e 2008, neste caso).

Assim, o sujeito passivo deveria ter efetuado a proporção entre os gastos derivados de garantias a clientes efetivamente suportados em 2008, 2009 e 2010 e a soma das vendas e prestações de serviços sujeitas a garantias efetuadas nos mesmos períodos.

Considerando os elementos constantes do ANEXO I, a percentagem utilizada para determinação da provisão para garantias, deveria ter sido de 1,43%, conforme cálculo demonstrado no quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

Pelo referido, o valor aceite fiscalmente como provisão para fazer face a encargos com garantias a clientes, nos termos da alínea b) do n° 1 e n° 5 do artigo 39° do CIRC é de 1.011.604,27 EUR (1,43% x70.741.557,27).

Conforme exposto vamos acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo o montante de 542.883,03 EUR (1.554.-487,30-1.011.604,27).

(...)

 

III.4. Perdas por imparidade em créditos

O sujeito passivo registou na conta 6511- Perdas por imparidade - Em dívidas a receber- Clientes o valor de 3.710.199,20 EUR, relativamente a crédito sobre clientes que o sujeito passivo considera estarem em situação de cobrança duvidosa e cujo saldo está registado na conta 218-Clientes de cobrança duvidosa.

Analisado o mapa elaborado pelo sujeito passivo verifica-se que, relativamente a cada cliente registado na conta 218, foi efetuada a decomposição do saldo em função da mora, tendo sido aplicadas as percentagens de:

- 25% ao saldo com mora entre 6 e 12 meses;

- 50% ao saldo com mora entre 12 e 18 meses;

- 75% ao saldo com mora entre 18 e 24 meses;

- 25% ao saldo com mora superior a 24 meses.

Ao valor desta forma obtido, o sujeito passivo, subtraiu o valor das perdas por imparidade acumuladas que se encontrava registado no ano anterior, obtendo por diferença o valor da perda a registar neste período.

Para verificação da aceitação do gasto fiscal, seguimos o critério utilizado na análise dos exercícios anteriores, centrando a análise nos clientes cujo ajustamento efetuado excedesse o valor de 10.000,00 EUR.

Tendo em consideração o referido, analisamos os clientes mencionados na tabela abaixo:

 

 

 

 

 

 

Na análise efetuada, e no que respeita à aceitabilidade fiscal da perda registada pelo sujeito passivo, teve-se em consideração o previsto nos artigos 35° e 36° do Código do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Coletivas (CIRC).

Assim, consideramos só serem de aceitar as perdas por imparidade sobre créditos relativamente aos quais esteja devidamente justificado 0 risco de incobrabilidade, requisito essencial nos termos do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Consideramos ainda que se verifica a existência de risco de incobrabilidade quando, tendo já sido ultrapassada a data estipulada ou o prazo estabelecido para a satisfação da dívida, apesar das diligências efetuadas, não tenha sido possível o seu recebimento.

O facto de os créditos entrarem em mora não significa por si só que haja risco de incobrabilidade, sendo apenas um indício da possibilidade da existência desse risco.

Conforme determina a alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC, só são aceites fiscalmente os ajustamentos sobre créditos em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento (sublinhado nosso).

Assim, solicitamos ao sujeito passivo que nos exibisse prova de diligências efetuadas, tendo o mesmo facultado fotocópias de cartas e faxes (que se encontram arquivadas no processo individual do sujeito passivo).

Acrescenta-se que a análise efetuada teve em consideração as apreciações e correções efetuadas pela Inspeção Tributária, doravante designada apenas por IT, aos exercícios anteriores (2004 a 2009).

Constatámos que, desde 2004, o sujeito passivo tem por prática habitual contabilizar perdas por imparidade relativas a créditos que estão em mora há mais de seis meses, mesmo em situações em que não há risco de incobrabilidade. Consequentemente, há clientes para os quais, sucessivamente, o sujeito passivo regista perdas e reversões de perdas.

Perante o descrito, do exame as perdas consideradas pelo sujeito passivo, encontraram-se as anomalias a seguir discriminadas por cliente.

 

B...- Sociedade de Construções, S.A. [461]

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-04-21 e 2010-11-26, pelas quais é informado o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado como estando em divida é de 1.989.788,05 EUR e, na segunda, é de 1.507.603,42 EUR, 0 que por si só evidencia que o cliente procedeu a pagamentos. Analisando as listagens anexas as cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010 e que entre a primeira listagem e a segunda, o cliente procedeu ao pagamento de diversos documentos (faturas e notas de debito) emitidas em 2009 e 2010.

O sujeito passivo já vem a considerar perdas por imparidade de créditos sobre este cliente, desde 2004, procedendo, quer a reforços, quer a reversão das mesmas, o que significa que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos. A IT procedeu ao acréscimo dos valores considerados como perdas nos períodos de 2006 e 2008.

A perda registada neste período reforça as perdas por imparidade acumuladas, registadas em períodos anteriores e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência do risco de incobrabilidade.

Não pondo em causa o referido anteriormente é de realçar que nas listagens que o sujeito passivo envia para o seu cliente está evidenciado que as faturas se vencem a 60 dias, pelo que nunca seria aceite fiscalmente a perda registada, relativa a documentos com data de emissão de 2010-04-30 ou posterior.

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 14.605,81 EUR.

 

C..., Lda. (...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes às faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-04-21 e 2010-11-26, pelas quais é informado o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo às referidas cartas.

Em ambas as cartas o montante indicado em dívida é de 372.251,23 EUR e, analisando as listagens anexas as cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010, pois essas listagens englobam documentos emitidos entre abril de 2009 e março de 2010.

O sujeito passivo já vem a considerar perdas por imparidade de créditos deste cliente, pelo menos, desde 2007, procedendo, quer a reforços, quer a reversão das mesmas, o que significa que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos. A IT procedeu ao acréscimo dos valores considerados como perdas nos períodos de 2007 e 2008.

A perda registada neste período reforça as perdas por imparidade acumuladas, registadas em períodos anteriores e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Não pondo em causa o referido anteriormente é de realçar que nas listagens que o sujeito passivo envia para o seu cliente está evidenciado que as faturas se vencem a 30 dias, pelo que nunca seria aceite fiscalmente a perda registada, relativa a documentos com data de emissão de 2010-05-31 ou posterior.

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 190.055,59 EUR.

 

D... S.A. ...

Para este cliente a perda por imparidade respeita às faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo uma impressão de mail, datado de 2010-12-06, pelo qual foi solicitado ao cliente a regularização de documentos vencidos em conta-corrente, cujo montante ascende a 571.423,62 EUR. É referido pelo sujeito passivo, que, desse montante, 373.593,50 EUR diz respeito a retenções.

Aquando da análise das diligências efetuadas em 2009, verificou-se que foi enviada uma primeira carta, onde foi solicitado o pagamento de 4.450.749,68 EUR, relativo a faturas emitidas entre 2008-06-30 e 2008-12-31, e uma segunda carta em que foi solicitado o pagamento de 1.881.793,04 EUR, relativo a faturas emitidas entre 2008-08-31 e 2009-09-30.

Considerando o referido, conclui-se que este cliente tem efetuado pagamentos, sendo grande parte do montante em dívida de 2010 resultado das retenções que o cliente faz, o que significa tratar-se de um montante que está em “aberto”, mas que não está em mora.

De referir ainda que, da análise do mail enviado pelo sujeito passivo ao cliente, constatou-se que:

 o prazo de vencimento das faturas é de 90 dias, pelo que as faturas constantes no quadro acima que têm data de emissão de 2010-04-30 e posteriores não estão em condições que permitam considerar a perda por imparidade, nos termos do artigo 36° do CIRC.

Na conta-corrente constam as notas de crédito n° 100026 e 100029, respetivamente de 2010-07-23 e 2010-07-31, ambas com o valor de 272.059,13 EUR, que anulam respetivamente as faturas n° 100294 (que consta no quadro acima) e 100432, pelo que nunca poderia ser considerada a perda por imparidade conforme foi calculada.

Por tudo o que foi descrito, conclui-se que se trata de um cliente com caráter de habitualidade, a quem o sujeito passivo efetuou fornecimentos em 2010 nas mesmas condições dos anos anteriores (mantém-se o prazo de vencimento de 90 dias) e que procedeu a pagamentos durante este ano.

Assim, e tendo em consideração que o simples facto de existir um mail a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Concluímos, então, que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 117.877,45 EUR.

 

E..., S.A. (...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes às faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo, fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-06-25 e 2010-10-18, pelas quais é solicitada ao cliente a regularização de conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo às referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado em dívida é de 114.133,43 EUR e na segunda é de 129.690,61 EUR.

Analisando as listagens anexas às cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010 e que, entre a primeira listagem e a segunda, o cliente procedeu ao pagamento de algumas faturas emitidas em 2010.

O sujeito passivo já vem a considerar perdas por imparidade de créditos sobre este cliente, pelo menos, desde 2004, procedendo, quer a reforços, quer a reversão das mesmas, o que significa que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos. A IT procedeu ao acréscimo dos valores considerados como perdas nos períodos de 2004 a 2009.

A perda registada neste período reforça as perdas por imparidade acumuladas, registadas em períodos anteriores e incide sobre um novo crédito.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra -o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 47.820,96 EUR.

 

F..., Lda. [F...]

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-02-23 e 2010-11-26, pelas quais é solicitada, ao cliente, a regularização de conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Em ambas as cartas o montante indicado em divida é de 163.598,75 EUR.

Analisando as listagens anexas as cartas enviadas, verifica-se que englobam uma fatura de janeiro de 2010 e notas de débito de abril e de maio de 2010. Para além de permitir concluir que o sujeito passivo efetuou, pelo menos, um fornecimento a este cliente em 2010, tal facto gera algumas dúvidas acerca da primeira carta enviada ao cliente, pois se pela referência da mesma parece estar correta a data da carta, fica-se com interrogação de como é possível em fevereiro estar a exigir o pagamento de documentos emitidos em meses posteriores.

A perda registada neste período reforça a perda por imparidade registada no período anterior.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 79.524,28 EUR.

 

G..., Lda. (...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes às faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo, fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-02-23 e 2010-09-28, pelas quais é solicitada, ao cliente, a regularização de conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Em ambas as cartas o montante indicado em dívida é de 303.308,13 EUR.

Verifica-se que a morada indicada nas referidas cartas não corresponde à sede ou instalações do cliente. O cliente tem a sua sede em ...(Edifício ...- ... e ...) enquanto as cartas têm como morada de destinatário a ..., ...-... ..., pelo que se conclui que efetivamente não foram realizadas diligências, ou pelo menos não se encontram comprovadas, uma vez que a morada constante das cartas não corresponde ao domicílio ou qualquer instalação da empresa.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estar cumprido o estipulado na alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 151.854,07 EUR.

 

H..., S.A. (...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita às faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-06-25 e 2010-12-07, pelas quais se informa o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo às referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado em dívida é de 1.445.999,06 EUR e na segunda é de 2.103.646,49 EUR.

Analisando as listagens anexas as cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010, mesmo posteriormente ao envio da primeira carta, e que entre a primeira listagem e a segunda, o cliente procedeu ao pagamento de faturas emitidas em 2009 e 2010.

Assim, tratando-se de um cliente com diversos fornecimentos no decurso do período em análise, e atendendo a que mesmo nos fornecimentos realizados perto do fim do ano se mantêm as condições dos fornecimentos anteriores (prazo de vencimento de 90 dias), e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade), ficando apenas demonstrado que se trata de um cliente com um prazo de pagamento bastante dilatado.

Não pondo em causa o referido anteriormente é de realçar que, nas listagens que o sujeito passivo envia para o seu cliente, está evidenciado que as faturas se vencem a 90 dias, pelo que nunca seria aceite fiscalmente a perda relativa aos créditos constantes nos documentos cuja data de emissão é de 2010-03-31 ou posterior.

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 238.105,28 EUR.

 

I..., ACE. [...]

Para este cliente a perda por imparidade respeita às faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-08-16 e 2010-12-07, pelas quais é informado o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo às referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado em dívida é de 620.850,00 EUR e na segunda é de 196.802.37,42 EUR, o que por si só evidencia que o cliente procedeu a pagamentos, o que se veio a confirmar com a análise às listagens anexas as cartas enviadas.

Tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade e que o cliente efetuou diversos pagamentos não se considera demonstrada a existência do risco de incobrabilidade.

Não pondo em causa o referido anteriormente, é de realçar que nas listagens que o sujeito passivo envia para o seu cliente está evidenciado que as faturas se vencem a 30 dias, pelo que nunca seria aceite fiscalmente a perda relativa ao crédito da fatura constante do quadro acima, com data de emissão de 2010-06-30.

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 49.481,57 EUR.

 

(...)

J..., Lda(J...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes às faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui, em arquivo, fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-10-18 e 2010-12-07, pelas quais é informado o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Em ambas as cartas o montante indicado em divida é de 148.608,84 EUR.

Analisando as listagens anexas as cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010.

O sujeito passivo já considerou uma perda por imparidade de créditos deste cliente em 2008, e em 2009 procedeu a reversão de quase a totalidade da mesma.

Pelo referido podemos concluir que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos.

A perda registada neste período reforça a perda por imparidade registada anteriormente e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 67.561,18 EUR.

 

K..., S.A. (...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui, em arquivo, fotocópia de duas cartas, datadas de 2010-01-18 e 2010-10-18, pelas quais é informado o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado em dívida é de 712.696,76 EUR e na segunda é de 2.684.171,06 EUR.

Analisando as listagens anexas às cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos este cliente em 2010, e que entre a primeira listagem e a segunda, o cliente procedeu ao pagamento de diversas faturas.

Não pondo em causa o referido anteriormente, é de realçar que no extrato que o sujeito passivo envia para o seu cliente está evidenciado que: (i) as faturas se vencem a 30 dias, pelo que nunca seria aceite a perda por imparidade com as faturas constantes do quadro acima, com data de emissão de 2010-06-30 e (ii) foram emitidas notas de crédito que o sujeito passivo teve em consideração no cálculo da perda mas apenas em percentagem equivalente à mora (como se se tratasse de uma fatura), quando deviam ter sido abatidas na totalidade ao valor em divida.

Por outro lado, a K... S.A. é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, conforme estatutos constantes do Decreto-Lei n.° 192/2008 de 01 de outubro, pelo que não há risco de incobrabilidade dos créditos.

Assim, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 26.725,90 EUR.

 

(...)

 

L..., Lda. (L...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O sujeito passivo tem vindo a constituir provisão para este cliente desde 2004, provisões que não foram aceites fiscalmente por não estar demonstrado o risco de incobrabilidade e por não existirem provas de diligências efetuadas no sentido do recebimento dos créditos provisionados.

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes às faturas constantes do quadro acima, concluiu-se que o sujeito passivo possui, em arquivo, fotocópia de duas cartas datadas de 2010-04-22 e de 2010-10-20, pelas quais é informado o cliente dos montantes que se encontram vencidos em conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado em divida é de 460.237,98 EUR e na segunda é de 480.773,06 EUR.

No entanto o simples facto de existir uma carta a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade.

Pela análise do extrato contabilístico verifica-se que o sujeito passivo continua a efetuar fornecimentos para este cliente em 2010, sendo este um cliente habitual desde 2004. Verifica-se ainda que durante o ano de 2010 foram efetuados pagamentos no montante de 350.073,69 EUR.

Pelo referido concluímos que não há risco de incobrabilidade dos créditos.

Assim, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 29.451,89 EUR.

 

M..., Lda. [...]

Para este cliente a perda por imparidade respeita às faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui, em arquivo, fotocópia de três cartas, datadas de 2010-03-22, 2010-03-31 e 2010-10-20, pelas quais é solicitado, ao cliente, a regularização de conta-corrente, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo as referidas cartas.

Na primeira carta o montante indicado em divida é de 231.998,53 EUR, na segunda é de 232.187,53 EUR e na terceira é de 237.875,53 EUR.

Analisando as listagens anexas às cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010.

O sujeito passivo já vem a considerar perdas por imparidade de créditos deste cliente desde 2006, procedendo, quer a reforços, quer a reversão das mesmas, o que significa que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos. A IT procedeu ao acréscimo dos valores considerados como perdas nos períodos de 2006, 2008 e 2009.

A perda registada neste período reforça as perdas por imparidade acumuladas, registadas em períodos anteriores, e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 87.877,46 EUR.

 

N..., Lda. (...)

Para este cliente a perda por imparidade respeita as faturas constantes do quadro abaixo:

 

 

 

 

 

 

 

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo, fotocópia de carta, datada de 2010-11-22, pela qual é solicitado, ao cliente, a regularização de conta-corrente, que totaliza o montante de 3.842.640,98 EUR, conforme listagem de documentos pendentes enviada em anexo à referida carta.

Analisando a listagem anexa à carta enviada, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010.

A perda registada neste período reforça a perda por imparidade registada no período anterior e incide sobre novos créditos.

Concluímos tratar-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise e, tendo em consideração que o simples facto de existir uma carta a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

Pelo referido, concluímos que não existem provas objetivas de imparidade, requisito primário para a consideração, para efeitos fiscais, da perda por imparidade, nos termos da alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC.

Pelo exposto, a perda contabilística não pode ser considerada como perda fiscal do período, uma vez não estarem reunidos os pressupostos da incobrabilidade, ficando assim, por cumprir o estipulado nos artigos 35° e 36° do CIRC, pelo que se vai acrescer ao lucro tributável declarado pelo sujeito passivo, o montante de 1.095.393,05 EUR.

(...)

 

 

  1. A Requerente deduziu reclamação graciosa da liquidação, que foi indeferida por despacho de 31-10-2014;
  2. A Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que foi indeferido por despacho de 22-08-2017;
  3. A decisão do recurso hierárquico remete para a fundamentação de um parecer em que se formulam as seguintes conclusões:

Por todo o exposto conclui-se:

 A Recorrente vem sendo acompanhada pelos Serviços Inspetivos desde o exercido económico de 2004, tendo-se constatado que desde o referido exercício a Recorrente tem por prática habitual contabilizar provisões/perdas por imparidade relativas a créditos que estão em mora há mais de seis meses, mesmo em situações em que não há risco de incobrabilidade. Consequentemente, há clientes para os quais, sucessivamente, o sujeito passivo regista perdas e reversões dessas mesmas perdas;

Encontram-se nestes casos os clientes analisados pelos serviços inspetivos cujas imparidades registadas foram desconsideradas fiscalmente;

Apesar do sucessivo risco de incobrabilidade registado pela Recorrente na sua contabilidade, ano após ano, os fornecimentos a tais clientes e nas condições habituais não cessaram, sendo que os mesmos foram efetuando pagamentos regulares;

Isto mesmo se continua a observar na análise efetuada pelos Serviços ao ano de 2011 em que os clientes em causa no presente processo, apesar de os registos apresentaram mora no pagamento de mais de seis meses, continuaram a receber fornecimentos por parte da Recorrente e a efetuar pagamentos dos valores em conta corrente;

 Acresce ter a Recorrente procedido em 2011 à reversão total em alguns casos e parcial noutras das imparidades registadas com referência aos clientes em questão no ano aqui em análise, inclusive as imparidades registadas em 2010;

 Dado o observado forçoso será concluir pela inexistência de prova objetiva de imparidades, um dos requisitos, cumulativos exigidos pelo disposta no n.0 1 do artigo 36° do CIRC para a sua aceitação fiscal;

 De ressaltar que vindo os Serviços inspetivos a acompanhar a Recorrente desde o exercício de 2004, as reversões efetuadas pela Recorrente de imparidades não aceites fiscalmente pelos Serviços, são, no ano da reversão, corrigidas favoravelmente à Recorrente, na medida em que já foram tributadas no exercício em que a imparidade registada não foi aceite fiscalmente;

No tocante aos clientes em que a Recorrente alega a existência de processos de Recuperação (PER), de referir que a par de os mesmos se encontrarem na situação de continuado fornecimento por parte da Recorrente, tais processos iniciaram-se somente em 2012 e 2015;

 No caso do cliente F... Lda. que veio a ser declarado insolvente, o processo apenas deu entrada em 2015 e ainda assim da lista de credores não faz parte a ora Recorrente;

Relativamente ao G..., Lda inexiste em 2010 prova objetiva da realização de diligências tendentes à cobrança do valor em mora na medida em que a prova apresentada consubstancia-se em duas cartas enviadas a solicitar a regularização da conta corrente enviadas para uma morada que não pertence ao cliente em questão;

Ao contrário do defendido pela Recorrente, a prova objetiva da realização de diligências para o recebimento dos créditos não é um requisito de menor relevância, é antes expressamente determinado pelo normativo como requisito cumulativo;

De referir que a imparidade não aceite fiscalmente em 2010 foi integralmente aceite em 2011 (porquanto se verificou nesse ano o envio de cartas de cobrança dos valores em mora para a morada correta do cliente);

 No tocante ao Cliente K... SA, o fundamento que subjaz à desconsideração da imparidade registada prende-se não pelo facto de se tratar, por si só, de uma sociedade de capitais integralmente públicos mas antes por não existirem provas objectivas da existência de imparidade;

Com efeito, também relativamente a este cliente se verifica a prática anteriormente referida de registar imparidades em concomitância com o continuado fornecimento ao cliente nos mesmos termos que o vinha fazendo anteriormente, aliada ao facto do cliente proceder ao longo do período ao pagamento de diversas faturas. Isto mesmo continuaram os Serviços a verificar na ação inspetiva realizada ao ano de 2011.

 

 

  1. Em Maio de 2011, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a Circular n.º 10/2011, sobre a interpretação do artigo 39.º, n.º 5, do CIRC, publicada em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/legislacao/instrucoes_administrativas/Documents/SNC_Provisao_Garantias_Clientes.pdf, cujo teor se dá como reproduzido, em se refere, além do mais o seguinte:

8. Para efeitos do cálculo do limite que pode ser fiscalmente aceite nos termos do n.º 5, é necessário conhecer o histórico de encargos com garantias respeitantes a vendas e prestações de serviços, nos últimos três períodos de tributação.

9. A referência aos «últimos três períodos de tributação» permite considerar os dados do período em que se está a constituir ou a reforçar a provisão (ano N) e dos dois períodos anteriores (anos N-1 e N-2), uma vez que no final do período de tributação N são já conhecidas as vendas e as prestações de serviços desse período bem como os encargos suportados com garantias a clientes.

 

  1. A testemunha O... contactava clientes cujos créditos estavam em mora, tendo em vista concretizar as respectivas, apercebendo-se daqueles que estariam em situação de maiores dificuldades em efectuarem pagamentos, sobretudo pelo número de fornecedores que encontrava juntos desses clientes reclamando créditos (depoimento da testemunha O...);
  2. Relativamente a clientes que estavam em mora, a testemunha O... realizava diligências junto de notários e registos tendo em vista apurar se dispunham de património que pudesse assegurar o pagamento das dívidas, fornecendo as informações ao departamento financeiro da Requerente (depoimento da testemunha O...);
  3. A testemunha P..., na qualidade de Diretor Financeiro da Requerente fez várias diligências junto da empresa G..., Lda, tendo em vista a cobrança da dívida desta empresa cuja perda por imparidade foi registada em 2010 (depoimento da testemunha P...);
  4. A maior parte dos clientes da empresa que têm dívidas em mora são contactados com o fim de ser efectuado o pagamento pelo departamento financeiro de a que testemunha P... é Director, havendo alguns que são contactados directamente pela administração da Requerente (depoimento da testemunha P...);
  5. São feitas semanalmente listas de clientes com créditos em mora, que são contactados, em primeiro lugar, por carta ou email para efectuarem os pagamentos (depoimento da testemunha P...);
  6. Quando após primeiros contactos se constata que os pagamentos continuam atrasados, o departamento financeiro da Requerente vai às instalações dos clientes ou tenta agendar reuniões, para perceber o que se passa e procurar chegar a acordo (depoimento da testemunha P...);
  7. Um dos membros do departamento financeiro faz um relatório semanal com todos os contactos que fez e seus resultados (depoimento da testemunha P...);
  8.  Não são criadas provisões pela Requerente em relação a todas as dívidas que estão em mora há mais de 6 meses, mas só nos casos em que há indícios de que pagamento pode vir a não ser efectuado e não há perspectivas de vir a ser efectuado o pagamento, designadamente nos casos em que os clientes dão respostas evasivas, ou não apresentam qualquer proposta de acordo ou de forma de pagamento diferido (como letras ou cheques pré-datados), ou os casos em que constata que há muitos credores a aguardar pagamentos (depoimento da testemunha P...);
  9. A crise no sector da construção civil começou em 2007/2008 (depoimento da testemunha P...);
  10. Nos casos em que se vem a constatar que, após o registo das perdas imparidade, são efectuados pagamentos, as perdas são revertidas (depoimento da testemunha P...);
  11. A Autoridade Tributária e Aduaneira controla nas acções inspectivas relativas a exercícios subsequentes se são efectuadas as reversões das perdas por imparidade relativas a créditos que acabam por ser cobrados (depoimento da testemunha Q...);
  12. Relativamente as correcções que foram efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira em 2010, não aceitando perdas por imparidade, foram efectuadas correcções em anos posteriores favoráveis aos contribuintes, nos casos em que registaram reversão de perdas por imparidade ou foram apresentadas novas que no entender da Autoridade Tributária e Aduaneira justificam que se aceitem essas perdas (depoimento da testemunha Q...);
  13. Relativamente às facturas que não foram aceites por não existir mora há mais de 6 meses em 2010, as perdas por imparidade foram reconhecidas posteriormente, quando o fundamento da não aceitação é apenas a falta de decurso desse prazo (depoimento da testemunha Q...);
  14. Relativamente ao K..., o registo da imparidade foi efectuado por ter havido litígio judicial quanto ao pagamento de uma dívida, só sendo feito pagamento depois de esse litígio ter sido resolvido (depoimento da testemunha P...);
  15. A Requerente continuou a ser fornecedora de empresas relativamente à quais reconheceu existir risco de incobrabilidade de créditos vencidos, através do registo de perdas por imparidade, por entender que se deixasse de fazer fornecimentos consolidaria esse risco, passando a ter a certeza de que não efectuaria as cobranças anteriores e ser preferível continuar a possibilitar o funcionamento dessas devedoras, na expectativa de vir a contribuir para criar para essas empresas condições que lhes permitam fazer os pagamentos (depoimento da testemunha P...);
  16. Em 24-01-2018, o Requerente apresentou o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da matéria de facto

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

A matéria de facto prova baseia-se no Relatório da Inspecção Tributária e nos depoimentos das testemunhas O..., P... e Q..., que aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos sobre que depuseram.

Relativamente a cada uma das correcções indica-se a prova testemunhal relevante e a sua valoração.

 

3. Matéria de direito

 

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira realizou uma acção inspectiva à Requerente relativa ao exercício de 2010, de que resultaram várias correcções ao lucro tributável no valor global de € 2.428.879,94 (umas favoráveis e outras desfavoráveis à Requerente) e a liquidação de IRC n.º 2014... datada de 27-01-2014, no valor de € 957.768,65, incluindo € 79.590,94.

Das correcções efectuadas, a Requerente impugna no presente processo apenas as seguintes:

 

– Provisão para garantia de Clientes – Gastos do Período no valor de € 542.883,03;

– Perdas por imparidade de créditos no valor de € 2.713.252,11.

 

3.1. Questão da provisão para garantias de clientes

 

A Requerente constituiu no exercício de 2010 uma provisão para fazer face a encargos com garantias a clientes, que registou na conta de gastos "6721 - Provisões do período -garantias", no montante de € 1.554.487,30.

Este valor resultou da aplicação da percentagem de 2,1974% ao valor da faturação com garantia, de 2010 (€ 70.741.557,27).

A percentagem utilizada pela Requerente resulta da proporção entre (i) os gastos indicados nesse quadro como suportados com garantias em 2007, 2008 e 2009 e a (ii) faturação com garantia desses mesmos anos (2007, 2008 e 2009).

O artigo 39.º, n.º 5, do CIRC, estabelece que «o montante anual da provisão para garantias a clientes a que refere a alínea b) do n.º 1 é determinado pela aplicação às vendas e prestações de serviços sujeitas a garantia efectuadas no período de tributação de uma percentagem que não pode ser superior à que resulta da proporção entre a soma dos encargos derivados de garantias a clientes efectivamente suportados nos últimos três períodos de tributação e a soma das vendas e prestações de serviços sujeitas a garantia efectuadas nos mesmos períodos».

A Autoridade Tributária e Aduaneira entende que «últimos três períodos de tributação» relativos ao exercício de 2010 são o período em que se está a constituir ou a reforçar a provisão (ano 2010, neste caso) e dos dois períodos anteriores (2009 e 2008, neste caso).

Assim, a questão a apreciar é a de saber se se devem considerar-se como «últimos três períodos de tributação» para efeitos do n.º 5 do artigo 39.º do CIRC o exercício em que é feita a provisão e os dois antecedentes ou os três que antecedem o exercício em que é feita a provisão.

O alcance daquela referência aos «últimos três períodos de tributação» não é claro, como foi reconhecido pela própria Autoridade Tributária e Aduaneira, ao emitir a Circular n.º 10/2011 para esclarecer a sua interpretação.

Como foi referido pelas testemunhas inquiridas, a controvérsia entre a Requerente e a Autoridade Tributária e Aduaneira sobre esta questão tem vindo a ser mantida relativamente a vários exercícios, pelo que, considerando a actividade da Requerente na sua globalidade, os reflexos da divergência na tributação global da Requerente não serão significativos, pois todos os encargos com garantias de clientes são considerados para cálculo da percentagem, num ou noutro exercício.

Neste contexto, é de presumir que a Requerente adoptou de boa-fé a interpretação que fez (em sintonia com a regra que impõe o n.º 1 do artigo 75.º da LGT), pois esta é perfeitamente compatível com a letra da lei e até é sugerida pelo teor literal, já que, em relação a cada período de tributação, o período presente, os três últimos serão os três anteriores.

Por outro lado, a posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório da Inspecção Tributária baseia-se exclusivamente na Circular referida, cuja fundamentação não se afigura convincente.

Na verdade, é certo que, como se diz no ponto 8. da Circular referida, para efectuar o cálculo do limite da provisão que pode ser fiscalmente aceite, «é necessário conhecer o histórico de encargos com garantias respeitantes a vendas e prestações de serviços, nos últimos três períodos de tributação», mas, ao contrário do que se refere no seu ponto 9., não é seguro que corresponda sempre à realidade a afirmação de que «no final do período de tributação N são já conhecidas as vendas e as prestações de serviços desse período bem como os encargos suportados com garantias a clientes», pois é possível (se não mesmo provável) que ocorram atrasos na facturação.

Por outro lado, como bem nota a Requerente, a terminologia utilizada naquele ponto 9.º, ao dizer que «a referência aos «últimos três períodos de tributação» permite considerar os dados do período em que se está a constituir ou a reforçar a provisão (ano N) e dos dois períodos anteriores (anos N-1 e N-2)» inculca que se decidiu aceitar que se interprete o n.º 5 do artigo 39.º dessa forma, mas não impõe essa interpretação.

Isto é, o que resulta do texto do ponto 9. da Circular é que aceitará uma interpretação do contribuinte no sentido que refere, se o contribuinte a fizer, por o texto da lei ser com ela compatível (a permitir), mas não impõe que seja essa a interpretação a adoptar.

Assim, o único argumento em invocado na Circular n.º 10/2011 para sustentar a interpretação aí adoptada afigura-se não constituir fundamento sólido para a posição aí assumida.

Além disso, sendo de presumir, como se disse, que a Requerente actuou de boa-fé, ao fazer uma interpretação perfeitamente plausível do n.º 5 do artigo 39.º do CIRC, a Circular n.º 10/2011 nem sequer podia ser invocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente à fixação da matéria tributável referente ao exercício de 2010, pois apenas foi emitida em Maio de 2011, não estando em vigor no ano de 2010 em que se formou o facto tributário.

Na verdade, o n.º 2 do artigo 68.º-A da LGT (aditado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro), estabelece que «não são invocáveis retroactivamente perante os contribuintes que tenham agido com base numa interpretação plausível e de boa-fé da lei as orientações genéricas que ainda não estavam em vigor no momento do facto tributário».

Pelo exposto, esta correcção não tem fundamento legal, pelo que se justifica a anulação da liquidação, na parte que a tem como pressuposto, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável, por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

 

3.2. Questão das perdas por imparidade

 

A Requerente registou na conta 6511- Perdas por imparidade - Em dívidas a receber- Clientes o valor de € 3.710.199,20, relativamente a créditos sobre clientes que considerou estarem em situação de cobrança duvidosa e cujo saldo está registado na conta 218-Clientes de cobrança duvidosa.

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções no montante global de € 2.713.252,11 relativamente a estas perdas.

A Requerente aceita que possa ser acrescido ao lucro tributável o montante de 517.117,62 €, respeitante às correções realizadas aos clientes R..., S... e T..., não impugnando, nessa parte, a liquidação efectuada (artigo 49.º do pedido de pronúncia arbitral), mas discorda das restantes correcções, no valor de € 2.196.134,49, que sintetizou no seguinte quadro que consta do artigo 51.º do pedido de pronúncia arbitral:

O artigo 35.º, n.º 1, do CIRC estabelece, no que «podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes perdas por imparidade contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores» «relacionadas com créditos resultantes da actividade normal que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade».

O regime das perdas por imparidade em créditos aplicável no exercício de 2010 era estabelecido no artigo 36.º do CIRC nos seguintes termos:

 

 

Artigo 36.º

 

Perdas por imparidade em créditos

 

1 – Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo de insolvência e de recuperação de empresas ou processo de execução;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente;

c) Os créditos estejam em mora mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas objectivas de imparidade e de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento.

2 – O montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos referidos na alínea c) do número anterior não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora:

a) 25 % para créditos em mora mais de 6 meses e até 12 meses;

b) 50 % para créditos em mora mais de 12 meses e até 18 meses;

c) 75 % para créditos em mora mais de 18 meses e até 24 meses;

d) 100 % para créditos em mora mais de 24 meses.

3 – Não são considerados de cobrança duvidosa:

a) Os créditos sobre o Estado, Regiões Autónomas e autarquias locais ou aqueles em que estas entidades tenham prestado aval;

b) Os créditos cobertos por seguro, com excepção da importância correspondente à percentagem de descoberto obrigatório, ou por qualquer espécie de garantia real;

c) Os créditos sobre pessoas singulares ou colectivas que detenham mais de 10 % do capital da empresa ou sobre membros dos seus órgãos sociais, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1;

d) Os créditos sobre empresas participadas em mais de 10 % do capital, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1.

 

 

A exigência de provas objectivas de imparidade que se faz na alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º foi introduzida no CIRC pela redacção do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, não existindo na correspondente redacção anterior do artigo 35.º que, na alínea c) do n.º 1, referia quanto a este requisito da provisão para créditos de cobrança duvidosa apenas que «os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento».

O Decreto-Lei n.º 159/2009 concretizou a adaptação das «regras de determinação do lucro tributável às normas internacionais de contabilidade tal como adoptadas pela União Europeia, bem como aos normativos contabilísticos nacionais que visam adaptar a contabilidade a essas normas» (como se sintetiza no respectivo sumário).

Assim, não sendo incluído no CIRC qualquer conceito próprio de «provas objectivas de imparidade», a introdução deste conceito, utilizado nas normas contabilísticas sobre imparidade e incobrabilidade de activos financeiros, visou aplicar no âmbito das perdas por imparidade de créditos para efeitos de determinação do lucro tributável o conceito contabilístico, que é utilizado, nomeadamente, na IAS 39 e na NCRF 27.

De resto, por força do disposto no artigo 17.º, n.ºs 1 e 3, do CIRC, as regras de normalização contabilística são aplicáveis na determinação do lucro tributável, quando não há regras especiais deste Código que as afastem, pelo que também por esta via se conclui é de fazer apelo aquelas normas.

Nas referidas normas contabilísticas diz-se, além do mais, o seguinte, sobre esta matéria:

 

IAS 39

§ 59. Um activo financeiro ou um grupo de activos financeiros está com imparidade e são incorridas perdas por imparidade se, e apenas se, existir prova objectiva de imparidade como resultado de um ou mais acontecimentos que ocorreram após o reconhecimento inicial do activo (um «acontecimento de perda») e se esse acontecimento (ou acontecimentos) de perda tiver um impacte nos fluxos de caixa futuros estimados do activo financeiro ou do grupo de activos financeiros que possa ser fiavelmente estimado. Pode não ser possível identificar um único e discreto acontecimento que tenha causado a imparidade. Pelo contrário, o efeito combinado de vários acontecimentos pode ter causado a imparidade. As perdas esperadas como resultado de acontecimentos futuros, independentemente do grau de probabilidade, não são reconhecidas. A prova objectiva de que um activo financeiro ou um grupo de activos está com imparidade inclui dados observáveis que chamam a atenção do detentor do activo acerca dos seguintes acontecimentos de perda:

(a) significativa dificuldade financeira do emitente ou do obrigado;

(b) uma quebra de contrato, tal como um incumprimento ou relaxe nos pagamentos de juro ou de capital;

(c) o mutuante, por razões económicas ou legais relacionadas com as dificuldades financeiras do mutuário, oferece ao mutuário uma concessão que o mutuante de outra forma não consideraria;

(d) torna-se provável que o mutuário vá entrar em processo de falência ou outra reorganização financeira;

(e) o desaparecimento de um mercado activo para esse activo financeiro devido a dificuldades financeiras;

ou

(f) dados observáveis indicando que existe um decréscimo mensurável nos fluxos de caixa futuros estimados de um grupo de activos financeiros desde o reconhecimento inicial desses activos, embora o decréscimo ainda não possa ser identificado com os activos financeiros individuais do grupo, incluindo:

(i) alterações adversas no estado de pagamento dos mutuários do grupo (por exemplo, um número crescente de pagamentos atrasados ou um número crescente de mutuários de cartão de crédito que atingiram o seu limite de crédito e estão a pagar a quantia mínima mensal);

ou

(ii) as condições económicas nacionais ou locais que se correlacionam com os incumprimentos relativos aos activos do grupo (por exemplo, um aumento na taxa de desemprego na área geográfica dos mutuários, um decréscimo nos preços das propriedades para hipotecas na área relevante, um decréscimo nos preços do petróleo para activos de empréstimo a produtores de petróleo, ou alterações adversas nas condições do sector que afectem os mutuários do grupo).

 

NCRF 27

§ 25 – Evidência objetiva de que um ativo financeiro ou um grupo de ativos está em imparidade inclui dados observáveis que chamem a atenção ao detentor do ativo sobre os seguintes eventos de perda:

a) Significativa dificuldade financeira do emitente ou devedor;

b) Quebra contratual, tal como não pagamento ou incumprimento no pagamento do juro ou amortização da dívida;

c) O credor, por razões económicas ou legais relacionados com a dificuldade financeira do devedor, oferece ao devedor concessões que o credor de outro modo não consideraria;

d) Torne-se provável que o devedor irá entrar em falência ou qualquer outra reorganização financeira;

e) O desaparecimento de um mercado ativo para o ativo financeiro devido a dificuldades financeiras do devedor; ou

f) Informação observável indicando que existe uma diminuição na mensuração da estimativa dos fluxos de caixa futuros de um grupo de ativos financeiros desde o seu reconhecimento inicial, embora a diminuição não possa ser ainda identificada para um dado ativo financeiro individual do grupo, tal como sejam condições económicas nacionais, locais ou sectoriais adversas.

26 – Outros fatores poderão igualmente evidenciar imparidade, incluindo alterações significativas com efeitos adversos que tenham ocorrido no ambiente tecnológico, de mercado, económico ou legal em que o emitente opere.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu existirem várias anomalias no registo das perdas por imparidade que a Requerente efectuou, tendo esta aceitado algumas das correções efectuados e contestado outras.

A fundamentação comum à generalidade das correcções é essencialmente a seguinte:

(...) tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência do risco de incobrabilidade.

 

Esta fundamentação não se afigura aceitável em todos os casos, pois o facto de ser um cliente com habitualidade e a existência de fornecimentos no período de 2010 não implicam a inexistência de uma situação de «significativa dificuldade financeira» do devedor, à face das referidas regras contabilísticas, e esta significativa dificuldade é o primeiro dos possíveis fundamentos de imparidade indicados em ambas as normas transcritas para o reconhecimento da imparidade dos créditos.

Na verdade, afigura-se aceitável o entendimento, explicitado nos depoimentos das testemunhas O... e P..., de a Requerente optar por continuar a efectuar fornecimentos a empresas que estão em difícil situação financeira e com dívidas que justificam o reconhecimento de imparidades, correndo o risco de ver agravadas as dívidas mas permitindo às devedoras eventual recuperação financeira que lhe possibilite pagar a totalidade dos créditos, em vez de cessar esses fornecimentos, impedindo-lhes a recuperação e adquirindo de imediato a certeza da incobrabilidade dos créditos em mora.

Mas, havendo de fundamentação específica sobre cada uma das situações, importa apreciá-la separadamente, à luz da prova produzida e das regras contabilísticas referidas.

 

 

3.2.1. B..., S.A. (créditos no valor de € 14.605,81)

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não existem provas objectivas de imparidade, exigidas pela alínea c) do n° 1 do artigo 36° do CIRC, pelas seguintes razões:

O sujeito passivo já vem a considerar perdas por imparidade de créditos sobre este cliente, desde 2004, procedendo, quer a reforços, quer a reversão das mesmas, o que significa que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos. A IT procedeu ao acréscimo dos valores considerados como perdas nos períodos de 2006 e 2008.

A perda registada neste período reforça as perdas por imparidade acumuladas, registadas em períodos anteriores e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência do risco de incobrabilidade.

Não pondo em causa o referido anteriormente é de realçar que nas listagens que o sujeito passivo envia para o seu cliente está evidenciado que as faturas se vencem a 60 dias, pelo que nunca seria aceite fiscalmente a perda registada, relativa a documentos com data de emissão de 2010-04-30 ou posterior.

 

 

Relativamente às facturas com datas posteriores a 30-04-2010, é manifesto que, até ao final do exercício de 2010, não tinham decorrido os seis meses exigidos pela alínea a) do n.º 2 do artigo 36.º para permitir a relevância fiscal de perdas por imparidade, pois nas facturas referiu-se que o vencimento era a 60 dias.

Estão nestas condições as seguintes facturas desta empresa, no montante total de € 901,16:

 

 

 

 

 

Quanto às restantes facturas, a razão da não aceitação das imparidades pela Autoridade Tributária e Aduaneira é tratar-se de «um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores».

A testemunha O... referiu que, a partir de 2008 a B... começou a evidenciar problemas de pagamentos a fornecedores, acabando posteriormente por entrar em PER ( [1] ), que encontrava muitos fornecedores na recepção da empresa procurando receber créditos e que apurou que o seu património já estava onerado, inclusivamente por incumprimentos em relação à Administração Tributária.

A existência de dificuldades de pagamento pela B... foi confirmada pela testemunha P... .

Afigura-se que os factos referidos, designadamente a existência de muitas dezenas de créditos em incumprimento, alguns deles desde 2001, deixa transparecer o afluxo de credores à recepção da empresa, aliados à notória crise que afectava o sector da construção civil no ano de 2010, são reveladores de «significativa dificuldade financeira do devedor», à face das regras contabilísticas referidas, pelo que é de considerar demonstrada a existência de provas objectivas de imparidade, para efeitos da alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIRC.

O facto de a Requerente ter efectuado fornecimentos, apesar da situação de incumprimento, justifica-se pela expectativa de que viesse a empresa viesse a recuperar da situação de dificuldade financeira, não sendo suficiente para concluir que a Requerente não tinha razões para concluir que esta dificuldade na existia, designadamente à face das regras contabilísticas aplicáveis.

Assim, é julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à correcção no valor de € 13.704,65 referente às facturas em mora há mais de seis meses (€ 14.605,81 - € 901,16)

 

3.2.2. C..., Lda.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção no montante de € 190.055,59 quanto às perdas por imparidade registadas pela Requerente relativamente a créditos sobre esta empresa.

Relativamente a este cliente da Requerente, as facturas venciam-se a 30 dias, pelo que os créditos a que se referem faturas com datas até 31-05-2010 não estavam em mora há mais de 6 meses, pelo que não podiam ser considerados em imparidade, para efeitos fiscais, à face da alínea a) do n.º 2 do artigo 36.º.

Estão nestas condições as seguintes facturas, no valor global de € 568,59:

 

 

 

 

A justificação referida no Relatório da Inspecção Tributária para a Autoridade Tributária e Aduaneira não ter aceite as restantes perdas por imparidade é a seguinte:

 

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

 

Pelo que se referiu no ponto anterior, o facto de ser um cliente com habitualidade e a existência de fornecimentos no período de 2010 não implicam a inexistência de uma situação de «significativa dificuldade financeira», à face das referidas regras contabilísticas. Segundo a testemunha O..., tratava-se de cliente que aparentava boa-fé e entre «perder tudo» ou procurar «cobrar alguma coisa», possibilitando a actividade da empresa, optavam por esta alternativa.

Neste caso, havia já mais de quatro dezenas de facturas da Requerente em mora há mais de seis meses e a testemunha O... referiu quando se desloca à instalações desta empresa encontrava grande número de credores procurando receber os seus créditos e que não foi encontrado património desta empresa, o que justifica que a Requerente pudesse concluir pela existência dessa dificuldade.

Assim, procede o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção, com excepção das facturas em que a mora não era de mais de 6 meses, sito é, quanto ao montante de € 189.486,60 (€ 190.055,59 - € 568,59).

 

3.2.3.  D... S.A.

 

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção no montante de € 117.877,45 relativamente aos créditos da Requerente sobre esta empresa, pelas seguintes razões:

 

Da análise à prova das diligências efetuadas para recebimento dos créditos inerentes as faturas constantes do quadro acima, verificou-se que o sujeito passivo possui em arquivo uma impressão de mail, datado de 2010-12-06, pelo qual foi solicitado ao cliente a regularização de documentos vencidos em conta-corrente, cujo montante ascende a 571.423,62 EUR. É referido pelo sujeito passivo, que, desse montante, 373.593,50 EUR diz respeito a retenções.

Aquando da análise das diligências efetuadas em 2009, verificou-se que foi enviada uma primeira carta, onde foi solicitado o pagamento de 4.450.749,68 EUR, relativo a faturas emitidas entre 2008-06-30 e 2008-12-31, e uma segunda carta em que foi solicitado o pagamento de 1.881.793,04 EUR, relativo a faturas emitidas entre 2008-08-31 e 2009-09-30.

Considerando o referido, conclui-se que este cliente tem efetuado pagamentos, sendo grande parte do montante em dívida de 2010 resultado das retenções que o cliente faz, o que significa tratar-se de um montante que está em “aberto”, mas que não está em mora.

De referir ainda que, da análise do mail enviado pelo sujeito passivo ao cliente, constatou-se que:

 o prazo de vencimento das faturas é de 90 dias, pelo que as faturas constantes no quadro acima que têm data de emissão de 2010-04-30 e posteriores não estão em condições que permitam considerar a perda por imparidade, nos termos do artigo 36° do CIRC.

Na conta-corrente constam as notas de crédito n° 100026 e 100029, respetivamente de 2010-07-23 e 2010-07-31, ambas com o valor de 272.059,13 EUR, que anulam respetivamente as faturas n° 100294 (que consta no quadro acima) e 100432, pelo que nunca poderia ser considerada a perda por imparidade conforme foi calculada.

Por tudo o que foi descrito, conclui-se que se trata de um cliente com caráter de habitualidade, a quem o sujeito passivo efetuou fornecimentos em 2010 nas mesmas condições dos anos anteriores (mantém-se o prazo de vencimento de 90 dias) e que procedeu a pagamentos durante este ano.

Assim, e tendo em consideração que o simples facto de existir um mail a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

 

A testemunha O... referiu que houve várias tentativas de cobrança, e que os créditos estavam conexionados com o centro comercial ..., cujas obras estiveram paradas e só em 2016 ou 2017 foram retomadas, havendo a perspectiva de que o centro comercial já não iria abrir. Esta testemunha referiu que esta empresa suspendeu os pagamentos a todos os fornecedores e que, quando se deslocava à empresa, encontrava grande número de credores procurando receber os seus créditos.

A testemunha P... confirmou as dificuldades de pagamento por esta empresa.

Como se vê por este depoimento, não houve apenas um «simples facto de existir um mail a solicitar a regularização de conta-corrente» a justificar o risco de incobrabilidade, como se pressupôs no Relatório da Inspecção Tributária, pelo que esta correcção assenta em erro sobre os pressupostos de facto.

Por outro lado, à semelhança do que se referiu nos pontos anteriores, as circunstâncias referidas por esta testemunha justificam que se considere demonstrado o risco de incobrabilidade.

No entanto, constata-se que o prazo de vencimento das faturas era de 90 dias, pelo que apenas em relação a facturas com datas até 30-04-2010 se verificavam os 6 meses de mora referidos no n.º 2 do artigo 36.º do CIRC.

Assim, não podiam ser aceites perdas por imparidade relativamente aos seguintes créditos no valor global de € 68.329,27:

 

 

 

 

 

 

Pelo exposto, procede o pedido de pronúncia arbitral que a esta correcção, relativamente ao montante de € 49.548,18 (€ 117.877,45 - 68.329,27).

 

 

3.2.4. E..., SA.

 

 

A Requerente efectuou em 2010 um reforço da imparidade dos créditos sobre esta empresa, no montante de € 47.820,96.

A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a relevância fiscal desta perda por imparidade, com fundamentação idêntica à do caso anterior:

 

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra -o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

 

                  A testemunha P... que esta perda por imparidade foi registada por esta empresa não reconhecer a dívida para com a Requerente, havendo abundante correspondência sobre a matéria.

                  O não reconhecimento da dívida pelo devedor é um fundamento suficiente para concluir pela provável incobrabilidade.

                  Procede, assim o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção, no montante de € 47.820,96.

 

 

      3.2.5. F..., Lda.

 

                  A Requerente contabilizou no exercício de 2012 perdas por imparidade no montante de € 79.524,28, relativamente a créditos sobre esta empresa, reforçando perda por imparidade registada no período anterior.

                  A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou esta perda por imparidade com fundamentação idêntica à anterior:

 

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

                 

A testemunha O... referiu que fez várias tentativas de cobrança, deslocando-se ao escritório desta empresa, que começou a atrasar pagamentos com o início da crise.

Esta empresa veio a ser declarada insolvente, como referiu a testemunha P... .

Como se vê, não foi apenas o «simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente» que justificou o registo da perda por imparidade, pelo que esta correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto. O facto de a empresa ter vindo a ser declarada insolvente confirma que havia boas razões para duvidar da cobrabilidade da dívida.

Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção no montante de € 79.524,28.

 

 

3.2.6. G..., Lda.

 

                  A Requerente registou em 2010 perdas por imparidade de créditos sobre esta empresa no montante de € 151.654,07.

                  A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou esta perda por imparidade por ter constado que o endereço indicado nas cartas enviadas para esta empresa não corresponde à sua sede ou instalações. Por isso concluiu a Autoridade Tributária e Aduaneira «que efetivamente não foram realizadas diligências, ou pelo menos não se encontram comprovadas, uma vez que a morada constante das cartas não corresponde ao domicílio ou qualquer instalação da empresa».

                  A testemunha O... referiu esta empresa tem uma outra dívida de renda em atraso para com a Requerente, mas não referiu diligências de cobrança, para além das cartas que foram enviadas com endereço errado.

                  A testemunha O... referiu que houve lapso no envio da carta, mas foram realizados vários outros contactos com representantes da empresa referida, tendo em vista a cobrança.

                  Não há razão para duvidar deste depoimento, desde logo por que é perfeitamente normal que haja contactos deste tipo e não é imprescindível que haja contacto por carta. O que seria anormal, decerto, à face das regras da vida e da experiência comum é que em relação a uma dívida de montante elevado não houvesse qualquer contacto com a devedora tendo em vista obter a cobrança.

                  Por outro lado, a alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIRC exige provas «de terem sido efectuadas diligências», mas não limita os meios de prova, designadamente não exigindo prova documental, o que tem como corolário a possibilidade de utilização de qualquer meio de prova admitido em direito (artigo 72.º da LGT), inclusivamente testemunhal e através de presunções.

                  De qualquer forma, se se interpretasse a referência a «provas objectivas», que consta daquela alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIRC, como proibindo aos Tribunais a utilização de prova testemunhal e através de presunções, esta norma seria materialmente inconstitucional, por violação dos princípios do direito à tutela judicial efectiva e da proporcionalidade ( [2] ), já que não se pode afastar a possibilidade de existirem situações em que não seja possível prova documental e, por outro lado, nesta específica situação, nem sequer se trata de matéria que assuma relevância essencial a nível da definição dos direitos tributários que reclame especiais cautelas probatórias.

                  Neste contexto, tendo-se provado que foram realizadas diligências, a correcção em causa enferma de erro sobre os pressupostos de facto, ao pressupor que não foram realizadas diligências.

                  Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção no montante de € 151.654,07.

 

                   

 

3.2.7. H..., S.A.

 

                  A Requerente registou perdas por imparidade no montante de € 238.105,26.

                  As facturas venciam-se a 90 dias, pelo que não podiam relevar fiscalmente perdas relativas a facturas com datas posteriores a 31-03-2010, pois não se verificava em relação a estas o requisito da mora há mais de 6 meses previsto no n.º 2 do artigo 36.º do CIRC.

                  Estão nestas condições as seguintes facturas no montante global de € 84.798,47.

 

 

                  No que concerne as restantes perdas por imparidade, a fundamentação utilizada pela Autoridade Tributária e Aduaneira é a seguinte:

 

 

Assim, tratando-se de um cliente com diversos fornecimentos no decurso do período em análise, e atendendo a que mesmo nos fornecimentos realizados perto do fim do ano se mantêm as condições dos fornecimentos anteriores (prazo de vencimento de 90 dias), e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade), ficando apenas demonstrado que se trata de um cliente com um prazo de pagamento bastante dilatado.

 

                  A testemunha O... referiu várias tentativas de receber as quantias em causa, tendo acabado por receber imóveis, por dificuldades desta empresa em efectuar os pagamentos, mas esta solução foi concretizada depois de 2010.

                  A testemunha P... referiu que a obra a que se reporta esta dívida esteve suspensa, com suspensão de pagamentos e que só posteriormente vieram a chegar a acordo quanto a receber apenas parte da dívida e não em dinheiro, mas através de permuta de imóveis.

                  Também neste caso, não houve apenas «simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente» como fundamento do registo da imparidade, pelo que a correcção efectuada enferma de erro sobre os pressupostos de facto.

                  Procede, assim o pedido de pronúncia arbitral quanto ao valor de € 153.306,79 (€ 238.105,26 - € 84.798,47).

 

 

                  3.2.8 I..., ACE

                 

                  A Requerente registou perdas por imparidade no montante de € 49.481,57.

                  As facturas venciam-se a 30 dias, pelo que não podia relevar fiscalmente perda relativa à factura emitida em 30-06-2010, no montante de € 23.920,84, pois não se verificava em relação a estas o requisito da mora há mais de 6 meses previsto no n.º 2 do artigo 36.º do CIRC.

                  Quanto às restantes facturas, a fundamentação da Autoridade Tributária e Aduaneira é idêntica às anteriores: «o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade e que o cliente efetuou diversos pagamentos não se considera demonstrada a existência do risco de incobrabilidade».

                  A testemunha O... referiu que foi várias vezes tentar receber os créditos e não conseguiu e não foi encontrado património, por se tratar de um ACE.

                  A testemunha P... referiu que as empresas que integravam o ACE invocavam que não recebiam créditos que tinham a receber de Angola.

                  Assim, também neste caso, não houve apenas «simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente» como fundamento do registo da imparidade, pelo que a correcção efectuada enferma de erro sobre os pressupostos de facto, quanto ao montante de € 25.560,73 (€ 49.481,57 – 23-920,84).

 

                  3.2.9. J..., Lda

 

                  Foi registada em 2010 uma perda por imparidade no montante de € 67.561,18.

                  A Autoridade Tributária e Aduaneira fundamentou esta correcção da seguinte forma, em suma:

 

Analisando as listagens anexas as cartas enviadas, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010.

O sujeito passivo já considerou uma perda por imparidade de créditos deste cliente em 2008, e em 2009 procedeu a reversão de quase a totalidade da mesma.

Pelo referido podemos concluir que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos.

A perda registada neste período reforça a perda por imparidade registada anteriormente e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, nas mesmas condições dos anos anteriores, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

 

                  A testemunha P... referiu que esta era uma empresa pequena que atrasou bastante os pagamentos e que foram feitos vários contactos tendo em vista obter os pagamentos, tendo vindo depois a efectuá-los.

                  Tendo já sido registada uma perda por imparidade em 2008 que foi quase totalmente revertida em 2009, o que indicia que a empresa em causa efectua pagamentos, apesar de o fazer com atrasos, não são claras as razões por que em 2010 se concluiu pela existência de indícios de que não viria a pagar.

                  Assim, tem razão a Autoridade Tributária e Aduaneira ao entender que não se pode concluir que existissem provas objectivas de imparidade quanto a esta correcção, pelo que improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a este valor de € 67.561,18.

 

                  3.2.10. K..., S.A.

 

                 

                  A Requerente reforçou no período de 2010 perdas por imparidade no montante de € 26.725,90.

                  As facturas venciam-se a 30 dias, pelo que não podem ser aceites perdas por imparidade relativas às seguintes facturas, datadas de 30-06-2010, por não se verificar em relação a elas o requisito da mora há mais de 6 meses exigido pelo n.º 2 do artigo 36.º do CIRC:

 

 

                 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                  A testemunha P... referiu que o registo da imparidade foi efectuado por ter havido litígio judicial quanto ao pagamento da dívida, só sendo feito pagamento depois de esse litígio ter sido resolvido.

                  Como se vê pelo Relatório da Inspecção Tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira não considerou sequer a existência de litígio como fundamento da incobrabilidade, concluindo que «a K... S.A. é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, conforme estatutos constantes do Decreto-Lei n.° 192/2008 de 01 de outubro, pelo que não há risco de incobrabilidade dos créditos».

                  O não reconhecimento da dívida e a existência de litígio sobre ela são factos que objectivamente justificam que se conclua pela existência de risco de incobrabilidade.

                  Pelo exposto, não tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira aludido sequer à existência de litígio judicial em relação a dívida e sendo este um facto relevante para aferir da existência de risco de incobrabilidade, sua decisão naquele ponto enferma de de erro sobre os pressupostos de facto.

                  Pelo exposto, esta correcção efectuada relativamente a dívida do K..., S.A. enferma de vício de violação de lei, pelo que deve ser anulada, quanto à não aceitação das perdas por imparidade no montante de € 26.725,90, pelo que procede o pedido de pronúncia arbitral nesta parte.

 

                  3.2.11. L..., Lda.

 

 

                  A Requerente contabilizou no exercício de 2010 perda por imparidade no montante de € 29.451,89.

                  A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a relevância fiscal desta perda por imparidade pelos seguintes fundamentos:

 

No entanto o simples facto de existir uma carta a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade.

Pela análise do extrato contabilístico verifica-se que o sujeito passivo continua a efetuar fornecimentos para este cliente em 2010, sendo este um cliente habitual desde 2004. Verifica-se ainda que durante o ano de 2010 foram efetuados pagamentos no montante de 350.073,69 EUR.

Pelo referido concluímos que não há risco de incobrabilidade dos créditos.

 

 

                  A testemunha O... disse que houve alguns atrasos no ano de 2010, mas que não era normal esta empresa ter pagamentos em atraso, detinha património e mostrava vontade de resolver os pagamentos atrasados.

                  A testemunha P... referiu que esta empresa tinha constantemente atrasos significativos nos pagamentos, o que leva a concluir que pagava, embora com atraso.

                  Por outro lado, não houve litígios com esta empresa quanto a reconhecimento das dívidas (depoimento da testemunha P...).

                  Nestas circunstâncias afigura-se que não se pode concluir pela existência de provas de risco de incobrabilidade.

                  Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção de € 29.451,89.

 

 

                  3.2.12. M..., Lda.

                 

                  A Requerente contabilizou no exercício de 2010 perda por imparidade no montante de € 87.877,46.

                  A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a relevância fiscal desta perda por imparidade pelos seguintes fundamentos, em suma:

O sujeito passivo já vem a considerar perdas por imparidade de créditos deste cliente desde 2006, procedendo, quer a reforços, quer a reversão das mesmas, o que significa que o cliente tem caráter de habitualidade e que efetua pagamentos. A IT procedeu ao acréscimo dos valores considerados como perdas nos períodos de 2006, 2008 e 2009.

A perda registada neste período reforça as perdas por imparidade acumuladas, registadas em períodos anteriores, e incide sobre novos créditos.

Assim, tratando-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise, e tendo em consideração que o simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

 

                  A testemunha O... disse que foram realizadas várias diligências de cobrança sem êxito e que a empresa tinha património, mas tinha mais credores e «muita gente à porta» procurando cobrar créditos, acabando a empresa por ir para PER.

                  A testemunha P... confirmou as dificuldades de pagamentos por esta empresa e que se indiciava que o futuro desta empresa seria a insolvência.

                  Conclui-se deste depoimento que são errados os pressupostos em que Autoridade Tributária e Aduaneira assentou o seu entendimento subjacente a esta correcção, pois o registo da perda por imparidade não teve como fundamento o «simples facto de existirem cartas a solicitar a regularização de conta-corrente».

                  Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta correcção no montante de € 87.877,46.

 

 

                  3.2.13. N..., Lda.

 

                  A Requerente contabilizou no exercício de 2010 perda por imparidade no montante de € 1.095.393,05.

                  A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou a relevância fiscal desta perda por imparidade pelos seguintes fundamentos, em suma:

 

Analisando a listagem anexa à carta enviada, concluímos que o sujeito passivo efetuou diversos fornecimentos a este cliente em 2010.

A perda registada neste período reforça a perda por imparidade registada no período anterior e incide sobre novos créditos.

Concluímos tratar-se de um cliente com caráter de habitualidade, com fornecimentos no decurso do período em análise e, tendo em consideração que o simples facto de existir uma carta a solicitar a regularização de conta-corrente, por si só, não demonstra o risco de incobrabilidade, não se considera demonstrada a existência desse risco (de incobrabilidade).

 

 

                  Esta empresa tinha um contrato relativo à construção de um hospital (...) e contratou a Requerente para efectuar a obra. A ... entrou em processo de insolvência não cumprindo o contrato, o que levou a que a empresa não pagasse à Requerente (depoimentos das testemunhas O... e P...).

                  A empresa já tinha feito um investimento de cerca de 2 milhões de euros e só tinha como património o próprio edifício em que a Requerente fez a obra, que estava hipotecado. O processo esteve suspenso na U... cerca de 4 ou 5 anos, até se encontrar uma solução, que foi vender o imóvel à empresa V..., com novo financiamento para instalar este hospital (depoimento da testemunha P...).

                  A Requerente aceitou continuar a efectuar fornecimentos à N... com base no novo financiamento, depois de ter sido acordado que os pagamentos seriam directamente efectuados pela U... (depoimento da testemunha P...).

                  Ainda em 2018 não está paga a dívida à Requerente (depoimento da testemunha P...).

                  As circunstâncias referidas por estas testemunhas justificam que a Requerente tenha registado esta perda por imparidade, por não haver, em 2010, expectativas de cobrança da divida, sendo claro que o registo da perda por imparidade que não se baseou no «simples facto de existir uma carta a solicitar a regularização de conta-corrente», como entendeu a Autoridade Tributária e Aduaneira no Relatório da Inspecção Tributária.

                  Assim, esta correcção enferma de erro sobre os pressupostos de facto, pelo que procede o pedido de pronúncia arbitral, quanto a esta correcção no montante de € 1.095.393,05.

 

                  3.3. Conclusão sobre o vencimento nesta acção arbitral

 

                  Do exposto conclui-se o seguinte:

 

a) A Requerente tem razão quanto à correcção no valor de € 542.883,03, relativa a provisão para garantia de clientes;

b) A Requerente tem razão quanto aos seguintes montantes respeitantes às seguintes correcções relativas a perdas por imparidade de créditos:

 

– B..., S.A.: € 13.704,65;

– C..., Lda.: € 189.486,60;

– D...S.A.: € 49.548,18;

– E..., SA.: € 47.820,96;

– F..., Lda.: € 79.524,28;

– G..., Lda.: € 151.654,07;

– H..., S.A.: € 153.306,79;

– I..., ACE: € 25.560,73;

– J..., Lda: € 0;

– K..., S.A.: € 26.725,90;

– L..., Lda.: € 0;

– M..., Lda.: € 87.877,46;

– N..., Lda.: € 1.095.393,05.

 

 

3.4. Decisão do recurso hierárquico

 

A decisão do recurso hierárquico que manteve a liquidação impugnada, enferma dos mesmos vícios, pelo que se justifica a sua anulação, na parte correspondente às correcções consideradas ilegais.

 

                 

4. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às correcções e valores indicadas no ponto 3.3. deste acórdão;
  2. Anular a liquidação de IRC e juros compensatórios n.º 2014..., na parte em que tem como pressuposto aquelas correcções e valores indicados no ponto 3.3. deste acórdão;
  3.  Anular a decisão do recurso hierárquico na parte em que tem como pressuposto aquelas correcções e valores indicados no ponto 3.3. deste acórdão.

 

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º -A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 742.793,51.

 

Lisboa, 30-10-2018

Os Árbitros

 

 

 

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

 

 

 

(Rui Duarte Morais)

 

 

 

 

(Henrique Fiúza)

[vencido, com declaração anexa]

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO DE VENCIDO

A presente declaração é feita por não adesão à fundamentação do deferimento da aceitação como gasto fiscal da provisão para garantias a clientes e por não adesão à fundamentação e decisão que levam ao deferimento do pedido de pronuncia arbitral no que respeita aos gastos contabilizados a título de imparidades em créditos em mora sobre os clientes G..., Lda e K..., SA.

1 – Provisão para garantias a clientes

Com a introdução do novo sistema de normalização contabilística (SNC) foi criada uma norma contabilística e de relato financeiro (NCRF) específica para o tratamento das provisões: a “NCRF 21 – Provisões, passivos contingentes e activos contingentes”.

Desta norma decorre a necessidade de reconhecer obrigações que a empresa possa ter de vir a suportar no futuro com referência a vendas e a prestações de serviços com garantia realizadas no presente.

Em tal caso, os encargos a suportar devem ser estimados com fiabilidade e considerados como um passivo reportado à data do respectivo balanço.

Uma provisão é então um passivo incerto quer quanto ao momento concreto da ocorrência da obrigação, quer quanto à quantia necessária para fazer face a essa mesma obrigação.

Deste modo, a quantia a reconhecer na contabilidade a título de provisão deve corresponder à melhor estimativa do dispêndio exigido para suportar a obrigação presente, reportado à data do balanço.

A normalização contabilística não impõe limites à constituição de provisões, deixando às melhores artes da gestão a determinação do valor estimado dos encargos a suportar no futuro relacionados com vendas e prestações de serviços do presente.

Portanto, no caso da provisão para garantia a clientes, o gasto a contabilizar como gasto do exercício, deve corresponder ao valor estimado dos encargos a suportar no futuro correspondentes a vendas e prestações de serviços cobertas por garantia legal ou contratual, realizadas nesse exercício.

Num outro nível e com outros objectivos, dispõe o código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC) as regras a aplicar em termos fiscais.

Com vista a acautelar as receitas do imposto e evitar abusos por parte dos sujeitos passivos, o CIRC estabelece limites ao valor da provisão para garantias a clientes aceites como gasto para efeitos fiscais, determinando o seu artigo 39º que:

Artigo 39.º- Provisões fiscalmente dedutíveis

1 — Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões:

a)…

 b) As que se destinem a fazer face a encargos com garantias a clientes previstas em contratos de venda e de prestação de serviços;

5 — O montante anual da provisão para garantias a clientes a que refere a alínea b) do n.º 1 é determinado pela aplicação às vendas e prestações de serviços sujeitas a garantia efectuadas no período de tributação de uma percentagem que não pode ser superior à que resulta da proporção entre a soma dos encargos derivados de garantias a clientes efectivamente suportados nos últimos três períodos de tributação e a soma das vendas e prestações de serviços sujeitas a garantia efectuadas nos mesmos períodos.

As normas contabilísticas e as normas fiscais funcionam em dois planos e tempos distintos, tendo as primeiras reflexo na contabilização das operações e no apuramento de resultados (contabilísticos) e as segundas no processo de cálculo do lucro tributável (ou prejuízo fiscal) e dos impostos a liquidar e a pagar.

A contabilização das provisões é efectuada ao longo do período de tributação ou no final do mesmo, conforme opção dos órgãos de gestão dos sujeitos passivos. O tratamento fiscal das provisões é efectuada várias semanas ou meses depois do fim do período a que as contas se referem e é feita no âmbito da prestação de contas à Administração Tributária e Aduaneira (AT), fora da contabilidade e já depois dos resultados apurados e das contas fechadas.

Nesse processo de prestação de contas ao Fisco, têm de ser observadas as normas fiscais, mormente as disposições do CIRC no que toca ao apuramento do lucro tributável, da matéria colectável e do imposto a liquidar e a pagar.

E é apenas neste processo, e só na fase de apuramento do lucro tributável, que se torna necessário ter em consideração o que estipula o artigo 39º do CIRC e se torna necessário ver se o valor anual das provisões para garantias a clientes contabilizada como gasto no exercício ultrapassou, ou não, o limite estipulado no referido artigo.

No caso, por se tratar do exercício de 2010, sendo a prestação de contas ao fisco feita em Maio de 2011, só nessa data (ou algumas semanas ou meses antes) foi necessário saber qual o valor das vendas e das prestações de serviços cobertas por garantia (legal ou contratual) realizadas em 2010 com base nas quais deveriam ser calculados os limites da provisão. Também só nessa data foi necessário saber os dados dos últimos três anos referentes às vendas e às prestações de serviços feitas a coberto de garantia e dos encargos derivados de garantias a clientes efectivamente suportados nos últimos três períodos de tributação.

Sublinho o facto de a lei referir “os últimos três períodos de tributação” e não “os três períodos de tributação anteriores”.

Ora, estando-se em Maio de 2011 (ou algumas semanas ou meses antes) a calcular os impostos referentes ao exercício anterior e tornando-se necessário apurar os gastos com garantias suportados nos últimos três períodos de tributação, claro será de concluir que os dados a considerar serão os de 2010, 2009 e de 2008, por serem, à data do cálculo do limite da provisão aceite como gasto para efeitos fiscais, os últimos três períodos de tributação referidos na lei.

Esta interpretação da lei que aqui é feita, foi também a interpretação feita pela AT (à data DGCI), quando, para esclarecer eventuais dúvidas existentes quanto à interpretação e aplicação da lei por parte dos sujeitos passivos, emitiu a Circular nº 10/2011 de Maio desse ano, de acordo com o Despacho de 25 de Fevereiro de 2011 do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

Por considerar que a interpretação feita da lei transcrita para a referida circular é isenta de erros, designadamente, dos apontadas na presente Decisão Arbitral, não posso, em consciência fazer a minha adesão à fundamentação do deferimento do pedido de pronúncia arbitral no que diz respeito à provisão para garantias a clientes.

Contudo, embora se possa considerar-se perfeita no plano legal e técnico a Circular nº 10/2011, porque apenas foi emitida em Maio de 2011 e por isso não aplicável ao exercício de 2010 por força do nº 2 do artigo 68º-A da LGT, (mas aplicável aos exercícios de 2011 e seguintes) e porque a fundamentação das correcções fiscais efectuadas pela AT se basearam apenas nela, e ainda por se conceder que a Requerente possa ter actuado de boa-fé ao utilizar os dados de 2009, 2008 e 2007 para cálculo do limite da provisão aceite como gasto para efeitos fiscais, justifica-se a anulação da liquidação na parte que respeita à correcção fiscal da provisão para garantias a clientes.

Resumindo, embora não faça adesão à fundamentação usada na Decisão Arbitral, o facto de a AT só ter emitido a referida Circular para além do fim do período de tributação em causa, retira à fundamentação do acto a necessária legalidade, devendo por isso ser anulado.

2 – Imparidades em créditos sobre clientes

Até 31 de Dezembro de 2009 as actualmente designadas por “Imparidades em créditos sobre clientes”, eram chamadas de “Provisões para créditos de cobrança duvidosa”.

Com a entrada em vigor do Sistema de Normalização Contabilística (SNC), o legislador reviu várias disposições do código do IRC, adaptando-as às novas regras da contabilidade, e aproveitou para fazer pequenas correcções ao texto legal no sentido de eliminar focos de conflito entre os sujeitos passivos e o Estado, tornado mais clara a letra e o espírito da lei.

Uma das milimétricas alterações introduzidas com esse intuito, foi exactamente a respeitante à prova formal a apresentar no que respeita às tentativas de o credor receber do devedor os valores em dívida. Este tema era, até então, geradora de conflitualidade entre os contribuintes e o Fisco, levando a reclamações, recursos, impugnações e processos judiciais que gastavam recursos necessários a outros fins.

O artigo 34º do código do IRC em vigor até à data de entrada em vigor do SNC dispunha o seguinte:

Artigo 34º - Provisão para créditos de cobrança duvidosa

1 - Para efeitos da constituição da provisão prevista na alínea a) do nº 1 do artigo anterior, são créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade se considere devidamente justificado, o que se verificará nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou processo de execução, falência ou insolvência;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente;

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento. (sublinhado nosso)

2 - O montante anual acumulado da provisão para cobertura de créditos referidos na alínea c) do número anterior não poderá ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora:

a) 25 % para créditos em mora há mais de 6 meses e até l2 meses;

b) 50 % para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;

c) 75 % para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;

d) 100 % para créditos em mora há mais de 24 meses.

3 - Não serão considerados de cobrança duvidosa:

a) Os créditos sobre o Estado, regiões autónomas e autarquias locais ou aqueles em que estas entidades tenham prestado aval;

b) Os créditos cobertos por seguro, com excepção da importância correspondente à percentagem de descoberto obrigatório, ou por qualquer espécie de garantia real;

c) Os créditos sobre pessoas singulares ou colectivas que detenham mais de 10% do capital da empresa ou sobre membros dos seus órgãos sociais, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do nº 1;

d) Os créditos sobre empresas participadas em mais de 10% do capital, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do nº 1.

Com a entrada em vigor do SNC foram introduzidas diversas alterações no código do IRC, passando as “Provisões para créditos de cobrança duvidosa” a ser tratadas no artigo 36º sob a epígrafe “Imparidades em créditos sobre clientes”.

O artigo assim criado, entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2010 com o seguinte texto:

Artigo 36.º - Perdas por imparidade em créditos

1 — Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo de insolvência e de recuperação de empresas ou processo de execução;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente;

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas objectivas de imparidade e de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento. (sublinhado nosso)

2 — O montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos referidos na alínea c) do número anterior não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora:

a) 25% para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses;

b) 50% para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;

c) 75% para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;

d) 100% para créditos em mora há mais de 24 meses.

3 — Não são considerados de cobrança duvidosa:

a) Os créditos sobre o Estado, Regiões Autónomas e autarquias locais ou aqueles em que estas entidades tenham prestado aval;

b) Os créditos cobertos por seguro, com excepção da importância correspondente à percentagem de descoberto obrigatório, ou por qualquer espécie de garantia real;

c) Os créditos sobre pessoas singulares ou colectivas que detenham mais de 10% do capital da empresa ou sobre membros dos seus órgãos sociais, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1;

d) Os créditos sobre empresas participadas em mais de 10% do capital, salvo nos casos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1.

Do confronto entre as duas normas acima transcritas, pode concluir-se que, até 31 de Dezembro de 2009, para que a “provisão para créditos de cobrança duvidosa” sobre os créditos em mora fosse aceite como custo para efeitos fiscais, bastaria que “Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento”.

Ou seja, bastaria que tivessem passado mais de 6 meses sobre o vencimento dos créditos sem que tenham sido recebidos, isto é, que os créditos estivessem em mora, e que existissem provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento.

O legislador exigia a existência de provas de diligências para o seu recebimento, mas não referia que tipo de provas eram necessárias, daí se poder concluir que qualquer tipo de prova aceites em direito serviria aos fins desejados, nomeadamente a prova testemunhal.

Na nova versão da lei, o legislador passou a exigir mais aos sujeitos passivos: passou a exigir que houvesse provas objectivas de os créditos se encontrarem em imparidade e passou também a exigir que houvesse provas objectivas de que foram efectuadas diligências para o seu recebimento.

2.1 – Imparidades em créditos sobre a cliente G..., Lda.

A Autoridade Tributária e Aduaneira não aceitou esta perda por imparidade por ter constatado que o endereço indicado nas cartas enviadas para esta empresa não corresponde à sua sede ou instalações. Por isso concluiu a Autoridade Tributária e Aduaneira «que efetivamente não foram realizadas diligências, ou pelo menos não se encontram comprovadas, uma vez que a morada constante das cartas não corresponde ao domicílio ou qualquer instalação da empresa».

Afirma-se na Decisão Arbitral que não há razão para duvidar dos testemunhos de O... e de P... que afirmaram ter havido outras diligências de cobrança, afirmando-se também que “não é imprescindível que haja contacto por carta” e ainda que “a alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIRC exige provas «de terem sido efectuadas diligências», mas não limita os meios de prova, designadamente não exigindo prova documental”.

Terminando a fundamentação da decisão com “De qualquer forma, se se interpretasse a referência a «provas objectivas», que consta daquela alínea c) do n.º 1 do artigo 36.º do CIRC, como proibindo aos Tribunais a utilização de prova testemunhal e através de presunções, esta norma seria materialmente inconstitucional, por violação dos princípios do direito à tutela judicial efectiva e da proporcionalidade, já que não se pode afastar a possibilidade de existirem situações em que não seja possível prova documental”. (sublinhado nosso)

Ora, se antes eram exigidas provas de que foram efectuadas diligências para o recebimento dos créditos em mora – qualquer tipo de prova aceite em direito – desde 2010 passaram a exigir-se provas objectivas, não podendo nelas incluir-se a prova testemunhal, por, claramente, não caber dentro do conceito de provas objectivas.

Excepção poderia ser feita se a Requerente tivesse demonstrado ao tribunal que não foi possível obter prova objectiva de terem sido efectuadas diligências para o recebimento dos créditos em mora, caso em que o tribunal poderia aceitar a prova testemunhal.

Mas tal prova não foi feita.

Ora, exigindo a lei a apresentação de provas objectivas, porque a Requerente não as garantiu nem demonstrou a tribunal a impossibilidade de as obter, a prova testemunhal como único meio de prova não pode ser aceite por contrariar o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 36º do Código do IRC.

Pelo exposto, deveria o tribunal ter considerado improcedente o pedido de pronúncia arbitral no que respeita a esta correcção ao lucro tributável no valor de EUR 151.654,07.

2.2 – Imparidade em créditos sobre a cliente K..., SA.

No ponto 3.2.10 do projecto de Decisão Arbitral referente às perdas por imparidade em créditos sobre a K..., SA, pode ler-se:

“A testemunha P... referiu que o registo da imparidade foi efectuado por ter havido litígio judicial quanto ao pagamento da dívida, só sendo feito pagamento depois de esse litígio ter sido resolvido.

Como se vê pelo Relatório da Inspecção Tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira não considerou sequer a existência de litígio como fundamento da incobrabilidade, concluindo que «a K... S.A. é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, conforme estatutos constantes do Decreto-Lei n.° 192/2008 de 01 de outubro, pelo que não há risco de incobrabilidade dos créditos».

O não reconhecimento da dívida e a existência de litígio sobre ela são factos que objectivamente justificam que se conclua pela existência de risco de incobrabilidade.

Pelo exposto, não tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira aludido sequer à existência de litígio judicial em relação a dívida e sendo este um facto relevante para aferir da existência de risco de incobrabilidade, sua decisão naquele ponto enferma de erro sobre os pressupostos de facto.”

O relatório da Inspecção Tributária que está na base do pedido de pronúncia arbitral não refere - nem podia referir - qualquer relação das imparidades em apreciação com qualquer eventual litígio judicial, porque as únicas imparidades que estão em causa são as imparidades sobre créditos em mora há mais de seis meses.

Ao longo das páginas 11, 12 e 13 do RIT são tratadas, sempre e só, as imparidades em créditos em mora. E as imparidades em créditos em mora são distintas das imparidades em créditos reclamados judicialmente e das imparidades em créditos cujo devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização, etc.

São distintas umas das outras e têm regras distintas para a determinação do valor aceite como gasto para efeitos fiscais.

E as correcções fiscais em discussão no presente processo são exclusivamente referentes a imparidades em créditos em mora.

Ora, se o que se discute é a aceitação ou não das imparidades de créditos em mora, está fora do contexto a discussão de imparidades sobre créditos em litígio judicial, por não enquadramento na respectiva norma fiscal.

É que, nem a AT no relatório da IT mencionou qualquer correcção das imparidades em créditos em litígio judicial, nem a Requerente, na reclamação graciosa, no recurso hierárquico ou no pedido de pronúncia arbitral e nas alegações finais pediu que lhe fosse aceite como gasto as imparidades em créditos em litígio judicial.

O tema das imparidades sobre créditos em litígio judicial só apareceu com o testemunho de P..., nunca sendo mencionado no relatório da IT, nem nos diversos meios de defesa utilizados pela Requerente.

E não pode o tribunal dar à Requerente aquilo que a Requerente não pediu. E não se diga que, porque a testemunha disse o que disse, tal equivale ao pedido da Requerente.

Além disso, para que uma perda por imparidades em créditos possa ser aceite para efeitos fiscais, ela tem de estar prevista numa das alíneas do nº 1 do artigo 28º-A do CIRC.

E, claramente, as imparidades em créditos em litígio judicial de per si não cabe em nenhuma das alíneas do nº 1 do artigo 28º-A do CIRC.

Sendo claro que a Requerente não pediu na reclamação ordinária, no recurso hierárquico nem no pedido de pronúncia arbitral, que lhe fosse aceite como gasto fiscal a imparidade em créditos em litígio judicial, não pode, agora, o tribunal dar-lhe aquilo que ela não pediu.

E tendo sido a provisão constituída sobre créditos em mora, não pode o tribunal declarar aceite como gasto a provisão constituída sobre créditos vencidos há menos de 6 meses, como é o caso.

Pelos motivos expostos, entendo que não deve a imparidade em créditos sobre a K..., SA vencidos há menos de 6 meses ser considerada como gasto para efeitos fiscais, motivo pelo qual, não posso também neste aspecto aderir à presente Decisão Arbitral.

 

Henrique Fiúza

(Economista)

 

 



[1] Plano Especial de Revitalização introduzido nos artigos 17-º-A a 17.º-I do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas pela Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril.

[2] Como já entendeu o Tribunal Constitucional, através de acórdão com força obrigatória geral (acórdão do TC n.º 759/2013, de 30-10-2013, publicado no Diário da República, Série I de 18-11-2013), a propósito da restrição probatória prevista no n.º 3 do artigo 146.º-B do CPPT.