Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 335/2019-T
Data da decisão: 2020-01-08  IRC  
Valor do pedido: € 52.788,50
Tema: Imposto sobre o Rendimento das pessoas Coletivas (IRC) - majoração de quotizações; tributação autónoma; despesas não documentadas; despesas de representação.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

1.            A..., S.A., contribuinte n.º..., com sede na Av. ..., n.º..., ..., ...-... Lisboa, doravante designada por “Requerente”, veio requerer, ao abrigo do disposto no artigo 11.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro, a constituição de Tribunal Arbitral.

2.            A Requerente pretende a anulação do despacho proferido em 08/04/2009 e consequentemente a anulação da liquidação adicional de IRC n.º 2006..., referente ao exercício de 2003, no montante de €52.788,50 e respetivos juros compensatórios, e a condenação da Requerida ao reembolso do imposto já pago pela Requerente, na parte correspondente às correções impugnadas, no valor de €52.788,50, acrescido de juros indemnizatórios.

3.            É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante designada somente por “Requerida” ou “AT”).

4.            O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD em 13/05/2019.

5.            A Requerida foi notificada da apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral em 15/05/2019.

6.            O signatário foi designado como árbitro, pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do RJAT, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

7.            Em 01/07/2019 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11.º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

8.            Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 22/07/2019.

9.            A Requerente fundamentou o pedido de pronúncia arbitral nos seguintes termos:

a)            A Requerente entende que algumas das correções propostas pela DSIT, consubstanciadas na liquidação adicional de IRC n.º 2006 ... e admitidas como válidas pelo despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada, estão feridas de ilegalidade;

b)           No relatório de inspeção tributária foi feita uma correção à dedução declarada no campo 234, do quadro 07, da declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC, apresentada pela requerente com referência ao exercício de 2003, no montante de €27.933,96, correspondente à majoração de 50% dos documentos referentes a quotizações respeitantes à B...;

c)            De acordo com o entendimento das Autoridades Tributárias “somente a factura n.º 200307, no valor de € 14.190,92, é que dizia respeito a quotas estatutárias, pelo que, a majoração efectuada contraria o disposto no n.º 1 do art. 41.º do CIRC, pois este artigo estabelece que só são aceites como custo em 150% as quotizações pagas “em conformidade com os estatutos” (...) as restantes quotizações dizem respeito a quotas suplementares”;

d)           Veio posteriormente tal entendimento a ser sufragado pelo despacho que indeferiu a reclamação graciosa apresentada pela Requerente;

e)           Tal como se refere no relatório que fundamentou o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, existe uma clara divergência na interpretação dada pela Administração Fiscal e pela aqui Requerente à norma contida no art. 41.º do CIRC, em vigor à data dos factos, em especial no que toca ao respetivo âmbito de aplicação;

f)            A AT sustenta que as denominadas “quotas suplementares” pagas pela requerente à B..., no valor de € 20.788,50, não usufruem do benefício fiscal de majoração do respetivo custo previsto no art. 41.º/1 do CIRC, em vigor à data dos factos, uma vez que não são exigidas pelos respetivos estatutos;

g)            Parece, pois, defender a AT que o âmbito de aplicação do disposto no art. 41.º do CIRC, em vigor à data dos factos, apenas abrange as “quotas regulares/ordinárias”, pois que, apenas estas seriam devidas pelo sujeito passivo “em conformidade com os estatutos”;

h)           A Requerente discorda de tal entendimento, considerando que o mesmo assenta numa errada e precipitada interpretação da norma contida no art. 41.º, n.º 1 do CIRC, em vigor à data dos factos;

i)             A AT não avança com qualquer argumentação suficiente, precisa e concreta suscetível de sustentar a sua posição, limitando-se a tecer considerações de teor abstrato e conclusivo;

j)             Tal como resulta do artigo 11.º, n.º 1 da LGT “na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e os princípios gerais de interpretação e aplicação das leis”;

k)            Nesta medida, deverá fazer-se apelo às regras comuns plasmadas no artigo 9.º do Código Civil, nos termos do qual “a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”;

l)             De acordo com a redação do artigo 41.º, n.º 1 do CIRC, aplicável à data, “é considerado custo ou perda do exercício, para efeitos de determinação do lucro tributável, o valor correspondente a 150% do total das quotizações pagas pelos associados a favor das associações empresariais em conformidade com os estatutos”;

m)          Uma vez interpretada literal, sistemática e teleologicamente a norma contida no art. 41.º, n.º 1 do CIRC, em vigor à data dos factos, sempre terá de se concluir que o benefício fiscal em apreço é aplicável ao total das quotizações pagas pelos associados a favor de associações empresariais, desde que sejam realizadas em conformidade com os respetivos estatutos, independentemente da sua natureza ordinária/corrente ou suplementar/extraordinária;

n)           No caso dos presentes autos, não pode deixar de se considerar que a quota suplementar paga pela Requerente, no valor de € 20.788,50, respeitou na integra os estatutos da B..., devendo, como tal, usufruir do benefício fiscal de majoração do respetivo custo;

o)           A Requerente considera, portanto, que não existe base legal para que subsista a correção em apreço, referente à não aceitação da majoração dos custos associados a quotizações enquadráveis no art. 41.º do CIRC, em vigor à data dos factos, no montante de € 20.788,50, pagas a associações profissionais, as quais, não obstante o respetivo carácter suplementar/extraordinário, não deixam de estar em conformidade com os seus estatutos e consubstanciar, de igual modo, quotas pagas a associações empresariais;

p)           Conclui a Requerente que o despacho impugnado se encontra ferido do vício de violação de lei por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 41.º/1 do CIRC, em vigor à data dos factos, devendo, em consequência, ser anulada parcialmente a liquidação de IRC/2003, n.º 2006...;

q)           A Requerente considerou como custo a oferta de cheques viagem a 10 dos seus funcionários, a título de reconhecimento pelo seu excecional desempenho no exercício de funções, no valor de € 32.000;

r)            No âmbito da inspeção tributária efetuada pela DSIT foi considerado tal encargo como “despesa não documentada” e consequentemente sujeita a tributação autónoma à taxa de 50%;

s)            Considerou a DSIT não ter ficado provado que os cheques foram, de facto, oferecidos ou mesmo que, a serem oferecidos, o tenham sido a colaboradores da requerente. Mais referiu que a "(...) a troca dos 32.000 euros, por cheques-viagem no mesmo valor, não constitui, naquele momento, como despesa para o contribuinte. De facto, esta ainda não se realizou. Este pagamento só se vai configurar como despesa, no momento em que se suporta o encargo, quando se oferece/adquire a viagem, só aí o pagamento efectuado se assume como uma despesa para o contribuinte e simultaneamente como encargo”;

t)            Não concordando com a correção proposta, contestou a Requerente, em sede de reclamação graciosa, a consideração dos mencionados encargos como despesas não documentadas e consequentemente a sua sujeição a tributação autónoma à taxa de 50% (correspondente ao montante de € 16.000);

u)           Não foi, todavia, acolhida pela AT a argumentação expendida pela Requerente, podendo ler-se da informação em que se baseou o despacho de indeferimento da reclamação graciosa que "(...) deve aquela aquisição com os cheques-viagem ser considerada como não documentada, e deste modo, a correcção efectuada não nos merece qualquer reparo";

v)            Sustenta a AT (na sequência do entendimento já vertido no relatório de inspecção tributária) que “(...) destinando-se os cheques-viagem à aquisição de um produto a ser usufruído por um determinado número de colaboradores, o custo não será a despesa com os cheques-viagem mas a sua concretização", ou seja, "(...) só a aquisição do produto final - a viagem – comprovada pelo respectivo documento, com a identificação do seu beneficiário (...) poderia ser considerada custo para efeitos fiscais e assim retiraria à despesa em causa, a natureza de "despesa não documentada”;

w)          A Requerente manifesta a sua discordância face a um tal entendimento, contestando quer a não dedução do custo, quer a sujeição a tributação autónoma;

x)            Dispunha o artigo 42.º, n.º 1, alínea g) do CIRC, na redação então vigente, que não são dedutíveis os “encargos não devidamente documentados e as despesas de carácter confidencial”;

y)            O conceito de “encargo não devidamente documentado” foi objeto de precisão pelo STA no seu acórdão de 16/02/00, tendo este Tribunal superior reafirmado a posição nos termos da qual tal expressão se deve interpretar como sendo sinónima da expressão “encargos não documentados nos termos da lei”;

z)            Por acórdão proferido pelo STA em 23/03/1994, veio este Tribunal Superior salientar que, nos casos em que a contabilidade do contribuinte é aceite como "sã” pelo Fisco, para que um custo se tenha como "comprovado” basta que o respetivo documento de suporte conste da contabilidade do sujeito passivo e que do mesmo resulte a natureza, finalidade e destinatário da despesa;

aa)         De acordo, ainda, com a jurisprudência firmada no acórdão do STA, de 05/07/00, “a apreciação da existência ou não da devida documentação e da confidencialidade da despesa é feita, tendo por objecto o acto através do qual o sujeito passivo suporta o encargo ou a despesa que é susceptível de afectar o resultado líquido do exercício, para efeitos de determinação da matéria tributável de IRC”;

bb)         Conclui o mencionado acórdão que, “estando documentadas as despesas com a aquisição de objectos para serem oferecidos, não pode atribuir-se àqueles a qualificação de despesas de carácter confidencial, por ser desconhecida a sua natureza, origem e finalidade. Sendo que “o desconhecimento da identidade das pessoas que receberam os objectos oferecidos ou a confidencialidade de ofertas efectuadas com objectos adquiridos, não implica a confidencialidade das despesas efectuadas para os adquirir e é a confidencialidade destas que está prevista na alínea h) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC como obstáculo à sua consideração para efeitos de determinação do lucro tributável”;

cc)          Tomando em consideração o caso concreto em apreço, cumpre, desde logo, fazer realçar que a figura do cheque-viagem não comporta qualquer semelhança com os denominados “cheques-auto” cuja utilização foi, em tempos, usada por diversos sujeitos passivos;

dd)         A tributação autónoma dos cheques-auto e tickets-refeição tem assentado num mesmo princípio, qual seja o de que a fatura de aquisição de um cheque-auto ou ticket-refeição não constitui a transmissão de quaisquer bens ou serviços, tratando-se tão somente da aquisição de um meio de pagamento (dinheiro);

ee)         Essa mesma transmissão apenas ocorrerá quando o cheque-auto ou ticket-refeição for apresentado para pagamento de combustível ou serviços de restauração. É nesse momento que deve ser emitida a correspondente fatura;

ff)           Já no cheque-viagem (como sucede no caso em apreço) acontece precisamente o contrário, isto é, o facto gerador do custo consubstancia-se na própria oferta e não já na realização da viagem (sendo que cabe ao beneficiário da oferta a decisão de usufruir ou não da mesma);

gg)         O momento de aquisição dos cheques-viagem configura o momento da criação do encargo para efeitos jurídicos, contabilísticos e fiscais na esfera do sujeito passivo de IRC;

hh)         No caso dos autos, os cheques-viagem foram adquiridos pela Requerente, destinando-se a premiar o desempenho excecional dos seus funcionários;

ii)            Os beneficiários indicados pela requerente poderiam posteriormente dirigir-se a um balcão daquela agência e solicitarem – junto da mesma – a prestação do serviço de viagem e/ou alojamento;

jj)           O serviço (viagem e/ou alojamento) foi adquirido pela Requerente – enquanto destinatária da despesa – junto do respetivo prestador, não existindo qualquer outro fornecedor, tendo sido emitida uma única fatura;

kk)         Daí que não possa deixar de se considerar que o custo se encontra suportado pela fatura emitida pelo prestador de serviços e ocorreu no momento em que a oferta foi atribuída. O facto gerador do custo é a oferta e nunca poderia ser a realização da própria viagem, pois essa decisão ficou nas mãos do beneficiário;

ll)            Não existe qualquer faturação posterior, nem tão pouco houve lugar à emissão de qualquer outro documento (para além da fatura inicialmente emitida pela agência de viagens a favor da requerente e que esta cuidou de entregar às autoridades fiscais no decurso da ação de inspeção);

mm)      É a própria AT que, em sentido inverso ao agora revelado, tem considerado como “devidamente documentado” o encargo adveniente do pagamento àquela agência de viagens relativo a viagens a serem usufruídas por seus colaboradores, mediante apresentação da fatura emitida por aquele prestador de serviços;

nn)         As faturas emitidas pela agência de viagens não variam em função das pessoas que irão usufruir das viagens adquiridas pela Requerente. Do mesmo modo que a não dedutibilidade fiscal dos custos incorridos com a aquisição de viagens oferecidas a colaboradores não se confunde com a validade fiscal do correspondente documento de suporte;

oo)         Outra conclusão não poderá extrair-se que não seja a de que o encargo decorrente dos cheques-viagem se encontra devidamente suportado pela fatura emitida, a 22 de dezembro de 2003, não assumindo tal despesa a natureza de "encargo não documentado” ou “despesa confidencial” e, como tal, não sujeita a tributação autónoma;

pp)         Donde resulta que incorreu o despacho de indeferimento da reclamação graciosa e, bem assim, a liquidação adicional de IRC n.º 2006..., no vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 42.°, n.º 1, alínea g) e 81°, n.º 1 do CIRC (na redação então vigente);

qq)         De acordo com o relatório de inspeção tributária foi considerado pela DSIT que “os encargos deduzidos (...) dizem respeito a despesas suportadas com (...) recepções no valor de 280.634,45 euros e com viagens no valor de 137.982,00 euros, oferecidas a clientes ou a fornecedores ou a quaisquer outras entidades. Ora estas configuram despesas de representação, nos termos do n.º 7 do artigo 81° do Código do IRC e, como tal, estão sujeitas a tributação autónoma em IRC”;

rr)           Por discordar do entendimento propugnado pela AT veio a Requerente contestar a sujeição a tributação autónoma das importâncias de € 280.634,45 e € 137.982,00 referentes, respetivamente, a receções e viagens;

ss)          Todavia, não foram atendidas as razões invocadas pela Requerente em sede de reclamação graciosa, podendo ler-se da informação em que se baseou o despacho de indeferimento que “(...) atentos às alegações da Reclamante, quer no âmbito da acção inspectiva, quer agora em sede de reclamação, e aos fundamentos defendidos pelos serviços de inspecção parece-nos concluir pela legalidade da correcção efectuada”;

tt)           Não cuidou, todavia, a AT de fundamentar, através da invocação de um qualquer argumento jurídico, a justeza da interpretação efetuada por parte dos serviços de inspeção tributária do artigo 81.º, n.º 6 do CIRC, aplicável à data, limitando-se a transcrever este preceito legal;

uu)         Daí a Requerente considerar que tal decisão administrativa enferma do vício de forma por deficiência de fundamentação, sendo, como tal, passível de anulação (cfr. art. 60.º, n.º 7 da LGT);

vv)         Sem conceder, entende a Requerente que a AT incorreu numa errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 81.º, n.º 6 do CIRC, aplicável à data;

ww)       Regia o artigo 81.º, n.º 6 do CIRC, na redação então vigente, que “consideram-se despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades”;

xx)         Contrariamente ao sustentado pela AT, as despesas em causa não deverão ser subsumidas ao conceito de “despesas de representação”, mas antes consideradas como encargos de publicidade, não podendo, como tal, ser objeto de tributação autónoma;

yy)         O artigo 3.º, n.º 1 do Código da Publicidade (aprovado pelo D.L. n.º 330/90, de 23/10) considera como publicidade "(...) qualquer forma de comunicação feita por entidades de natureza pública e privada, no âmbito de uma actividade comercial, industrial, artesanal ou liberal, com o objectivo directo ou indirecto de: a) promover, com vista à comercialização ou alienação quaisquer bens ou serviços; b) promover ideias, princípios, iniciativas ou instituições”;

zz)          Por sua vez, o n.º 1 do artigo 4.º do mesmo diploma legal, enuncia o conceito de actividade publicitária como sendo “o conjunto de operações relacionadas com a difusão de uma mensagem publicitária junto dos seus destinatários, bem como as relações jurídicas e técnicas daí emergentes entre anunciantes, agências de publicidade e entidades que explorem os suportes publicitários ou que exerçam a actividade publicitária”;

aaa)       De acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, incluem-se entre as operações referidas no n.º anterior, designadamente, “as de concepção, criação, produção, planificação e distribuição publicitárias”;

bbb)      Cabe assim, neste conceito, o evento realizado para difusão de uma mensagem destinada a informar os clientes acerca da existência e qualidades de um novo produto, com o objetivo de aumentar as vendas, que foi precisamente o que sucedeu no caso em apreço;

ccc)        A organização dos eventos de apresentação dos novos combustíveis foi levada a cabo por uma empresa especializada para o efeito;

ddd)      A requerente considera que as alegadas despesas suportadas com os referidos eventos mais não se traduziram do que numa campanha publicitária efetuada pela empresa para lançamento de novos produtos e serviços de valor acrescentado e a preços competitivos tendo, consequentemente, em vista a realização de operações tributáveis;

eee)      Também assim o considerou a AT, em sede de IVA, tendo afirmado que “serão de aceitar as deduções de IVA no montante de € 21.827,11, referente aos custos referentes a material de publicidade (€ 18.217,11) e coordenação do evento (€ 3.610) por se considerar que estes custos são encargos normais da actividade de exploração nos termos do disposto no art. 19.º e 20.º do CIVA)";

fff)         Ou seja, a AT aceitou que as despesas de publicidade e coordenação de eventos, no valor total de € 114.879,50, eram dedutíveis em sede de IVA, por não se subsumirem ao conceito de despesas de representação, o que se traduziu num IVA dedutível total de € 21.827,11;

ggg)       Se é certo que o IRC e o IVA não comungam da mesma natureza, a verdade é que a natureza dos custos não se altera de acordo com a perspetiva em que os estamos a analisar, sob pena de incorrermos numa inultrapassável contradição jurídica;

hhh)      Assim, entende a Requerente que a correção promovida ao exercício de 2003, com referência ao assunto em apreço, deverá ser anulada em € 6.892,77, valor este que corresponde à aplicação da taxa de tributação autónoma de 6% ao total das despesas de € 114.879,50;

iii)           Foi igualmente corrigido o imposto, no montante de € 8.278,92, relativo ao exercício de 2003, correspondente à despesa relativa a uma viagem ao México, a qual foi contabilizada, pela requerente, como “Publicidade e Propaganda”;

jjj)          Tão pouco relativamente a esta questão em particular merece acolhimento a posição tomada pela AT, tendo esta incorrido numa errada interpretação e aplicação do disposto no art. 81°, n.° 6 do CIRC (vigente à data);

kkk)       Entende a Requerente que a despesa relativa à viagem ao México oferecida a clientes encontra pleno enquadramento no âmbito da política comercial desenvolvida, associada à promoção dos seus produtos, sendo que, através da referida viagem a Requerente pretendeu reforçar o posicionamento da sua marca num mercado extremamente competitivo;

lll)           A informação vinculativa n.º 530/2001, de 5 de julho, emitida pela Direção de Serviços do IRC, vem afirmar que a oferta de viagens não configura uma despesa de representação;

mmm)  Considera igualmente a Requerente que a despesa resultante da aquisição e oferta da referida viagem constitui uma despesa normal de exploração da sua atividade, não se enquadrando consequentemente no disposto no n.º 6 do art. 81.º do CIRC, vigente à data, razão pela qual deverá ser anulada a correção promovida ao exercício de 2003, com referência ao assunto em apreço, no montante de €8.278,92.

10.          A Requerida apresentou Resposta, na qual se defende por impugnação, sustentando a improcedência do pedido de pronúncia arbitral com base nos seguintes argumentos:

a)            Conforme reiterado em sede de procedimento inspetivo e no âmbito da reclamação graciosa, os pagamentos suportados pela Requente e as denominadas “quotas suplementares” não são exigidos pelos estatutos da B... e, nesse desiderato, não são suscetíveis de aproveitar o benefício fiscal consignado no Art.º 41.º, n.º 1, do CIRC;

b)           Pese embora a Requerente referir que as quotizações suplementares se encontram estabelecidas nos Estatutos da Associação, não procedeu à junção de qualquer elemento probatório, quando tal ónus se lhe impunha e a isso estava adstrita, nos termos e para os efeitos no Art.º 342.º do CC;

c)            No documento que originou a contabilização das quotas suplementares foi liquidado IVA, entendendo assim a Associação que se trata de uma prestação de serviços sujeita a IVA e dele não isenta;

d)           Se a própria associação considerou as quotas suplementares sujeitas a IVA, consequentemente não considerou uma despesa enquadrável nos termos do n.º 21.º do então Art.º 21.º do CIVA, isenta de IVA;

e)           No que diz respeito aos cheques-viagem, resulta do procedimento administrativo que a Requerente, no âmbito da demonstração do custo, não carreou quaisquer elementos demonstrativos e de prova que clarificassem que suportou aquele custo com vista a premiar os seus colaboradores;

f)            A Requerente não identificou os funcionários que foram objeto desses prémios, bem como a comprovação da sua entrega a esses colaboradores;

g)            A Requerente também não carreou prova acerva da demonstração de que aquele custo foi considerado na comunicação de rendimentos consignada no disposto no Art.º 119.º do CIRS, quanto aos rendimentos auferidos no ano de 2003, bem como para efeitos de retenção na fonte;

h)           A Requerente não fez prova através de documento no qual constasse as condições dessa oferta;

i)             O requisito da indispensabilidade para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, estabelecido no Art. 23.º do CIRC, constitui factor essencial circunscritor da dedutibilidade fiscal dos custos, o que implica a insuficiência, para tal efeito, da mera conexão formal e relevação contabilística do custo;

j)             Para que os encargos suportados sejam aceites como custo fiscal é necessário que os mesmos preencham três requisitos: a comprovação (justificação), a indispensabilidade e, ainda, o da ligação a proveitos ou ganhos sujeitos a imposto;

k)            Não tendo a Requerente demonstrado a prova dos requisitos estatuídos no Art. 23.º do CIRC, implica a não consideração dos custos para efeitos fiscais;

l)             Destinando-se os cheques viagem à aquisição de um produto a ser usufruído por um determinado número de pessoas, o custo não será a despesa com os cheques viagem, mas a sua concretização;

m)          Apenas com a aquisição do produto final – viagem –, comprovada pelo respetivo documento com a respetiva identificação do beneficiário, poderá ser considerada custo para efeitos fiscais, retirando-se, assim, à despesa em causa a natureza de despesa não documentada;

n)           A Requerente nunca demonstrou a entrega daqueles cheques viagem, nem a identificação dos destinatários, não tendo indicado os motivos e as condições em que premeia determinados colaboradores;

o)           O documento externo, que servirá de comprovação e de suporte ao lançamento contabilístico, deverá incorporar informação sobre a identidade dos intervenientes nas operações, especificando a origem, natureza e finalidade;

p)           No caso vertente, o documento de suporte não identifica quem são os beneficiários da despesa, sendo de natureza desconhecida;

q)           Terá de ser possível discernir da correlação entre a despesa e a sua necessidade para os proveitos obtidos, o que implica, necessariamente, conhecer a natureza, origem e finalidade das despesas, o que não acontece no caso em apreço;

r)            Os documentos apresentados pela Requerente não permitem aferir do objetivo/finalidade da despesa em questão, nem do beneficiário da mesma;

s)            A fatura de aquisição dos cheques viagem apenas comprova o registo de um fluxo monetário, não comprovando a aquisição efetiva da viagem, sendo a despesa constituída com o fluxo real que carece de comprovação (recibo da viagem e dos beneficiários da mesma), a fim de se conhecer a natureza e os beneficiários da viagem;

t)            De acordo com o disposto no Art. 23. ° do CIRC, não foi devidamente comprovado o custo, ou seja, não estando devidamente esclarecidos os montantes contabilizados, não foi possível aferir da indispensabilidade dos custos para a manutenção da fonte produtora;

u)           Quanto à tributação autónoma, tratando-se de despesas confidenciais, na medida em que se desconhece a sua natureza e beneficiário, nos termos do n.º 1 do Art.º 81.º do CIRC, está sujeita a tributação à taxa de 50%;

v)            A Requerente deduziu indevidamente encargos respeitantes a despesas suportadas com refeições, com receções (onde se incluem refeições e espetáculos) e com viagens oferecidas a clientes ou a fornecedores ou a quaisquer outras entidades;

w)          Tendo em conta que estas despesas configuravam despesas de representação, foram, pela Requerida, efetuadas correções em sede de tributação autónoma;

x)            Alega a Requerente que inexistem fundamentos para a tributação autónoma, na medida em que as despesas em causa não correspondem a despesas de representação, mas sim a custos com publicidade e propaganda, mas não carreou elementos de prova dos factos que alega;

y)            As despesas de receção, associadas às campanhas publicitárias de apresentação de produtos, exatamente, porque incluem designadamente um serviço (um cocktail, uma refeição ou um espetáculo artístico), assim como as viagens incentivo oferecidas a clientes que, não sendo o seu fim, não se esgotam exatamente na publicidade, donde, concretizam e proporcionam, para além disso, externalidades na esfera dos clientes, alvo destas campanhas e/ou viagens, designadamente, momentos lúdicos e de divertimento;

z)            O legislador considerou tributar autonomamente estas despesas, no equivalente a 20% do seu total – consubstanciado na tributação autónoma à taxa de 6% -procurando, assim, encontrar um equilíbrio entre a proporção aceite e a tributada que pendeu favorável à sua aceitação, pois considerou aceitar em 80% os custos suportados desta natureza;

aa)         Quanto à Informação n. 530/2001, de 5 de julho, invocada pela Requerente, cumpre referir que as Informações Vinculativas respondem e apenas são vinculativas para os casos concretos para que foram concedidas;

bb)         A redação consignada no n.º 4, do Art.º 81.º do C IRC é taxativa e inequívoca, quanto a considerar como despesas de representação "os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer pessoas ou entidades”;

cc)          Já no respeitante às viagens, a norma do Art.º 81.º do CIRC sujeita-as a tributação autónoma, contrariamente ao que sucede com atribuição de uma oferta/brinde (bonés, guarda-chuvas, bolas de futebol, etc.).

11.          Por despacho de 07/10/2019, este Tribunal concedeu à Requente o prazo de 10 dias para aperfeiçoar o pedido de pronúncia arbitral, tendo a mesma apresentado, dentro do prazo indicado, requerimento para a correção de erros de escrita, o qual foi deferido pelo Tribunal, em despacho de 30/10/2019.

12.          Através do despacho de 30/10/2019, este tribunal decidiu, ainda, ao abrigo dos princípios da autonomia na condução do processo, da celeridade e da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária) e da limitação dos atos [artigo 130.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do art. 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT], tendo em conta que não foram suscitadas exceções, considerando a prova documental produzida e considerando a natureza dos factos cuja prova se pretende, bem como as questões a decidir, dispensar a produção de prova testemunhal, dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e determinar que o processo prosseguisse com alegações escritas, a apresentar pelas Partes no prazo simultâneo de 20 dias, conforme previsto no artigo 91.º, n.º 5, do CPTA, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

13.          As Partes apresentaram alegações.

14.          Nas suas alegações, a Requerente reproduz, no essencial, a argumentação expendida no pedido de pronúncia arbitral.

15.          A Requerida, em sede de alegações, mantém integralmente a argumentação exposta em sede de Resposta.

 

II – SANEADOR

16.          Não foram suscitadas exceções.

17.          Encontram-se verificados os pressupostos contidos no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro, referente ao cometimento de processos tributários pendentes para a arbitragem.

18.          As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

19.          Não se verificam nulidades, pelo que se impõe conhecer do mérito.

 

III. MÉRITO

III. 1. MATÉRIA DE FACTO

§1.         Factos provados

20.          Consideram-se provados os seguintes factos:

a)            A Requerente pagou, em 2003, uma quota suplementar à B... (B...), no valor de € 20.788,50;

b)           Esse pagamento foi feito na sequência da aprovação, na Reunião Plenária de Associados da B..., realizada em 27 de novembro de 2002, da estrutura de quotizações da Associação para o ano de 2003, que contemplou “quotização estatutária” e “quotizações suplementares”;

c)            Os estatutos da B..., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, estipulam, no seu artigo 23.º, que "constituem receitas da Associação: a) As jóias de admissão, b) As quotas e contribuições dos associados; c) quaisquer outros rendimentos", e preveem, no seu artigo 14.º, alínea i), que compete à Assembleia Geral “fixar e alterar, sob proposta da Direcção, o montante da quota da jóia de admissão e das quotas, que deverão ser proporcionais ao número de votos de cada associado”;

d)           O artigo 9.º dos referidos estatutos incluem, na alínea a), entre os deveres dos associados, o de “pagar a jóia de admissão e quotas”;

e)           Os Serviços de Inspeção Tributária procederam à correção da dedução declarada pela Requerente no Campo 234, do Quadro 07, da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC, no montante de € 27.933,96, correspondente à majoração de 50% dos documentos referentes às quotizações respeitantes à B..., excluindo da majoração o montante relativo à quota suplementar;

f)            A Requerente adquiriu, em 22/12/2003, cheques-viagem à C..., no montante de €32.000;

g)            No âmbito da inspeção tributária efetuada pela DSIT, o encargo com cheques-viagem foi considerado como "despesa não documentada” e consequentemente foi sujeito a tributação autónoma à taxa de 50%;

h)           Em 2003, a Requerente suportou custos no montante de €280.634,45, referentes a eventos;

i)             O referido montante de €280.634,45 foi suportado pela Requerente com a organização dos eventos de apresentação dos combustíveis ... e ..., tendo essa organização sido assegurada por uma empresa especializada para o efeito, a D...;

j)             As apresentações comerciais foram efetuadas a 09 de maio e a 10 de outubro de 2003, no  ... e no ...;

k)            A AT aceitou, em sede de IVA, que as despesas de publicidade e coordenação de eventos, no valor total de € 114.879,50, eram dedutíveis, por considerar que os mesmos eram encargos normais da atividade de exploração da Requerente, o que se traduziu num IVA dedutível total de € 21.827,11;

l)             Em sede de IRC, na sequência da inspeção tributária efetuada pela DSIT, a Requerida, por entender que as referidas despesas com os eventos configuravam despesas de representação, sujeitou-as a tributação autónoma à taxa de 6%, tendo procedido à respetiva correção;

m)          Em 2003, a Requerente suportou também custos, no montante de €137.982,00, referentes a viagens oferecidas a clientes, no âmbito das promoções comerciais da empresa;

n)           A AT entendeu que o custo referente a viagens se subsume a despesas de representação e procedeu à respetiva correção, no montante de € 8.278,92, resultante da aplicação da taxa de tributação autónoma de 6%;

o)           No total, na sequência do exame à escrita da Requerente, realizado pela Direção de Serviços de Inspeção Tributária da Direção Geral dos Impostos, com referência ao exercício de 2003, foram efetuadas correções quer à matéria tributável, quer a imposto respeitantes àquele exercício, entre as quais se incluem as relativas ao lucro tributável e, bem assim, ao cálculo do imposto evidenciado na declaração de rendimentos Modelo 22 do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) apresentadas com referência ao exercício de 2003, tendo resultado um montante adicional de IRC a pagar no valor de € 848.274,28 (€788.093,21 de imposto e €60.181,07 de juros compensatórios);

p)           Por não concordar com algumas das correções em causa (melhor descritas supra), a Requerente exerceu, em 07/04/06, o seu direito de audição;

q)           Em 07/07/06, a Requerente foi notificada da liquidação adicional de IRC n.º 2006..., no montante total de € 864.505,54;

r)            A Requerente procedeu ao pagamento do imposto;

s)            Em 06/12/06, a Requerente deduziu reclamação graciosa da supramencionada liquidação adicional de IRC n.º 2006...;

t)            A referida reclamação graciosa tinha como objeto: (i) a anulação parcial no montante de € 66.536,64 da liquidação adicional de IRC n.° 2006..., respeitante ao exercício de 2003 e respetivos juros compensatórios; (ii) o reembolso do imposto já pago na parte correspondente às correções reclamadas, no valor de € 66.536,64, bem como dos respetivos juros compensatórios e (iii) o pagamento dos juros indemnizatórios previstos na alínea e) do n.º 1 do art. 30.°, art. 43.º da LGT e art. 61.º do CPPT, contados desde 4 de agosto, data em que o imposto foi pago;

u)           Por despacho proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto, em 08/04/2009, foi indeferida a reclamação graciosa apresentada pela Requerente;

v)            Em 04/05/2009, a Requerente intentou, junto do Tribunal Tributário de Lisboa, impugnação judicial contra o despacho proferido, em 08/04/09, pelo Diretor de Finanças Adjunto, por delegação, nos termos do qual foi indeferida a reclamação graciosa apresentada pela Requerente, em 06/12/06 (objeto imediato) e consequentemente contra a nota de liquidação adicional de IRC n.º 2006... (objeto mediato);

w)          Tal impugnação judicial correu termos junto do Tribunal Tributário de Lisboa, 3.ª unidade Orgânica, sob o n.º de processo .../09...BELRS;

x)            No âmbito do mencionado processo de impugnação judicial, foi a Requerente notificada, por ofício de 12/11/2009, do despacho de revogação parcial, proferido no processo administrativo tributário, por forma a que na liquidação em crise não fosse considerada a correção no montante de €24.240,72 relativa a amortizações e reintegrações;

y)            Por requerimento datado de 25/11/09, a Requerente manifestou a sua intenção de prosseguimento da impugnação judicial com vista à anulação da liquidação impugnada e que não havia sido revogada, no montante de € 52.788,50 e respetivos juros compensatórios;

z)            Foi posteriormente realizada a inquirição das testemunhas arroladas pela Requerente e foram apresentadas pela Requerente alegações escritas, por requerimento datado de 30/01/2013;

aa)         Em 10/05/2019, a Requerente, ao abrigo do disposto no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro, apresentou no CAAD o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo arbitral.

 

§2. Factos não provados

21.          Com relevo para a decisão, não existem factos essenciais não provados.

 

§3. Motivação quanto à matéria de facto

22.          Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral, no processo administrativo, e nas posições assumidas pelas partes, e não contestadas, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT.

III.2. MATÉRIA DE DIREITO

§1. Questões decidendas

23.          A primeira questão que se coloca é a que se prende com saber se as quotas suplementares pagas pela Requerente à B..., em 2003, podem, ou não, beneficiar da majoração do respetivo custo, prevista no artigo 41.º, n.º 1, do CIRC, em vigor à data dos factos, nos seguintes termos:

“1 - É considerado custo ou perda do exercício, para efeitos da determinação do lucro tributável, o valor correspondente a 150% do total das quotizações pagas pelos associados a favor das associações empresariais em conformidade com os estatutos”.

24.          A segunda questão a decidir por este tribunal prende-se com saber se o custo com cheques-viagem, suportado pela Requerente em 2003, configura, ou não, “despesa não documentada” e, consequentemente, se o mesmo deverá ou não ser sujeito a tributação autónoma à taxa de 50%, por aplicação da norma contida no n.º 1 do artigo 81.º do CIRC, na versão em vigor à data dos factos, cuja redação é a seguinte:

“1 - As despesas não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50 %, sem prejuízo da sua não consideração como custo nos termos do artigo 23.º”.

25.          A terceira questão é a que se prende com saber se há ou não vício de forma por deficiência de fundamentação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa, no que diz respeito à sujeição a tributação autónoma de 6% das referidas despesas com receções e viagens.

26.          A quarta questão é a que se prende com saber se as despesas suportadas pela Requerente, em 2003, com receções e com viagens, no valor, respetivamente, de €280.634,45 e de € 114.879,50, configuram, ou não, despesas de representação e, consequentemente, saber se as mesmas estão, ou não, sujeitas a tributação autónoma à taxa de 6%, por aplicação da norma contida no n.º 6 do artigo 81.º do CIRC, na versão em vigor à data dos factos, cuja redação é a seguinte:

“6 - Consideram-se despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades”.

27.          A resposta à quarta questão convoca também a norma contida no artigo 23.º, n.º 1, alínea b), do CIRC, cuja redação, na versão em vigor à data dos factos, é a seguinte:

“1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:

[…]

b) Encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias;

[…]”.

28.          Em caso de procedência do pedido de pronúncia arbitral, há que decidir, ainda, se a Requerente tem direito ao reembolso do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios.

 

§2. Aplicação do direito ao caso sub judice

Majoração de quotizações

29.          Conforme resulta da factualidade dada como provada, as quotas suplementares pagas pela Requerente à B..., no ano de 2003, foram fixadas nos termos estatutários pelo órgão competente para o efeito, estando a Requerente obrigada a esse pagamento [artigos 9.º, alínea a), 14.º, alínea i), e 23.º, alínea b), dos Estatutos da B...].

30.          Entende a Requerida que a Requerente não procedeu à junção de qualquer elemento probatório de que as quotizações suplementares se encontravam estabelecidas nos Estatutos da Associação.

31.          Sucede que o que a Requerente tinha que provar é que o pagamento das quotas suplementares foi feito “em conformidade com os estatutos” (e não, conforme parece pretender a Requerida, que as quotizações suplementares estavam estabelecidas nos estatutos), e essa prova foi feita documentalmente, quer nos presentes autos, quer junto da Requerida, conforme o revela o Processo Administrativo, não tendo a genuinidade dos documentos apresentados sido impugnada pela Requerida.

32.          O que está em causa é, pois, a interpretação do preceito contido no artigo 41.º, n.º 1, do CIRC.

33.          Importa saber se as quotas suplementares pagas pela Requerente configuram “quotizações pagas pelos associados a favor das associações empresariais em conformidade com os estatutos”, na expressão utilizada pelo legislador no artigo 41.º, n.º 1, do CIRC, em vigor à data dos factos.

34.          Resulta do elemento literal que a norma do artigo 41.º, n.º 1, do CIRC não exclui do benefício aí previsto as quotas que sejam pagas com caráter suplementar ou extraordinário, apenas exige que as mesmas tenham sido pagas “em conformidade com os estatutos”, o que aconteceu no caso vertente.

35.          Não só o elemento literal não permite excluir da majoração as quotas com caráter suplementar ou extraordinário, como também não se vê justificação, à luz dos demais elementos da interpretação, para sustentar essa exclusão;

36.          Assim sendo, conclui-se não haver razão para a Requerida excluir da majoração prevista no artigo 41.º, n.º 1, do CIRC os montantes pagos pela Requerente à B... a título de quotas suplementares;

37.          O facto de a B... ter considerado que as quotas suplementares estavam sujeitas a IVA não altera a conclusão expressa no ponto anterior, uma vez que tal facto não altera a natureza das quotas pagas nem altera o sentido da interpretação do artigo 41.º, n.º 1, do CIRC.

 

                               Encargos não documentados

38.          Conforme resulta da factualidade dada como provada, a Requerente adquiriu, em 22/12/2003, cheques-viagem à C..., no montante de €32.000, como o demonstra a fatura emitida por esta empresa.

39.          A Requerida entendeu tratar-se de "despesa não documentada”, em virtude de, na sua perspetiva, o documento de suporte não identificar quem são os beneficiários da despesa, e consequentemente, sujeitou-a a tributação autónoma à taxa de 50%.

40.          Importa, por conseguinte, saber se os custos relativos à oferta dos mencionados cheques-viagem consubstanciam “despesa não documentada”, para efeito do disposto no n.º 1 do artigo 81.º do CIRC.

41.          Conforme é afirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo no seu Acórdão de 19/04/2017, proferido no âmbito do processo n.º 01320/16, “[a] terminologia empregue no art.º 23.º e 81.º é suficientemente esclarecedora de que o legislador estabeleceu diferença entre encargos não devidamente documentados e despesas não documentadas, reservando esta qualificação para as despesas que careçam em absoluto de comprovativo documental”.

42.          No Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 28/01/2009, proferido no âmbito do processo n.º 0575/08, este Tribunal sustenta que “[a] apreciação da existência ou não da devida documentação e da confidencialidade da despesa é feita tendo por objecto o acto através do qual o sujeito passivo suporta o encargo ou a despesa que é susceptível de afectar o resultado líquido do exercício, para efeitos de determinação da matéria tributável de IRC”, esclarecendo, ainda, que “o encargo não estará devidamente documentado quando não houver a prova documental exigida por lei que demonstre que ele foi efectivamente suportado pelo sujeito passivo e a despesa será confidencial quando não for revelado quem recebeu a quantia em que se consubstancia a despesa”.

43.          No caso em apreço, foi feita prova, através da fatura emitida, em 22/12/2003, pela C..., de que a Requerente adquiriu a esta empresa cheques-viagem no valor de €32.000.

44.          Ou seja, existe prova documental que demostra que o referido montante foi efetivamente suportado pela Requerente, tendo a quantia em causa sido recebida pela C... .

45.          Para o efeito de saber se estamos ou não perante despesa não documentada é irrelevante saber quem são os beneficiários efetivos da viagem; o que se afigura decisivo é saber quem é o beneficiário da quantia despendida pela Requerente, o que, no caso vertente, está documentalmente provado – a C... .

46.          Isto significa que não existe dúvida de que o encargo foi suportado pela Requerente, nem existe dúvida do momento em que tal sucedeu e de quem foi o destinatário da respetiva quantia.

47.            Deste modo, a despesa referente à aquisição dos cheques viagem à C... não configura “despesa não documentada”, para efeito do disposto no n.º 1 do artigo 81.º do CIRC, pelo que não poderia ter sido sujeita à tributação autónoma, à taxa de 50%, aí prevista.

 

                               Despesas de representação

48.          Quanto à tributação autónoma, à taxa de 6%, das despesas suportadas pela Requerente com receções, no valor de €280.634,45, e com viagens, no valor de €137.982,00, importa apreciar o alegado vício de forma por deficiência de fundamentação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa.

49.          Segundo a Requerente, foi violado o disposto no n.º 7 do artigo 60.º da LGT, que dispõe o seguinte: “[o]s elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão”.

50.          Entende a Requerente que “[n]ão cuidou, todavia, a Administração Fiscal de fundamentar, através da invocação de um qualquer argumento jurídico, a justeza da interpretação efectuada por parte dos serviços de inspecção tributária do artigo 81.º, n.º 6 do CIRC, aplicável à data, limitando-se a transcrever este preceito legal” (n.º 84 do pedido de pronúncia arbitral).

51.          Relativamente às despesas de representação, na informação em que se baseou o despacho de indeferimento da reclamação graciosa transcreve-se o n.º 6 do artigo 81.º do CIRC, na versão à data dos factos, acrescentando-se o seguinte: “[e] atentos às alegações da Reclamante quer no âmbito da acção inspectiva quer agora em sede de reclamação, e aos fundamentos defendidos pelos serviços de Inspecção, parece-nos concluir pela legalidade da correcção efectuada”.

52.          Sucede que, relativamente à matéria em questão, não há na reclamação graciosa elementos novos, face àqueles que já constavam do exercício do direito de audição prévia, que obrigassem à sua especificação na fundamentação da decisão da reclamação graciosa, pelo que não se pode considerar que houve violação do disposto no n.º 7 do artigo 60.º da LGT.

53.          De acordo com a jurisprudência do STA, “um acto está fundamentado sempre que o administrado, como destinatário normal, ficar devidamente esclarecido acerca das razões que o determinaram estando, consequentemente, habilitado a impugná-lo convenientemente, não tendo, todavia, a fundamentação de ser exaustiva mas acessível” (Acórdão do STA de 02/02/2006, proc. n.º 1114/05).

54.          Ora, no caso vertente fica suficientemente claro, para um destinatário normal, qual a razão que levou a Requerida a sujeitar a tributação autónoma as despesas com receções e viagens oferecidas aos clientes pela Requerente – ter considerado que essas despesas configuram despesas de representação.

55.          E o pedido de pronúncia arbitral espelha a compreensão, pela Requerente, dos motivos que levaram a Requerida a proceder à referida tributação autónoma e a confirmar, na decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a legalidade dessa tributação.

56.          Entende, pois, este tribunal que o despacho de indeferimento da reclamação graciosa não enferma de vício de forma por deficiência de fundamentação.

57.          Importa, então, saber se as despesas suportadas pela Requerente com receções, no valor de €280.634,45, e com viagens, no valor de €137.982,00, configuram despesas de representação e, por conseguinte, se devem ser sujeitas a tributação autónoma, à taxa de 6%, por aplicação da norma contida no n.º 6 do artigo 81.º do CIRC, na versão em vigor à data dos factos, como é entendimento da Requerida.

58.          Conforme resulta da factualidade dada como provada, a Requerente despendeu o montante de €280.634,45 com a organização de eventos de apresentação dos combustíveis ... e ..., tendo essa organização sido assegurada por uma empresa especializada para o efeito.

59.          De acordo com o disposto no n.º 6 do artigo 81.º do CIRC, na versão em vigor à data dos factos, consideram-se “despesas de representação, nomeadamente, os encargos suportados com recepções, refeições, viagens, passeios e espectáculos oferecidos no País ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades”.

60.          Por outro lado, o artigo 23.º, n.º 1, alínea b), do CIRC, na versão em vigor à data dos factos, prevê que sejam considerados como “custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora”, nomeadamente os “encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias”.

61.          O Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), no seu Acórdão de 12/01/2017, proferido no âmbito do processo n.º 09894/16, sustenta que “[s]e do exame da factualidade provada se conclui que estamos perante despesas que se destinam, não a representar a sociedade impugnante onde esta não se encontra presente (portanto, fora da sua actividade principal), mas a assegurar o normal desenvolvimento do seu objecto social, dentro do circuito económico onde este naturalmente se manifesta, não se podem qualificar tais custos como despesas de representação, mas antes como custos inerentes ao normal desenvolvimento da actividade principal da sociedade impugnante/recorrida, de acordo com a definição do mesmo constante do nº.1 do probatório (comércio por grosso de produtos farmacêuticos), assim devendo enquadrar-se no artº.23, nº.1, al. b), do C.I.R.C., enquanto despesas de publicidade” (cfr., no mesmo sentido, o Acórdão do TCAS de 07/05/2015, proferido no âmbito do processo n.º 08534/15).

62.          No caso sub judice, a Requerente decidiu organizar dois eventos para a apresentação e promoção dos combustíveis ... e ... .

63.          Trata-se de produtos comercializados pela Requerente, sendo inequívoca a relação de causalidade económica entre a assunção do encargo com a promoção dos produtos e a realização desse encargo no interesse da empresa.

64.          Tal significa, em linha com o entendimento expresso no Acórdão do TCAS citado, que estamos perante despesas com publicidade, e não despesas de representação.

65.          Conforme é afirmado no Acórdão do TCAS de 06754/13 de 16/10/2014, proferido no âmbito do processo n.º 06754/13, “[o] requisito da indispensabilidade de um custo tem sido jurisprudencialmente interpretado como um conceito indeterminado de necessário preenchimento casuístico, em resultado de uma análise de perspectiva económica-empresarial, na percepção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento o objecto societário do ente comercial em causa, sendo vedadas à A. Fiscal actuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo. Não obstante, se a A. Fiscal duvidar fundadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respectivo escopo societário”.

66.          E é ainda referido, no mesmo Acórdão, que “[é] entendimento da jurisprudência e doutrina que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código - cfr. artº.23, nº.1, do C.I.R.C.), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica”.

67.          No caso sub judice, existe um nexo de causalidade entre a realização das despesas com os eventos (que, como se disse, configuram despesas com publicidade), e a prossecução dos interesses comerciais da empresa, pelo que tais despesas são enquadráveis no disposto no artigo 23.º, n.º 1, alínea b), do CIRC, não estando as mesmas sujeitas a tributação autónoma, por não configurarem despesas de representação.

68.          O mesmo vale para as despesas com viagens oferecidas pela Requerente a alguns dos seus clientes, no âmbito das promoções comerciais da empresa.

69.          Relativamente a estas despesas, sustenta a Requerente, designadamente, que “[n]o âmbito da sua actividade, a requerente atribui viagens a clientes com o intuito de promover a utilização/ aquisição, por parte dos referidos clientes, dos seus produtos, bem como o de divulgar a respectiva imagem e de estreitar o relacionamento comercial existente” (n.º 108 do pedido de pronúncia arbitral), acrescentando que as viagens oferecidas a clientes têm “pleno enquadramento no âmbito da política comercial desenvolvida, associada à promoção dos seus produtos”, pretendendo a Requerente, com essa oferta “reforçar o posicionamento da sua marca num mercado extremamente competitivo”.

70.          A Requerida não contesta que as viagens tenham sido oferecidas pela Requerente a clientes, no âmbito da sua política comercial, mas entende               que as despesas com essas viagens configuram despesas de representação e estão, por essa razão, sujeitas a tributação autónoma, uma vez que “[a]s despesas de recepção […] assim como as viagens incentivo oferecidas a clientes que, não sendo o seu fim, não se esgotam exactamente na publicidade, donde, concretizam e proporcionam, para além disso, externalidades na esfera dos clientes, alvo destas campanhas e/ou viagens, designadamente, momentos lúdicos e de divertimento” (artigo 72.º da resposta).

71.          Acrescenta a Requerida que “no respeitante às viagens, pese embora a Requerente não entender a diferença entre, por exemplo, a atribuição de uma oferta/brinde (bonés, guarda-chuvas, bolas de futebol, etc.) aos clientes que consomem produtos da A... e viagens aos clientes de grande consumo, importa referir que a norma do Art.º 81.º do CIRC contempla tal distinção, ao considerar a oferta de viagens como sujeita a tributação autónoma e a oferta de bonés, não sujeita”.

72.          Ou seja, a questão controvertida não se prende com qualquer divergência quanto aos factos, mas sim quanto ao seu enquadramento jurídico, traduzida na questão de saber se as despesas com viagens oferecidas a clientes consubstanciam, ou não, despesas de representação, para efeito do n.º 6 do artigo 81.º do CIRC.

73.          Sobre esta matéria releva a jurisprudência do TCAS citada supra (Acórdão de 12/01/2017, proferido no âmbito do processo n.º 09894/16, e Acórdão do TCAS de 07/05/2015, proferido no âmbito do processo n.º 08534/15).

74.          Ora, tal como sucede com as despesas com receções, já analisadas, também no caso das despesas com viagens oferecidas a clientes, no âmbito das promoções comerciais da empresa, se conclui que tais despesas não serviram para representar a sociedade perante terceiros, mas antes para promover a venda dos produtos da Requerente, no circuito normal da sua atividade económica, devendo, portanto, as mesmas ser classificadas como gastos com publicidade, e não como despesas de representação.

75.          Por essa razão, as despesas com as viagens oferecidas pela Requerente a clientes seus, no âmbito das promoções comerciais da empresa, não estão sujeitas à tributação autónoma de 6%.

 

                               Reembolso do imposto pago e juros indemnizatórios

76.          A Requerente pede ainda que este tribunal determine o reembolso do montante de imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios, calculados à taxa legal em vigor.

77.          De acordo com o disposto na alínea b), do n.º 1, do artigo 24.º do RJAT, “[a] decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários […] [r]estabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.

78.          Esta norma do RJAT é coerente com a previsão contida no artigo 100.º da Lei Geral Tributária, cujo texto é o seguinte:

“A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.

79.          Quanto à possibilidade de o tribunal arbitral reconhecer o direito a juros indemnizatórios, prevê o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.

80.          E, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, “[s]ão devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

81.          Face à total procedência do pedido de pronúncia arbitral, reconhece-se à Requerente o direito ao reembolso do montante de imposto indevidamente pago, uma vez que tal reembolso é essencial para o restabelecimento da situação que existiria se os atos objeto da presente decisão arbitral não tivessem sido praticados.

82.          Este tribunal reconhece, igualmente, que a ilegalidade da liquidação em causa nos presentes autos resultou de erro na interpretação da lei, imputável aos serviços da Administração Tributária, pelo que reconhece à Requerente o direito a juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT, sobre o montante a reembolsar.

83.          Os juros indemnizatórios são devidos desde a data do pagamento até ao integral reembolso, por aplicação da taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de abril.

 

IV – DECISÃO

Nestes termos, e com os fundamentos expostos, este Tribunal Arbitral decide:

a)            Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)           Declarar ilegal e anular, com todas as consequências legais, o ato de liquidação adicional de IRC n.º 2006..., referente ao exercício de 2003, no montante de €52.788,50 e respetivos juros compensatórios;

c)            Declarar ilegal e anular o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, datado de 08/04/2009;

d)           Julgar procedente o pedido de reembolso do montante de imposto pago indevidamente, acrescido de juros indemnizatórios, à taxa legal, contados desde a data do pagamento até integral reembolso, tudo conforme for apurado em sede de execução de sentença, condenando a Autoridade Tributária e Aduaneira a efetuar tal reembolso acrescido de juros;

e)           Condenar a Requerida no pagamento das custas do presente processo.

 

V- VALOR DO PROCESSO

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € €52.788,50.

 

VI – CUSTAS

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 08/01/2020

O Árbitro

 

(Paulo Nogueira da Costa)