Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 439/2017-T
Data da decisão: 2018-10-12  IRC  
Valor do pedido: € 1.734.668,46
Tema: RETGS – IRC – Declaração de Substituição.
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Decisão Arbitral (consultar versão completa no PDF)

 

          Os árbitros Conselheira Fernanda Maçãs (árbitro-presidente), Prof. Doutor Paulo Nogueira da Costa e Dra. Marisa Almeida Araújo, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

            1. Relatório

 

A..., S.A., pessoa colectiva n.º..., com sede Rua ..., n.º..., ..., ..., ...-... ..., doravante designada como “A...” ou “Requerente”, veio ao abrigo da al. a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 10.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ou ”RJAT”), apresentar pedido de pronúncia arbitral requerendo que seja anulada a decisão de deferimento parcial da Reclamação Graciosa N.º ...2016..., na parte referente ao ajustamento em sede de IRC (no montante de € 5.905.944,05) preconizado na Requerente e decorrente da cessação do RETGS no período de tributação de 2011 e, em resultado disso, que seja anulado o acto de liquidação de IRC n.º 2016..., na parte que concretiza o referido ajustamento (a qual ascende a € 1.515.477,55 a título de imposto, derrama municipal e tributação autónoma, e juros compensatórios no montante de € 219.220,91), num total de € 1.734.668,46.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, de ora em diante designada por “AT” ou “Requerida”.

 

1.1. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 28-07-2017.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 12-09-2017 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 27-09-2017.

Em 02-11-2017, a Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta em que defendeu que o pedido deve ser julgado improcedente.

Considerando as posições assumidas de ambas as partes quanto à suspensão do presente processo, pela existência de outro, com idêntica relação material controvertida e com recurso pendente no Tribunal Constitucional, até que houvesse decisão deste recurso, foi deferido pelo Tribunal o requerimento de suspensão tendo, a 15-06-2018, sido junto o acórdão do Tribunal Constitucional em relação ao processo n.º 10/2017-T deixando, conforme despacho de 16-06-2018, de existir fundamento para a manutenção da suspensão.

No mesmo despacho foi dispensada a reunião a que alude o art. 18.º do RJAT tendo-se convidado as partes a alegar por escrito e fixando-se a data limite para a prolação da presente decisão para 28-09-2018, sem ter em conta o tempo que o processo esteve suspenso.

As partes apresentaram alegações tendo a AT suscitado matéria de excepção, notificada ao tribunal após férias judiciais.

Impondo-se dar cumprimento ao princípio do contraditório e considerando as vicissitudes processuais, o tribunal proferiu despacho a 23-09-2018, prorrogando por dois meses a data limite da Decisão Arbitral fixando como limite para a respectiva prolação o dia 27 de novembro de 2018.

A Requerente veio responder à matéria de excepção a 01-10-2018.

 

1.2. O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

A Requerida suscitou a exceção de incompetência material do tribunal arbitral para apreciação de parte do pedido e, em sede de alegações, suscitou a excepção do caso julgado bem como, do que se retira do texto do requerimento, o interesse em agir por alegada inutilidade da causa.

Cumpre apreciar,

Quanto à excepção de incompetência material do tribunal arbitral, entende a Requerida que o conhecimento do pedido de anulação do «ato de liquidação de IRC n.º 2016..., na parte em que concretiza o supra referido ajustamento (a qual ascende a € 1.515.447,55 a título de imposto, derrama municipal e tributação autónoma, e juros compensatórios no montante de € 219.220,91), num total de € 1.734.668,46, conforme cálculo junto como doc. 19.», extravasa a competência deste Tribunal, porquanto o conhecimento de tais consequências da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa em causa, na parte referente ao ajustamento em sede de IRC (no montante de € 5.905.944,05), e respetiva quantificação, só poderia eventualmente decorrer da execução de julgados que viesse a ser efectuada em caso de a decisão arbitral proferida ser de procedência do pedido.

Segundo a Requerida, trata-se de um pedido de reconhecimento de direitos, que não se insere no âmbito das competências dos tribunais arbitrais

Sustenta a Requerida que uma eventual decisão de procedência do pedido arbitral nunca poderia implicar uma decisão de devolução de uma qualquer quantia concreta, mas, tão somente, uma obrigação para os serviços da Requerida de concretizar e quantificar os efeitos da procedência do pedido anulatório.

Assim, conclui a Requerida que este Tribunal é materialmente incompetente para apreciar o pedido identificado supra, o que consubstancia uma excepção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, conducente à absolvição da instância quanto à pretensão em causa, de acordo com o previsto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea a) do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

Cumpre, então, apreciar e decidir sobre a excepção invocada.

Este tribunal julga totalmente improcedente a excepção de incompetência material suscitada pela Requerida para apreciar os pedidos formulados pela Requerente, a saber: (i) a anulação da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa n.º ...2016..., na parte referente ao ajustamento em sede de IRC, e (ii) a anulação do ato de liquidação de IRC n.º 2016..., na parte em que concretiza o supra referido ajustamento (a qual ascende a € 1.515.447,55 a título de imposto, derrama municipal e tributação autónoma, e juros compensatórios no montante de € 219.220,91), num total de € 1.734.668,46, conforme cálculo junto como doc. 19.

O conhecimento dos referidos pedidos insere-se no âmbito da competência dos tribunais arbitrais, conforme resulta do disposto no artigo 2.º do RJAT e da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

A obrigação de a Requerida, em caso de procedência do pedido de anulação parcial da decisão de deferimento parcial da reclamação, restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, resulta da lei [artigo 24.º, n.º 1, al. b) do RJAT, artigo 100.º da LGT, e artigo 173.º, n.º 1, do CPTA, aplicável ex vi alínea c) do nº 1 do artigo 29.º do RJAT], sendo decorrência lógica da decisão sobre o mérito da pretensão, indispensável para garantir o seu efeito útil.

Isso mesmo tem vindo a ser reiteradamente afirmado pela jurisprudência arbitral, que tem reconhecido competência condenatória aos tribunais arbitrais restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, incluindo a devolução de montantes de imposto indevidamente pago, nos montantes correspondentes aos valores das liquidações impugnadas, acrescidos de juros indemnizatórios, calculados sobre aquela quantia, à taxa legal, desde a data do pagamento até emissão da respectiva nota de crédito[1].

Assim, este Tribunal julga totalmente improcedente a excepção de incompetência material suscitada pela Requerida.

Daqui resulta que este Tribunal considera correcto o cálculo do valor da causa. Nos termos do disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT, o valor da causa, quando seja impugnada a liquidação, corresponde à importância cuja anulação se pretende, o que no caso, ascende a 1.734.668,46, (dos quais € 1.515.447,55 a título de imposto, derrama municipal e tributação autónoma, e € 219.220,91 correspondentes a juros compensatórios), conforme é evidenciado no Doc. 19.

Quanto à excepção do caso julgado e interesse processual em agir, suscita a Requerida a questão de saber se estão verificadas as condições previstas na lei à data em vigor para a aplicabilidade do RETGS a todas as sociedades integrantes do perímetro do grupo dominado pela GRUPO B...(e a Requerente é uma delas) já foram sujeitas a apreciação jurisdicional, no CAAD, no âmbito do processo que correu termos sob o nº 10/2017-T. Não sendo, segundo a Requerente, unicamente a matéria de facto que se encontra em relação de prejudicialidade, bem assim, as consequências jurídicas advenientes da verificação dos factos também aqui em causa foram já submetidas a apreciação jurisdicional, nesse referido processo que correu termos sob o n.º 10/2017-T e que, através do despacho de 03/12/2017, o Tribunal arbitral deferiu o pedido de suspensão da instância até ao trânsito em julgado do processo arbitral n.º 10/2017-T.

Segundo a AT há identidade de objecto havendo já uma sentença transitada em julgado que apreciou os concretos fundamentos de facto e de direito em que se baseia a pretensão anulatória do acto impugnado e a decisão de fazer cessar a aplicação do RETGS ao Grupo B... foi já objecto de decisão, transitada em julgado, no âmbito do processo arbitral n.º 10/2017-T do CAAD.

Acrescenta ainda a AT que, não podendo proceder-se à aplicação da tributação segundo o RETGS à sociedade dominante C... SGPS e a todas as dominadas que foram Requerentes no âmbito do proc. 10/2017-T tornam manifesta a impossibilidade jurídica do efeito pretendido pela Requerente, qual seja, a de ser tributada de acordo com o RETGS no âmbito de um grupo que não existe – no ano de 2011 – para efeitos de aplicação de tal regime.

A AT alega estar impedida de tributar a aqui Requerente segundo o RETGS no âmbito do grupo constituído pela dominante C... SGPS e pelas dominadas que foram Requerentes no âmbito do proc. 10/2017-T, por força do art. 100.º da LGT e do art. 24.º do RJAT levando, in extremis, à desobediência a uma decisão transitada em julgado.

De resto, acrescenta, a admitir-se, e apenas por exageradíssima cautela de patrocínio, que a pretensão deduzida pela Requerente nos presentes autos pudesse proceder, o resultado seria não só absurdo como absolutamente inútil.

A Requerente veio exercer o contraditório pugnando pela improcedência das excepções.

Cumpre decidir,

O excepção do caso julgado material e a consequente extensão do efeito do caso julgado importa a verificação, cumulativa, dos requisitos de identidade do objecto (ambos os processos possuirem uma mesma causa de pedir e neles se formule o mesmo pedido) e de identidade dos sujeitos (confrontam-se as mesmas partes), conforme resulta dos arts. 580.º e 581.º do CPC.

Ora, in casu, a Requerente figura na relação jurídico-tributária, formalmente distinta de qualquer outra que tenha sido apreciada, e independentemente da subsunção ao regime material aplicável.

Desta forma, é inútil apreciar os limites do caso julgado, mormente a questão de prejudicialidade suscitada, considerando que não se verifica a excepção suscitada.

Desta forma, e sem mais considerações concluímos que não se verifica qualquer excepção do caso julgado.

Quanto ao mais alegado pela AT e que sumarizamos na temática do interesse em agir.

 O interesse processual consiste na necessidade de usar um processo exprimindo uma ideia de necessidade ou situação objectiva de carência de tutela judiciária (Remédio Marques, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto, 2.ª Ed., Coimbra Editora, p. 393).

A parte demonstra o interesse processual quando é necessária, indispensável, justificada, razoável e actual a resolução pela via judicial.

No caso concreto, para efeitos de configuração da relação processual, a relação jurídico-tributária tem como sujeito passivo a Requerente sobre quem vai recair os efeitos jurídicos do cumprimento, ou não, da prestação tributária emergente da liquidação aqui posta em crise, e não a sociedade dominante ou qualquer outra entidade.

Desta forma só se pode concluir que a Requerente tem uma situação de carência objectiva, justificada e razoável em recorrer a juízo, independente da relação jurídico-tributária da sociedade dominante.

Face ao exposto, considera-se que a Requerente tem interesse em agir.

 

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

1.3. A Requerente sustenta o seu pedido alegando, em síntese, que,

  1. Sustentam os Serviços de Inspeção Tributária, segundo a Requerente, que tendo a sociedade D... registado nos períodos de tributação de 2008, 2009 e 2010 prejuízos fiscais nos montantes de € 154.961,22, € 174.863,02 e € 213.827,29, respetivamente e, não sendo a participação na D... detida em 90% pela sociedade dominante há mais de dois anos (por referência ao período de tributação de 2011), tal sociedade não poderia ter sido incluída no RETGS.
  2. Acontece que, segundo a Requerente, este entendimento enferma de vícios estruturais, em particular porque não tem em consideração factos essenciais que justificam a devida inclusão da sociedade D... no RETGS que, apesar de terem sido oportunamente expostos no âmbito da competente reclamação graciosa, não foram devidamente considerados pela AT.
  3.  Em 2004 foi exercida a opção pelo RETGS, tendo a sociedade Grupo C... SGPS, S.A. figurado como sociedade dominante do grupo e em 2011, a sociedade D... foi incluída no referido grupo especial de tributação.
  4.  Tal sociedade dedicava-se à exploração de dois espaços comerciais no ..., propriedade da sociedade E... (sociedade que integra o grupo de sociedades sujeito ao RETGS) e, no contexto da constituição da sociedade D... foi celebrado um acordo parassocial em janeiro de 2008 entre a sociedade F... e a pessoa singular G... .
  5. No âmbito do referido acordo parassocial foram estabelecidos, segundo a Requerente, os termos que deveriam regular as futuras relações entre os sócios imputando ao sócio G... a obrigação de suportar as rendas dos espaços comerciais objeto de futura exploração, durante o exercício de 2008, caso o resultado líquido da sociedade a constituir referente a esse exercício fosse inferior a € 10.000, o que veio a verificar-se já que o resultado líquido da sociedade D... sido inferior a € 10.000 no primeiro exercício de atividade.
  6.  A D... foi assim constituída em 29 de janeiro de 2008, detendo cada um dos sócios uma quota no valor nominal de € 10.000.
  7. Durante o período de 2008 e por referência a este mesmo exercício, a D... apurou um resultado líquido negativo de € 155.163,03, mas acabou por pagar rendas em virtude da utilização dos espaços comerciais no valor de € 185.755,47 ainda que, conforme a Requerente essas rendas deveriam constituir um encargo do sócio G... .
  8. Segundo a Requerente, por lapso, a D... não exerceu o seu direito a ser ressarcida das rendas dos espaços comerciais suportadas em 2008, não tendo, em consequência, procedido ao devido acréscimo dos encargos suportados com as referidas rendas no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC de 2008, submetida no dia 26 de maio de 2009, (isto é, ajustamento ao resultado tributável do período de tributação de 2008).
  9. Tendo, a D... submetido, assim, a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC relativa ao ano fiscal de 2008 sem ter acrescido ao resultado fiscal o custo com as rendas tendo, em consequência, sido, segundo a Requerente, erroneamente apurado pela D... um prejuízo fiscal no valor de € 154.961,22, 120, quando, segundo a Requerente, deveria ter sido reportado um lucro tributável no valor de € 30.794,25, face à errónea consideração de € 185.755,47 como gasto fiscal dedutível.
  10. Para além disso, analisando os impactos contabilísticos do acordo parassocial, por referência ao exercício de 2008, também se deverá concluir que as contas da D... foram erroneamente preparadas e aprovadas, uma vez que não respeitaram os princípios contabilísticos vertidos no Plano Oficial de Contabilidade (“POC”).
  11. De forma a repor a verdade dos factos, para a Requerente, por referência ao período de tributação de 2008, a D... procedeu, em 25 de novembro de 2015, à entrega da declaração de substituição, com o número 2015-... (...), no seguimento da mesma foi emitida, depois, a respetiva guia de pagamento de IRC, no montante de € 3.743,15, 136.º e paga no dia 26 de novembro de 2015.
  12. Tal declaração foi dada como certa no dia 2 de dezembro de 2015 e foi celebrado entre G... e a sociedade F...– enquanto sociedade que sucedeu nos direitos e obrigações da D... após a sua fusão na F... durante o ano de 2014 – um acordo de assunção de dívida e plano de pagamento em prestações, com vista à recuperação do crédito de € 185.755,47 sobre o anterior sócio da D... .
  13. A AT não considerou o exposto.
  14. Segundo a Requerente, é inegável que a D... apresentou um resultado líquido negativo de € 155.163,03, mas, ao contrário do referido pela Direção de Finanças de ..., o gasto contabilizado com as rendas em questão não deveria ter sido considerado fiscalmente aceite e dedutível na esfera da D..., porquanto se tratava de um encargo de terceiro, a saber, do sócio G... .
  15.  Já que, segundo a Requerente, à luz do artº. 42º, nº 1, al. c), do CIRC em vigor à data dos factos, este gasto não seria dedutível em sede de IRC porquanto o mesmo reconduzir-se-ia a um “encargo que incide sobre terceiros que o sujeito passivo não está legalmente autorizado a suportar”.
  16. Precisamente por tal razão, e por forma a relevar fiscalmente o lapso cometido, é que a D... procedeu à entrega de declaração de substituição identificada com o número 2015..., em 25 de novembro de 2015, 151.º Declaração que foi dada como certa.
  17.  A eficácia meramente obrigacional ou inter partes do acordo parassocial o qual, por sua vez, terá, segundo a Requerente, uma relevância fiscal.
  18. Circunstância que levaria a que no exercício de 2008 fosse apurado um lucro tributável no valor de € 30.794,25, por contraposição ao prejuízo fiscal anteriormente registado no montante de € 154.961,22. Por esta razão procedeu a D... à entrega da declaração de rendimentos Modelo 22 de substituição, regularizando, dessa forma, a sua situação contributiva.
  19. Daí que a AT esteja obrigada, segundo a Requerente, a considerar e aceitar os efeitos do acordo parassocial celebrado – ou qualquer que seja a natureza do mesmo – entre a sociedade F... e o sócio G..., bem como os efeitos daí decorrentes para a D... .
  20. Não havendo, segundo a Requerente, qualquer nulidade quanto ao acordo parassocial exibido.
  21. O facto de a declaração Modelo 22 de substituição entregue pela D... se encontrar como “documento não liquidável”, a Requerente alega que da consulta ao documento emitido pelo Portal das Finanças, donde consta o detalhe da declaração de IRC resultante da entrega da declaração modelo 22 de substituição, resulta expressamente a menção a “Declaração Certa”.
  22. Assim, segundo a Requerente, a partir do momento em que uma declaração periódica de rendimentos se apresentar centralmente validada, e, por isso, definitiva, dando as bases de dados centrais expressamente essa indicação, à qual se segue, para além do mais, a pronta emissão de uma guia de pagamento, não há outra forma que não concluir que aquela afirmação de ciência – “Declaração Certa” – produz efeitos jurídicos conformadores sobre a Requerente.
  23. Segundo a Requerente, é a declaração de substituição apresentada pela D..., por referência ao período de tributação de 2008, que reflete a realidade contributiva da empresa e constitui presunção dessa mesma realidade.
  24. Daí que, segundo a Requerente, quando os Serviços de Inspeção Tributária de ... determinaram, quanto ao período de tributação de 2011, a cessação da aplicação do RETGS ao grupo de sociedades dominado pelo Grupo C... SGPS, S.A., ‘ex-vi’ do disposto no artº. 69º, nº 9, al. c) e nº 8, al. b), do CIRC, parece ter sido violada, segundo a Requerente – sem mais - a presunção de legalidade que decorre da aplicação desse mesmo artigo.
  25.  Quanto à caducidade e intempestividade da declaração de substituição a AT conclui, apenas, que a declaração de substituição não pode ser apresentada a todo o tempo, mas exclusivamente nos limites impostos pela lei, ou seja até 60 dias antes do termo do prazo de caducidade, sendo que, segundo a Direção de Finanças, ainda que se admitisse que o ano de caducidade é o ano limite de exercício do direito de reporte dos prejuízos fiscais declarados no caso concreto o período de tributação de 2014 (6 anos) –, a declaração entregue sempre seria intempestiva, já que a mesma foi apresentada somente a 25 de novembro de 2015.
  26. A Requerente entende que apenas o direito à liquidação de imposto, por referência ao período de tributação de 2008, é que pode eventualmente caducar, algo que não sucede com o direito/ obrigação de apresentar uma Declaração Modelo 22 de substituição, a qual pode ocorrer a todo o tempo quando a correção é a favor do Estado.
  27. Assistia – e ainda assiste – o direito à D... de proceder à substituição da declaração de rendimentos Modelo 22, referente ao período de tributação de 2008, declaração essa que foi tempestivamente submetida, tendo tal facto sido validado pelos Serviços Centrais de IRC ao darem a referida declaração de substituição como “declaração certa”.
  28. Nos termos do disposto no art. 47.º do Código do IRC, na versão em vigor em 2008, “Os prejuízos fiscais apurados em determinado período de tributação, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis períodos de tributação posteriores”, isso, por si só, segundo a Requerente é o motivo pelo qual o prejuízo fiscal indevidamente apurado em 2008 foi utilizado no âmbito do RETGS do Grupo B... em 2014, na sequência da fusão por incorporação da D... na sua acionista (única) F... .
  29. Daí que tenham sido deduzidos ao lucro tributável que a F... reportou no RETGS do Grupo B..., no período de tributação de 2014, prejuízos fiscais apurados pela D... em 2008, no valor de € 91.395,70.
  30. Tendo sido indevidamente apurado um prejuízo fiscal no exercício de 2008 e tendo esse prejuízo sido indevidamente utilizado em 2014, pelo facto do mesmo ser inexistente, deverá indubitavelmente entender-se que o mesmo pode ser corrigido pela AT dentro do prazo do instituto em questão, porquanto o mesmo produziu efeitos na liquidação de IRC de 2014.
  31. Período esse que ainda se encontra aberto para correção.
  32. Daí que nada obste a que a D... tenha procedido à submissão de Declaração Modelo 22 de substituição referente a 2008 e, consequentemente, à correção do prejuízo fiscal indevidamente apurado nesse período e utilizado erradamente no período de tributação de 2014.
  33. Tendo sido utilizado erradamente prejuízo fiscal num determinado ano (ano seis) que fora apurado num outro ano (ano zero), mal se andaria, segundo a Requerente, se não fosse possível corrigir-se o apuramento de tal prejuízo fiscal porquanto o mesmo tem impacto direto num ano ainda em aberto para efeitos, nomeadamente, de inspeção tributária.
  34. Entende a Requerente, na verdade, que o prazo excecional de caducidade previsto nas citadas normas permite corrigir o apuramento de prejuízos fiscais para além do prazo normal de caducidade.
  35. Mesmo que assim não se entenda, segundo a Requerente, esta declaração de substituição pode ser apresentada a todo o tempo.
  36. As declarações de substituição têm por objetivo permitir a correção dos valores apurados e declarados, por iniciativa do sujeito passivo, consubstanciando-se em regularizações voluntárias dos erros cometidos pelo contribuinte, pelo que se tem forçosamente de concluir que o Legislador pretendeu consagrar, aqui, um prazo especial a todo o tempo para a devida correção.
  37. Segundo o art. 104º, nº 2 da Constituição da República Portuguesa quando determina que “A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real”.
  38. Assim, segundo a Requerente, deve ser anulada a decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa – bem como a liquidação adicional de imposto que lhe está subjacente, emitida quanto ao exercício de 2011 – no que diz respeito à decisão de fazer cessar a aplicação do RETGS.
  39. Parece para a Requerente que a AT se demite de qualquer responsabilidade pela violação do princípio da proporcionalidade.
  40. Segundo a Requerente, o RETGS não se traduz, de facto, num benefício fiscal, revestindo antes a qualidade de regime estrutural de tributação, o qual permite às empresas serem tributadas conjuntamente através de um modelo simplificado de tributação, tendo em vista o acolhimento na realidade de tributação das pessoas coletivas de uma prossecução alargada de objetos sociais distintos no âmbito de uma filosofia de grupo comum.
  41. Ora, ainda que não se traduza num benefício fiscal, o RETGS sempre deverá entender--se como um regime de tributação que permite ao contribuinte (i.e. ao grupo de sociedades) um melhor controlo da atividade, assegurando, dessa forma, um maior grau de eficácia na prossecução dos objetivos comuns.
  42. A decisão da AT mostra-se absolutamente desadequada e violadora dos princípios gerais de direito, nos termos dos quais se deve reger a atividade da AT, violando-se, desde logo, o princípio da tributação do lucro real e o princípio da proporcionalidade, bem como no que concerne ao princípio da exigibilidade – também conhecido como princípio da necessidade ou da menor ingerência possível.
  43. Trata-se, pois, segundo a Requerente, de equacionar os meios e os fins, “mediante um juízo de ponderação, com o objetivo de avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim. Trata-se, pois, de uma questão de “medida” ou “desmedida” para se alcançar um fim: pesar as desvantagens dos meios em relação às vantagens dos fins”.
  44. A onerosa carga que para a Requerente e restantes sociedades do Grupo é aplicada decorrente da utilização desta medida (cessação da aplicação do RETGS), é totalmente desproporcional, desajustada e desmedida com o impacto financeiro e fiscal que a sociedade D...– alegada incumpridora – aporta ao RETGS.
  45. A sociedade D... representa 0,23% do total do volume de negócios de todas as sociedades incluídas no perímetro do RETGS. Pelo que, segundo a Requerente, não se pode reputar de legítima uma situação em que a sociedade que representa apenas 0,23% do total de volume de negócios do total das sociedades que compõe o RETGS acaba por onerar tão fortemente um grupo económico da dimensão do Grupo B... podendo, inclusivamente, colocar em causa a viabilidade económica financeira do Grupo, no seu todo.
  46.  A Requerente alega uma situação semelhante do caso da ... .
  47. Segundo a Requerente a solução adequada ao presente litígio é a que propugna, por se encontrar em consonância com o já mencionado princípio da proporcionalidade, tendo sido já esse o entendimento do legislador ao proceder à alteração do regime legalmente consagrado, por se tratar de um regime desnecessariamente gravoso para as sociedades.
  48. A AT, não tendo diligenciado em tempo útil, conforme estava apta a fazer e é sua obrigação, pela verificação das condições de que depende a aplicação do RETGS, violou os deveres a que se encontrava adstrita.
  49. Pelo exposto, segundo a Requerente, a decisão de deferimento parcial da Reclamação Graciosa sub judice, nos termos apresentados, enferma do vício de ilegalidade, porquanto viola grosseiramente o princípio da proporcionalidade ao qual a AT se encontra igualmente adstrita. devendo, como tal, ser mantida a aplicação do RETGS ao período de tributação de 2011, e, em consequência, ser anulada a liquidação de IRC emitida pela AT.

 

1.4. Por sua vez, a Requerida alega, em síntese que,

  1. Quanto à alegada ilegalidade das liquidações por erro sobre os pressupostos de facto e de Direito entende a AT que são de manter as liquidações controvertidas, resultado das conclusões dos serviços de inspecção, na parte em que não foi dada razão à Requerente, uma vez que a reclamação graciosa foi deferida «quanto à aplicação do RETGS no período de tributação de 2012» e, consequentemente, alteradas as liquidações na parte correspondente.
  2. Sendo certo que o procedimento inspectivo ocorrido em 2010 validou os prejuízos fiscais declarados pela D..., sendo o relatório notificado à aqui requerente, nos termos do art. 62º do RCPITA, sem que esta se tenha oposto às conclusões.
  3. Erra a Requerente, segundo a AT, ao pretender que a Autoridade Tributária estaria vinculada a considerar um alegado acordo parassocial que se manteve secreto durante sete anos e que só veio a público quando subitamente se tornou necessário para tentar infirmar a conclusão de que a aplicação do RETGS ao Grupo B... devia cessar com referência ao exercício de 2011.
  4. De facto, verificou-se que a D... havia registado prejuízos fiscais durante os três anos consecutivos de 2008, 2009 e 2010, pelo que tal implicava a cessação da aplicação do RETGS a todo o perímetro do grupo, com efeitos no ano de 2011.
  5. Portanto, o invocado acordo parassocial teria a virtualidade de transformar o declarado prejuízo fiscal (aliás deduzido no apuramento do resultado tributável do grupo em 2014) em lucro tributável.
  6. O que teria sido declarado em Novembro de 2015, por meio da submissão de declaração de substituição, contemporaneamente à realização das acções inspectivas.
  7. O que, no caso, até se verificou, havendo a autoliquidação de 2008 sido validada pelas conclusões de acção inspectiva efectuada em 2010.
  8. Sendo, para mais, incontestadas pela D... as conclusões da acção inspectiva, após notificação do relatório da inspecção efectuada em 2010.
  9. Pelo que, deve concluir-se que a pretensão de alterar a situação jurídico-tributária da D..., relativa a 2008, em finais de 2015, no decurso de acção inspectiva aos pressupostos de aplicação do RETGS, caducado já o direito à liquidação e, inclusivamente, depois de se terem conformado com as conclusões da inspecção que em 2010 validaram os prejuízos fiscais declarados…
  10. Pretende a Requerente, segundo a AT, que, mesmo que, verificando-se que a D... incumpria os requisitos para a sua inclusão no perímetro do grupo, ainda assim não deverá entender-se que a consequência é a cessação da aplicação do RETGS.
  11. O que implica que cada sociedade deva ser tributada autónoma e individualmente.
  12. Advogando a mera exclusão dos prejuízos fiscais gerados pela D... do apuramento do lucro tributável do grupo de sociedades.
  13. Para o que não beneficia de qualquer apoio, quer na letra, quer no espírito da lei.
  14. Quanto à alegada violação dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da tributação do rendimento real invoca a Requerente (cfr. arts. 402º e ss.), em suma, que a aplicação da cessação do RETGS estaria vedada in casu por força da vinculação da AT aos princípios constitucionais da proporcionalidade e da tributação do rendimento real.
  15. Ora, tal argumentação é totalmente carecida de fundamento segundo a AT.
  16. Neste caso específico (que não noutros), não há utilização de qualquer instrumento legal de concessão de poderes discricionários à Administração, seja por atribuição de faculdades ou através da utilização de conceitos indeterminados.
  17. Não ocorre qualquer ofensa ao princípio da proporcionalidade, pois a cessação da aplicação do regime especial é simplesmente decorrência da aplicação da lei, à qual tanto a Administração como os Tribunais devem obediência.
  18. Atender à pretensão da Requerente, segundo a AT, equivaleria a subverter a característica básica da tributação (ou seja, o seu carácter coactivo), quando a Administração Tributária está funcionalmente obrigada a cumprir as prescrições legais e sendo o crédito tributário indisponível.
  19. A cessação da aplicação do RETGS conduz à tributação de cada sociedade do grupo individualmente, nos termos gerais, portanto, de forma tão proporcional como qualquer outra sociedade que, por opção própria ou por não cumprimento dos requisitos legais, não seja tributada segundo este regime especial.
  20. Igualmente não é ofendido o princípio da tributação do rendimento real.
  21. Qualquer interpretação que não aplique a norma constante do artigo 69º do CIRC, tendo subjacente a assunção de que tal norma incorre em violação do princípio da proporcionalidade, proibida nos termos da Constituição da República Portuguesa, sendo, consequentemente, inconstitucional, ou tendo subjacente a assunção de que tal norma incorre em violação do princípio da tributação do rendimento real, proibida pela Constituição da República Portuguesa, sendo inconstitucional.
  22. Da inconstitucionalidade da interpretação propugnada pela Requerente sempre se deve ressaltar que, caso vingasse a interpretação da Requerente, a saber, de que a consequência a associar à verificação do incumprimento dos pressupostos legais para a aplicação do RETGS fosse a simples retirada dos prejuízos fiscais indevidamente considerados no apuramento do resultado tributável do grupo por força do contributo da sociedade D..., então, sempre se dirá que tal interpretação seria materialmente inconstitucional.
  23. Como é bom de ver, as normas do art. 69º do CIRC estabelecem a sanção aplicável no caso: à verificação do incumprimento dos requisitos necessários à aplicação do regime (especial, mais benéfico e dependente de opção), a lei associa uma consequência ao nível do Direito Tributário: a tributação de cada uma das sociedades segundo as normas gerais, por força da impossibilidade de aplicação do regime especial de grupos.
  24. Por todo o exposto, sustenta a Requerente que não existe qualquer suporte legal, entendimento administrativo ou mesmo assiste qualquer razão à pretensão da Requerente, carecendo de sustentação o entendimento propugnado pela mesma.
  25. Pelo exposto, os juros compensatórios foram liquidados em estrita obediência ao legalmente estabelecido.
  26. A Requerente não alega haver pago as liquidações controvertidas (segundo a Requerente) nem peticiona a condenação em juros indemnizatórios, não podendo o Tribunal condenar além do pedido.
  27. Sempre se dirá que, ainda que fosse julgado procedente o pedido arbitral (o que só por extrema cautela de patrocínio se concebe), ainda assim os juros indemnizatórios não seriam devidos.
  28. Pelo que, atendendo a que as normas em causa têm um carácter imperativo, nunca a AT, face ao regime a aplicar ao caso concreto segundo o disposto no referido artigo 69º do CIRC, poderia ter desaplicado tal determinação legal.

 

2. Matéria de facto

 Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artigos 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT). Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos infra elencados.

 

2.1. Factos provados

  1. A Requerente estava inserida num grupo de sociedades cuja sociedade dominante é a sociedade GRUPO C... SGPS S.A, NIPC ... que havia optado pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS) previsto no artigo 69.º e seguintes do Código do Imposto dobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).
  2. Os serviços de inspecção tributária da Direcção de Finanças de ... deram início ao procedimento inspectivo à sociedade dominante do grupo – GRUPO C... SGPS, SA – com a ordem de serviço n.º OI2015..., incidente sobre o exercício de 2011, tendo como principal objectivo a verificação externa de elementos relacionados com o enquadramento a dar ao regime de tributação dos rendimentos do sujeito passivo, mormente se estavam reunidas as condições para o grupo poder beneficiar da aplicação do RETGS tendo concluído que uma das sociedades indicada como fazendo parte do perímetro do grupo – a D...- não cumpria todos os requisitos previstos no n.º 4 do artigo 69º do CIRC.
  3. À Requerente, em 9 de Junho de 2015 foram emitidas as ordens de serviço com os números OI2015... e OI2015..., respectivamente para os exercícios de 2011 e 2012, de âmbito parcial, incidentes sobre o IRC.
  4. A acção inspectiva foi credenciada pelas ordens de serviço nº OI2015... e OI2015... .
  5. Na declaração de opção pela aplicação do RETGS estavam indicadas trinta e quatro sociedades:

  1. Em 9 de Junho de 2015 foram emitidas as ordens de serviço com os números OI2015... e OI2015..., respectivamente para os exercícios de 2011 e 2012, tendo as acções inspectivas incidido na verificação externa de elementos relacionados com o enquadramento a dar ao regime de tributação dos rendimentos dos sujeitos passivos, havendo alcançado conclusões que não estão em discussão nesta sede.
  2. No que concerne às declarações entregues pelo GRUPO C... SGPS, SA, verificou-se que, com referência ao exercício de 2011, o grupo entregou as seguintes declarações modelo 22 de IRC:

  1. Sendo que a primeira declaração, não liquidável, refere-se à do GRUPO, individual, e as seguintes, todas liquidadas, à do GRUPO como sociedade dominante (RETGS).
  2. Face ao declarado pela sociedade dominante na declaração de opção pela aplicação do RETGS, sobre a existência de um grupo fiscal constituído por 34 empresas, procedeu a AT à verificação do seu perímetro, de modo a validar as condições de aplicação do regime especial de tributação previsto no artigo 69º do CIRC. o âmbito dos procedimentos inspectivos referidos verificou a AT que, nomeadamente que ocorreram alterações ao capital social da D..., Lda.
  3. A D... foi constituída de acordo com o contrato de sociedade por quotas, com o capital social de € 20.000 euros, representado pelas seguintes quotas:

- Quota de € 10.000,00 - pertencente a F..., SA com o NIPC...;

- Quota de € 10.000,00 - pertencente a G... com o NIF... .

  1. Em 2009.04.27, foi registada a deliberação, datada de 2009.04.22, de alterações ao contrato de sociedade e designação de novos membros de órgãos sociais, passando o capital social a ser constituído do seguinte modo:

- Quota de € 10.000,00 - pertencente a F..., SA com o NIPC... .

- Quota de € 10.000,00 - pertencente à mesma F..., SA com o NIPC ... .

  1. Em 2010.11.03 verifica-se uma actualização do pacto social da sociedade, no qual se verifica um aumento do seu capital para € 470.000,00, correspondente a duas quotas, do seguinte modo:

- Quota de € 100,00 - pertencente a H..., SGPS, SA com o NIPC  ...;

- Quota de € 469.900,00- pertencente a F..., SA com o NIPC... .

  1. A sociedade F..., SA com o NIF ... é participada desde 2004 em 100% pela sociedade H.., SA com o NIF..., que por sua vez é participada em 100% pela GRUPO C... SGPS SA com o NIF... .
  2. No âmbito dos procedimentos inspectivos apurou a AT que “Nos exercícios de 2008 a 2010, a sociedade D..., Lda, apresentou a declaração anual de rendimentos modelo 22, no regime geral de tributação de IRC, onde declarou os seguintes resultados tributáveis:

Exercício

Resultado tributável

Regime

2008

-154.961,22 €

Redução de taxa

2009

-174.863,02 €

Redução de taxa

2010

-213.827,29 €

Redução de taxa

 

  1. Em 30 de Maio de 2012 a sociedade dominante GRUPO C... SGPS SA procedeu, via internet, ao envio da declaração de IRC modelo 22 de 2011, prevista no nº 6 do art. 120º do CIRC, onde declarou ser-lhe aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS) definido no artigo 69º do Código do IRC.
  2. Em 22 de Maio de 2012, a sociedade dominada D..., Lda. procedeu à entrega da declaração de IRC modelo 22 de 2011, onde declara o regime de tributação pelo regime geral e como pertencente ao grupo de sociedades dominada pela GRUPO C... SGPS SA com o nipc..., tributado nos termos do artigo 69º do CIRC, e por esse facto não se encontrando liquidável.”
  3. No que respeita concretamente à participação da sociedade F..., SA, apurou-se:

“A D... apresentou prejuízos fiscais nos exercícios de 2008, 2009 e 2010, ou seja, nos três exercícios anteriores ao do início de aplicação do regime, 2011.

- A F... detinha a participação na D... em 50% desde a sua constituição em 2008.01.29 e só adquiriu a outra participação de 50% em Abril de 2009, passando a deter 100% do capital;

  1. No decurso dos procedimentos inspectivos, foram apresentados cópia de um acordo parassocial relativo à D... celebrado entre a F... (primeiro outorgante) e G... (segundo outorgante), sócios em partes iguais da D..., datado de 2008.01.22, que refere “…mais acorda o segundo outorgante que relativamente à exploração das lojas no  ... … assumirá, individual e pessoalmente, os encargos decorrentes das prestações periódicas devidas pela utilização das lojas no primeiro exercício de exploração das referidas marcas, caso o resultado líquido do respectivo exercício não seja positivo em, pelo menos, € 10.000,00”.
  2. Em 2008 o resultado líquido do exercício não chegou aos € 10.000,00 e a sociedade D... pagou o valor correspondente às rendas dos estabelecimentos comerciais da sociedade, nesse ano, no valor de € 185.755,47.
  3. A D... não exerceu o seu direito a ser ressarcida das rendas dos espaços comerciais suportadas em 2008.
  4. Não existe qualquer registo contabilístico do acordo parassocial e do consequente direito a receber quaisquer rendas.
  5. Em 25 de Novembro de 2015, a D... entregou via internet uma declaração de rendimentos de IRC modelo 22 de substituição de 2008 em que declarava um lucro tributável de € 30.794,25.
  6. Esta declaração, com a identificação ..., encontra-se na situação de “documento não liquidável”.
  7. Esta declaração de substituição alterou um prejuízo inicialmente apresentado de € 154.961,22 para um lucro tributável de € 30.794,28 (185.755,47 – 154.961,22);
  8. O que foi apresentado no âmbito dos procedimentos inspectivos em análise como resultado de aquele valor de € 185.755,47 corresponder aos encargos que segundo o acordo parassocial seriam da responsabilidade do sócio G..., o que, segundo a dominante, faria ultrapassar a questão posta em face do disposto na alínea c) do nº 4 do artigo 69º do CIRC, uma vez que já não se verificava a situação de prejuízo tributável em três exercícios seguidos mas sim apenas em dois (2009 e 2010).
  9. Em Assembleia Geral realizada em 2009.03.23 foram aprovados o relatório de gestão e as respectivas contas do exercício de 2008 sem qualquer reserva ou menção às importâncias supostamente a receber.
  10. No decorrer de 2010, a D... foi alvo de uma acção de inspecção ao exercício de 2008 por parte dos serviços de inspecção tributária, tendo sido validado o resultado tributável declarado pelo contribuinte.
  11. Nos termos do artigo 62º do RCPITA a empresa foi notificada deste facto e a ele não se opôs, sendo digno de nota que a razão primeira para a realização daquela acção de inspecção foi a análise dos prejuízos declarados pela empresa;
  12. O referido acordo parassocial não foi exibido aquando da realização da acção de inspecção atrás referida.
  13. Após notificação para o exercício do direito de audição, o mesmo veio a ser exercido.
  14. Face à cessação do RETGS foram corrigidas as declarações individuais de 2011 das sociedades incluídas no grupo, procedendo-se à alteração do regime de tributação para o regime geral.
  15. Em consequência forma emitidas liquidações efectuadas de acordo com o regime geral de tributação.
  16. A aqui Requerente apresentou, em 28.07.2016, reclamação graciosa contra a liquidação impugnada, a qual foi tramitada sob o nº ...2016... que veio a ser parcialmente deferida.

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.

Os factos provados baseiam-se nos documentos juntos pela Requerente com o pedido de pronúncia arbitral, no processo administrativo, bem como na posição das partes vertidas nas respectivas peças.

 

3. Matéria de direito:

 

  1. Da caducidade do direito à entrega da declaração de substituição:

O grupo de sociedades B..., da qual a Requerente faz parte, sujeito ao RETGS foi objeto de uma ação de inspeção tributária, promovida pelos Serviços de Inspeção Tributária de ..., que visou confirmar da elegibilidade das sociedades que integravam perímetro do grupo para efeitos da aplicação daquele regime relativo a grupo de sociedades.

A AT concluiu que a sociedade D... foi indevidamente incluída pela sociedade dominante no perímetro das sociedades sujeitas ao RETGS uma vez que aquela registou, nos períodos de tributação de 2008 a 2010, a sociedade D..., Lda.

Da declaração anual de rendimentos modelo 22, no regime geral de tributação de IRC, foram declarados, pela aludida sociedade dominada, os seguintes resultados tributáveis:

 

Exercício

Resultado tributável

Regime

2008

-154.961,22 €

Redução de taxa

2009

-174.863,02 €

Redução de taxa

2010

-213.827,29 €

Redução de taxa

 

Não sendo a participação na D..., Lda. detida em 90% pela sociedade dominante há mais de dois anos, tal sociedade não poderia ter sido incluída no RETGS, o que determina, por si só, a cessação da aplicação do RETGS a todas as sociedades integradas no grupo, nos termos resultantes da alínea b), do nº 8 e na alínea c), do nº 9, ambos do artigo 69.º do CIRC.

Em face disso, todas as sociedades integrantes do perímetro do grupo devem ter sido tributadas autónoma e individualmente de acordo com o regime geral de IRC.

A Requerente alegou que existiu um lapso nas contas da aludida D... .

Perante um acordo parassocial celebrado entre a F... (primeiro outorgante) e G... (segundo outorgante), sócios em partes iguais da D..., datado de 2008.01.22, que refere “…mais acorda o segundo outorgante que relativamente à exploração das lojas no ... … assumirá, individual e pessoalmente, os encargos decorrentes das prestações periódicas devidas pela utilização das lojas no primeiro exercício de exploração das referidas marcas, caso o resultado líquido do respectivo exercício não seja positivo em, pelo menos, € 10.000,00”. Ou seja, quem devia ter assumido as rendas dos estabelecimentos comerciais da sociedade era o sócio G... e não a sociedade, como erroneamente aconteceu.

A Requerente confessa o erro, ou seja, confessa a aludida sociedade pagou as rendas e que não exerceu qualquer direito a ser ressarcida – na concepção e enquadramento jurídico que sustenta – das rendas, quanto a si, indevidamente pagas pela D... e que levou, erradamente, a um prejuízo fiscal.

O que, segundo a Requerente não aconteceu tendo, não obstante a sociedade ter pago as rendas – segundo a sua perspectiva indevidamente – que contabilizou e não cobrou ao sócio e, só mais tarde se apercebendo do lapso, corrigiu a declaração e terá formalizado a dívida com o sócio devedor, através de uma assunção de dívida com plano de pagamento.

Ou seja, por referência a 2008, na medida em que esta sociedade deveria ter registado uma conta a receber do sócio G..., relativa ao crédito no valor de € 185.755,45, o que, por lapso, não fez.

O que levou a que, em 25 de Novembro de 2015, a D... entregasse via internet uma declaração de rendimentos de IRC modelo 22 de substituição de 2008 em que declarava um lucro tributável de € 30.794,25, ao invés do referido prejuízo fiscal.

Entende a Requerente que a declaração de substituição, referente ao período de tributação de 2008 e entregue em 25 de novembro de 2015, podia ser apresentada a todo o tempo.

Quanto a esta questão já se pronunciou o tribunal arbitral, no âmbito do processo n.º 10/2017-T (que pode ser consultado no sítio da internet do CAAD in www.caad.pt), cuja posição sufragamos e que seguimos e que, por constituir decisão sobre análoga relação material controvertida, aqui consideramos.

Analisando,

Na senda da decisão referida “é sabido que, na interpretação de normas fiscais, devem ser observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis (cfr. artigo 11.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT)).

De acordo com o artigo 9.º n.º 1 da mesma LGT, são expressamente proibidas as interpretações exclusivamente baseadas no teor literal das normas, quando estatui que «a interpretação não deve cingir-se à letra da lei», devendo, antes, «reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada». Quanto à correspondência entre a interpretação e a letra da lei, basta «um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso» (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil), o que só impedirá que se adoptem interpretações que não possam em absoluto compaginar-se com a letra da lei, mesmo reconhecendo nela imperfeição na expressão da intenção legislativa. Por isso, a letra da lei não é obstáculo a que se faça interpretação declarativa, que explicite o alcance do teor literal, nem mesmo interpretação extensiva, quando se possa concluir que o legislador disse menos do que o que, em coerência, pretenderia dizer, isto é, quando disse imperfeitamente o que pretendia dizer.

Assim, preceitua o art. 122.º do CIRC:

Declaração de substituição

1 - Quando tenha sido liquidado imposto inferior ao devido ou declarado prejuízo fiscal superior ao efetivo, pode ser apresentada declaração de substituição, ainda que fora do prazo legalmente estabelecido, e efetuado o pagamento do imposto em falta.

2 - A autoliquidação de que tenha resultado imposto superior ao devido ou prejuízo fiscal inferior ao efetivo pode ser corrigida por meio de declaração de substituição a apresentar no prazo de um ano a contar do termo do prazo legal.

3 - Em caso de decisão administrativa ou sentença superveniente, o prazo previsto no número anterior conta-se a partir da data em que o declarante tome conhecimento da decisão ou sentença.

4 - Sempre que seja aplicado o disposto no número anterior, o prazo de caducidade é alargado até ao termo do prazo aí previsto, acrescido de um ano.

5 - Quando for aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades e alguma das sociedades do grupo apresente declaração de substituição da declaração prevista na alínea b) do n.º 6 do artigo 120.º, a sociedade dominante procede à substituição da declaração periódica de rendimentos do grupo prevista na alínea a) do referido n.º 6 do artigo 120.º»

Conforme resulta da decisão em análise, “(…) em abstrato, considerar-se que este artigo inclui um conjunto de regras especiais que afastam a aplicação da regra geral de contagem de prazos prevista no n.º 3 do artigo 59.º do CPPT relativamente ao prazo para substituição das declarações dos contribuintes, em caso de erro de facto ou de direito nas declarações. Esta interpretação mostra-se rigorosa quando é analisado o n.º 2 do artigo 122.º do CIRC.

Como já foi entendido pelo STA, justamente a propósito do n.º 2 do artigo 122.º do CIRC, no acórdão n.º 0159/14 (13.01.2016): “a norma do CIRC, que fixa em 1 ano o prazo para a apresentação da declaração de substituição deve ter-se como norma especial (Norma especial, na medida em que, visando complementar o regime-regra, consagra uma disciplina diferente para um círculo mais restrito de relações (Cf. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 95).

Com interesse e vasta indicação de doutrina sobre a temática da distinção entre lei geral e lei especial, vide o Parecer n.º 110/2003 da Procuradoria-Geral da República, publicado no Diário da República, II série, n.º 28, de 3 de Fevereiro de 2004 (https://dre.pt/application/file/a/2906437), págs. 1924 a 1934.) relativamente à norma do CPPT, motivo por que deve prevalecer sobre esta (Nos termos do disposto no art. 7.º, n.º 3, do Código Civil, «[a] lei geral não revoga lei especial, salvo se outra for a intenção inequívoca do legislador».).”

 Concluindo pela natureza especial do n.º 2 do artigo 122.º do IRC, este mesmo acórdão afirma o seguinte: “Sendo certo que no art. 59.º, n.º 3, alínea b), II), o CPPT permite a substituição da declaração até ao termo do prazo legal de reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto de liquidação e que, nos termos do n.º 1, do art. 131.º do mesmo Código, o prazo para aquela, no caso de autoliquidação, é de 2 anos após a apresentação da declaração, a norma do CIRC citada em I deve ter-se por especial relativamente ao art. 59.º do CPPT e, por isso, prevalecer sobre ela quando esteja em causa a substituição de declaração de IRC.” e que “não tinha a AT de convolar a declaração de substituição apresentada para além do termo do prazo legal em reclamação graciosa e sendo a omissão dessa convolação o único fundamento invocado na impugnação judicial da liquidação adicional que substituiu a autoliquidação dita em I, a mesma está condenada ao fracasso.”

Acontece que, discutimos, in casu, a caducidade do direito à liquidação na decorrência da entrega da declaração de substituição, de acordo com o n.º 1 do art. 122.º do CIRC, realizada a 26/11/2015, da sociedade D... e que, segundo a Requerente podia ser feito a todo o tempo.

E assim sendo, de acordo com o teor da decisão referida e proferida no âmbito do processo n.º 10/2017-T “A interpretação do n.º 1 do artigo 122.º não deve /suscitar, aliás, quaisquer dúvidas. Vejamos: Como é corretamente afirmado pelas -Requerentes, o nº 1 do artigo 122.º refere “apenas que a declaração de substituição pode ser apresentada fora do prazo legalmente estabelecido – 31 de Maio de cada ano” (…).

Porém, a circunstância de a declaração poder ser apresentada fora do prazo legalmente estabelecido para a liquidação – 31 de maio de cada ano – encontra-se balizada, quanto às consequências - liquidação das declarações -, pelos preceitos e prazos estipulados no artigo 101º do CIRC, que refere que a “liquidação de IRC (…) só pode efectuar-se nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45º e 46º da LGT”, e na parte III da alínea b) do nº 3 do artigo 59º do CPPT que diz que em caso de erro de facto ou de direito nas declarações dos contribuintes, estas podem ser substituídas “(…) até 60 dias antes do termo do prazo de caducidade para a correção de erros imputáveis aos sujeitos passivos de que resulte imposto superior ao anteriormente liquidado”.

O que significa que o prazo limite para a apresentação da declaração de substituição prevista no artigo 122.º, n.º 1 do CIRC termina 60 dias antes do termo do prazo de caducidade.

A não ser assim resultaria, do disposto no artigo 122.º, n.º 1 do CIRC, que a declaração de substituição poderia ser apresentada fora do prazo legalmente estabelecido, isto é ad aeternum, entendimento que não só colocaria em crise o princípio da segurança e da certeza jurídica como, e mais relevante, não encontra qualquer suporte no texto da lei. No caso em apreço está em causa a liquidação de IRC referente ao ano de 2008, razão pela qual, em condições normais, o prazo de caducidade teria ocorrido 60 dias antes do dia 31 de maio de 2012 (i.e. quatro anos depois do prazo legal).

Como também já foi decidido no âmbito do processo n.º 10/2017-T “é certo, porém, que o artigo 47.º do CIRC, na versão em vigor em 2008, dispunha que “Os prejuízos fiscais apurados em determinado período de tributação, nos termos das disposições anteriores, são deduzidos aos lucros tributáveis, havendo-os, de um ou mais dos seis períodos de tributação posteriores”.

Ou seja, os prejuízos fiscais podiam, em 2008, ser deduzidos aos lucros tributáveis de um ou mais dos seis anos seguintes, ou seja, os prejuízos em apreço, na concepção da Requerente, indevidamente apurados nesse período (“ano zero”) foram, erradamente utilizados, no período de tributação de 2014 (“ano seis”) pelo que, entende que sempre pode ser corrigido pela AT dentro do prazo, uma vez que o mesmo tem impacto direto num ano ainda em aberto para efeitos, nomeadamente, de inspecção tributária.

Daí que, segundo a Requerente, tenham sido deduzidos ao lucro tributável que a F... reportou no RETGS do Grupo B..., no período de tributação de 2014, prejuízos fiscais apurados pela D... em 2008, no valor de € 91.395,70.

Segundo este entendimento da Requerente, tendo sido indevidamente apurado um prejuízo fiscal no exercício de 2008 e tendo esse prejuízo sido indevidamente utilizado em 2014, pelo facto do mesmo ser inexistente, o mesmo podia ser corrigido pela AT dentro do prazo do instituto em questão, porquanto o mesmo produziu efeitos na liquidação de IRC de 2014.

Daí que, segundo a tese defendida pela Requerente, nada obste a que a D... tenha procedido à submissão de Declaração Modelo 22 de substituição referente a 2008 e, consequentemente, à correção do prejuízo fiscal indevidamente apurado nesse período e utilizado erradamente no período de tributação de 2014.

Como foi já apreciado no âmbito da decisão que temos vindo a seguir, aqui “estão em causa, consequentemente, duas realidades distintas que devem ser apreciadas de forma distinta à luz do CIRC.

É que o artigo 45.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária é muito claro ao dispor que:

 “Em caso de ter sido efetuada qualquer dedução ou crédito de imposto, o prazo de caducidade é o do exercício desse direito.”

Por outras palavras, em caso de ter sido efetuada qualquer dedução de prejuízos, o prazo de caducidade é o do exercício do direito a deduzir prejuízos o qual, sendo de 6 anos, e tendo-se iniciado em 2008 cessou, consequentemente, em 2014.

A não ser assim, e a seguir-se o entendimento das Requerentes, o prazo de caducidade previsto no artigo 45.º, n.º 3 da LGT seria, no limite, de 12 anos (i.e. seis anos para a deduzidos aos lucros tributáveis de prejuízos fiscais mais seis anos para a empresa ou grupo de empresas onde tivessem sido contabilizados tais prejuízos).

Esta possibilidade não só não encontra suporte no texto da lei, em particular no artigo 45.º, n.º 3 da LGT, como seria até incompreensível à luz do regime jurídico-fiscal atual.

O prazo de caducidade de 12 anos apenas ocorre excepcionalmente, nos termos previstos na lei, que equivalem a situações muito gravosas e especiais, previstas no artigo 45.º, n.º 7 da LGT, em particular sempre que o direito à liquidação respeite a factos tributários conexos com país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, que devendo ser declarados à administração tributária o não sejam ou contas de depósito ou de títulos abertas em instituições financeiras não residentes em Estados membros da União Europeia, ou em sucursais localizadas fora da União Europeia de instituições financeiras residentes, cuja existência e identificação não seja mencionada pelos sujeitos passivos do IRS na correspondente declaração de rendimentos do ano em que ocorram os factos tributários.

Desta forma, a possibilidade de entrega da declaração de substituição pela D..., cessou, por caducidade, em 2014.

Considerando esse efeito extintivo para a possibilidade da entrega da declaração de substituição, face à caducidade em 2014, não pode ser aceite a declaração de substituição em apreço que foi submetida em 25 de novembro de 2015, já que referente a liquidação de 2008, nos termos do art. 122.º, n.º 1 do CIRC.

Está, assim, verificada, processualmente, a excepção peremptória extintiva.

Não desconsideramos que, quando da susbmissão, a declaração de substituição foi, conforme preconiza a Requerente, dada como “certa”.

Também, quanto a isto, já teve, o tribunal arbitral constituído e que decidiu no âmbito do processo n.º 10/2017-T, oportunidade de se pronunciar, posição com a qual concordamos.

Assim, pelo “(…) facto de a declaração de substituição ter sido dada como certa pelo sistema informático da AT não tem o significado que a Requerente pretende atribuir-lhe.

A declaração certa é aquela que não tem anomalias impeditivas de um eventual ato de liquidação, que se acha formalmente correta e é, em abstrato, suscetível de servir de base à liquidação.

O nº 5 do artigo 4º da portaria nº 1214/2001, de 23/10, invocado pela Requerente, evidencia isso mesmo – declaração certa é a que não contem erros suscetíveis de correção pelo declarante; por isto aí se dispõe que, se a declaração não for declarada certa, ele deve emendar os erros de que ela enferme, tudo com vista a possibilitar a eventual liquidação do imposto.

Mas daqui não pode retirar-se que a uma declaração que a Administração qualifica como “certa” se siga, inexoravelmente, a liquidação.

A tal liquidação podem opor-se obstáculos de outrem ordem, como é o caso da caducidade do respetivo direito.

Não podendo já a AT exercer o seu direito à liquidação, não pode, evidentemente, retirar consequências da declaração do contribuinte, esteja ela “certa” ou não.

Tal declaração, ainda que formalmente correta, e ainda que goze da presunção de veracidade do seu conteúdo, não pode ser considerada para exercer um direito que já não existe. É o que, como se viu, ora acontece”.

Desta forma, consideramos procedente a excepção de caducidade da declaração de substituição submetida em 25 de novembro de 2015 relativa ao exercício de 2008.

Por omissão de verificação dos requisitos legais cessa a aplicação do RETGS ao grupo de sociedades dominado pelo grupo C..., SGPS, S.A., nos termos do arts. 69.º, n.ºs 8 e 9 do CIRS.

Desta forma, improcede o pedido de anulação da decisão de indeferimento – na parte objecto da presente acção – da Reclamação Graciosa sub judice e, em consequência disso, improcede também o pedido de anulação do respectivo acto de liquidação de IRC.

 

ii. Da violação do princípio da proporcionalidade e do princípio da tributação do rendimento real:

 

Suscita, ainda a Requerente, que do incumprimento do art. 69.º do CIRC, perante a circunstâncias concretas que levaram à cessação da aplicação do RETGS, leva a uma decisão desadequada e violadora dos princípios gerais de direito violando-se, desde logo, o princípio da tributação do lucro real e o princípio da proporcionalidade.

Quanto a isto, também a decisão n.º 10/2017-T que temos vindo a seguir toma posição, com a qual concordamos e seguimos.

Vejamos.

Estabelece, na sua redacção actual, o n.º 8 do art. 69.º do CIRC:

“O regime especial de tributação dos grupos de sociedades cessa a sua aplicação nos seguintes casos:

a) Deixe de se verificar algum dos requisitos referidos no n.º 3 relativamente à sociedade dominante, sem prejuízo dos casos em que seja exercida a opção prevista no n.º 10; (Redação da Lei n.º 82-C/2014, de 31 de dezembro)

b) Se verifique alguma das situações referidas nas alíneas a), b), d) ou g) do n.º 4 relativamente à sociedade dominante;

c) O lucro tributável de qualquer das sociedades do grupo seja determinado com recurso à aplicação de métodos indiretos;

d) (Revogada.)

e) (Revogada.)

 

Por sua vez, o actual n.º 9 do mesmo preceito prevê que,

Os efeitos da renúncia ou da cessação no presente regime reportam-se:

a) Ao final do período de tributação anterior àquele em que foi comunicada a renúncia à aplicação no presente regime nos termos e prazo previstos no n.º 7;

b) (Revogada.)

c) Ao final do período de tributação anterior ao da verificação de qualquer dos factos previstos no n.º 8.”

 

Por sua vez o actual n.º 4 do artigo 69.º do CIRC determina o seguinte:

Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes:

a) Estejam inactivas há mais de um ano ou tenham sido dissolvidas;

b) Tenha sido contra elas instaurado processo especial de recuperação ou de falência em que haja sido proferido despacho de prosseguimento da acção;

c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos;

d) Estejam sujeitas a uma taxa de IRC inferior à taxa normal mais elevada e não renunciem à sua aplicação;

e) Adoptem um período de tributação não coincidente com o da sociedade dominante;

f) (revogada);

g) Não assumam a forma jurídica de sociedade por quotas, sociedade anónima ou sociedade em comandita por ações, salvo o disposto no n.º 11. (Retificada pela Declaração de Rectificação n.º 67-A/2009, de 11 de setembro)”

 

Quanto a isto, seguindo a posição Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 03/12/2014 (proc. nº 0256/12), que acolhemos, no qual considerou o seguinte:

«I - Para a existência de um grupo de sociedades para efeitos fiscais é necessário que uma sociedade, dita dominante, detenha, direta ou indiretamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto, há mais de um ano à data em que se inicia a aplicação do regime.

II - Relativamente às sociedades dominadas, não podem fazer parte do grupo as que, no início ou durante a aplicação do regime, registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, se a participação (de pelo menos 90% exigida à sociedade dominante) já for detida há mais de dois anos, o que no caso dos autos não ocorre quanto à sociedade dominada que, registando prejuízos nos três anos anteriores ao início do regime, era detida há menos de dois anos (v. alíneas C) a F) e H) do probatório supra.

III - Este regime especial de tributação reveste, assim, um aspeto dinâmico podendo cessar se deixarem de se verificar as respetivas condições, mas podendo também vir a ter lugar quando as condições não reunidas em determinado momento passarem a verificar-se

 

Por sua vez, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, proferido no âmbito do proc. nº 00065/11.0BEBRG, em 05/12/2016, decide que,

«V – O Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS) é aplicável, por opção, aos grupos de sociedades constituídos com base na relação de participação fixada no Código de IRC e que cumpram as condições previstas no artigo 63.º do mesmo Código (redacção dada pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29/12).

VI – A opção pela aplicação do RETGS deve ser comunicada à AT através do envio, por transmissão electrónica de dados, da competente declaração (prevista no artigo 110.º do Código de IRC), até ao fim do 3.º mês do período de tributação em que se pretende iniciar a aplicação do regime.

VII – As alterações na composição do RETGS, nomeadamente inclusão ou saída de sociedades dominadas, devem ser comunicadas pela sociedade dominante, através da competente declaração nos termos previstos no Código de IRC.

VIII – Todos os requisitos devem ser cumpridos, sob pena de cessação da aplicação do regime.

IX - Ocorrendo a saída de sociedades do grupo, por alteração da sua composição, e a sociedade dominante não optando, com observância de todos os requisitos legais relativos ao perímetro do grupo, pela continuidade do regime dentro do prazo legal, ou seja, no caso, até 31/03/2008, cessa a aplicação do RETGS em 31/12/2007 – cfr. artigo 63.º, n.º 7, alínea b), ii), n.º 8, alínea e) e n.º 9, alínea b) do Código de IRC (redacção dada pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29/12).» (destaques nossos).

            Assim,

            Nos termos das decisões citadas entende-se que as normas previstas no CIRC em apreço têm carácter imperativo.

            Significa isto que não é concedida à AT qualquer margem de discricionariedade conforme decisão n.º 10/2017-T que temos vindo a perfilhar e que prevê que “(…) na sua aplicação uma vez que o n.º 8 do referido artigo elenca e determina, de forma expressa e inequívoca, os casos em que o regime especial de tributação dos grupos de sociedades cessa a sua aplicação, remetendo, nomeadamente, para as situações referidas nas alíneas a), b), d) ou g) do n.º 4 do artigo 69.º, relativamente à sociedade dominante”.

            A sujeição da AT ao princípio da legalidade, nos termos dos arts. 266.º, n.º 2 da CRP, 8.º da LGT e 3.º, n.º 1 do CPPT, no que tange à aplicação das normas imperativas, em que lhe está vetada qualquer aplicação discricionária, implica que a AT verifique, objectivamente, os requisitos de aplicação da norma, como fez in casu e aplicou cabalmente tendo decidido em conformidade com a lei.

            Conforme decisão n.º 10/2017-T, sobre este tema, a “(…) a AT não dispõe de margem de discricionariedade na aplicação das normas previstas no artigo 69.º, n.ºs 8 e 9 do CIRC não podendo, por isso, considerar a aplicação do princípio da proporcionalidade na actividade ordinária de mera aplicação deste preceito porquanto a convocação deste princípio não é permitida pelo legislador ordinário (o que não invalida, naturalmente, que possa ponderar a validade constitucional da norma em apreço à luz do princípio da proporcionalidade que decorre da Constituição, como de seguida se analisará).

(…)

A Requerida AT apenas podia atuar em conformidade com o princípio da proporcionalidade se pudesse adotar, de entre as medidas necessárias e adequadas para atingir esses fins, aquelas que impliquem menos gravames, sacrifícios ou perturbações à posição jurídica dos administrados.

Ora, neste caso, não existe um leque de medidas a adoptar.

Apenas uma consequência é (era, na redacção aplicável) associada à verificação do incumprimento dos requisitos previstos no artigo 69.º, n.ºs 8 e 9 do CIRC: a cessação da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades.

O regime previsto nos n.ºs 8 e 9 do artigo 69.º do CIRC – em particular resultante da alínea c) do n.º 4 do artigo 69.º, como ocorre no caso sub judice – determina a imposição de uma sanção – a cessação da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades – que não permite qualquer margem de apreciação por parte da administração fiscal.

            Na situação em concreto, a Requerente suscita a onerosa carga que para a Requerente e restantes sociedades do Grupo é aplicada decorrente da utilização desta medida (cessação da aplicação do RETGS), é totalmente desproporcional, desajustada e desmedida com o impacto financeiro e fiscal que a sociedade D... aporta ao RETGS.

A sociedade D... representa, segundo a Requerente, 0,23% do total do volume de negócios de todas as sociedades incluídas no perímetro do RETGS. Pelo que, segundo a Requerente, não se pode reputar de legítima uma situação em que a sociedade que representa apenas 0,23% do total de volume de negócios do total das sociedades que compõe o RETGS acaba por onerar tão fortemente um grupo económico da dimensão do Grupo B... podendo, inclusivamente, colocar em causa a viabilidade económica financeira do Grupo, no seu todo.

            É certo que o argumento importa que se discuta as consequências fiscais na exclusão da aplicação do RETGS por se poderem apresentar excessivas quando analisado, em concreto, o conjunto das sociedades e respectivo impacto fiscal podendo, até, suscitar-se o princípio da proporcionalidade que resulta da Constituição e a consequente análise deste, à luz do regime legal que resulta do disposto no artigo 69.º, n.ºs 8 e 9 do CIRC por forma a ajuizar da conformidade constitucional deste preceito.

            Na senda da decisão n.º 10/2017-T esse regime legal que resulta do disposto no artigo 69.º, n.ºs 8 e 9 do CIRC visa “(…) justamente efectivar e potenciar a igualdade dos contribuintes perante a lei fiscal.

A imposição da sanção foi elaborada pelo legislador, em termos gerais e abstractos, estatuindo que a verificação do incumprimento das condições previstas tem, como consequência, a cessação da aplicação do regime especial e a inerente aplicação das normas gerais de tributação a cada sociedade.

A não ser assim, e se acaso a lei permitisse a aplicação, a casos concretos, de alguma ponderação, teria de se encontrar o critério ou os critérios que autorizariam a

administração fiscal a desaplicar a lei ou a aplicá-la de forma ponderada, o que colocaria

necessariamente em crise o princípio da legalidade tributária.

Dito de outra forma, a cessação da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades pode decorrer do incumprimento, por uma ou várias sociedades menos relevantes, financeiramente, no contexto do grupo ou do incumprimento por uma ou várias sociedades muito relevantes financeiramente”.

Qualquer outro cenário, mormente de aplicação casuísta, não só é excluído pela natureza imperativa das normas, como se imporia que fosse o legislador a ponderar e prever qualquer outra forma, progressiva ou gradativa que implicasse uma eventual desaplicação parcial por exemplo.

Mas não o fez, nem permitiu que a AT o fizesse.

Não só não está previsto como a AT não tem qualquer margem de discricionariedade para o fazer, nem se pode conceber a desaplicação casuística da sanção legal já que o art. 69.º determina taxativamente que o regime especial de tributação dos grupos de sociedades cessa a sua aplicação quando se verifique alguma das situações previstas no n.º 4 e a respectiva sociedade não seja excluída do grupo ao qual o regime está a ser ou pretende ser aplicado, como aconteceu in casu.

 

Sendo que a verificação e prova das condições de aplicação do regime especial de tributação de grupo de sociedades compete à sociedade dominante nos termos do art. 69.º, n.º 12 do CIRC. Verificação e prova que a Requerente não fez.

Se não estão verificados os requisitos legais, não se poderia conceber, contra normas imperativas, a desaplicação da respectiva sanção, o que seria uma solução sem qualquer cabimento na lei, pelo que não poderia a AT actuar em conformidade com a mesma.

Correndo-se o risco de dar causa a regimes legais casuísticos decididos pela AT.

O legislador foi claro nos requisitos de aplicação do regime legal ema preço do art. 69.º do CIRC que se verifica in casu sem qualquer dúvida sendo que a sociedade dominante deveria ter verificado por forma a decidir pela aplicabilidade, ou não, do RETGS.

Posição legal que se encontrava em vigor e que a Requerente conhecia, mormente na análise e planeamento fiscal, e que incumpriu.

Na senda da decisão do CAAD que temos vindo a seguir “o legislador fiscal, ao determinar regras claras e objetivas para a cessação da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, como aquelas que constam do artigo 69.º, n.ºs 4; 8 e 9 do CIRC, facilmente compreensíveis e até antecipáveis no contexto do planeamento fiscal, não ofendeu o princípio da proporcionalidade que se extrai da Constituição”.

            Consideramos que o regime legal não ofende, assim, o princípio da proporcionalidade.

            Nem, como entende a Requerente, que a aplicação da cessação, in casu, do regime especial de tributação dos grupos de sociedades viola o princípio da tributação do rendimento real.

            Nos termos do acórdão do Tribunal Constitucional nº. 139/2016, citando o acórdão do mesmo Tribunal nº 753/14 «ainda que, em tese geral, o princípio da capacidade contributiva implique que deva ser considerado como tributável apenas o rendimento líquido, com a consequente exclusão de todos os gastos necessários à produção ou obtenção do rendimento, o certo é que não pode deixar de reconhecer-se ao legislador – como admite a doutrina – «uma certa margem de liberdade para limitar a certo montante, ou mesmo excluir, certas deduções específicas, que, embora relativas a despesas necessárias à obtenção do correspondente rendimento, se revelem de difícil apuramento» (Casalta Nabais, ob. cit., pág. 521) [a obra em causa é O Dever Fundamental de Pagar Impostos]. O ponto é que tais limitações ou exclusões tenham um fundamento racional adequado e se apliquem à generalidade dos rendimentos em causa.

Trata-se de opções de política fiscal que assentam numa ideia de praticabilidade, que exige ao legislador a elaboração de leis cuja aplicação e execução seja eficaz e económica ou eficiente, e que conduzam a resultados consonantes com os objetivos pretendidos. Com essa finalidade, com que se pretende também assegurar os princípios materiais da igualdade e da justiça fiscal, é constitucionalmente justificável que o legislador possa recorrer não apenas às referidas presunções legais, mas também a técnicas de tipificação e de simplificação, que permitam disciplinar certos aspetos do direito dos impostos segundo critérios de normalidade, afastando as situações atípicas ou anormais (idem, págs. 622-623).

[…] Como se deixou exposto num outro momento, o artigo 104.º, n.º 2, não institui um critério absoluto e rigoroso de tributação das empresas segundo o lucro real, apontando antes para uma aproximação tendencial entre a matéria coletável e os lucros efetivamente auferidos, sem excluir o recurso a rendimentos presumidos e a métodos indiciários”.

Conforme decisão proferida no âmbito do proc. N.º 10/2017-T “Ainda quanto ao princípio constitucional da tributação pelo rendimento real, refira- se que em nada este sai beliscado, no caso dos autos, pois que a norma constitucional introduz um elemento moderador, o advérbio «fundamentalmente» - cfr. Acórdão do STA proferido no proc. 0959/06, em 15-02-2007.

Pode assim concluir-se que a opção tomada pelo legislador no CIRC e, em particular, no artigo 69.º, encontra inscrição na margem de conformação do legislador fiscal, sendo insusceptível de fundar autónoma censura constitucional uma vez que tem o propósito de criar regras jurídicas precisas e rigorosas, adequadas ao princípio da certeza e segurança jurídica que devem igualmente nortear o legislador fiscal, e que, como tal, podem facilmente ser interpretadas e cumpridas pelo contribuinte o que, no caso em apreço, não terá sucedido”.

            Desta forma, conclui-se que não existe qualquer violação do princípio da tributação do rendimento real.

            Acresce que também não há, da alteração superveniente ao regime jurídico aplicável, e que aqui consideramos para o exercício de subsunção para os factos constitutivos tributários com a Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, qualquer dúvida substancial para alterar a posição já descrita, como pretende a Requerente nas suas alegações.

            Com efeito, por um lado a existência de uma alteração legislativa, ainda que inclua normas revogatórias, não importa – nem desta resulta da sua exposição de motivos qualquer questão sobre a inconstitucionalidade do regime anterior, e aplicável ao caso – qualquer aceitação que o regime até então vigente padece de qualquer vício, mormente de violação de qualquer princípio enformador da lei fundamental. Por outro lado, a alteração legal não tem qualquer efeito retroactivo que implique uma aplicação ao caso sub judice; tem, como teria de ser, efeitos prospectivos, vigorando para todos os factos tributários anteriores à entrada em vigor da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, o regime que temos vindo a considerar e que é o aplicável à situação que a Requerente trouxe a juízo.

            Para além disso, a alteração legal referida não altera a apreciação de mérito do regime vigente aplicável ao caso concreto, pelo que é de manter a posição assumida em matéria de apreciação da constitucionalidade do regime jurídico e que, aqui, por brevidade, damos por reproduzido.

 

            Pela posição assumida encontra-se decidida a relação material controvertida sendo que demais questões suscitadas pelas partes não serão apreciadas por absoluta desnecessidade face à posição já assumida para as questões decidendas. 

           

Assim,

Face ao exposto, pelos fundamentos invocados, conclui-se pela legalidade da liquidação impugnada.

 

  1. Da responsabilidade pelo pagamento de custas arbitrais:

Nos termos do artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, ex vi 29.º, n.º 1, e) do RJAT, estabelece que será condenada em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

Em face do exposto deve a Requerente ser condenada em custas.

 

  1. Decisão:

Nestes termos e com a fundamentação supra, o tribunal decide,

  1. Julgar improcedentes as excepções suscitadas;
  2. Julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral;

c.   Condenar a Requerente no pagamento das custas do presente processo.

 

6. Valor do processo:

De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de € 1.734.668,46.

 

7. Custas:

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €22.950,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 12 de Outubro de 2018.

 

O Árbitro Presidente

 

 

(Fernanda Maçãs)

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

(Paulo Nogueira da Costa)

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

(Marisa Almeida Araújo)



[1] Cfr., a título de exemplo, o acórdão arbitral proferido no âmbito do Processo n.º 686/2017-T.