Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 274/2013-T
Data da decisão: 2014-08-12  Selo  
Valor do pedido: € 12.486,80
Tema: Verba 28 da TGIS
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Decisão Arbitral

 

 

Processo n.º 274/2013-T

 

 

 

I – RELATÓRIO

 

  1. A… (de ora em diante identificado apenas por Requerente), com o Número de Identificação Fiscal …, residente na Rua …, Lisboa, apresentou em 29 de Novembro de 2013, um pedido de constituição de Tribunal Arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2º e 10º do Decreto-Lei 10/2011 de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, de ora em diante identificado apenas pelas iniciais RJAT).

 

  1. No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente optou por não designar árbitro.

 

  1. Nos termos do nº 1 do artigo 6º do RJAT, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem designou árbitro singular.

 

  1. Em 3 de Fevereiro de 2014, o Tribunal Arbitral foi devida e regularmente constituído para apreciar e decidir o objecto do processo.

 

  1. Em 13 de Maio de 2014, foi proferido o seguinte despacho:

 

“Notifique-se as Partes para, no prazo de 10 dias, se pronunciarem sobre a não realização da reunião prevista no artigo 1º do RJAT.

Concordando as Partes com a não realização da referida reunião, consideram-se notificadas para, no prazo de 10 dias, a contar do termo do prazo referido supra, apresentarem, de forma sucessiva, começando pela Requerente, e por escrito, as suas alegações”.

 

  1. Na sequência deste despacho, em 2 e 11 de Junho de 2014, Requerente e a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), na qualidade de Requerida, apresentaram as suas alegações, respectivamente.

 

  1. O Requerente pretende, com o pedido de constituição do Tribunal Arbitral a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação (notificados através dos documentos de cobrança com os nºs 2013 … todos de 14.07.2013) de Imposto do Selo (IS) que, ao abrigo da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, incidiu sobre o prédio urbano com o artigo matricial 86, sito na Rua …, Distrito e Concelho de Lisboa, freguesia da …, de que é proprietário.

 

  1. Sustenta o Requerente, em síntese, a sua pretensão, no seguinte:

 

  1. Que, de acordo com a respectiva caderneta predial urbana, o prédio identificado supra se encontra constituído em propriedade vertical;
  2. Que, ainda de acordo com a referida caderneta, o prédio é constituído por três andares ou divisões independentes, correspondentes ao Rés-do-Chão, Primeiro Andar e Segundo Andar, sendo que todos eles estão afectos a habitação e são de utilização independente;
  3. Que as liquidações contestadas se basearam no Valor Patrimonial Tributário (VPT) resultante da avaliação que lhe foi notificada em 28 de Maio de 2013, sendo que no entendimento do Requerente e em face das normas aplicáveis, se impunha o VPT vigente a 31 de Dezembro de 2012;
  4. Que o VPT vigente a 31 de Dezembro de 2012, ao contrário do que sustenta a Autoridade Tributária (AT), já era o VPT actualizado nos termos do Código do IMI (CIMI);
  5. Os actos de liquidação da AT baseiam-se no entendimento que um edifício constituído em propriedade total, ainda que com partes ou divisões susceptíveis de utilização independente, integra o conceito jurídico de prédio e deve ser visto e tratado como uma única unidade, cujo VPT é determinado pela soma das partes com afectação e sendo essa some superior a € 1.000.000,00 há sujeição a IS no âmbito da verba 28 da TGIS;
  6. Este entendimento da AT não tem, para o Requerente qualquer sustentação na lei, mais concretamente na redacção da verba 28 e das normas que, no âmbito da Lei 55-A/2012 de 29 de Outubro, acompanharam a criação daquela verba 28 da TGIS e ainda nas normas constante do Código do IMI (CIMI) para onde remete o Código do Imposto do Selo;
  7. Assim, da norma de incidência constante da citada verba 28 da TGIS, resulta que o pagamento de IS depende de duas circunstâncias, a saber:
  • De o VPT constante da matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00;
  • De o prédio se encontrar afecto à habitação
  1. Nos termos das disposições constantes do Código do Imposto do Selo (CIS) e da Lei 55-A/2012 (cf. artigos 5º al. u) e 23º nº 7 do CIS e artigo 6º nº 2 da Lei 55-A/2012), o CIMI surge como normativo de referência no âmbito da liquidação do IS previsto na verba 28 da TGIS, sendo que, para efeitos de liquidação de IS, será relevante o VPT que no mesmo ano seja utilizado para efeitos de IMI;
  2. Nos termos do artigo 113º do CIMI, o imposto é liquidado anualmente, no ano seguinte ao que o imposto e tendo por base o VPT constante da matriz a 31 de Dezembro do ano a que o imposto respeita, pelo que o IS subjacente as liquidações contestadas deveria ter incidido sobre o VPT constante da matriz a 31 de Dezembro de 2012;
  3. No presente caso, e ao contrário do que sustentam as normas aqui citadas, a AT, nas liquidações de IS de 2012, sobre os andares susceptíveis de utilização independente que compõem o prédio, utilizou o VPT apurado no âmbito da avaliação geral de imóveis prevista na Lei 60-A/2011 de 30 de Novembro, que apenas foi notificado ao Requerente em 28 de Maio de 2013, o que, no entendimento deste, é totalmente inaceitável porque representa a aplicação retroactiva deste resultado da avaliação;
  4. Não tendo sido cumprida o prazo a que o legislador se propôs, na Lei 60-A/2011, para ter o processo de avaliação geral dos imóveis concluído – 31 de Dezembro de 2012 – tem que se atender ao que dispõem as regras de liquidação, mais concretamente ao que dispõe o já citado artigo 113º do CIMI, o qual estipula que o IMI é liquidado com base no VPT que conste da matriz a 31 de Dezembro do ano a que respeita;
  5. Considerando que a avaliação só foi notificada em 28 de Maio de 2013 e que, nos termos da lei, apenas se torna definitiva 30 dias depois, em 31 de Dezembro de 2012 o VPT que deveria ter sido considerado era, repete o Requerente, o que constava na matriz nesta data, à semelhança do que se verificou, aliás, para o IMI;
  6. Ora, sendo o VPT que consta da matriz, em 31 de Dezembro de 2012, quer o de qualquer das unidades/fracções susceptíveis de utilização independente, quer o que resultaria da soma dessas fracções, inferior a € 1.000.000,00, não deveria ter sido despoletada a tributação em IS pretendida pela AT;
  7. Pelo que o facto tributário inexiste e a correspondente liquidação é ilegal para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS, porque o resultado da avaliação apenas produz efeitos para o ano de 2013;
  8. Para além do valor do VPT sobre o qual incidiram as liquidações de IS, o Requerente suscita ainda a ilegalidade dessas mesmas liquidações resultante da não autonomização dos valores patrimoniais tributários de cada andar ou divisão susceptível de utilização independente;
  9. Depois de transcrever os artigos 2º e 12º do CIMI, o Requerente conclui pela ilegalidade das liquidações porque se basearam e incidiram sobre o VPT resultante da soma dos diferentes andares ou divisões susceptíveis de utilização independente;
  10. Na verdade, entende o Requerente que, sendo o IMI o quadro de referência desta nova forme de tributação, impunha-se, para efeitos de liquidação do IS e à semelhança do que se verifica naquele imposto, a total autonomização das fracções susceptíveis de uma utilização independente, como acontece, aliás, no caso das fracções autónomas de prédios em propriedade horizontal;
  11. Efectivamente, em sede de IMI, a inscrição na matriz de imóveis em propriedade total, quando constituídos por unidades independentes, é realizada separadamente, discriminando-se individualmente o VPT de cada parte do prédio;
  12. Para além disso, neste caso, a AT emite, para efeitos de IMI, documentos de cobrança individualizados;
  13. Atendendo aos argumentos referidos, conclui o Requerente que, “… tendo em consideração que a liquidação do Imposto do Selo deverá obedecer ao valor patrimonial tributário resultante das regras constantes do CIMI, e que a incidência objectiva do imposto constitui a propriedade do prédio urbano afecto a habitação cujo valor patrimonial tributário constante da matriz iguale ou supere € 1.000.000, na liquidação de Imposto do Selo sobre imóveis em propriedade plena deverá ser respeitada a individualização que na matriz é feita relativamente a cada andar ou fracção susceptível de utilização independente.”;
  14. Acresce que, dada a identidade desta situação com a situação em que os prédios estejam em propriedade horizontal, não considerar esta forma de tributação separada e individualizada de cada fracção susceptível de utilização independente, constituiria uma clara violação do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado;
  15. Assim, ainda que a afectação das três fracções independentes seja habitacional, não deve haver lugar à liquidação de IS, porque nenhum dessas fracções tem, por si só, um VPT igual ou superior ao limite de € 1.000.000,00 legalmente consagrado.

 

  1. Na sua contestação a AT, Requerida neste processo, invocou, o seguinte:

 

  1. Não é verdade o alegado pelo Requerente que a avaliação geral dos prédios deveria estar concluída até Novembro de 2012, porque o prazo de 10 anos deve ser contado a partir de 2003-12-01, terminando, dessa forma em 2013-12-01 e não em Novembro de 2012;
  2. Para além disso, apesar de o processo geral de avaliação, decorrente da obrigação assumida perante os credores internacionais e consagrado na Lei 60-A/2011, ter terminado já no ano de 2013, o legislador foi bem claro, na referida Lei, em pretender utilizar os novos valores patrimoniais tributários resultantes daquele processo, relativamente aos sujeitos passivos que constavam das matrizes a 31 de Dezembro de 2012;
  3. Em defesa deste entendimento, a AT cita e transcreve (parcialmente) a Circular nº 4/2013 da Direcção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis;
  4. Quanto à retroactividade da norma suscitada pelo Requerente, considera a AT, na medida em que não se está perante uma situação de retroactividade autêntica, que é o único caso em que a Constituição impõe uma proibição de retroactividade à lei fiscal (para o efeito, a Requerida indica diversos acórdãos do Tribunal Constitucional em que esta posição vem expressa);
  5. Porque, já a partir de 1 de Dezembro de 2011 (com a entrada em vigor da Lei 60-A/2011), o legislador deixou bem claro que ao facto tributário a ocorrer em 31 de Dezembro de 2012 já iria ser aplicado um novo VPT, mesmo que esse VPT fosse calculado já no ano de 2013.
  6. Ou seja, a alteração legislativa operada pela Lei 60-A/2011 anunciou, com mais de um ano de antecedência, o aumento de IMI a pagar pelos proprietários de imóveis não avaliados à luz do CIMI relativamente ao período de 2012.
  7. Em conclusão, sustenta a Requerida que, na situação em análise, não se verifica qualquer “cerceamento” dos princípios da confiança e da segurança jurídica, pois com a publicação da Lei 60-A/2011, todos os contribuintes fiscais ficaram cientes das consequências do novo regime nela previsto, nomeadamente do estatuído no artigo 15º-D/A do DL 287/2003;
  8. Quanto à ilegalidade resultante da não autonomização dos VPT de cada andar susceptível de utilização independente, a AT manifesta igualmente total desacordo com as posições assumidas pelo Requerente;
  9. Na verdade, entende a AT que a propriedade plena e a propriedade horizontal não constituem, de todo, realidades jurídicas substancialmente idênticas, porque foi o próprio legislador fiscal que entendeu que apenas as fracções sujeitas ao regime da propriedade horizontal é que poderiam adquirir o estatuto de prédio, pelo que, só com uma mudança da natureza das fracções susceptíveis de utilização independente, ou seja, só com a efectiva constituição da propriedade horizontal, é que essas fracções são consideradas prédios;
  10. Para a Requerida, o VPT de um prédio urbano em regime de propriedade total, resulta, necessariamente da soma dos valores patrimoniais dos andares susceptíveis de utilização independente, posição esta que tem suporte, quer na redacção do artigo 7º nº 2 al. b) do CIMI, quer em alguma doutrina, sendo citadas e parcialmente transcritas, para este efeito, as obras de Joaquim Silvério Mateus e Corvelo de Freitas (“Os impostos sobre o património imobiliário”) e de Martins Alfaro (Código do IMI Anotado e Comentado);

 

  1. Notificadas para o efeito, por despacho datado de 13 de Maio de 2014 (cf. ponto 6 deste acórdão, supra), as Partes apresentaram, por escrito, as suas alegações, onde mantiveram os argumentos deduzidos no requerimento inicial – o Requerente – e na contestação - a Requerida.

 

 

II – FACTOS PROVADOS

 

  1. O Requerente foi notificado dos actos de liquidação (notificados através dos documentos de cobrança com os nºs … todos de 14.07.2013)) de Imposto do Selo (IS) que, ao abrigo da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, incidiu sobre o prédio urbano com o artigo matricial 86, sito na Rua do …, nº 14, Distrito e Concelho de Lisboa, … .
  2. A liquidação teve como fundamento o facto de a AT ter considerado que o VPT do prédio, correspondente à soma dos VPT das três unidades/fracções que o compõem, era superior a € 1.000.000,00.
  3. O Requerente é dono e legitimo proprietário do prédio identificado no número 1 supra.
  4. O prédio, apesar estar em regime de propriedade vertical, tem três unidades/fracções susceptíveis de utilização independente, correspondentes ao rés-do-chão, primeiro e segundo andares, sendo que, para cada uma destas fracções foi apurado, pela AT, um VPT de forma autónoma e independente.
  5. O VPT de cada uma das unidades/fracções susceptíveis de utilização independente é inferior a € 1.000.000,00
  6. Os VPT nos quais a AT fundamentou a aplicação da verba 28.1 da TGIS, foram notificados ao Requerente em 28 de Maio de 2013.
  7. O Requerente não deduziu reclamação graciosa destas liquidações tendo procedido directamente à sua impugnação perante o Tribunal Arbitral através de pedido formulado em 29 de Novembro de 2013.
  8. O Tribunal Arbitral foi devida e regularmente constituído em 3 de Fevereiro de 2014.
  9. Os factos acima mencionados resultam provados pelos documentos anexados pelas partes, não se tendo provado outros factos considerados relevantes para a decisão objecto do presente processo.

 

 

Cumpre, agora, apreciar e decidir.

 

 

III – DECISÃO

 

No entendimento deste Tribunal, são duas as questões fundamentais que devem ser objecto de análise.

A primeira é a de apurar o VPT sobre o qual deveria incidir o IS, isto é, se o VPT que constava da matriz em 31 de Dezembro de 2012, se o VPT que serviu de base à liquidação e que foi notificado ao Requerente apenas em 28 de Maio de 2013.

A segunda questão é a de determinar qual, em sede da verba 28 da TGIS, o valor tributável sobre o qual deve incidir o IS, quando se trate de um prédio em propriedade total (ou vertical) constituído por unidades/fracções susceptíveis de utilização independente. Decidir, dessa forma, se o IS deverá incidir sobre a soma dos VPT dessas fracções ou se, pelo contrário, o IS deve incidir sobre cada uma dessas fracções susceptíveis de utilização independente e correspondente VPT.

 

 

  1. DA DETERMINAÇÃO DE QUAL O VPT SOBRE O QUAL DEVE INCIDIR O IMPOSTO DO SELO.

 

  1. Como se referiu na introdução deste capítulo da decisão, a questão que está em análise é a de saber se a liquidação de IS ao abrigo da verba 28 da TGIS deve considerar o valor inscrito na matriz predial do prédio objecto de tributação em 31 de Dezembro de 2012 ou se se deve considerar o valor notificado ao Requerente em 28 de Maio de 2013, resultante já do processo de avaliação geral determinado pela Lei 60-A/2011.

 

  1. Das disposições aplicáveis, especialmente da norma transitória prevista na Lei 55-A/2012, o Código do IMI é o normativo de referência para efeitos de liquidação do IS, sendo de notar, com particular ênfase, o estabelecido no nº 2 do citado artigo 6º da referida Lei.

 

  1. De acordo com este preceito “Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba nº 28 da respectiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efectuar nesse ano.

 

  1. Ora, para este feito, dispõe o artigo 113º do CIMI que este imposto é liquidado anualmente, “… tendo por base o VPT constante da matriz a 31 de Dezembro do ano a que o imposto respeita.

 

  1. Daqui resulta, de forma clara, que a matéria colectável sobre a qual deve incidir o IS previsto na verba 28 da TGIS, deve ser o VPT constante da matriz a 31 de Dezembro de 2012, uma vez que nos termos do nº 1 do artigo 113º do CIMI, o imposto é liquidado com base nos VPT dos prédios que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita

 

  1. Ora, apesar do imposto ser liquidado apenas em 2013, nos termos, aliás, do previsto no nº 2 do artigo 113º do CIMI, ele respeita, inequivocamente ao ano anterior, ou seja, 2012.

 

  1. Pelo que o VPT a considerar só pode ser, nos termos da legislação aplicável, o que estava inscrito na matriz a 31 de Dezembro de 2012.

 

  1. Acresce que, no que se refere ao IMI liquidado ao Requerente, foi esse o valor sobre o qual incidiu este imposto.

 

  1. A adoptar-se o VPT que resultou do processo de avaliação geral promovida pela AT, na sequência do Memorando de Entendimento celebrado pelo Estado Português com os credores internacionais, estar-se-ia, na opinião do Tribunal, perante uma aplicação retroactiva do resultado dessa avaliação.

 

  1. Assim, como se refere na sentença proferida no âmbito do processo 225/2013-T do CAAD, “… determina o artigo 103º nº 3 da Constituição da Republica Portuguesa que não podem ser criados impostos retroactivos, o que, conjuntamente com o princípio da segurança jurídica impede, a nosso ver, que o ato tributário de fixação de valor ocorrido em 2013 se repercuta sobre um facto jurídico ocorrido em 2012.”

 

 

  1. Ora, sendo o VPT do prédio sobre o qual incidiu a tributação, em 31 de Dezembro de 2012 inferior a € 1.000.000,00, mesmo assumindo (com o que não concordamos, como veremos adiante) que o IS incide sobre a propriedade total e não fraccionada, não se encontra, desta forma, preenchido um dos requisitos essenciais para a verificação da norma de incidência, logo da liquidação do imposto.

 

  1. Pelo que, neste particular, as liquidações contestadas são ilegais, devendo, por isso, ser anuladas.

 

 

  1. DA INCIDÊNCIA DO IS PREVISTO NA VERBA 28 DA TGIS EM CASO DE IMÓVEL DETIDO EM REGIME DE PROPRIEDADE TOTAL MAS COMPOSTO POR FRACÇÕES SUSCEPTÍVEIS DE UTILIZAÇÃO INDEPENDENTE.

 

  1. A questão a decidir, foca-se, essencialmente, em determinar se no âmbito de incidência do IS prevista na verba 28 da TGIS se incluem os prédios habitacionais que, não estando constituídos em propriedade horizontal, sejam compostos por fracções/unidades susceptíveis de utilização independente e cujo VPT é inferior a € 1.000.000,00, mas em que a soma dos VPT dessas mesmas fracções é superior a este montante.

 

  1. A norma de incidência constante da verba 28 da TGIS refere que ficam sujeitos a este imposto os prédios urbanos cujo VPT, constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1.000.000,00.

 

  1. Tal como já se verificou anteriormente, também nesta questão, em virtude da norma de remissão constantes do artigo 67º nº 2 do Código do IS, teremos que nos socorrer das regras do IMI quanto ao tratamento que é dado às partes de prédios urbanos susceptíveis de utilização independente, especialmente quanto à determinação do seu VPT.

 

  1. Assim, nos termos do artigo 12º nº 3 do CIMI, que define o que se considera matriz predial “cada andar ou parte de prédios susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina o respectivo valor patrimonial tributário”.

 

  1. Consagra, pois, a lei, uma verdadeira autonomização “fiscal” das fracções de um prédio susceptíveis de utilização independente, autonomização essa que também se verifica, aliás, quanto às regras de liquidação, conforme resulta claro do disposto no artigo 119º do CIMI.

 

  1. De acordo com o último dos citados preceitos, quando se trata de um prédio em propriedade vertical, mas com fracções susceptíveis de utilização independente, a liquidação do IMI não tem como referência o somatório dos valores patrimoniais das diversas partes autónomas, mas tão só o valor atribuído a cada uma delas.

 

  1. Resulta, pois, das regras aplicáveis do CIMI, para as quais, repita-se o Código do IS expressamente remete, que as unidades/fracções autónomas de prédios urbanos têm total autonomia, quer em termos de avaliação, quer de liquidação do imposto.

 

  1. Conforme sentença proferida no processo nº 248/13-T do CAAD, com que este Tribunal concorda, “Ao referir-se ao valor patrimonial considerado para efeitos de IMI, a norma de incidência e quantificação do imposto do selo a que se refere a verba 28 da respectiva Tabela, não pode senão apelar para a realidade acima descrita, ou seja, para o valor patrimonial tributário considerado em sede de IMI relativamente a cada parte do prédio urbano susceptível de utilização independente.” (sublinhado nosso).

 

  1. Sendo, neste processo, a questão em tudo idêntica à que foi tratada e analisada no citado processo (248/13-T), e concordando com o seu conteúdo, adere-se integralmente à conclusão nele expressa e aqui transcrita.

 

  1. No mesmo sentido, aliás, já se tinham pronunciado os Juízes Árbitros em processos arbitrais do CAAD, como, por exemplo, entre outros, nos processos 50/2013-T, 132/13-T e/ou 181/13-T.

 

  1. Assim sendo, entende o Tribunal que, também neste particular, as liquidações estão feridas de ilegalidade, devendo, consequentemente, ser anuladas.

 

 

  1. CONCLUSÃO

 

Decisão: Face ao exposto, decide-se pela procedência do pedido de anulação dos actos de liquidação de IS constantes dos documentos de cobrança com os nºs … todos datados de 14.07.2013.

 

Desta forma, mostrando-se procedente o entendimento dos Requerentes quanto à questão da ilegalidade dos actos de liquidação de IS, torna-se desnecessário verificar da procedência da alegação de outros vícios das liquidações ora impugnadas, com excepção do pedido formulado pela Requerente de a AT ser condenada, desde já, a reembolsá-lo dos encargos suportados com a prestação da garantia bancária para suspender o processo de execução fiscal.

Quanto a este pedido, entende o Tribunal, tal como defendido pela AT na sua contestação, que este pedido não deve ser formulado nesta sede, mas antes em sede de Execução de Julgado.

 

Valor do processo: € 12.486,60

 

Custas do processo: Custas calculadas em conformidade com a Tabela I do regulamento de custas dos processos de arbitragem tributária em função do valor do pedido, a cargo da Requerida e que fixo em 918,00 (novecentos e dezoito euros)

 

 

Lisboa, 12 de Agosto de 2014 

 

 

Notifique-se

 

 

O ÁRBITRO

 

 

 

 

 

 

 

 

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.