Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 570/2014-T
Data da decisão: 2015-02-02  Selo  
Valor do pedido: € 10.667,60
Tema: IS – Verba 28 TGIS - Terreno para construção
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

 

A – RELATÓRIO

 

1.    A, LDA., pessoa colectiva n.º …, com sede na Rua … Vizela, veio requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos art. 2º, n.º 1, a) e 10º, n.º 1 e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no DL 10/2011, de 20 Janeiro, doravante designado “RJAT” e dos artigos 1º e 2º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, tendo em vista a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de Imposto do Selo, referente ao ano de 2013, e o reconhecimento ao direito a juros indemnizatórios, sendo requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “AT”).

 

2.    Admitido o pedido de constituição do tribunal arbitral singular, e não tendo a requerente optado pela designação de árbitro, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou o signatário como árbitro.

 

       As partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do disposto no artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico, tendo, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral ficado constituído em 01-10-2014.

 

3.    Notificada, a AT veio apresentar resposta em que não suscitou qualquer excepção.

 

4.    Foi dispensada, com a anuência das partes, a realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT, bem como a apresentação de alegações.

 

5.    Pretende a requerente que seja declarada a ilegalidade e inerente anulação do acto de liquidação do Imposto do Selo relativo ao ano de 2013, com a consequente restituição do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios, alegando em síntese:

 

       a)  Foi notificada da liquidação de Imposto de Selo n.º 2014 …, do ano de 2013, no valor de 10.667,60 €, relativa ao prédio urbano sito na … União das freguesias de … (… e …), concelho de Vizela, inscrito na matriz predial sob o artigo ….

       b)  A liquidação de imposto de selo em causa foi efetuada com fundamento na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), com a redação que lhe foi introduzida pela Lei n.º 55-A/2012 de 29 de outubro (Lei do Orçamento de Estado para 2013).

       c)  O valor tributário do imóvel em causa é de 1.066.760 €, pelo que lhe foi aplicada a taxa de 1%, taxa essa prevista na referida verba 28.1 da TGIS.

       d) O que resultou na liquidação no valor de 10.667,60 €.

       e)  A referida Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, aditou a verba 28 `Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS), com a seguinte redação:    

            “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

            28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1 % (…)”.

       f)  Nas disposições transitórias que constam do artigo 6.º daquela Lei n.º 55-A/2012, estabeleceram-se as seguintes regras:

            c) O valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011.

       g)  O código do IMI define as espécies de prédio, mas não se refere ao conceito de “prédio com afetação habitacional”.

       h)  A palavra «afetação», neste contexto de utilização de um prédio, tem o significado de «ação de destinar alguma coisa a determinado uso».

       i)   Entende a Requerente que o prédio em causa não é um “prédio com afetação habitacional”.

       j)   Trata-se de um terreno para construção.

       k)  Um terreno para construção permite a construção de prédios para habitação mas também permite a construção de prédios para comércio, serviços ou aparcamentos.

       l)   Pelo que um terreno para construção nunca pode ser classificado como um prédio com afetação habitacional.

       m) Pelo que não pode o imóvel da Requerente encontrar-se abrangido pela incidência da verba 28.1 da TGIS por não se tratar de um prédio com afetação habitacional.

       n)  Acresce que a intenção do legislador com a criação da verba 28.1 da TGIS, foi a de tributar as habitações de luxo, ou seja, as habitações com valor patrimonial tributário acima de um milhão de euros.

       o)  A intenção do legislador foi tributar as habitações com mais elevador valor, e não terrenos para construção, por não terem a requerida afetação habitacional.

       p)  Tem sido jurisprudência uniforme do CAAD a declaração de ilegalidade das liquidações de Imposto de Selo ao abrigo da verba 28.1 da TGIS aplicadas a terrenos para construção (exemplos: acórdãos do CAAD n.º 42/2013-T (Relator Nuno Azevedo Neves), n.º 53/2013-T (Relatores Jorge Manuel Lopes de Sousa, Conceição Pinto Rosa e Alberto Amorim Pereira), n.º 180/2013-T Relator Suzana Fernandes da Costa).

       q)  O Supremo Tribunal Administrativo também já se pronunciou sobre esta matéria nos acórdãos n.º 046/14 de 14-05-2014, n.º 0274/14 de 14-05-2014, n.º 0396/14 de 28-05-2014 e n.º 0425/14 de 28-05-2014.

       r)  Todos estes acórdãos referem que “não tendo o legislador definido o conceito de “prédios (urbanos) com afetação habitacional”, e resultando do artigo 6º do Código do IMI – subsidiariamente aplicável ao Imposto de Selo previsto na nova verba n.º 28 da Tabela Geral – uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto de Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redação da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), como prédios urbanos com afetação habitacional”.

       s)  Pelo que entende a Requerente que o imóvel em causa não se encontra sujeito a imposto de selo, verificando-se no caso em apreço uma errónea qualificação do facto tributário.

       t)  Sendo o prédio urbano em questão um terreno para construção, o mesmo não cai no âmbito da norma de incidência objetiva da Verba 28.1 da TGIS, o que fere de ilegalidade a liquidação.

       u)  Estamos assim perante uma clara violação do princípio da legalidade e da tipicidade das normas de incidência tributária, consagrados no artigo 103º da Constituição da República Portuguesa.

       v)  Tendo pago o imposto relativo à primeira prestação, pretende que lhe sejam pagos juros indemnizatórios a contar do pagamento, nos termos do art.º 43.º da LGT.

 

6.    Por seu turno a requerida veio em resposta alegar, em síntese:

 

       a)  É entendimento da AT que o prédio em apreço, tem natureza jurídica de prédio com afectação habitacional, pelo que os actos de liquidação objecto do presente pedido de pronúncia arbitral devem ser mantidos por consubstanciarem uma correcta interpretação da Verba 28 da Tabela Geral, aditada pela Lei 55-A/2012, de 29/12.

       b)  A Lei nº 55-A/2012, de 29/10/2012 veio alterar o art. 1º do CIS e aditar à TGIS a verba 28; com esta alteração legislativa, o IS passaria a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) seja igual ou superior a €1.000.000,00.

       c)  O imposto do selo incidiria assim sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na tabela geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.

       d) Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção e afectação habitacional, em sede de IS há que recorrer ao CIMI na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS, de acordo com o previsto no art. 67º, nº 2 do CIS na redacção dada pela Lei nº 55-A/2012, de 29/10.

       e)  Nos termos da referida disposição legal, às matérias não reguladas no Código, respeitantes à verba nº 28º da TGIS aplica-se subsidiariamente o disposto no CIMI.

       f)  Dispõe o nº 1 do art. 2º do CIMI que “prédio é toda a fracção de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial”.

       g)  Por sua vez o art. 6º, nº 1 do CIMI dispõe acerca das espécies de prédios urbanos existentes, integrando neste conceito os terrenos para construção, isto é os “terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações…”.

       h)  A noção de afectação do prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que bem se compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação.

       i)   Conforme resulta da expressão “…valor das edificações autorizadas”, constante do art. 45º, nº 2 do CIMI o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral, à avaliação dos terrenos para construção, sendo-lhes por conseguinte aplicável o coeficiente de afectação previsto no art. 41º do CIMI. Neste sentido veja-se o Acórdão nº 04950/11, de 14/02/2012, do TCA Sul : “O regime de avaliação do valor patrimonial dos terrenos para construção está consagrado no art. 45º do CIMI. O modelo de avaliação é igual à dos edifícios construídos, embora partindo-se do edifício a construir, tomando por base o respectivo projecto, é que o valor do terreno para construção corresponde, fundamentalmente, a uma expectativa jurídica, consubstanciada num direito de nele se vir a construir um prédio com determinadas características e com um determinado valor. Será essa expectativa de produção de uma riqueza materializada num imóvel a construir que faz aumentar o valor do património e a riqueza do proprietário do terreno para construção, logo que o imóvel em causa passa a ser considerado como terreno para construção. Por essa razão, quanto maior for o valor do prédio a construir, maior é o valor do terreno para construção que lhe está subjacente (cfr. Art. 6º, nº 3 do CIMI).“Em conclusão, na avaliação dos terrenos para construção o legislador quis que fosse aplicada a metodologia da avaliação dos prédios urbanos em geral, assim se devendo levar em consideração todos os coeficientes, supra identificados, nomeadamente o coeficiente de afectação previsto no art. 41º do CIMI, mais resultando tal imposição legal do nº 2 do art. 45º do CIMI, ao remeter para o valor das edificações autorizadas ou previstas no mesmo terreno para construção”.

       j)   Assim, para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28 da TGIS não pode ser ignorada, valendo neste sentido esta ordem de considerações:

 

a.       Na aplicação da lei aos casos concretos importa determinar o exacto sentido e alcance da norma, de modo a que se revele a regra nela contida, condição indispensável para que possa ser aplicada, de acordo com o disposto no art. 9º do CC, ex vi art. 11º da LGT.

b.      O art. 67º nº 2 do CIS manda aplicar subsidiariamente o disposto no CIMI.

c.       A afectação do imóvel (aptidão ou finalidade) é um coeficiente que concorre para a avaliação do imóvel, na determinação do valor patrimonial tributário, aplicável aos terrenos para construção;

d.      A própria verba 28 TGIS remete para a expressão “prédios com afectação habitacional”, apelando a uma classificação que se sobrepõe às espécies previstas no nº 1 do art. 6º do CIMI.

       k)  A noção de afectação do prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que bem se compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação.

       l)   Ao contrário do propugnado pela Requerente, a AT entende que o conceito de “prédios com afectação habitacional”, para efeitos do disposto na verba 28 da TGIS, compreende quer os prédios edificados quer os terrenos para construção, desde logo atendendo ao elemento literal da norma.

       m) Note-se que o legislador não refere “prédios destinados a habitação”, tendo optado pela noção “afectação habitacional”. Expressão diferente e mais ampla cujo sentido há-de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das identificadas no art. 6º, nº1 alínea a) do CIMI.

       n)  Aliás, a mera constituição de um direito de potencial construção faz aumentar imediatamente o valor do imóvel em causa, daí a regra constante do art.45º do CIMI que manda separar as duas partes do terreno.

       o)  De um lado, considera-se a parte do terreno onde vai ser implantado o edifício a construir, e do outro a área de terreno livre. Apurado o montante da primeira parte, reduz-se o valor determinado a uma percentagem entre 15% e 45% como prevê o nº2 da referida norma, em virtude de a construção ainda não estar efectivada.

       p)  No que diz respeito ao regime jurídico da urbanização e edificação, é de salientar que o mesmo tem como pressuposto as edificações já construídas.

       q)  Não se podendo ignorar que o alvará de licença para a realização de operações urbanísticas deverá conter, entre outros elementos, o número de lotes e a indicação da área de localização, finalidade, área de implantação, área de construção, número de pisos de número de fogos de cada um dos lotes, com especificação dos fogos destinados a habitações a custos controlados, quando previstos, nos termos da alínea a) do art. 77º do RJUE.

       r)  E ainda que o art. 77º do RJUE contém especificações obrigatórias, desde logo para os alvarás de operação de loteamento ou obras de urbanização, e para as obras de construção.

       s)Também os Planos Directores Municipais estabelecem a estratégia de desenvolvimento municipal, a política municipal de ordenamento do território e de urbanismo e as demais políticas urbanas. Integra e articula as orientações estabelecidas pelos instrumentos de gestão territorial de âmbito nacional e regional e estabelece o modelo de organização espacial do território municipal.

       t)  Nestes termos, muito antes da efectiva edificação do prédio, é possível apurar e determinar a afectação do terreno para construção.

       u)  Quanto à alegada inconstitucionalidade suscitada, deve a mesma improceder, porquanto: tal como consignado no art. 13º da Constituição da República, é sabido que “obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo a diferenciação de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, irrazoáveis, ou seja, as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastante”.

       v)  Assim, entende a AT que a previsão da verba 28º da TGIS não consubstancia qualquer violação do princípio da igualdade do art. 13º da CRP, a qual incide sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos com afectação habitacional, cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1.000.000,00, ou seja, incide sobre o valor do imóvel.

       w) Trata-se de uma norma geral e abstracta, aplicável de forma indistinta a todos os casos em que se verifiquem os pressupostos de facto e de direito.

       x)  Importa, ainda, referir que a tributação em sede de imposto do selo obedece ao critério da adequação, aplicando-se de forma indistinta a todos os titulares de imóveis com afectação habitacional de valor superior a € 1.000.000,00, incidindo sobre a riqueza consubstanciada e manifestada no valor dos imóveis, falecendo qualquer inconstitucionalidade por violação do princípio da proporcionalidade ou da capacidade contributiva.

       y)  Na verdade, a medida implementada procura buscar um máximo de eficácia quanto ao objectivo a atingir, com o mínimo de lesão para outros interesses considerados relevantes, encontrando-se legitimada a opção por este mecanismo de obtenção de receita, o qual apenas seria censurável, face ao princípio da proporcionalidade se resultasse manifestamente indefensável.

       z)  O que não se verifica porquanto tal medida será de aplicar de forma indistinta a todos os titulares de imóveis com afectação habitacional de valor superior a €1.000.000,00.

       aa)Por todo o exposto, as liquidações em crise consubstanciam uma correcta interpretação e aplicação do direito aos factos, não padecendo de vício de violação de lei, seja da CRP ou do CIS.

 

 

* * *

 

 

7.    O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente.

 

       As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

 

       O processo não enferma de nulidades.

 

 

 

 

 

 

 

B. DECISÃO

 

1. MATÉRIA DE FACTO

 

1.1. FACTOS PROVADOS

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)    A requerente está inscrita na matriz predial como proprietária do prédio urbano correspondente a um terreno para construção sito na Rua …, União das freguesias de … (… e …), concelho de Vizela, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….

b)    Tendo sido notificada da liquidação de Imposto do Selo n.º 2014 …, do ano de 2013, no valor de 10.667,60 €, relativa ao identificado prédio.

c)    Liquidação de imposto efetuada com fundamento na verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), com a redação que lhe foi introduzida pela Lei n.º 55-A/2012 de 29 de outubro.

d)    A liquidação teve como pressuposto a atribuição ao terreno para construção em causa afectação habitacional.

e)    O prazo para pagamento voluntário da primeira prestação do imposto do selo liquidado terminou em 30-04-2014.

f)    A requerente procedeu ao pagamento da primeira prestação do imposto.

g)    Em 29-07-2014 a requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem aos presentes autos.

 

1.2  Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos ao processo.

 

 

 

1.3  FACTOS NÃO PROVADOS

      

       Não existem factos dados como não provados com relevância para a apreciação do pedido.

 

1.4  O DIREITO

 

A questão de fundo a apreciar nos autos foi já objecto de várias decisões arbitrais que têm de modo, podemos dizer unânime, tido o mesmo sentido interpretativo.

 

O que está aqui em causa é, em suma, apurar se um terreno para construção pode ser considerado como tendo afectação habitacional para efeitos de aplicação, em particular, da verba 28.1 da TGIS.

 

A requerente entende que não, invocando, designadamente, que a palavra “afetação”, neste contexto de utilização de um prédio, tem o significado de “ação de destinar alguma coisa a determinado uso”, não sendo possível afectar um terreno para construção a tal uso.

 

Por seu turno, defende a requerida que o conceito de “prédios com afectação habitacional” compreende quer os prédios edificados quer os terrenos para construção, desde logo porque muito antes da efectiva edificação do prédio, é possível apurar e determinar a afectação do terreno para construção.

 

 

Nem o CIS, nem a Lei 55-A/2012, de 29 de Outubro, definem ou estabelecem critérios clarificadores para o conceito de prédio com afectação habitacional. Este último diploma apenas aditou também um n.º 2 ao art. 67º do CIS, estipulando que “às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiriamente, o disposto no CIMI”

 

Ora, se é certo que a lei fiscal, através do CIMI, nos dá uma definição exacta do que se entende por prédio (art. 2º), bem como a sua classificação e divisão entre prédios rústicos e urbanos (art. 3º a 5º), identificando, relativamente a estes, as várias espécies (art. 6º), é também exacto que naquelas classificações não é utilizado o conceito de “afectação habitacional”.

 

Em abono da sua tese, defende a AT que “a noção de afectação do prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que bem se compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um facto de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação.

 

Entendimento que não perfilhamos. Com efeito, as regras de determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, definidas no art. 45º do CIMI não têm qualquer relação com a classificação de prédios, apenas indicando os factores a ponderar na avaliação dos mesmos.

 

Da circunstância de o legislador ter querido que na avaliação dos terrenos para construção seja aplicada a metodologia da avaliação dos prédios urbanos em geral, considerando-se nomeadamente os coeficientes previstos no referido artigo, não resulta que aos mesmos seja ou esteja atribuída qualquer afectação específica.

 

Aliás, não existindo nenhuma definição legal para o conceito de afectação habitacional, teremos de apurar o significado do termo afectação, no quadro linguístico geral. O qual terá o significado de destinar alguma coisa a determinado uso.

 

Parece assim, numa primeira abordagem, resultar que prédio com afectação habitacional será aquele que está efectivamente destinado ao uso habitacional.

 

Será que um terreno para construção por ter já determinado destino - designadamente habitacional – definido no seu licenciamento, há-de ser considerado como tendo essa afectação ou essa apenas decorrerá da efectiva atribuição desse destino concretizado?

 

Propendemos para a segunda hipótese. Permitimo-nos transcrever, a este propósito, excerto da decisão arbitral proferida no processo n.º 53/2013:

- “… em boa hermenêutica, “prédio com afectaçãohabitacional”, não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um “prédio habitacional”), tendo de ser um prédio que tenha já efectiva afectação a esse fim.

Que é este o sentido da expressão “afectação”, no mesmo contexto de classificação de prédios que faz o CIMI, confirma-se pelo artigo 3º, em que, relativamente aos prédios rústicos, se faz referência aos que estejam “afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas”, que evidencia que a afectação é concreta, efectiva. Na verdade, como se vê pela parte final deste texto, um prédio pode ter como destino uma determinada utilização e estar ou não afecto a ela, o que evidencia que a afectação é, a nível da ligação de um prédio a determinada utilização, algo mais intenso que o mero destino e que pode ou não ocorrer, a jusante deste e não a montante”.

 

Em suma, concluir-se que de um mero direito de potencial construção de um terreno para construção, partindo apenas dos elementos da matriz e da circunstância de a sua avaliação ter sido efectuada com referência aos coeficientes aplicáveis aos prédios urbanos habitacionais, resulta a sua necessária afectação habitacional, carece de apoio legal.

 

Não tendo o prédio de que a requerente é proprietária afectação habitacional, enferma a liquidação, cuja declaração de ilegalidade é requerida, de vício consubstanciado em erro sobre os pressupostos de direito, que a inquina de ilegalidade.

 

juros indemnizatórios

 

Além da restituição do imposto indevidamente pago, pretende a requerente que seja declarado o direito ao pagamento de juros indemnizatórios.

 

Tal direito vem consagrado no art. 43º da LGT o qual tem como pressuposto que se apure, em reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida em montante superior ao legalmente devido.

 

O reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral, resulta do disposto no art. 24º, n.º 5 do RJAT.

 

No caso em apreço, é manifesto, que a ilegalidade do acto de liquidação em apreço é imputável a erro da AT.

 

Pelo que assiste à requerente o direito ao pretendido pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

 

 

3. DECISÃO

 

Face ao exposto, decide-se:

 

                                             a)  julgar procedente, por vício de violação de lei, o pedido de anulação do acto tributário objecto do pedido arbitral correspondentes à liquidação de Imposto do Selo referente ao ano de 2013, bem como o pedido de pagamento de juros indemnizatórios;

                                             b) condenar a Administração Tributária e Aduaneira a restituir à requerente o montante de imposto pago, acrescido dos respectivos juros indemnizatórios;

                                             c)  condenar a requerida no pagamento das custas do processo.

 

 

VALOR DO PROCESSO: De acordo com o disposto nos art. 306º, n.º 2 do Código de Processo Civil, art. 97º-A, n.º 1, a) do Código do Processo e de Procedimento Tributário e art. 3º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 10.667,60 € (dez mil seiscentos e sessenta e sete euros euros e sessenta cêntimos).

 

 

CUSTAS:                            Nos termos do disposto no art. 22.º, n.º 4, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em 918,00 € (novecentos e dezoito euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

 

Notifique-se.

 

 

Lisboa, 18-02-2015

 

 

 

                                                                                            O árbitro

                                                                                                  

 

 

 

 

 

 

                                                                               António Alberto Franco