Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 225/2016-T
Data da decisão: 2016-11-10  IRC  
Valor do pedido: € 388.915,37
Tema: IRC – Benefício fiscal – SIFIDE. Compensação
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Decisão Arbitral

 

 

           

            Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof. Doutora Suzana Fernandes Costa e Prof. Doutor António Martins, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 26-07-2016, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

 

            A…, S.A., NIPC…, sociedade com sede na Avenida…, Lote …, … andar, …-… Lisboa (doravante designada por “Requerente”), veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, número 1 alínea a), 5.º, número 3 alínea a), 6.º, número 2 alínea a) e 10.º, número 1, alínea a), todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante "RJAT") apresentar um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, na sequência do indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada para apreciação da legalidade da liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do exercício de 2007.

            A Requerente pede ainda o reconhecimento do direito da Requerente ao reembolso da quantia adicional de € 388.915,37 a título de IRC do exercício de 2007, acrescida dos correspondentes juros indemnizatórios, calculados nos termos do artigo 43.º da LGT, a computar desde 30-03-2012 e até emissão do correspondente título de crédito.

            O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA em 28-04-2016.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 11-07-2016, as Partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 26-07-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 29-09-2016, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidido que o processo prosseguisse com alegações.

As Partes não apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

O processo não enferma de nulidades.

Não há obstáculos à apreciação do mérito da causa.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

·         No período de tributação de 2007, a Requerente incorreu em “despesas de investigação e desenvolvimento”, tendo apresentado candidatura à Agência de Inovação ("Adi”) ao abrigo do Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento (SIFIDE);

·         Em 27-08-2008, a Requerente submeteu a Declaração de Rendimentos Modelo 22, com o n.º …, referente a 2007, na qual não reflectiu qualquer dedução a título de benefício fiscal SIFIDE, no campo 355 do quadro 10, pois à data da entrega da declaração ainda aguardava, nos termos legais, aprovação da candidatura apresentada à Adi (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 29-08-2008, na sequência daquela submissão, procedeu ao pagamento do montante de € 36.739.273,11 (documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Após acção de inspecção externa levada a cabo pela Autoridade Tributária (“AT”), foi emitida em 10-08-2010, a liquidação adicional de IRC n.º 2010…, relativa ao exercício de 2007, da qual resultou um montante de imposto a pagar de € 694.002,78, e que resultou de correções promovidas ao lucro tributável da Requerente (Documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 17-09-2010, a Requerente efectuou o pagamento parcial da liquidação adicional, no montante de € 56.800,32 (Documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 14-11-2011, a Requerente foi notificada, pela “Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à l&D Empresarial”, da atribuição de um crédito fiscal para dedução à colecta relativo ao período de tributação de 2007, no montante de € 1.282.837,78 (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 30-12-2011, submeteu uma nova Declaração de Rendimento Modelo 22, com o n.º…, referente ao mesmo período de tributação, na qual reflectiu, como única alteração em relação à anterior, a “dedução à colecta a título de benefícios fiscais no montante de € 1.282.837,78”, correspondente ao SIFIDE, inscrevendo este montante no campo 355 do quadro 10 (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 05-11-2012, a Requerente foi notificada da liquidação adicional de IRC com o n.º 2012…, de 29-10-2012, no montante de € 77.595,969, na qual a AT não considerou a "declaração de substituição submetida em 30-12-2011”, pois a dedução relativa ao SIFIDE, no montante de € 1.282.837,78, não se encontra nela reflectida (documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Face ao pagamento parcial que tinha sido feito pela Requerente, no montante de € 56.800,32, a AT procedeu à emissão de uma demonstração de acerto de contas, tendo o valor remanescente em dívida ascendido a € 20.795,64, conforme demonstração de acerto de contas n.º 2012…, de 5 de Novembro (documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         A 20-12-2013, a Requerente procedeu ao pagamento do montante de € 20.795,64, ao abrigo do Regime Excepcional de Regularização de Dívidas Fiscais e à Segurança Social (“RERD”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 151-A/201 3, de 31 de Outubro (documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 14-07-2015, a Requerente foi notificada de uma nova demonstração de liquidação de IRC relativa ao exercício de 2007, com o n.º 2014…, de 10-11-2014, a qual reflecte, na linha 13, um montante de € 839.590,67 como dedução à colecta, a título de Benefício Fiscal SIFIDE, e da qual resulta um IRC a reembolsar no montante de € 764.031,69 (documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         O documento de liquidação referido na alínea anterior não vinha acompanhado de qualquer fundamentação que sustentasse a redução do crédito fiscal de € 1.282.837,78 para € 839.590,67;

·          Em 17-07-2015, a Requerente foi notificada da demonstração de acerto de contas de IRC n.º 2015…, de 01-07-2015, a qual reflecte como importância a reembolsar € 820.159,61, a qual desdobra-se por:

– € 764.031,69, correspondente ao reembolso, reflectido na última "nota de liquidação’';

– € 77.595,96, correspondente ao reembolso, relevado na nota de liquidação emitida a 29-10-2012 e que já se encontrava totalmente pago;

– € 20.795,64, correspondente a um abatimento ao valor a reembolsar, e que a AT considera que está em dívida; e

– € 672,40, relativo a outro abatimento ao valor a reembolsar, respeitante a uma penhora resultante de um processo de execução fiscal;

·         Em 11-11-2015, a Requerente apresentou a reclamação graciosa que consta do documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, que foi autuada sob o n.º …2015…, em que pede, em suma, o seguinte:

– o reembolso do montante correspondente ao valor do SIFIDE aprovado e não considerado como dedução à colecta, no montante de €443.247,11;

– o reembolso dos montantes € 20.795,64 e € 672,40 indevidamente abatidos na demonstração de acerto de contas; e

– o pagamento de juros indemnizatórios à taxa legal, calculados sobre o montante de € 464.715,15, até ao efectivo e integral pagamento dos montantes acima identificados, desde as data do efectivo pagamento destes;

·         Em 15-01-2016, através do ofício n.º … de 14-01-2016, a Requerente foi notificada da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa, proferida pela Senhora Chefe de Divisão da Unidade dos Grandes Contribuintes, que manifesta concordância com a Informação n.º 06-AIR2/2016, que consta do documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais o seguinte:

Do reembolso do BF/SIFIDE (I) aprovado e não considerado - € 443.247,11

18.

Como alegado, na liquidação 2014…, a única alteração, relativamente à liquidação anterior - vide ANEXO N.º 120 - corresponde a que no apuramento do IRC Liquidado foi considerado como dedução à colecta o montante de € 839.590,67, montante respeitante a parte do BF/SIFIDE de 2007.

Aquele "crédito fiscal" diverge do BF/SIFIDE constante da notificação ("declaração comprovativa") da "Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à I&D Empresarial", o qual ascendeu ao montante de € 1.282.837,78.

A liquidação em referência deu origem a um reembolso de IRC, por referência ao período de tributação de 2007, no montante de € 764.031,69, valor, que no entendimento do R, encontra-se incorrectamente calculado.

19.

Efectivamente, aquele montante de € 764.031,69 encontra-se incluso na referida demonstração de acerto de contas 2015…, a qual, em termos de valor apurado, releva um direito a um crédito que ascende ao montante € 820.159,61.

Aquele direito, inclui para além do referido valor € 764.031,69, o montante € 77.595,96 correspondente ao "valor a pagar" apurado na liquidação (de IRC) 2012 … (de 29.10.2012) e que já se encontrava totalmente pago, deduzido de: (i) € 20.795,64, associado a um "abatimento" que a AT considerou estar ainda em dívida; e de (ii) € 672,40, referente a outro "abatimento", respeitante a uma penhora resultante de um processo de execução fiscal.

Em suma:

20.

O benefício fiscal SIFIDE (l), atribuído à A… no período de tributação de 2007, encontra-se regulado na Lei n.º 40/2005, de 02.08.

Nos termos dos artigos 2.º a 4.º daquele diploma, o BF/SIFIDE (I) consiste, no essencial, na "atribuição de um benefício fiscal, por dedução à colecta, e até à concorrência desta, de uma percentagem das despesas de investigação e desenvolvimento (I&D) consideradas elegíveis, realizadas no período de tributação".

O n.º 1 do artigo 6.º do mesmo diploma dispõe expressamente que "a dedução (...) deve ser justificada por declaração comprovativa (...) de que as actividades exercidas, ou a exercer, correspondem efectivamente a acções de I&D, dos respectivos montantes envolvidos, do cálculo do acréscimo das despesas (...), emitida por entidade nomeada por despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a integrar o processo de documentação fiscal do sujeito passivo a que se refere o artigo 121.º do Código do IRC".

21.

Aquele BF depende, entre outros, nos termos da segunda parte do n.º 2 do mesmo artigo 6.º "da existência, naquele processo de documentação fiscal, de documento comprovativo de que se encontra preenchida a condição referida na alínea b) do artigo 5.º - i.e., não sejam devedores ao Estado e à Segurança Social de quaisquer impostos ou contribuições, ou tenham o seu pagamento devidamente assegurado — com referência ao mês anterior ao da entrega da declaração periódica de rendimentos": No caso da A…, atento ao seu período de tributação, com "referência a 31 de Julho de 2008".

22.

O R submeteu [tempestivamente] em 27.08.2008 a DR/22 de autoliquidação referente ao exercício fiscal correspondente ao período de tributação de 2007 na qual não declarou qualquer BF/SIFIDE.

Após a recepção da "Comissão Certificadora" da declaração que concedia, para aquele mesmo período de tributação, um BF/SIFIDE (l) que ascendia a € 1.282.837,7, o R em 30.12.2011, submeteu um a nova DR/22 de substituição, na qual declarou o direito à dedução à colecta (…) naquele montante.

A Direcção de Serviços de IRC, em 17.12.2010, através do Ofício n.º…, notificou a A…de que a nova DR/22 de substituição não seria liquidada, face ao disposto no n.º 3 do artigo 122.º do CIRC.

Contudo, na medida em que o n.º 7 do artigo 38.º do Código Fiscal do Investimento, alterado pelo artigo 211.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31.12 (OE/2014), passou a considerar que "a declaração comprovativa prevista no n.º 1 constitui uma decisão administrativa para efeitos do n.º 3 do artigo 122.º do CIRC", pelo que, a mesma Direcção de Serviços do IRC em 11.12.2014, através do seu ofício n.º…, notificou a A…, no sentido de que, em conformidade como Despacho do Senhor Director-Geral de 20.10.2014, a AT iria proceder à "emissão das liquidações de IRC do período de 2007, tendo em consideração o BF/SIFIDE".

Daquela decisão, a Divisão de Liquidação da Direcção de Serviços do IRC emitiu a Liquidação 2014…, na qual foi considerado em termos de BF/SIFIDE a deduzir à colecta do IRC (€ 92.651.374,73), por referência ao período de tributação de 2007, o montante de € 839.590,67.

23.

Nos termos do n.º 1 do artigo 4.º da Lei n.º 40/2005, o BF/SIFDE (l) determinado e calculado nos termos dos artigos 2.º a 4.º daquele diploma, será deduzido à colecta do IRC e até à sua concorrência, no período correspondente.

Porém, o BF, que por insuficiência de colecta não possa ser deduzido no período de tributação em que as "despesas foram realizadas", poderá ser deduzido até ao 6.º período imediato (Cfr. n.º 4 do citado artigo 4.º da Lei n.º 40/2005).

Atento à regulamentação do BF/SIFIDE (l), conclui-se, de imediato, que o BF no montante de € 1.282.837,78 (valor notificado pela "Comissão Certificadora") esgotar-se-ia no período de tributação de 2007 da A…, porém, face a toda a factualidade supra referida, aquela Divisão de Liquidação, procedeu ao cálculo do remanescente do BF que deveria afectar o apuramento do IRC daquele período de tributação, conforme quadro que se segue:

 

24.

A referida Divisão de Liquidação atento a que no período de tributação de 2009, aquela sociedade teria efectuado, no âmbito do BF/SIFIDE (I), uma "dedução à colecta" de € 700,194,36, quando a dotação para o mesmo período era unicamente de € 311.278,99, resultando uma "dedução em excesso" no montante de € 388.915,37, e no período de tributação de 2010, teria efectuado uma dedução de € 106.830,64, quando a dotação era de € 52.498,90, resultando, igualmente, uma "dedução em excesso" de € 54.331,74, pelo que resultaria, forçosamente, que a "dedução à colecta" remanescente, em termos do BF em apreço, referente ao período de tributação de 2007, deveria ascender a € 839.590,67 [= € 1.282.837,78-(€ 388.915,37+ € 54.311,74)].

25.

Posteriormente, na sequência da Ordem de Serviço OI2015…, de 24.02.2015, a UGC procedeu a uma acção inspectiva ao período de tributação de 2010 da A…, da qual resultou a liquidação adicional de IRC 2015…, que releva, unicamente, a alteração dos "benefícios fiscais declarados" (…) de € 1.750.064,28 (valor declarado) para € 1.695.732,54 (dotação do exercício), ou seja, correspondente a uma variação no montante de (-)€ 54.331,73 [1].

26.

Assim, mostrando-se cumpridos todos pressupostos legais do direito ao BF/SIFIDE (l) com origem nas despesas de I&D efectuadas em 2007 pelo R, nomeadamente a existência no "dossier fiscal" ("processo de documentação fiscal da A…") das certidões ("documentos comprovativos") de que se encontra preenchido o quesito referido na alínea b) do artigo 5.º, com referência a Julho de 2008, da Lei n.º 40/2005, somos de parecer que o valor a considerar em termos daquele BF (reflectido na liquidação e demonstração de acerto de contas sob reclamação) deverá passar de € 839.590,67 para € 893.922,41. Nestes termos, o BF/SIFIDE (l)/2007 certificado pela "Comissão Certificadora" no montante de € 1.282.837,78, passaria influenciar os seguintes períodos de tributação da A…:

 

27.

Face ao antedito, o solicitado pelo R, quanto à consideração como dedução à colecta do IRC do período de tributação de 2007 da A… do montante de € 443.247,11, encontra-se parcialmente precludido, pelo que propomos, salvo outra e melhor opinião, que será de improceder parcialmente ao pedido no presente procedimento de reclamação graciosa.

Nestes termos, será de imputar ao período de tributação de 2007 do R, a título de BF/SIDE (l) o montante de € 54.331,74 (cinquenta e quatro mil, trezentos e trinta e um euros e setenta e quatro cêntimos), acrescido de juros indemnizatórios.

Do reembolso de importâncias indevidamente abatidas - € 20.795,64 e € 672,40

28.

Quanto à matéria ora sob contestação referente aos "abatimentos indevidos" na demonstração de acerto de contas ID 2015_..., nos montantes de € 20.795,64 (pagamento ao abrigo do RERD no processo …2010…) e € 672,40 (remanescente da "ordem de penhora …" - PEF …), depois de compulsados os meios informáticos à disposição da Unidade dos Grandes Contribuintes, permite-nos, nesta data, concluir que:

(i) A importância de € 20.795,64 foi restituída [restituição n.º 2015…] ao contribuinte … (A…) em 12.11.2015 (Cfr. Doc. n.º 1 em ANEXO N.º 221); e

(ii) O valor de € 672,40 foi reembolsado (Reembolso 2015_...) ao contribuinte … (A…) em 29.07.2015, por transferência electrónica interbancária nº… (Cfr. Doc. n.º 2 em ANEXO N.º 225).

29.

Atento ao exposto, as duas importâncias sob contestação - € 20.795,64 e € 672,40 - foram devidamente abatidas no apuramento do montante do reembolso do IRC respeitante ao período de tributação de 2007 do R, pelo que o pedido, quanto esta matéria, encontra-se totalmente precludido por inutilidade superveniente da lide.

Do pagamento de juros indemnizatórios

30.

São devidos juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT, calculados sobre o montante de € 54.331,74, contados desde 01.01.2014, data que entrou em vigor o n.º 7 do artigo 38.º do Código Fiscal ao Investimento, na redacção dada pelo artigo 211.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31.12, até ao seu "efectivo e integral pagamento".

31.

Através de ofício emanado por esta Unidade dos Grandes Contribuintes, o R foi devidamente notificado para, querendo, exercer o seu direito de participação, na modalidade de audição prévia, sob a forma escrita, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 60.º da Lei Geral Tributária, por sua vez conjugado com o preceituado no artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo.

32.

Decorrido o prazo concedido para o exercício daquele direito de participação, nem o R, por um lado, veio aos autos acrescentar outros elementos que não tivessem já sido dirimidos aquando do nosso anterior "Projecto de Decisão", nem a Unidade dos Grandes Contribuintes, por outro, descortinou quaisquer outros elementos susceptíveis de colocar em causa as conclusões anteriormente propostas.

Nestes termos,

33.

Considerando-se a permanência da validade dos pressupostos que, de facto e de direito, alicerçaram o nosso anterior "Projecto de Decisão", somos então a entender pela definitividade do mesmo, com todas as consequências legais.

§ II. DA CONCLUSÃO

Em conformidade com o anteriormente exposto e compulsados todos os elementos dos autos, designadamente o nosso anterior "Projecto de decisão" e as peças processuais carreadas pela A…, aqui Reclamante, parece-nos de deferir parcialmente o pedido inserto nos autos, em conformidade com o teor do "quadro-síntese" mencionado no intróito desta nossa Informação, com todas as consequências legais, designadamente, sendo o caso, no que tange ao preceituado no artigo 163.º do Código do Procedimento Administrativo e, bem como, ao cumprimento do determinado pelo artigo 100.º da Lei Geral Tributária e ao disposto no n.º 2 do artigo 63.º do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária e Aduaneira.

Mais se informa que, em caso de Concordância Superior, se promova a notificação da A…, SA, contribuinte com o NIPC…, aqui Reclamante, através de ofício a remeter sob registo, nos termos do previsto nos artigos 35.º a 41.º, todos do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

·         No período de tributação de 2009, a Requerente efectuou, no âmbito do BF/SIFIDE (I), uma “dedução à colecta” de € 700.194,36, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira entendido que a dotação para o mesmo período era unicamente de € 311.278,99, pelo que daí terá resultado uma “dedução em excesso" no montante de € 388.915,37;

·         No período de tributação de 2010, efectuou uma dedução de € 106.830,64, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira entendido que a dotação era de € 52.498,90, pelo que terá resultado uma “dedução em excesso" de € 54.331,74;

·         Os excessos de dedução referidos nas alíneas anteriores não foram alvo de qualquer correcção pela Autoridade Tributária e Aduaneira, mas somente de acertos com o crédito fiscal concedido para o exercício de 2007;

·         A 24-02-2015, a Unidade dos Grandes Contribuintes procedeu a uma acção inspectiva ao período de tributação de 2010 da A… (OI n.º Ordem de Serviço…), da qual resultou a liquidação adicional de IRC n.º 2015…, que releva, unicamente, a alteração dos “benefícios fiscais declarados” (…) de € 1.750.064,28 (valor declarado) para € 1.695.732,54 (dotação do exercício), ou seja, correspondente a uma variação no montante de (-) € 54.331,73;

·         Considerando os acertos que foram efectuados nos exercícios de 2009 e 2010 em função da dedução à colecta em excesso pela Requerente, bem como do deferimento parcial da RG (no montante de € 54.331,74), verifica-se que o montante atribuído pela Comissão certificadora como dedução à colecta no exercício de 2007, no montante de €1.282.837,78 foi integralmente restituído à Requerente, nestes termos:

·         A Requerente nunca foi notificada de qualquer acto de liquidação do exercício de 2009 que incorporasse qualquer correcção fiscal ao crédito fiscal referente ao SIFIDE daquele exercício, nem tão pouco foi citada da instauração de qualquer processo de execução fiscal para cobrança coerciva de qualquer dívida de IRC de 2009 (afirmação da Requerente no artigo 28.º do pedido de pronúncia arbitral que não é questionada pela Autoridade Tributária e Aduaneira);

·         Em 13-04-2016, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral.

Não há controvérsia sobre a matéria de facto.

 

3. Matéria de direito

 

3.1. Questão essencial a decidir

 

A questão essencial a decidir equaciona-se nos seguintes termos:

– a Requerente, depois de ter sido notificada pela “Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à l&D Empresarial”, da atribuição de um crédito fiscal para dedução à colecta relativo ao período de tributação de 2007, no montante de € 1.282.837,78, apresentou, em 30-12-2011, uma declaração de substituição Modelo 22, em que indicou este valor, correspondente ao benefício fiscal do SIFIDE, no campo 355 do quadro 10;

– a Autoridade Tributária e Aduaneira, em 05-11-2012, emitiu uma declaração adicional de IRC com o n.º 2012…, relativa ao ano de 2007, em que não considerou o referido valor do SIFIDE;

– em 14-07-2015, a Requerente foi notificada de uma nova demonstração de liquidação de IRC relativa ao exercício de 2007, com o n.º 2014…, de 10-11-2014, a qual reflecte, na linha 13, um montante de € 839.590,67 como dedução à colecta, a título de Benefício Fiscal SIFIDE;

– a não consideração, na liquidação relativa ao ano de 2007, do valor de € 1.282.837,78 atribuído pela Comissão Certificadora para os Incentivos Fiscais à l&D Empresarial” deve-se ao facto de a Autoridade Tributária e Aduaneira ter entendido que, no ano de 2009, a Requerente tinha efectuado uma dedução à colecta excessiva do benefício fiscal do SIFIDE, no montante de € 388.915,37;

– o excesso de dedução referido não foi objecto de correcção pela Autoridade Tributária e Aduaneira da declaração relativa ao ano de 2009, mas somente de acertos com o crédito fiscal concedido para o exercício de 2007, a que foi subtraído o montante que a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou ter sido deduzido em excesso em 2009;

– a Requerente dispunha de colecta de IRC em 2007 suficiente para deduzir a totalidade do benefício fiscal referente ao SIFIDE, no montante de € 1.282.837,78;

– no presente processo, a Requerente pretende que se declare a ilegalidade da liquidação n.º 2014…, complementada pela demonstração de acerto de contas n.º 2015…, na parte em que nela não foi considerado o referido valor de € 388.915,37, que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu ter sido deduzido em excesso na declaração relativa ao exercício de 2009.

 

Não é questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira que a Requerente tinha direito à dedução à colecta do benefício fiscal do SIFIDE no montante de € 1.282.837,78 que lhe foi atribuído relativamente ao ano de 2007.

 

 

3.2. Falta de fundamentação e preterição de formalidade legal

 

A Requerente entende que a Autoridade Tributária e Aduaneira não fundamentou o seu procedimento e violou seu direito de audição prévia, ao «pegar» no crédito fiscal de 2007 e ao considerá-lo para compensar uma alegada dedução excessiva do exercício de 2009, sem que, contudo, tal alegado crédito referente ao exercício de 2009 estivesse titulado por algum procedimento tributário ou mesmo um acto de liquidação.

 

Os actos tributários, como espécie de actos administrativos que são, «carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos» (artigo 268.º, n.º 3, da CRP).

O artigo 76.º da LGT concretiza os requisitos da fundamentação de actos tributários estabelecendo o seguinte:

1. A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária».

2. A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».

 

É manifesto que a liquidação impugnada e a demonstração de acerto de contas em que se baseou enfermam do vício de falta de fundamentação, pois nem antes da emissão desses documentos nem no seu texto se faz qualquer referência às razões por que não foi considerado relativamente a exercício de 2007 o valor de € 1.282.837,78, nem se faz qualquer remissão para qualquer documento que contenha explicitação dessas razões.

Como é jurisprudência pacífica, a fundamentação só é suficiente quando, no contexto em que o acto foi praticado, permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão tomada e a fundamentação relevante é a que consta do próprio acto ou de documento para que no seu texto se remeta.

Assim, no caso em apreço, tem de se concluir que a liquidação n.º 2014…, complementada pela demonstração de acerto de contas n.º 2015…, enferma de vício de fala de fundamentação, pois, no contexto em que os actos foram praticados, não era possível para um destinatário normal aperceber-se das razões por que não foi considerado o benefício fiscal do SIFIDE no montante de € 1.282.837,78.

Por outro lado, é também claro que a Requerente tinha direito de audição prévia antes da liquidação impugnada em que não foi considerada totalmente a declaração de substituição que apresentou. Na verdade, esse direito é assegurado pela alínea a) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT e não se está perante qualquer das situações de dispensa prevista no seu n.º 2.

Por isso, a liquidação a liquidação n.º 2014…, complementada pela demonstração de acerto de contas n.º 2015… enferma de vícios de falta de fundamento e de preterição de formalidade legal (audição prévia).

 

3.3. Vícios de violação dos artigos 90.º do CIRC e 75.º da LGT e violação do regime legal do SIFIDE

 

A Requerente imputa à liquidação impugnada violação do artigo 90.º do CIRC, que estabelece que a liquidação é efectuada com base na declaração submetida pelo sujeito passivo e “tem por base a matéria colectável que delas conste" e violação do artigo 75.º da LGT por estabelecer uma presunção de veracidade da declaração.

O artigo 75.º da LGT estabelece que «presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos».

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira não suscitou qualquer dúvida sobre a veracidade da declaração de substituição apresentada pela Requerente, em que referiu indicou o montante de € 1.282.837,78 do SIFIDE relativo ao exercício de 2007.

Na verdade, a Autoridade Tributária e Aduaneira não efectuou a liquidação com base neste valor, por entender que deveria imputar parte dele ao exercício de 2009 e não porque duvidasse da declaração da Requerente.

Por isso, não ocorre violação do referido artigo 75.º da LGT.

No que concerne ao artigo 90.º do CIRC estabelece, que «quando a liquidação deva ser feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º, tem por base a matéria colectável que delas conste» (n.º 1) e que ao montante apurado são efectuadas, além de outras, as deduções relativas a benefícios fiscais.

O SIFIDE foi introduzido pela Lei n.º 40/2005, de 3 de Agosto, para vigorar de 2006 a 2010, sendo esse regime inicial que vigorava no exercício de 2007.

No seu artigo 4.º estabelece-se o seguinte, no que aqui interessa:

1 - Os sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam, a título principal ou não, uma actividade de natureza agrícola, industrial, comercial e de serviços e os não residentes com estabelecimento estável nesse território podem deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 83.º do Código do IRC, e até à sua concorrência, o valor correspondente às despesas com investigação e desenvolvimento, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido, realizadas no período de tributação que se inicie em 1 de Janeiro de 2006, numa dupla percentagem:

(...)

 

2 - A dedução é feita, nos termos do artigo 83.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior.

3 - As despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no exercício em que foram realizadas poderão ser deduzidas até ao 6.º exercício imediato.

 

Ao artigo 83º do CIRC, na redacção vigente em 2005, corresponde o artigo 90.º, na redacção de resultante da republicação operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho.

Resulta destas normas que, não sendo questionada pela Autoridade Tributária e Aduaneira a veracidade da declaração de substituição apresentada pela Requerente, a liquidação relativa ao exercício de 2007 deveria ser efectuada, como se determina no artigo 90.º, deduzindo à matéria colectável a globalidade do benefício fiscal do SIFIDE, já que a colecta era suficiente para esse efeito e a dedução em períodos subsequentes apenas poderia ser efectuada se ocorresse insuficiência de colecta no período de tributação em que foram efectuadas as despesas com investigação e desenvolvimento, nos termos do n.º 3 do citado artigo 4.º.

Por isso, tem de se concluir que a liquidação n.º 2014…, complementada pela demonstração de acerto de contas n.º 2015…, viola o referido artigo 90.º, n.ºs 1 e 2, do CIRC.

 

3.4. Da violação dos princípios da anualidade do imposto, da especialização dos exercícios e da indisponibilidade da relação jurídica tributária, da legalidade e da justiça

 

O princípio da anualidade do imposto não é afectado pela actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, pois não foi considerado período diferente de um ano, para a determinação do imposto a pagar.

Por outro lado, os artigos 17.º e 18.º do CIRC e as normas contabilísticas relativas ao princípio da especialização dos exercícios versam sobre a determinação do lucro tributável e não sobre as deduções à colecta, que são uma operação posterior a essa determinação.

No caso em apreço, a dedução do montante do SIFIDE à colecta de IRC de 2007 resulta das normas especiais dos n.ºs 1 a 3 d artigo 4.º da Lei n.º 40/2005, e não do princípio da especialização dos exercícios nem do princípio da anualidade do imposto.

No que concerne ao princípio da indisponibilidade, o que a lei prevê é a sua aplicação ao crédito tributário (artigo 30.º, n. 2, da LGT), que é definido pelas liquidações e só surge depois destas, pelo que não se está perante um vício de que possam enfermar as liquidações.

Por outro lado, não se vislumbra que tenha ocorrido disponibilidade da relação jurídica tributária, pois ela não foi declarada extinta nem foi transmitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira para qualquer outra entidade.

Quanto ao princípio da legalidade, como princípio geral a observar ela Autoridade Tributária e Aduaneira (artigo 55.º da LGT), a ofensa, quanto a liquidação relativa ao exercício de 2007, resulta da violação das normas dos artigos 90.º do CIRC e 4.º da Lei n.º 40/2005 que se refeririam, não assumindo autonomia.

No que concerne ao princípio da justiça não se vê que seja violado no caso em apreço, por normas relativas à determinação do exercício em que deve ser efectuada a dedução a colecta do SIFIDE, pois o seu próprio regime admite que a dedução se faça no próprio exercício ou em exercícios posteriores.

Assim a liquidação impugnada não enferma deste vício que a Requerente lhe imputa, com excepção do princípio da legalidade, nos termos indicados.

 

3.5. Da violação das regras legais da compensação de créditos

 

Os actos de liquidação e demonstração de acerto de contas não operaram qualquer compensação de créditos, antes os definiram.

Por outro lado, é manifesto que a apreciação da legalidade de actos jurídicos que declarem compensação de créditos ou de actos materiais que compensem créditos não se insere nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, definidas no artigo 2.º do RJAT.

Por isso, não se toma conhecimento desta questão.

 

3.6. Anulação da decisão da reclamação graciosa

 

A Requerente imputa ainda ilegalidade à decisão da reclamação graciosa (Artigo 136.º do pedido de pronúncia arbitral).

A reclamação graciosa, ao manter a liquidação n.º 2014…, complementada pela demonstração de acerto de contas n.º 2015…, enferma dos vícios substantivos de que esta enferma, designadamente, violação dos artigos 90.º, n.ºs 1 e 2 do CIRC e artigo 4.º, n.ºs 1, 2, e 3, da Lei n.º 40/2005, de 3 de Agosto.

 

3.7. Princípio do aproveitamento dos actos

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que «a própria jurisprudência dominante vem entendendo que só não será de decretar a anulabilidade de um acto, por preterição de quais quaisquer formalidades, se essa falta, esse incumprimento de dever, no caso concreto se degradar em formalidade não essencial. – o que é irrefutável in casu, estando provado que a mesma foi sucessivamente informada (respondendo e trocando comunicações via e-mail) dos procedimentos com vista a acertar as contas» e que «destarte, entrará em acção o princípio do aproveitamento dos actos, que em nome da economia dos actos públicos dá voz moderna ao antigo aforismo “utile per inutile non vitiatur”».

As situações em que, apesar de os actos enfermarem de vícios, não se produz o efeito anulatório são actualmente indicadas no n.º 5 do artigo 163.º do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT.

Estabelece este n.º 5 o seguinte:

 

5 - Não se produz o efeito anulatório quando:

a) O conteúdo do acto anulável não possa ser outro, por o acto ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível;

b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;

c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o acto teria sido praticado com o mesmo conteúdo.

 

A situação prevista na alínea b) apenas pode justificar a não anulação nos casos em que os actos apenas enfermam de vícios de natureza formal e procedimental, pois é a relevância destes e apenas destes que é afastada se a finalidade visada for alcançada por outra via.

No caso em apreço, a liquidação e a decisão da reclamação graciosa enfermam de vícios de natureza substantiva, pelo que, mesmo que se entendesse que foi atingido o fim visado com a imposição legal de audiência prévia e de fundamentação suficiente, o aproveitamento do acto sempre dependeria da possibilidade de afastamento do efeito anulatório à face das alíneas a) e c).

Assim, o que é decisivo é a apreciação da situação à face destas alíneas a) e c).

No que concerne a alínea a), é claro que o conteúdo do acto poderia e deveria ser outro, designadamente levando em conta a totalidade do benefício fiscal do SIFIDE de dedução à colecta na liquidação relativa ao ano de 2007, com eventuais acertos em outros anos, se fosse caso disso.

Quanto à alínea c), também é claro que não se verifica uma situação desse tipo, pois, se fosse considerada a totalidade do montante do benefício fiscal no ano de 2007, o acto seria praticado com diferente conteúdo.

Por isso, não se verificam os pressupostos de aplicação do princípio do aproveitamento do acto.

 

3.8. Abuso do direito

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira invoca o abuso do direito de impugnação pela Requerente, por venire contra factum proprium.

Não se vislumbram os pressupostos do abuso do direito, nesta modalidade, pois não ficou demonstrada qualquer conduta da Requerente que possa considerar-se causalmente conexionada com a liquidação ilegal, que foi praticada por exclusiva iniciativa e decisão da Autoridade Tributária e Aduaneira, que nem sequer permitiu à Requerente a possibilidade de exercício do direito de audição prévia.

Por outro lado, o direito de impugnar actos lesivos tem fundamento constitucional (artigo 268.º, n.º 4, da CRP) e não há elementos nos autos que permitam concluir que a Requerente não foi lesada pela liquidação impugnada, pois não se demonstrou que tenha ocorrido o alegado excesso de dedução em 2009 nem que houvesse lugar a pagamento de juros compensatórios pela Requerente relativamente a esse exercício, como alega a Autoridade Tributária e Aduaneira.

Por isso, não se demonstra o invocado abuso do direito.

 

 

3.9. Pedidos de reembolso e juros indemnizatórios, formulados pela Requerente, e pedido de acerto formulado pela Autoridade Tributária relativamente a «excesso no exercício de 2009» e invocação do e pela Requerente

 

Com consequência da procedência da sua pretensão anulatória, a Requerente pede o reembolso da quantia correspondente ao SIFIDE que não foi deduzido na liquidação relativa ao exercício de 2007, acrescida de juros indemnizatórios.

A Autoridade Tributária e Aduaneira, por sua vez, defende que não são devidos quaisquer juros indemnizatórios por não haver erro imputável aos serviços gerador de qualquer obrigação de indemnizar Requerente e que, se se concluir pela procedência da acção, deverá decidir-se que «o valor deduzido em excesso no exercício de 2009 (€ 388.915,37) seja alvo do correspectivo acerto, sob pena de duplicação de benefícios fiscais ou em última análise abuso de direito ou enriquecimento sem causa».

A Requerente nada veio dizer sobre esta posição da Autoridade Tributária e Aduaneira, não tendo, designadamente, apresentado alegações.

 A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD restringe-se à apreciação da legalidade de actos dos tipos referidos no artigo 2.º do RJAT, acrescida, quando há elementos seguros para tal, da apreciação dos pedidos de reembolso e de juros indemnizatórios e de indemnização por garantia indevida, apreciação esta que vem sendo pacificamente admitida pela jurisprudência no meio processual paralelo que é o processo de impugnação judicial.

No entanto, se é certo que deve ser admitida a possibilidade de os tribunais arbitrais definirem as consequências da anulação quando não há controvérsia sobre outras questões atinentes à execução do julgado de que aquela dependam, também o é que, quando a definição dessas consequências depender da apreciação de questões de outros tipos, para cuja apreciação os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD não têm competências, estará necessariamente afastada a possibilidade de o Tribunal Arbitral apreciar os referidos pedidos de reembolso, juros indemnizatórios e indemnização por garantia indevida.

É isso que sucede no caso em apreço, pois a Autoridade Tributária e Aduaneira pede (artigo 74.º da Resposta) que, caso venha a concluir pela procedência da presente acção, o Tribunal Arbitral admita «que o valor deduzido em excesso no exercício de 2009 (€ 388.915,37) seja alvo do correspectivo acerto, sob pena de duplicação de benefícios fiscais ou em ultima análise abuso de direito ou enriquecimento sem causa».

Sem decidir esta questão da admissibilidade de acerto quanto ao exercício de 2009, o Tribunal Arbitral não pode decidir se deve haver lugar ao reembolso e aos juros indemnizatórios pedidos pela Requerente.

Por isso, não tendo o Tribunal Arbitral competência para apreciar aquela questão suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não pode também apreciar os referidos pedidos de reembolso e juros indemnizatórios

Por isso, não se toma conhecimento dos referidos pedidos de reembolso e de juros indemnizatórios, bem como sobre o acerto de eventual valor deduzido em excesso no exercício de 2009.

 

4. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a)    Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto aos pedidos de declaração de ilegalidade da decisão da reclamação graciosa e da liquidação n.º 2014…, de 10-11-2014, complementada pela demonstração de acerto de contas n.º 2015 …;

b)   Não tomar conhecimento dos pedidos de reembolso, juros indemnizatórios e acerto de eventual valor deduzido em excesso no exercício de 2009;

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 388.915,37.

 

6. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 6.426,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 10-11-2016

 

Os Árbitros

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

(Suzana Fernandes Costa)

 

 

 

(António Martins)

 



[1] Paga voluntariamente em 25.05.2007, por cheque na entidade "…", no montante de € 67.390,39 [= € 54.311.74+ € 6.948,50 (juros compensatórios) +€6 110,15 (juros indemnizatórios)].