Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 456/2016-T
Data da decisão: 2017-01-05  IRC  
Valor do pedido: € 153.073,37
Tema: IRC - Tributações autónomas. Deduções à coleta; SIFIDE; RFAI
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Decisão Arbitral

 

Os árbitros Dr. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Paulo Lourenço e Dr.ª Carla Castelo Trindade, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 19-10-2016, acordam no seguinte:

 

1. Relatório

 

A…, S.A. (adiante designada por A… ou “Requerente”), titular do Número de Identificação de Pessoa Colectiva (NIPC) n.º…, com sede na Avenida…, n.º…, …-… Lisboa, na qualidade de sociedade dominante do Grupo B… (no exercício de 2013), apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, 6.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de Janeiro (doravante RJAT) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 de 22 Março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

A Requerente pretende

– a declaração de ilegalidade e anulação do acto de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2016…;

– a declaração de ilegalidade e anulação do acto de liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) relativo ao exercício de 2013, conforme Demonstração de Liquidação n.º 2015…;

– a adição ao imposto apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, do montante de tributações autónomas apuradas nos termos do artigo 88.º do Código do IRC e, consequentemente, a dedução integral dos benefícios fiscais, neste caso, créditos fiscais detidos a título de SIFIDE e benefícios fiscais apurados a título de RFAI por referência aos exercícios de 2010 e de 2011 (limitados, em cada um dos exercícios a que respeitam, a um máximo de 25% da colecta de IRC apurada), nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC na redacção em vigor no exercício de 2013; e

 ii) o reembolso do montante de imposto pago em excesso pela ora Requerente no montante de € 153.073,37.

 

A Requerente pede ainda juros indemnizatórios.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 19-08-2016.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 03-10-2016 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 19-10-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 18-11-2016, decidiu-se dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e que o processo prosseguisse com alegações.

As partes apresentaram alegações.

O Tribunal é competente, as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

a)      A Requerente era, a 31-12-2013, a sociedade dominante do Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (doravante RETGS) do Grupo B…, o qual, no exercício de 2013, era formado pelas seguintes sociedades:

–…– C…S.A.

–…– D… S.A.

–…– E… S.A.

–…– A… S.A.

–…– F… SGPS S.A.

–…– G…- SGPS, S.A.

–…– H… S.A.

–…– I…, S.A.

–…– J…, LDA.

–…– K…, S.A.

–…– L…, S.A.

–…– M…, S.A.

–…– N…, S.A.

–…– O…, S.A.

b)      A Requerente, enquanto sociedade dominante do RETGS, procedeu à entrega, da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC, respeitante ao exercício de 2013 do Grupo, e, posteriormente, de uma Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC de substituição, em 20-10-2015 (documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

c)      O grupo tributado pelo RETGS, então dominado pela Requerente, detinha diversos benefícios fiscais disponíveis para dedução no exercício fiscal de 2013, sendo que, após o deferimento parcial da Reclamação Graciosa apresentada para o exercício de 2012, bem como a autoliquidação de IRC impugnada, se mantiveram disponíveis para dedução:

– créditos fiscais decorrentes do Sistema de Incentivos à Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE) apurado nos exercícios de 2011 e 2012 e 2013, num total de € 363.374,73, € 302.941,90, e € 678.761, respectivamente;

– créditos fiscais decorrentes do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI) apurado nos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, num total de € 5.017.632,80; e

– 0 Crédito fiscal decorrente do apuramento do Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento (CFEI) no exercício de 2013;

d)      Por insuficiência de colecta, tais benefícios não foram integralmente deduzidos nos exercícios de 2010, 2011 e 2012, subsistindo no exercício de 2013, diversos benefícios fiscais disponíveis para dedução, mesmo considerando a procedência do pedido de pronúncia arbitral relativo aos exercícios de 2011 e 2012;

e)      No período de tributação de 2013, de acordo com a declaração de rendimentos que consta do Documento n.º 3, a Requerente apenas deduziu benefícios ficais de € 509.456,64 na sua Declaração de Rendimentos Modelo 22 do RETGS;

f)       Na sequência da apresentação da declaração, em 19-06-2015, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a Liquidação n.º 2015 … que consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

g)      Em 30-03-2016, a Requerente apresentou uma reclamação graciosa da liquidação referida, que teve o n.º … 2016 … (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, especialmente a folha 9, página 3 do projecto de decisão);

h)      A reclamação graciosa foi indeferida por despacho de 25-05-2016, proferido pela Senhora Chefe de Divisão de Gestão e Assistência Tributária da Unidade dos Grandes Contribuintes (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

i)       O despacho referido manifesta concordância com as Informações n.ºs …-… /2016 e …-… /2016, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, se refere o seguinte:

 

§ IV. DA ANÁLISE DO PEDIDO

10. Compulsado o teor da petição inicial apresentada pela Contribuinte, ora Reclamante, e considerando que, nos autos, está em causa dirimir se o ato tributário a sindicar enferma ou não dos vícios de ilegalidade que lhe são apontados, somos então a aferir da bondade dos argumentos nesta sede trazidos ao nosso conhecimento.

Assim sendo,

§ IV.l. Do cálculo do imposto

§ IV.I.I. Dedução à tributação autónoma dos créditos relativos a benefícios fiscais no âmbito do SIFIDE e do RFAI

§ IV.I.II. Dos argumentos da Reclamante

Alega a Reclamante que, por prudência, tem vindo a deduzir os benefícios fiscais apenas à coleta de IRC, não considerando como tal a coleta da tributação autónoma, na medida em que até à reforma do imposto operada em 2014 existia a incerteza de que esta tributação possuísse carácter de IRC.

12. Entende que com a redação dada à alínea a) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC pela Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, foi esclarecida a natureza da tributação autónoma ao estabelecer-se que não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável o IRC, incluindo a tributação autónoma.

13. Em defesa da sua tese apela a varia jurisprudência nacional, quer do Supremo Tribunal Administrativo, quer do Tribunal Arbitral.

§ IV.l.III. Da apreciação

14. Não podemos concordar com a pretensão da Reclamante de deduzir à tributação autónoma apurada no período de tributação de 2013 os benefícios fiscais que operam por dedução à coleta do IRC, concretamente os resultantes do SIFIDE e do RFAI.

15. Sem prejuízo de atualmente a tributação autónoma se encontrar inserida nos Códigos do Imposto sobre o Rendimento (Código do IRC e Código do IRS) e ser liquidada no seu âmbito e a esse título, o certo é que se trata de uma imposição tributária autónoma, como indica a designação que lhe foi conferida.

16. Trata-se, pois, de uma tributação que incide sobre determinado tipo de despesas e não de um imposto que incide, como no caso do IRS, sobre o valor anual dos rendimentos das suas diversas categorias, ou como no caso do IRC, sobre os rendimentos obtidos no período de tributação, cuja duração se convencionou ser de um ano.

17. A tributação autónoma é independente dos impostos sobre o rendimento e com eles não se confunde.

18. Com a tributação autónoma não se pretende tributar um rendimento no fim do período de tributação, e sim, tributar determinadas despesas, em si mesmas consideradas, pelas razões de política fiscal que de todos são conhecidas.

19. Na tributação autónoma o facto que lhe dá origem é cada despesa que a ela esteja sujeita, com um apuramento totalmente independente do dos impostos sobre o rendimento, embora venha a ser liquidada em conjunto com estes.

20. Daí que a nossa jurisprudência e doutrina a tenha vindo a classificar como um imposto de obrigação única, cujo facto gerador se produz de modo instantâneo, que surge isolado no tempo, gerando sobre o contribuinte uma obrigação de pagamento com caráter avulso.

21. Como se tem referido em vária jurisprudência nacional, na tributação autónoma, o facto tributário que dá origem ao imposto, é instantâneo: esgota-se no ato de realização de determinada despesa que está sujeita a tributação (embora, o apuramento do montante de imposto, resultante da aplicação das diversas taxas de tributação aos diversos atos de realização de despesa considerados, se venha a efetuar no fim de um determinado período tributário). Mas o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa.

22. Esta caracterização da tributação autónoma impede, por regra, de serem consideradas na sua liquidação quaisquer deduções e por maioria de razão as que foram consagradas pelo legislador para efeitos do apuramento do IRC devido e que se encontram previstas no n.º 2 do artigo 90 º do respetivo Código, nas quais se integram as deduções relativas a benefícios fiscais que operam nessa fase do cálculo do imposto.

De facto,

23. Em sede de IRC o legislador introduziu na mecânica de apuramento as deduções à coleta, que não são mais do que subtrações à coleta do imposto visando ajustá-lo, em cada período de tributação, a situações particulares dos sujeitos passivos, como seja, a sua submissão a situações de dupla tributação internacional, o seu direito a usufruir de benefícios fiscais, a sua obrigação de já ter pago imposto adiantadamente (pagamentos por conta e por retenção na fonte).

24. É desta forma que assistimos no n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC à possibilidade de na liquidação do IRC serem tomadas em consideração, e nas condições aí indicadas, as deduções relativas:

• A dupla tributação internacional

• Aos benefícios fiscais

• Ao pagamento especial por conta

• Às retenções na fonte

25. Já no tocante à tributação autónoma a única dedução permitida estabeleceu-a o legislador do Código do IRC no artigo 88.º que é ele mesmo o normativo que define as realidades a ela sujeitas, bem como as respetivas taxas.

26. Trata-se da dedução do imposto que eventualmente tenha sido retido na fonte na distribuição de lucros por entidades sujeitas a IRC a sujeitos passivos que beneficiem de isenção total ou parcial e nas situações previstas no n.º 11 do artigo 88.º do Código do IRC, não podendo neste caso ser aplicada a dedução relativa a retenções na fonte, prevista no n.º 2 do artigo 90.º do mesmo diploma conforme determina o n.º 12 do citado artigo 88.º.

Pelo que,

27. Se pode inferir que a tributação autónoma não é mais do que um conjunto de taxas que incide sobre factos autónomos e ainda que inserida nos Códigos do Imposto sobre o Rendimento o resultado da sua aplicação é um puro adicional a liquidar e a pagar pelos sujeitos passivos, não sendo passível de ser confrontada com deduções à coleta, concretamente com as previstas no n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, como requer a Reclamante,

Aliás,

28. Em consonância com o que acabamos de expor está o facto de o legislador com a Lei do Orçamento do Estado para 2016 ter aditado ao artigo 88.º do Código do IRC o n.º 21 esclarecendo" que "A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos no artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado."

Neste sentido,

29. Também a legislação específica relativa aos benefícios fiscais, quer se trate dos contemplados no RFAI, quer os abrangidos pelo SIFIDE, dispõe que os mesmos são deduzidos à coleta do IRC, não prevendo a sua dedução a quaisquer outros tributos.

Assim,

30. Concluímos não poder ser promovida qualquer dedução nos termos solicitados pela Reclamante e consequentemente não enfermar o ato tributário reclamado de qualquer ilegalidade.

 

j)       Em 28-07-2016, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão que não se tenham provado.

 

 2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e afirmações da Requerente que não são questionadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

3. Matéria de direito

 

A questão essencial que é objecto do presente processo é a de saber se, relativamente ao exercício de 2013, as quantias referentes aos benefícios fiscais do SIFIDE e do RFAI pode ser deduzido à colecta de IRC produzida por tributações autónomas, inclusivamente à face da redacção do CIRC resultante da Lei nº 7-A/2016, de 30 de Março.

 

3.1. Questão da aplicação do artigo 90.º do CIRC às tributações autónomas

 

Na decisão da reclamação graciosa, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, em suma, que «a tributação autónoma não é mais do que um conjunto de taxas que incide sobre factos autónomos e ainda que inserida nos Códigos do Imposto sobre o Rendimento o resultado da sua aplicação é um puro adicional a liquidar e a pagar pelos sujeitos passivos, não sendo passível de ser confrontada com deduções à coleta, concretamente com as previstas no n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC».

Os artigos 89.º e 90.º do CIRC estabelecem o seguinte, na redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril:

 

 

Artigo 89.º

 

Competência para a liquidação

 

A liquidação do IRC é efectuada:

a) Pelo próprio sujeito passivo, nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º;

b) Pela Direcção-Geral dos Impostos, nos restantes casos.

 

Artigo 90.º

 

Procedimento e forma de liquidação

 

1 - A liquidação do IRC processa-se nos seguintes termos:

a) Quando a liquidação deva ser feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º, tem por base a matéria colectável que delas conste;

b) Na falta de apresentação da declaração a que se refere o artigo 120.º, a liquidação é efectuada até 30 de Novembro do ano seguinte àquele a que respeita ou, no caso previsto no n.º 2 do referido artigo, até ao fim do 6.º mês seguinte ao do termo do prazo para apresentação da declaração aí mencionada e tem por base o valor anual da retribuição mínima mensal ou, quando superior, a totalidade da matéria colectável do exercício mais próximo que se encontre determinada;

c) Na falta de liquidação nos termos das alíneas anteriores, a mesma tem por base os elementos de que a administração fiscal disponha.

2 – Ao montante apurado nos termos do número anterior são efectuadas as seguintes deduções, pela ordem indicada:

a) A correspondente à dupla tributação internacional;

b) A relativa a benefícios fiscais;

c) A relativa ao pagamento especial por conta a que se refere o artigo 106.º;

d) A relativa a retenções na fonte não susceptíveis de compensação ou reembolso nos termos da legislação aplicável.

 

3 – (Revogado pela da Lei n.º 3-B/2010)

4 – Ao montante apurado nos termos do n.º 1, relativamente às entidades mencionadas no n.º 4 do artigo 120.º, apenas é de efectuar a dedução relativa às retenções na fonte quando estas tenham a natureza de imposto por conta do IRC.

5 – As deduções referidas no n.º 2 respeitantes a entidades a que seja aplicável o regime de transparência fiscal estabelecido no artigo 6.º são imputadas aos respectivos sócios ou membros nos termos estabelecidos no n.º 3 desse artigo e deduzidas ao montante apurado com base na matéria colectável que tenha tido em consideração a imputação prevista no mesmo artigo.

6 – Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções referidas no n.º 2 relativas a cada uma das sociedades são efectuadas no montante apurado relativamente ao grupo, nos termos do n.º 1.

7 – Das deduções efectuadas nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 2 não pode resultar valor negativo.

8 – Ao montante apurado nos termos das alíneas b) e c) do n.º 1 apenas são feitas as deduções de que a administração fiscal tenha conhecimento e que possam ser efectuadas nos termos dos n.ºs 2 a 4.

9 – Nos casos em que seja aplicável o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 79.º, são efectuadas anualmente liquidações com base na matéria colectável determinada com carácter provisório, devendo, face à liquidação correspondente à matéria colectável respeitante a todo o período de liquidação, cobrar-se ou anular-se a diferença apurada.

10 – A liquidação prevista no n.º 1 pode ser corrigida, se for caso disso, dentro do prazo a que se refere o artigo 101.º, cobrando-se ou anulando-se então as diferenças apuradas.

 

Os referidos artigos 89.º e 90.º do CIRC, bem como outras normas deste Código, como as relativas as declarações previstas nos artigos 120.º e 122.º, são aplicáveis às tributações autónomas.

Na verdade, é hoje pacífico, na sequência de inúmera jurisprudência arbitral e das posições assumidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que o imposto cobrado com base em tributações autónomas previstas no CIRC tem a natureza de IRC. De resto, para além da jurisprudência, o artigo 23.º-A n.º 1, alínea a), do CIRC, na redacção da Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, não deixa hoje margem para qualquer dúvida razoável, corroborando o que já anteriormente resultava do teor literal do artigo 12.º do mesmo Código.

Ora, o artigo 90.º do CIRC refere-se às formas de liquidação do IRC, pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária, aplicando-se ao apuramento do imposto devido em todas as situações previstas no Código, incluindo a liquidação adicional (n.º 10).

Por isso, aquele artigo 90.º aplica-se também à liquidação do montante das tributações autónomas, que é apurado pelo sujeito passivo ou pela Administração Tributária, na sequência da apresentação ou não de declarações, não havendo qualquer outra disposição que preveja termos diferentes para a sua liquidação.

Assim, as diferenças entre a determinação do montante resultante de tributações autónomas e o resultante do lucro tributável restringem-se à determinação da matéria tributável e às taxas aplicáveis, que são as previstas nos Capítulos III e IV do CIRC para o IRC que tem por base o lucro tributável e no artigo 88.º do CIRC para o IRC que tem por base a matéria tributável das tributações autónomas e as respectivas taxas.

Mas, as formas de liquidação que se prevêem no Capítulo V do mesmo Código são de aplicação comum às tributações autónomas e à restante matéria tributável de IRC.

No entanto, a circunstância de uma autoliquidação de IRC, efectuada nos termos do n.º 1 do artigo 90.º, poder conter vários cálculos parciais com base em várias taxas aplicáveis a determinadas matérias colectáveis, não implica que haja mais que uma liquidação, como resulta dos próprios termos daquela norma ao fazer referência a «liquidação», no singular, em todos os casos em que é «feita pelo sujeito passivo nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º», tendo «por base a matéria colectável que delas conste» (seja a determinada com base nas regras dos artigos 17.º e seguintes seja a determinada com base nas várias situações previstas no artigo 88.º).

Aliás, não são apenas as liquidações previstas no artigo 88.º que podem englobar vários cálculos de aplicação de taxas a determinadas matérias colectáveis, pois o mesmo pode suceder nas situações previstas nos n.ºs 4 a 6 do artigo 87.º. ( [1] )

De qualquer forma, sejam quais forem os cálculos a fazer, é unitária autoliquidação que o sujeito passivo ou a Autoridade Tributária e Aduaneira devem efectuar nos termos dos artigos 89.º, alínea a), 90.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), e 120.º ou 122.º, e com base nela que é calculado o IRC global, sejam quais forem as matérias colectáveis relativas a cada um dos tipos de tributação que lhe esteja subjacente. ( [2] )

Aliás, se este artigo 90.º não fosse aplicável à liquidação das tributações autónomas previstas no CIRC, teríamos de concluir que não haveria qualquer norma que previsse a sua liquidação, o que se reconduziria a ilegalidade, por violação do artigo 103.º, n.º 3, da CRP, que exige que a liquidação de impostos se faça «nos termos da lei».

Refira-se ainda a nova norma do n.º 21 aditada ao artigo 88.º do CIRC pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, independentemente de ser ou não verdadeiramente interpretativa, em nada altera esta conclusão, pois aí se estabelece, no que concerne à forma de liquidação das tributações autónomas, que ela «é efectuada nos termos previstos no artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores».

Com efeito, se é certo que esta nova norma vem explicitar como é que se calculam os montantes das tributações autónomas (o que já decorria do próprio texto das várias disposições do artigo 88.º) e que a competência cabe ao sujeito passivo ou à Administração Tributária, nos termos do artigo 89.º, é também claro que não se afasta a necessidade de utilizar o procedimento previsto no n.º 1 do artigo 90.º, designadamente nos casos previstos na sua alínea c) em que a liquidação cabe à Administração Tributária e Aduaneira, com «base os elementos de que a administração fiscal disponha», que abrangerão a possibilidade de liquidar com base em tributações autónomas, se a Autoridade Tributária e Aduaneira dispuser de elementos que comprovem os seus pressupostos.

Por isso, quer antes quer depois da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, o artigo 90.º, n.º 1, do CIRC é aplicável à liquidação de tributações autónomas.

 

3.2. Questão da dedutibilidade de despesas de investimento previstas no SIFIDE às quantias devidas a título de tributações autónomas

 

Em 2013, vigorava o Sistema de incentivos fiscais em investigação e desenvolvimento empresarial II (SIFIDE II) que foi aprovado pelo artigo 133.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, e alterado pelo artigo 163.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.

Este diploma estabelece o seguinte, nos seus artigos 4.º e 5.º:

 

Artigo 4.º

Âmbito da dedução

1 - Os sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza agrícola, industrial, comercial e de serviços e os não residentes com estabelecimento estável nesse território podem deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência, o valor correspondente às despesas com investigação e desenvolvimento, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido, realizadas nos períodos de tributação de 1 de Janeiro de 2011 a 31 de Dezembro de 2015, numa dupla percentagem:

 

a) Taxa de base - 32,5 % das despesas realizadas naquele período;

 

b) Taxa incremental - 50 % do acréscimo das despesas realizadas naquele período em relação à média aritmética simples dos dois exercícios anteriores, até ao limite de (euro) 1 500 000.

 

2 - Para os sujeitos passivos de IRC que sejam PME de acordo com a definição constante do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de Novembro, que ainda não completaram dois exercícios e que não beneficiaram da taxa incremental fixada na alínea b) do número anterior, aplica-se uma majoração de 10 % à taxa base fixada na alínea a) do número anterior.

3 - A dedução é feita, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior.

4 - As despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no exercício em que foram realizadas podem ser deduzidas até ao sexto exercício imediato.

5 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, quando no ano de início de usufruição do benefício ocorrer mudança do período de tributação, deve ser considerado o período anual que se inicie naquele ano.

6 - A taxa incremental prevista na alínea b) do n.º 1 é acrescida em 20 pontos percentuais para as despesas relativas à contratação de doutorados pelas empresas para actividades de investigação e desenvolvimento, passando o limite previsto na mesma alínea a ser de (euro) 1 800 000.

7 - Aos sujeitos passivos que se reorganizem, em resultado de actos de concentração tal como definidos no artigo 73.º do Código do IRC, aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 15.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

 

Artigo 5.º

 

Condições

 

Apenas podem beneficiar da dedução a que se refere o artigo 4.º os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:

 

a) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indirectos;

b) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer impostos ou contribuições, ou tenham o seu pagamento devidamente assegurado.

 

 

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira não questiona que a Requerente preencha os requisitos subjectivos e objectivos para poder beneficiar do SIFIDE, tendo indeferido a reclamação graciosa por entender que as despesas em causa não podem ser deduzidas às quantias que pagou a título de tributações autónomas, por a dedução só poder ser efectuada à colecta de IRC resultante da aplicação da taxa de IRC ao lucro tributável.

Como se referiu, o artigo 90.º do CIRC reporta-se também à liquidação das tributações autónomas.

E, como também se disse, não há suporte legal para afirmar que, na eventualidade de terem de ser efectuados numa declaração vários cálculos para determinar o IRC, seja efectuada mais que uma autoliquidação.

O diploma que aprovou o SIFIDE não refere que os créditos dele provenientes são dedutíveis a toda e qualquer colecta de IRC, antes define o âmbito da dedução aludindo, no seu n.º 1 do artigo 4.º, «ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência».

O n.º 3 do mesmo artigo 4.º confirma que é ao montante que for apurado nos termos do artigo 90.º do CIRC que releva para concretizar a dedução ao dizer que «a dedução é feita, nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior».

Assim, por mera interpretação declarativa, conclui-se que o artigo 4.º, n.º 1, do SIFIDE II, ao estabelecer a dedução «ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência», implica a dedução ao montante das tributações autónomas que são apuradas nos termos desse artigo 90º.

O facto de o artigo 5.º do SIFIDE II afastar o benefício quando o lucro tributável seja determinado por métodos indirectos e nas tributações autónomas se incluírem situações em que se visa indirectamente a tributação de lucros (designadamente, não dando relevância ou desmotivando factos susceptíveis de os reduzirem) não tem qualquer relevância para este efeito, pois o conceito de «métodos indirectos» tem um alcance preciso no direito tributário, que é concretizado no artigo 90.º da LGT (para além de normas especiais), reportando-se a meios de determinar o lucro tributável, cuja utilização não se prevê para cálculo da matéria colectável das tributações autónomas previstas no artigo 88.º do CIRC.

Por outro lado, se é a necessidade de fazer uso de métodos indirectos que afasta a possibilidade de usufruir do benefício, não se pode justificar esse afastamento em relação à colecta das tributações autónomas, que é determinada por métodos directos.

Para além disso, não pode ver-se, na eventual natureza de normas antiabuso que assumem algumas tributações autónomas ( [3] ) uma explicação para o seu afastamento da respectiva colecta do âmbito da dedutibilidade do benefício do SIFIDE II, pois não há qualquer suporte legal para afastar a dedutibilidade à colecta proporcionada por correcções baseadas em normas de natureza indiscutivelmente antiabuso, como, por exemplo, as relativas aos preços de transferência ou subcapitalização.

Por outro lado, o facto de a dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE II ser limitada à colecta do artigo 90º do CIRC, até à sua concorrência, não permite concluir que o crédito fiscal só seja dedutível caso haja lucro tributável, pois o que aquele facto exige é que haja colecta de IRC, que pode existir mesmo sem lucro tributável, designadamente por força das tributações autónomas.

Assim, apontando o teor literal do artigo 4.º do SIFIDE II no sentido de a dedução se aplicar também à colecta de IRC derivada de tributações autónomas a apurada nos termos do artigo 90.º do CIRC, só por via de uma interpretação restritiva se poderá afastar a aplicação do benefício fiscal à colecta de IRC proporcionada pelas tributações autónomas.

            A viabilidade de uma interpretação restritiva encontra, desde logo, um obstáculo de ordem geral, que é o de que as normas que criam benefícios fiscais têm a natureza de normas excepcionais, como decorre do teor expresso do artigo 2.º, n.º 1, do EBF, pelo que, na falta de regra especial, devem ser interpretadas nos seus precisos termos, como é jurisprudência pacífica. ( [4] ) No caso dos benefícios fiscais, prevê-se explicitamente a possibilidade de interpretação extensiva (artigo 10.º do EBF), mas não de interpretação restritiva, pelo que, em regra, o benefício fiscal não deve ser interpretado com menor amplitude do que a que, numa interpretação declarativa, resulta do teor da norma que o prevê.

De qualquer modo, uma interpretação restritiva apenas se justifica quando «o intérprete chega à conclusão de que o legislador adoptou um texto que atraiçoa o seu pensamento, na medida em que diz mais do que aquilo que pretendia dizer. Também aqui a ratio legis terá uma palavra decisiva. O intérprete não deve deixar-se arrastar pelo alcance aparente do texto, mas deve restringir este em termos de o tornar compatível com o pensamento legislativo, isto é, com aquela ratio. O argumento em que assenta este tipo de interpretação costuma ser assim expresso: cessante ratione legis cessat eius dispositio (lá onde termina a razão de ser da lei termina o seu alcance)» ( [5] ).

Como fundamento para uma interpretação restritiva poderá aventar-se o facto de que algumas tributações autónomas visam desincentivar certos comportamentos dos contribuintes susceptíveis de afectarem o lucro tributável, e, consequentemente, diminuírem a receita fiscal, e a sua força desincentivadora será atenuada com a possibilidade de a respectiva colecta poder ser objecto de deduções.

Mas, o desincentivo desses comportamentos é justificado apenas pelas preocupações de protecção da receita fiscal e os benefícios fiscais concedidos são, por definição, «medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do EBF).

E, no caso dos benefícios fiscais do SIFIDE II, as razões de natureza extrafiscal que justificam a sua sobreposição às receitas fiscais são, na perspectiva legislativa, de enorme importância, como se infere da fundamentação no Relatório do Orçamento do Estado para 2011:

 

II.2.2.4.4. Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial II (SIFIDE)


Tendo em conta que uma das valias da competitividade em Portugal passa pela aposta na capacidade tecnológica, no emprego científico e nas condições de afirmação no espaço europeu, a Proposta de Orçamento do Estado para 2011 propõe renovar o SIFIDE (Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial), agora na versão SIFIDE II, para vigorar nos períodos de 2011 a 2015, possibilitando a dedução à colecta do IRC para empresas que apostam em I&D (capacidade de investigação e desenvolvimento).

Dado o balanço positivo dos incentivos fiscais à I&D empresarial, e considerando também a evolução do sistema de apoio dos outros países, foi decidido rever e reintroduzir por mais cinco períodos de tributação este sistema de apoio. A I&D das empresas é um factor decisivo não só da sua própria afirmação enquanto estruturas competitivas, como da produtividade e do crescimento económico a longo prazo, facto, aliás, expressamente reconhecido no Programa do XVIII Governo, assim como em vários relatórios internacionais recentes.

É neste contexto que, no panorama internacional, a OCDE considera desde 2001 Portugal como um dos três países com um avanço mais significativo na I&D empresarial. Sendo o sistema nacional vigente, comparativamente aos demais sistemas que utilizam a dedução à colecta e a distinção entre taxa base e taxa incremental, é um dos mais atractivos e competitivos.

 

Sendo a investigação e desenvolvimento das empresas «um factor decisivo não só da sua própria afirmação enquanto estruturas competitivas, como da produtividade e do crescimento económico a longo prazo», compreende-se que se tenha dado preferência ao incentivo da aposta na capacidade tecnológica, no emprego científico e nas condições de afirmação no espaço europeu, que, a prazo se reconduzem à obtenção de maiores receitas fiscais.

A importância que, na perspectiva legislativa, foi reconhecida a este benefício fiscal previsto no SIFIDE II, é decisivamente confirmada pelo facto de ele ser indicado como estando especialmente excluído do limite geral à relevância de benefícios fiscais em IRC, que se indica no artigo 92.º do CIRC.

             Por isso, é seguro que se está perante benefícios fiscais cuja justificação é legislativamente considerada mais relevante que a obtenção de receitas fiscais, inferindo-se daquele artigo 92.º que a intenção legislativa de incentivar os investimentos em investigação e desenvolvimento previstos no SIFIDE II é tão firme que vai ao ponto de nem sequer se estabelecer qualquer limite à dedutibilidade da colecta de IRC, apesar de este regime fiscal ter sido criado e aplicado num período de notórias dificuldades das finanças públicas.

            Assim, não se vê fundamento legal, designadamente à face da intenção legislativa que é possível detectar, para, com fundamento numa interpretação restritiva, afastar a dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE II à colecta das tributações autónomas que resulta directamente da letra do artigo 4.º, n.º 1, do respectivo diploma, conjugado com o artigo 90.º do CIRC.

            Por outro lado, a eventual limitação da aplicação do benefício fiscal a empresas que apresentassem lucro tributável em 2013 reconduzir-se-ia a uma fortíssima restrição do seu campo de aplicação, já que, como é facto público, grande parte das empresas, nesse ano e nos anteriores, apresentava prejuízos fiscais, embora pagasse IRC por outras vias.

Na verdade, segundo a estatística publicada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, no ano de 2011 (último ano cujos dados estariam disponíveis quando foi apresentada a Proposta de Orçamento do Estado para 2012, por isso, é de supor que tenha sido considerado na ponderação do alcance do benefício fiscal), mais de metade das declarações de IRC apresentavam valor líquido negativo e no período de tributação de 2011 apenas 26% dos sujeitos passivos apresentaram IRC Liquidado (Quadro 7), e cerca de 71% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC (Quadro 8), por via do Pagamento Especial por Conta, ou de outras componentes positivas do imposto (Tributações Autónomas, Derrama, Derrama Estadual, IRC de períodos de tributação anteriores, etc.). ( [6] ).

Por isso, é manifesto que a aplicabilidade do benefício fiscal a empresas que, embora apresentassem prejuízos fiscais, pagavam IRC, inclusivamente a título de tributações autónomas, ampliava fortemente o número de empresas potencialmente beneficiárias e, consequentemente, compagina-se melhor com a intenção legislativa subjacente ao SIFIDE II do que a defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Por outro lado, como se referiu, não se pode olvidar que as tributações autónomas visam proteger ou aumentar as receitas fiscais e que os benefícios fiscais concedidos são, por definição, «medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do EBF).

Isto é, no caso em apreço, ao estabelecer um benefício fiscal por dedução à colecta de IRC, o legislador optou por prescindir da receita fiscal que este imposto poderia proporcionar, na medida da concessão do benefício fiscal. Para esta ponderação relativa dos interesses em causa (receita fiscal versus estímulo forte ao investimento) é indiferente que essa receita provenha de cálculos efectuados com base no artigo 87.º ou no artigo 88.º do CIRC. Na verdade, seja qual for a forma de cálculo dessa receita fiscal, está-se perante dinheiro cuja arrecadação o legislador considerou ser menos importante do que a prossecução da finalidade económica referida. Das duas alternativas que se deparavam ao legislador relativamente ao incentivo aos investimentos previstos no SIFIDE II, que eram, por um lado, manter intactas as receitas provenientes de IRC (incluindo as de tributações autónomas) e não ver incentivado o investimento e, por outro lado, concretizar esse incentivo com perda de receitas de IRC, a ponderação que necessariamente está subjacente ao SIFIDE II é a da opção pela criação do incentivo com prejuízo das receitas. E, naturalmente, sendo a criação do incentivo ao investimento melhor, na perspectiva legislativa, do que a arrecadação de receitas, não se vislumbra como possa ser relevante que as receitas de IRC que se perdem para concretizar o incentivo provenham da tributação geral de IRC prevista no n.º 1 do artigo 87.º ou das tributações a taxas especiais previstas nos n.ºs 4 a 6 do mesmo artigo, ou das tributações autónomas previstas no artigo 88.º: em todos os casos, a alternativa é a mesma entre criação do incentivo e arrecadação de receitas de IRC e a ponderação relativa que se pode fazer dos interesses conflituantes é idêntica, quaisquer que sejam as formas de determinar o montante de IRC de que se prescinde para criar o incentivo.

E, no caso do benefício fiscal do SIFIDE II, as razões de natureza extrafiscal que justificam o incentivo com perda de receita são fortíssimas, pois considera-se que os investimentos incentivados são um factor decisivo na competitividade futura do país.

            Por isso, é seguro que se está perante benefício fiscal cuja justificação é legislativamente considerada mais relevante que a obtenção de receitas fiscais provenientes de IRC, seja qual for a base do seu cálculo, pois o que está em causa sempre prescindir ou não de determinada quantia em dinheiro para criar um incentivo ao investimento.

            Neste contexto, a natureza das tributações autónomas e as soluções legislativamente adoptadas, em geral, em relação a elas, não têm qualquer relevância para a apreciação desta questão, pois esta tem de ser apreciada à face dos específicos interesses que na sua ponderação se entrechocam.

Na verdade, o que está em causa é, exclusivamente, determinar o alcance do SIFIDE II, que estabelece um regime de natureza excepcional, que visou prosseguir determinados interesses públicos, e não contribuir para a decisão de qualquer questão conceitual sobre a natureza das tributações autónomas, matéria sobre a qual não se vislumbra quer no texto da lei, quer no Relatório do Orçamento para 2011, a menor preocupação legislativa.

Pela mesma razão de que o que está em causa é interpretar o alcance do diploma de natureza especial que é o SIFIDE II, não pode ser atribuída relevância, para este efeito, à norma do n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, aditado pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, na parte em que se refere que não são «efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado», apesar da pretensa natureza interpretativa que lhe foi atribuída.

Na verdade, não há qualquer sinal, nem na Lei n.º 7-A/2016, nem no Relatório do Orçamento para 2016, nem na sua discussão, de que com o aditamento no artigo 88.º do CIRC de uma norma geral proibindo deduções ao montante global apurado de tributações autónomas, se pretendesse interpretar restritivamente a expressão «deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC» que consta de uma norma especial de um diploma avulso, como é o SIFIDE II.

E, na falta de uma intenção inequívoca em sentido contrário, vale a regra de que a lei geral não altera lei especial (artigo 7.º, n.º 3, do Código Civil), que tem a justificação o facto de que «o regime geral não inclui a consideração das condições particulares que justificaram justamente a emissão da lei especial». ( [7] )

Para além disso, as referidas regras do SIFIDE II têm em vista incentivar os sujeitos passivos de IRC a efectuarem investimentos no período entre 01-01-2011 e 31-12-2015, pelo que, sendo o benefício fiscal uma contrapartida da adopção do comportamento legislativamente desejado e incentivado, seria incompaginável com o princípio constitucional da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP), não reconhecer a esses comportamentos os efeitos fiscais favoráveis previstos na lei vigente no momento em que eles ocorreram. Por isso, se hipoteticamente a Lei n.º 7-A/2016 pretendesse eliminar, total ou parcialmente, os efeitos fiscais favoráveis que o SIFIDE II prometeu aos contribuintes que, com justificada confiança, adoptassem o comportamento aí previsto, seria materialmente inconstitucional, por violação daquele princípio.

Pelo exposto, convergindo os elementos literal e racional da interpretação do artigo 4.º do SIFIDE II no sentido de que as despesas de investimento nele previstas são dedutíveis à «ao montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência», é de concluir que elas são dedutíveis à globalidade dessa colecta, que engloba, para além, da derivada da tributação dos lucros em cada período fiscal, a que resulta do pagamento especial por conta e de outras componentes positivas do imposto, designadamente de tributações autónomas, derrama estadual e IRC de períodos de tributação anteriores.

            Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão. ( [8] )

 

3.3. Questão da dedutibilidade de despesas de investimento previstas no RFAI às quantias devidas a título de tributações autónomas

 

O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento realizado em 2009 (RFAI 2009), foi aprovado pela Lei n.º 10/2009, de 10 de Março.

Foi mantido em vigor no ano de 2013 pelo artigo 232.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2013).

No que concerne ao IRC, o referido regime traduziu-se num benefício fiscal previsto no artigo 3.º daquela Lei, que estabelece o seguinte, no que aqui interessa:

 

Artigo 2.º

 

Âmbito de aplicação e definições

 

1 - O RFAI 2009 é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam, a título principal, uma actividade:

a) Nos sectores agrícola, florestal, agro-industrial, energético e turístico e ainda da indústria extractiva ou transformadora, com excepção dos sectores siderúrgico, da construção naval e das fibras sintéticas, tal como definidos no artigo 2.º do Regulamento (CE) n.º 800/2008, da Comissão, de 6 de Agosto;

 

b) No âmbito das redes de banda larga de nova geração.

 

2 - Para efeitos do presente regime, consideram-se como relevantes os seguintes investimentos desde que afectos à exploração da empresa:

 

a) Investimento em activo imobilizado corpóreo, adquirido em estado de novo, com excepção de:

i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em projectos de indústria extractiva;

ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afectos a actividades administrativas;

iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;

iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afecto a exploração turística;

v) Equipamentos sociais, com excepção daqueles que a empresa seja obrigada a ter por determinação legal;

vi) Outros bens de investimento que não estejam directa e imprescindivelmente associados à actividade produtiva exercida pela empresa;

 

b) Investimento em activo imobilizado incorpóreo, constituído por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, 'saber-fazer' ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

 

3 - Podem beneficiar dos incentivos fiscais previstos no presente regime os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:

 

a) Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade;

b) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indirectos;

c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de cinco anos os bens objecto do investimento;

d) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer contribuições, impostos ou quotizações ou tenham o pagamento dos seus débitos devidamente assegurado;

e) Não sejam consideradas empresas em dificuldade nos termos da comunicação da Comissão - orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 244, de 1 de Outubro de 2004;

f) Efectuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período de dedução constante dos n.ºs 2 e 3 do artigo 3.º

 

4 - No caso de sujeitos passivos de IRC que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definida no anexo i do Regulamento (CE) n.º 800/2008, da Comissão, de 6 de Agosto, as despesas de investimento a que se refere a alínea b) do n.º 2 não podem exceder 50 % dos investimentos relevantes.

5 - Considera-se investimento realizado em 2009 o correspondente às adições, verificadas nesse exercício, de imobilizações corpóreas e bem assim o que, tendo a natureza de activo corpóreo e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições às imobilizações em curso.

6 - Para efeitos do número anterior, não se consideram as adições de imobilizações corpóreas que resultem de transferências de imobilizado em curso transitado de exercícios anteriores, excepto se forem adiantamentos.

 

 

Artigo 3.º

 

Incentivos fiscais

 

1 - Aos sujeitos passivos de IRC residentes em território português ou que aí possuam estabelecimento estável, que exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola abrangida pelo n.º 1 do artigo anterior que efectuem, em 2009, investimentos considerados relevantes, são concedidos os seguintes benefícios fiscais:

a) Dedução à colecta de IRC, e até à concorrência de 25 % da mesma, das seguintes importâncias, para investimentos realizados em regiões elegíveis para apoio no âmbito dos incentivos com finalidade regional:

i) 20 % do investimento relevante, relativamente ao investimento até ao montante de (euro) 5 000 000;

ii) 10 % do investimento relevante, relativamente ao investimento de valor superior a (euro) 5 000 000;

(...)

2 - A dedução a que se refere a alínea a) do número anterior é efectuada na liquidação respeitante ao período de tributação que se inicie em 2009.

3 - Quando a dedução referida no número anterior não possa ser efectuada integralmente por insuficiência de colecta, a importância ainda não deduzida pode sê-lo, nas mesmas condições, nas liquidações dos quatro exercícios seguintes.

(...)

5 - O montante global dos incentivos fiscais concedidos nos termos dos números anteriores não pode exceder o valor que resultar da aplicação dos limites máximos aplicáveis ao investimento com finalidade regional para o período de 2007-2013, em vigor na região na qual o investimento seja efectuado, constantes do artigo 7.º

 

           

Como se vê pela alínea a) do n.º 1 deste artigo 3.º o benefício fiscal concretiza-se através de «dedução à colecta de IRC».

Esta expressão não tem alcance substancialmente diferente da que é utilizada no SIFIDE II que é «montante apurado nos termos do artigo 90.º do Código do IRC».

Pelo que já atrás se referiu, a colecta derivada de tributações autónomas previstas no CIRC é «colecta de IRC», pelo que a expressão utilizada no RFAI não exclui a dedução dos investimentos elegíveis à colecta proporcionada por aquelas tributações.

Também em relação a este benefício fiscal vale o que atrás se referiu sobre

– a natureza excepcional das normas que prevêem este benefício fiscal;

– a prevalência dos interesses que o benefício fiscal visa atingir sobre o interesse na obtenção de receitas fiscais;

– a relevância da colecta derivada das tributações autónomas para dar ao benefício fiscal uma dimensão considerável, atenta a diminuta colecta de IRC que provém da liquidação com base no lucro tributável;

– a inadmissibilidade, à face do princípio constitucional da confiança, de uma hipotética interpretação restritiva a posteriori do alcance de um diploma que criou um benefício fiscal concretizado através de uma vantagem fiscal que é uma contrapartida de um determinado comportamento do contribuinte;

– o não afastamento da aplicação de uma norma especial sobre a dedução à colecta de IRC por uma norma geral posterior, mesmo com natureza pretensamente interpretativa.

 

Por isso, também quanto a esta questão, procede o pedido de pronúncia arbitral.

 

 

3.4. Questões de inconstitucionalidade suscitadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira refere no artigo 123.º da sua Resposta o seguinte:

 

Sempre se diga que qualquer interpretação que não aplique a norma constante da Lei Orçamento de Estado para 2016, vertida no artigo 133.º, que aditou o número 21 ao artigo 88.º do CIRC, com os efeitos previstos no artigo 135.º, ambos constantes da Lei do Orçamento de Estado para 2016, publicado a 30.03.2016, com entrada em vigor no dia seguinte, nos quais se preconiza, com carácter interpretativo, que

«A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos do artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado.»

e que, por conseguinte, permita a dedução à parte da colecta do IRC produzida pelas taxas de tributação autónoma dos benefícios fiscais efectuados em sede de IRC, in casu, SIFIDE/CFEI/RFAI, essa decisão é materialmente inconstitucional, por

a) violação do princípio da legalidade, ínsito no art.º 103.º n.º 2 da CRP,

b) violação do princípio da separação dos poderes, plasmado no art.º 2 da CRP,

c) violação do princípio da protecção da confiança previsto no art.º 2.º da CRP,

d) violação do princípio da igualdade, na sua formulação positiva da capacidade contributiva, decorrente do art.º 13.º, n.º2 e do 103.º, n.º 2 ambos da CRP».

 

Constata-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira não explica qual a razão ou razões pelas quais entende que são violados esses princípios, limitando-se a aludir a eles, pelo que não cumpriu, quanto a estas hipotéticas questões, ónus de alegar indispensável para ser assegurado o direito de contraditório.

De qualquer forma, com a brevidade que a insuficiência de alegação justifica, pode dizer-se que não se vê como possa ser violado o princípio da legalidade, pois a legalidade tem precisamente o alcance que atrás se referiu e, designadamente, a norma geral do número 21 ao artigo 88.º do CIRC, mesmo aplicada a situações anteriores não tem potencialidade, para revogar normas especiais, como são as do SIFIDE II e do RFAI que prevêem a dedução à colecta de IRC, que inclui a das tributações autónomas. Sendo esta a interpretação adequada das referidas normas, o que seria incompaginável com o princípio da legalidade seria aplicá-las com alcance diferente do que resulta das regras interpretativas adequadas.

Quanto ao princípio da separação dos poderes, a presente decisão é proferida por um Tribunal, pelo que tem carácter jurisdicional, e no exercício do poder jurisdicional cabe aos Tribunais que incumbe interpretar e aplicar as leis e, no caso, este Tribunal interpretou todas as normas em causa, inclusivamente o n.º 1 do artigo 88.º do CIRC, com o sentido que referiu e não, com outro.

No que concerne ao princípio da protecção da confiança, mesmo que se entenda que o seu âmbito de protecção se estende à Administração Estadual, não abrange, decerto, a confiança em que os tribunais adoptarão uma determinada interpretação, quando a jurisprudência não é pacífica.

No que respeita ao princípio da igualdade, não é identificada qualquer situação equiparável a que tenha sido dado um tratamento distinto. Para além disso, as tributações autónomas não têm por base a capacidade contributiva das empresas, pois a sua autonomia concretiza-se, precisamente, na imposição de tributação com indiferença pela existência de rendimentos, sendo excepções ao princípio da tributação das empresas com incidência «fundamentalmente sobre o seu rendimento real» (artigo 104.º, n.º 2, da CRP). Por isso, não se vê como seja violado o princípio da igualdade, e muito menos o artigo 103.º, n.º 2, da CRP, que se reporta aos requisitos formais das leis tributárias.

Pelo exposto, não ocorre violação dos princípios invocados.

 

4. Reembolso do montante pago em excesso e juros indemnizatórios  

 

A Requerente pede o reembolso do montante de imposto pago em excesso, no montante de € 153.073,37, acrescido de juros indemnizatórios, «em observância do disposto no artigo 43.º da LGT».

No que concerne a juros indemnizatórios, de harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

No caso em apreço, na sequência da ilegalidade dos actos de autoliquidação nas partes relativas à não dedução do SIFIDE e RFAI, há lugar a reembolso do imposto pago que devia ter sido deduzido, por força dos referidos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado», o que deverá ser determinado em execução de julgado.

O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

 

Das várias situações em que são devidos juros indemnizatórios indicadas no artigo 43.º da LGT, haverá lugar aos mesmos se se entender que ocorreu erro imputável aos serviços.

No caso em apreço, o imposto indevidamente pago foi autoliquidado, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira não teve qualquer intervenção na prática do acto de pagamento, sendo à própria Requerente que é imputável a sua prática.

Por outro lado, a Requerente que não alegou ter seguido influenciada por qualquer actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, dizendo que «a Requerente tem vindo a adotar, por prudência, como procedimento a dedução de benefícios fiscais à coleta de IRC, não considerando como tal a coleta de tributação autónoma, na medida em que, até à introdução da Reforma do IRC do exercício de 2014, existia a incerteza de que a tributação autónoma possuía caráter de IRC, tendo vindo esta esclarecer a sua natureza, corroborando, aliás, o que já anteriormente resultava do teor literal do artigo 12.° do mesmo Código» (artigo 9.º do pedido de pronúncia arbitral).

Por isso, quanto à autoliquidação, não ocorreu erro imputável aos serviços, não havendo, consequentemente direito a juros indemnizatórios derivado da sua prática.

No entanto, o mesmo não sucede com a decisão da reclamação graciosa, pois deveria nela ter sido acolhida a pretensão da Requerente, na medida em que é aqui julgada procedente, e o não acolhimento da pretensão é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Este caso de a Autoridade Tributária e Aduaneira manter uma situação de ilegalidade, quando devia repô-la deverá ser enquadrada, por mera interpretação declarativa, no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, pois trata-se de uma situação em que há nexo de causalidade adequada entre um erro imputável aos serviços e a manutenção de um pagamento indevido e a omissão de reposição da legalidade quando se deveria praticar a acção que a reporia deve ser equiparada à acção. ( [9] )

No caso em apreço, a reclamação graciosa foi apresentada em 30-03-2016 e foi decidida em 25-05-2016, dentro do prazo legal previsto no artigo 57.º, n.º 1, da LGT.

Por isso, a partir de 31-03-2016, começam a contar-se juros indemnizatórios, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, artigo 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

                       

            5. Decisão

 

            Termos em que acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

– julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto ao pedido de declaração de ilegalidade da decisão da reclamação graciosa e anular esta decisão;

– declarar a ilegalidade da autoliquidação relativa exercício de 2013, na parte relativa aos montantes disponíveis do SIFIDE II e RFAI que não foram deduzidos ao montante da colecta de IRC resultante de tributações autónomas e anular a autoliquidação na parte respectiva;

– condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar a Requerente da quantia que pagou em excesso, no montante de € 153.073,37, e a pagar juros indemnizatórios à Requerente, relativamente este montante, desde 31-03-2016 até ao seu reembolso, à taxa legal supletiva.

 

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 305.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 153.073,37.

 

            7. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.672,00, de harmonia com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 05 -01-2017

 

 

Os Árbitros

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

 

(Paulo Lourenço)

 

 

(Carla Castelo Trindade)

 

(vencida nos termos da declaração de voto anexa)


 

 

 

VOTO DE VENCIDO

Não acompanho a orientação que fez vencimento pelas razões que, ainda que de forma resumida, passo a reiterar.

 

Tudo começa pela divergência (fundamental) relativa à natureza das tributações autónomas.

Aqui - e ao contrário daquela que parece ser a posição sufragada pela decisão sub judice -, acompanha-se a posição uniforme e reiterada quer da jurisprudência do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo quer da Doutrina.

As tributações autónomas são um imposto sobre a despesa diferente e distinto do IRC que, indiscutivelmente, é um imposto sobre o rendimento.

Esta jurisprudência foi iniciada há já 6 anos no tribunal constitucional com o voto de vencido do Exmo. Conselheiro Vítor Gomes, aposto no Acórdão n.º 204/2010, onde se pode ler que: “Embora formalmente inserida no CIRC e o montante que permita arrecadar seja liquidado no seu âmbito e a título de IRC, a norma em causa respeita a uma imposição fiscal que é materialmente distinta da tributação nesta cédula, (….). Com efeito, estamos perante uma tributação autónoma, como diz a própria letra do preceito. E isso faz toda a diferença. Não se trata de tributar um rendimento no fim do período tributário, mas determinado tipo de despesas em si mesmas, pelas compreensíveis razões de política fiscal que o acórdão aponta (…).”. Em Acórdão n.º 310/12, de 20 de Junho, o Tribunal Constitucional reformulou a doutrina do Acórdão n.º 18/11 aproximando-se do então voto de vencido do Conselheiro Vítor Gomes, nos termos seguintes: “Contrariamente ao que acontece na tributação dos rendimentos em sede de IRS e IRC, em que se tributa o conjunto dos rendimentos auferidos num determinado ano (o que implica que só no final do mesmo se possa apurar a taxa de imposto, bem como o escalão no qual o contribuinte se insere), no caso tributa-se cada despesa efetuada, em si mesma considerada, e sujeita a determinada taxa, sendo a tributação autónoma apurada de forma independente do IRC que é devido em cada exercício, por não estar diretamente relacionada com a obtenção de um resultado positivo, e por isso, passível de tributação. Assim, e no caso do IRC, estamos perante um imposto anual, em que não se tributa cada rendimento percebido de per si, mas sim o englobamento de todos os rendimentos obtidos num determinado ano, considerando a lei que o facto gerador do imposto se tem por verificado no último dia do período de tributação (cfr. artigo 8.º, n.º 9, do CIRC). Já no que respeita à tributação autónoma em IRC, o facto gerador do imposto é a própria realização da despesa, não se estando perante um facto complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas perante um facto tributário instantâneo. Esta característica da tributação autónoma remete-nos, assim, para a distinção entre impostos periódicos (cujo facto gerador se produz de modo sucessivo, pelo decurso de um determinado período de tempo, em regra anual, e tende a repetir-se no tempo, gerando para o contribuinte a obrigação de pagar imposto com caráter regular) e impostos de obrigação única (cujo facto gerador se produz de modo instantâneo, surge isolado no tempo, gerando sobre o contribuinte uma obrigação de pagamento com caráter avulso). Na tributação autónoma, o facto tributário que dá origem ao imposto, é instantâneo: esgota-se no ato de realização de determinada despesa que está sujeita a tributação (embora, o apuramento do montante de imposto, resultante da aplicação das diversas taxas de tributação aos diversos atos de realização de despesa considerados, se venha a efetuar no fim de um determinado período tributário). Mas o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa.”.

Esta jurisprudência foi mais tarde reafirmada pelo Plenário, no Acórdão n.º 617/2012, processo n.º 150/12, de 31/1/2013 e, recentemente, no Acórdão n.º 197/2016, proferido no âmbito do processo n.º 465/2015.

No mesmo sentido tem andado o Supremo Tribunal Administrativo como se confirmará, entre outros, no Acórdão de 21/3/2012, processo 830/11, de 21/3/2012.

A doutrina também acompanha esta posição.

SÉRGIO VASQUES, na nota de rodapé 60, página 342, do seu Manual de Direito Fiscal (Almedina, 2015) afirma a este propósito que “No acórdão nº18/2011, porém, relativo ao agravamento das taxas de tributação autónoma de IRC sobre despesas com viaturas, concretizado em Dezembro de 2008 com efeitos reportados ao princípio desse ano, o Tribunal Constitucional ignora a questão, integrando as despesas avulsas sujeitas a tributação autónoma no seio do rendimento anual que serve de base de incidência ao IRC. Trata-se de uma forma de ver as coisas que não conseguimos subscrever, pois, como observa Vítor Gomes em voto de vencido, embora “formalmente inserida(s) no Código do IRC”, as taxas de tributação autónoma não incidem sobre o rendimento cuja formação se vai dando ao longo do ano mas antes sobre despesas avulsas que representam factos tributários autónomos e “a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em IRC no fim do período”.

Já RUI MORAIS (Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pp. 202-203) “está em causa uma tributação que incide sobre certas despesas dos sujeitos passivos, as quais são havidas como constituindo factos tributários. (…)”.

O Professor CASALTA NABAIS, considera, por seu turno, “Verdadeiros impostos sobre despesas realizadas pelas empresas. Tendo começado por incidir sobre despesas não documentadas e confidenciais e, depois, sobre as despesas de representação e com viaturas, foram entretanto as mesmas alargadas a diversas despesas e, em sede de IRC, a alguns rendimentos como lucros distribuídos e certas indemnizações ou compensações. O que nos leva a reconhecer que no IRC temos tributações autónomas sobre determinados rendimentos, sobre despesas que não são gastos fiscais e sobre despesas que são considerados gastos fiscais” chegando a afirmar “Tratar-se de uma tributação sobre a despesa ou consumo e não sobre o rendimento (…).” (Direito Fiscal, 8.ª ed., Almedina, Coimbra, 2015, p. 542).

No mesmo sentido, pode analisar-se a professora ANA PAULA DOURADO em Direito Fiscal, Lições, 2015, pp. 237 ss.

Esta tese foi transposta para a lei, de forma inequívoca, pelo próprio legislador quando na redacção introduzida ao artigo 23.º-A, n.º 1, alínea a), do Código do IRC pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, se passa a dizer que “não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável» «o IRC, incluindo as tributações autónomas”. Que sentido faria deixar claro na lei que a tributação autónoma e o IRC não são dedutíveis ao lucro tributável se as tributações autónomas fizessem parte do IRC? Assim, em face do exposto pode desde já concluir-se, de forma singela, que se o legislador fiscal entendesse que o IRC incluía as tributações autónomas não teria tido necessidade de distinguir as duas realidades, pois esse IRC já incluiria necessariamente as tributações autónomas.

E não é pelo facto de a tributação autónoma estar inserida no Código do IRC que as duas realidades se devem confundir.

Recorde-se que a tributação autónoma foi introduzida pelo artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 192/90, de 9 de Junho, não tendo sido imediatamente inserida no Código IRC. O legislador só 10 anos depois do surgimento da tributação autónoma decidiu introduzi-la no Código IRC através da Lei n.º 30-G/2000 de 29 de Dezembro. O que o legislador procurou com esta sistemática foi um efeito anestesiador, já que, não obstante as tributações autónomas serem liquidadas independentemente do IRC, são autoliquidadas juntamente com a declaração do IRC, através do modelo 22. Quanto a esta questão o Tribunal Constitucional considerou, nos Acórdãos n.ºs 18/2009 e 85/2010, que a tributação autónoma poderia estar inserida em qualquer outro código ou diploma autónomo.

E as realidades são diferentes desde logo porque os objectivos são diferentes.

No IRC visa-se a tributação do rendimento sob o escrutínio da capacidade contributiva.

Já a tributação autónoma teve, pelo menos originariamente, dois objectivos bem diferentes.

O primeiro o de tributar na esfera das empresas o que não se consegue tributar em sede de IRS e o segundo o de desincentivar a realização de certas despesas ou de certos comportamentos. A este propósito o professor Saldanha Sanches chegou mesmo a afirmar que “Neste tipo de tributação, o legislador procura responder à questão reconhecidamente difícil do regime fiscal que se encontra na zona de intersecção da esfera pessoal e da esfera empresarial” acrescentando ainda que na “«(...) designação de “tributações autónomas", escondem-se realidades muito diversas (...)»” (Manual de Direito Fiscal, 3.“ edição (2007), Coimbra Editora, pág. 406/7). O Professor Guilherme de Oliveira Martins afirma que as tributações autónomas “(…) cumprem, no essencial, duas funções: por um lado, evitar a errosão da base tributável em sede de IRC, fazendo incidir tributação sobre encargos que podem ser deduzidos pelos sujeitos passivos de IRC, mas que, sendo-o, se transformam num agravamento da tributação, pretendendo, portanto, servir como desincentivo à despesa com tais encargos; outros tipos de tributações autónomas visam, pura e simplesmente, penalizar comportamentos presuntivamente evasivos ou fraudulentos dos sujeitos passivos, consubstanciando um mecanismo antiabusivo.”. Já o Professor Casalta Nabais qualifica as tributações autónomas como “Verdadeiros impostos sobre despesas realizadas pelas empresas. Tendo começado por incidir sobre despesas não documentadas e confidenciais e, depois, sobre as despesas de representação e com viaturas, foram, entretanto, as mesmas alargadas a diversas despesas e, em sede de IRC, a alguns rendimentos como lucros distribuídos e certas indemnizações ou compensações. O que nos leva a reconhecer que no IRC temos tributações autónomas sobre determinados rendimentos, sobre despesas que não são gastos fiscais e sobre despesas que são considerados gastos fiscais” sendo que, mais adiante, quanto à finalidade das mesmas, acrescenta que, se, numa primeira fase, “visavam evitar que, através dessas despesas, as empresas procedessem à distribuição camuflada de lucros, sobretudo dividendos, bem como combater a fraude e evasão fiscais que tais despesas ocasionam, não só em relação ao IRS e IRC, mas também em relação às contribuições (das entidades patronais e dos trabalhadores) para a segurança social”, presentemente, o alargamento e o agravamento a que têm sido sujeitas revelam uma “finalidade clara de obter mais receitas fiscais” diz o professor Casalta Nabais.

E basta olhar à evolução das receitas obtidas pela tributação autónoma para concordar com este entendimento.

Evolução das Receitas da Tributação Autónoma[10]

 

A tributação autónoma visa então tributar uma vantagem patrimonial obtida via de regra através da realização de uma despesa e que se traduz, consequentemente, na diminuição do lucro tributável. O IRC visa por seu turno tributar o rendimento real do sujeito passivo atendendo à sua capacidade contributiva.

Aqui e em jeito de conclusão há que lembrar que é unanimemente aceite quer pela jurisprudência quer pela doutrina que as taxas autónomas de IRC (e IRS) são um tributo de obrigação única distinto dos próprios IRC e IRS, impostos de formação sucessiva. Há também que relembrar que a autonomia das taxas autónomas resulta de possuírem um facto gerador radicalmente distinto do IRS/IRC, de obedecerem a regras de liquidação próprias e de servirem finalidades muito específicas. Com efeito, as finalidades das taxas autónomas são hoje variadas mas, no que têm de mais importante, insista-se elas servem para garantir a igualdade tributária garantindo a sujeição a imposto de valores que, sendo despesa na esfera das empresas, prefiguram rendimento na esfera de terceiros e prevenindo o planeamento abusivo pelo recurso a paraísos fiscais. Estes objectivos são de superlativa importância para garantir a justa distribuição dos rendimentos e da riqueza a que apela o artigo103.º, n.º 1, CRP.

Em face do exposto concluímos que se há razões que justifiquem a admissão de deduções gerais à colecta do imposto (IRC), permitidas por lei por força do princípio da tributação do rendimento real e efectivo enquanto elemento revelador da capacidade contributiva o mesmo não acontece em relação à colecta devida por tributações autónomas. A dedução à colecta é uma realidade do IRC (e do IRS) enquanto imposto legitimado pelo princípio da capacidade contributiva.

Nas tributações autónomas, ou, arrisca-se, no IVA, essa dedução geral deixa de fazer sentido porque, não tributando os rendimentos mas despesas e se se quiser comportamentos, não se coloca, quanto a estes, qualquer questão de justiça na repartição do encargo geral do imposto. Não são estas as preocupações e os elementos enformadores do imposto. Seria mesmo ilógico permitir a dedução de encargos quando tal dedução, na prática, destruiria o sentido anti abusivo que as caracteriza e que se resume ao desincentivo de comportamentos desviantes que a sua instituição reprime ou dirime.

Em suma, as tributações autónomas, que incidem sobre certas despesas, funcionam de modo diferente do que constitui o escopo essencial do IRC, que tributa rendimentos, e, não obstante a inserção sistemática e a ligação funcional ao IRC, a verdade é que são cobradas no âmbito do processo de liquidação deste imposto sem, no entanto, se descaracterizarem e perderem sua raiz dogmática próprias.

Deste modo, não se pode subscrever uma conclusão como a deste acórdão que vá no sentido de que não subsiste fundamento legal para afastar a dedutibilidade do benefício fiscal do SIFIDE e RFAI à colecta das tributações autónomas porque tal resulta directamente da letra do artigo 4.º, n.º1 do respectivo diploma, conjugado com o artigo 90.° do Código do IRC. Desde logo porque esta conclusão resulta de uma interpretação jurídica que faz tábua rasa da convocação dos elementos teleológico e racional, mormente dos objectivos prosseguidos tanto pelo incentivo fiscal em causa quanto pelas finalidades adstritas às tributações autónomas desconsiderando os princípios subjacentes quer à tributação de IRC e quer ao benefício fiscal de IRC (SIFIDE e RFAI).

Compreenda-se então o conteúdo do artigo 4.º, n.º 1 do respectivo diploma, conjugado com o artigo 90.° do Código do IRC.

Para tal é necessário perceber que foi estabelecido no então n.° 6 do artigo 109.° do Código do IRC, actual artigo 117.°, que a obrigação de apresentar a declaração periódica de rendimentos abrange as entidades isentas de IRC, quando estejam sujeitas a tributação autónoma. E para determinados efeitos – designadamente para efeitos das deduções previstas no n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC ou do cálculo dos pagamentos por conta ou ainda do Resultado da Liquidação (artigo 92.°) - ficou, então, ao cuidado do intérprete e do aplicador da lei a tarefa de identificar a parte relevante de colecta do IRC. Isto extraindo dos normativos aplicáveis um sentido útil, literalmente possível, que permita uma solução coerente e conforme com a natureza e funções atribuídas a cada componente do imposto. Pois bem, é aqui que há que ter cautela. Quando se trata das deduções previstas no n.° 2 do artigo 90.° do Código IRC, concorda a maioria do colectivo deste Tribunal que a expressão “montante apurado nos termos do número anterior” deva ser entendida como abrangendo o somatório do montante do IRC, apurado sobre a matéria colectável determinada segundo as regras do capítulo III e às taxas previstas no artigo 87.° do mesmo Código, e o montante das tributações autónomas, calculado com base nas regras previstas no artigo 88.°. Ora, o resultado desta interpretação implicaria desde logo e de uma forma muito singela que na base de cálculo dos pagamentos por conta definida no n.° 1 do artigo 105.º do Código do IRC, e em termos idênticos aos utilizados no n.° 2 do artigo 90.°, fossem incluídas as tributações autónomas. Com efeito, para a base de cálculo dos pagamentos por conta apenas é considerado o IRC apurado com base na matéria colectável determinada segundo as regras do capítulo III e as taxas do artigo 87.° do respectivo Código. E aqui todos concordam. Pois que, é de salientar que a coerência e adequação deste entendimento alicerça-se na própria natureza dos pagamentos por conta do imposto devido a final, os quais, de acordo com a definição do artigo 33.° da LGT são “as entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pelos sujeitos passivos no período de formação do facto tributário”, constituindo uma “(...) forma de aproximação do momento da cobrança ao do da percepção do rendimento de modo a colmatar as situações em que essa aproximação não pode efectivar-se através das retenções na fonte”. Portanto, só faz sentido concluir que a respectiva base de cálculo corresponda ao montante da colecta do IRC resultante da matéria colectável que se identifica com o lucro/rendimento do exercício do sujeito passivo.

Assim sendo, a delimitação do conteúdo da expressão utilizada pelo legislador no n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC, “montante apurado nos termos do número anterior”, e no n.° 1 do artigo 105.° do Código do IRC, “imposto liquidado nos termos do n.º 1 do art. 90.°”, deve ser feita de forma coerente; ou seja, sendo-lhe consequentemente atribuído, em ambos os preceitos, um sentido unívoco. E esse sentido é o de que ao montante do IRC calculado mediante a aplicação das taxas do artigo 87.° à matéria colectável determinada com base no lucro e nas taxas do artigo 87.° do Código. Aqui acompanha-se o que defende a Requerida insistindo-se de que a única (e consistente) interpretação da expressão “montante apurado nos termos do número anterior” com a natureza das deduções referidas nas alíneas nas alíneas do n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC, relativas a:

-      créditos de imposto por dupla tributação internacional jurídica e económica (actuais alíneas a) e b));

-      benefícios fiscais (actual alínea c));

-      pagamento especial por conta (actual alínea d));

-      e retenções na fonte (actual alínea e)).

Na realidade, faz-se notar que o traço comum a todas as realidades reflectidas nas deduções referidas no n.° 2 do artigo 90.° do Código do IRC reside no facto de respeitarem a rendimentos ou gastos incorporados na matéria colectável determinada com base no lucro do sujeito passivo ou pagamentos antecipados do imposto, sendo, por isso, inteiramente alheios às realidades que integram os factos geradores das tributações autónomas.

Por sua vez, no que aos benefícios fiscais respeita, e tal como se pode ler Relatório do Grupo de Trabalho constituído pelo Despacho n.° 130/97-XIII do Ministério das Finanças o crédito de imposto ou dedução à colecta configura uma das modalidades, de entre as previstas no n.° 2 do artigo 2.° do EBF, que têm sido adoptadas sobretudo nas medidas de incentivos fiscais ao investimento. E são fundamentalmente duas as razões: uma, ligada à operacionalidade do benefício pela transparência e simplicidade do cálculo da despesa fiscal associada que, como é sabido, representa a receita fiscal (do IRC) cessante; e outra, que se prende com a filosofia subjacente aos benefícios, ou seja, a sua indexação à rendibilidade do investimento segundo a qual “a dedução de uma certa percentagem de um investimento à colecta de um imposto sobre lucros só se efectiva se houver lucro, o que premeia a rendibilidade do investimento” (Reavaliação dos Benefícios Fiscais in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.° 180, 1998, pp. 46-47).

Assim, também para as deduções à colecta a título de benefícios fiscais, o montante ao qual são efectuadas só pode respeitar ao imposto liquidado com base na matéria colectável, determinada com base nas regras do capítulo III e das taxas previstas no artigo 87.° do Código IRC. Só uma nota a este propósito para referir que, no contexto do artigo 92.° (resultado da liquidação), para efeitos do cálculo da limitação global dos benefícios fiscais abrangidos, quando ainda eram objecto de limitação alguns benefícios fiscais ao investimento, a expressão que figura no n.° 1 deste preceito “imposto liquidado nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 90.°”, em tudo idêntica à utilizada no n.° 1 do art.° 105.°, sempre foi entendida como não incluindo as tributações autónomas.

Ora em face de tudo o que se deixou dito e ao contrário do consignado no presente acórdão, não subsiste, assim, qualquer erro conceptual nem tão pouco qualquer contradição entre o acabado de expor e o facto de os regimes do SIFIDE e do RFAI estabelecerem que os mesmos são concretizados em deduções à colecta do IRC.

A dedução relativa a benefícios fiscais (alínea b) do n.° 2 do artigo 90.°), quando se trata de benefícios ao investimento - como é o caso do SIFIDE -, tem subjacente a filosofia de que o benefício constitui um prémio cuja amplitude varia com rendibilidade dos investimentos, pois quanto mais elevado foi o lucro/matéria colectável do IRC maior será a capacidade para efectuar a dedução.

O SIFIDE II permite às empresas a obtenção de um benefício fiscal, em sede de IRC, proporcional à despesa de investimento em investigação e desenvolvimento (ao nível dos processos, produtos e organizacional) que consigam evidenciar, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido (Cfr Lei n.° 55- A/2010 de 31 de Dezembro, Decreto-Lei n.° 82/2013 de 17 de Junho e Lei n.° 83-C/2013 de 31 de Dezembro). Concretamente, o benefício a obter com o SIFIDE II traduz-se na possibilidade de deduzir à colecta de IRC apurada no exercício, um montante de crédito fiscal que resulta do somatório das seguintes parcelas: Taxa base: 32,5% das despesas realizadas no exercício; Taxa incremental: 50% do acréscimo das despesas realizadas no exercício face à média aritmética simples das despesas realizadas nos dois exercícios anteriores, até ao limite de € 1.500.000. Ou seja e em síntese: os valores que traduzam o benefício fiscal em sede de SIFIDE são deduzidos “aos montantes apurados nos termos do artigo 90.º do Código do IRC, e até à sua concorrência” e na liquidação respeitante ao período de tributação em que se realizem as despesas para o efeito elegíveis e que, na falta ou insuficiência de colecta apurada nesses termos, as despesas que não possam ser deduzidas no exercício em que forem realizadas “poderão ser deduzidas até ao 6.° exercício imediato”. Ou seja, o legislador do regime do SIFIDE, ao fazer essa referência expressa ao montante apurado nos termos do n.° 1 do artigo 90.° do Código do IRC, está a reportar-se à colecta de IRC propriamente dita para cujo apuramento não concorrem as tributações autónomas precisamente porque não entram no apuramento nem do lucro tributável, nem da matéria colectável, e, como consequência, não concorrem para o IRC liquidado.

Assim, ao contrário do consignado no presente acórdão, insista-se, não subsiste qualquer erro conceptual nem tão pouco qualquer contradição entre o acabado de expor e o facto de os regimes do SIFIDE e do RFAI estabelecerem que os mesmos são concretizados em deduções à colecta do IRC. Referem-se à colecta do IRC que como vimos é diferente e distinta da tributação autónoma. Ao fazer essa referência expressa está o legislador a reportar-se à colecta de IRC stricto sensu para cujo apuramento não concorrem as tributações autónomas como se viu. E não concorrem precisamente porque não entram no apuramento nem do lucro tributável, nem da matéria colectável, e, como consequência, não concorrem para a colecta do IRC, nem mesmo do IRC liquidado ou do IRC a pagar/recuperar. O resultado das tributações autónomas, apurado de forma autónoma/independente/separada não concorre para a colecta do IRC, pelo contrário, há-de acrescer ao IRC liquidado para efeitos de apuramento do valor a pagar ou a recuperar, o que consubstancia um resultado bem diferente. Note-se a este propósito que são desde logo devidas tributações autónomas (agravadas) no caso de sujeitos passivos que apresentem prejuízos fiscais.

Em face de tudo o exposto e atenta em especial a natureza e a razão de ser das tributações autónomas não é possível admitir, sob pena de subversão da ordem de valores e de, arrisca-se, contrariedade com os princípios constitucionais, a dedução de benefícios fiscais aos valores devidos de tributação autónoma, sob pena de descaracterização dos princípios que especificamente se pretendem prosseguir, quer com os incentivos, quer com as tributações autónomas.

Admitir esta possibilidade leva a que um sujeito passivo pudesse efectuar a dedução a título de SIFIDE ou outros benefícios fiscais como RFAI ao montante de tributações autónomas incidentes sobre despesas não documentadas subvertendo por completo a função dessas tributações na prevenção ou evitação de comportamentos fiscal e socialmente indesejados.

Com efeito, tendo o regime das tributações autónomas maxime uma função desincentivadora de comportamentos abusivos, não se vê por que motivo lógico esse desincentivo poderia, depois, desvanecer-se em prol de um benefício fiscal. Não se vê como é que comportamentos como os de relações com paraísos fiscais possam ser desconsiderados e aproveitados em função de benefícios fiscais ao investimento o que sucederá ao possibilitar-se a dedução à colecta das tributações autónomas incentivos fiscais como aponta a presente decisão: Este resultado é no mínimo paradoxal.

É que aqui, e muito singelamente, há ainda que referir que os benefícios fiscais são normas absolutamente excepcionais no sistema fiscal, na medida em que encerram uma derrogação ao princípio da igualdade tributária, resultante do artigo 13.º CRP. Só podem sobreviver portanto a um juízo de inconstitucionalidade se a derrogação que trazem ao princípio da igualdade se mostrar necessária, adequada e proporcionada à tutela dos fins extrafiscais em jogo. Assim, para que se admita a dedução à colecta do IRC de créditos gerados por benefícios fiscais SIFIDE é necessário que se lhes reconheça intensidade suficiente para derrogar a igualdade que deve valer na tributação das empresas. Este exercício já de si não é fácil nem pode ser tomado com ligeireza, visto que a igualdade é o mais importante princípio material da Constituição Fiscal. Ora, se se admitir, porém, que benefícios fiscais como os do SIFIDE podem ser deduzidos não apenas à colecta do IRC mas também às taxas de tributação autónoma este controlo de proporcionalidade toma contornos muito diferentes. Com efeito, admitir que os contribuintes de IRC possam neutralizar as taxas de tributação autónoma de que são devedores mobilizando benefícios fiscais como o SIFIDE redundaria em reconhecer que a promoção do investimento em ciência por parte das empresas deveria prevalecer sobre o princípio da capacidade contributiva mesmo quando estão em causa pagamentos e operações que indiciam as mais graves práticas de planeamento abusivo e evasão fiscal. A interpretação da lei que se sustenta no acórdão degrada o princípio da capacidade contributiva num princípio menor do sistema e permite que empresas que realizam despesas confidenciais, práticas remuneratórias evasivas ou operações com territórios offshore se furtem por inteiro às consequências que a lei lhes associa, desde que a sua actividade envolva despesas relevantes de investigação e desenvolvimento (R&D). Na verdade, a interpretação da lei que se sustenta no acórdão tem consequência mais gravosa ainda, pois que a qualificação das taxas de tributação autónoma como colecta de IRC para efeitos da dedução de benefícios fiscais é doutrina que necessariamente valerá para quaisquer outros benefícios fiscais que operem por dedução à colecta e é doutrina que valerá necessariamente também em sede de IRS e não apenas de IRC.

Uma tal interpretação das normas do Código do IRC não apenas escamoteia o facto gerador e procedimento de liquidação muito próprios das taxas de tributação autónoma, mas sobretudo, uma tal interpretação das normas do Código do IRC atribui às regras do SIFIDE e aos benefícios fiscais em geral um valor constitucional que não possuem no confronto com o princípio da igualdade tributária. Interpretadas as normas do Código do IRC deste modo, parece manifesto que a lesão que trazem ao artigo 13.º da CRP não se mostra necessária, adequada nem proporcionada ao objectivo de promoção da ciência que está subjacente ao SIFIDE.

Assim, tendo em consideração tudo o que se deixou dito, seria de concluir pela ilegalidade da dedutibilidade do SIFIDE e do RFAI à colecta das tributações autónomas mesmo sem necessidade de se lançar mão do carácter interpretativo dado pelo artigo 135.º da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março (OE para 2016), ao n.º 21 do artigo 88.º do Código do IRC, que passa a ter o seguinte conteúdo: “21 - A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos no artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado”.

Na tese que se sufraga, o legislador, ao aditar este n.º 21 ao artigo 88.º do CIRC com o conteúdo mencionado limitou-se a acolher e a reforçar o sentido interpretativo que já resultava das normas vigentes, como ficou demonstrado.

Há que sublinhar que a interpretação que se propõe no presente não só possui alcance em sede de SIFIDE e IRC mas quanto a todos os benefícios fiscais dedutíveis à colecta do IRS/IRC o que será bastante grave. Há que sublinhar ainda que tribunal arbitral tem a obrigação de fazer da lei a interpretação mais conforme à CRP, tal como o têm os tribunais judiciais, termos em que, pelas razões expostas, negaria provimento ao pedido arbitral de declaração de ilegalidade da autoliquidação de IRC, na parte produzida pelas tributações autónomas com a sua consequente manutenção na ordem jurídica.

 

 

Carla Castelo Trindade

 


[1] Expressão utilizada pelo Ilustre Professor SALDANHA SANCHES, J. L., Manual de Direito Fiscal, pág.407. «Com esta previsão [tributações autónomas] o sistema mostra a sua natureza dual.»

[2] De facto, o que existe é um pagamento único, pois, quanto às regras de pagamento, no art.º 104.º, n.º 2, alínea a),do CIRC o legislador refere-se ao montante total apurado na declaração, incluindo, portanto, todos os apuramentos.

[3] FREITAS PEREIRA, M.H., Fiscalidade, Almedina, 2014-5.ª ed., págs. 439-440.

[4]  Lei n.° 40/2005, de 3 de Agosto para vigorar entre 2006 e 2010, Lei n.° 55-A /2010, de 31 de Dezembro (artigo 133.°) institui o SIFIDE 11 a vigorar entre 2011 e 2015, alterado pela Lei n.° 64-B/2011, de 30 de Dezembro.

[5] Expressão utilizada pelo Ilustre Professor SALDANHA SANCHES, J. L., Manual de Direito Fiscal, pág.407. «Com esta previsão [tributações autónomas] o sistema mostra a sua natureza dual.»

[6] De facto, o que existe é um pagamento único, pois, quanto às regras de pagamento, no art.º 104.º, n.º 2, alínea a),do CIRC o legislador refere-se ao montante total apurado na declaração, incluindo, portanto, todos os apuramentos.

 [7] Sublinhado nosso.

[8] No Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 465/2015 pode ler-se o seguinte:

«a tributação autónoma, embora regulada normativamente em sede de imposto sobre o rendimento, é materialmente distinta da tributação em IRC, na medida em que incide não diretamente sobre o lucro tributável da empresa, mas sobre certos gastos que constituem, em si, um novo facto tributário (que se refere não à perceção de um rendimento mas à realização de despesas).

[…]

Com efeito, como se fez notar, o IRC e a tributação autónoma são impostos distintos, com diferente base de incidência e sujeição a taxas específicas.»

[9] Apontamentos ao IRC, Coimbra, Almedina, 2007, pp. 202-203.

[10] Idem, p. 203.

[11] No ano de 2000, as taxas do IRC encontravam-se reguladas no artigo 69.º do CIRC. Neste ano, conforme o número 1 deste artigo, a taxa de IRC era de 32%.

[12] À data dos factos, artigo 4.º, n.º 1, do SIFIDE, na redação introduzida pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (cfr. o seu artigo 133.º) para vigorar até 2015 como SIFIDE II, por sua vez alterado já pela Lei 64-B/2011, de 30 de dezembro (cfr. os seus artigos 163.º e 164.º) vertido entretanto para os artigos 33.º e seguintes do Código Fiscal do Investimento aprovado pelo Decreto-Lei n.º 82/2013, de 17 de Junho, e alterado pela Lei n.º 83-C/2013 de (cfr. os seus artigo 211.º e 212.º) que, entre outras alterações, prorrogou a vigência do SIFIDE II até 2020.

[13] À data dos factos, artigo. 3.º, n.º 1, al. a), do RFAI, aprovado pelo artigo 133.º da Lei n.º 10/2009, de 10 de março, tendo a sua vigência sido sucessivamente prorrogada até 31 de Dezembro de 2013, pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril (cfr. o seu artigo 116.º), pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (cfr. o seu artigo 134.º), pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (cfr. o seu artigo 162.º) e pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (cfr. o seu artigo 232.º), e transferido entretanto para os artigos 23.º e seguintes do Código Fiscal do Investimento aprovado pelo Decreto-Lei n.º 82/2013, de 17 de Junho, que, entre outras alterações, prorrogou a vigência do RFAI até 2017.

[14] O Direito. Introdução e teoria geral, 13.ª ed., Coimbra, Almedina, 2009.

 

 

 



[1]              O n.º 6 do artigo 87.º do CIRC foi revogado pela Lei n.º 55/2013, de 8 de Agosto, o que não tem relevância para este efeito de demonstrar que fora do âmbito das tributações autónomas havia e há cálculos parciais de IRC com base em taxas especiais aplicáveis a determinadas matérias colectáveis.

[2]              É, aliás, neste sentido a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira que refere que há «dois cálculos distintos que, embora processados, de acordo com a mesma base jurídica – a alínea a) do n.º 1 do art.º 90.º do CIRC - e nas declarações a que se referem os artigos 120.º e 122.º do mesmo código, são efectuados com base em parâmetros diferentes, pois cada uma se materializa na aplicação das suas próprias taxas, previstas nos artigos 87.º ou no 88.º do CIRC, às respectivas matérias colectáveis determinadas igualmente de acordo com regras próprias» (artigo 27.º da Resposta).

[3]              Actualmente apenas em relação a algumas tributações autónomas se poderá encontrara natureza de normas antiabuso, pois, como ensina CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 7.ª edição, página 543, «é, porém, evidente que o alargamento e agravamento de que tais tributações autónomas têm presentemente uma finalidade clara de obter mais receitas fiscais».

 [4]             Neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15-11-2000, processo n.º 025446, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 501, páginas 150-153, em que se cita abundante jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e do Supremo Tribunal de Justiça.

                Este Boletim do Ministério da Justiça está disponível em:

http://www.gddc.pt/actividade-editorial/pdfs-publicacoes/BMJ501/501_Dir_Fiscal_a.pdf

[5]              BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso legitimador, página 186.

[6]              Este texto está disponível em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/70E81137-189A-440E-AF11-88B4A6CC1C9A/0/Notas_Previas_IRC_20092011.pdf.

De resto, há já vários anos que apenas uma minoria de contribuintes pagava IRC com base no lucro tributável do respectivo exercício, como se pode ver nos documentos estatísticos publicados em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/dgci/divulgacao/estatisticas/estatisticas_ir/:

– 29% no período de tributação de 2010, em que cerca de 76% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, ou de outras componentes positivas do imposto (Tributações Autónomas, Derrama, Derrama Estadual, IRC de períodos de tributação anteriores, etc.).;

– 31% no período de tributação de 2009, em que de 77% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, das Tributações Autónomas e do IRC de exercícios anteriores;

– 34% no período de tributação de 2008, em que 79% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, das Tributações Autónomas e do IRC de exercícios anteriores;

– 36% no período de tributação de 2007, em que 80% dos sujeitos passivos efectuaram pagamentos de IRC por via do Pagamento Especial por Conta, das Tributações Autónomas e do IRC de exercícios anteriores.

 

 

 

[7]              OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito – Introdução e Teoria Geral, página 260.

[8]              Registe-se que não releva para a apreciação das questões suscitadas nestes autos o que a Autoridade Tributária e Aduaneira refere a propósito do regime do crédito fiscal extraordinário ao investimento (CFEI), criado pela Lei n.º 49/2013, de 16 de Julho, por não estar em causa na autoliquidação efectuada qualquer crédito abrangido por tal regime e ser manifesto que as normas especiais para aplicação deste benefício fiscal aos grupos de sociedades, que constam do n.º 5 do artigo 3.º daquela Lei, não têm qualquer correspondência no SIFIDE II ou no RFAI.

                Não havendo no SIFIDE II e no RFAI normas especiais sobre a aplicação dos benefícios fiscais aos grupos de sociedades, é aplicável o regime geral previsto no n.º 6 do artigo 90º do CIRC, que estabelece que «quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções referidas no n.º 2 relativas a cada uma das sociedades são efectuadas no montante apurado relativamente ao grupo, nos termos do n.º 1».

 

( [9] )         ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, 10.ª edição, página 528:

«A omissão, como pura atitude negativa, não pode gerar física ou materialmente o dano sofrido pelo lesado; mas entende-se que a omis­são é causa do dano, sempre que haja o dever jurídico especial de praticar um acto que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação desse dano».

[10] Fonte: Portal das Finanças