Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 582/2016-T
Data da decisão: 2017-04-04  IRC  
Valor do pedido: € 836.705,81
Tema: IRC – Amortizações. Aerogeradores. Painéis fotovoltaicos.
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Acórdão Arbitral

 

Os árbitros Jorge Lopes de Sousa (árbitro presidente), Gustavo Courinha e Nuno Miguel Morujão, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 12/12/2016, acordam o seguinte:

 

 

I.                   Relatório

 

1.      O contribuinte A…– SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, S. A., com o NIPC … (doravante “Requerente”), apresentou, no dia 29/6/2016, um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Coletivo, nos termos das disposições conjugadas dos arts 2.º e 10.º do decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”).

2.      O Requerente solicita a pronúncia arbitral sobre o pedido de anulação parcial de liquidação de IRC, correspondentes liquidações de juros, e de demonstração de acerto de contas, respeitantes ao período de tributação de 2011, na parte correspondente às correções que a AT realizou ao lucro tributável apurado no âmbito do RETGS, que tiveram por referência idênticas correções realizadas pela mesma às matérias coletáveis de sociedades subsidiárias da ora Requerente, as quais assentaram na forma como estas reconheceram fiscalmente os gastos das amortizações realizadas, respetivamente, aos aerogeradores e painéis fotovoltaicos, bem como na parte em que desconsiderou os prejuízos fiscais reportáveis, pedindo ainda o pagamento de uma indemnização derivada da prestação de garantia indevida e juros indemnizatórios por pagamento – via compensação – de imposto indevidamente liquidado.

3.      O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT, em 10/10/2016.

a.       O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na al. a) do n.º 2 do art. 6.º e da al. b) do n.º 1 do art. 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo art. 228.º da lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo os ora signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

b.      Em 23/11/2016, as partes foram notificadas da designação dos árbitros, não tendo arguido qualquer impedimento.

c.       Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 12/12/2016.

d.      Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.

4.      A fundamentar o pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alega, em síntese:

a.       Para efeitos de depreciação ou amortização contabilística dos aerogeradores e dos painéis fotovoltaicos, as subsidiárias da Requerente apuraram o período de vida útil desses mesmos equipamentos, tendo em consideração as disposições constantes nas regras de normalização contabilística vigentes em Portugal.

b.      Nesse contexto, quanto à determinação da vida útil daqueles ativos, levou-se em linha de conta diversos fatores, como sejam:

                                                  i.      Os benefícios económicos futuros que os aerogeradores e os painéis fotovoltaicos eram capazes de gerar. Neste plano assumiu relevância os acordos com o Estado Português, mediante os quais este se comprometeu a adquirir a totalidade da eletricidade produzida nos centros electroprodutores daquelas entidades, mediante o pagamento por parte deste de uma remuneração fixa e garantida, por um período de 15 anos, a contar do início do fornecimento de eletricidade à rede, nos termos da legislação aplicável. Findo esse período da remuneração garantida, passando os fornecimentos da eletricidade produzida a estar sujeitos às regras do mercado liberalizado, prognosticaram as subsidiárias da Requerente uma quebra de rentabilidade acentuada dos ativos em causa. De tal modo que, findo aquele período, a entrada em novo período de elevada incerteza poderá conduzir a cessão das respetivas atividades; e

                                                ii.      A obsolescência técnica provocada designadamente por alterações ou melhoramentos na produção de tais equipamentos, traduzindo-se alternativas no mercado mais produtivas e/ou mais baratas, não existindo por outro lado mercado secundário para os equipamentos.

c.       Dado que nas tabelas anexas ao Decreto Regulamentar (“DR”) n.º 2/90, de 12 de janeiro e ao DR n.º 25/2009, de 14 de setembro (diploma legal que revogou o antes indicado), não continham uma referência expressa acerca das taxas de depreciação e amortização (e ao período de vida útil que lhes estava subjacente) a aplicar aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicos, entenderam as subsidiárias da Requerente que o período de vida útil esperado para estes tipos de equipamentos corresponderia a 16 anos (o referido período de 15 anos em que receberia uma tarifa legalmente garantida conjugado com o período de cerca de um ano referente à instalação daqueles centros eletroprodutores), devendo os mesmos ser amortizados anualmente a uma taxa de 6,25%. Aliás, esse período de vida útil estimado e a correspondente taxa de depreciação eram equivalentes aos que o legislador fiscal havia fixado para os equipamentos de centrais hidroelétricas.

d.      O legislador fiscal não procedeu à concreta definição do que entende por “vida útil” de um bem, apenas se estabelecendo a forma como a mesma é apurada em função das taxas previstas nos DR das amortizações.

e.       Por outro lado, o estabelecimento, por via legal, do período de vida útil de um item representa uma lógica dogmática e particularmente rígida da parte do legislador fiscal, sempre mais afastado da realidade e, frequentemente, incapaz de acompanhar os avanços técnicos, tecnológicos e civilizacionais.

f.       Razão pela qual o próprio legislador fiscal – reconhecendo a sua incapacidade de acompanhar, a pari passu, a realidade económica – previu, no artigo 31.º, n.º 3, do Código do IRC, e no artigo 5.º, n.º 3, do Decreto-Regulamentar 25/2009, normas que constituem uma “válvula de escape” para os casos em que a lei (neste caso, o DR 25/2009) não contenha uma pré-determinada fixação das taxas de depreciação e amortização (e subsequente período de vida útil) de um dado elemento do ativo fixo tangível.

g.      Quanto a esses preceitos, coloca-se perante o intérprete a necessidade de saber qual o significado jurídico-tributário do conceito de período de vida útil ou de utilidade esperada, e a questão de saber quais as condições ou critérios que permitem aferir da razoabilidade de uma determinada taxa de depreciação ou amortização de um determinado item do ativo fixo tangível. Se é certo que em termos tecnológicos a utilidade de um bem pode ser associada ao período de garantia do seu bom funcionamento, é igualmente certo que à luz do regime fiscal português a utilidade prevalecente é a utilidade económica (tendo em vista fatores como os benefícios económicos futuros gerados pelos ativos para os seus proprietários) e não a “durabilidade” do ativo ou a vida útil de “catálogo”.

h.      O que está implicitamente reconhecido nas taxas de depreciação fiscalmente aceites é o facto de não ser suficiente que um determinado ativo funcione para que tenha valor económico. É necessário correlacionar os gastos de uso de um ativo com os rendimentos que ele gera e com todas as circunstâncias (como sejam o desgaste, a obsolescência técnica e constrangimentos legais) que afetam essa capacidade de gerar rendimentos.

i.        Os business plans inicialmente delineados, pelas subsidiárias da Requerente, que presidiram à definição de uma taxa de depreciação de 6,25%, tiveram precisamente em consideração a capacidade de estes equipamentos serem capazes de produzirem eletricidade durante um determinado espaço temporal e, nesse sentido, estarem aptos a gerarem réditos para as suas respetivas proprietárias.

j.        O período de vida útil esperada (a que o Código do IRC faz referência) deve ser entendido na sua vertente económica, e nunca como o período de “durabilidade” que é proposto pela AT no Relatório.

k.      De acordo com o processo n.º 75/2014-T do CAAD, é inquestionável que a definição de um período de vida útil esperado, para efeitos contabilísticos e também fiscais, se faça tendo por referência fatores legais, financeiros, tecnológicos e de mercado que afetem a atividade económica dos sujeitos passivos, aí se concluindo no sentido de caucionar o período de vida útil estimado pelo sujeito passivo para os painéis fotovoltaicos em questão, em detrimento do critério adotado pela AT (ao que se seguiram várias decisões arbitrais no mesmo sentido).

l.        Nessas decisões arbitrais, os Árbitros concluíram pela correção das estimativas de vida útil realizadas pelos sujeitos passivos em causa (sendo que num dos casos era a ora Requerente que estava em causa) e, em consequência, rejeitaram a argumentação da durabilidade técnica veiculada pela AT.

m.    Num plano mais técnico (“extra-fiscal”), há a considerar um estudo preparado pela B…(“doravante B…”) sustenta que as instalações de produção de energia hidroelétrica apresentam longos períodos de vida útil, podendo os mesmos variar entre os 30 e os 80 anos, e que o período de vida útil dos projetos hidroelétricos é o mais longo face a qualquer outra instalação geradora de eletricidade, e isto apesar dos últimos anos terem-se registado fortes desenvolvimentos tecnológicos no que respeita à capacidade de produção e eficiência dos novos equipamentos de produção de eletricidade através de fontes renováveis. Ou seja, tais evoluções tecnológicas não permitem que os aerogeradores e os painéis fotovoltaicos apresentem um período de vida útil que ultrapasse a dos equipamentos de produção de energia hidroelétrica. Assim, face aos períodos mínimo e máximo de vida útil que resultam da aplicação das taxas de amortização previstas no DR 25/2009 para os equipamentos das centrais hidroelétricas, dever-se-á concluir que o período (mínimo e máximo) de utilidade esperada para os aerogeradores e para os painéis fotovoltaicos tenderá a igualar (mas não ultrapassará) o dos equipamentos primeiramente referidos. Por outras palavras, se um projeto hidroelétrico tem uma durabilidade variável de 30 a 80 anos e uma vida útil esperada de 16 anos – nos termos da Tabela I, Divisão V, do Grupo I, do DR 25/2009 – por maioria de razão, os aerogeradores e os painéis fotovoltaicos que estejam em funcionamento durante cerca de 15 anos nunca poderão ter uma vida útil esperada superior a 16 anos.

n.      Para efeitos de depreciação e amortização dos aerogeradores e painéis fotovoltaicos as subsidiárias das Requerente tiveram em linha de conta fatores ponderosos, de caráter financeiro, técnico, ambiental e legal, que justificaram a determinação de uma vida útil de 16 anos, e o subsequente reconhecimento do correspondente gasto por aplicação de uma taxa de 6,25% sobre o custo de aquisição daqueles equipamentos.

Esses elementos, objetivos, considerados fundamentam a razoabilidade da taxa aplicada, conforme várias decisões arbitrais citadas.

o.      Diz-se na Proposta da Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde – corroborando as opções das subsidiárias da Requerente – que originou a lei em vigor sobre o tema:

                                                  i.      “A Comissão concorda com a fixação de período de amortização de equipamento eólico e fotovoltaico entre 12,5 anos e 25 anos….

                                                ii.      …caso o período de vida mínima de operação de uma turbina eólica (garantido pelos fabricantes) fosse de 20 anos, o período de vida útil máximo seria assumido, de forma automática, como sendo o dobro do período mínimo, i.e. 40 anos, o que não corresponde, em caso algum, à realidade do sector eólico atual. A metodologia desenvolvida pelo LNEG permitiu concluir que o período de vida útil máxima de uma turbina eólica se situa entre os 20 e os 25 anos.

                                              iii.      No que respeita ao equipamento fotovoltaico aplica-se um raciocínio semelhante…poder-se-á dizer que o tempo de vida útil de um sistema fotovoltaico situa-se num valor entre 20 anos e cerca de 30 anos sendo tipicamente o valor de 25 anos o valor que mais consenso oferece nomeadamente em termos de garantias dos módulos fotovoltaicos e em termos de tempo previsto para o respetivo desmantelamento…

                                              iv.      …As taxas a utilizar devem seguir uma razoabilidade técnica e de eficiência económica…

                                                v.      …Tendo em conta estes dois aspetos, parece razoável a adoção de um prazo máximo de vida útil de 25 anos, a que corresponderá, nos termos da bitola fiscal consagrada pelo legislador, um prazo mínimo de vida útil de 12,5 anos”.

p.      Esta Proposta de Lei deu origem à lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro (doravante “Lei da Fiscalidade Verde”), a qual, tendo ido mais longe do que constava na redação inicialmente proposta, estabeleceu alterações ao DR 25/2009, nomeadamente quanto a equipamentos de energia solar fotovoltaica, ou equipamentos de energia eólica, para os quais atribuiu uma taxa de 8%.

q.      Nesse sentido, o legislador atendeu aos trabalhos da Comissão e atribuiu um período de vida útil aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicas de 12,5 (mínimo) a 25 anos (máximo), demonstrando como inteiramente razoável o período aplicado pela Requerente de 16 anos. Ou seja, o legislador fiscal veio a confirmar, com esta alteração legislativa, que o período de vida útil estimado pelas subsidiárias da Requerente para aqueles equipamentos era razoável, de um ponto de vista económico e também fiscal.

r.        O legislador só não estabeleceu que a nova taxa se aplicava a períodos de tributação já ocorridos, para evitar prejudicar aqueles contribuintes que, na ausência da lei, tivessem estabelecido uma taxa diferente.

s.       Assim, não faz sentido que a AT insista que os prazos de amortização e depreciação propostos pelos contribuintes para os aerogeradores e painéis fotovoltaicos não são razoáveis, quando o próprio legislador veio a estabelecê-los como sendo razoáveis, ainda no decurso do período de amortização dos mesmos equipamentos.

t.        A AT afirmou que o período de vida útil dos aerogeradores e dos módulos fotovoltaicos deveria corresponder, respetivamente, a 20 e a 25 anos, baseando-se nos documentos anexos ao Relatório, que consistem em elementos disponibilizados por fornecedores desses equipamentos, esquecendo-se porém que por aplicação das normas legais (vide os art. 3.º e 18.º, n.º 2, do DR 25/2009, e 30.º, n.º 6, do Código do IRC), o período mínimo de vida útil daqueles equipamentos andaria então em torno dos 10 (para os aerogeradores) a 12,5 (para os painéis fotovoltaicos) anos. Tal período mínimo de vida útil corresponderá à aplicação aos aerogeradores de uma taxa de amortização máxima de cerca de 10% e, no caso dos painéis fotovoltaicos, de 8%. Assim, o período de vida útil que a Requerente e as suas subsidiárias estimaram para os aerogeradores e painéis fotovoltaicos (16 anos) se encontra dentro dos intervalos temporais definidos quer pela AT (entre 10 e 20 anos para os aerogeradores e 12,5 a 25 anos para os painéis fotovoltaicos), quer pelo legislador fiscal (entre 12,5 a 25 anos para ambos os equipamentos).

u.      Que a AT está a trabalhar com um período de vida máximo resulta também de um estudo do LNEG, intitulado «Estudo Técnico “Período de Vida Útil Esperada” de Equipamentos de Conversão de energia Eólica», elaborado pela Unidade de Análise Energética e Redes do LNEG em dezembro de 2013, onde se conclui que “a metodologia desenvolvida pelo LNEG permitiu concluir que o período de vida útil máxima de uma turbina eólica se situa entre os 20 e os 25 anos”. Mais adiante o Estudo refere que “caso o período de vida mínima de operação de uma turbina eólica (garantido pelos fabricantes) fosse de 20 anos, o período de vida útil máximo seria assumido, de forma automática, como sendo o dobro do período mínimo, i.e. 40 anos, o que não corresponde, em caso alguém, à realidade do sector eólico atual”. Ainda mais adiante, é referido de novo que “de acordo com os resultados anteriormente apresentados na figura 18, este valor de redução corresponde a um período de tempo de vida útil máxima entre os 20 e 25 anos” (sublinhados e destacados da Requerente). Ou seja, esta doutrina pronunciou-se no sentido de o período de vida útil máximo (destaque e sublinhado pela Requerente) dos aerogeradores não poder exceder entre 20 a 25 anos.

v.      A própria Direção de Serviços de IRC (doravante “DSIRC”) já teve a ocasião de defender que perante a existência de uma tarifa garantida (naquele caso de 20 anos) é necessário determinar a taxa de depreciação “de forma a que os gastos sejam balanceados com os réditos a obter com a produção e venda de energia”, determinando-se nesse despacho (documento 13) que “como a taxa de depreciação das centrais fotovoltaicas não se encontra prevista nas Tabelas (…) será aceite pela Autoridade Tributária a taxa de depreciação correspondente ao limite temporal da vida útil da central – 20 anos” (com negrito da Requerente).

w.    Ao exposto acresce salientar a clara violação do princípio constitucional da igualdade e da tributação do lucro real.

x.      A aplicação das taxas de amortização e depreciação propostas pela AT para os aerogeradores e painéis fotovoltaicos é inconstitucional, na medida em que é desproporcional, implicando que a Requerente e as suas subsidiárias sejam penalizadas face a outras entidades produtoras de energia.

y.      Com efeito, a AT considera “razoável” uma taxa de amortização e reintegração de 20 anos para os aerogeradores e de 25 anos para os painéis fotovoltaicos, quando o legislador fiscal considerou razoável uma taxa de 16 anos para equipamentos de centrais hidroelétricas. Por outras palavras, estabelecendo o paralelismo entre estes equipamentos de produção de energia elétrica, a AT considera que é “razoável” a aplicação de um período de reintegração quatro anos mais longo (i.e. 20 – 16) para os aerogeradores e nove anos mais longo (i.e. 25 – 16) para os painéis fotovoltaicos, quando estes têm comprovadamente um período de utilidade, entre sessenta (i.e. 80 – 20) e cinquenta e cinco anos inferior (i.e. 80 – 25) aos equipamentos de centrais hidroelétricas.

z.       Por conseguinte, caso se tomasse por válida a posição da AT – o que se admite como mera hipótese académica – estaríamos perante uma manifesta violação o princípio da justiça material, porquanto se estaria a tratar de forma manifestamente mais gravosa a ora Requerente. Havendo, por esta via, mais um motivo para considerar ilegais e inconstitucionais as correções e consequente liquidação adicional efetuadas pela AT no caso sub judice.

aa.   A AT afirma, por outro lado, que as subsidiárias da Requerente estão a considerar prejuízos fiscais reportáveis (disponíveis em 2011) superiores aos devidos, uma vez que os lucros de 2010 foram corrigidos pela AT. Sucede porém que essas correções foram oportunamente contestadas pela Requerente, apresentando um pedido de pronúncia arbitral junto do CAAD (cfr. processo n.º 593/2015-T), que veio a decidir no sentido da anulação das liquidações de IRC em causa, por sinal atinentes a amortizações dos aerogeradores e painéis fotovoltaicos.

bb.  Assim, a partir do momento em que essas correções realizadas pela AT ao lucro tributável da Requerente, apurado no âmbito do RETGS, foram julgadas ilegais, tinha (e tem) aquele ente público o dever de, em conformidade com o art. 100.º da LGT, reconstituir total e imediatamente a situação que existiria se não tivesse sido cometida aquela ilegalidade. Justifica-se portanto, que em face da declaração da ilegalidade das correções respeitantes ao período de tributação de 2010, a AT reponha o nível dos prejuízos fiscais que a Requerente e suas subsidiárias dispunham, em 2010, em momento anterior às correções julgadas por ilegais.

cc.   Por discordar dos fundamentos apresentados pela AT para proceder à liquidação adicional de imposto, a Requerente optou por não pagar o imposto e juros liquidados por aquela, atendendo a que pretendia discutir (como o está aqui a fazer) a ilegalidade dessas liquidações. Assim, aguardou que fosse instaurado o correspondente processo de execução fiscal, para prestar garantia bancária e assim suspender quaisquer diligências de cobrança até que seja proferida uma decisão final e transitada em julgado quanto à legalidade da liquidação, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 169.º, do CPPT.

dd. Após apresentar garantia bancária, a ora Reclamante foi notificada da constituição de um penhor sobre créditos, no valor de € 968.895,63, tendo tal penhor sido constituído sobre parte do montante do IRC a reembolsar à ora Requerente, referente ao período de tributação de 2015, apurado nos termos da Declaração Modelo 22 submetida pela Requerente. Posteriormente, no dia 6/9/2016, esse penhor sobre o crédito fiscal da Requerente foi objeto de conversão em penhora, daí resultando que a AT procedeu a um ato de compensação de créditos sem que previamente se tivesse pronunciado sobre a garantia oferecida, em ordem à suspensão da execução.

ee.   Pelo que, a Requerente tem direito a ser devidamente indemnizada em resultado da prestação de garantia bancária de forma indevida, nos termos do artigo 53.º da LGT, e tem também direito a juros indemnizatórios por pagamento indevido – pagamento este efetuado por compensação.

5.      Em 12/12/2015, o tribunal arbitral proferiu um despacho de notificação ao Sr. Diretor Geral da AT para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar resposta, juntar cópia do processo administrativo e, querendo, requerer a produção de prova adicional.

6.      A AT ofereceu Resposta, acompanhada do Processo Administrativo, alegando, em síntese:

a.       Por se ver na impossibilidade de conhecer e poder pronunciar-se quanto ao teor dos alegados dezassete documentos que a Requerente protestou juntar, à cautela, a Requerida impugna os mesmos para todos os efeitos legais. Caso a Requerente venha a juntar os alegados documentos, a Requerida não prescinde do direito ao exercício do contraditório.

b.      Relativamente aos elementos do ativo para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada, de acordo com o previsto no n.º2 do artigo 31º do CIRC. No mesmo sentido, o artigo 5º nº 3 do DR nº 2/90 estabelece que: “Relativamente aos elementos para os quais não se encontrem fixadas, nas tabelas referidas no n.º 1, taxas de depreciação ou amortização são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada

c.       No caso sub judice, os aerogeradores e os painéis fotovoltaicos são utilizados para a produção de energia, integrando-se na atividade das empresas integradas no Grupo A…, pelo que, não se encontram previstos nas tabelas anexas ao DR nº 25/2009.

d.      Deste modo, a AT teve de recorrer ao critério previsto no artigo 31º nº 2 do CIRC e no artigo 5º nº 3 do DR nº 25/2009 para determinar a referida taxa. Ou seja, não determinando a lei a taxa de depreciação ou amortização a aplicar aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicos destinados à produção de energia, somos reconduzidos para as taxas que pela AT sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada.

e.       O único critério imposto pela lei à AT é o da utilidade esperada.

f.       A razoabilidade aqui imposta resultará diretamente do período de utilidade esperada, só sendo razoável, a taxa que for fixada em função do período de utilidade esperada.

g.      Trata-se de um período de utilidade esperada, expectável, provável, e não um período de utilidade absolutamente exato, preciso e certo.

h.      Deste modo, a Requerida adotou todas as diligências necessárias e que lhe eram exigíveis com vista à determinação da taxa de depreciação ou amortização aplicável aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicos, procurando apurar o período de utilidade esperada destes bens, consultando a informação técnica disponibilizada pelas principais empresas referidas na presente resposta.

i.        Todas as entidades referidas na presente Resposta são unânimes em considerar que o período de utilidade esperada dos painéis fotovoltaicos e nos aerogeradores é, no mínimo, respetivamente, de 25 e de 20 anos (sendo que algumas até referem um período de utilidade de 30 anos para os painéis fotovoltaicos).

j.        Todas as empresas que comercializam e/ou fabricam painéis fotovoltaicos e cuja informação a AT teve a oportunidade de consultar e analisar, indicam o período de 25 anos como sendo o seu período de vida útil.

k.      Quanto aos aerogeradores, por consulta aos dados técnicos disponibilizados pelo fornecedor dos equipamentos em causa, as sociedades C… (NIPC …), D…, Lda. (NIPC…) e E…– Sucursal em Portugal (NIPC…) responderam que o período de utilidade esperada para esses equipamentos é de 20 anos, pelo que os bens deveriam ter sido amortizados a uma taxa de 5%, que corresponde à percentagem da amortização a praticar por cada ano, durante 20 anos, para que o bem fique totalmente amortizado durante este período de vida útil esperada.

l.        Quanto aos painéis fotovoltaicos, os equipamentos estão implantados num terreno particular, propriedade da F…, tendo em 2009 sido realizada uma escritura de constituição de direito de superfície, para a instalação do equipamento da central solar, que foi celebrada entre uma subsidiária da Requerente e a “G…”, para um período de 40 anos.

m.    Por outro lado, de acordo com os contratos de compra de energia elétrica celebrados pela subsidiária da Requerente com a H…, esta obriga-se a adquirir àquela a totalidade de energia elétrica disponível gerada na central solar e entregue nas redes recetoras, a vigorar por tempo indeterminado.

n.      Por consulta e análise de dados de natureza técnica disponibilizados por diversas empresas fornecedoras de painéis fotovoltaicos (“I…”, J…, Ltd., “K…” – esta fabricante dos equipamentos usados pela subsidiária da Requerente, L…, S.A., M…, Lda.), a Requerida conseguiu apurar que o período de utilidade esperada indicado para os painéis fotovoltaicos é sempre o de 25 anos. Por sua vez, o Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), indica o seguinte: “Solar Fotovoltaico - Introdução O custo actual de instalação é da ordem dos 10 Euros por Wp para sistemas isolados da rede eléctrica e de cerca de 6 Euros por Wp para sistemas ligados à rede eléctrica, o que se traduz num custo do kwh produzido no tempo de vida do sistema (tipicamente 20-30 anos)”. Acresce que, a Associação Europeia da Indústria Fovoltaica, refere explicitamente que o período de vida útil dos painéis fotovoltaicos é de 25 anos. Também a Plataforma Europeia para a Tecnologia Fotovoltaica indica o mesmo período de utilidade esperada de 25 anos para os bens em questão. A Associação Europeia da Indústria Fovoltaica disponibiliza em www.epia.org um relatório sobre a energia fotovoltaica, afirmando claramente que “O período de via útil estimando de um painel fotovoltaico é de 30 anos”.

o.      Assim, considerando o período de utilidade esperada de 25 anos previsto para os bens em causa, a taxa de depreciação ou amortização que deveria ter sido aplicada era de 4%.

p.      Nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 31º do CIRC e do n.º 3 do artigo 5º do DR 25/2009, relativamente aos bens para que não se encontrem fixadas taxas de amortização, como é o caso dos aerogeradores e painéis fotovoltaicos, são aceites pela Direção-Geral dos Impostos as consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada.

q.      Deste modo, a AT teve de recorrer ao critério previsto no artigo 31º nº 2 do CIRC e no artigo 5º nº 3 do Dr nº 25/2009 para determinar a referida taxa.

r.        A lei não determina a taxa de depreciação ou amortização a aplicar aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicos destinados à produção de energia, antes remetendo para as taxas que pela AT sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada. O único critério que a lei impõe à AT é que esta, na determinação da taxa de depreciação ou amortização, observe, apenas, o “período de utilidade esperada”.

s.       Entende a Requerente que o critério mencionado pelo art. 31º do CIRC e pelo art. 5º do DR 25/2009 do “período de vida útil esperada” não pode corresponder à durabilidade dos bens em causa, mas antes à sua utilidade económica, considerando os réditos que se obterão dos mesmos. Contudo, entendemos que a Requerente não tem razão.

t.        A Requerente alega que o critério do período de vida útil esperada utilizado pela lei encerra em si apenas um significado de um suposto conceito de vida útil económica esperada, conceito que a Requerente não define, e que não tem fundamento legal.

u.      Seria curioso que a vida útil de um bem estivesse dependente da performance económica de um determinando sujeito passivo ou do projeto em que o bem a amortizar está inserido. Porém, entendemos que a determinação da taxa de depreciação ou amortização não está, nem pode estar em relação direta com os lucros ou prejuízos que as atividades das empresas integradas no Grupo A…, ou de qualquer outro sujeito passivo, possam originar.

v.      O critério apontado pelo art. 31º nº 2 do CIRC não é o da “razoabilidade da taxa, tendo em conta os lucros ou prejuízos da atividade do sujeito passivo…”, mas sim o da “razoabilidade da taxa, tendo em conta o período de utilidade esperada”. Dúvidas não podem existir que o critério do período de vida útil esperada tal como utilizado pela Requerida é objetivo, ao contrário do utilizado pela Requerente num sentido subjetivo sempre depende da performance económica dos sujeitos passivos,

w.    Face ao exposto, propôs-se a correção das amortizações registadas como gasto, resultante da diferença entre as amortizações praticadas e contabilizadas pela empresa para efeitos fiscais e o valor das amortizações que, nos termos legais, deveria ter efetuado.

x.      Não se pode concluir que a Requerida não agiu com razoabilidade, conforme lhe competia, na determinação das taxas aqui em causa, tendo esta fundamentado em prova documental o período de vida útil esperada.

y.      É mais razoável determinar as taxas com base nas informações prestadas pelas entidades que melhor know-how possuem em relação aos bens em questão ( em que a Requerida se apoiou), do que determinar essas taxas com base numa alegada rentabilidade económica que cada sujeito passivo poderá retirar de cada um desses bens (conforme defende a Requerente).

z.       Aliás, a interpretação defendida pela Requerente causará, necessariamente, situações de desigualdade entre diferentes sujeitos passivos que desenvolvam as mesmas atividades das empresas aqui em causa e que utilizem os mesmos bens, já que defende uma dependência da determinação das taxas de amortização da performance económica de cada sujeito passivo.

aa.   Face ao alegado pela Requerente percebemos que a mesma entende que, no caso sub judice estamos perante uma lacuna da lei e, nessa medida, recorreu à integração de lacunas por analogia prevista no artigo 10º nº 1 do Código Civil. Nestes termos, a Requerente considerou que a taxa de depreciação ou amortização de 6,25% prevista para os equipamentos de centrais hidroelétricas seria a taxa a aplicar aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicos. Mas no caso dos presentes autos, estamos perante o simples caso não regulado, e não perante um caso omisso (lacuna da lei).

bb.  A letra do art. 31º nº 2 do CIRC constitui a única referência para colmatar a falta de regulação legal, devendo a AT fixar a taxa em causa com base no critério da razoabilidade, tendo em conta o período de utilidade esperada.

cc.   Quanto às referências à Reforma da Fiscalidade Verde, a superveniência de um outro regime legal no qual a omissão normativa originária deixou de existir – nomeadamente o regime de “Fiscalidade Verde” (lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro) que permite amortizações em prazos como o adotado pela Requerente, ao estabelecer prazos de vida útil a estes equipamentos com duração mínima de 12, 5 anos e máxima de 25 anos – não tem, nem pode ter qualquer relevância para o caso, já que aqui vigorava, à data dos factos, um poder discricionário que foi regularmente exercido pela AT, dele resultando a fixação de taxas de amortização que eram as legalmente aplicáveis aos equipamentos em causa.

dd. Quanto à alegada violação do princípio da igualdade e da tributação do lucro real:

                                                  i.      No que respeita ao princípio constitucional da igualdade, deve referir-se que este, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a realização de distinções. Proíbe-lhe, antes, a adoção de medidas que estabeleçam distinções discriminatória. O princípio da igualdade fiscal em sentido material não apenas veda ao legislador a adoção de desigualdades de tratamento, no âmbito fiscal, que não sejam autorizadas pela Constituição ou que sejam materialmente infundadas, desprovidas de fundamento razoável ou arbitrárias, como impõe que a lei garanta que todos os cidadãos com igual capacidade contributiva estejam sujeitos à mesma carga tributária, contribuindo, assim, em igual medida, para as despesas ou encargos públicos. O princípio da igualdade é firmado no texto constitucional português através do artigo 13º da CRP, onde se estabelece um princípio de igualdade perante a lei, também na tributação, comportando quer a generalidade quer a uniformidade dos impostos. A doutrina comummente aceite que o princípio da igualdade consiste em “dar tratamento igual ao que é igual e tratamento desigual ao que é desigual”.

                                                ii.      Conclui-se da jurisprudência constitucional que a norma que estatui que “a tributação das empresas incide, fundamentalmente sobre o rendimento real”, tem o Tribunal Constitucional entendido que “não só não é constitucionalmente imperioso que o rendimento tributável consista sempre e apenas no rendimento real, tal como aparentemente resulta da contabilidade empresarial, mas também tal rendimento não é, em si próprio, uma realidade de valor fisicamente apreensível, antes sendo um conceito normativamente modelado.”

ee.   A AT actuou em conformidade com o disposto no artigo 31º nº 2 do CIRC, tendo determinado a taxa de depreciação ou amortização que resulta dos períodos de utilidade esperada de 20 anos (aerogeradores) e de 25 anos (painéis fotovoltaicos) expressamente indicado pelas entidades com conhecimento especializado na matéria em questão.

ff.     Quanto aos prejuízos fiscais, conforme se extrai do RIT do grupo, o peticionado pela Requerente, no âmbito do exercício do direito de audição, foi atendido pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa. Ou seja, já foi atendida a pretensão do aqui Requerente, de ver cumprido o determinado nas decisões do Tribunal arbitral.

7.      Em 31/1/2017, o Tribunal proferiu despacho designando o dia 8/2/2017 para a realização da reunião prevista no art. 18.º do RJAT, notificando ainda o sujeito passivo para até à data da reunião juntar os documentos que indicou no pedido de pronúncia arbitral que não foram juntos.

8.      No dia 8/2/2017 realizou-se a reunião a que alude o art. 18.º do RJAT:

a.       Iniciados os trabalhos, a Requerente requereu junção dos documentos 1 a 17 (que na petição inicial tinha protestado juntar), com exceção dos documentos 11 e 14, cuja junção consideram desnecessária, tendo em conta que são públicos e de fácil acesso.

b.      A Requerida requereu um prazo para análise e pronúncia sobre os documentos juntos pela Requerente.

c.       Foram inquiridas as testemunhas, no ato, apresentadas pela Requerente.

9.      O Tribunal fixou o prazo de 10 (dez) dias para apresentação de alegações sucessivas, sendo que a Requerida poderá nesse contexto pronunciar-se sobre os documentos juntos pela Requerente.

10.  Designou-se o dia 3/4/2017 como prazo limite para prolação da decisão arbitral.

11.  As alegações foram apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida, reiterando e desenvolvendo as respetivas posições jurídicas, no essencial pugnando pelas posições anteriores.

12.  De realçar ainda as seguintes alegações finais da Requerente:

a.       A AT contradiz-se, ao defender na contestação que o prazo de vida útil dos painéis fotovoltaicos é de 25 anos (e que a taxa de amortização deve ser de 4%), quando o relatório de inspeção defende que esse período é de 20 anos e efetuou uma correção assumindo uma taxa de 5%. É que a própria inspeção tributária defendeu, na inspeção ao exercício de 2010, que o período de vida útil destes mesmíssimos painéis era de 25 anos, para volvido um ano considerar que era afinal de 20 anos, o que demonstra a arbitrariedade da AT na apreciação desta matéria.

b.      Não se compreenderá uma decisão que obriga um contribuinte a alterar a taxa de amortização, quando o legislador já veio confirmar que essa taxa estava correta.

c.       Tendo verificado que a manutenção dos atuais aerogeradores se tornou financeiramente inviável, a P… encontra-se a preparar o desmantelamento e substituição de todos os aerogeradores do seu parque, previsto para o decurso de 2017 - ou seja, ao fim de apenas catorze anos de funcionamento.

d.      De acordo com as testemunhas, prevê-se que após os 15 anos de tarifa garantida venha a ocorrer uma quebra de rentabilidade económica substancial, tornando-se impossível a correspondência contabilística entre os proveitos gerados pelos equipamentos durante os primeiros quinze anos e os custos associados à manutenção do mesmo.

e.       A definição do período de vida útil por forma a “correlacionar os gastos de uso de um activo com os rendimentos que ele gera” não resulta de um juízo arbitrário e unilateral feito por cada sujeito passivo de IRC. Resulta antes do respeito pelos mais elementares princípios - mormente o princípio da prudência - que norteiam as regras contabilísticas.

f.       Se a AT sustenta que o período de vida útil dos equipamentos deve corresponder a 20 anos, baseando-se nos documentos anexos ao Relatório de Inspeção, que consistem em elementos disponibilizados pelo fornecedor desses equipamentos, resulta que o período mínimo de vida útil daqueles equipamentos andaria então em torno dos 10 anos, num intervalo (entre 10 e 20 anos) compatível com as amortizações praticadas pelas subsidiárias da Requerente.

g.      Existe erro grosseiro pela AT ao afirmar que “o período de utilidade esperada é no mínimo de 25 anos” (cfr. artigo 56.º da contestação), admitindo uma vida útil máxima de 50 anos, cfr. decisão arbitral de 18/9/2014, proferida no âmbito do CAAD, no processo n.º 75/2014-T.

h.      É inconstitucional, por violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva, estar a tributar em sede de IRC um ganho que o próprio legislador veio confirmar que não ocorreu.

i.        É inconstitucional a não sindicabilidade pelo Tribunal das decisões praticadas pela AT no exercício de poder discricionário (discricionariedade stricto sensu), cfr. mencionado no voto de vencido associado ao acórdão do processo n.º 593/2015-T CAAD, como revela a decisão proferida em 28/11/2016, processo n.º 238/2016-T também do CAAD, que chama à colação o acórdão do STA de 16/6/1999 (processo n.º 020839), o qual foi depois sufragado pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 269/2000, associado ao processo n.º 598/99.

13.  De realçar ainda as seguintes alegações finais da Requerida:

a.       Quanto ao estudo da B… invocado pela Requerente, o mesmo um carácter meramente orientador dos investimentos estatais, tendo como objetivo a análise dos custos e dos benefícios que a energia hidroeléctrica poderá acarretar para um Estado, não versando, sequer, sobre a energia produzida por aerogeradores ou pela energia solar fotovoltaica.

b.      Por outro lado, da Divisão V do Grupo I - Produção, transporte e distribuição de energia elétrica da tabela I anexa ao DR nº 25/2009 resulta que existem outros equipamentos das centrais hidroeléctricas, que têm taxas inferiores à de 6,25%; para as obras hidráulicas fixas está prevista uma taxa de 3,33%, para as subestações e postos de transformação e para as Linhas de AT e suportes está prevista uma taxa de 5%.

c.       Quanto ao documento da Direção de Serviços de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas mencionado pela Requerente, o seu teor não é extensível, nem aplicável analogicamente ao objeto do presente processo. Nessa situação está em causa uma licença de produção e comercialização de energia elétrica (ativo intangível), a qual tem uma duração máxima de 20 anos, de acordo com um contrato celebrado com a DGEG, e versa sobre um pedido de autorização para a utilização do método das unidades de produção para a amortização daquele ativo intangível.

d.      No presente caso não estamos a discutir o método de depreciação de uma licença, que é um ativo intangível, mas sim as taxas de depreciação de ativos fixos tangíveis, os aerogeradores e os painéis fotovoltaicos.

e.       No âmbito do processo arbitral nº 75/2014-T do CAAD, a respetiva Requerente (a…) também apresentou o mesmo documento, sendo que o tribunal arbitral entendeu que: «4. Factos não provados - Não se prova que seja aplicável ao caso concreto o documento junto aos autos pela Requerente aquando da realização da inquirição de testemunhas e que se reporta a um despacho da Senhora Diretora de Serviços do IRC, com o assunto “Métodos de Cálculo das Depreciações e Amortizações”».

f.       Quanto ao alegado alinhamento entre a determinação das taxas de depreciação ou amortização com um período de tarifa garantida, a Requerente refere, por diversas vezes, que elaborou o seu business plan tendo em conta que os rendimentos gerados pelos ativos em causa ocorrerão, de forma expectável, ao longo de 15 anos, por força do disposto na lei, referindo-se ao decreto-Lei nº 189/88, de 27 de maio. Ora, parece-nos descabida a afirmação da Requerente (e que vai repetindo ao longo das alegações) de que um diploma legal prevê e limita os rendimentos que um determinado equipamento pode produzir.

g.      A Requerente faz depender a razoabilidade da taxa de amortização a aplicar do alegado risco da atividade económica desenvolvida. Ora, nenhuma das taxas de amortização previstas no DR 25/2009 varia de contribuinte para contribuinte, não variam consoante o sucesso ou insucesso das atividades económicas dos sujeitos passivos, pois essa associação direta e dependente que a Requerente pretende fazer valer é manifestamente violadora do princípio da igualdade consagrado na CRP.

h.      O decreto-lei n.º 189/88, de 27 de maio regula a atividade de produção de energia elétrica e sua remuneração, sem se referir nunca a qualquer período de utilidade esperada. Mas este diploma – do qual a Requerente extrai o período de tarifa garantida de 15 anos como critério para definir a vida útil dos equipamentos – sugere que os equipamentos em causa têm uma duração superior a 15 anos ao utilizarem a expressão “os primeiros 15 anos” (“Para as centrais solares termoeléctricas e centrais fotovoltaicas de microgeração quando instaladas em edifícios de natureza residencial, de serviços ou industrial, durante os primeiros 15 anos a contar desde o início do fornecimento de electricidade à rede.”, cfr. al. d) do n.º 20 do anexo II do referido diploma).

i.        E ao referir que, atingidos os limites estabelecidos no nº 20, a eletricidade produzida pelas centrais é vendida em regime de mercado, torna evidente que os painéis fotovoltaicos podem durar e produzir muito mais do que nos primeiros 15 anos,

j.        Sendo que, o nº 23 do Anexo II do referido diploma estipula que a eletricidade produzida pelas centrais é vendida em regime de mercado, sem prejuízo da possibilidade de acesso dessas centrais ao sistema de certificados verdes.

k.      Quanto à alegada violação dos princípios da igualdade e da tributação do lucro real não se vê como pode a aplicação de uma taxa de depreciação ou de amortização que foi determinada em plena conformidade com o art. 31º nº 2 do CIRC e o art. 5º nº 3 do DR nº 25/2009 ser desproporcional ou inconstitucional. A aplicação das taxas determinadas pela Requerida não é injustificada ou desproporcional, uma vez que resulta diretamente dos períodos de utilidade esperada supra referidos, pelo que a atuação da AT respeita integralmente os princípios da igualdade, da proporcionalidade e da tributação do lucro real.

l.        Aliás, não deixa de ser curioso que a Requerente pugne pelo respeito pelo princípio da igualdade quando é ela que pretende a aplicação de taxas de amortização que dependa diretamente de um alegado “período de tarifa garantida”. O qual, para além de não ter qualquer suporte legal, iria criar situações discriminatórias e violadoras do princípio da igualdade, já que as taxas de depreciação iriam, então, depender de contratos celebrados neste âmbito, o que não nos parece razoável ou sequer legal.

 

II.                Saneamento

 

14.  As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, bem como são beneficiárias de legitimidade processual (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art. 1.º da portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

15.  A AT procedeu à designação dos seus representantes nos autos e o Requerente juntou procuração, encontrando-se as Partes, assim, devidamente representadas.

16.  Em conformidade com o preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, al. a), 5.º, 6.º, n.º 1 e 11.º, n.º 1, do RJAT (com a redação introduzida pelo art. 228.º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro), o Tribunal Arbitral é competente e encontra-se regularmente constituído.

17.  O processo não enferma de nulidades.

18.  Não existindo questões que obstem à apreciação do mérito da causa, mostram-se reunidas as condições para ser proferida decisão final.

 

III.             Matéria de facto

 

19.  Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas quanto ao mérito, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

a.       A Requerente tem por objeto a gestão de participações sociais noutras empresas como forma indireta de exercício de atividades económicas e é, desde 2006, a sociedade dominante de um grupo de sociedades (doravante “Grupo A…”) tributadas de acordo com o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (doravante “RETGS”).

b.      No período de tributação em questão no caso sub judice (2011), o perímetro do Grupo A… que integrava o RETGS incluía, entre outras, as seguintes sociedades:

                                                  i.      O…, Lda. (NIF…), doravante O…, que gerou um lucro tributável de 12.865.587,08 €;

                                                ii.      P…, Lda. (NIF…), doravante P…, que gerou um lucro tributável de 372.400,51 €;

                                              iii.      Q… Sociedade Unipessoal, Lda. (NIF…), doravante Q…, que gerou um lucro tributável de 872.340,01 €.

c.       Tendo em vista a plena realização dos seus objetos sociais (“a produção e comercialização de energia através da exploração de empreendimentos de aproveitamento de energias renováveis, bem como quaisquer outras atividades complementares ou acessórias daquela que eventualmente, venham a ser necessárias ou a ter relação com o objeto principal), a O… e a P… investiram na construção das infraestruturas de Parques Eólicos.

d.      Quanto à Q… (cujo objeto social consiste na produção e comercialização de energia através da exploração de empreendimentos de aproveitamento de energias renováveis, bem como quaisquer outras atividades complementares ou acessórias daquela que eventualmente venham a ser necessárias ou a ter relação com o objeto principal), investiu na construção de uma Central Solar.

e.       Nas datas dos investimentos em Parques Eólicos efetuados pela O… e P… por um lado, e na Central Solar pela Q… por outro, não estavam previstas para os equipamentos em que o investimento foi efetuado, taxas de amortização nos DR que regulam os limites fiscais de amortizações e depreciações fiscalmente aceites.

f.       Tanto a O…, P… por um lado, como a Q… por outro, aplicaram respetivamente aos aerogeradores e aos painéis fotovoltaicos, a taxa de amortização de 6,25%, a que corresponde uma vida útil de 16 anos, para efeitos contabilísticos e fiscais, classificando-os para efeitos fiscais como “1230 – Equipamentos de centrais hidroeléctricas”.

g.      De acordo com o decreto-lei n.º …/…, de 27 de maio, diploma que estabelece a remuneração fixa e garantida obtida pela O…, P… e Q… pelo fornecimento da totalidade da eletricidade produzida (proveniente dos Parques Eólicos do … e do … e da …, respetivamente) à rede elétrica nacional, alterado, entre outros, pelo decreto-lei n.º 33-A/2005, de 16 de fevereiro, em particular no n.º 20 do anexo II, o fator de remuneração garantida aí definido vigora por um período de 15 anos, a contar do início do fornecimento de eletricidade à rede.

h.      O mercado dos aerogeradores e dos painéis fotovoltaicos tem vindo a atravessar um período de evolução tecnológica, contribuindo para uma maior produtividade e menor custo dos equipamentos.

i.        Atualmente não existe um mercado secundário, em Portugal ou no estrangeiro, para a revenda deste género de equipamentos.

j.        Na sequência da ordem de serviço n.º OI2015…, de 22/10/2015, a AT procedeu a uma ação inspetiva externa (com as ordens de serviço n.º OI2012…, OI2014…, OI2015… e OI2014…), em sede de IRC, ao período de tributação de 2011, tendo por referência os resultados do Grupo A… .

k.      Na sequência desta ação inspetiva, a Requerente foi notificada do Relatório de Inspeção Tributária, em que:

                                                  i.      Relativamente à O… e P…, a AT considerou que os aerogeradores deveriam ter sido amortizados, para efeitos fiscais, a uma taxa de 5%, que corresponde à vida útil de 20 anos, resultando na proposta de correção do que considerou serem amortizações fiscalmente excessivas praticadas pelos sujeitos passivos, que haviam praticado, contabilisticamente e para efeitos fiscais, taxa de amortização de 6,25%, a que corresponde uma vida útil de 16 anos. A proposta de correção às depreciações e amortizações ascendeu a € 1.442.267,49 no caso da O…, e € 124.201,97 no caso da P… .

                                                ii.      Relativamente à Q…, a AT considerou que os painéis fotovoltaicos deveriam ter sido amortizados, para efeitos fiscais, a uma taxa de 4%, que corresponde à vida útil de 25 anos, resultando na proposta de correção do que considerou serem amortizações fiscalmente excessivas praticadas pelos sujeitos passivos, que haviam praticado, contabilisticamente e para efeitos fiscais, taxa de amortização de 6,25%, a que corresponde uma vida útil de 16 anos. A proposta de correção às depreciações e amortizações dos bens em análise ascendeu a € 391.782,85.

l.        Quanto à taxa de amortização considerada razoável pela AT, aplicável aos aerogeradores:

                                                  i.      Segundo informação técnica prestada pelas sociedades E…– Sucursal em Portugal (NIPC…), e D…, Lda. (NIPC…), todas fornecedoras dos aerogeradores da O…, os equipamentos fornecidos têm um período de vida útil de 20 anos. No mesmo sentido informou a sociedade C… GMBH (NIPC…), fornecedora dos aerogeradores da P… .

                                                ii.      No caso da D…, Lda., o fornecedor anexou à sua resposta ao pedido de informação da AT “garantias de máquina, do contrato de fornecimento”, onde consta: “design life time: 20 years”.

m.    Quanto à previsibilidade do período de exploração dos aerogeradores da O… e P…, os mesmos foram instalados em terrenos alheios, tendo sido constituídos para o efeito direitos de superfície junto dos proprietários, por períodos de 29 anos;

n.      Quanto à taxa de amortização considerada razoável pela AT, aplicável aos painéis fotovoltaicos:

                                                  i.      Segundo informação técnica prestada pelas sociedades I…, J…, Ltd., K… (fornecedora da Q…), L…, S.A., e M…, Lda., todas as empresas referem expressamente que o período de utilidade esperada para os painéis fotovoltaicos é de 25 anos.

                                                ii.      Em particular, a empresa “J…”, ao indicar o modo como presta as respetivas garantias, refere expressamente que o período de vida útil dos painéis fotovoltaicos é de 25 anos.

                                              iii.      Em particular, a empresa “K…”, que fabricou um sistema fotovoltaico utilizado pela Q…, entende que o respetivo período de utilidade esperada é no mínimo de 25 anos.

                                              iv.      De acordo com estudo do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), em relatório de 2001, o tempo de vida do sistema solar fotovoltaico é tipicamente de 20-30 anos.

                                                v.      De acordo com a Plataforma Europeia para a Tecnologia Fotovoltaica, em informação de 2014, o período de utilidade esperada para os bens em questão é de 25 anos.

                                              vi.      De acordo com um relatório da Associação Europeia da Indústria Fovoltaica sobre a energia fotovoltaica, “o período de via útil estimando de um painel fotovoltaico é de 30 anos”.

o.      Quanto à previsibilidade do período de exploração dos painéis fotovoltaicos da Q…, os mesmos foram instalados em terreno alheio, tendo sido constituído para o efeito direito de superfície junto do proprietário, por período de 40 anos.

p.      De acordo com os contratos de compra de energia elétrica celebrados entre a Q… e a H…, esta obriga-se a adquirir àquela a totalidade de energia elétrica disponível gerada na central solar e entregue nas redes recetoras, vigorando os contratos por tempo indeterminado.

q.      De acordo com um estudo preparado pela B…, divulgado em 2012, as instalações de produção de energia hidroelétrica apresentam longos períodos de vida útil, que podem variar entre os 30 e os 80 anos, e o período de vida útil dos projetos hidroelétricos é o mais longo face a qualquer outra instalação geradora de eletricidade.

r.        De acordo com a Comissão que preparou uma proposta no âmbito da Reforma da Fiscalidade Verde:

                                                  i.      “Concorda com a fixação de período de amortização de equipamento eólico e fotovoltaico entre 12,5 anos e 25 anos”. (…)

                                                ii.      “Caso o período de vida mínima de operação de uma turbina eólica (garantido pelos fabricantes) fosse de 20 anos, o período de vida útil máximo seria assumido, de forma automática, como sendo o dobro do período mínimo, i.e. 40 anos, o que não corresponde, em caso algum, à realidade do sector eólico atual”. (…)

                                              iii.      “A metodologia desenvolvida pelo LNEG permitiu concluir que o período de vida útil máxima de uma turbina eólica se situa entre os 20 e os 25 anos (…) no que respeita ao equipamento fotovoltaico aplica-se um raciocínio semelhante: (…) o tempo de vida útil de um sistema fotovoltaico situa-se num valor entre 20 anos e cerca de 30 anos sendo tipicamente o valor de 25 anos o valor que mais consenso oferece”. (…)

                                              iv.      “As taxas a utilizar devem seguir uma razoabilidade técnica e de eficiência económica”. (…)

                                                v.      “Tendo em conta estes dois aspectos, parece razoável a adoção de um prazo máximo de vida útil de 25 anos, a que corresponderá, nos termos da bitola fiscal consagrada pelo legislador, um prazo mínimo de vida útil de 12,5 anos” (destaque e sublinhado da Requerente).

s.       De acordo com estudo de 2013 do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG):

                                                  i.      Resumo (pág. 3): “A metodologia desenvolvida pelo LNEG permitiu concluir que o período de vida útil máxima de uma turbina eólica se situa entre os 20 e 25 anos”;

                                                ii.      3.1.1. Aplicação a um caso real (pág. 16): “A figura 17 apresenta a estimativa da evolução da degradação do fator de capacidade de uma turbina ao fim de no máximo 40 anos de operação para as duas análises efetuadas”;

                                              iii.      3.1.1. Aplicação a um caso real (pág. 18): “Os resultados indicam que para uma amostra de 3123 turbinas onshore instaladas na Dinamarca, com 20 a 11 anos de operação e potência nominal entre 150 KW e 2300 KW, o fator de capacidade apresenta uma degradação entre 10-15% ao final de 20-25 anos de operação e entre 15-20% ao final de 30-35 anos de operação”;

                                              iv.      3.2 Análise económica e discussão de resultados (pág. 19): “Analisando os resultados obtidos verifica-se que a degradação do fator de capacidade de uma turbina varia, até 20%, ao longo de 35-40 anos de operação”.

                                                v.      3.2 Análise económica e discussão de resultados (pág. 20): “Os resultados indicam que a partir de 11% de redução da energia produzida, o projeto apresenta uma taxa interna de rentabilidade abaixo dos 8%. De acordo com os resultados anteriormente apresentados … este valor de redução corresponde a um período de tempo de vida útil máxima entre os 20 e 25 anos”.

                                              vi.      4. Conclusões (pág. 21): “Por forma a estabelecer um limite máximo de redução da produção energética das turbinas eólicas e, assim, identificar o período de vida útil do mesmo, foi efetuada a análise económica de um parque eólico típico correlacionando-se o decréscimo de produção com a viabilidade económica do projeto… Neste contexto, conclui-se que o limite máximo de vida útil de uma turbina eólica se situa entre 20 e 25 anos de operação”.

t.        Entre 27/10/2015 e 28/10/2015, findo o procedimento inspetivo, as subsidiárias da Requerente foram convidadas a exercer o direito de audição sobre o Projeto de correções da Inspeção Tributária (através dos ofícios n.º… de 27/10/2015 no caso da O…, n.º … de 27/10/2015 no caso da Q…, e n.º … de 28/10/2015 no caso da P…), nos termos dos arts. 60.º LGT e 60.º RCPITA, não tendo os sujeitos passivos exercido esse direito de audição no prazo concedido (16/11/2015 no caso da O…, 17/11/2015 no caso da P…, e 20/11/2015 no caso da Q…).

u.      Em 16/12/2015 a Requerente foi notificada pessoalmente (Ofício n.º…, Ordem de serviço n.º OI2015…), nos termos do art. 60.º do RCPITA, para exercer o direito de audição sobre o projeto de correções do Relatório de Inspeção Tributária, tendo sido informado que apenas se deveria pronunciar sobre as correções específicas relativas à declaração do grupo (as subsidiárias já haviam tido oportunidade de se pronunciar).

v.      A Requerente exerceu o direito de audição dentro do prazo, pugnando pela correção dos prejuízos fiscais reportáveis, na sequência de decisão arbitral do processo n.º 75/2014-T do CAAD, que veio a ser confirmada pelo TCA Sul no âmbito do processo n.º 08072/14, proferida em setembro de 2015, e que teve como consequência a anulação da liquidação de IRC n.º 2012…, traduzida no reconhecimento integral dos prejuízos fiscais relativos a 2009 deduzidos pela Q…, de forma irrecorrível, implicando o reconhecimento pela AT, da dedução fiscal de prejuízos no valor global, peticionado pela Requerente, de € 872.370,01.

w.    Em 21/4/2016 a Requerente foi notificada do Relatório de Inspeção Tributária final preparado pela AT.

x.      Nesse Relatório verifica-se que foi considerado o efeito da pretensão da Requerente. Aí se diz (pág. 24): “(…) em 2011 a sociedade Q…, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA apenas tem prejuízos reportáveis no valor de € 442.846.12, uma vez que o remanescente dos prejuízos gerados no exercício de 2009 é utilizado na liquidação 2010. Face ao exposto apesar da soma algébrica dos resultados fiscais corrigidos ser de € 15.398.572,74, conforme quadro resumo constante no ponto III.2 do presente Relatório e quadro infra, a matéria coletável apurada para o exercício de 2011, é de € 14.549.319,23, uma vez as sociedades dominadas apresentam prejuízos reportáveis gerados na sua esfera individual antes da aplicação do RETGS, no montante global de € 849.253,51 (…)”.

y.      Posteriormente, a Requerente foi notificada da liquidação de IRC n.º 2016…, das liquidações de juros n.º 2016 … e 2016…, e da demonstração de acerto de contas n.º 2016…, respeitantes ao período de tributação de 2011, com data limite de pagamento até 27/6/2016, nas quais foi refletida uma liquidação adicional de IRC (e respetivos juros) que ascendeu a € 960.200,49 provocada, designadamente, pelas correções à matéria coletável supra identificadas.

z.       Em 3/8/2016 foi emitida citação pessoal através da qual a Requerente tomou conhecimento que havia sido instaurado pela AT o processo de execução fiscal n.º …2016… .

aa.   Em 22/8/2016[1] a Requerente foi notificada da constituição de um penhor sobre créditos, no valor de € 968.895,63 (notificação emitida em 18/8/2016).

bb.  Tal penhor foi constituído sobre parte do montante do IRC a reembolsar à ora Requerente, referente ao período de tributação de 2015, apurado nos termos da Declaração Modelo 22 submetida pela Requerente.

cc.   Em 23/8/2016 (212.º da PI) a Requerente apresentou à AT garantia bancária n.º … no montante de € 1.218.801,38, visando a suspensão do processo de execução fiscal em causa (garantia emitida em 18/8/2016).

dd. Em 6/9/2016 esse penhor sobre o crédito fiscal da Requerente foi objeto de conversão em penhora.

ee.   Em 12/2/2016 a P… obteve autorização, da Direção Geral de Energia e Geologia, para desmantelar e substituir todos os aerogeradores do seu parque.

20.  Não se prova que seja aplicável ao caso concreto sub judice o documento 13 junto aos autos pela Requerente, atinente a um despacho da Senhora Diretora de Serviços do IRC, com o assunto “Métodos de Cálculo das Depreciações e Amortizações”.

21.  Inexistem outros factos, com relevo para apreciação do mérito da causa, que não se tenham provado.

22.  Fundamentação da matéria de facto:

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de direito (cfr. anterior art. 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual art. 596.º, aplicável ex vi do art- 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT).

Assim, a factualidade provada teve por base a apreciação crítica da posição assumida por cada uma das partes, a análise crítica dos documentos juntos aos autos, cuja autenticidade e veracidade não foram impugnadas por nenhuma das partes, e as declarações prestadas pelas testemunhas, trabalhadores do Grupo em que se insere a Requerente, revelando conhecimento de facto sobre a atividade desenvolvida pela Requerente e suas subsidiárias, e sobre as características dos equipamentos usados.

 

IV.             Matéria de direito:

 

IV.1. Questão das taxas de depreciação/amortização

 

IV.1.1. A correção ao lucro tributável da requerente ora em discussão assenta no disposto no artigo 34.º, n.º 1, alínea c) do Código do IRC, o qual veda a dedução como gastos das depreciações e amortizações que excedam os limites estabelecidos pelo Código.

No caso, a discussão centra-se, por isso, nos limites estabelecidos por lei, atenta a inexistência (à data) de valores de referência para a vida útil dos bens em causa, caso em que o artigo 31.º, n.º 2 (atual n.º 3) daquele Código outorga à Autoridade Tributária e Aduaneira a possibilidade de fixar quotas de depreciação e amortização consideradas “razoáveis”.

Dispõe, com efeito, este dispositivo que: "Relativamente aos elementos para que não se encontrem fixadas taxas de depreciação ou amortização, são aceites as que pela Direcção-Geral dos Impostos sejam consideradas razoáveis, tendo em conta o período de utilidade esperada."

Este critério de razoabilidade não traduz, todavia, a concessão de uma faculdade discricionária àquela Autoridade; nos termos daquela referida disposição, a fixação de tais quotas pela Autoridade Tributária e Aduaneira está vinculada ao “período de vida útil esperada” dos elementos amortizáveis/depreciáveis, de modo a que a decisão possa sempre ser sujeita a escrutínio. Ou seja, na presença de um conceito vago e indeterminado – “razoável” – o próprio legislador fixou um critério de densificação, o qual mais não é do que aquele que suportou a tarefa do próprio legislador na elaboração do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro (e, antes deste, o Decreto Regulamentar n.º 2/90): o período “económico-substancial” (ou intrínseco) de vida útil esperada para os bens em causa, no âmbito da sua utilização normal.

Aliás, nem poderiam as coisas ser doutro modo, atento o princípio fundamental da reserva de lei fiscal quanto aos elementos essenciais da relação fiscal: a decisão sobre o período de vida útil (que incumbe à AT nestes casos) é uma decisão vinculada e nunca livre. Pode haver alguma margem de densificação; mas nunca haverá discricionariedade na fixação destes valores.

 

IV.1.2. Vertendo, agora, ao caso nos autos, constata-se que o procedimento adotado pela Autoridade Tributária e Aduaneira é, em abstrato e no essencial, o correto.

Com efeito, constata-se que o fator de densificação preponderante para aquele conceito foi, corretamente, obtido por meio das diligências levadas a cabo junto dos fornecedores dos equipamentos, que devem ser consideradas bastantes, nomeadamente por não terem sido invocadas e provadas circunstâncias anormais de utilização.

Contrariamente a algumas considerações menos corretas feitas, quer pela própria AT quer pela Requerente, em relação à duração do plano de investimentos, da rentabilidade dos mesmos associada aos acordos com o Estado Português (mediante os quais este se comprometeu a adquirir a totalidade da eletricidade produzida nos centros electroprodutores, segundo uma muito alta tarifa garantida) ou até a duração do direito de superfície contratado (29 e 40 anos, consoante os bens instalados) enquanto critérios de determinantes na tarefa ora em causa, é somente pela duração expectável útil dos bens em condições de normalidade (material e tecnológica) que deve ter lugar o preenchimento daquele conceito jurídico.

Aqueles fatores não devem ser valorados na hora de determinar os períodos de vida útil mínimo e máximo; e isto, pese embora devam, ao invés, ser valorados pelas empresas na hora da decisão contabilística de determinar o período de vida útil concreto - como, aliás, o normalizador contabilístico citado pela Requerente (NCRF 7 do Sistema de Normalização Contabilística) claramente sugere.

 

IV.1.3. É esse o critério genérico estabelecido pela lei no artigo 29.º, n.º 1 do Código do IRC, quando define a amortização dos bens como a consideração "com carácter sistemático, ....[das] perdas de valor resultantes da sua utilização ou do decurso do tempo." (sublinhado nosso), por contraposição ao regime das desvalorizações excecionais, gerador de imparidades, vertido no artigo 35.º, n.º 1, alínea c) e 38.º do Código do IRC (atual artigo 31.º-B).

Como corretamente sublinha a Requerida AT, trata-se de um “período de utilidade esperada, expectável, provável, e não um período de utilidade absolutamente exato, preciso e certo”; e, em resultado das referidas diligências, foi apurado um período de vida útil dos bens que se situaria, respetivamente, nos 25/30 anos – para os painéis fotovoltaicos – e nos 20 anos - para os aerogeradores.

 

IV.1.4. Ora, se até aqui o Tribunal acompanha tendencialmente a Requerida na sua argumentação, já diverge fundamentalmente daquela quanto às conclusões a extrair destas mesmas diligências, ou seja, na fixação da "janela" do período fiscal relevante.

É que, em face da prova feita pela própria Autoridade Tributária e Aduaneira, aqueles prazos assim apurados configuram (rectio, só podem configurar) o período máximo de duração útil dos bens, e nunca o seu período mínimo, como pretende a Requerida. É esta a única leitura que o Tribunal considera como razoável da informação carreada para os autos.

Quer dizer, não se compreenderia que aqueles prazos avançados pelos próprios fornecedores – interessados comercialmente em inflacionar as qualidades dos produtos que vendem e que, por isso, provavelmente terão indicado os períodos máximos previsíveis de duração do bem em termos suscetíveis de produzir quaisquer utilidades económicas – pudessem ser fiscalmente considerados, afinal, como meros períodos legais mínimos para efeitos fiscais.

É que, consequência inevitável de um tal raciocínio, isso implicaria a admissão de períodos de vida útil máximos de 50/60 anos e 40 anos - respetivamente para painéis fotovoltaicos e aerogeradores - períodos estes que, em momento algum, encontram qualquer espécie de suporte na matéria de facto carreada para o presente processo arbitral, com nenhuma prova documental, testemunhal ou pericial a ser apresentada nesse sentido. Não é, com efeito, razoável admitir que aqueles equipamentos possam, em condições de normalidade material e tecnológica (que, no setor em causa, é muito acelerada), manter-se em estado de uso até meados da década de 50 do presente século.

Aliás, o facto de a Lei n.º 82-D/2014, de 31 de dezembro, ter vindo expressamente incluir os «equipamentos de energia eólica», assim como os «equipamentos de energia solar fotovoltaica», na lista de taxas da Tabela II anexa ao Decreto Regulamentar n.º 25/2009, e indicar a taxa de 8% (que corresponde a 12,5 anos de vida útil), dissipa quaisquer dúvidas sobre (precisamente) a desrazoabilidade de períodos de vida útil tão extensos fixados pela AT.

Daqui decorre que tem, forçosamente, de se admitir que, pelas regras gerais de amortização/depreciação fiscalmente aplicáveis, esse período deve ser delimitado por baixo (e não por cima) e em metade dos valores apurados naquelas diligências, com as respetivas quotas de amortização/depreciação a ascenderem por isso ao dobro.

Ora, sendo o período máximo de vida útil dos bens de 25/30 anos para os painéis fotovoltaicos e de 20 anos para os aerogeradores - é esse o resultado das diligências, na leitura do Tribunal, reitera-se -, então o período de vida útil mínimo terá sempre de se situar em metade daqueles valores, sendo esta a moldura deixada à decisão concreta do contribuinte.

Forçoso é, por isso, concluir que o período de vida útil concretamente estimado pela Requerente para aqueles bens – período de 16 anos – se compreende, claramente, dentro do intervalo legal fiscal deixado à opção dos sujeitos passivos, não sendo, por conseguinte, merecedor de qualquer reparo.

Pelo exposto, as correcções em causa enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a anulação parcial da liquidação de IRC, na parte em que assentou nessas correcções.

A liquidação de juros compensatórios e a demonstração de acerto de contas que se basearam naquela liquidação, enfermam do mesmo vício.

Por isso, justifica-se a anulação parcial da liquidação de IRC n.º 2016…, das liquidações de juros n.º 2016… e 2016 …, e da demonstração de acerto de contas n.º 2016 … respeitantes ao período de tributação de 2011, na parte correspondente às correções que a AT realizou ao lucro tributável apurado no âmbito do RETGS e que tiveram por referência idênticas correções realizadas pela mesma às matérias coletáveis das sociedades subsidiárias da Requerente O…, P… e Q… (as quais assentaram na forma como estas reconheceram fiscalmente os gastos das amortizações realizadas, respetivamente, aos aerogeradores e painéis fotovoltaicos).

 

IV.2. Questão do reporte de prejuízos fiscais

 

A Requerente invoca também com fundamento do pedido de pronúncia arbitral que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que, relativamente ao exercício de 2011, «o sujeito passivo está a considerar prejuízos de valor superior àqueles que na realidade tem direito, ou seja, deduziu prejuízos no montante de € 1.006.131,25 quando apenas tinha direito ao montante total de € 133.761,22 (antes das correções da AT) e € 406.407,39 (após as correções da AT)».

Diz a Requerente, em suma, que «para a AT, os prejuízos individuais que haviam sido gerados, nomeadamente, pela Q… (no montante € 1.112.740,92) já haviam sido consumidos por esta entidade, após as correções efetuadas por aquele ente público aos seus resultados individuais, no período de tributação de 2010», mas as correcções que a AT efectuou em relação ao período de 2010 ao liquidação de ao lucro tributável individual de diversas subsidiárias da Requerente (incluindo a Q…) e ao lucro tributável do Grupo A… apurado no contexto do RETGS foram impugnadas e a Requerente obteve vencimento no processo arbitral n.º 593/2015-T.

A Requerente não juntou a cópia da decisão arbitral que refere, mas pela cópia da decisão que consta da página informática do CAAD constata-se que ela foi proferida em 29-07-2016, depois de emitida a liquidação, datada de 28-04-2016.

Para além disso, o trânsito em julgado da decisão referida não pode ter ocorrido antes do decurso do prazo de 30 dias a contar de 01-09-2016, em que pode ser interposto recurso nos termos do artigo 25.º, n.ºs 2 e 3, do RJAT e 152.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Assim, no momento em que foi emitida a liquidação impugnada, não havia ainda decisão anulatória que devesse ter por efeito alteração da dedução de prejuízos fiscais do exercício de 2010, pelo que aquela liquidação não pode enfermar de vício por não ter considerado o decidido naquele acórdão arbitral.

Por outro lado, a reconstituição da situação prevista no artigo 100.º da LGT, que a Requerente pretende (artigo 200.º do pedido de pronúncia arbitral) é matéria a apreciar no âmbito de execução da referida decisão arbitral, se for caso disso, e não no presente processo, que tem como objecto a declaração de ilegalidade de actos de liquidação, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.

Pelo exposto improcede o pedido de pronúncia arbitral nesta parte, sem prejuízo dos eventuais direitos que possam advir à Requerente da execução da referida decisão arbitral, à face do preceituado no artigo 24.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

 

IV.3. Questões de conhecimento prejudicado

 

Procedendo o pedido de pronúncia arbitral com fundamento nestes vícios, fica prejudicado, por ser inútil [artigo 130.º do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT], o conhecimento das outras questões colocadas relativas a ilegalidade das liquidações e demonstração de acerto de contas.

 

IV.4. Juros indemnizatórios

 

A Requerente pede juros indemnizatórios relativamente a um pagamento que diz ter sido efectuado por compensação, não indicando o montante que diz ter sido pago, nem indicando qual o acto ou actos através do qual esse pagamento terá sido decidido ou efectuado.

A prova produzida não é clara sobre a existência do alegado pagamento, nem sobre o seu montante, sobre as circunstâncias em que, eventualmente, foi efectuado.

Na verdade, sobre essa matéria apenas se provou que foi constituído um penhor sobre créditos, no valor de € 968.895,63, sobre parte do montante de IRC a reembolsar à ora Requerente, referente ao período de tributação de 2015, apurado nos termos da Declaração Modelo 22 submetida pela Requerente e que, em 06-09-2016, esse penhor sobre o crédito fiscal da Requerente foi objeto de conversão em penhora.

Mas, esta conversão em penhora não constitui pagamento por compensação, que, eventualmente nem terá ocorrido, se foi suspensa execução fiscal na sequência da garantia anteriormente prestada (em 23-08-2016)

Dependendo o direito a juros indemnizatórios da existência de um pagamento indevido (artigo 43.º, n.º 1, da LGT), a falta de prova do pagamento implica a improcedência do pedido de juros indemnizatórios, sem prejuízo do eventual direito que possa ser reconhecido em execução do presente acórdão.

 

IV.5. Indemnização por garantia indevida

 

A Requerente prestou garantia bancária para suspender execução fiscal instaurada para cobrança da quantia liquidada.

O art. 171.º do CPPT estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».

Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação.

O pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido art. 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.

O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do art. 53.º da LGT, que estabelece o seguinte:

Artigo 53.º

Garantia em caso de prestação indevida

     1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.

     2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

     3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

     4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.

 

No caso em apreço, o erro do acto de liquidação de IRC é imputável à administração tributária, pois as correcções foram da sua iniciativa e a Requerente em nada contribuiu para que esses erros fossem praticados.

Por isso, a Requerente tem direito a indemnização pela garantia bancária prestada.

Não havendo elementos que permitam determinar o montante da indemnização, a condenação terá de ser efectuada com referência ao que vier a ser liquidado em execução do presente acórdão (arts. 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil e 565.º do Código Civil).

 

V. Decisão

 

            De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

a)      Julgar procedente o pedido quanto à anulação parcialmente a liquidação adicional de IRC de 2011 liquidação de IRC n.º 2016 … e das liquidações de juros compensatórios n.ºs 2016 … e 2016 …;

b)      Anular as referidas liquidações e a demonstração de acerto de contas n.º 2016 … na parte correspondente às correções motivadas por desconsideração das quotas de amortização adotadas pela Requerente;

c)      Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral na parte respeitante à desconsideração dos prejuízos fiscais reportáveis e absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira deste pedido, sem prejuízo dos eventuais direitos da Requerente que possam advir da execução da decisão arbitral proferida no processo n.º 593/2015-T;

d)     Julgar improcedente o pedido de juros indemnizatórios e absolver dele a Autoridade Tributária e Aduaneira, se sem prejuízo dos eventuais direitos da Requerente que possam advir da execução do presente acórdão;

e)      Julgar procedente o pedido de indemnização por garantia indevida e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar a Requerente a respectiva indemnização que for determinada em execução do presente acórdão.

 

VI. Valor do processo

 

A Requerente atribuiu valor ao processo apenas considerando o montante do IRC e juros compensatórios, não atribuindo qualquer valor relacionado com os prejuízos fiscais que refere.

O valor indicado não foi questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pelo que, de harmonia com o disposto no art. 306.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 836.705,81.

 

VII. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 11.934,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira, já que na fixação do valor da causa não foi considerado valor relativo à questão dos prejuízos fiscais.

 

Lisboa, 4 de Abril de 2017

 

Os Árbitros

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

 

 

(Gustavo Courinha)

 

 

 

 

(Nuno Miguel Morujão – Vencido, conforme declaração de voto)

 

Voto de vencido:

 

I. Quanto ao poder discricionário em análise

Acompanho o exposto na matéria de direito da presente decisão arbitral, quando afirma que o poder da AT é vinculado a critérios técnicos.

Mas na situação sub judice não existe poder totalmente vinculado; existe uma discricionariedade parcial.

Com efeito, nas situações em que não estão fixadas taxas de amortização ou depreciação, para se saber o que é gasto fiscalmente dedutível, compete à AT definir as taxas que considera “razoáveis”, “tendo em conta o período de vida útil esperada”[2]. Existe discricionariedade quando se utiliza o conceito impreciso “razoável”, mas existe por outro lado vinculação, no sentido de se ter em conta a vida útil esperada.

Este poder discricionário é exercido na fase de instrução do procedimento de inspeção, mediante um ato instrumental (a operação de integração da lei, em virtude dos bens omissos do DR de amortizações), anterior ao ato administrativo (de liquidação), que emerge na fase decisória do procedimento. Não se confunde o referido ato instrumental levado a efeito no âmbito da fase de instrução (que por si só nenhum efeito produz na esfera do contribuinte), com o ato administrativo de liquidação (que existiu neste caso) emergente na fase decisória, resultante da constatação do excesso de amortizações contabilísticas face aos limites de dedutibilidade fiscal.

Isto para salientar que esta operação de integração da lei (nos termos do n.º 3 do art. 10.º do Código Civil, aplicável com as devidas adaptações) deve ser feita “criando o intérprete a norma que, como legislador, dentro do espírito do sistema, ele formularia para o tipo de casos [não para o caso] em que a hipótese omissa se integra”[3], segundo critérios de abstração e generalidade. Nesta operação, “o julgador terá de encontrar a solução justa (de acordo com o espírito do sistema) não apenas para aquele caso concreto mas para todos os outros casos juridicamente semelhantes, o que obrigará a um esforço de abstração, ou seja, um esforço para isolar no caso aquela que é a questão jurídica que urge resolver, desprezando as particularidades do caso que não contribuem para identificar essa mesma questão”[4]. Assim, na operação de integração a AT deve i) observar a coerência sistemática, e ii) desprezar as especificidades da situação concreta do contribuinte. Importa apenas atender à vida útil do bem omisso do DR (essa é a questão que urge resolver) segundo um critério abstrato e geral (ou como se refere no voto de vencido do processo 593/2015-T, “aferição objetiva” e não “aferição subjetiva”).

Esta vida útil esperada será encontrada em fontes técnicas, mas dentro desse universo de fontes técnicas, a AT decidirá autonomamente, no seu espaço próprio de valoração, o que considera “razoável”, para a partir daí determinar quais as taxas de amortização que são aplicáveis. O que aliás se percebe; antevendo a hipótese de diferentes fontes / estudos preverem diferentes vidas úteis, e sendo necessário integrar a norma de forma geral e indeterminada, o legislador concedeu este poder (parcialmente) discricionário à AT, posto que (o legislador) optou por conceder (apenas) à Administração o papel de integração juridicamente vinculante das taxas de amortização omissas no DR.

Esta autonomia da AT, traduzindo um espaço próprio de valoração, não deixa, contudo, de ser juridicamente conformada, segundo o princípio da juridicidade. De acordo com este princípio, no exercício de poderes discricionários a Administração não deixa de estar subordinada ao Direito, designadamente aos princípios gerais de Direito Administrativo, como o princípio da igualdade e da imparcialidade[5].

Assim, a discricionariedade não significará nunca arbitrariedade ou casuísmo. Com efeito, no exercício de poderes discricionários a AT deve comparar o caso em que exerce o poder com outros casos (reais ou virtuais), decidindo como se aquele seja uma espécie de género, e não um caso isolado, único, irrepetível.

Pese embora estar em causa um espaço de valoração próprio da Administração, em princípio, insindicável pelo tribunal, o exercício desse poder discricionário está sujeito ao controlo judicial em caso de erro grosseiro, evidente ou manifesto.

 

II. Quanto à adequação da conduta da AT:

Acompanho a posição vencedora quando sustenta que a conduta da AT foi correta, visto que procurou preencher o período omisso de vida útil esperada recorrendo a fontes técnicas, incluindo diligências junto dos fornecedores dos equipamentos.

Concordo ainda quando são rejeitados os argumentos apresentados quer pela Requerente quer pela Requerida, na fundamentação das vidas úteis sustentadas. Nem é relevante a duração do plano de investimentos, ou rendibilidade dos mesmos, atinentes aos acordos com o Estado Português (mediante os quais este se comprometeu a adquirir a totalidade da eletricidade produzida nos centros electroprodutores, segundo uma tarifa garantida), invocados pela Requerente, nem é relevante a duração do direito de superfície contratado, invocado pela Requerida.

Os argumentos expendidos pelas partes serão porventura relevantes no domínio contabilístico, dotado de maior subjetividade, mas não no domínio fiscal, onde se deve privilegiar a objetividade. Aqui importa atender apenas à duração expectável da vida útil dos bens, em condições de utilização normal, no preenchimento do “período de vida útil esperada”.

 

III. Quanto às conclusões das diligências da AT:

III.1 Parte comum aos aerogeradores e painéis fotovoltaicos

A AT fundamentou com informação dos fornecedores, a definição das vidas úteis consideradas, para efeitos de integração do DR, e subsequente correção da situação fiscal do contribuinte. Informação que incluiu por um lado respostas dos fornecedores a perguntas feitas diretamente pela AT, e por outro material de divulgação comercial, designadamente respeitante a períodos de garantia associada aos equipamentos.

Nessas fontes de informação consta a vida útil de 20 e de 25 anos, respetivamente para aerogeradores e painéis fotovoltaicos, sem, contudo, se dizer se esses períodos correspondem a vidas úteis mínimas, médias ou máximas.

A posição vencedora entendeu que essa prova, produzida pela AT, respeita aos prazos máximos de duração útil dos bens. A minha leitura é diferente.

O que está em causa é a forma como a AT preencheu um vazio do DR. Aí constam bens e as suas taxas máximas, a que correspondem vidas úteis mínimas, para efeitos de dedutibilidade fiscal. O método adotado visou, portanto, encontrar as taxas máximas (vidas úteis mínimas) omissas.

Concordo que o conteúdo dos materiais de divulgação comercial dos fornecedores pode estar influenciado pela vontade de engrandecer as qualidades dos produtos, por um certo dolus bónus. Precisamente por isso, quando os fornecedores divulgam / garantem comercialmente uma vida de 20 ou 25 anos, estão necessariamente a referir-se a um mínimo, e não a um máximo. É essa a expressão do engrandecimento comercial. Quem quer engrandecer o seu produto sustenta que a vida útil é “no mínimo” de 20/25 anos, não diz que é “no máximo” de 20/25 anos.

É certo que essas grandezas poderão ser inflacionadas num contexto comercial. O mínimo poderá não ser 20/25 anos, mas menos. Mas o possível otimismo exagerado, comercialmente contextualizado, não é de esperar quando se responde a uma pergunta feita pela AT. Nesse contexto, é razoável esperar uma resposta com seriedade e neutralidade, para mais não sendo os inquiridos os sujeitos passivos inspecionados.

 

III.2 Quanto aos aerogeradores em particular

Atente-se às seguintes passagens do estudo do LNEG (2013) carreado para os autos, indicadas na al. s) de 19 – matéria de facto:

 i.              Resumo (pág. 3): “A metodologia desenvolvida pelo LNEG permitiu concluir que o período de vida útil máxima de uma turbina eólica se situa entre os 20 e 25 anos”;

ii.              3.1.1. Aplicação a um caso real (pág. 16): “A figura 17 apresenta a estimativa da evolução da degradação do fator de capacidade de uma turbina ao fim de no máximo 40 anos de operação para as duas análises efetuadas”;

iii.              3.1.1. Aplicação a um caso real (pág. 18): “Os resultados indicam que para uma amostra de 3123 turbinas onshore instaladas na Dinamarca, com 20 a 11 anos de operação e potência nominal entre 150 KW e 2300 KW, o fator de capacidade apresenta uma degradação entre 10-15% ao final de 20-25 anos de operação e entre 15-20% ao final de 30-35 anos de operação”;

iv.              3.2 Análise económica e discussão de resultados (pág. 19): “Analisando os resultados obtidos verifica-se que a degradação do fator de capacidade de uma turbina varia, até 20%, ao longo de 35-40 anos de operação”.

v.              3.2 Análise económica e discussão de resultados (pág. 20): “Os resultados indicam que a partir de 11% de redução da energia produzida, o projeto apresenta uma taxa interna de rentabilidade abaixo dos 8%. De acordo com os resultados anteriormente apresentados … este valor de redução corresponde a um período de tempo de vida útil máxima entre os 20 e 25 anos”.

vi.              4. Conclusões (pág. 21): “Por forma a estabelecer um limite máximo de redução da produção energética das turbinas eólicas e, assim, identificar o período de vida útil do mesmo, foi efetuada a análise económica de um parque eólico típico correlacionando-se o decréscimo de produção com a viabilidade económica do projeto… Neste contexto, conclui-se que o limite máximo de vida útil de uma turbina eólica se situa entre 20 e 25 anos de operação”.

A análise do exposto supra permite perceber que a conclusão desse estudo, de que o período de vida útil máxima de uma turbina eólica se situa entre os 20 e 25 anos, é o resultado da metodologia adotada, de relação estabelecida entre a diminuição da produção inerente à maior longevidade dos equipamentos, e a correspondente diminuição de rendibilidade, abaixo de uma taxa interna de rentabilidade (“TIR”) de 8%.

Ou seja, com o aumento da longevidade dos equipamentos diminui a produtividade, e assim, estima-se que quando a utilização excede os 25 anos, a rendibilidade do empreendimento diminui abaixo de uma TIR de 8%.

Porém, não há dúvidas que esse estudo contempla cenários de longevidade destes equipamentos até 40 anos, estimando para esses casos a respetiva degradação do fator de capacidade.

Ora se foram ponderados no estudo cenários em que as turbinas tinham longevidade de 40 anos, foi necessariamente porque esses cenários são razoáveis. De outro modo não mereceriam ponderação. Simplesmente não proporcionam a rendibilidade mínima pretendida (TIR de 8%), o que como já foi dito, acompanhando a posição vencedora, é irrelevante para se preencher o vazio do DR.

Ora se temos de um lado os fornecedores a informarem que a vida útil é de 20 anos, a garantirem uma vida útil de 20 anos (e só faz sentido garantir-se um período mínimo), e temos de outro lado um estudo do LNEG, independente e comercialmente desinteressado, que contempla uma longevidade até 40 anos, perante a omissão do DR, não existe erro grosseiro quando a AT preenche o vazio com um intervalo de dedutibilidade fiscal que vai de 20 a 40 anos.

Por conseguinte, é legal a correção promovida pela AT, relativamente às amortizações de aerogeradores.

 

III.3 Quanto aos painéis fotovoltaicos em particular

Existe suporte para a vida útil de 25 anos, indicado na matéria de facto e ora reproduzido, que pelas razões antes expostas a propósito dos aerogeradores, deve aprioristicamente ser entendido como visando o preencher o mínimo. De acordo com o exposto na al. n) de 19 – matéria de facto:

  1. Segundo informação técnica prestada pelas sociedades I…, J..., Ltd., K… (fornecedora da Q…), L…, S.A., e M…, Lda., todas as empresas referem expressamente que o período de utilidade esperada para os painéis fotovoltaicos é de 25 anos;
  2. Em particular, a empresa “J…”, ao indicar o modo como presta as respetivas garantias, refere expressamente que o período de vida útil dos painéis fotovoltaicos é de 25 anos.
  3. Em particular, a empresa “K…”, que fabricou um sistema fotovoltaico utilizado pela Q…, entende que o respetivo período de utilidade esperada é no mínimo de 25 anos (afirmação da AT que não foi contraditada pela Requerente).
  4. De acordo com estudo do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), em relatório de 2001, o tempo de vida do sistema solar fotovoltaico é tipicamente de 20-30 anos.
  5. De acordo com a Plataforma Europeia para a Tecnologia Fotovoltaica, em informação de 2014, o período de utilidade esperada para os bens em questão é de 25 anos.
  6. De acordo com um relatório da Associação Europeia da Indústria Fotovoltaica sobre a energia fotovoltaica, “o período de via útil estimando de um painel fotovoltaico é de 30 anos”.

A Requerente não contraditou a afirmação da Requerida, de que segundo o fornecedor do equipamento o período de utilidade esperada é no mínimo de 25 anos, valendo aqui, portanto, a livre apreciação da prova pelo Tribunal (cfr. n.º 7 do art. 110.º CPPT). 

Por outro lado, novamente de acordo com o LNEG (mas agora em estudo de 2001), o tempo de vida do sistema solar fotovoltaico é tipicamente de 20 a 30 anos.

É certo que, nos termos previstos no DR, o intervalo de dedutibilidade fiscal é formado por ficção, de tal modo que o limiar máximo é o dobro do mínimo. Ou seja, neste caso, se a vida útil mínima for 25 anos (taxa de amortização de 4%), por ficção legal a vida útil máxima é 50 anos (taxa de amortização de 2%). Mas o acerto do limiar mínimo (25 anos) não pode prescindir do acerto do limiar máximo (50 anos), ainda que resulte de ficção legal, sob pena do desacerto do intervalo de dedutibilidade globalmente considerado.

Assim, no caso dos painéis fotovoltaicos, apesar de não ser muito recente, a referência disponível (estudo de 2001 do LNEG, entidade independente e comercialmente desinteressada) quanto ao limiar superior do intervalo de vidas úteis esperadas situa-se nos 30 anos, significativamente inferior aos 50 anos do intervalo definido pela AT, de 25 a 50 anos.

Por conseguinte, face aos elementos carregados para o processo, no caso dos painéis fotovoltaicos a correção promovida pela AT enferma de vício de violação de lei, por erro grosseiro sobre os pressupostos de direito, o que justifica a anulação parcial da liquidação de IRC, na parte em que assentou nessas correções.

 

IV. Quanto à alteração superveniente da lei (Reforma da Fiscalidade Verde)

Segundo os princípios de aplicação da lei no tempo a lei nova (Reforma da Fiscalidade Verde) produz efeitos apenas para o futuro, razão pela qual não vincula a AT na apreciação do passado.

Adicionalmente, subscrevo o entendimento exposto no voto de vencido do Proc. 593/2015-T do CAAD, que passo a reproduzir:

“A superveniência de um outro regime legal no qual a omissão normativa originária deixou de existir – nomeadamente o regime de "Fiscalidade Verde" (Lei n.º 82-D/2014, de 31 de Dezembro) que permite amortizações em prazos como o adoptado pela Requerente, ao estabelecer prazos de vida útil a estes equipamentos com duração mínima de 12,5 anos e máxima de 25 anos – não tem nem pode ter qualquer relevância para o caso, já que aqui vigorava, à data dos factos, um poder discricionário que foi regularmente exercido pela AT, dele resultando a fixação de taxas de amortização que eram as legalmente aplicáveis aos equipamentos em causa. Admitamos que, se a sucessão de regimes legais pudesse servir de base adicional, e excepcional, para a impugnação de uma decisão tomada no exercício de um poder discricionário, então não só todas as decisões da Administração assim tomadas ficariam fragilizadas porque sujeitas a um estatuto precário, ao menos dentro dos prazos de caducidade (ou até, por absurdo, teriam tais decisões que ter-se por "não-razoáveis" pela única circunstância de não incorporarem um juízo de prognose quanto a possíveis regimes futuros dentro de um prazo de caducidade); mas os próprios critérios legais que tivessem sido preenchidos pelo exercício de um poder discricionário da Administração ficariam criticamente expostos à sucessão de regimes, numa infindável cascata de retroactividades”.

 

V. Quanto à questão dos prejuízos fiscais, acompanho a posição vencedora.

VI. Concordo ser improcedente o pedido de juros indemnizatórios relativamente a um pagamento que diz ter sido efetuado por compensação, visto não ter sido feita prova desse pagamento.

VII. Quanto ao pedido de indemnização por garantia indevida, na sequência do antes exposto, considero que a Requerente tem direito a indemnização, na parte correspondente à correção ilegal da AT, atinente aos painéis fotovoltaicos, em que o erro do ato de liquidação de IRC é imputável à AT, pois as correções foram da sua iniciativa e a Requerente em nada contribuiu para que esses erros fossem praticados.

 

Nuno M. Morujão.

Lisboa, 4/4/2017.

 



[1] http://www.ctt.pt/...

[2] Cfr. n.º 3 do art. 5.º do DR 25/2009, de 14 de setembro e n.º 2 do art. 31.º CIRC, segundo a numeração vigente à época.

[3] Cfr. Lima. P. e Varela, A., Código Civil Anotado – Volume I, Coimbra Ed. (4.ª ed.), 2010, em anotação 3 ao art. 10.º (Integração das lacunas da lei) p. 59.

[4] Cfr. Guedes, A. A., “Artigo 10.º (Integração das lacunas da lei)” in Fernandes, L. C. e Proença, J. B. (Coord.), Comentário ao Código Civil – Parte Geral, UCE Ed. (4.ª ed.), 2010, em anotação 3 ao art. 10.º (Integração das lacunas da lei) p. 53.

[5] Cfr. art. 55.º LGT, art. 6.º e 9.º CPA e n.º 2 do art. 266.º CRP.