Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 747/2016-T
Data da decisão: 2017-12-21  IRC  
Valor do pedido: € 147.166,06
Tema: IRC - Desconsideração de gastos
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DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

 

Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Rui Ferreira Rodrigues e José Manuel Parada Ramos, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral:

 

 

I – RELATÓRIO

 

  1. No dia 20 de Dezembro de 2016, A…, S.A., NIPC…, com sede na …, …, n.º…  …-… …, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de IRC n.º 2013… e n.º 2016…, e de juros compensatórios n.º 2013… e 2016…, todos referentes ao exercício de 2009, no valor de € 147.166,06, bem como das decisões de indeferimento e indeferimento parcial, respectivamente, da reclamação graciosa e do recurso hierárquico que tiveram aqueles por objecto.

 

  1. Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese:
  2. insuficiência de fundamentação dos actos de liquidação;
  3. preterição de formalidades legais essenciais;
  4. erro nos pressupostos de facto e de direito relativamente às correcções respeitantes a proveitos não reconhecidos, à desconsideração e não aceitação da dedutibilidade de determinados gastos para efeitos fiscais e à tributação autónoma de determinados gastos;
  5. ilegalidade da liquidação de juros compensatórios;
  6. ilegalidade do despacho que negou provimento ao recurso hierárquico.

 

  1. No dia 21-12-2016, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.

 

  1. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. Em 10-02-2017, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.

 

  1. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 28-02-2017.

 

  1. No dia 07-04-2017, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se unicamente por impugnação.

 

  1. No dia 31-05-2017, realizou-se a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, onde foi inquirida a testemunha, no acto, apresentada pela Requerente.

 

  1. Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.

 

  1. Foi fixado o prazo de 30 dias para a prolação de decisão final, após a apresentação de alegações pela Requerida.

 

  1. Tendo em conta o período de férias judiciais, e o disposto no art.º 17.º-A do RJAT, prorrogou-se o prazo constante do art.º 21.º/1 também do RJAT por dois meses, nos termos do n.º 2 desta última norma.

 

  1. Tendo em conta a constatação, em sede de elaboração da decisão final, da ausência de documentos essenciais à obtenção de uma decisão de mérito sobre parte do fundo da causa, foi determinada, oficiosamente, pelo Tribunal, a junção de documentação adicional, o que foi cumprido por requerimento da Requerente, de 06-11-2017.

 

  1. Foi facultado o contraditório à Requerida sobre a documentação junta e foi indicada a data de 28/12/2017, para os efeitos do artigo 18.º/2 do RJAT.

 

  1. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir

 

II. DECISÃO

 

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

1-      A ora Requerente é uma empresa municipal sob a forma de sociedade comercial anónima tutelada pela Câmara Municipal de … e constituída por escritura púbica em 09 de Novembro de 1995.

2-      Com vista à análise da situação tributária da REQUERENTE, a Administração Tributária iniciou um procedimento de inspecção tributária, externo e de âmbito geral, com incidência sobre o exercício de 2009, credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI2O11…, de 1 de Julho de 2011, do qual resultaram correcções à matéria colectável e correcções ao cálculo do imposto da sociedade.

3-      As Conclusões do Relatório da Inspecção Tributária, elaboradas após ter sido facultado o direito de audiência prévia, foram notificadas à REQUERENTE através do ofício n.º…, de 19 de Fevereiro de 2013.

4-                 Relativamente à matéria de IRC, do RIT consta o seguinte:

 

 

 

                   

 

 

 

 

 

 

                 

 

 

 

 

 

                      

 

 

 

 

                

 

 

 

 

 

 

 

 

                   

 

 

 

 

 

 

 

 

                              

 

 

 

 

                       

 

 

 

                 

 

 

 

 

 

                      

5-                   

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                

      

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                     

 

 

                       

 

 

 

 

                     

 

 

 

6-      As correcções sugeridas foram sintetizadas, no Relatório de Inspecção, nos seguintes quadros:

 

 

 

 

 

7-      Na sequência do Relatório de Inspecção Tributária referido, foram emitidas as liquidações objecto da presente acção arbitral, bem como as notas de liquidação referentes aos juros compensatórios, nas quais consta a sua razão de ser e quantificação, o imposto sobre o qual incidem os juros, o período a que se referem, a taxa de juro aplicável e o valor de juros devido.

8-      A Requerente, em 27-07-2013, apresentou reclamação graciosa relativamente às liquidações referidas, tendo aquela sido indeferida.

9-      A decisão da reclamação graciosa foi recebida pela Requerente em 25/09/2015.

10-  Em 23/10/2015, a Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão da reclamação graciosa referida, recurso que foi parcialmente deferido, por despacho notificado a 10/09/2016.

11-  Uma vez que os actos de liquidação que constituem o objecto do presente processo arbitral não foram pagos no respectivo prazo de pagamento voluntário, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º …2013…, para cobrança coerciva dos mesmos.

12-  No dia 24 de Abril de 2013, a Requerente prestou garantia, que consistiu em hipoteca voluntária sobre bem imóvel, no valor de € 805.286,62, a qual inclui o valor respeitante à dívida de imposto e de Juros Compensatórios, relativa ao ano de 2009.

13-  Esta garantia foi, posteriormente, ampliada, através da constituição, em 26 de Junho de 2013, de uma nova hipoteca voluntária sobre o mesmo bem imóvel.

14-  Nos termos do artigo 3.º dos seus estatutos, a Requerente tem, e tinha em 2009, por objecto social:

a.       Promoção da construção de equipamentos e infra-estruturas adequados ao desenvolvimento turístico do concelho de …;

b.      Exploração directa, ou em regime de cessão e sub-cessão, de equipamentos municipais, designadamente das unidades que tenham sido construídas por sua promoção, e de outros equipamentos e infra-estruturas cujos direitos de exploração haja adquirido e, ou, obtido;

c.       Desenvolvimento de iniciativas de promoção e animação turísticas do concelho de…;

d.      Promoção de acções de concretização da estratégia de desenvolvimento turístico do concelho de … definida pelo Município;

e.       Fiscalização de concessões municipais e de concessões cuja fiscalização caiba no Município, desde que respeitem áreas relacionadas com o desenvolvimento turístico do concelho de … .

15-  A actividade da Requerente, centra-se, e centrava-se em 2009, na gestão e exploração de espaços e equipamento do domínio público municipal (Câmara Municipal de …-…) e no desenvolvimento de iniciativas de promoção e animação turísticas do concelho de … .

16-  Os respectivos proveitos incluem, e incluíam em 2009, além de receitas próprias resultantes da actividade de exploração de espaços comerciais, do Centro … e de equipamentos desportivos - hipódromo …-, os subsídios à exploração atribuídos pelo Município de … e pelo Turismo de Portugal, tendo em vista o desenvolvimento de actividades de dinamização turística e cultural.

17-  No período de tributação de 2009, a Requerente celebrou os seguintes contratos programa e contratos de financiamento para a promoção das actividades de interesse cultural e turístico:

                                                              i.            o Contrato - Programa –…;

                                                            ii.            o Contrato - Programa – Casa…;

                                                          iii.            o Contrato - Programa – Câmara Municipal de…;

                                                          iv.            os Contratos de Financiamento – Turismo de Portugal para a Promoção e Animação do … e para implementação do … .

18-  Em 20 de Novembro de 2009, foi celebrado um contrato de financiamento, entre o Turismo de Portugal e a Requerente nos termos do qual ficou previsto que o “Contrato de Financiamento tem por objecto a concessão pelo Turismo de Portugal de um apoio financeiro à Promotora no montante global mínimo de 3.645.000,00 Euros, o qual se destina à execução de um Pano de Promoção e Animação do … para o ano de 2009”.

19-  O valor de € 1.785,09, correspondente ao lançamento 26/9, de 31 de Outubro de 2009, na conta 74.1.1 da contabilidade da Requerente, é referente ao seguinte acerto de contas com o Turismo de Portugal, efectuado em 04-09-2009:

 

 

 

 

20-  Na conta 72.9 (TTT…) da contabilidade da Requerente consta um movimento a crédito de € 113.670,80.

21-  Para o referido movimento a Requerente apresentou, como documentos de suporte, um recibo por si emitido ao Turismo de Portugal, naquele montante e datado de 22-06-2009, e o registo de um movimento contabilístico de 15-05-2009, correspondente a um pagamento de € 113.670,80 à sociedade TTT…, Ld.ª, relativo ao prize money de USD 150.000,00, do evento … .

22-  Do plano de pagamentos efectuados em 2009, enviado pelo Turismo de Portugal à AT durante o procedimento inspectivo, consta que, para financiamento do projecto "…", foram pagos à Requerente os montantes de € 1.512.500,00 e de € 137.500,00, em 2009 e 2010, respectivamente, totalizando o montante de € 1.650.000,00.

23-  Na contabilidade da Requerente, consta das contas 74.1.3 - Subsídios à Exploração (NNN…) e da conta 79.7.2 (NNN…), que aí foram reconhecidos proveitos no montante de € 1.375.000,00 e de € 137.500,00, respectivamente, perfazendo o montante global de € 1.512.500,00.

24-  Do diário contabilístico da Requerente constam os seguintes movimentos, datados de 31-12-2009: débito da conta 2719 no montante de € 137.500,00 e crédito da conta 7413 (Subsídios à Exploração (NNN…)) nos montantes de € 137.500,00 e € 137.500,00, num total de € 275.000,00.

25-  Para os referidos movimentos a Requerente apresentou, como documentos de suporte, um recibo por si emitido ao Turismo de Portugal, no montante de € 137.500,00 e datado de 09-06-2010, e um plano de recebimentos do Turismo de Portugal com a designação “PAL 50 –…2007-2009”, onde se mencionam, em 2009, recebimentos daquela entidade nos valores de € 1.237.500,00 (06-04-2009) e de  €137.500,00 (08-06-2010).

26-  Os gastos subjacentes à factura n.º 42082, de 25 de Agosto de 2009, emitida pelo Restaurante X… e à factura n.º 144618, de 20 de Agosto de 2009, emitida pelo NN…, nos montantes de € 3.750,00 e € 2.722,32, respectivamente, foram suportados por ocasião do evento "", o qual teve lugar, entre os dias 28 e 30 de Agosto de 2009, nos … .

27-  A referida factura n.º 144618 contêm a referência a "…".

28-  O evento "…" possuía uma enorme importância e dimensão do género em Portugal, e destinou-se à promoção turística da região de … e …, contando com a participação de um quadro alargado de juízes de várias nacionalidades, responsáveis pela classificação dos melhores exemplares, em cada categoria.

29-  Os gastos suportados pela Requerente constantes das facturas mencionadas no ponto 25 dizem respeito a dois jantares em que estiveram presentes os juízes que participaram no evento.

30-  A Requerente, em 2009, suportou gastos com o pagamento de quotizações suplementares à Associação …, no montante de € 172.500,00 e à Associação de …, …, … e …, no montante de € 68.500,00.

31-  Do Plano de Promoção e Animação …, para o exercício de 2009, em que assenta o Contrato de Financiamento – Turismo de Portugal para a Promoção e Animação do … para o mesmo ano, acima referida, consta a obrigação de pagamento de € 172.500,00 à Associação … .

32-  A Requerente adquiriu as viaturas de matrícula … e …, tendo a respectiva factura sido emitida em 13-04-2010.

33-  A Requerente adquiriu a viatura de matrícula …, tendo a respectiva factura sido emitida em 05-05-2010.

34-  A Requerente adquiriu as viaturas de matrícula …, tendo a respectiva factura sido emitida em 26-04-2010.

35-  No dia 18 de Setembro de 2007, o Município de …, a REQUERENTE e a Associação … celebraram um protocolo de cooperação, nos termos do qual ficou acordado que o evento … seria realizado, nos anos de 2007, 2008 e 2009, no Concelho de… .

36-  O evento "…", em 2009, teve lugar na Cidadela de … .

37-  Com a referida iniciativa, procurou-se reforçar os ganhos da Marca, tanto no plano nacional, como internacional, e a promoção e internacionalização da imagem de … e do … .

38-  Neste sentido, foi determinado no Protocolo celebrado, que (i) o evento … a assumiria uma nova designação, incluindo as expressões "…" e "…", e que (ii) a Associação … ficaria responsável pela organização em cada evento, de "uma viagem de jornalistas estrangeiros, através do seu Gabinete de imprensa internacional, com vista à divulgação dos eventos (...) e à promoção do Concelho de …".

39-  Os lançamentos 70 e 27, do diário 4, da contabilidade da Requerente reportam-se às facturas nos 46 e 54, emitidas em 2 de Setembro e 23 de Outubro de 2009, respectivamente, pela Associação…, reconhecidas na conta 62.1 (subcontratos), onde foi reconhecido o gasto de € 250.000,00 (€ 125.000,00 + € 125.000,00) e na conta 6.1.2.99 (IVA pro rata), onde foi reconhecido o gasto de € 6.500,00 (€ 3.250,00 + € 3.250,00). 

40-  O referido lançamento na conta 6.1.2.99 corresponde à percentagem não dedutível do IVA (13%), IVA calculado "por dentro", sendo que a parte dedutível correspondeu, ao longo do ano de 2009, a 87%, já que o IVA suportado em cada uma das facturas (20%) foi de € 25.000,00, e a Requerente considerou não dedutível, também por referência a cada factura, o montante de € 3.250,00, equivalente a 13% daquele montante, que contabilizou como gasto do exercício.

41-  A Requerente considerou dedutível, também por referência a cada factura, o montante de € 21.750,00, equivalente a 87% daquele montante, tendo sido deduzido, nos períodos de imposto correspondentes.

42-  Com o recálculo da proporção do pro rata definitivo para 47% - existindo uma diferença, para menos, de 40% relativamente à proporção do pró-rata utilizado ao longo do exercício (87%) —, a Requerente contabilizou como gasto adicional a percentagem adicional do IVA não dedutível associado àquelas facturas, na proporção de 40% (53%-13%), aumentando, na mesma proporção, o montante dos gastos do exercício que haviam sido reconhecidos.

43-  No dia 16 de Junho de 2000, a Requerente, enquanto cessionária da exploração do Centro …, celebrou com a sociedade EEE…, S.A. - pessoa colectiva de Direito Espanhol, cujo objecto social consistia na exploração e desenvolvimento da actividade de organização e serviços de congressos e eventos similares - um Contrato de Sub-Cessão de Exploração do Centro … .

44-  De acordo com a cláusula segunda, do referido Contrato de Sub-Cessão de Exploração do …, a Requerente cedeu à EEE…, S.A. todos os direitos e obrigações relativos à gestão e exploração das diferentes zonas do …, com exclusão da Zona destinada a estabelecimentos comerciais, serviços e escritórios.

45-  Com o propósito de proceder à exploração do …, a EEE…, S.A. constituiu a sociedade EEE…, Organização de Congressos …, Lda, pessoa colectiva de Direito Português, para a qual se transferiram, automaticamente, todos os direitos e obrigações assumidos pela EEE…, S.A., no referido contrato de Contrato de Sub-Cessão de Exploração do … .

46-  O … era considerado umas das infra-estruturas fulcrais para o desenvolvimento do Turismo no Concelho e foi construído com o objectivo principal de promover o desenvolvimento local e regional da zona.

47-  No dia 20 de Fevereiro de 2003, a UUU…, Lda. celebrou com a sociedade GGG…, S.A. (doravante "GGG…") um contrato de prestação de serviços, nos termos do qual esta sociedade ficou encarregada da realização e desenvolvimento de actividades relacionadas com a prestação de serviços de audiovisuais no… .

48-  No âmbito da execução do referido contrato de prestação de serviços celebrado com a UUU…, Lda., esta sociedade contraiu uma dívida para com a GGG…, no montante de € 890.383,08.

49-  Esta dívida foi assumida pela EEE…, S.A., enquanto sociedade que detinha 100% da Sociedade UUU…, Lda.

50-  No dia 8 de Dezembro de 2006, foi celebrado entre a Requerente e a EEE… S.A. um Acordo Revogatório, nos termos do qual foi revogado o Contrato de Sub-Cessão de Exploração do … assinado, entre as duas sociedades, em 16 de Junho de 2000, passando a Requerente a explorar directamente o Centro de Congressos … .

51-  De acordo com a Cláusula Terceira, n.º 1, alínea b), do referido Acordo Revogatório, a Requerente obrigou-se a pagar, na data da celebração do mesmo, a quantia de € 309.387,00, a título de compensação pela transferência dos bens e equipamentos da sociedade EEE…, S.A., discriminados no Anexo, ao referido Acordo.

52-  Com a finalidade de proceder à avaliação do imobilizado incorpóreo e corpóreo, que iria ser adquirido, a Requerente contratou os serviços da Sociedade FFF… .

53-  O valor de aquisição do imobilizado constante do Balanço da EEE…, S.A. era de € 228.470,25.

54-  Em 2009, a Requerente, baseada no valor de aquisição de € 309.387,00, contabilizou amortizações, no montante de € 53.074,63, relacionadas com a aquisição dos bens e equipamentos constantes do imobilizado corpóreo da EEE…, S.A., na sequência da revogação do Contrato de Sub-Cessão de Exploração, celebrado entre a Requerente e aquela sociedade.

55-  Nos termos do Acordo Revogatório celebrado no dia 8 de Dezembro de 2006, atrás referido, a Requerente aceitou assumir a transmissão singular da referida dívida que a EEE…, S.A. detinha perante a GGG…, no montante de € 890.383,08, correspondente às facturas discriminadas no Anexo 2, ao referido Acordo.

56-  Simultaneamente, a Requerente e a GGG… celebraram um Acordo de Pagamento, nos termos do qual ficaram definidos os termos em que seria efectuado o pagamento da dívida assumida.

57-  Na alínea d) e e), da Cláusula Primeira, do Acordo de Pagamento, consta que “a quantia de € 300.000,00 (trezentos mil euros) (...) vence juros à taxa Euribor a três meses desde a data da assinatura deste acordo até ao seu efectivo pagamento”, e que “Os juros vencidos nos termos da alínea anterior serão pagos semestralmente no primeiro dia útil do mês seguinte ao semestre a que respeitem”.

58-  O referido pagamento foi efectuado de acordo com o estipulado na Cláusula Primeira do Acordo de Pagamento, nos termos da qual a quantia de € 590.383,08 seria paga até ao dia 31 de Janeiro de 2007, de acordo com o disposto nas respectivas alíneas a) e b), e o remanescente, no montante de € 300.000,00, seria pago no período de tempo e com as condicionantes estabelecidas nas respectivas alíneas c), d) e e).

59-  A Requerente contabilizou como gasto do exercício a percentagem não dedutível (13%) do IVA incidente sobre as notas de crédito por si emitidas, no decurso do exercício 2009, no montante global de € 7.908,74.

 

 

A.2. Factos dados como não provados

1- Que as despesas suportadas pela Requerente, identificadas no quadro resumo da pág. 58 do Relatório de Inspecção respeitem, exclusivamente, a despesas com jornalistas estrangeiros que acompanharam eventos por aquela organizados.

2- A viatura com a matrícula … foi alugada no âmbito de um evento/acção de promoção desenvolvido pela Requerente.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º/7 do CPPT, a prova documental e testemunhal e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Em especial, os factos dados como provados nos pontos 25, 27, 28, 35, 43, 44, resultam da conjugação da prova documental disponível com a prova testemunhal produzida, que se apresentou coerente e revelando o conhecimento suficiente para não deixar dúvidas razoáveis a respeito da verificação dos factos em questão.

O facto provado sob o ponto 26, não se refere à factura n.º 42082, porquanto, ao contrário do alegado pela Requerente (ponto 90 do requerimento inicial), tal não está comprovado.

Com efeito, a Requerente refere: “No entanto, como bem se refere no despacho de indeferimento da Reclamação graciosa, as facturas em crise contêm a referência a «… »”.

Porém, tal não se comprova. Com efeito, na informação que serviu de fundamento àquele despacho é referido: “Como se pode aferir de fls. 420-v, o documento (refere-se à fatura n.º 42082) não identifica o sujeito passivo para o qual foi prestado o serviço, nem a data de prestação do serviço coincide com a data do evento «Exposição …», ou seja, este documento não é suficiente (…). Quanto ao documento de fls. 425v (refere-se à fatura n.º 144618), apesar de mencionar «Exposição …», não identifica os destinatários dos mesmos, nem a data é coincidente (…)” (cfr. doc. 1 (PA15, pp. 44/45 do documento gravado em computador).

Assim, verifica-se que a expressão “Exposição…” consta da fatura n.º 144618, mas não da n.º 42082, o que resulta também da relação constante do PA3 (pp. 12/14 – doc. 3) e dos doc.ºs 4 (PA12-p. 54) e 5 (PA12-p. 63).

A referência a que ambas as faturas respeitam a jantares oferecidos aos diversos juízes do evento «Exposição …» consta da informação prestada na reclamação graciosa, mas apenas como alegação da Requerente, cfr. doc. 2 (PA15-p. 38)

O facto provado sob o ponto 30 resulta da documentação junta pela Requerente a 06-11-2017, a solicitação do tribunal arbitral.

Os factos dados como não provados resultam da insuficiência ou ausência de prova suficiente a seu respeito.

O facto dado como não provado no ponto 1, tem em conta que a prova testemunhal produzida não demonstrou nem exprimiu conhecimento directo e fundamentado no sentido de terem sido apenas as pessoas ali referidas a beneficiarem das despesas em questão.

O facto dado como não provado no ponto 2 resulta da total ausência de prova a seu respeito.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

 

B. DO DIREITO

 

a.      do vício de fundamentação

 

Começa a Requerente por arguir a falta de fundamentação das liquidações objecto da presente acção arbitral, referindo que nos actos de liquidação notificados não são explicitados os fundamentos de facto e de direito que determinaram a sua emissão, assim como não existe qualquer referência a uma eventual remissão explícita para um concreto documento externo, como o Relatório de Inspeção Tributária, sendo apenas indicado um conjunto de valores, imperceptíveis para um destinatário normal e também para a Requerente, bem como referido os competentes meios de reacção.

Assim, tais actos, segundo a Requerente, não permitem conhecer o itinerário cognoscitivo que lhes subjaz, estando deste modo inquinados de vício de violação de lei, nos termos do artigo 268.º/3 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e artigo 77.º da Lei Geral Tributária (LGT), tendo por consequência a sua anulabilidade.

Já segundo a Requerida, é entendimento do STA, conforme acórdão de 25-05-1993 (Proc. 27387), que: “Atento ao fim meramente instrumental perseguido pela fundamentação dos actos administrativos, dever-se-á entender que este ficará assegurado sempre que mau grado a inexistência de uma referência expressa a qualquer preceito legal, ou princípio jurídico, a decisão em causa se situe indubitavelmente num determinado quadro legal perfeitamente cognoscível do ponto de vista do destinatário normal” (na mesma esteira veja-se ainda os Acórdão de 15.02.2007 proferido no âmbito do Proc. n.º 1096/06 de 11.11.2004, Proc. n.º 504/04 de 23.12.2003, Proc. n.º 48.168-A (Pleno) de 30.04.2003, Proc. n.º 46556 (Pleno) de 10.07.2002 e Proc. n.º 274/2002 e de 29.10.2009 proferido no âmbito do Proc. n.º 0778/09).

Também segundo Freitas Pereira, o que “importa assegurar na fundamentação é que o destinatário do acto tributário – o sujeito passivo – colocado perante ela, e sendo uma pessoa normalmente diligente ou razoável, esteja em condições de conhecer as razões de facto e de direito que determinaram a administração fiscal a decidir de uma determinada maneira e não de outra.”.

Para a Requerida, no caso concreto, a fundamentação é suficientemente clara e inequívoca, tanto mais que a Requerente, por via do pedido de pronúncia arbitral, demonstra, em face dos argumentos por si explanados ao longo do seu articulado, ter cabalmente compreendido o quadro fáctico e legal em que assentou a decisão da AT, já que tenta rebater, ponto por ponto, toda a sua actuação.

Como é sabido, e ambas as partes o reconhecem, a fundamentação é uma exigência dos actos tributários em geral, sendo uma imposição constitucional (268º da CRP) e legal (art.º 77º da LGT).

            Resumidamente, pode dizer-se que é hoje pacífico na doutrina e na jurisprudência nacionais que a fundamentação exigível tem de reunir as seguintes características:

1.                            Oficiosidade: deve partir sempre da iniciativa da administração, não sendo admissíveis fundamentações a pedido;

2.                            Contemporaneidade: deve ser coeva da prática do acto, não podendo haver fundamentações diferidas;

3.                            Clareza: deve ser compreensível por um destinatário médio, evitando conceitos polissémicos ou profundamente técnicos;

4.                            Plenitude: deve conter todos os elementos essenciais e que foram determinantes da decisão tomada. Esta característica desdobra-se em duas exigências, a saber: o dever de justificação (normas legais e factualidade – domínio da legalidade) e de motivação (domínio da discricionariedade ou oportunidade, quando é preciso uma valoração).

Ora, se a fundamentação é, nos termos referidos, necessária e obrigatória, tal não pode nem deve ser entendido de uma forma abstracta e/ou absoluta, ou seja, a fundamentação exigível a um acto tributário concreto, deve ser aquela que funcionalmente é necessária para que aquele não se apresente perante o contribuinte como uma pura demonstração de arbítrio. Esta será – julga-se – a pedra de toque do cumprimento do dever de fundamentação: quanto, perante um destinatário médio colocado na posição do destinatário real, o acto tributário se apresente, sob um ponto de vista de razoabilidade, como um produto do puro arbítrio da Administração, por não serem discerníveis os motivos de facto e/ou de direito em que assenta, o acto padecerá de falta de fundamentação.

            O artigo 77.º/1 da LGT refere, assim, que: “A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.”.

            Descendo ao caso concreto, verifica-se que os actos de liquidação em questão ocorreram na sequência de acto inspectivo e em conformidade com o relatório de inspecção tributária homologado por despacho, relatório esse onde constam os fundamentos das liquidações em causa, que a Requerente, desde a reclamação graciosa, demonstrou compreender, tomando, de maneira fundada, a decisão de não aceitar.

            De resto, a própria Requerente acaba por conceder nisso mesmo – pelo menos de forma implícita – ao sustentar, também desde a reclamação graciosa, que a remissão para o relatório de inspecção deveria ser explícita.

            Contudo, este entendimento é, desde logo, contrariado pelo Acórdão do STA de 19-05-2004, proferido no processo 0228/03[2], onde se lê que “Não vale como fundamentação a motivação apresentada posteriormente à prática do acto, nem a constante de peças instrutórias anteriores para as quais não tenha sido feita remissão, expressa ou implícita.”, admitindo-se, assim, que a remissão possa ser implícita, ou seja, decorrente do próprio contexto do acto tributário, ou do qual este emerge.

            Neste mesmo sentido, se orienta a jurisprudência do STA que considera que “Apesar da não indicação expressa do preceito legal aplicável, a exigível fundamentação de direito do acto tributário será suficiente com a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado, desde que, em qualquer caso, se possa concluir que aqueles eram conhecidos ou cognoscíveis por um destinatário normal colocado na posição em concreto do real destinatário.”[3], e que “A exigência legal e constitucional de fundamentação do acto tributário, decorrente dos arts. 268º da CRP, 77º da LGT e 125º do CPA, visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a Administração a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.”[4].

            Deste modo, entende-se que, considerado o contexto concreto em que foram produzidos os actos de liquidação em questão nos presentes autos, será perceptível, para um destinatário médio colocado na posição do destinatário real, que os fundamentos daqueles são os constantes do relatório de inspecção que os precedeu, sendo certo que mais se afigura evidente que a Requerente compreendeu isso mesmo.

            Este, de resto, tem sido o juízo dos nossos tribunais superiores em casos análogos, podendo a esse respeito conferir-se os Acórdãos do STA de 10-09-2014, proferido no processo 01226/13[5], do TCA-Norte de 13-09-2012, proferido no processo 00334/05.8BEBRG[6], e do TCA-Sul de 23-05-2006, proferido no processo 01156/06[7].

            Assim, e deste modo, nada haverá a censurar, na perspectiva do dever de fundamentação, aos actos tributários objecto do presente processo.

 

***

 

b.      Da preterição de formalidades legais essenciais

 

            Quanto a esta matéria, alega a Requerente, em suma, que não foi “notificada nos termos previstos na alínea a), do n.º 1, do artigo 60.º. da Lei Geral Tributária”.

            Já a Requerida sustenta a inexistência de qualquer preterição de formalidade essencial por violação do direito de participação, previsto no artigo 60.º/1-a) da LGT, porquanto o n.º 3 deste preceito prevê a dispensa de audição antes da liquidação do tributo nos casos em que, anteriormente, o contribuinte haja esse direito em sede de inspeção tributária

            Como se constata dos factos dados como provados, certo é que a Requerente foi notificada para exercer o seu direito de audiência prévia, o que fez, no âmbito do procedimento inspectivo do qual resultaram as liquidações contra as quais se insurge.

            Deste modo, e tendo em conta o disposto no artigo 60.º/3 da LGT, estava dispensada a audição da Requerente antes da liquidação, pelo que deve, também, este vício se dá por não verificado.  

 

***

 

c.       Das violações de Lei

Em termos substanciais, contesta a Requerente a liquidação de imposto objecto da presente acção arbitral, começando por arguir que as correcções relativas aos subsídios pagos pelo Turismo de Portugal, no montante de € 3.644.714,62, destinados ao financiamento do “Plano de Promoção e Animação do…”, sustentando que os mesmos se mostram totalmente contabilizados pelo que não foram omitidos quaisquer rendimentos.

No decurso do presente processo arbitral, a Requerente juntou documentos no sentido de sustentar o doc. n.º 4, correspondente ao extracto dos movimentos registados na conta 74.1.1 “Subsídios à Exploração”,  

Segundo a Requerente, a nota de lançamento (débito) n.º 174, de 04-09-2009, no montante de € 1.785,09, relativa a “Promoção e Animação 2008” (doc. n.º 4.9.2), foi contabilizada na conta 74.1.1 do exercício de 2009 (lançamento 26/9 de 31-10-2009), quando na realidade respeita ao exercício de 2008.

Por outro lado o montante de € 113.670,80, não foi efectivamente contabilizado na conta 74.1.1, tendo sido lançado na conta 72.9.02 – TTT…, Ld.ª (doc. n.º 5).

Juntou também o recibo n.º 1629, de 22-06-2009, no montante de € 113 670,80, que tem correspondência ao montante pago à “TTT…, Ld.ª”, em 30-06-2009, lançado na conta 72.9.02 (lançamento n.º 11/07) – TTT…, Ld.ª, conforme doc. n.º 5, oportunamente junto aos autos e uma ficha de Centro de Custo relativa a esse projeto

Para a Requerida, todavia, os subsídios pagos pelo Turismo de Portugal, no montante de € 3.644.714,62, destinados ao financiamento do “Plano de Promoção e Animação do…”, mostram-se contabilizados na conta 74.1.1, apenas, pelo valor de € 3.532.828,87, pelo que foram omitidos rendimentos no montante de € 111.885,75.

Ainda na perspectiva da Requerida, o montante de € 1.758,09 referente a “Promoção e Animação 2008”, face ao princípio da especialização dos exercícios previsto no artigo 18.º do CIRC, deveria ter sido reconhecido contabilisticamente naquele exercício, uma vez que a imputação de um proveito a certo exercício obedece a um critério económico, em que as operações nele efectuadas afectam o respetivo resultado, independentemente do recebimento ou do pagamento do respetivo preço.

Para a Requerida, não tendo sido registado contabilisticamente, como devia, no ano de 2008, deveria tê-lo sido, em alternativa, em 2009, o que não aconteceu, considerando que a Requerente, não obstante juntar uma Nota de Débito 26/9 (como doc. 4) e alegar que o aludido valor de € 1.785,09 se reporta ao exercício de 2008 e, por isso, dever ser desconsiderado, em momento algum comprova que aquele montante concorreu para a formação do lucro tributável do dito exercício

Relativamente à restante diferença (€ 113.670,80), julga a Requerida que, contabilisticamente e conforme o Plano Oficial de Contas (POC) em vigor à data dos factos, a conta 72 respeita aos trabalhos e serviços prestados que constituam o objecto social principal da entidade, devendo ter por base a faturação emitida pela entidade ou documentação externa.

Perante os elementos de prova apresentados, considera a Requerida que é impossível confirmar que o valor registado como proveitos - embora indevidamente registados na conta 72.9.02 – correspondem efectivamente ao subsidio à exploração atribuído pelo Fundo de Turismo.

Quanto aos documentos apresentados pela Requerente em 09-06-2017, entende a Requerida que os mesmos não são aptos a provar que, no ano de 2009, tenham sido contabilizados como rendimentos, ou seja, que o valor de € 111.885,75, inserido no financiamento prestado pelo Turismo de Portugal à Requerente, no valor de € 3.645.000,00, foi contabilizado como rendimento do ano de 2009.

Mais sustenta a Requerida que os documentos n.º 4.1.1 a 4.13.8 juntos pela Requerente “não identificam qual o n.º do lançamento contabilístico na conta 74.1.1 Subsídios à Exploração – Turismo de Portugal do ano de 2009 (documento n.º 4) que pretendem justificar, pelo que não é possível concluir quais daqueles valores se encontram contabilizados no ano de 2009 não permitindo assim, concluir que o montante de 111.885,75 € foi considerado como proveito em 2009”.

A argumentação da Requerente nesta matéria não é muito clara, o que terá de alguma forma induzido a Requerida em erro na sua defesa, já que, se bem se compreende, a Requerente não pretende que a nota de lançamento (débito) n.º 174, de 04-09-2009, no montante de € 1.785,09, relativa a “Promoção e Animação 2008” (doc. n.º 4), contabilizada na conta 74.1.1 do exercício de 2009 (lançamento 26/9 de 31-10-2009), seja desconsiderada para efeitos de apuramento do seu resultado tributável.

A referência àquela nota de débito, no quadro da argumentação da Requerente, será meramente explicativa, já que a mesma justifica o reconhecimento de um proveito adicional em 2009 de € 1.785,09, respeitante ao exercício anterior, ou seja, que deveria ter sido reconhecido em 2008 mas apenas o foi em 2009.

Consequentemente, infere-se que o valor total de subsídios à exploração do Turismo de Portugal a relevar como proveitos em 2009 (face à omissão verificada em 2008) seria de € 3.646.499,71, respeitando € 3.644.714,62 ao exercício de 2009 e € 1.785,09 ao exercício de 2008.

Como a AT reconhece que a Requerente registou na conta 74.1.1 o montante de € 3.532.828,87 (doc. nº 4), o valor dos proveitos pendente de confirmação será de € 113.670,84 e não de € 111.885,75, como pretende a AT:

 

 

Montante (€)

Proveitos tributáveis em 2009

- Subsídio a reconhecer referente a 2009

- Subsídio não reconhecido em 2008 e registado em 20

Total

 

3.644.714,62

1.785,09

3.646.499,71

Proveitos registados na conta 74.1.1

3.532.828,87

Proveitos pendentes de confirmação

113.670,84

 

Da argumentação apresentada pela Requerente, infere-se que, segundo esta, o montante dos subsídios auferidos do Turismo de Portugal imputáveis a 2009 e reconhecidos como proveito desse exercício, perfazerá a importância de € 3.644.714,58:

 

 

Montante (€)

Subsídios registados na conta 74.1.1

  • Total
  • Valor referente a 2008
  • Valor referente a 2009

 

3.532.828,87

1.785,09

3.532.828,87

Subsídios registados na conta 72.9.02

113.670,84

Subsídios referentes a 2009 e reconhecidos como proveitos no ano

3.644.714,58

 

Fundamental, então, é aferir se, efectivamente e em primeiro lugar, é possível, face à matéria de facto apurada, afirmar que o lançamento de € 113.670,80, efectuado na conta 72.9.02 –TTT…, Ld.ª, corresponde a pagamentos efetuados à Requerente a título de subsídios à exploração no âmbito do PLANO DE PROMOÇÃO E ANIMAÇÃO 2009.

Ora, compulsados os factos provados e não provados, julga-se assistir razão à Requerente.

Analisada a contabilidade, reconhecem-se nela os seguintes eventos:

                                                              i.            Reconhecimento como proveitos, na rubrica 74.1.1 Subsídios à exploração de uma importância total de € 3.532.828,87, conforme Doc. 4 e ponto 44 do Relatório de Inspeção Tributária (RI);

                                                            ii.            Neste proveito, reconhecido em 2009, encontra-se incluída a verba de € 1.785,09 que, de acordo com o descritivo do respectivo documento de débito ao Turismo de Portugal (Nota de Lançamento Nº 174) respeita ao exercício de 2008 e não ao exercício de 2009;

                                                          iii.            Do valor total de subsídios reconhecido como proveitos na conta 74.1.1 Subsídios à Exploração, € 3.531.043,78 serão então imputáveis a 2009 e € 1.785,09 respeitarão ao exercício de 2008. Esta verba de € 1.785,09 não foi reconhecida como proveito no ano a que respeita e apenas o foi em 2009;

                                                          iv.            Reconhecimento como proveitos, na rubrica 729.01 Outras prestações de serviços – TTT… do montante de € 113.670,80, conforme Recibo Nº 1629, verba que seria destinada à organização do evento contratado à TTT…;

Estamos aqui perante proveitos referentes a realidades distintas e que não se sobrepõem: (i) a verba de € 1.785,09 foi registada (conjuntamente com mais € 3.531.043,78) na conta de subsídios à exploração; e (ii) a verba de € 113.670,80 registada na conta de prestação de serviços, perfazendo um total de € 3.646.499,67. Se a este valor subtrairmos a verba de € 1.785,09, que respeita, como se viu, ao exercício de 2008, temos que o valor dos subsídios respeitantes a 2009 e registados como proveitos ascendem a € 3.644.714,58.

            Este valor mostra-se inferior em € 0,04 ao que a AT afirma ter sido pago pelo Turismo de Portugal, que seria de € 3.644.714,62 (cfr. RI).

            Da análise aos valores registados na conta 74.1.1 verifica-se, todavia, que a diferença de € 0,04 resulta de uma discrepância entre o valor do recibo 1931 (€ 162.999,84) e o valor pelo qual o mesmo foi registado na contabilidade (€ 162.999,80), conforme se poderá constatar pela análise do DOC Nº 4 e DOC Nº 4.12.1 anexos ao Requerimento apresentado pela Requerente em 9 de Junho.

Em suma, verificando-se que o montante registado como prestação de serviços na rubrica 72.9.02 respeita a verbas pagas pelo Turismo de Portugal a título de subsídio à exploração, a omissão de proveitos reduz-se a € 0,04, uma vez que:

                                                              i.            O montante global contabilizado como proveitos pela Requerida é de € 3.644.499,67, superior em € 1.787,05 ao que AT diz considerar que deveria ter sido reconhecido como proveitos;

                                                            ii.            Desconsiderando o proveito de € 1.787,09 imputável ao exercício anterior, verifica-se que a diferença entre os proveitos reconhecidos pela Requerente e imputáveis ao exercício (€ 3.644.714,58) e os que a AT afirma que deveriam ter sido reconhecidos (€ 3.644.714,62) se traduz numa omissão de proveitos de € 0,04, resultante de um erro no registo contabilístico do recibo 1931.

Não se acolhem, assim, os argumentos da AT relativamente esta matéria, que se reconduzem a:

                                                              i.            Quanto à importância de € 1.785,09, a ser de facto uma parcela de subsídio referente ao exercício de 2008, deveria ter sido reconhecida contabilisticamente nesse exercício. Não tendo essa verba sido registada “contabilisticamente, como devia, no ano de 2008, devê-lo-ia, em alternativa, ter sido em 2009, o que não aconteceu”;

                                                            ii.            Relativamente à restante diferença (€ 113.670,80), “a prova apresentada pela Requerente é tão-somente um extrato de conta corrente referente à conta 72.9.02 –TTT…, Lda., isentas, não tendo anexado cópia do correspondente documento de suporte ao alegado erróneo registo contabilístico.” … “Perante os elementos de prova apresentados é impossível confirmar que o valor registado como proveitos – embora indevidamente registados na conta 72.9.02 – correspondam efetivamente ao subsídio à exploração atribuído pelo Fundo de Turismo, já considerado como proveito do período de tributação de 2009.”.

Todavia considera-se que:

                                                              i.            A AT não tem razão quando diz que o valor de € 1.787,09 não foi reconhecido como proveito nem em 2008 nem em 2009, pois os documentos juntos pela Requerente demonstram esse registo no extrato da conta 74.1.1 referente ao exercício de 2009, sendo que o respectivo documento de suporte refere respeitar a “Promoção e Animação de 2008”;

                                                            ii.            Tratar-se-á, todavia, de uma questão irrelevante para o que está em apreciação, uma vez que este assunto apenas releva para a reconciliação entre os valores registados na contabilidade e a declaração de subsídios pagos pelo Turismo de Portugal.

Relativamente à restante diferença (€ 113.670,80), para além do extrato de conta corrente referente à conta 72.9.02 – TTT…, Lda., a Requerente veio a anexar o respectivo documento de suporte, que consiste num recibo emitido ao Turismo de Portugal, a que juntou uma ficha de centro de custo que indica como fornecedor “TTT…, Lda.” e como descrição do trabalho “…2009 – 150.000 USD”.

O valor dos subsídios atribuídos pelo Turismo de Portugal e demais importâncias pagas por este organismo à Requerente constam da carta que o mesmo enviou à AT, perfazendo os valores referentes a “PLANO DE PROMOÇÃO E ANIMAÇÃO 2009” a quantia de € 3.644.714,62.

Essa carta refere este e os demais pagamentos efetuados em 2009 à Requerente por aquela entidade, bem como os respectivos projectos, a saber: (i) aluguer de equipamentos; (ii) centro de exposições e congressos; (iii) … 2007-2009; (iv) Departamento Técnico de Secretariado; (v) … 2007; (vi) Plano de Promoção e Animação 2008; e (vii) Plano de Promoção e Animação 2009.

Tendo isto presente, afigura-se que: (i) o valor recebido pela Requerente do Turismo de Portugal tem, forçosamente, de respeitar a um desses projectos; (ii) da tipologia dos diferentes projectos comparticipados pelo Turismo de Portugal, tendo em conta o descritivo constante da ficha de centro de custo e por exclusão de partes, tudo aponta para que o pagamento em causa se enquadre no projeto “PLANO DE PROMOÇÃO E ANIMAÇÃO”.

O recibo emitido pela Requerente ao Turismo de Portugal não faz qualquer referência ao ano de 2008 e a ficha de centro de custo faz referência a “…–…2009”.

Face a todo o exposto, afigura-se plausível que a verba em questão seja enquadrável no projeto “PLANO DE PROMOÇÃO E ANIMAÇÃO 2009”, na qual se insere a quantia de proveitos que a AT considerou não ter sido integralmente reconhecida.

                                                          iii.            Por fim, releva ainda a coincidência de valores (ao cêntimo, se considerarmos o erro de € 0,04, resultante da discrepância acima identificada) entre o valor que a AT afirma dever ser reconhecido (correspondente ao que consta da carta de Turismo de Portugal para o projeto PLANO DE PROMOÇÃO E ANIMAÇÃO 2009) e o registado pela Requerente nas contas 71.1.4 e 72.9.03 (feito o devido ajustamento quanto ao valor imputável a 2008 e quanto ao referido erro de quatro cêntimos);

            É certo que que a Requerente poderia ter esclarecido melhor a questão e diligenciado na produção de argumentos e factos que explicitassem melhor os factos evidenciados acima. No entanto, o Tribunal tem o poder/dever de articular esses factos e argumentos que a Requerente poderia/deveria ter aduzido, desde que constantes do processo, como é o caso.

Deste modo, e em suma, concluindo-se que a contabilização dos € 113 670,80, contextualizada nos termos acima expostos, se reporta aos € 111.885,75 cuja omissão foi detectada e corrigida pela AT, deverá o pedido arbitral proceder nesta parte.

 

*

Alega também a Requerente, no que diz respeito às verbas transferidas pelo “Turismo de Portugal, IP”, destinadas ao financiamento do “…2007/2009” no montante de € 137.500,00 (art.s 18.º/1 e 20.º/1-j) do CIRC), que não obstante o referido montante ter sido pago à Requerente no ano de 2010, o mesmo encontra-se devidamente contabilizado como resulta do extrato contabilístico (doc. n.º 6), sendo que, no decurso da presente acção arbitral veio juntar o recibo n.º 2180, de 09-06-2010, no montante de € 137.500.00, visando sustentar aquele referido doc. n.º 6.

Já a Requerida sustenta que os subsídios pagos pelo Turismo de Portugal, no montante de € 1.650.000,00, destinados ao financiamento do “…2007/2009”, mostram-se contabilizados nas contas 74.1.3 e 79.7.12, nos montantes de € 1.375.000,00 e € 137.500,00, respectivamente, pelo que foram omitidos rendimentos no montante de € 137.500,00 €, pagos em 2010, mas constituindo compromisso de 2009, conforme programa de financiamento.

Assim, de acordo com o n.º 1 do artigo 18.º do CIRC, em conjugação com o princípio contabilístico da especialização dos exercícios, os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica. 

Relativamente a esta matéria, apurou-se no plano da matéria de factos, que:

- Do plano de pagamentos efectuados em 2009, enviado pelo Turismo de Portugal à AT durante o procedimento inspectivo, consta que, para financiamento do projecto "…", foram pagos à Requerente os montantes de € 1.512.500,00 e de € 137.500,00, em 2009 e 2010, respectivamente, totalizando o montante de € 1.650.000,00;

- Na contabilidade da Requerente, consta das contas 74.1.3 - Subsídios à Exploração (NNN…) e da conta 79.7.2 (NNN…), que aí foram reconhecidos proveitos no montante de € 1.375.000,00 e de € 137.500,00, respectivamente, perfazendo o montante global de € 1.512.500,00;

- Do diário contabilístico da Requerente constam os seguintes movimentos, datados de 31-12-2009: débito da conta 27.1.9 no montante de € 137.500,00 e crédito da conta 74.1.3 (Subsídios à Exploração (NNN…)) nos montantes de € 137.500,00 e € 137.500,00, num total de € 275.000,00;

- Para os referidos movimentos a Requerente apresentou, como documentos de suporte: um recibo por si emitido ao Turismo de Portugal, no montante de € 137.500,00 e datado de 09-06-2010, e um plano de recebimentos do Turismo de Portugal com a designação “…2007-2009”, onde se mencionam, em 2009, recebimentos daquela entidade nos valores de € 1.237.500,00 (06-04-2009) e de € 137.500,00 (08-06-2010).

            A correcção em questão, operada pela AT, tem uma fundamentação simples e linear: a Requerente tinha, em função da relação contratual com o Turismo de Portugal, em 2009, direito a pagamentos num total de € 1.650.000,00, o que a Requerente não contesta, e na conta respectiva apenas se encontravam registados ganhos no valor de € 1.512.500,00, estando, portanto, em falta no montante de € 137.500,00, que, de acordo com o princípio da especialização dos exercícios foram acrescidos ao lucro tributável do exercício.

            A Requerente contesta esta correcção, por mera remissão para o documento 6, junto com o Requerimento inicial, afirmando, simplesmente, que daquele, e da respectiva documentação de suporte “não restam dúvidas de que o montante alegadamente não reconhecido na contabilidade da REQUERENTE, o foi efectivamente”, não fundamentando, porém, de que forma, e em que medida, é que a documentação por si junta faz a demonstração que pretende.

            Analisada tal documentação, contudo, não é possível concordar com a Requerente.

            Com efeito, o referido doc. 6 consiste numa cópia do diário contabilístico da Requerente, que reporta movimentos, datados de 31-12-2009: débito da conta 27.1.9 no montante de € 137.500,00 e crédito da conta 74.1.3 (Subsídios à Exploração (NNN…)) nos montantes de € 137.500,00 e € 137.500,00, num total de € 275.000,00.

            Como documento de suporte de tais movimentos, a Requerente apresentou um recibo por si emitido ao Turismo de Portugal, no montante de € 137.500,00 e datado de 09-06-2010, e um plano de recebimentos do Turismo de Portugal com a designação “… 2007-2009”, onde se mencionam, em 2009, recebimentos daquela entidade nos valores de € 1.237.500,00 (06-04-2009) e de € 137.500,00 (08-06-2010).

            Ora, desde logo, os documentos de suporte apresentados não constituem suporte idóneo dos movimentos registados, notando-se, para além do mais, que é incompreensível como é que a Requerente pretende justificar um movimento de 31-12-2009, com um recibo emitido, posteriormente, em 09-06-2010.

            Por outro lado, o plano de recebimentos do Turismo de Portugal apresentado, ao qual tem correspondência o recibo de 09-06-2010, cuja data é a mesma que consta junto ao recebimento de € 137.500,00 constante daquele plano, é, outrossim, compatível com os registos contabilísticos na conta 74.1.3 - Subsídios à Exploração (NNN…), já que o respectivo montante é equivalente (€ 1.375.000,00).

            Por outro lado, inexplicavelmente – dúvida que a Requerente também não logrou dissipar -, em termos de prática contabilística, nesse lançamento o total dos valores lançados a débito é diferente do total dos valores registados a crédito: Débito da conta 27.1.9 no montante de € 137.500,00 e crédito da conta 74.1.3 no montante de € 275.000,00 € (repartido em dois montantes).

            Deste modo, não sendo possível concluir que o montante omisso de € 137.000,00, foi contabilizado no exercício devido – 2009 – deverá improceder, também nesta parte, o pedido arbitral.

*

Prosseguindo, contesta a Requerente as correcções relativas a gastos (i) com beneficiários não identificados ou respeitantes a funcionários, clientes ou fornecedores da empresa, relacionados com “refeições/alojamentos”, (ii) “quotizações suplementares”, (iii) “reparações de viaturas cuja matrícula não é mencionada ou não pertence à Requerente” e (iv) “outos gastos sem identificação dos respetivos beneficiários”, no montante de € 265.863,71 (art. 23.º/1 do CIRC), reputados pela AT como custos ou perdas considerados como dispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

            Sustenta a Requerente que as facturas n.ºs 42 082, de 25-08-2009, de € 3.750,00 e 144 618, de 20-08-2009, de € 2.722,32, referem-se a dois jantares oferecidos a juízes da “…”, realizada de 28 a 30 de agosto de 2009, e que outros gastos com refeições/alojamentos, no montante de € 14.204,55, cumprem com a indispensabilidade dos custos, uma vez que a área do desenvolvimento e promoção do turismo depende, essencialmente, das relações públicas que desenvolve.

            Relativamente ao pagamento de quotizações suplementares, no montante global de € 241.000,00, à Associação da … de … e …, nos montantes de € 172.500,00 e € 68.500,00, respectivamente, argumenta a Requerente que tais quotizações encontram-se previstas no “Plano de Promoção e Animação” para o exercício de 2009.

            No que diz respeito aos gastos com reparações de viaturas ligeiras de passageiros, no montante de € 3.031,39, sustenta, ainda, a Requerente que os veículos, à data factos, eram sua propriedade, com excepção do veículo registado com a matrícula n.º …, que foi alugado no âmbito de um evento/acção de promoção por si desenvolvido.

Vejamos cada uma destas situações.

(i)

Da análise aos documentos de suporte aos gastos controvertidos (anexo 32 ao relatório de inspeção tributária - folhas 582 a 722 dos autos de reclamação graciosa), constata-se que se referem essencialmente a despesas com estadias em hotéis situados em França, Espanha, Portugal, alimentação e bebidas, aquisições de artigos para oferta e de cabazes de natal, não havendo sido apresentado qualquer elemento adicional relativamente a estes gastos.

            Mais se contata que os documentos de suporte das despesas com refeições não logram identificar o destinatário da fatura (identificação, morada fiscal e numero de identificação fiscal da ora Requerente), sendo também que inexiste qualquer evidência da identificação dos seus beneficiários, do objetivo, causa e necessidade daqueles gastos para a manutenção da fonte produtora, de forma a comprovar o seu caráter empresarial e não meramente particular.

Relativamente aos gastos subjacentes à fatura n.º 42082, de 25 de Agosto de 2009, emitida pelo Restaurante N… e à fatura n.º 144618, de 20 de Agosto de 2009, emitida pelo NN…, nos montantes da € 3.750,00 e € 2.722,32, respectivamente, a Requerente alega que os mesmos foram suportados por ocasião do evento “…”, o qual teve lugar, entre os dias 28 a 30 de Agosto da 2009, nos … e que se referem a dois jantares oferecidos aos diversos juízes que participaram no evento, sendo contudo impossível, a respectiva identificação nas faturas que vieram a ser emitidas pelos estabelecimentos que proporcionaram as refeições.

Relativamente aos documentos em questão, considera a Requerida que:

- A venda a dinheiro n.º 42082, emitida em 25 de agosto de 2009 pelo Restaurante N…, além de nem sequer identificar o destinatário da fatura (identificação, morada fiscal e número de identificação fiscal do adquirente) apenas indica um valor: € 3.750,00. Não faz qualquer menção ao produto ou serviço comercializado/fornecido, quantidades, preços unitários, beneficiários, referindo apenas genericamente que “Os produtos faturados foram postos à disposição do adquirente em 25-08-2009”.

- A fatura n.º 144618, de 20 de agosto de 2009, emitida pelo NN… no montante de € 2.722,32 identifica a Requerente enquanto destinatário e contém a menção “…”. Indica apenas um fornecimento de 21 pacotes relativos a alojamento a € 77,52 cada e 12 pacotes de alojamento a € 91,20 cada, com data de chegada foi 20-08-2009 e de partida em 25-08-2009. No entanto, e tratando-se de uma prestação de serviços de alojamento, não contém qualquer menção dos beneficiários, do objectivo, causa e necessidade daqueles gastos de forma a comprovar o seu carácter empresarial e não meramente particular ou municipal/público.

            Quanto aos outros gastos com refeições/alojamentos, no montante de € 14.204,55, considera a Requerida que a Requerente também não carreou quer para o procedimento, quer para o processo arbitral, qualquer meio de prova dos concretos beneficiários desse custo nomeadamente troca de correspondência prévia à marcação das estadias no referido Hotel, apenas alegando tratar-se de custos com os juízes que participaram no evento supra referido, pelo que nem os documentos de suporte, nem a ora Requerente vieram trazer novidade, qualquer elemento adicional de prova, capaz de corroborar a alegada indispensabilidade destes custos nos termos e para os efeitos do disposto pelo art.º 23.º do CIRC.

            Relativamente às correcções agora em causa, no presente processo arbitral a Requerente apresenta, como se viu, dois grupos de argumentação, a saber:

- que as facturas n.ºs 42 082, de 25-08-2009, de € 3.750,00 e 144 618, de 20-08-2009, de € 2.722,32, referem-se a dois jantares oferecidos a juízes da “…”, realizada de 28 a 30 de agosto de 2009; e que

- os outros gastos com refeições/alojamentos, no montante de € 14.204,55, cumprem com a indispensabilidade dos custos, uma vez que a área do desenvolvimento e promoção do turismo depende, essencialmente, das relações públicas que desenvolve.

            Relativamente a estes últimos gastos, é evidente a improcedência da argumentação da Requerente. Com efeito, não havendo dúvidas que, como aquela afirma, “a área do desenvolvimento e promoção do turismo depende, essencialmente, das relações públicas que desenvolve”, tal não é, manifestamente, suficiente para concluir pela verificação dos requisitos de dedutibilidade dos custos em questão, infirmando a fundamentação da AT, subjacente às correcções em causa.

            Para que tal ocorresse era necessário que, por qualquer forma, estivesse demonstrado que as concretas despesas em questão foram contraídas com o propósito ou finalidade indicadas, o que não acontece, já que a Requerente não apresenta qualquer prova, ou sequer alega o que quer que seja nesse sentido, notando-se, por exemplo, que relativamente aos alojamentos a Madrid, não é adiantada uma explicação concreta para as deslocações e estadias e ali, nem para a utilização de quartos duplos, com indicação de apenas um beneficiário.

            Já relativamente às facturas n.ºs 42 082, de 25-08-2009, de € 3.750,00 e 144 618, de 20-08-2009, de € 2.722,32, considera-se não assistir razão à AT nas correcções que, operou relativamente à segunda das referidas facturas.

            A referida factura, como resulta dos factos provados, tem a menção ao evento “Exposição…”, o que é suficiente para que, na vertente que ora interessa (aferição da inserção do gasto no quadro da actividade normal da Requerente), a AT possa exercer as funções de fiscalização que lhe incumbe.

            É certo que, como a Requerida sustenta, não se apuram os concretos beneficiários da despesa em questão, para além do facto de nelas terem participado juízes do concurso animal em questão.

            Todavia, tal é próprio do tipo de despesas em questão, sendo, precisamente, esse o fundamento da tributação autónoma que sobre as mesmas está (e estava, à data) prevista.

            Daí que seja por essa via, da tributação autónoma, e não pela sua não dedutibilidade, que deverão ser fiscalmente tratadas tais despesas, quando, como é o caso, está aparente uma conexão com a actividade normal da empresa, sem contudo se explicitarem os seus concretos beneficiários.

            Deve por isso proceder o pedido arbitral no que diz respeito à correcção relativa à factura n.º 144 618, de 20-08-2009, de € 2.722,32, improcedendo na restante parte ora apreciada.

(ii)

A Requerente, como se viu, considerou como custo fiscal o pagamento de “quotizações suplementares” à Associação da … e à Associação de…, …, … e …, nos montantes de € 172.500,00 e € 68.500,00, respectivamente, para além dos realizados a título de quotas regulamentares previstas nos seus estatutos.

A AT considera que estas associações têm objetivos estatutários em tudo semelhantes aos da Requerente pelo que tais quotizações suplementares constituem verdadeiras liberalidades, não reunindo os critérios de indispensabilidade exigidos pelo CIRC para serem considerados custos fiscais.

Conforme resulta dos factos provados (ponto 30),   do Plano de Promoção e Animação do … para o exercício de 2009, em que assenta o Contrato de Financiamento – Turismo de Portugal para a Promoção e Animação do … para o mesmo ano, acima referida, consta a obrigação de pagamento à Associação da … acima referida.

            Verifica-se assim, que o pagamento de “quotizações suplementares” à Associação da …, no montante de € 172.500,00, está directamente relacionado com um proveito efectivamente obtido pela Requerente, e sujeito a IRC, proveniente do Contrato de Financiamento – Turismo de Portugal para a Promoção e Animação do …, sendo uma obrigação decorrente deste, pelo que o pagamento em questão está causalmente ligado, de forma directa, à obtenção dos sobreditos proveitos.

            Deste modo, atento o erro de facto, e consequente erro de direito, verificados, deverá a correcção em questão ser anulada, procedendo nesta parte o pedido arbitral, e improcedendo na restante.

(iii)

No que diz respeito aos gastos com reparações de viaturas ligeiras de passageiros, no montante de € 3.031,39, sustenta a Requerente, como se viu também, que os veículos, à data factos, eram sua propriedade, com excepção do veículo registado com a matrícula n.º…, que foi alugado no âmbito de um evento/acção de promoção por si desenvolvido.

Compulsada a matéria de facto assente, verifica-se que a Requerente incorreu em diversos gastos com reparação de viaturas ligeiras de passageiros, para os quais, nalguns casos, não se encontra identificada[8] e, noutros encontrando-se identificada a matrícula, relativamente ao exercício em questão (2009), não pertenciam ao activo da Requerente nem existia qualquer contrato que justificasse a sua utilização (matriculas…, …, …, …), tendo, por isso, os serviços desconsiderado tais gastos, que deixaram de concorrer para a determinação do resultado tributável.

A Requerente reitera que as viaturas ligeiras de passageiros com as matrículas…, …, …) eram, efetivamente, sua propriedade e que a viatura com a matrícula … foi alugada no âmbito de um evento/acção de promoção desenvolvido pela ora Requerente.

No entanto pela análise dos elementos de prova carreados conclui-se exatamente em sentido oposto pois, conforme documentos disponibilizados, as viaturas…, …, …apenas se tornaram sua propriedade em 2010-03-30, conforme certificados de matrícula, sendo que, relativamente à viatura com a matrícula…, não foi apresentado qualquer comprovativo do alegado aluguer.

Deste modo, nada havendo a censurar à correcção operada, deverá, nesta parte, o pedido arbitral improceder.

(iv)

Os lançamentos constantes da referida relação (pág.s 37/38 do RIT), e infra relacionados, no montante de € 1 155,45, respeitam a gastos diversos sem identificação dos beneficiários, pelo que, face ao disposto no n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, não poderão ser aceites como custos fiscais:

N.º ordem 29– AA…  …………..………… - 8 livros literatura  ……..      96,45 €

      “         51– JJ…, Ld.ª … - 1 Grupo ……...………..     117,00 €

      “         52– JJ…, Ld.ª … - Idem …………………..     385,00 €

      “         59–Restaurante CC... - Diversos  …….………..    357,00 €

      “         66–Hotel OO… ………..  -5 tratamentos de SPA …     200,00 €

 

Deste modo, nada havendo a censurar à correcção operada, deverá, nesta parte, o pedido arbitral improceder.

*

A Requerente contesta, também, as correcções relativas a gastos suportados, no montante de € 256.500,00, considerados pela AT como fiscalmente dispensáveis.

Alega a este propósito que, de acordo com o n.º 2 da cláusula 3.ª do Protocolo Realização de Edições da “…” em … – 2007, 2008 e 2009, celebrado em 18-09-2007 (doc. n.º 11), a Requerente emitiu as facturas n.ºs 46, de 02-09-2009 e 54, de 23-10-2009, nos montantes de € 250.000,00 e € 6.500,00, respectivamente, a favor de “…”, tendo em vista apoiar a 32.ª edição da “…”, realizada na Cidadela de…, de 12 a 15 de Março de 2009, nomeadamente no reforço da Marca …, tanto no plano nacional como internacional, pelo que foi essencial determinar no referido Protocolo que a Associação … ficaria responsável pela organização em cada evento de uma viagem de jornalistas estrangeiros, com vista à divulgação dos eventos e à promoção do concelho de … .  

Para a Requerente, não será de aceitar o entendimento da AT de que não ficou provada a indispensabilidade dos gastos associados a esta iniciativa para a obtenção de rendimentos sujeitos a imposto, nos termos do artigo 23.º do CIRC, uma vez que não foi feita prova da emissão de facturação a terceiros, em resultado dos gastos incorridos pela Requerente para financiamento da realização do evento, uma vez que a noção legal de indispensabilidade deverá recortar-se sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro, pelo que os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa, ou melhor, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo.

            A Requerida sustenta que não obstante a Requerente alegar que os custos estão associados à sua participação na 32.ª edição do evento “…”, realizado na Cidadela de…, tendo atribuído o montante de € 300.000,00 conforme o previsto no n.º 2, da Cláusula Terceira, do Protocolo de cooperação celebrado no dia 18 de Setembro de 2007, entre o Município de …, a Requerente e aquela associação, nos termos do qual ficou acordado que o evento … seria realizado, nos anos de 2007, 2008 e 2009, no Concelho de … e que, estando ligada ao sector turístico, verifica-se que a 32.ª Edição da … decorreu entre os dias 12 a 15 de Março de 2009, na Cidadela de …, pelo que não foi utilizado nenhum dos espaços explorados (directa ou indirectamente) pela Requerente e que, compulsado o referido Protocolo, verifica-se que os seus outorgantes são o Município de … com o NIPC…, a Associação … com o NIPC … e a Junta de Turismo da … com o NIPC …  e não a Requerente, tendo recaído sobre a Junta de Turismo da … a obrigação de atribuir àquela associação o montante de € 300.000,00, nos termos do referido n.º 2, da Cláusula Terceira, do Protocolo.

Refere ainda a Requerida que, como reconhece a Requerente na sua petição, esta acção teve subjacente a promoção e desenvolvimento turístico do concelho de …, uma das actividades que constituem o seu objecto social, não sendo conhecido, contudo, qualquer rendimento sujeito a imposto associado a este gasto, sendo que, em termos empresariais, seria expectável que esse rendimento lhe viesse atribuído pela CM … .

Apreciando.

Constituindo o objecto social da Requerente a promoção, realização e desenvolvimento de actividades nos domínios do desenvolvimento turístico, turístico cultural e da prática desportiva no concelho de …, as faturas n.ºs 46, de 02-09-2009 e 54, de 23-10-2009, nos montantes de € 250.000,00 € e € 6.500,00, respetivamente, emitidas de acordo com o n.º 2 da cláusula 3.ª do Protocolo Realização de Edições da “…” em …– 2007, 2008 e 2009, celebrado em 18-09-2007 (doc. n.º 11), tiveram em vista apoiar a 32.ª edição da “…”, realizada na Cidadela de …, de 12 a 15 de Março de 2009, visando no reforço da Marca … e do concelho de…, tanto no plano nacional como internacional.

Assim os referidos gastos, à luz dos critérios legais aplicáveis e reconhecidos como tal pelas partes, deverão considerar-se comprovadamente indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora da Requerente, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.

Não infirmam tais conclusões as circunstâncias mencionadas no RIT, e nas quais se fundaram as correcções ora em questão, designadamente que:

a.       que não foi utilizado nenhum dos espaços explorados (directa ou indirectamente) pela Requerente;

b.      o referido Protocolo, verifica-se que os seus outorgantes são o Município de … com o NIPC…, a Associação … com o NIPC … e a Junta de Turismo da … com o NIPC … e não a Requerente.

Quanto à primeira das questões referidas, a mesma é totalmente irrelevante para o juízo de dedutibilidade em causa, já que, desde que apropriada à prossecução dos seus objectivos empresariais, a Requerente era livre de escolher as instalações que entendesse apropriadas para as actividades a realizar, sendo certo que, de parte alguma, resulta que as instalações próprias da Requerente tivessem as mesmas características e servissem exactamente nos mesmos termos para a actividade ora em apreço.

Quanto à segunda das questões referidas, não teve – e deveria ter – a AT considerado que a Junta de Turismo … foi extinta pelo Decreto-Lei 67/2008 de 10 de Abril de 2008 (cfr. artigo 19.º/1), tendo o Protocolo em referência sido celebrado ainda no período de existência daquela, e que a Requerente lhe sucedeu numa série de actividades que anteriormente eram afectas àquela, entre as quais a realização do protocolo em questão.

De resto, a AT não coloca em causa nem a realização do evento, nem o enquadramento deste na actividade normal da Requerente, nem o valor da contraprestação pela utilização das instalações, nem o seu efectivo pagamento, pelo que razão alguma haverá, atento o erro de facto, e, consequentemente, de direito, para manter a correcção em apreço, devendo por isso, nesta parte, o pedido arbitral proceder.

*

No que diz respeito às correcções relativas a gastos com artigos para oferta a clientes (cartões oferta, brinquedos, vinhos e cabazes de natal), no montante de € 5.401.63, alega a Requerente que se encontram verificados todos os pressupostos para que seja atribuída relevância fiscal aos custos em causa, devendo a correcção ser anulada em conformidade, porque violadora do disposto no artigo 23.º do CIRC, enquanto a Requerida sustenta que a Requerente não provou a indispensabilidade bem como a finalidade dos gastos suportados, nem sequer a identificação dos beneficiários das ofertas, pelo que, face ao disposto no artigo 23.º do CIRC, deverão os mesmos ser desconsiderados como custos.

            Em causa, a este respeito, estão as seguintes situações:

 

 

            Nesta matéria, como sustenta a AT, verifica-se que a Requerente não só não provou a indispensabilidade e finalidade dos gastos suportados, como não identificou os beneficiários das ofertas.

            É certo que a experiência e a normalidade das coisas evidencia que num largo número de empresas se verifica a oferta de cabazes de Natal e outras ofertas aos seus clientes ou fornecedores (e mesmo a colaboradores), sendo que, tendo em conta a actividade em concreto da Requerente, que envolve a realização de vários eventos promocionais, se poderia assumir que os gastos em questão se destinam a clientes/fornecedores/colaboradores.

            No entanto, nada a este respeito é alegado, e muito menos provado pela Requerente, que se limita a afirmar “que se encontram verificados todos os pressupostos para que seja atribuída relevância fiscal aos custos em causa”, quando poderia, e devia, mesmo com base em documentos internos, assegurar um mínimo de elementos que facultasse um controle com a necessária segurança do destino dos gastos incorridos.

            Note-se, aliás, que estando em causa algumas situações de cheques-oferta (cartões-oferta; cartões-brinde), nos encontramos já numa situação de analogia muito próxima, com uma outra situação abundantemente tratada pela jurisprudência do STA, relativa aos chamados “cheques-auto”[9].

Assim, face ao disposto no artigo 23.º do CIRC, não poderão os custos em questão ser considerados, como julgou a AT, devendo nesta parte o pedido arbitral improceder.

*

Contesta, também, a Requerente as correcções operadas no exercício em causa, relativas a gastos com acerto IVA pro-rata a 31-12-2009 (53% - 13% = 40%) efetuado nos termos do artigo 23.º/6 do CIVA, no montante de € 20 000,00 (artigo 23.º/1 do CIRC).

A este propósito, sustenta a Requerente que sendo dedutível o valor das facturas n.ºs 46, de 02-09-2009 e 54, de 23-10-2009, nos montantes de € 250 000,00 e € 6 500,00, respetivamente, a favor de “”, de acordo com o n.º 2 da cláusula 3.ª do Protocolo Realização de Edições da “…” em …– 2007, 2008 e 2009, celebrado em 18-09-2007, tendo em vista apoiar a 32.ª edição da “”, realizada na Cidadela de …de 12 a 15 de Março de 2009, o acerto do pro rata infra calculado, no montante de € 20.000,00, efetuado nos termos do artigo 23.º/6 do CIVA, também deverá ser dedutível:

a.       Factura n.º 46 –€ 125.000,00 x 20% (IVA) = € 25.000,00

                                                                          i.       € 25.000,00 x 13% (pro rata de 87% em 02-09-2009) =

    € 3.250,00

                                                                       ii.       € 25.000,00€ x 53% (pro rata de 47% em 31-12-2009) =

    € 13.250,00

                                                                     iii.       € 13.250,00€ - € 3.250,00€ = € 10.000,00.

b.      Factura n.º 54 –€ 125.000,00 x 20% (IVA) = € 25.000,00

                                                                          i.       € 25.000,00€ x 13% (pro rata de 87% em 02-09-2009) =

    € 3.250,00

                                                                       ii.       € 25.000,00€ x 53% (pro rata de 47% em 31-12-2009) =

    € 13.250,00

                                                                     iii.       € 13.250,00€ - € 3.250,00€ = € 10.000,00

c.       Total: € 10.000,00 + € 10.000,00 = € 20 000,00

Para a AT, como o montante de € 256.500,000, respeitante às facturas n.ºs 46, de 02-09-2009 e 54, de 23-10-2009, emitidas a favor de “…”, foi desconsiderado como custo para efeitos de determinação do resultado tributável da Requerente, uma vez que não ficou provada a sua indispensabilidade para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, como exige o artigo 23.º do CIRC, também o montante correspondente à regularização do IVA a favor do Estado (€ 20.000,00) que a Requerente realizou em 31 de Dezembro de 2009 em cumprimento do disposto pelo n.º 6 do artigo 23.º do CIVA, foi desconsiderado como custo fiscal por não se revelar indispensável para a fonte produtora.

Todavia, face à consideração das faturas n.ºs 46, de 02-09-2009 e 54, de 23-10-2009, nos montantes de € 250.000,00 e € 6.500,00, respectivamente, como gastos para efeitos de IRC, também o acerto pro rata a 31-12-2009, no montante de € 20.000,00, efectuado nos termos do artigo 23.º/6 do CIVA, deverá ser considerado como gasto nos termos da alínea f), n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, devendo, portanto, nesta parte proceder o pedido arbitral.

*

A Requerente contesta também nos autos, as correcções relativas a amortizações não aceites (imobilizado adquirido à EEE…, SA), no montante de € 53.074,63 (artigo 34.º/1-c) do CIRC).

Sustenta a Requerente que, em 16-06-2000, foi celebrado um contrato de sub-cessão de exploração do Centro de Congressos do … entre a Requerente e a EEE…, SA, que foi revogado em 18-12-2006, passando a Requerente a explorar directamente o referido centro de congressos.

De acordo com a alínea b), n.º 1, Cláusula Terceira do referido acordo revogatório, a Requerente obrigou-se a pagar, na data da celebração do mesmo, a quantia de € 309.387,00, a título de compensação pela transferência dos bens e equipamentos da EEE…, SA, os quais foram avaliados nesse montante pela sociedade FFF…, representando deste modo um valor justo.

Assim, as amortizações operadas no exercício em questão (2009), no montante de € 53.074,63, deverão ser fiscalmente aceites, nos termos do artigo 28.º do CIRC, uma vez que foram calculadas sobre o valor de aquisição dos bens do activo imobilizado corpóreo e incorpóreo, no montante de €309.387,00, e não sobre o valor de aquisição de € 228 470,25 constante do balanço da EEE…, SA.

Segundo a Requerida, a Requerente contabilizou como custo para efeitos de determinação do resultado tributável do período de tributação de 2009, a título de amortizações do exercício, o montante total de € 53.074,63, calculado sobre o valor dos bens e equipamentos transferidos do ativo imobilizado corpóreo e incorpóreo da sociedade espanhola EEE…, SA, em 18-12-2006, na sequência do acordo revogatório do contrato efetuado com esta sociedade, em 16 de Junho de 2000, avaliados pela sociedade FFF…, no montante de € 309.387,00. 

Porém, nos termos do ponto um da Cláusula Segunda deste acordo revogatório, a Requerente adquiria o mobiliário e equipamentos pelo valor correspondente ao indicado na Cláusula Terceira, que corresponderia àquele pelo qual os referidos bens estariam contabilizados no balanço da EEE…, SA, ou seja, pelo seu valor líquido contabilístico. Este, face à análise do referido balanço, em 18-12-2006, era de € 39.047,31, sendo de € 228.096,72 o respectivo valor de aquisição.

No entanto, na Cláusula Terceira do mesmo acordo revogatório consta que o montante a pagar a “título de compensação pela transferência” desses bens e equipamentos ascende a € 309.387,00 (acrescida de IVA à taxa legal em vigor), pelo que foi este o valor de aquisição considerado pela Requerente para efeitos de cálculo das amortizações.

Todavia, pela observação das informações constantes do processo e do sistema de informações da AT, apurou-se que o valor de todo o imobilizado corpóreo da sociedade alienante EEE…, SA, à data de 01 de janeiro de 2006, ascendia a € 227.871,72, sendo o seu valor líquido contabilístico de € 53.226,37.

Pela listagem dos bens transacionados, anexa ao acordo revogatório, infere-se que se reporta a diverso equipamento de comunicações (telemóveis, telefax), material informático (hardware: computadores, monitores, impressoras e software diverso …) e mobiliário especifico para o funcionamento de um centro de congressos (mesas, cadeiras, biombos, expositores, carros de transporte, sofás, candeeiros,…), adquiridos principalmente entre 2001 e 2003.

Assim, na data da aquisição (18-12-2006) o imobilizado estaria quase totalmente amortizado.

Decorrido quase um ano de actividade do centro de congressos (2006-01-01 a 2006-12-18), e tendo presente o consequente desgaste quer do mobiliário em uso quer dos equipamentos informáticos cuja desactualização é uma constante, mesmo considerando a aquisição de mesas de conferência em Outubro de 2006 que se traduziu num acréscimo no valor bruto do imobilizado corpóreo de € 227.871,72 para € 228.096,72 €, é para a AT economicamente inexplicável que o alegado justo valor deste imobilizado (€ 309.387,00) seja oito vezes superior ao seu valor líquido contabilístico (€ 39.047,31) com a agravante deste valor contradizer também o acordado entre as partes no ponto um da Cláusula Segunda do Acordo Revogatório.

Fiscalmente, para efeitos de cálculo das quotas máximas de amortização, os elementos do activo devem estar valorizados segundo as premissas previstas no artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro de 2009 e n.º 1 do artigo 30.º do CIRC, não constando a avaliação pelo justo valor como base para efeitos de aplicação das taxas de reintegração e amortização.

Pelo que, conclui a AT, será de manter a decisão da reclamação graciosa, ou seja, manter a correcção efectuada pelos Serviços de Inspeção relativa à desconsideração como custo fiscal do montante de € 53.074,63 relativo a amortizações praticadas sobre o montante € 309.387,00 € nos termos do artigo 33.º, n.º 1, al. c) do CIRC.

Apreciando.

Nos termos da alínea a), n.º 1, artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de janeiro (norma aplicável ao exercício de 2009), para efeitos de cálculo das respectivas reintegrações e amortizações, os elementos do activo imobilizado devem ser valorizados com base no custo de aquisição ou custo de produção, consoante se trate, respectivamente, de elementos adquiridos a terceiros a título oneroso ou de elementos fabricados ou construídos pela própria empresa.

O custo de aquisição de um elemento do activo imobilizado é o respetivo preço de compra, acrescido dos gastos acessórios suportados até à sua entrada em funcionamento, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do referido diploma.

Relativamente aos bens adquiridos em estado de uso, as taxas de reintegração e amortização são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada, o qual pode ser corrigido quando se considere que é inferior ao que objectivamente deveria ter sido estimado, sendo que quando for conhecido o ano em que pela primeira vez tiverem entrado em funcionamento, o período de utilidade esperada não pode ser inferior à diferença entre o período mínimo de vida útil do mesmo elemento em estado de novo e o número de anos de utilização já decorrido (cfr. alínea a), n.ºs 2 e 4 do artigo 5.º do mesmo diploma).

Também o n.º 5 do artigo 30.º do CIRC (redacção ao tempo dos factos) refere que, para os bens adquiridos em estado de uso, as taxas de reintegração são calculadas, pelo método das quotas constantes, com base no período de utilidade esperada, sendo que, como refere a alínea a), n.º 1 do mesmo artigo, a quota anual de reintegração e amortização que pode ser aceite como custo do exercício determina-se com base no custo de aquisição dos bens.  

Deste modo, considerando que os referidos bens foram adquiridos por € 309.387,00, como consta da Cláusula Terceira do acordo revogatório, de 18-12-2006, do contrato de sub-cessão de exploração do Centro de Congressos do … entre a Requerente e a EEE…, SA, sendo este o valor sobre o qual foram calculadas as amortizações, no montante de € 53.074,63, deverão ser fiscalmente aceites, nos termos da alínea g), n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.

Com efeito, como é hoje entendimento corrente, e como se escreveu no Ac. do STA de 23-09-2015, proferido no processo 0134/11[10], “É exclusivamente à luz da fundamentação externada pela AT quando da prática da liquidação adicional de IVA que deve aferir-se a legalidade desse acto tributário”.

            Ora, o fundamento da correcção em causa é – estritamente – a circunstância de a AT considerar o valor de aquisição exagerado e o entendimento de que o justo valor não é critério para base do cálculo de amortizações.

            Em relação à referida circunstância, o certo é que a AT – eventualmente desconfiando – não sugere, nem muito menos prova que o valor em questão seja simulado, ou por qualquer outra forma, fraudulento, sendo certo que, como é evidente, a lei fiscal não impõe aos contribuintes que realizem apenas bons negócios, nem os proíbe de realizar maus negócios.

            Quanto ao entendimento referido em segundo lugar, o certo é que a Requerente não utilizou o critério do justo valor como base das amortizações que contabilizou. A Requerente solicitou a terceiro uma avaliação dos bens de acordo com um critério de justiça/equidade, e aceitou adquiri-los por esse valor, tendo sido precisamente tal valor, o de aquisição, em conformidade, como se viu, com as normas legais aplicáveis, que ficou subjacente às amortizações desconsideradas, que, na falta de qualquer indício de fraude, não poderão julgar legais.

            Deste modo, pelo exposto, também nesta parte, deve proceder o pedido arbitral.

*

Questiona igualmente a Requerente, a correcção relativa aos juros indemnizatórios pagos à GGG…, no montante de € 3 499,50 (art. 45.º/1-g) do CIRC).

Afirma a Requerente que não corresponde à verdade que os custos em que incorreu com o pagamento de juros não se encontrem suficientemente documentados, considerando que a AT se encontra na posse de todos os elementos necessários a retirar tal conclusão.

Para a Requerida a assunção da dívida pela Requerente não teve subjacente qualquer fornecimento de bens e/ou serviços à mesma pela GGG…, não se referindo a gastos comprovadamente indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Considera este encargo uma liberalidade que não logra passar sequer o teste da respetiva indispensabilidade, pelo que, tal como a assunção da dívida, também o pagamento dos juros indemnizatórios em apreço não deverão ser aceites como custo para efeitos fiscais.

Ou seja, para a Requerida nunca foram apresentados os elementos de prova que permitam à AT aferir da legalidade, veracidade e indispensabilidade do gasto considerado para efeitos de determinação do resultado tributável do período de tributação de 2009, pelo que, nos termos do artigo 45.º n.º 1 al. g) do CIRC, não serão dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável os encargos não devidamente documentados, mesmo quando contabilizados como gastos do período de tributação.

Por outro lado, alerta a Requerida que o objecto social da ora Requerente não se reconduz à assunção de dívidas e de obrigações por conta de terceiros, sem quaisquer contrapartidas, pelo que tal assunção corresponde a um acto ilegal, por contrário ao escopo empresarial, ou seja, ao lucro, razão pela qual não podem ser fiscalmente dedutíveis.

Apreciando.

A assunção da dívida da EEE…, SA, relativa ao pagamento de juros indemnizatórios à GGG…, emerge, conforme resulta dos factos provados, do processo de viabilização da exploração do Centro de Congressos (face à existência de uma providência cautelar por esta requerida), por parte da Requerente, actividade que, notoriamente, integra o seu objecto social e é adequada à prossecução da sua actividade sujeita a imposto, pelo que deverá, deste modo ser considerado um gasto comprovadamente indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, com enquadramento no n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.

Assim, também nesta parte, deverá proceder o pedido arbitral.

*

Pede também a Requerente na presente acção que seja anulada a correcção relativa a gastos com IVA pro rata (13%) efectuada nas notas de crédito, nos termos do artigo 23.º/1/b) do CIVA, no montante de € 7.908,74 (artigos 23.º/1 e 45.º/1/c) do CIRC), sustentando que os gastos respeitantes à percentagem provisória (13%) do IVA incidente sobre as notas de crédito, no montante de € 7.908,74, são dedutíveis nos termos do artigo 23.º, n.º 1, alínea f) do CIRC.

            Para a Requerida, contabilisticamente, o registo da regularização de IVA a favor do sujeito passivo decorrente da rectificação de facturas emitidas a clientes, efectuada ao abrigo do disposto pelo art.º 78.º do CIVA, não se traduz em qualquer custo, sendo movimentadas somente contas de terceiros (24341 e contas da classe 2, nomeadamente 211).

Assim, para a AT, a consideração como custo do montante em causa (€ 7.908,74) resultante de errónea aplicação dos normativos tributários e contabilísticos, além de constituir clara violação do disposto pelo artigo 23.º do CIRC por não cumprir com os requisitos de indispensabilidade exigíveis naquele normativo, também não é dedutível para efeito de determinação do lucro tributável nos termos c) do nº 1 do artigo 45.º do CIRC.

Assistirá, nesta parte, razão à Requerida. Com efeito, refere o n.º 2 do artigo 78.º do CIVA que:

«Se, depois de efectuado o registo referido no artigo 45.º, for anulada a operação ou reduzido o seu valor tributável em consequência de invalidade, resolução, rescisão ou redução do contrato, pela devolução de mercadorias ou pela concessão de abatimentos ou descontos, o fornecedor do bem ou prestador do serviço pode efectuar a dedução do correspondente imposto até ao final do período de imposto seguinte àquele em que se verificarem as circunstâncias que determinaram a anulação da liquidação ou a redução do seu valor tributável».

Refere ainda o n.º 5 do mesmo preceito legal:

«Quando o valor tributável de uma operação ou o respectivo imposto sofrerem rectificação para menos, a regularização a favor do sujeito passivo só pode ser efectuada quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da rectificação ou de que foi reembolsado do imposto, sem o que se considera indevida a respectiva dedução».

Como aponta a Requerida, e muito bem, «Sendo o IVA um imposto que incide sobre operações com terceiros não é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável, mesmo quando contabilizado como gasto do período de tributação, por imposição da alínea a) do n.º 1 do artigo 45.º do CIRC».

            Efectivamente, o que está em causa é a regularização a favor do sujeito passivo (Requerente) de IVA anteriormente liquidado em facturas por si emitidas, a qual não tem (ou não deveria ter tido, neste caso) qualquer impacto em resultados.

Não estará, aqui, em causa IVA suportado pela Requerente, mas sim IVA a recuperar do Estado em consequência da emissão de notas de crédito, das quais resulta uma correcção ao imposto anteriormente liquidado pela Requerente sobre os serviços por ela prestados (ou vendas por ela efectuadas) a terceiros. Nas circunstâncias, o IVA é integralmente recuperável (dedutível), não havendo qualquer correcção a considerar em termos de pro rata.

Com efeito:    

(i)                 O efeito (pro rata) invocado pela Requerente tem relevância em conta de resultados quanto ao IVA suportado por um sujeito passivo na aquisição de bens e serviços. Efectivamente, um sujeito passivo misto em IVA (e consequentemente, com direito à dedução parcial desse imposto), apenas terá legitimidade para deduzir o IVA por ele suportado na aquisição de bens e serviços em função da sua taxa de pro rata, sendo a parte do IVA não recuperável imputável ao custo de aquisição da operação subjacente (prestação de serviços ou bem adquirido);

(ii)              O que está aqui em causa não é IVA suportado na aquisição de bens ou serviços, mas sim uma regularização do imposto anteriormente liquidado pela Requerente a terceiros, por redução (ou anulação) do valor da operação sobre a qual recaiu esse IVA.

(iii)            Verificando-se uma redução do valor tributável de uma operação, sobre a qual tenha incidido IVA, o fornecedor poderá recuperar, nos termos e condições legalmente previstos, o IVA anteriormente entregue ao Estado que se mostre em excesso ao que se mostraria devido face ao valor final da operação.

Ou seja, assumindo que uma determinada entidade (p. ex. a Requerente) liquidou 23% de IVA sobre serviços prestados a uma entidade terceira com um valor tributável de € 100.000,00, o IVA por ela liquidado (e devido ao Estado) sobre esta operação foi de € 23.000,00.

Se, por algum motivo, o valor que havia sido praticado sofrer uma redução para menos, dando origem à emissão da respetiva nota de crédito, sendo essa nota de crédito emitida com IVA, o imposto nela incluído pode ser objecto de regularização a favor do sujeito passivo, em sede dos mecanismos de funcionamento próprios daquele imposto.

Assim, assumindo que o valor inicialmente debitado pela Requerente na prestação de serviços anteriormente referida veio a ser posteriormente reduzido em € 20.000,00, dando origem à emissão de uma nota de crédito com IVA (de € 4.600,00) a Requerente teria o direito à recuperação integral desse imposto (cabendo à contraparte na operação proceder à regularização a favor do Estado que se mostrasse devida).

Em termos contabilísticos teríamos a seguinte situação na esfera da Requerente:

(i)                 Valores inicialmente contratados:

 

Débito

Crédito

Valor

Valor do serviço prestado

 

#72 (conta de resultados)

100.000

Valor a receber do cliente

# 21 (ativo)

 

123.000

IVA liquidado

 

#24 (passivo)

23.000

 

(ii)              Emissão da nota de crédito

 

Débito

Crédito

Valor

Valor do serviço prestado

#72 (conta de resultados)

 

20.000

Valor a devolver ao cliente

 

# 21 (ativo)

24.600

IVA a recuperar

#24 (passivo)

 

4.600

Não há, assim, qualquer efeito em contas de resultados nem o valor a recuperar do Estado é influenciado pelo pro rata.

Em suma, contabilisticamente, o registo da regularização de IVA a favor do sujeito passivo decorrente da rectificação de facturas emitidas a clientes efectuada ao abrigo do disposto pelo art.º 78.º do CIVA não se traduz em qualquer custo sendo movimentadas somente contas de terceiros (24341 e contas da classe 2, nomeadamente 211).

            Deverá nesta parte, pelo exposto, improceder o pedido arbitral.

*

Impugna também a Requerente as correcções operadas pela AT, relativas a encargos indevidamente documentados, no montante de € 1.882,00 (artigo 45.º/1/g) do CIRC), referindo que a maioria dos gastos em causa estão relacionados com serviços prestados por agrupamentos associativos, desprovidos de infra-estruturas ou serviços de apoio contabilístico e fiscal, pelo que sempre seria impossível, à partida, que os documentos em causa fossem emitidos sem qualquer tipo de irregularidade.

            A Requerida, por seu lado, sustenta que foram detectados alguns custos suportados pela Requerente, referentes a actuações de ranchos folclóricos, refeições e prestações de serviços de tradução, tendo os Serviços de Inspeção concluído que os documentos de suporte apresentavam diversas irregularidades que, além de impedirem a avaliação da indispensabilidade nos termos do disposto pelo art.º 23.º do CIRC, também não estariam devidamente documentados, não sendo dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável nos termos g) do nº 1 do artigo 45.º do CIRC.

Os documentos em questão foram juntos ao processo como documentos os n.ºs 13 a 19.

Relativamente a este último, no montante de € 480,00, já havia sido deferida a pretensão da sua dedutibilidade por despacho proferido no recurso hierárquico interposto.

Analisados os restantes documentos, conclui-se que respeitam a contrapartidas financeiras pelas actuações dos grupos de dança (Associação HHH…, JJJ…, KKK… e Grupo LLL…) na 46.ª edição da Feira Internacional de Artesanato da … (…), que decorreu entre 2 de Julho a 30 de Agosto de 2009 junto ao Centro de Congressos do … e ao X… .

Para além disso, verifica-se da referida documentação:

                                                                          i.            Documento n.º 13, no montante de € 250,00 - Não indica o NIPC do destinatário do serviço;

                                                                       ii.            Documento n.º 14, no montante de € 82,00 - Não indica o nome e NIPC do destinatário do serviço;

                                                                     iii.            Documento n.º 15, no montante de € 500,00 - Formalmente correcto;

                                                                      iv.            Documento n.º 16, no montante de € 300,00 - Não indica o NIPC do destinatário do serviço;

                                                                        v.            Documento n.º 17, no montante de € 500,00 - Não indica o NIPC do prestador do serviço; e

                                                                      vi.            Documento n.º 18, no montante de € 250,00 - Não indica o NIPC do destinatário do serviço.

A propósito desta matéria, note-se que à data dos factos (exercício de 2009) o n.º 1 do artigo 23.º do CIRC apenas considerava gastos os que comprovadamente fossem indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, sem enunciar os elementos que deveriam constar dos documentos, muito embora o n.º 5 do artigo 36.º do CIVA já previsse alguns que, com a alteração do n.º 4 do referido artigo 23.º do CIRC, operada pelo artigo 2.º da Lei n.º 2/2014, de 16-01, aplicável a partir de 01-01-2014, passaram a constar, também, para efeitos de IRC (nome ou denominação social do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário; Números de identificação fiscal do fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e do adquirente ou destinatário, sempre que se tratassem de entidades com residência ou estabelecimento estável no território nacional; quantidade e denominação usual dos bens adquiridos ou dos serviços prestados; valor da contraprestação, designadamente o preço; e data em que os bens foram adquiridos ou em que os serviços foram realizados).

Como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 21-05-2015, proferido no processo 07833/14[11]:

“I. Os encargos para serem fiscalmente dedutíveis têm de estar devidamente justificados por meio de documento (alínea g) do n.º 1 do art. 42.º do CIRC);

II. O CIRC não estabelece qualquer definição do conceito de “devidamente documentado” ao contrário do que sucede em sede de IVA em que se estabelece a obrigatoriedade de emissão de factura (art. 29.º, 1, alínea b) do CIVA) com as formalidades previstas no n.º 5 do art. 36.º do CIVA;

III. Deste modo, em sede de IRC, o documento justificativo do gasto para efeitos do art. 42.º, n.º 1, alínea g) do CIRC não tem de assumir as formalidades previstas para as facturas em sede de IVA;

IV. Os encargos estão devidamente documentados quando contenham os elementos essenciais da operação que titulam, por forma a possibilitar à AT quer ao controle da legalidade da dedução para efeitos fiscais do gasto, quer da respectiva tributação dos montantes auferidos pelos prestadores de serviços.”

No caso, considerando todos os elementos facultados à AT, crê-se que lhe foi, suficientemente, possibilitado o controle quer da legalidade da dedução para efeitos fiscais do gasto, quer da respectiva tributação dos montantes auferidos pelos prestadores de serviços

Assim, para efeitos do disposto no artigo 23.º/1 do CIRC (redação à data dos factos), apenas o documento n.º 14, no montante de € 82,00, não comprova o gasto incorrido, pelo que, nesta parte, o pedido deverá ser parcialmente deferido no montante de € 1.800,00.

*

            Não se conforma, também, a Requerente com a correcção operada pela AT relativa à regularização de IVA incidente sobre as notas de crédito por si emitidas na proporção de 87%, por aplicação do artigo 23.° do CIVA, tendo reconhecido a diferença de 13% como gasto do exercício, no montante de € 24.334,58 (artigos 23.º/1 e 45.º/1/c) do CIRC), entendendo a Requerente, que o referido montante de € 24.334,58 é dedutível nos termos do artigo 23.º/1/f) do CIRC.

A Requerida, por seu lado, sustenta que, contabilisticamente, o registo da regularização de IVA a favor do sujeito passivo decorrente da rectificação de facturas emitidas a clientes, efectuada ao abrigo do disposto no art.º 78.º do CIVA não se traduz em qualquer custo sendo movimentadas somente contas de terceiros (24341 e contas da classe 2, nomeadamente 211), pelo que a consideração como custo do montante em causa (€ 24.334,58) é resultante de errónea aplicação dos normativos tributários e contabilísticos, além de constituir violação do disposto no art.º 23.º do CIRC por não cumprir com os requisitos de indispensabilidade exigíveis naquele normativo, e também não ser dedutível para efeito de determinação do lucro tributável, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 45.º do CIRC.

Pelas razões atrás apontadas na desconsideração do IVA suportado nas notas de crédito antes referidas, também a respetiva regularização, no montante de € 24.334,58, efetuada de acordo com o art.º 78.º do CIVA, não poderá ser dedutível nos termos da alínea c), n.º 1 do artigo 45.º do CIRC.

Efectivamente, como atrás se demonstrou, das reduções verificadas quanto ao valor tributável duma operação por emissão de notas de crédito, não decorre qualquer efeito em termos de pro rata, já que contabilisticamente o registo da regularização de IVA a favor do sujeito passivo decorrente da rectificação de facturas emitidas a clientes efectuada ao abrigo do disposto pelo art.º 78.º do CIVA não se traduz em qualquer custo sendo movimentadas somente contas de terceiros (24341 e contas da classe 2 nomeadamente 211).

            Deverá nesta parte, pelo exposto, improceder o pedido arbitral.

*

Também contesta a Requerente as correções operadas pela AT ao cálculo do imposto no montante de € 434,21 - tributação autónoma das despesas de representação (artigo 88.º/7 do CIRC) -, estando em causa os seguintes encargos:

 

            Sustenta a Requerente que as despesas em questão estão relacionadas com acções de promoção do concelho, desenvolvidas pela Requerente junto de jornalistas estrangeiros, por ocasião de diversos eventos (e.g. o Concurso de…, realizado em 2009), constituindo iniciativas que se integram, efectivamente no objeto da sociedade, conforme decorre do artigo 3.º dos Estatutos, que refere «a sociedade tem por objeto, entre outras atividades, o desenvolvimento de iniciativas de promoção e animação turísticas do Concelho de … e, bem assim, a promoção de concretização da estratégia de desenvolvimento turístico do mesmo concelho».

Para a Requerente, a iniciativa por si promovida traduziu-se na promoção e desenvolvimento turístico do Concelho de…, pelo que tais gastos relevaram-se como indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, ou para a manutenção da fonte produtora, pelo que, deverão ser aceites fiscalmente, ao abrigo do artigo 23.º do CIRC, não constituindo qualquer despesa de representação que importe a tributação autónoma nos termos do artigo 81.º/3/a) do CIRC.

            A Requerida nota que a análise dos documentos de suporte aos custos em questão, indicados no quadro resumo da página 58 do RIT, evidencia que se trata de encargos suportados, relativos a estadias, refeições e viagens (passagens aéreas), cujos beneficiários não pertencem aos quadros da empresa, vindo a Requerente alegar que as despesas em causa foram efectuadas a favor de jornalistas estrangeiros, por ocasião de diversos eventos organizados, ou seja, despesas efetuadas em representação da empresa junto de terceiros, que ascendem ao valor de € 4.342,09 e da consequente tributação autónoma adicional no montante de € 434,21 (10%).

As despesas em questão são distintas das despesas com deslocações e estadas que se referem a despesas com transportes, estadias e refeições, suportadas, por exemplo, com os trabalhadores dependentes da empresa, relativas às deslocações destes para fora do local de trabalho, mediante a apresentação de um documento comprovativo em nome da empresa.

Nos termos do nº 7 do artigo 81.º do CIRC, consideram-se despesas de representação, nomeadamente, as suportadas com refeições, viagens, passeios, e espetáculos oferecidos no país ou no estrangeiro a clientes ou a fornecedores ou ainda a quaisquer outras pessoas ou entidades, pressupondo a prévia confirmação do cumprimento dos pressupostos exigidos pelo art.º 23.º do CIRC sendo, portanto, totalmente dedutíveis para efeitos de determinação do resultado tributável.

Por estas despesas se situarem numa zona cinzenta que separa aquilo que é despesa empresarial (produção) daquilo que é despesa privada (consumo), facilmente desviadas para consumo privado, ou seja de empresarialidade à partida não evidente, o legislador sujeitou-as a Tributação Autónoma.

No caso, não obstante tratarem-se de despesas de representação, ínsitas no n.º 7 do artigo 81.º do CIRC (redação em vigor ao tempo dos factos), e considerando-se possível a Requerente ilidir a presunção de não empresarialidade, deverão as mesmas ser objecto da tributação autónoma prevista na alínea a), n.º 3 do mesmo artigo, já que não se provou, para lá de qualquer dúvida razoável, como ocorrendo em contexto exclusivamente empresarial.

Com efeito, como decorre da conjugação do facto provado sob o ponto 16, com o facto dado como não provado, não é possível, face à prova produzida, concluir que as despesas tituladas pelas facturas em causa, tenham tido uma afectação “estritamente profissional”, pelo que deverá improceder, nesta parte, o pedido de pronúncia arbitral.

 

***

 

Da liquidação de juros compensatórios

Relativamente a esta matéria, sustenta a Requerente que “há um (...) pressuposto legal da liquidação de juros compensatórios não demonstrado pela Administração tributária em matéria de fundamentação do acto tributário de liquidação promovido por esta: o pressuposto, previsto na lei, de que o retardamento da liquidação do imposto se deva a facto imputável ao contribuinte (cf. artigo 35.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária)”, “não fazendo qualquer menção à culpa da REQUERENTE no suposto atraso na liquidação do imposto, e muito menos procedendo à demonstração dessa culpa, impede a REQUERENTE de conhecer, em toda a sua extensão, o porquê do encargo adicional que lhe é imposto, bem como de apreciar a sua legalidade”, já que “dos elementos até à data facultados à REQUERENTE não se vislumbra qualquer referência à existência de culpa imputável, pressuposto fundamental da pretensão de liquidação de juros compensatórios.”, considerando a Requerente que “a Administração tributária se limitou a exigir, de forma automática, juros compensatórios, ultrapassando as formalidades legais estabelecidas para a respectiva liquidação e inquinando, assim, o acto tributário de liquidação de juros compensatórios ora impugnado de vício de forma, por falta de fundamentação”.

Mais sustenta, a este propósito a Requerente que “sempre se deveria reconhecer que o seu comportamento não foi censurável, por se basear numa interpretação mais do que razoável e de boa-fé das leis aplicáveis” e que “dos elementos facultados à REQUERENTE resulta ainda que, em nenhum momento, foi a mesma notificada para se pronunciar, em sede de audiência prévia, sobre o projecto de decisão que em concreto determinou a emissão do acto de liquidação de Juros Compensatórios ora impugnado, pelo que é o mesmo ilegal, por violação do princípio da participação consagrado nos artigo 60° da Lei Geral Tributária e 267.°, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa, devendo ser anulados em conformidade”.

A Requerida sustenta que, no que respeita à taxa, base de cálculo e período de tempo a que se reportam os juros compensatórios, a AT não goza de qualquer margem de manobra, sendo a sua actuação, relativamente àqueles pressupostos estritamente vinculada, o mesmo não ocorre relativamente ao pressuposto da culpa imputável ao sujeito passivo em relação com os juros compensatórios, cuja factualidade em que se há-de radicar só pode ser a mesma em que se estriba o apuramento do imposto considerado em falta, na exata medida em que os juros se integram neste, conforme previsto no artigo 35.º/8 da LGT.

E, segundo a AT, existe culpa sempre que a actuação do sujeito passivo seja subsumível na hipótese de qualquer infração tributária, neste processo consubstanciada pela prática de variadas irregularidades que violam as normas do código do IRC, conforme relatório de inspecção tributária notificado à ora Requerente contendo os fundamentos de facto e de direito, em cumprimento do disposto pelo artigo 77.º da LGT, que estão na origem da liquidação contestada.

Conforme resulta dos factos dados como provados (cfr. ponto 6), das notas de liquidação referentes aos juros compensatórios, consta a sua razão de ser e quantificação, o imposto sobre o qual incidem os juros, o período a que se referem, a taxa de juro aplicável e o valor de juros devido.

Assim, de acordo com a jurisprudência pacífica do STA, “Está cumprido o dever legal de fundamentação se na liquidação de juros compensatórios estão explicitados o motivo da liquidação (ter havido retardamento da liquidação de parte ou da totalidade do imposto, por facto imputável ao sujeito passivo - arts. 89º do CIVA e 35º da LGT) e se constam a indicação do imposto em falta sobre o qual incidem os juros, o período a que se aplica a taxa de juro, a taxa de juro aplicável ao período (feita por remissão para a taxa dos juros legais fixada nos termos do art. 559º nº 1 do CCivil) e o valor dos juros.”[12]

Relativamente à arguida falta de cumprimento do disposto no artigo 60.º da LGT (direito de audição), verifica-se que inexiste no processo qualquer elemento que permita demonstrar tal cumprimento.

De resto, em sede de decisão da reclamação graciosa, onde a Requerente suscitou, desde logo, tal questão, a AT limitou-se a referir o entendimento de que a audiência prévia apenas seria pertinente para efeitos de determinação da imputabilidade da culpa à Requerente, e que tal imputação resulta dos factos tributários apurados em sede de acção inspectiva, pelo que a audiência prévia à liquidação de juros estaria dispensada, face ao disposto no artigo 60.º/3 da LGT.

No entanto, compulsado o relatório final daquela acção inspectiva verifica-se que no mesmo não é feita qualquer menção a juros, pelo que não é possível considerarem-se preenchidos os pressupostos daquela norma da LGT.

Deste modo, face à violação do disposto no artigo 60.º/1/a) da LGT, devem, por vício de forma, ser anuladas as liquidações de juros compensatórios.

 

***

 

d.      Do despacho que negou provimento ao recurso hierárquico.

 

Argui ainda a Requerente a ilegalidade do despacho que negou provimento ao recurso hierárquico, porquanto arrolou, ao abrigo do artigo 72.°, da Lei Geral Tributária, uma testemunha cuja audição se mostrava essencial à correcta decisão do pedido formulado, testemunha essa que não foi ouvida.

            Como explica Carla Castelo Trindade[13], “não são arbitráveis os vícios próprios dos actos de indeferimento de reclamações graciosas e recursos hierárquicos ou de pedidos de revisão oficiosa do acto tributário porque escapam ao âmbito material da arbitragem tributária. Por outras palavras, estes actos de indeferimento só poderão ser “trazidos” para a jurisdição arbitral, na estrita condição de terem, eles próprios, apreciado a (i)legalidade do acto tributário que o sujeito passivo, verdadeira e efectivamente, pretende impugnar pela via arbitral.”. Ou seja, “O objecto do pedido de pronúncia arbitral será, então, a (i)legalidade do acto tributário de primeiro grau, independentemente de o sujeito passivo apontar como objecto da sua acção arbitral este (o acto de primeiro grau), ou o de segundo, isto sempre, desde que o de segundo aprecie a (i)legalidade do acto de primeiro grau.”.

            Sem prejuízo, sempre se dirá que não assiste razão à Requerente já que, não obstante alegar que a audição da testemunha se mostrava essencial à correcta decisão do pedido formulado, não o demonstra, nem demonstrou aquando do requerimento de audição formulado, indicando quais os concretos factos que o depoimento da testemunha se destinava a provar, e qual o modo como os mesmos influenciariam determinantemente a decisão a tomar.

            Assim, e por tudo o exposto, deve improceder, nesta parte, o pedido arbitral.

 

***

 

e.       Da indemnização por garantia indevida

A Requerente formula, ainda, um pedido de indemnização por garantia indevida.

Esta matéria foi objecto já de várias decisões no âmbito da jurisdição arbitral, podendo ver-se, entre outras, a do processo arbitral do CAAD, n.º 1/2013T[14], em termos que ora se transcrevem

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito».

Na autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, proclama-se, como diretriz primacial da instituição da arbitragem como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD e não faça referência a decisões constitutivas (anulatórias) e condenatórias, deverá entender-se, em sintonia com a referida autorização legislativa, que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários em relação aos atos cuja apreciação de legalidade se insere nas suas competências.

Apesar de o processo de impugnação judicial ser essencialmente um processo de mera anulação (arts. 99.º e 124.º do CPPT), pode nele ser proferida condenação da administração tributária no pagamento de juros indemnizatórios e de indemnização por garantia indevida.

Na verdade, apesar de não existir qualquer norma expressa nesse sentido, tem-se vindo pacificamente a entender nos tribunais tributários, desde a entrada em vigor dos códigos da reforma fiscal de 1958-1965, que pode ser cumulado em processo de impugnação judicial pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios com o pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência do ato, por nesses códigos se referir que o direito a juros indemnizatórios surge quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, a administração seja convencida de que houve erro de facto imputável aos serviços. Este regime foi, posteriormente, generalizado no Código de Processo Tributário, que estabeleceu no n.º 1 do seu artigo 24.º que «haverá direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, se determine que houve erro imputável aos serviços», a seguir, na LGT, em cujo artigo 43.º, n.º 1, se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e, finalmente, no CPPT em que se estabeleceu, no n.º 2 do artigo 61.º (a que corresponde o n.º 4 na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Relativamente ao pedido de condenação no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, o artigo 171.º do CPPT, estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».

Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do ato de liquidação.

O pedido de constituição do tribunal arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido artigo 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.

Aliás, a cumulação de pedidos relativos ao mesmo ato tributário está implicitamente pressuposta no artigo 3.º do RJAT, ao falar em «cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes atos», o que deixa perceber que a cumulação de pedidos também é possível relativamente ao mesmo ato tributário e os pedidos de indemnização por juros indemnizatórios e de condenação por garantia indevida são suscetíveis de ser abrangidos por aquela fórmula, pelo que uma interpretação neste sentido tem, pelo menos, o mínimo de correspondência verbal exigido pelo n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil.

O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do artigo 52.º da LGT, que estabelece o seguinte:

Artigo 53.º

Garantia em caso de prestação indevida

              1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objeto a dívida garantida.

              2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

              3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

              4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efetuou.”

No caso em apreço, é manifesto que o erro dos actos de liquidação nas partes ora declaradas ilegais, consubstanciado em liquidações parcialmente praticadas sem suporte num facto tributário pressuposto de imposto e/ou em erro na aplicação do direito, é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, pois a inspeção tributária e a liquidação foram da sua iniciativa e a Requerente em nada contribuiu para que esse erro fosse praticado.

Por isso, a Requerente tem direito a indemnização pela garantia prestada em excesso, relativamente ao montante de imposto ora anulado.

No entanto, não foram alegados e provados os encargos que a Requerente suportou para prestar a garantia bancária, pelo que é inviável fixar aqui a indemnização a que a Requerente tem direito, o que só poderá ser efectuado em execução deste acórdão.

 

*

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar parcialmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

a)      Anular os actos de liquidação de juros compensatórios e de IRC n.º 2013… e n.º 2016…, referentes ao exercício de 2009, na medida em que reflectem as correcções sintetizadas no seguinte quadro:

 

Correções à matéria coletável

Procedente

(€)

Improcedente

(€)

Proveitos não contabilizados destinados ao Plano de Promoção e Animação de 2009

111 885,75

 

111 885,75

0

Proveitos não contabilizados destinados ao … 2007-2009

137 500,00

0

137 500,00

Gastos desconsiderados: Refeições/alojamentos

6 472,32

 

2 722,32

3 750,00

Gastos desconsiderados: Outras Refeições/aloja-

mentos

14 204,55

0

14 204,55

Gastos desconsiderados: Quotizações suplementa- res

241 000,00

172 500,00

68 500,00

Gastos desconsiderados: Reparações viaturas

3 031,39

0

3 031,39

Gastos desconsiderados: Diversos

1 155,45

0

1 155,45

Gastos dispensáveis com apoio à …

256 500,00

256 500,00

0

Gastos com ofertas a clientes

5 401,63

0

5 401,63

Gastos com acerto IVA pró-rata

20 000,00

20 000,00

0

Amortizações não aceites

53 074,63

53 074,63

0

Juros indemnizatórios pagos à GGG…

3 499,50

3 499,50

0

Gastos com IVA (regularização) nas notas de crédito

7 908,74

0

7 908,74

Gastos indevidamente documentados (ranchos)

1 882,00

1 800,00

82,00

Gastos com IVA (regularização) nas notas de crédito

24 334,58

0

24 334,58

SOMA

887 850,54

621 982,20

265 868,34

Tributação autónoma

 434,21

0

434,21

Juros compensatórios

14 403,79

14 403,79

0

TOTAL

902 688,54

636 385,99

266 302,55

 

b)      Condenar a Requerida no pagamento de indemnização por garantia indevida, na parte referente aos montantes correspondentes aos montantes ora anulados, no montante que se vier a demonstrar em execução de sentença;

c)      Julgar improcedentes as restantes partes do pedido arbitral;

d)      Condenar as partes nas custas do processo, na proporção dos respectivos decaimentos, fixando no montante de € 902,70, o valor a cargo da Requerente, e de € 2.157,30, o valor a cargo da Requerida.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 147.166,06, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 3.060,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pelas partes na proporção dos respectivos decaimentos, acima fixada, uma vez que o pedido foi parcialmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa 21 de Dezembro de 2017

 

O Árbitro Presidente

 

 

 

(José Pedro Carvalho)

 

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(Rui Ferreira Rodrigues)

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(José Manuel Parada Ramos)

 

 

 

 

 

 



[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.

[2] Disponível para consulta em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.

[3] Cfr., p. ex., Ac. do STA de 08-06-2011, proferido no processo 068/11.

[4] Ac. do STA de 21-06-2017, proferido no processo 068/17.

[5]os actos de liquidação em questão ocorreram na sequência de acto inspectivo e em conformidade com o relatório de inspecção tributária homologado por despacho. Relatório onde consta que esses actos derivam de correcções aritméticas introduzidas por via da desconsideração das regularizações de IVA levadas a efeito pelo contribuinte (ora recorrente) em diversas declarações periódicas devidamente identificadas, e que decorrem de várias notas de crédito que ela produziu nos anos de 2002 e 2003.

[6]Com efeito, se atentarmos no relatório de inspecção que está subjacente à liquidação adicional impugnada, cujo teor foi dado por reproduzido no probatório fixado, podemos concluir que a AT deu a conhecer ao visado, a aqui Recorrente, as razões que a levaram a proceder à liquidação adicional impugnada.

[7]resulta claro que se o impugnante analisar o conteúdo da liquidação em conjunto com o relatório da inspecção tributária, do qual também tem conhecimento, a fundamentação do acto tributário resulta cristalina, sem ambiguidades, obscuridades, ou qualquer contradição.

[8] Os lançamentos 3 e 56 (n.º de ordem dos lançamentos na referida relação), nos montantes de 500,00 € e 163,80 €, respetivamente, não identificam as matrículas dos veículos.

[9] Cfr., por exemplo, Ac. de 18-10-2010, proferido no processo 018/10, disponível em www.dgsi.pt.

[10] Disponível em www.dgsi.pt.

[11] Disponível em www.dgsi.pt.

[12] Ac. de 09-03-2016, proferido no processo 0805/15.

[13] “Regime Jurídico da Arbitragem Tributária - Anotado”, Almedina, 2014, p.70 e ss.

[14] Disponível em www.caad.org.pt.