Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 732/2016-T
Data da decisão: 2017-04-26  IRC  
Valor do pedido: € 12.089,71
Tema: IRC – Custos não aceites fiscalmente; Custos financeiros não dedutíveis
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

 

1.      RELATÓRIO

 

1.1.  A…, S.A. (Requerente), pessoa colectiva n.º…, com sede na Rua …, n.º…, …, na Amadora, apresentou em 11/12/2016, pedido de pronúncia arbitral, no qual peticiona a anulação do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.º 2016 …, referente ao período de tributação de 2012, da qual resulta o montante a pagar de € 12.089,71 (doze mil oitenta e nove euros e setenta e um cêntimos), a título de imposto e juros compensatórios (cfr. demonstração de compensação n.º 2016 …).

 

1.2.  O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou, em 26/01/2017, como árbitro singular o signatário desta decisão.

 

1.3.  No dia 20/02/2017 ficou constituído o tribunal arbitral.

 

1.4.  Cumprindo-se o disposto no n.º 1 do artigo 17.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) foi a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) notificada, em 20/02/2017, para, querendo, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional.

 

1.5.  Em 22/03/2017 a AT apresentou a resposta, juntando o respectivo relatório de inspecção.

 

1.6.  Em 22/03/2017 o tribunal arbitral decidiu dispensar a realização da reunião a que n.º 1 do artigo 18.º do RJAT se refere, com fundamento no princípio da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, convidando ambas as partes para, querendo, apresentarem alegações escritas facultativas e agendou a data para prolação da decisão final.

 

1.7.  Em 03/04/2017 a Requerente apresentou alegações escritas facultativas, dando por reproduzido tudo o que foi alegado no pedido de pronúncia arbitral.

 

1.8.  Em 24/04/2017 a AT apresentou alegações escritas facultativas.

 

 

2.      SANEAMENTO

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, não ocorrendo vícios de patrocínio.

 

Não existem nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do mérito e de que cumpra oficiosamente conhecer.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral é tempestivo.

 

Verificam-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.

 

 

3.      POSIÇÕES DAS PARTES

 

São duas as posições em confronto, a da Requerente, vertida no pedido de pronúncia arbitral e respectivas nas alegações subsequentes e a da AT na sua resposta.

 

Como fundamento, alega a Requerente, em síntese, que a AT não demonstrou que os financiamentos contratados e que geraram custos financeiros não foram afectos à actividade e à exploração da Requerente, tendo antes sido objecto de operações de financiamento das suas participadas não geradoras de quaisquer proveitos, sendo que tais financiamento não se traduziram, de per se, num acréscimo dos direitos sociais da Requerente nas diversas participadas, dando apenas direito ao respectivo reembolso pelo valor nominal.

 

Conclui a Requerente que conclusões enunciadas pela AT e que estão na base da liquidação de IRC são ilegais por não provadas e fundamentada, por violação do disposto no artigo 23.º do Código do IRC e do princípio da tributação das empresas pelo lucro real e, bem assim, por violação dos artigos 81.º, 87.º e 88.º da Lei Geral Tributária (LGT) porquanto a AT recorreu a métodos presuntivos sem alegar e demonstrar justificação legalmente admissível para tal.

 

Já a AT alega, em síntese, que:

 

a)      Para efeitos de determinação da matéria colectável sujeita a IRC, não é indiferente se um gasto incorrido pela empresa foi praticado no seu interesse ou no interesse de terceiros e, ainda, mesmo quando praticado também no seu interesse o mesmo deve ser-lhe imputável para efeitos do disposto no artigo 23.º do Código do IRC.

 

b)      A Requerente não demonstrou que o empréstimo contraído tenha sido não só, no interesse da sociedade que o contraiu, mas que igualmente tenha tido cabimentação a jusante de acordo com o necessário critério de indispensabilidade nas sociedades participadas.

 

c)      Ao contrário da justificação meramente societária que a Requerente pretende atribuir aos encargos ocorridos com os aludidos financiamentos, entende a AT que estes não se afiguram com um interesse imediato, antes só se compaginando como um reflexo do interesse da sociedade participada.

 

d)      Por outro lado, qualquer cedência gratuita, para efeitos fiscais, é tida como uma doação, a qual está sujeita a Imposto do Selo.

 

e)      Segundo a AT, abrir a porta à dedutibilidade de custos que tiveram como fim a realização de doações é manifestamente desajustado de toda a sistemática do IRC, não sendo acompanhado o custo incorrido do respectivo rédito, contrariando o necessário binómio.

 

f)       Quanto à alegada violação do princípio constitucional da tributação pelo rendimento real, conclui a AT que o acto tributário impugnado não afronta tal princípio, já que o mesmo admite excepções, entre muitas, as limitações à dedutibilidade dos encargos para efeitos fiscais, decorrentes do artigo 23.º do Código do IRC.

 

 

4.      MATÉRIA DE FACTO

 

4.1.  FACTOS QUE SE CONSIDERAM PROVADOS

 

Em face dos documentos carreados para o processo, dá-se como provado que:

 

4.1.1.      A Requerente tem por objecto a actividade de comércio por grosso de produtos farmacêuticos.

 

4.1.2.      A coberto da ordem de serviço n.º OI2015…, emitida pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, foi efectuada uma acção de inspecção interna, a qual incidiu sobre o período de tributação de 2012, e teve por fim o controlo do endividamento da Requerente e respectivos gastos / rendimentos financeiros.

 

4.1.3.      No âmbito do referido procedimento, foi efectuada uma correcção ao lucro tributável, no montante de € 239.071,54, relativa à desconsideração da dedução para efeitos fiscais de empréstimos obtidos e créditos concedidos:

 

 

 

4.1.4.      No período de tributação em causa, a Requerente detinha 50% da sociedade B…, Lda., 100% da sociedade C… Lda. e 65% da sociedade espanhola D…, S.L..

 

4.1.5.      Em 22/06/2016 a Requerente exerceu, junto da Direcção de Finanças de Lisboa, o respectivo direito de audição sobre o projecto de decisão.

 

4.1.6.      Através do Ofício n.º…, de 06/07/2016, da Direcção de Finanças de Lisboa, a Requerente foi notificada do relatório de inspecção tributária que deu origem à liquidação adicional de IRC n.º 2016 … e do acto de liquidação de juros compensatórios n.º 2016 …, cuja data limite de pagamento terminou em 14/09/2016.

 

4.1.7.      Em 11/12/2016 a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao processo identificado em epígrafe.

 

 

4.2.  FACTOS QUE NÃO SE CONSIDERAM PROVADOS

 

Não existem factos com relevo para a decisão que não tenham sido dados como provados.

 

 

5.      O DIREITO

 

5.1.  ILEGALIDADE DO ACTO DE LIQUIDAÇÃO

 

No ponto III.1 – “Análise contabilístico-fiscal” do relatório de inspecção tributária, a AT faz o enquadramento da situação financeira da Requerente, identificando e quantificando os financiamentos obtidos e os financiamentos concedidos.

 

Assim, verificou-se que a Requerente registou na conta 25 – “Financiamentos obtidos”, o montante total de € 2.437.991,75, que corresponde ao somatório dos empréstimos bancários (subconta 2511 com um saldo de € 1.601.466,50), com as locações financeiras (subconta 2513 com um saldo de € 167.400,69), com os cartões de crédito (subconta 2514 com um saldo de € 3.164,45) e com o Factoring (subconta 2515 com um saldo de € 665.960,11).

 

 

Na análise à subconta 4113 – “Investimentos Financeiros – Empréstimos concedidos”, a AT constatou que a Requerente concedeu empréstimos à sociedade C…, Lda., detendo 100% da mesma, apresentando em 31/12/2012 um saldo devedor de € 449.869,12.

 

Foram, ainda, concedidos empréstimos às respectivas associadas no valor total de € 114.798,58, sendo o saldo da subconta 412301 –B…, Lda., na qual detém 50%, de € 24.798,58 e o saldo da subconta 412302 –D…, S.L., onde detém 65% de € 90.000.00.

 

Já no ponto III.1.3.2. – “Determinação dos gastos não aceites fiscalmente” do relatório de inspecção tributária, a AT conclui que o montante de € 40.966,03 correspondente a gastos financeiros (juros, despesas bancárias e Imposto do Selo) os quais, em seu entender, não serão aceites fiscalmente como custo ao abrigo do artigo 23.º do Código do IRC.

 

Com efeito, entende a AT, que estes custos correspondem a “(…) gastos que não são fiscalmente dedutíveis nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, na medida em que para o sujeito passivo tais gastos não são indispensáveis à realização dos proveitos sujeitos a imposto nem à manutenção da sua fonte produtora, destinando-se tão só apenas à eventual realização de proveitos ou à manutenção da fonte produtora das suas participadas / subsidiária e só nestas poderiam ser considerados gastos”.

 

Entende, a AT que tais gastos não são dedutíveis porque respeitam a capitais alheios que não foram aplicados na exploração e na actividade da Requerente, tendo antes sido objecto de operações de financiamento das suas participadas não geradoras de quaisquer proveitos, sendo que tais financiamentos não se traduziram, de per se, num acréscimo dos direitos sociais da Requerente nas diversas participadas, dando apenas direito ao respectivo reembolso pelo valor nominal.

 

Não obstante o exposto, a AT não demonstrou que os financiamentos contratados pela Requerente e que geraram os custos financeiros em causa não foram afectos à actividade e, bem assim, à exploração da Requerente.

 

Com efeito, para aferir da dedutibilidade, ou não, dos referidos encargos financeiros, importa determinar a afectação efectiva e concreta dos financiamentos obtidos, ou seja, avaliar o destino ou uso das disponibilidades recebidas e em relação às quais o sujeito passivo pretende deduzir fiscalmente os juros que suportou.

 

Entende o tribunal arbitral que a AT limitou-se a constatar que a Requerente efectuou financiamentos não remunerados às suas participadas e a presumir que os fundos disponibilizados teriam origem em capitais alheios que geraram encargos financeiros para a Requerente.

 

Ora, atento o regime de repartição do ónus da prova, em especial, o disposto no artigo 75.º, n.º 1, da LGT, “presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.”.

 

No entanto, esta presunção é imediatamente afastada pelo n.º 2 do mesmo artigo, caso o sujeito passivo não tenha cumprido com as suas obrigações fiscais, nomeadamente, os deveres de esclarecimento da respectiva situação tributária. [1]

 

Com efeito, competiria à AT alegar e provar factos que permitissem concluir no sentido de que parte dos fundos mutuados à Requerente teriam sido efectivamente utilizados na exploração e na actividade das suas participadas e não da Requerente, uma vez que esta beneficia da presunção legal de veracidade e correcção da sua contabilidade e das declarações de rendimento apresentadas.

 

Conforme referido, está por demonstrar que os capitais alheios não foram utilizados pela Requerente para a realização de proveitos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, demonstração essa que caberia à própria AT.

 

Nesta medida, não poderá ser aceite a correcção efectuada pelo que a liquidação adicional contestada é ilegal, por não comprovada e fundamentada, traduzindo-se na violação do artigo 23.º do Código do IRC.

 

Não obstante, ainda que se pudesse concluir que os fundos mutuados e que geraram encargos para a Requerente foram canalizados, directamente, para as participadas a título gratuito, está também por demonstrar que estes financiamentos não contribuíram para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora da Requerente.

 

De facto, e contrariamente ao que a AT alega, o financiamento das sociedades participadas,

ainda que gratuito, assegurando a estas entidades fundos que, por outra via, poderiam não ser obtidos, permite a manutenção da actividade dessas entidades.

 

Conforme defende Maria dos Prazeres Lousa, no trecho do artigo transcrito pela própria AT no relatório de inspecção tributária, o sujeito passivo “(…) não poderá deduzir, em princípio, a totalidade dos encargos financeiros correspondentes a tais empréstimos”.[2]

 

A Autora condiciona, no entanto, esta conclusão quanto à não dedutibilidade dos encargos financeiros incorridos a um “(…) em princípio (…)”, reconhecendo, naturalmente, que não se está perante uma verdade inquestionável que não possa, caso a caso, ser alvo de excepções em função de elementos concretos e especificidades de cada situação individualmente analisada.

 

Impõe-se, assim, uma análise casuística decorrente da interpretação do próprio Código do

IRC e, em especial, do artigo 23.º do Código do IRC, o qual estabelece como critério delimitador de dedução dos gastos a sua indispensabilidade e a sua conexão com a actividade empresarial do sujeito passivo em concreto.

 

Veja-se, a este respeito, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), de 16/10/2014, Processo n.º 06754/13 [3], onde se conclui que:

 

“É entendimento da jurisprudência e doutrina que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código – cfr. art. 23.º, n.º 1, do CIRC), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica”.

 

Ora, a actividade da Requerente não se esgota no conjunto de operações produtivas ou operacionais, incluindo também o conjunto de operações de investimento ou alienação de activos, a aquisição de participações financeiras e a sua posterior alienação, a aplicação de

liquidez em investimentos, os recebimentos e pagamentos resultantes de rendimentos e gastos operacionais e não operacionais, entre outros.

 

De facto, a actividade empresarial que gera custos dedutíveis traduz-se, assim, no conjunto de operações que tenham como propósito – ainda que, por razões diversas, este possa não ser alcançado – a obtenção de rendimento ou a manutenção da fonte produtora, seja como resultado directo de uma efectiva actividade produtiva e operacional, seja por via da

gestão, administração ou alienação dos seus activos de investimento.

 

É este sentido amplo de actividade empresarial que deverá ser considerado para efeitos de

determinação dos gastos dedutíveis para efeitos do artigo 23.º do Código do IRC.

 

Nesta medida, a dedutibilidade de gastos para efeitos fiscais deverá ser aferida em função da sua conexão com a actividade empresarial do sujeito passivo e com os seus interesses

económicos (que não exclusivamente operacionais e produtivos).

 

 

Ora, no caso de investimento de uma sociedade numa sua participada, o financiamento originado na participante será feito no âmbito da sua actividade empresarial e no seu interesse caso daí decorra uma expectativa de rendimentos futuros dele directamente decorrentes, ou seja, desde que se conclua que, segundo as regras normais de gestão, tais financiamentos contribuam para o incremento da expectativa de benefícios futuros ou para manutenção da fonte produtora (que, neste caso, corresponderá a um activo financeiro) da sociedade participante.

 

Esta conclusão resulta, igualmente, da decisão arbitral proferida no Processo n.º 12/2013-T, na qual se concluiu que:

 

“Uma sociedade pode obter fundos (e pagar juros) e depois entregar esses fundos a uma filial sem qualquer remuneração causal e directa – e ainda assim exercer adequadamente a sua actividade, dentro da sua capacidade e escopo lucrativo: pode efectuar um aumento de capital (art. 25.º do CSC), prestações suplementares ou acessórias sem juros (art. 210.º e 287.º do CSC) ou suprimentos sem juros (art. 243.º do CSC) – e em qualquer desses casos actua totalmente dentro da sua capacidade de exercício e com um ânimo lucrativo e no âmbito da sua actividade”. [4]

 

É, pois, inquestionável que o financiamento não oneroso efectuado em benefício das participadas da Requerente não pode, só por se tratar de uma operação gratuita, levar à

desconsideração como custo fiscal dos eventuais encargos suportados pela Requerente e a ele inerentes, uma vez que poderão ser essenciais para a obtenção de ganhos futuros ou para a manutenção da fonte produtora da sociedade participante.

 

Contrariamente ao que a AT parece considerar, a participada usa fundos que lhe são aportados pela participante para a sua actividade e no seu interesse, mas esses fundos são, também, utilizados no interesse da própria sociedade participante, no contexto de actos normais de gestão e administração dos seus activos que se podem englobar no seu escopo ou propósito lucrativo, uma vez que permitem criar a expectativa de benefícios económicos futuros.

 

Esta conclusão é tanto mais evidente nas situações em que a sociedade participante detém a totalidade do capital social da participada, como se verifica no presente caso em relação à sociedade C… Lda. .

 

Como se conclui, também, na decisão arbitral proferida no processo n.º 585/2014-T, “Nas situações em que a participante detém a totalidade do capital da participada e, por isso, detém total possibilidade de intervir na gestão da participada e assegurar que o investimento é utilizado no seu interesse, o investimento na participada reconduz-se a gestão da participação e consubstancia exercício indireto pela participante da atividade económica que a participada leva a cabo, cujos reflexos positivos ou negativos se acabam por repercutir totalmente na esfera jurídica da participante através da valorização ou desvalorização da sua participação, pelo que os encargos necessários para assegurar o investimento potenciador da obtenção de futuros benefícios enquadram-se no conceito de indispensabilidade económica, com o referido sentido de despesas integralmente efetuadas no interesse da empresa.”. [5]

 

Não obstante, este racional é também aplicável a sociedades participadas relativamente às quais a sociedade participante, não detendo a totalidade do capital, tenha uma participação lhe permita uma posição de controlo.

 

Conforme referido na decisão arbitral citada, “Nos casos em que se está perante uma situação de detenção pela participante de parte do capital da participada, só se pode considerar que os custos são «comprovadamente» indispensáveis, como exige o artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, na redação vigente antes da Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, se estiver assegurada a possibilidade de influência da participante na sociedade participada, pois se essa possibilidade não existir, se o investimento for efetuado sem qualquer possibilidade de a participante influenciar o seu destino, não se poderá considerar assegurado (comprovado) que ele irá ser utilizado no seu interesse.”.

 

Nesta medida, a comprovar-se a influência significativa da participante na gestão da participada, o financiamento desta por aquela será no interesse económico da primeira, inserindo-se no âmbito das operações normais de gestão da participante.

 

Com efeito, esta posição de controlo e capacidade para influenciar a gestão da participada deverá ser determinada, em concreto, tomando por base a relação jurídico-societária existente entre as entidades envolvidas.

 

No caso em apreço, não restam quaisquer dúvidas que, tendo em conta a participação social detida pela Requerente na B…, Lda. (50%) e na sociedade espanhola D…, S.L. (65%), a Requerente exerce uma influência significativa na gestão de ambas as sociedades, para os efeitos que aqui nos interessam, pelo que a cedência gratuita de fundos por parte da Requerente a estas participadas foi feita no seu interesse, correspondendo a um acto de gestão e administração no âmbito da sua capacidade jurídica e integrante da sua actividade empresarial enquanto actividade direcionada para a obtenção de lucro.

 

Por todo o exposto, conclui-se pela ilegalidade da liquidação ora contestada porquanto assenta na recusa da AT de permitir à Requerente a dedução de parte dos encargos financeiros incorridos, em violação do artigo 23.º do Código do IRC.

 

Fica assim prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas pela Requerente, por ter sido declarada a ilegalidade da liquidação supra identificada, por vício substantivo que impede a renovação do acto, assegurando-se eficazmente a tutela dos direitos da Requerente, de harmonia com o preceituado no artigo 124.º do CPPT. [6]

 

 

6.      DECISÃO

 

Com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:

 

a)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, declarar ilegal a liquidação de IRC do ano de 2012, com todas as consequências legais;

 

b)      Julgar procedente o pedido de reconhecimento do direito da Requerente ao pagamento de juros indemnizatórios;

 

c)      Condenar a AT a restituir à Requerente o montante indevidamente pago;

 

d)      Condenar a AT em custas.

 

 

7.      VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em € 12.089,71 (doze mil oitenta e nove euros e setenta e um cêntimo), nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

 

8.      CUSTAS

 

Custas a suportar pela AT, no montante de € 918 (novecentos e dezanove euros), nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, nos termos do n.º 2 do artigo 22.º do RJAT.

 

 

 

Notifique.

Lisboa, 26 de Abril de 2017

 

 

O árbitro,

 

 

(Hélder Filipe Faustino)

 

 

 

 

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 131.º, do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.

 



[1] Conforme apontam José Maria Fernandes Pires (Coordenador), Gonçalo Bulcão, José Ramos Vidal e Maria João Menezes, em anotação ao artigo 75.º da LGT, Nos casos de não colaboração do contribuinte no apuramento da verdade, cessa a preseunção da veracidade da sua declaração e contabilidade. De igual modo, a presunção de verdade não acontece nos casos em que o contribuinte não cumpre os seus deveres de prestação de informações, exceptuando se for legíltima a sua recusa.”, “Lei Geral Tributária Comentada e Anotada”, Almedina, 2015, pág. 821.

[2] “O problema da dedutibilidade dos juros para efeitos da determinação do lucro tributável”, Estudos em Homenagem à Dra. Maria de Lourdes Órfão de Matos Correia e Vale, Lisboa, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal n.º 171, Centro de Estudos Fiscais, 1995.

 

[3] Disponível em www.dgsi.pt.

[4] Disponível em www.caad.org.pt.

[5] Disponível em www.caad.org.pt.

[6] Subsidiariamente aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.