Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 143/2017-T
Data da decisão: 2017-10-20  IRS  
Valor do pedido: € 36.916,54
Tema: IRS - União de facto - identidade de domicílio fiscal - artigo 14º do Código do IRS.
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

I-RELATÓRIO

 

1. A… (doravante designado por Requerente) contribuinte fiscal nº…, residente na Rua …, nº…, …-… … (com as anteriores denominações …, …e …, nº…) apresentou em 24/02/2017, pedido de constituição de tribunal arbitral singular, nos termos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 2º, e artigo 10º, nºs 1 e 2, ambos do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante referido por RJAT), em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por Requerida ou AT), com vista à declaração de nulidade do acto de liquidação de IRS nº 2015… e correspondentes juros compensatórios, com referência ao ano de 2010, que ascendem ao valor global de 36.916,54 €, sendo o montante de 33.395,80 €, correspondente à liquidação impugnada e 3.520,74 € referente aos juros compensatórios.[1]

 

2.O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Singular foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Requerida em 27/02/2017.

 

3.Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, devidamente notificado às partes, nos prazos previstos, foi designado como árbitro o signatário que comunicou àquele Conselho a aceitação do encargo no prazo previsto no artigo 4º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

 

4.Em 14/04/2017 foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11º, nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

5.O Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 09/05/2017, em consonância com a prescrição da alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

6.Devidamente notificada para tanto, em 2017-06-12 a Requerida procedeu à apresentação da sua resposta e à junção do processo administrativo.

 

7.O tribunal solicitou por despachos proferidos em 2017-06-12 e 2017-07-05, informação adicional ao Requerente no sentido de este vir esclarecer e melhor identificar qual a liquidação de IRS subjacente ao seu pedido de constituição de pronúncia arbitral e seu valor, em resultado de divergências nesse sentido suscitadas pela AT no âmbito da sua resposta.

 

8. Em 2017-07-11 o Requerente procedeu aos esclarecimentos, quanto à liquidação em causa e seu valor, suscitados nos despachos supra referenciados.

 

9.Por despacho arbitral datado de 2017-07-11, notificou-se a AT, ao abrigo do exercício do contraditório quanto aos esclarecimentos prestados pelo Requerente, foi dispensada a realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, convidando-se as partes a apresentarem, por escrito as suas alegações tendo-se indicado prazo limite para a prolação da decisão arbitral e sua notificação às partes.

 

10. As partes não procederam à apresentação de alegações escritas.

 

12.A fundamentar o seu pedido, o Requerente, invocou em síntese, e com relevo para o que aqui importa o seguinte (que se menciona maioritariamente por transcrição);

                                                                                                        

12.1.(…) vive em união de facto com B…, NIF…, desde 1991 (cfr. artigo 6º do pedido de pronúncia arbitral),

12.2.a casa de morada de família é desde essa data – e continua a ser - na Avenida …, …, …, … em Lisboa (cfr. artigo 7º do pedido de pronúncia arbitral),

12.3.da referida união nasceram dois filhos, o primeiro C…, NIF…, nascida em 1993.07.05 e em 1997.05.12 nasceu D…, NIF … (cfr. artigo 8º do pedido de pronúncia arbitral),

12.4.todos residentes na mencionada morada de família (cfr. artigo 9º do pedido de pronúncia arbitral),

12.5.(…) desde o exercício de 2003 que o (Requerente) vem apresentando a declaração anual de IRS do casal ao abrigo do regime tributário da união de facto,(cfr. artigo 10º, parte final, do pedido de pronúncia arbitral),

12.6. [ O Requerente] tem associado ao seu número de identificação fiscal a morada de um estabelecimento comercial onde exerce a sua actividade profissional, sito na Rua de …, nº …, na …, concelho de Odivelas, enquanto que, por seu lado , o sujeito passivo B tinha o seu domicílio fiscal declarado na morada comum da família sita na Av. …, em Lisboa,(cfr. artigo 12º do pedido de pronúncia arbitral),

12.7. Tece ainda o Requerente no seu pedido de pronúncia arbitral várias considerações de direito, acerca do domicílio fiscal e do regime de tributação em sede de IRS aplicável aos sujeitos passivos unidos de facto,

12.8. concluindo, como se extrai do seu pedido, pela “ilegalidade da liquidação, determinar-se a sua anulação integral com as demais consequência legais” mais requerendo “a condenação da AT a pagar os custos de uma garantia bancária prestada para suspender a execução fiscal da referida liquidação (…)”

 

13.A AT, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta, pugnando pela inexistência de qualquer ilegalidade relativa à liquidação aqui em crise, concluindo, consequentemente, pela improcedência do pedido formulado pelo Requerente, em consonância, aliás com a posição por si já expressa em sede de reclamação graciosa (no que a este segmento respeita)

 

13.1. alega assim, em brevíssima síntese, em defesa da sua posição, e para o que aqui releva que:

13.2. na origem da liquidação controvertida, respeitante ao exercício de 2010 está a divergência de domicílio fiscal do Requerente e B…, (artigo 5 da resposta).

13.3. uma vez que o Requerente tinha (e ainda tem) o seu domicílio fiscal na Rua de …, nº…, na … (artigo 6 da resposta),

13.4. enquanto, no que se refere a B…, o seu domicílio fiscal constava a 31.12.2010, na Avenida …, nº…, …, ..., em Lisboa (artigo 7 da resposta),

13.5. a identidade de domicílio fiscal de ambos só ocorre em 01/07/2010, quando B… alterou o seu domicílio fiscal para as instalações da referida farmácia, sita na Rua …, nº…, na …(artigo 8 da resposta),

13.6. a AT entende, em cumprimento da legislação em vigor, que a aplicação do regime de tributação previsto no nº 2 do art. 14º do CIRS depende da identidade de domicílio fiscal há mais de dois anos e durante o período de tributação, efectuada atempadamente nos termos do art. 19º da LGT (artigo 31 da resposta),

13.7. tece ainda a AT várias considerações acerca do tema e quadro normativo subjacentes,  para concluir  pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

 

14.As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas (artigos 3º, 6º e 15º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi do artigo 29º, nº 1 alínea a) do RJAT.

 

15.O processo não enferma de quaisquer nulidades, não tendo sido suscitadas quaisquer excepções, inexistindo qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

II- FUNDAMENTAÇÃO

 

A.MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

  1. em 30/09/2011 foi submetida declaração de IRS, modelo 3 em nome do Requerente juntamente com B… NIF … referente ao ano de 2010, na qual foi indicado o estado civil de unidos de facto;

 

  1. no âmbito de divergência D31 (Necessidade de comprovação dos requisitos de união de facto) foi em 20/01/2014 oficiosamente corrigida tal declaração, desconsiderando o estado civil na mesma constante, por não estarem reunidos os requisitos previstos no artigo 14º do CIRS,

 

  1. fazem parte do agregado familiar do Requerente B…, e dois dependentes filhos de ambos, C… NIF nº … (nascida em 15/07/1993) e D…, NIF nº … (nascido em 12/05/1997,

 

  1. em 25/07/2014 o Requerente apresentou reclamação graciosa, solicitando que fosse considerada a união de facto, os seus dois dependentes e despesas com deduções à colecta e prediais,

 

  1. por despacho de 31/12/2014, foi proferido despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa, desconsiderando, todavia, a união de facto do Requerente com a mencionada B…,

 

  1. desde o exercício de 2003 que o (Requerente) vem apresentando a declaração anual de IRS do casal ao abrigo do regime tributário da união de facto,

 

  1. o Requerente tem associado ao seu número de identificação fiscal a morada de um estabelecimento comercial de farmácia onde exerce a sua actividade profissional, sito na Rua …, nº…, na …, concelho de Odivelas, enquanto que, por seu lado, o sujeito passivo B tinha o seu domicílio fiscal declarado na morada comum da família sita na Av. …, em Lisboa,

 

  1. a identidade do domicílio fiscal do Requerente e de B… só ocorreu em 01/07/2010, quando esta alterou a seu domicílio fiscal para as instalações da referida farmácia,

 

  1. em 24/02/2017, o Requerente apresentou junto do CAAD pedido de constituição de tribunal arbitral e pronúncia arbitral, que deu origem ao presente processo.

 

A.2. Factos dados como não provados

 

Não se dá como provado que o Requerente tenha prestado garantia para suspender a execução relativa à liquidação subsequente, inexistindo, com relevo para a decisão quaisquer outros factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto dado como provada e não provada

 

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que pronunciar-se sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão, de discriminar a matéria provada da não provada [( cfr. art. 123º nº 2 do CPPT, e nº 3 do  artigo 607º do Código de Processo Civil, aplicáveis, ex vi do artigo 29º, nº1 alíneas a) e ) do RJAT)].

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções da (s) questão (ões) de direito. (cfr. artigo 596º do CPC, aplicável ex vi do artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).

 

Assim tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do disposto no artigo 110º, nº 7 do CPPT, a prova documental junta aos autos, e o PA anexo, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos supra elencados.

 

Cabendo realçar a convicção deste Tribunal que as divergências entre as partes se circunscrevem a questões essencialmente interpretativas quanto ao quadro normativo que enforma a questão subjacente, evidenciada de resto, pela Requerida, ao afirmar; “Está assim em causa a tributação conjunta ou separada dos rendimentos auferidos por sujeitos passivos que alegadamente vivem em união de facto há mais de dois anos, quando não tenha havida comunicação atempada por parte de um dos membros da união de facto, ou de ambos, da alteração do domicílio para efeitos do disposto no artº 19º da LGT”.

 

B. DO DIREITO

 

A questão central que é objecto do processo a que cabe responder, face à posição e argumentos apresentados pelas partes, reconduz-se em determinar da relevância da identidade do domicílio fiscal dos sujeitos passivos unidos de facto, durante o período legalmente exigido, para efeitos de aplicação do regime tributário em IRS nas mesmas condições dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens.

 

******

 

O quadro normativo, à data dos factos subjacentes, que a questão suscita recorta-se como segue, e no que aqui releva:

 

Artigo 19º da Lei Geral Tributária

 

“1. O domicílio fiscal do sujeito passivo, é, salvo disposição em contrário:

a) Para as pessoas singulares, o local da residência habitual:

(…)

1.É obrigatória, nos termos de lei, a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária.

 

2.É ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária (…)”

 

Por outro lado, determinava o artigo 14º do CIRS (na redacção à data):

 

“1. As pessoas que vivendo em união de facto preencham os pressupostos constantes da lei respectiva, podem optar pelo regime de tributação dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens.

 

2. A aplicação do regime a que se refere o número anterior depende da identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos durante o período exigido pela lei para verificação dos pressupostos da união de facto e durante o período de tributação, bem como da assinatura, por ambos, da respectiva declaração de rendimentos.

 

3. No caso de exercício da opção prevista no nº 1, é aplicável o disposto no nº 2 do artigo 13º, sendo ambos os unidos de facto responsáveis pelos cumprimentos das obrigações tributárias”.

 

Por seu turno há que ter em conta o que dispõe a lei de protecção das uniões de facto – Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, nomeadamente nos seus artigos 1º e 3º:

 

Artigo 1º

“2. A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos”

 

Artigo 3º

“As pessoas que vivem em união de facto nas condições previstas na presente lei têm direito a […]

d) Aplicação do regime do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares nas mesmas condições dos sujeitos passivos casados e não separados judicialmente de pessoas e bens”

 

 

A questão em análise foi já alvo de várias decisões no âmbito da arbitragem tributária, nomeadamente, entre outros, nos processos 11/2017- T de 2017-08-24, 547/2016-T de 2017-04-03, 413/2016-T de 2017-01-10, 773/2015 de 2016-05-03, 564/2015-T de 2016-05-17, 304/2015-T de 2016-01-14, 497/2014-T de 2015-03-06.

 

O último dos citados processos – 497/2014- T, teve por Requerente o mesmo dos presentes autos e por objecto a liquidação relativa ao ano de 2008, em similares pressupostos aos aqui visados.

 

Não se vislumbrando desta forma motivos para dissentir quanto ao que aí foi decido,  subscreve-se com elevado respeito, o que aí vem dito, igualmente por razões atinentes à harmonização de decisões, não deixando contudo de se sinalizar que é convicção do presente Tribunal Arbitral Singular que o Requerente e B…, viviam em 2010, pelo menos há mais de dois anos em condições análogas às dos cônjuges, conjuntamente com os dois filhos de ambos, na casa de morada de família sita à Avenida …, nº…, …, … em Lisboa.

Convicção essa ancorada nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e do processo administrativo anexo, e fundamentalmente pelo facto de se afigurar que a AT não terá posto em causa a indicada localização, identificação da casa de morada de família, onde convivem Requerente, unida de facto e filhos de ambos revestindo, outrossim, o fulcro do seu argumentário, na falta de identidade fiscal do Requerente com a unida de facto.

Parece-nos clara essa intenção ao que discorre do articulado de resposta;

“A questão em análise incide sobre a interpretação do segmento da norma ínsita no nº 2 do artigo 14º do CIRS na parte em que se determina que a aplicação do regime a que se refere o seu nº 1 “depende da identidade de domicílio fiscal dos sujeitos passivos” durante o período de tempo aí mencionado” (artigo 29º da resposta)

 

“ Está assim em causa a tributação conjunta ou separada dos rendimentos auferidos por sujeitos passivos que alegadamente vivem em união de facto há mais de dois anos, quando não tenha havido comunicação atempada por parte de um dos membros de união de facto, ou de ambos, da alteração do domicílio para efeitos do disposto no art. 19º da LGT (artigo 30º da resposta)

 

“A AT entende, em cumprimentos da legislação em vigor, que a aplicação do regime de tributação previsto no nº 2 do art. 14º do CIRS depende da identidade de domicílio fiscal há mais de dois anos e durante o período de tributação, efectuada atempadamente nos termos do art. 19º da LGT” (artigo 31º da resposta)

 

Sustentando ainda a Requerida (artigo 43º da resposta) que: “o estatuto tributário da união de facto incorpora dos seus pressupostos aquisitivos o requisito formal de cumprimentos tempestivo da obrigação declarativa de inscrição ou actualização do domicílio no Registo de Contribuintes, requisito que acresce à identidade de residência habitual, não se bastando, no entanto, com esta”.

Reforçando ainda que: “a exigência de identidade de domicilio fiscal dos sujeitos passivos, durante o período legalmente exigível, enquanto pressuposto formal do estatuto tributário da união de facto, fundamentando-se no dever de actualização de dados dos contribuintes, afigura-se adequada às funções de controlo da Administração Tributária, sem violar os limites impostos pela constituição fiscal, incluindo o princípio da proporcionalidade”.

 

Isto posto,

 

Conforme, e bem, se sinaliza no acórdão arbitral de 24/08/2017, proferido no âmbito do processo nº 11/2017- T, não tem sido este o entendimento da jurisprudência dos tribunais comuns e de várias decisões arbitrais (de entre as quais as supra referidas).

 

  • Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 16-11-2016, relatado pelo Exmo. Senhor Conselheiro Aragão Seia, no âmbito do processo nº 0761/15:

 

O incumprimento do disposto no artigo 14º, nº 2 do CIRS, na redacção em vigor à data dos factos, não impedia os interessados de optar pelo regime da tributação própria dos contribuintes unidos pelo casamento”

 

  • Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 08-10-2015, relatado pela Exma. Senhora Desembargadora Cristina Flora, no âmbito do processo nº 06685/13:

 

“ Nos casos em que o sujeito passivo não cumpriu com a sua obrigação de comunicação da mudança da domicílio fiscal prevista no art. 19º da LGT pode ser demonstrada a sua morada em certo lugar através de “factos justificativos”, e por conseguinte, não obsta ao preenchimento do pressuposto de “habitação permanente” o nº 5 do art.10º do CIRS a não comunicação do domicilio fiscal”

 

  • Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 07-04-2011, relatado pelo Exmo. Senhor Desembargador José Correia, no âmbito do processo nº 04550/11:

 

I. O conceito de domicilio fiscal estatuído no disposto no artigo 19º da LGT, nomeadamente no seu nº 1 é um domicílio especial que se refere a um lugar determinado para o exercício de direitos e cumprimentos dos deveres previstos nas normas tributárias o qual, sendo especial, é independente do estipulado no artigo 82º do C.C., embora ideologicamente e na sua essência o disposto naquele primeiro inciso legal se conecte com a necessidade de o sujeito passivo e a A.F. estarem em contacto sempre que o for necessário para o exercício dos respectivos direito e deveres, em homenagem ao princípio da colaboração ínsito no artº 59º da LGT”


II- O domicílio dos contribuintes pode e deve ser rectificado oficiosamente com base nos elementos que estavam ao dispor da administração tributária em observância do disposto no nº 6 do referido normativo porque se trata exactamente disso: de um poder - dever, destinado antes de mais a proteger a verdade tributária em concretização também do dito princípio da colaboração consagrado no artº 59º da LGT”

 

Perfilhando as decisões arbitrais assinaladas (para além de outras) de entendimento similar ao que vem vertido nas instâncias, não se vislumbrando necessidade de quaisquer outras considerações adicionais, e à semelhança do que vem dito no processo arbitral 11/2017- T aí como no presente, “não se descortinando aqui motivos para dissentir da referida jurisprudência, haverá que concluir não assistir razão à Requerida no entendimento que sustenta, face à matéria de facto dada com provada, e à convicção formada quanto ao  facto de em 2010, os unidos de facto viveram, há pelos menos dois anos, em condições análogas às dos cônjuges.

 

A título de nota final e afigurando-se não ser controverso o facto de em exercícios anteriores ao aqui posto em causa (2010), o Requerente ter apresentado as suas declarações de IRS mencionando como seu domicílio fiscal a referida Rua …, nº…, assinalando, todavia, a sua união de facto com B…, declarações essas que terão sido aceites pela Administração Fiscal, não obstante a inverificação por parte dos unidos de facto de identidade do domicílio fiscal, detectada  e sinalizada tal divergência, não se descortina razão válida para a AT não ter procedido à rectificação oficiosa do domicílio fiscal dos unidos de facto, face ao disposto no então nº 8 (hoje nº 9 face à renumeração produzida pela Lei nº 82-E/2014, de 31 de Dezembro) do artigo 19º da Lei Geral Tributária;

“A administração tributária poderá rectificar oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor”.

 

Assinalando-se ainda que, igual alteração oficiosa igualmente decorre do disposto na alínea a) do nº 3 do artigo 24º do Decreto Lei nº 14/2013, de 28 de Janeiro.

 

III- DECISÃO

 

De harmonia com o exposto, decide este Tribunal Arbitral Singular em:

 

(i). julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral declarando-se a ilegalidade do acto de liquidação de IRS (imposto e juros compensatórios), relativo ao ano de 2010, com o nº  2015…, com os demais efeitos legais, nomeadamente a anulação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa,

 

(ii) condenar a Requerida ao pagamento das custas do processo.

 

 

IV- VALOR DO PROCESSO

 

De conformidade ao estatuído nos artigos 296ç nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 47/2013, de 26 de Junho, 97º- A) nº 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de 36.916,54 €.

 

V- CUSTAS                         

 

Nos termos do disposto nos artigos 12º, nº 2, 22º, nº 4 do RJAT, e artigos 2º e 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e Tabela I a este anexa, fixa-se o montante das custas em 1.836,00 €.

 

NOTIFIQUE-SE

 

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1, alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, com versos em branco, e revisto pelo árbitro.

 

A redacção da presente decisão, rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.

 

Vinte de Outubro de dois mil e dezassete

 

 

O árbitro

 

(José Coutinho Pires)

 

 



[1] Os valores da liquidação e juros, bem como a identificação daquela, diferentes dos referidos no pedido de pronúncia arbitral, resultam de rectificação a que o Requerente procedeu, em resultado de esclarecimento solicitado pelo tribunal.