Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 575/2017-T
Data da decisão: 2018-03-15  IVA  
Valor do pedido: € 56.735,22
Tema: IVA – SGPS - conceito de atividade económica - direito à dedução.
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

            I. RELATÓRIO      

1. No dia 31 de outubro de 2017, a sociedade comercial A…, SGPS, S. A., NIPC…, com sede na …, n.º…, …, Lisboa (doravante, Requerente), apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade e a anulação do ato de liquidação adicional de IVA n.º 2017… e correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2017…, resultante da compensação n.º 2017…, de que resultou o montante total a pagar de € 56.735,22.

A Requerente juntou 16 (dezasseis) documentos, não tendo requerido a produção de quaisquer outras provas. 

É Requerida a AT – Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, Requerida ou AT).

1.1. No essencial, a Requerente alegou o sumariado nas seguintes conclusões que formula, a final, no pedido de pronúncia arbitral:

«A. O Requerente é uma sociedade gestora de participações sociais que, paralelamente à sua atividade, intervém diretamente na gestão das suas participadas, nomeadamente através da prestação de serviços técnicos às mesmas.

B. A sua atividade de gestão das participações sociais do B… e do C… apresenta características particulares, na medida em que resulta de (e está totalmente condicionada a) tratado internacional celebrado entre os Governos de Portugal e do Reino de Espanha.

C. Neste sentido, esta atividade é essencialmente passiva e assume uma natureza meramente residual no cômputo geral das atividades do Requerente.

D. Daí resultando, portanto, que os bens e serviços por si adquiridos respeitam, no essencial, a despesas incorridas para a prossecução e realização dos serviços técnicos – na área dos recursos humanos, secretariado e apoio logístico – que presta às suas participadas, no âmbito da relação contratual que com estas assumiu há vários anos e que continua a honrar numa base contínua e regular.

E. Em sede de inspeção, a AT contestou uma parte significativa do montante de IVA deduzido pelo Requerente em 2013 – cerca de 84% do valor total do campo 24 das suas declarações periódicas desse ano – alegando, sem provar nem fundamentar (ao arrepio do enquadramento legal a que está vinculada), o seu consumo integral e exclusivo na atividade de gestão de participações sociais, a qual não confere direito à dedução por não ser uma atividade económica.

F. Ora, conforme ficou demonstrado supra, bem como na documentação anexa, a dedução de IVA efetuada pelo Requerente quanto a essas despesas encontra pleno acolhimento legal, administrativo e jurisprudencial.    

G. Os Serviços de Inspeção ignoraram o facto de as despesas em causa serem necessárias à realização dos serviços do Requerente às suas participadas, razão pela qual, ao contrário do alegado, o seu consumo não se esgota na atividade de gestão de participações sociais.

H. Considerando, aliás, o tipo de serviços adquiridos – de natureza jurídica, financeira, comercial (marketing) e IT –, bem como o facto de o Requerente não dispor desse tipo de recursos ao nível interno, é facilmente percetível a essencialidade dos mesmos para a prestação de serviços de recursos humanos e similares às participadas.

I. Se, ao invés do cenário atual, o Requerente tivesse internalizado estes recursos (i.e., se tivesse contratado um advogado in-house, bem como um diretor de recursos humanos, ou um informático), os quais seriam, então, responsáveis, a para dos recursos já existentes, pela prestação de serviços às participadas, estamos em crer que a AT não teria suscitado qualquer questão ao nível da dedução de imposto de inputs.

J. Esta diferença de tratamento constitui, no entanto, uma violação do princípio da neutralidade do imposto, porquanto o Requerente não pode ser limitado’ no exercício do seu direito à dedução pelos simples facto de necessitar de recorrer à contratação externa para, juntamente com os seus recursos internos, poder cumprir as obrigações contratuais que acordou com as suas participadas, as quais se consubstanciam na realização de serviços técnicos tributados.

K. Os Serviços de Inspeção incorreram, igualmente, num erro de direito ao ignorar o facto de (i) o Requerente, não obstante a sua natureza de holding, interferir diretamente na gestão das suas participadas, facto comprovado pelos contratos celebrados com estas (juntos a este processo), o que configura uma atividade económica e (ii) de tais custos fazerem parte das despesas gerais do Requerente, sendo componentes do preço dos serviços que fornece a jusante.   

L. Pelo que todo o IVA incorrido pelo Requerente nos serviços por si adquiridos e objeto de correções é plenamente dedutível.

M. Face ao exposto, a liquidação de imposto notificada não pode vingar por ser manifestamente ilegal.»

1.2. A Requerente remata o seu articulado inicial peticionando o seguinte:

«Nestes termos peticiona-se:

  1. Anular a liquidação adicional de IVA n.º 2017 … e respetiva demonstração de acerto de contas materializada na compensação n.º 2017…;
  2. Ordenar a reconstituição plena e imediata da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, conforme resulta do disposto no artigo 100.º da Lei Geral Tributária, nomeadamente ao nível das liquidações adicionais corretivas que foram emitidas para os períodos 03T, 06T e 09T de 2013 e da restituição do montante pago a este título;
  3. Condenar a Fazenda Pública no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data do pagamento das liquidações em causa até à data de processamento da respetiva nota de crédito, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT.»

2. O pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT em 6 de novembro de 2017.

3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral singular, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

3.1. Em 21 de dezembro de 2017, as Partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas b) e c), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

3.2. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 11 de janeiro de 2018.

4. No dia 14 de fevereiro de 2018, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua Resposta na qual impugnou, especificadamente, os argumentos aduzidos pela Requerente, tendo concluído pela improcedência da presente ação.

4.1. No essencial e também de forma breve, importa respigar os argumentos mais relevantes em que a Requerida alicerçou a sua Resposta:

            A Requerida começa por aludir ao invocado vício de falta de fundamentação, afirmando que resulta demonstrado que a Requerente entendeu perfeitamente o sentido e alcance do ato, como resulta do exercício jurídico-argumentativo que faz no presente pedido de pronúncia arbitral, pelo que não ocorre o vício formal de falta de fundamentação quando é manifesto e inquestionável que a Requerente demonstra, ao longo do seu pedido de pronúncia arbitral, uma perfeita compreensão do ato impugnado.

            Ademais, segundo a Requerida, relativamente ao imposto cuja dedução foi aceite, não tendo sido praticado qualquer ato lesivo dos interesses da Requerente, não se tornou necessário fundamentar a sua aceitação, nem a apreciação desse direito à dedução cabe no âmbito destes autos; o quer está sim em causa nestes autos é apreciar se a desconsideração do imposto dedutível, cuja correção a Requerente pretende ver anulada, foi ou não efetuada de forma legal.

            Relativamente à questão de fundo, a Requerida alega que competia à Requerente demonstrar, através da contabilidade bem como dos esclarecimentos prestados em sede de dever de colaboração, o seu direito à dedução e não o tendo logrado fazer, não pôde a Requerida considerar o IVA em causa dedutível; aliás, não é percetível, nem do descritivo das faturas cuja dedução do imposto nelas contido se discute, nem dos esclarecimentos prestados pela Requerente aos SIT, nem dos esclarecimentos trazidos aos presentes autos, a relação de tais inputs com os serviços que a Requerente presta às suas participadas.

            A Requerente procura garantir tal direito à dedução através de uma utilização abusiva do direito à dedução do imposto suportado nas despesas gerais, que se admite quando essas despesas sejam, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta.  

            Ora, os serviços prestados pela Requerente às suas participadas no ano de 2013 totalizaram € 9.429,48, cujo imposto liquidado, à taxa normal, deverá ter correspondido a € 2.168,78.

            Assim, a imputação feita pela Requerente das faturas em apreço a despesas gerais que sejam elementos constitutivos do preço dos serviços que presta, é perfeitamente abusiva, uma vez que pretender fazer crer que inputs com um montante total de € 67.831,52 de IVA suportado, são elementos constitutivos do preço de outputs que totalizariam o montante de € 2.168,78 de IVA liquidado.

            Por isso, ainda que a Requerente pretenda criar a ideia de uma ligação indireta entre tais inputs e a realização daquelas operações, considerando os inputs despesas gerais de funcionamento, não demonstra que os inputs sejam parte constitutiva dos serviços que presta às participadas, o que, aliás, se revela impossível na medida em que o imposto suportado nunca pode ser parte constitutiva de um preço quando essa parte é sensivelmente 30 vezes o todo.

            Acresce que também não se entende como podem os inputs relativos a serviços que as suas participadas lhes prestaram ser parte dos outputs de serviços prestados pela Requerente a essas mesmas participadas.

            Não se comprovando os pressupostos para o exercício do direito à dedução, a Requerente estava obrigada a cumprir o regime-regra, efetuando a liquidação do IVA e suportando-o, como se de um consumidor final se tratasse, em virtude de o input ser efetuado para a realização de operações fora do campo de incidência do imposto.

            Desta forma, as correções devem manter-se, por corresponderem ao correto enquadramento jurídico-tributário das operações em causa.

            Relativamente ao peticionado pagamento de juros indemnizatórios, a Requerida sustenta que não se verificando, nos presentes autos, qualquer erro imputável aos serviços na liquidação do tributo, não deve ser reconhecido à Requerente o direito a juros indemnizatórios.                     

            Tal erro terá necessariamente de implicar a existência de um vício na relação jurídico-tributária, isto é, implicará um juízo sobre o caráter indevido da prestação pecuniária cobrada pela AT, à luz das normas substantivas, ilegalidade essa que terá de ser necessariamente imputável a erro dos serviços

            Ora, a liquidação em causa não provém de qualquer erro dos serviços, decorrendo diretamente da aplicação da lei; com efeito, a AT limitou-se a aplicar as consequências jurídicas que, do ponto de vista fiscal, se impunham face à ocorrência dos pressupostos de facto subjacentes às correções efetuadas, pelo que também deverá ser julgada improcedente a impugnação quanto aos juros peticionados.    

A Requerida remata assim o seu articulado:

            «Nestes termos, e nos demais que V. Exa. doutamente suprirá, deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os atos tributários de liquidação impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.»

4.2. Na mesma ocasião, a Requerida juntou aos autos o respetivo processo administrativo (doravante, abreviadamente designado PA).

5. No dia 15 de fevereiro de 2018, foi proferido despacho a dispensar a realização da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, bem como a estipular o prazo sucessivo de 10 (dez) dias para, querendo, as Partes apresentarem alegações escritas, tendo ainda sido fixado o dia 29 de junho de 2018, como data limite para a prolação da decisão arbitral.

6. Ambas as Partes apresentaram alegações escritas, nas quais reiteraram as posições anteriormente assumidas nos respetivos articulados.     

***

            II. SANEAMENTO

            O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.

O processo não enferma de nulidades.

            As partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias, encontram-se devidamente representadas e são legítimas.

Não existem quaisquer exceções ou questões prévias que obstem ao conhecimento de mérito e de que cumpra conhecer.

***

III. FUNDAMENTAÇÃO                      

III.1. DE FACTO

§1. FACTOS PROVADOS

Consideram-se provados os seguintes factos:

a) A Requerente é uma sociedade anónima constituída em 16 de setembro de 2010 e que iniciou a sua atividade em 20 de setembro de 2010, tendo por objeto social a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indireta de exercício de atividades económicas, encontrando-se inscrita no CAE 64202 (“ACT. SOCIED. GESTORAS PARTICIPAÇÕES SOCIAIS NÃO FINANCEIRAS”). [cf. PA junto aos autos e Doc. n.º 4 anexo à PI]

b) Em sede de IVA, a Requerente encontra-se sujeita a imposto no regime normal com periodicidade trimestral. [cf. PA junto aos autos e Doc. n.º 4 anexo à PI]

c) A Requerente é detentora de participações sociais das empresas gestoras do Mercado Ibérico de Eletricidade (“MIBEL”), o qual resultou de uma iniciativa conjunta dos Governos da República de Portugal e do Reino de Espanha, tendo em vista a construção de um mercado regional de eletricidade na Península Ibérica, tendo para o efeito sido assinados entre 2001 e 2008, pelos dois países, vários protocolos e acordos/tratados internacionais.

d) A implementação do “MIBEL” pressupunha a seguinte estrutura societária, especialmente criada para o efeito:

  • duas entidades gestoras – uma portuguesa, a B…, S. A. (“B…”), e outra espanhola, a C…, S. A. (“C…”) – para gerir os mercados a prazo e diário e intradiário, respetivamente;
  • duas sociedades, uma portuguesa e uma espanhola, gestoras das participações sociais da “B…” e da “C…”.

e) Nesse contexto, em 18 de outubro de 2011, a Requerente, a par da sua congénere espanhola, passou a deter 50% do capital social de cada uma das sociedades gestoras de mercado, ou seja, da “B…” e da “C…”.

f) A especificidade do mercado em causa determina que a Requerente esteja vinculada, por tratado internacional, à manutenção das participações sociais da “B…” e da “C…”, não lhe sendo possível dispor livremente das mesmas.

            g) No ano de 2013, a Requerente detinha as seguintes participações financeiras [cf. PA junto aos autos e Doc. n.º 4 anexo à PI]:

  • 50% do capital social da “B…”;
  • 50% do capital social da “C…”;
  • 50% do capital social da “D…, S. A.”;
  • 10% do capital social da “E…, S. A.”.

h) Atendendo às características próprias do “MIBEL”, que determinam que a carteira de títulos detida pela Requerente não sofra quaisquer alterações – isto é, a Requerente não está autorizada a proceder à compra ou à venda de títulos, como se de uma normal SGPS se tratasse –, a atividade de gestão de participações sociais assume uma natureza meramente residual, porquanto se trata de um ato de detenção de uma carteira de títulos que, por razões legais, deve ser mantida sem qualquer alteração, a qual apenas permite o recebimento de dividendos.

i) A Requerente, para além de deter as aludidas participações sociais, presta serviços técnicos – consubstanciados em assessoria em recursos humanos, secretariado e apoio administrativo –, numa base regular e contínua, a duas entidades do Grupo: a “B…” e a “F…, S. A. (“F…”), por si detida indiretamente, através da “B…”.

j) As mencionadas sociedades participadas são sujeitos passivos de IVA, com direito à dedução.

k) Em 5 de dezembro de 2011, a Requerente celebrou um Contrato de Prestação de Serviços com a “B…” (anexo como Doc. n.º 2 à PI e que aqui se dá por inteiramente reproduzido) nos termos do qual se obrigou a prestar-lhe os seguintes serviços enunciados na respetiva cláusula 1.ª: «Assessoria em recursos humanos, compreendendo todos os serviços inerentes ao funcionamento do departamento de recursos humanos da B…» e «Secretariado e apoio administrativo».

l) A remuneração da Requerente pelos serviços prestados no âmbito daquele contrato ficou estipulada na respetiva cláusula 5.ª e no seu Anexo I, daí resultando o seguinte [cf. Doc. n.º 2 anexo à PI]:

  • A remuneração é fixada no montante anual de € 8.251,05, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, a ser faturado numa base mensal;
  • O referido montante pode ser atualizado, renegociado ou alterado, mediante acordo entre as Partes, designadamente em resultado de acréscimo ou redução do volume dos serviços prestados.

m) Em 4 de dezembro de 2012, a Requerente celebrou um Contrato de Prestação de Serviços com a “F…” (anexo como Doc. n.º 3 à PI e que aqui se dá por inteiramente reproduzido), nos termos do qual se obrigou a prestar-lhe os seguintes serviços enunciados na respetiva cláusula 1.ª: «Assessoria em recursos humanos, compreendendo todos os serviços inerentes ao funcionamento do departamento de recursos humanos da F…» e «Secretariado e apoio administrativo».

n) A remuneração da Requerente pelos serviços prestados no âmbito daquele contrato ficou estipulada na respetiva cláusula 5.ª e no seu Anexo I, daí resultando o seguinte [cf. Doc. n.º 3 anexo à PI]:

  • A remuneração é fixada no montante anual de € 9.429,50, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, a ser faturado numa base mensal;
  • O referido montante pode ser atualizado, renegociado ou alterado, mediante acordo entre as Partes, designadamente em resultado de acréscimo ou redução do volume dos serviços prestados, sem que em caso algum o desvio possa ser superior ou inferior a 10% do preço dos serviços;
  • O preço dos serviços será automaticamente ajustado em função da evolução do Índice de Preços no Consumidor (excluindo habitação), em cada data de aniversário do Contrato, em caso de renovação do mesmo.

o) A Requerente contratou para a realização de tarefas nas áreas de secretariado e apoio administrativo G… e H…, cujos Contratos de Trabalho a Termo Certo, respetivamente celebrados em 2 de novembro de 2010 e em 1 de março de 2013, aqui se dão por inteiramente reproduzidos (cf. Docs. n.ºs 14 e 15 anexos à PI).

p) Em 26 de junho de 2012, a Requerente celebrou um Contrato de Prestação de Serviços com I… (anexo como Doc. n.º 16 à PI e que aqui se dá por inteiramente reproduzido), pelo qual este se obrigou a prestar-lhe os seus serviços profissionais de consultoria e de apoio à gestão, na área dos recursos humanos, mediante o pagamento da quantia mensal ilíquida de € 1.500,00, acrescida de IVA à taxa legal em vigor.

q) Na declaração periódica de IVA respeitante ao período de imposto 201312T, a Requerente efetuou um pedido de reembolso de IVA no montante total de € 107.244,38. [cf. Doc. n.º 4 anexo à PI e PA junto aos autos]

r) Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI2016…, emitida em 25.10.2016, com o código de atividade “1122111506 – Controlo dos sujeitos passivos que solicitaram reembolso de IVA sem procedimento inspetivo”, na Direção de Finanças de Lisboa, foi efetuado um procedimento de inspeção externa à Requerente, de âmbito parcial, incidente sobre o IVA e abrangendo o exercício de 2013. [cf. Doc. n.º 4 anexo à PI e PA junto aos autos]

s) No âmbito daquele procedimento inspetivo, em 23.03.2017, a Requerente foi notificada para prestar os seguintes esclarecimentos [cf. Doc. n.º 4 anexo à PI e PA junto aos autos]:

 

 

t) A Requerente respondeu em 28.03.2017, nos seguintes termos [cf. Doc. n.º 4 anexo à PI e PA junto aos autos]:

u) Através do ofício n.º…, de 20.04.2017, dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, remetido por carta registada (registo dos CTT: RD … PT), foi a Requerente notificada do respetivo Projeto de Relatório da Inspeção Tributária e para, querendo, exercer o direito de audição, tendo ali sido propostas correções de natureza meramente aritmética, em sede de IVA, com referência ao exercício de 2013, com a seguinte fundamentação [cf. PA junto aos autos]:

 

 

 

 

 

(…)

 

 

 

 

 

 

 

v) A Requerente não exerceu aquele direito de audição, pelo que as mencionadas correções propostas em sede de IVA foram integralmente mantidas no Relatório da Inspeção Tributária, com a fundamentação ali constante e que aqui se dá por inteiramente reproduzida. [cf. Doc. n.º 4 anexo à PI e PA junto aos autos]

w) A Requerente foi notificada do Relatório da Inspeção Tributária, através do ofício n.º…, datado de 22/05/2017, dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa, remetido por carta registada (registo CTT: RD … PT). [cf. Doc. n.º 4 anexo à PI e PA junto aos autos]

x) A AT considerou que a Requerente não tem direito à dedução do IVA suportado na aquisição dos serviços a que se referem as faturas emitidas por “B…” (assessoria jurídica, financeira e de gestão), “F…” (assessoria em marketing e IT), I… (consultoria de recursos humanos), “J…, Lda.” (revisão legal de contas), “K…” (serviços jurídicos) e “L…, RL” (serviços jurídicos), anexas como Doc. n.º 5 à PI e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.

y) Em virtude das referenciadas correções, foram efetuadas as seguintes liquidações adicionais de IVA com referência ao exercício de 2013 [cf. Docs. n.ºs 1 e 7 anexos à PI]:

(i) A liquidação n.º…, referente ao período de tributação de 201303T, com um excesso de imposto a reportar para o período seguinte de € 45.420,16;

(ii) A liquidação n.º…, referente ao período de tributação de 201306T, com um excesso de imposto a reportar para o período seguinte de € 46.798,17;

(iii) A liquidação n.º…, referente ao período de tributação de 201309T, com um excesso de imposto a reportar para o período seguinte de € 49.909,14; e

(iv) A liquidação n.º 2017…, referente ao período de tributação de 201312T, com o valor a reembolsar de € 50.509,11.  

z) Conjuntamente com esta última liquidação adicional de IVA, a Requerente foi ainda notificada da demonstração de acerto de contas n.º 2017…, na qual está materializada a compensação n.º 2017…, referente ao período de tributação de 201312T, de que resultou o montante de imposto a pagar de € 56.735,22, com data limite de pagamento voluntário a 02.08.2017. [cf. Doc. n.º 1 à PI]

aa) A Requerente efetuou o pagamento integral e tempestivo do referido montante de imposto de € 56.735,22. [cf. Doc. n.º 6 à PI]

bb) Em 31 de outubro de 2017, foi apresentado o pedido de constituição de tribunal arbitral que deu origem ao presente processo. [cf. sistema informático de gestão processual do CAAD]

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§2. FACTOS NÃO PROVADOS

Com relevo para a apreciação e decisão da causa, não se apurou nem em que consistiu a assessoria jurídica prestada pela “B…”, nem quais os concretos serviços jurídicos prestados pela “L…” e pela “K…” à Requerente e a que se referem as respetivas faturas constantes do Doc. n.º 5 anexo à PI.

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§3. MOTIVAÇÃO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO

O Tribunal fundou a sua convicção na análise crítica dos documentos (incluindo o processo administrativo) referidos em cada alínea dos factos provados, cuja genuinidade não é impugnada ou controvertida, nem nos deixa dúvida, e no alegado e contra-alegado pelas partes, cuja aderência à realidade não foi posta em causa. Quanto à conjugação dos factos representados nos documentos, sendo o caso, o Tribunal terá em conta as regras da experiência comum, da normalidade, da lógica, da plausibilidade e da verosimilhança, inerentes ao princípio da livre apreciação da prova.

Relativamente à factualidade não provada, acresce dizer que a mesma foi assim considerada em virtude da inexistência de quaisquer elementos de prova suscetíveis de, ainda que indiretamente, a comprovarem.

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III.2. DE DIREITO

No caso sub judice, o epicentro do dissenso entre as partes radica na existência ou não do direito à dedução do IVA suportado pela Requerente com as aquisições de serviços tituladas pelas faturas constantes do documento n.º 5 junto ao pedido de pronúncia arbitral e referidas no Relatório de Inspeção Tributária que, segundo aquela, visaram a prestação de serviços às suas participadas.

            Na ótica da Requerente, a realização de transações sujeitas e não isentas de IVA consubstanciadas em serviços prestados pela sociedade holding às participadas é suficiente para a conclusão de que a mesma exerce uma atividade económica e, nessa medida, que lhe assiste o direito à dedução do IVA incorrido para o respetivo desenvolvimento. Consequentemente, prossegue a Requerente, é legítimo o direito à dedução do IVA face à natureza da atividade por ela efetivamente desenvolvida.

            Na perspetiva da Requerida, aqueles concretos serviços adquiridos pela Requerente foram utilizados apenas e só no exercício da atividade de gestão de participações sociais e, como tal, não apresentam qualquer nexo direto, causal e imediato com os serviços prestados pela Requerente às suas participadas, pelo que lhe é vedado o direito à dedução do IVA.

            Dito isto.

Como resultou provado, a Requerente é uma SGPS que, a par do exercício da atividade de gestão de participações sociais, desenvolve a atividade de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às sociedades por si participadas, pelo que podemos ter por assente que a Requerente tem intervenção ativa e direta na gestão das suas participadas.

A referida atividade de prestação de serviços técnicos de administração e gestão às sociedades participadas, exige um conjunto de recursos (técnicos e humanos) a que Requerente, por si só, não consegue prover, pois não possui uma estrutura física e humana para tanto adequada, pelo que recorre a entidades terceiras, a quem subcontrata a prestação de serviços nas sobreditas áreas.

Nessas situações em que a Requerente não dispõe dos meios suficientes ou adequados e subcontrata entidades terceiras, não foram suscitadas, nem se colocam quaisquer dúvidas de que essas entidades liquidam IVA à Requerente, relativamente aos serviços contratados e prestados.

Por seu turno, sobre os serviços que a Requerente presta às sociedades participadas também é liquidado o correspondente IVA.

É, precisamente, em resultado da intervenção ativa e direta que a Requerente tem na gestão das suas participadas que surge o presente litígio quanto à possibilidade de deduzir, ou não, o IVA suportado pela Requerente nos inputs a montante.

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Isto posto. A Requerente assaca os seguintes vícios invalidantes ao ato de liquidação adicional de IVA controvertido:

- falta de fundamentação;

- violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, consubstanciada na errada interpretação e aplicação, designadamente, dos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA.

Importa, pois, começar por estabelecer a ordem de conhecimento dos aludidos vícios, para o que temos de convocar o artigo 124.º do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, que estatui o seguinte:

Artigo 124.º

Ordem do conhecimento dos vícios da sentença

  1. Na sentença, o tribunal apreciará prioritariamente os vícios que conduzam à declaração de inexistência ou nulidade do acto impugnado e, depois, os vícios arguidos que conduzam à sua anulação.
  2. Nos referidos grupos a apreciação dos vícios é feita pela ordem seguinte:
  1. No primeiro grupo, o dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos;
  2. No segundo grupo, a indicada pelo impugnante, sempre que este estabeleça entre eles uma relação de subsidiariedade e não sejam arguidos outros vícios pelo Ministério Público ou, nos demais casos, a fixada na alínea anterior.

Este preceito legal estabelece uma prioridade para o conhecimento dos vícios cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos.

No caso concreto, afigura-se inequívoco que nenhum dos vícios invocados pela Requerente pode ser considerado como proveniente de situações que possam determinar a nulidade dos atos controvertidos à luz dos critérios legais que os caracterizam, nem tão pouco a Requerente estabeleceu uma ordem de prioridade para esse conhecimento, pelo que a máxima eficácia na tutela dos seus interesses impõe o conhecimento prioritário do alegado vício de violação de lei em relação ao indicado vício de falta de fundamentação; sendo que só nos pronunciaremos sobre este último se viermos a concluir que a liquidação adicional de IVA impugnada não padece do vício de violação de lei pois, caso contrário, tal não fará sentido, atento o preceituado no citado artigo 124.º do CPPT (efetivamente, se conhecendo de um vício que conduza à eliminação jurídica do ato impugnado e que impeça definitivamente a renovação do mesmo, o julgador tivesse de conhecer de todos os vícios imputados ao ato, seria indiferente a ordem de conhecimento).

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§1. DO REGIME JURÍDICO DAS SGPS

            O conceito de sociedade holding é genericamente utilizado para aludir quer a sociedades que se limitam a gerir de forma passiva carteiras de títulos, numa lógica de repartição de risco, quer a sociedades que detêm participações de controlo e que intervêm ativamente na gestão das suas participadas, prestando-lhes ou não serviços remunerados.

            É habitual distinguir, entre outras modalidades, entre a holding pura e a holding mista e entre a holding financeira e a holding de direção.

No primeiro caso, o critério distintivo reside no caráter exclusivo do seu objeto social, sendo que a holding pura se dedica unicamente à detenção de participações sociais e a holding mista tem igualmente por objeto atividades de natureza comercial e industrial.

No segundo caso, o critério diferenciador reside no fim a que se destina a gestão das participações sociais, sendo que a holding de direção visa, mais do que a mera detenção de participações sociais, o enquadramento e direção das sociedades participadas, enquanto que a holding financeira está vocacionada apenas para a rentabilização do investimento concentrado nas participações. 

            No tangente às SGPS, encontramos o respetivo regime jurídico definido no Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de dezembro – sucessivamente alterado pelo Decreto-Lei n.º 318/94, de 24 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 378/98, de 27 de novembro e pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de dezembro –, o qual estatui no seu artigo 1.º que as SGPS “têm por único objecto contratual a gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta de exercício de actividades económicas” (n.º 1), sendo que “a participação numa sociedade é considerada forma indirecta de exercício da actividade económica desta quando não tenha carácter ocasional e atinja, pelo menos, 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer por si só quer através de participações de outras sociedades em que a SGPS seja dominante” (n.º 2), considerando-se “que a participação não tem carácter ocasional quando é detida pela SGPS por período superior a um ano” (n.º 3).

Nos termos do artigo 4.º do mesmo diploma legal, às SGPS é permitida “a prestação de serviços técnicos de administração e gestão a todas ou a algumas das sociedades em que detenham participações ou com as quais tenham celebrado contratos de subordinação” (n.º 1), devendo aquela prestação de serviços “ser objecto de contrato escrito, no qual deve ser identificada a correspondente remuneração” (n.º 2).    

Nesta parametria, é usual a qualificação da SGPS como uma holding pura – na justa medida em que está limitada quanto ao seu objeto social, nos termos acima referidos, o que a impede de desenvolver diretamente atividades económicas de natureza comercial, industrial ou outra que não as mencionadas prestações de serviços – e como uma holding de direção –, uma vez que a sua atividade vai para além da mera aquisição, detenção e alienação de participações sociais, podendo, complementarmente à sua atividade principal, prestar, em determinadas circunstâncias, serviços técnicos de administração e gestão a todas ou a algumas das sociedades em que possua participações ou com as quais tenha celebrado contratos de subordinação.

Em síntese, flui do regime jurídico das SPGS que a gestão de participações sociais noutras sociedades, como forma indireta de exercício de uma atividade económica, constitui o único objeto social que, legalmente, qualquer SGPS poderá ter e prosseguir; isto sem prejuízo de, como já dissemos, a respetiva atividade ultrapassar a simples aquisição, detenção e alienação de participações sociais.      

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            §2. DO DIREITO À DEDUÇÃO DO IVA

            O direito à dedução (assente no designado método da dedução do imposto ou método do crédito de imposto ou método subtrativo indireto ou ainda método das faturas) é um dos pilares do IVA, provavelmente o mais importante; efetivamente, «o que faz do IVA um imposto sobre o valor acrescentado é a faculdade que se atribui a cada operador económico de deduzir ao imposto que liquida nas suas vendas o imposto incorrido nas suas compras, entregando ao Estado apenas a diferença, quando o saldo seja positivo.»[1]

            Isto mesmo tem sido destacado pelo TJUE em diversas decisões, como é o caso do acórdão Petroma (proferido em 8 de maio de 2013 no processo C-271/12): «o direito à dedução constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA que não pode, em princípio, ser limitado e que se exerce imediatamente em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante (…). O regime das deduções assim estabelecido visa aliviar inteiramente o empresário do peso do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante dessa forma a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente do seu fim ou do seu resultado, na condição de essas atividades estarem elas mesmas, em princípio, sujeitas a IVA».

            O mecanismo do exercício do direito à dedução serve, assim, para assegurar a neutralidade característica do IVA, evitando o efeito cumulativo e assegurando que o imposto é suportado em definitivo pelo consumidor final; porquanto, permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante e, dessa forma, não o refletir como custo operacional da sua atividade, retirando, assim, o efeito cumulativo ou de cascata, propiciando a neutralidade económica do imposto. O direito à dedução do IVA suportado a montante tem, pois, um relevo especial no sistema deste imposto[2].

            O mecanismo do exercício do direito à dedução está regulamentado nos artigos 167.º a 192.º da Diretiva IVA (Diretiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado) que, no essencial, prevê que os sujeitos passivos têm o direito a deduzir ao imposto liquidado num Estado-membro o imposto que nesse mesmo Estado tenham suportado na aquisição de bens ou serviços, desde que estes se destinem exclusivamente à realização de operações tributadas ou de operações com isenção completa. Nos casos em que os bens e serviços adquiridos pelos sujeitos passivos de IVA e destinarem exclusivamente à realização daquelas operações o direito à dedução do imposto suportado a montante é integral; se se destinarem indistintamente à realização destas operações e de outras que não confiram direito à dedução, o imposto suportado a montante só é dedutível em parte, estabelecendo a Diretiva IVA diferentes métodos de cálculo para o efeito.

            Numa perspetiva subjetiva, o artigo 168.º da Diretiva IVA estatui que o direito à dedução só pode ser exercido por quem seja sujeito passivo de IVA, tal como a própria Diretiva os define; assim, são titulares do direito à dedução os sujeitos passivos referidos no artigo 9.º da Diretiva IVA – as pessoas que de modo independente se dediquem a uma atividade económica continuada, qualquer que seja a sua natureza – assim como aqueles que realizem atos isolados, sempre que os estados-membros decidam considerá-los como sujeitos passivos nos termos do artigo 12.º da Diretiva IVA. São ainda abrangidos pelo direito à dedução aqueles que se tornem devedores do imposto por via do mecanismo de reverse charge previsto nos artigos 194.º a 199.º da Diretiva IVA.

Numa perspetiva objetiva, o artigo 168.º, alínea a), da Diretiva IVA estabelece que por princípio os sujeitos passivos podem deduzir o imposto suportado na aquisição de todos e quaisquer bens e serviços a outros sujeitos passivos, desde que estes sejam utilizados para as suas operações tributadas. Também por princípio, apenas ficam excluídos do direito à dedução os bens ou serviços que suscitem confusão entre a esfera pessoal e a esfera empresarial, aos quais alude o artigo 176.º da Diretiva IVA.

Como esclarece Sérgio Vasques, a «referência a “operações tributadas” serve para deixar claro que só quando se dá a aplicação efectiva do imposto nas operações activas se torna possível a dedução do imposto incorrido nas operações passivas. Ao contrário, quando as operações activas beneficiem de isenção simples, fica excluído por princípio o direito à dedução e o sujeito passivo passa a ocupar posição semelhante à de um consumidor final, suportando na sua esfera o imposto relativo às suas aquisições. Só quando as operações activas beneficiem de isenção completa é que se mantém intocado o direito à dedução, sendo a essas isenções que se refere o artigo 169.º, nas suas alíneas b) e c).»[3]

A existência de uma relação direta e imediata entre os bens e serviços adquiridos e uma ou várias atividades de fornecimento de bens ou de prestação de serviços que conferem o direito à dedução é, pois, em regra, indispensável para que o direito à dedução do IVA incorrido nos bens e serviços adquiridos seja reconhecido ao sujeito passivo e para determinar a extensão desse direito.

Contudo, o TJUE veio esclarecer que aquela relação direta e imediata não é exigível relativamente a cada output individualmente considerado, admitindo que tal conexão se verifique relativamente à atividade do sujeito passivo globalmente considerada[4].    

Assim, na ausência de um nexo operação a operação, o direito à dedução subsiste se se verificar uma ligação, direta e imediata, com o conjunto da atividade económica desenvolvida, na medida em que esta confira esse direito, ou seja, desde que exista aquela relação entre as aquisições a montante e as atividades tributáveis do sujeito passivo[5].

Recentemente, o TJUE foi ainda mais longe na abordagem desta questão do nexo direto e imediato entre as aquisições e as operações tributáveis a jusante, tendo no acórdão Sveda[6] desvalorizado a exigência de uso direto da aquisição dos bens ou serviços, concluindo que somente atendendo ao propósito último da aquisição se logrará atingir a racionalidade e a neutralidade do sistema do IVA. Ao desconsiderar a afetação imediata do input, atendendo à sua conexão final, o TJUE considera pois suficiente um nexo indireto, desde que se demonstre que os inputs integram o objetivo último de prossecução de uma atividade que confere o direito à dedução ou na medida em que o confira.   

O TJUE tem, pois, vindo a acompanhar a tendência interpretativa que dá prevalência à neutralidade no sistema do IVA, afastando-se de fórmulas restritivas na sua aplicação concreta e, por isso, tem salientado, em diversas ocasiões, que as normas da Diretiva IVA que prevêem limitações do direito à dedução – artigos 176.º e 177.º – têm caráter excecional no âmbito do sistema IVA, derrogando o princípio da neutralidade, pelo que devem ser sempre objeto de interpretação estrita[7].           

No ordenamento jurídico nacional, o Código do IVA define que são sujeitos passivos do imposto, entre outros, “as pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões livre, e, bem assim, as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos de incidência real do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) ou do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC)” (artigo 2.º, n.º 1, alínea a)).

Por outro lado, encontramos o direito à dedução do IVA regulamentado nos artigos 19.º a 26.º do Código do IVA, importando aqui destacar as seguintes normas (redação em vigor à época dos factos):

“Artigo 19.º

Direito à dedução

1 - Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram: 

a) O imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos;

(…)”

“Artigo 20.º

Operações que conferem o direito à dedução

1 - Só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes:

a) Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas;”

“Artigo 23.º

Métodos de dedução relativa a bens de utilização mista

1 - Quando o sujeito passivo, no exercício da sua actividade, efectuar operações que conferem direito a dedução e operações que não conferem esse direito, nos termos do artigo 20.º, a dedução do imposto suportado na aquisição de bens e serviços que sejam utilizados na realização de ambos os tipos de operações é determinada do seguinte modo:

a) Tratando-se de um bem ou serviço parcialmente afecto à realização de operações não decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, o imposto não dedutível em resultado dessa afectação parcial é determinado nos termos do n.º 2;

b) Sem prejuízo do disposto na alínea anterior, tratando-se de um bem ou serviço afecto à realização de operações decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, parte das quais não confira direito à dedução, o imposto é dedutível na percentagem correspondente ao montante anual das operações que dêem lugar a dedução.

2 - Não obstante o disposto na alínea b) do número anterior, pode o sujeito passivo efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, com base em critérios objectivos que permitam determinar o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem direito a dedução e em operações que não conferem esse direito, sem prejuízo de a Direcção-Geral dos Impostos lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar que provocam ou que podem provocar distorções significativas na tributação.

3 - A administração fiscal pode obrigar o sujeito passivo a proceder de acordo com o disposto no número anterior:

a) Quando o sujeito passivo exerça actividades económicas distintas;

b) Quando a aplicação do processo referido no n.º 1 conduza a distorções significativas na tributação.Ver jurisprudência

4 - A percentagem de dedução referida na alínea b) do n.º 1 resulta de uma fracção que comporta, no numerador, o montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar a dedução nos termos do n.º 1 do artigo 20.º e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo decorrentes do exercício de uma actividade económica prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, bem como as subvenções não tributadas que não sejam subsídios ao equipamento.

(…)

6 - A percentagem de dedução referida na alínea b) do n.º 1, calculada provisoriamente com base no montante das operações realizadas no ano anterior, assim como a dedução efectuada nos termos do n.º 2, calculada provisoriamente com base nos critérios objectivos inicialmente utilizados para aplicação do método da afectação real, são corrigidas de acordo com os valores definitivos referentes ao ano a que se reportam, originando a correspondente regularização das deduções efectuadas, a qual deve constar da declaração do último período do ano a que respeita.Ver jurisprudência

            Noutra ordem de considerações, importa frisar que, em conformidade com a jurisprudência do TJUE, o princípio da neutralidade do IVA exige que a dedução do imposto pago a montante seja concedida caso os requisitos substanciais tenham sido cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Destarte, de acordo com o TJUE, desde que a Administração fiscal disponha dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo, enquanto destinatário das operações, é devedor do IVA, não pode impor, no que diz respeito ao seu direito à dedução, condições adicionais que possam ter por efeito a inviabilização absoluta do exercício desse direito[8].

A propósito dos aludidos requisitos formais, o artigo 178.º da Diretiva IVA estatui que [p]ara poder exercer o direito à dedução, o sujeito passivo deve satisfazer as seguintes condições: a) Relativamente à dedução referida na alínea a) do artigo 168.°, no que respeita às entregas de bens e às prestações de serviços, possuir uma fatura emitida em conformidade com os artigos 220.° a 236.°, 238.°, 239.° e 240.°”.

O artigo 219.º da Diretiva IVA dispõe que [é] assimilado a fatura qualquer documento ou mensagem que altere a fatura inicial e a ela faça referência específica e inequívoca”.

Nos termos do artigo 220.° da citada Diretiva, [o]s sujeitos passivos devem assegurar que seja emitida uma fatura, por eles próprios, pelos adquirentes ou destinatários ou, em seu nome e por sua conta, por terceiros, nos seguintes casos: 1) Relativamente às entregas de bens ou às prestações de serviços que efetuem a outros sujeitos passivos ou a pessoas coletivas que não sejam sujeitos passivos”.

Mais adiante, o artigo 226.° da mesma Diretiva prevê que [s]em prejuízo das disposições específicas previstas na presente diretiva, as únicas menções que devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas faturas emitidas em aplicação do disposto nos artigos 220.° e 221.° são as seguintes: (…) 6) A quantidade e natureza dos bens entregues ou a extensão e natureza dos serviços prestados; 7) A data em que foi efetuada, ou concluída, a entrega de bens ou a prestação de serviços ou a data em que foi efetuado o pagamento por conta, referido nos pontos 4) e 5) do artigo 220.°, na medida em que essa data esteja determinada e seja diferente da data de emissão da fatura”.

Por fim, o artigo 273.° da referida Diretiva determina o seguinte:

“Os Estados‑Membros podem prever outras obrigações que considerem necessárias para garantir a cobrança exata do IVA e para evitar a fraude, sob reserva da observância da igualdade de tratamento das operações internas e das operações efetuadas entre Estados‑Membros por sujeitos passivos, e na condição de essas obrigações não darem origem, nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, a formalidades relacionadas com a passagem de uma fronteira.

A faculdade prevista no primeiro parágrafo não pode ser utilizada para impor obrigações de faturação suplementares às fixadas no Capítulo 3.”

No Código do IVA, o artigo 19.º, n.º 2, determina que [s]ó confere direito a dedução o imposto mencionado nos seguintes documentos, em nome e na posse do sujeito passivo: a) Em faturas passadas na forma legal”; sendo que o n.º 6 do mesmo artigo estipula que [p]ara efeitos do exercício do direito à dedução, consideram-se passadas na forma legal as faturas que contenham os elementos previstos nos artigos 36.º ou 40.º, consoante os casos”.  

No n.º 5 do artigo 36.º do Código do IVA vamos, então, encontrar estatuído o seguinte:

“5 - As faturas devem ser datadas, numeradas sequencialmente e conter os seguintes elementos:

a) Os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto;

  b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efetivamente transacionadas devem ser objeto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução;

c) O preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável;

d) As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido;

e) O motivo justificativo da não aplicação do imposto, se for caso disso;

f) A data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente, em que os serviços foram realizados ou em que foram efetuados pagamentos anteriores à realização das operações, se essa data não coincidir com a da emissão da fatura.

 No caso de a operação ou operações às quais se reporta a fatura compreenderem bens ou serviços sujeitos a taxas diferentes de imposto, os elementos mencionados nas alíneas b), c) e d) devem ser indicados separadamente, segundo a taxa aplicável.”

O TJUE foi chamado a pronunciar-se sobre esta temática, entre uma miríade de outros casos, no âmbito de um pedido de decisão prejudicial, apresentado por um Tribunal Arbitral constituído sob a égide do CAAD, no âmbito de um litígio opondo uma sociedade comercial à AT, a propósito da recusa desta última em admitir a dedução do IVA pago a montante pela empresa na qualidade de destinatária de serviços jurídicos prestados por um escritório de advogados, com fundamento no facto de as faturas emitidas por este escritório não satisfazerem as exigências de forma previstas pela legislação nacional.

O pedido de decisão prejudicial teve, pois, por objeto a interpretação do artigo 178.°, alínea a), e do artigo 226.°, n.° 6, ambos da Diretiva IVA.

No acórdão então prolatado[9], o TJUE pronunciou-se da seguinte forma relativamente à questão que lhe foi submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio:

24. A questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio comporta duas partes, que importa tratar separadamente. Com a primeira parte da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 226.° da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que faturas que só contenham as menções «serviços jurídicos prestados desde determinada data até ao presente» ou «serviços jurídicos prestados até ao presente», como as que estão em causa no processo principal, respeitam as exigências previstas nos n.os 6 e 7 deste artigo. Com a segunda parte da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se o artigo 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades tributárias nacionais possam recusar o direito a dedução do IVA pelo simples facto de o sujeito passivo possuir uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, desta diretiva, quando essas autoridades disponham de todas as informações necessárias para verificar se os requisitos substantivos relativos ao exercício desse direito se encontram satisfeitos.

 

Quanto à primeira parte da questão, relativa ao respeito do artigo 226.°, n.os 6 e 7, da Diretiva 2006/112

 

25. A título preliminar, há que recordar que o artigo 226.° da Diretiva 2006/112 precisa que, sem prejuízo das disposições específicas previstas nesta diretiva, só as menções citadas nesse artigo devem obrigatoriamente figurar, para efeitos do IVA, nas faturas emitidas em aplicação do disposto no artigo 220.° da referida diretiva. Daqui decorre que não é legítimo aos Estados‑Membros associar o exercício do direito à dedução do IVA ao preenchimento de pressupostos relativos ao conteúdo das faturas que não estão expressamente previstos nas disposições da Diretiva 2006/112 (v., neste sentido, acórdão de 15 de julho de 2010, Pannon Gép Centrum, C‑368/09, EU:C:2010:441, n.os 40 e 41).

26. Em primeiro lugar, o artigo 226.°, n.° 6, da Diretiva 2006/112 exige que a fatura contenha a menção da extensão e natureza dos serviços prestados. A redação desta disposição indica assim que é obrigatório especificar a extensão e natureza dos serviços prestados, sem contudo precisar que é necessário descrever os serviços específicos prestados de forma exaustiva.

27. Como observou a advogada‑geral nos n.os 30, 32 e 46 das suas conclusões, a finalidade das menções que devem obrigatoriamente constar da fatura consiste em permitir às Administrações Fiscais a realização de controlos do pagamento do imposto devido e, se for caso disso, da existência do direito a dedução do IVA. É, portanto, à luz desta finalidade que importa analisar se faturas como as que estão em causa no processo principal respeitam as exigências do artigo 226.°, n.° 6, da Diretiva 2006/112.

28. No processo principal, embora as faturas em causa qualifiquem os serviços prestados de «serviços jurídicos», não deixa de ser verdade, conforme salientou o Governo português nas suas observações, que este conceito abrange um vasto acervo de prestações de serviços e, nomeadamente, prestações que não assumem necessariamente um âmbito empresarial. Daqui resulta que a menção «serviços jurídicos prestados desde determinada data até ao presente» ou «serviços jurídicos prestados até ao presente» não parece indicar, de forma suficientemente detalhada, a natureza dos serviços em causa. Além disso, esta menção é tão genérica que não permite pôr em evidência a extensão dos serviços prestados, pelas razões referidas pela advogada‑geral nos n.os 60 a 63 das suas conclusões. Por conseguinte, a dita menção não cumpre, em princípio, os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.° 6, da Diretiva 2006/112, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

29. Em segundo lugar, o artigo 226.°, n.° 7, da Diretiva 2006/112 exige que a fatura contenha a data em que foi efetuada, ou concluída, a prestação de serviços.

30. Esta exigência também deve ser interpretada à luz da finalidade prosseguida pela imposição de menções obrigatórias na fatura, conforme previstas no artigo 226.° da Diretiva 2006/112, que é, como foi recordado no n.° 27 do presente acórdão, permitir às Administrações Fiscais a realização de controlos do pagamento do imposto devido e, se for caso disso, da existência do direito a dedução do IVA. Para este efeito, a data da prestação dos serviços objeto da referida fatura permite controlar quando ocorreu o facto gerador do imposto e, portanto, determinar as disposições fiscais que devem, de um ponto de vista temporal, aplicar‑se à operação a que respeita o documento.

31. No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que os serviços jurídicos objeto das faturas em causa no processo principal dão origem a pagamentos por conta ou a pagamentos sucessivos. O artigo 64.° da Diretiva 2006/112 prevê que tais prestações de serviços se consideram efetuadas no termo do prazo a que se referem esses pagamentos. Logo, a fim de satisfazer as exigências do artigo 226.°, n.° 7, da Diretiva 2006/112, é imperativo que esses períodos sejam mencionados nas faturas relativas a tais prestações.

32. A este respeito, importa salientar que as faturas em causa referentes aos «serviços jurídicos prestados desde determinada data até ao presente» parecem especificar o período de faturação. Em contrapartida, uma das faturas em causa contém apenas a menção «serviços jurídicos prestados até ao presente». Essa fatura não menciona a data de início do período em questão e não permite, por isso, determinar o período a que se reportam esses pagamentos por conta.

33. Por conseguinte, há que considerar que uma fatura que contenha apenas a menção «serviços jurídicos prestados até ao presente», sem especificar uma data de início do período de faturação, não preenche os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.° 7, da Diretiva 2006/112.

34. Cabe, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio, se constatar que as faturas em causa não preenchem as exigências decorrentes do artigo 226.°, n.os 6 e 7, desta diretiva, verificar se os documentos anexos aduzidos pela Barlis contêm uma apresentação mais detalhada dos serviços jurídicos em causa no processo principal e podem ser equiparados a uma fatura nos termos do artigo 219.° da referida diretiva, na qualidade de documentos que alteram a fatura inicial e a ela façam referência específica e inequívoca.

35. Decorre das considerações precedentes que há que responder à primeira parte da questão submetida que o artigo 226.° da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que faturas que só contenham a menção «serviços jurídicos prestados desde determinada data até ao presente», como as que estão em causa no processo principal, não respeitam, em princípio, as exigências previstas no n.° 6 deste artigo e que faturas que só contenham a menção «serviços jurídicos prestados até ao presente» não respeitam, em princípio, as exigências previstas no referido n.° 6 nem as exigências previstas no n.° 7 do mesmo artigo, o que cabe, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

 

Quanto à segunda parte da questão, relativa às consequências de uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, da Diretiva 2006/112 para o exercício do direito a dedução do IVA

 

36. Com a segunda parte da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, em substância, determinar as consequências de uma violação do artigo 226.°, n.os 6 e 7, da Diretiva 2006/112 no exercício do direito a dedução do IVA.

37. Cumpre recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito dos sujeitos passivos a deduzir do IVA de que são devedores o IVA devido ou pago sobre os bens adquiridos e os serviços que lhes foram prestados a montante constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pela legislação da União (acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Maks Pen, C‑18/13, EU:C:2014:69, n.° 23 e jurisprudência aí referida).

38. O Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que o direito a dedução do IVA previsto nos artigos 167.° e seguintes da Diretiva 2006/112 faz parte integrante do mecanismo do IVA e não pode, em princípio, ser limitado. Esse direito é imediatamente exercido em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante (v., neste sentido, acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Maks Pen, C‑18/13, EU:C:2014:69, n.° 24 e jurisprudência aí referida).

39. O regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do peso do IVA devido ou pago no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante, por conseguinte, a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, em princípio, elas próprias sujeitas ao IVA (acórdão de 22 de outubro de 2015, PPUH Stehcemp, C‑277/14, EU:C:2015:719, n.° 27 e jurisprudência aí referida).

40. No que se refere aos requisitos materiais exigidos para a constituição do direito a dedução do IVA, resulta do artigo 168.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 que os bens e serviços invocados para fundamentar esse direito devem ser utilizados pelo sujeito passivo a jusante para os efeitos das suas próprias operações tributadas e que, a montante, esses bens ou serviços devem ser prestados por outro sujeito passivo (v., neste sentido, acórdão de 22 de outubro de 2015, PPUH Stehcemp, C‑277/14, EU:C:2015:719, n.° 28 e jurisprudência aí referida).

41. No que respeita aos requisitos formais relativos ao exercício do referido direito, resulta do artigo 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 que o seu exercício está subordinado à posse de uma fatura emitida nos termos do artigo 226.° desta diretiva (v., neste sentido, acórdãos de 1 de março de 2012, Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz, C‑280/10, EU:C:2012:107, n.° 41, e de 22 de outubro de 2015, PPUH Stehcemp, C‑277/14, EU:C:2015:719, n.° 29).

42. O Tribunal de Justiça declarou que o princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução deste imposto pago a montante seja concedida se os requisitos materiais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Por conseguinte, quando a Administração Fiscal dispõe dos dados necessários para saber que os requisitos materiais foram cumpridos, não pode impor condições suplementares ao direito do sujeito passivo de dedução do imposto que possam ter por efeito eliminar esse direito (v., neste sentido, acórdãos de 21 de outubro de 2010, Nidera Handelscompagnie, C‑385/09, EU:C:2010:627, n.° 42; de 1 de março de 2012, Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz, C‑280/10, EU:C:2012:107, n.° 43; e de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C‑183/14, EU:C:2015:454, n.os 58, 59 e jurisprudência aí referida).

43. Daqui resulta que a Administração Fiscal não pode recusar o direito a dedução do IVA pelo simples facto de a fatura não preencher os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, da Diretiva 2006/112, se dispuser de todos os dados para verificar se os requisitos substantivos relativos a este direito se encontram satisfeitos.

44. A este respeito, a Administração Fiscal não deve limitar‑se ao exame da própria fatura. Deve igualmente ter em conta informações complementares prestadas pelo sujeito passivo. Esta constatação é confirmada pelo artigo 219.° da Diretiva 2006/112 que equipara a fatura qualquer documento ou mensagem que altere a fatura inicial e a ela faça referência específica e inequívoca.

45. No processo principal, cabe assim ao órgão jurisdicional de reenvio ter em conta todas as informações constantes das faturas em causa e dos documentos anexos apresentados pela Barlis com vista a verificar se os requisitos substantivos do seu direito a dedução do IVA se encontram satisfeitos.

            46. Neste contexto, há que sublinhar, em primeiro lugar, que é ao sujeito passivo que solicita a dedução do IVA que incumbe provar que preenche os requisitos para dela beneficiar (v., neste sentido, acórdão de 18 de julho de 2013, Evita‑K, C‑78/12, EU:C:2013:486, n.° 37). As autoridades fiscais podem assim exigir ao próprio contribuinte as provas que considerem necessárias para apreciar se há ou não que conceder a dedução solicitada (v., neste sentido, acórdão de 27 de setembro de 2007, Twoh International, C‑184/05, EU:C:2007:550, n.° 35).

47. Em segundo lugar, importa precisar que os Estados‑Membros são competentes para prever sanções em caso de violação dos requisitos formais relativos ao exercício do direito a dedução do IVA. Nos termos do artigo 273.° da Diretiva 2006/112, os Estados‑Membros têm a faculdade de adotar medidas para assegurar a cobrança exata do imposto e evitar a fraude, desde que tais medidas não vão além do que é necessário para atingir tais objetivos nem ponham em causa a neutralidade do IVA (v., neste sentido, acórdão de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C‑183/14, EU:C:2015:454, n.° 62).

48. Nomeadamente, o direito da União não impede os Estados‑Membros de aplicarem, sendo caso disso, uma multa ou uma sanção pecuniária proporcionada à gravidade da infração, a fim de punir a violação das exigências formais (v., neste sentido, acórdão de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C‑183/14, EU:C:2015:454, n.° 63 e jurisprudência aí referida).

49. Decorre das considerações precedentes que há que responder à segunda parte da questão submetida que o artigo 178.°, alínea a), da Diretiva 2006/112 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que as autoridades tributárias nacionais possam recusar o direito a dedução do IVA pelo simples facto de o sujeito passivo possuir uma fatura que não cumpre os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.os 6 e 7, desta diretiva, quando essas autoridades dispõem de todas as informações necessárias para verificar se os requisitos substantivos relativos ao exercício desse direito se encontram satisfeitos.”          

Em linha com esta jurisprudência do TJUE, entre muito outros, citamos exemplificativamente os seguintes arestos do Tribunal Central Administrativo Sul:

- Acórdão proferido em 14.04.2016, no processo n.º 07924/14 (http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/c2f43cfa55433f1380257fa2004cb2d6?OpenDocument):

“III – Constitui obrigação dos sujeitos passivos emitir factura (ou documento equivalente) por cada transmissão de bens ou serviço prestado, sendo através dela que é determinado o regime e o montante do IVA incidente sobre cada uma das operações tributáveis; que a Administração Tributária controla o imposto pago ou a pagar e, por fim, é a factura que sustenta o exercício e comprovação por parte dos sujeitos passivos do direito à dedução do IVA.

IV – O IVA e ou as operações nesta sede tributáveis e o direito de dedução que delas pode emergir têm um enquadramento muito específico: embora no plano formal seja ostensiva a existência de um regime muito rigoroso, o certo é que, por força do princípio de neutralidade, as operações tributáveis devem igualmente ser analisadas na sua vertente material, isto é, segundo a realidade que lhes está subjacente, pelo que, se numa determinada situação se comprova que o regime formal não foi observado, mas estão comprovados os requisitos substantivos, deve ser reconhecido o direito à dedução do IVA.”

- Acórdão proferido em 15.12.2016, no processo n.º 1356/10.2BELRA (http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/50db962fa45b977c8025808b00537c76?OpenDocument):

“I. O artigo 36.º do CIVA estabelece determinados requisitos na emissão de facturas ou documentos equivalentes que são condição para a dedução do imposto por parte do sujeito passivo adquirente nos termos do artigo 19.º, n.º 2 do mesmo Código.

II. Se os vícios formais contidos na factura ou documento equivalente não permitirem a exacta cobrança e respectiva fiscalização do imposto, o direito à dedução do IVA não pode ser exercido.”

   

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            §2.1. O CONCEITO DE ATIVIDADE ECONÓMICA PARA EFEITOS DE IVA

            Como acima se referiu, decorre do artigo 9.º da Diretiva IVA que são genericamente considerados sujeitos passivos de IVA todos aqueles que de modo independente desenvolvam uma atividade económica, qualquer que seja o seu fim ou resultado. Assim, a qualidade de sujeito passivo do imposto advém da realização das operações integradas no âmbito da incidência objetiva do imposto, as quais, antes de tudo o mais – ou seja, antes de serem qualificadas como transmissões de bens ou prestações de serviços – têm que consubstanciar uma atividade económica.  

            O exercício de uma atividade económica constitui, deste modo, o pressuposto em que assenta a incidência subjetiva e objetiva do IVA. Efetivamente, ninguém pode ser dito «sujeito passivo que não leve a cabo uma actividade económica nem quando esta falte podemos estar em face de transmissões de bens ou prestações de serviços tributáveis. A delimitação da noção de actividade económica torna-se, assim, um exercício da maior importância na aplicação do imposto e um exercício particularmente delicado na medida em que o IVA, enquanto imposto geral de consumo, possui uma vocação de universalidade. O que quer que constitua actividade económica tem que ser definido em termos tão amplos quanto possível, se quisermos garantir neutralidade e igualdade ao imposto»[10].

            O artigo 9.º da Diretiva IVA determina que se deve entender por atividade económica “qualquer actividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas”.

Esta é uma noção de atividade económica que abrange genericamente toda a produção e comércio de bens e toda e qualquer prestação de serviços, seja qual for a respetiva natureza. Em face de tão ampla noção de atividade económica, o TJUE tem vindo a ser chamado a fixar os limites do que se deve considerar ter ou não ter conteúdo económico. 

            Um dos tipos de operações cujo conteúdo económico se revela controverso no âmbito do sistema IVA é o atinente às operações relativas a participações sociais, as quais se revestem de especial complexidade.

            A qualificação destas operações como económicas ou não tem consequências importantes na aplicação do IVA, senda a mais relevante o condicionar o direito à dedução.

*

            §2.2. AS SGPS E AS OPERAÇÕES RELATIVAS A PARTICIPAÇÕES SOCIAIS

            «O ponto de partida para o enquadramento das participações sociais em sede de IVA está no acórdão Polysar, de 1991 [proferido em 20 de junho de 1991, no processo C-60/90], em que o TJUE fixa o princípio de que a aquisição e detenção de participações sociais não representa verdadeira actividade económica. Uma sociedade que se limite a adquirir e gerir participações sociais não realiza genuínas transmissões de bens nem prestações de serviços mas meras aplicações de capitais. (…)

Aos olhos do TJUE, a aquisição e detenção de participações só pode dizer-se actividade económica se envolver a “interferência directa ou indirecta” na gestão das participadas. Sempre que uma holding intervenha activamente na gestão das participadas podemos dizer que através delas exerce uma actividade económica, justificando-se reconhecer-lhe a qualidade de sujeito passivo e o direito à dedução do IVA em que incorra a montante.

As condições em que a gestão de participações pode dar lugar a actividade económica seriam sumariadas algo mais no acórdão Harnas & Helm, de 1997 [proferido em 6 de fevereiro de 1997, no processo C-80/95]. Neste acórdão, o TJUE sentenciou que estas operações dão corpo a actividade económica quando se verifique uma de três condições: (a) serem realizadas no quadro de uma actividade comercial de negociação de títulos; (b) serem realizadas com vista a assegurar a interferência directa ou indirecta na gestão da sociedade em que foi tomada participação; ou (c) constituírem o prolongamento directo, permanente e necessário de uma actividade tributável. (…)

Quanto à detenção de participações, devemos considerá-la sempre operação desprovida de conteúdo económico e, por isso mesmo, fora do campo de aplicação do imposto [neste sentido, o acórdão Sofitam (proferido em 22 de junho de 1993, no processo C-333/91) do TJUE]. (…)

Quanto à aquisição de participações sociais, o TJUE é do entendimento de que esta não dá corpo a uma actividade económica para efeitos de IVA, ressalvadas as três condições que já referimos. Com certeza que também aqui se poderá dizer que há actividade económica quando a aquisição vise a “interferência directa ou indirecta” na gestão da participada. Se bem virmos, contudo, o alcance da qualificação é neste caso limitado, na medida em que a aquisição de participações constitui uma operação passiva e não operação activa. Os custos incorridos com uma aquisição de participações – custos com consultoria jurídica ou financeira, por hipótese – não podem por isso associar-se a uma concreta operação a jusante, apenas podendo ser associados à actividade geral que a empresa desenvolve. Esses custos não constituem nunca custos directos mas despesas gerais, semelhantes às despesas em que uma empresa incorre com vista à aquisição de tantos outros activos.

Assim, o IVA suportado em despesas necessárias a uma aquisição de participações será dedutível nos termos gerais, querendo isto dizer que será integralmente dedutível quando o sujeito passivo apenas realize operações tributadas e parcialmente dedutível quando o sujeito passivo, a par de operações tributadas, realize operações isentas [neste sentido, o acórdão Cibo (proferido em 27 de setembro de 2001, no processo C-16/00) do TJUE]. (…)           

A noção de que uma holding só exerce atividade económica quando de algum modo intervém na vida das participadas é razoavelmente intuitiva. O critério de que o TJUE se tem servido [para aferir da interferência direta ou indireta na gestão das participadas], porém, é de que existe intervenção apenas quando a sociedade-mãe realiza prestações tributáveis em proveito das afiliadas, como sucede quando a estas presta financiamento, consultoria ou serviços informáticos.»[11]    

Tendo, então, por referência as sociedades holding em geral, a questão primeira a dilucidar, neste âmbito, é a de saber se uma holding é ou não um sujeito passivo de IVA, ou seja, se desenvolve ou não uma atividade económica, importando, para tal, analisar se, para além da mera detenção de participações sociais, é praticada ou não alguma atividade de prestação de serviços, designadamente, às suas participadas.

            No caso de a sua atuação ser meramente passiva, será uma sociedade que não exerce uma atividade económica para efeitos de IVA, visto que os dividendos e os juros que aufere consubstanciam meros frutos resultantes da propriedade de um bem e não os proveitos decorrentes da sua exploração económica, pelo que essa sociedade não poderá ser considerada sujeito passivo para efeitos de IVA.

            Se se tratar de uma sociedade holding que tenha intervenção ativa na gestão das suas participadas, tendo como resultado a realização de outputs tributáveis, deverá ser considerada como uma entidade que exerce uma atividade económica, assumindo a qualidade de sujeito passivo de IVA[12].

            No que concerne, concretamente, às SGPS, importa salientar que decorre do respetivo regime legal que o seu objeto social único é a gestão – e não a mera detenção – de participações sociais, o que adicionado ao facto de a própria lei lhes reconhecer competência para a prestação de serviços de administração e gestão às participadas, resulta no exercício de uma atividade económica para efeitos de IVA. A tal conclusão não obsta, efetivamente, o facto de o seu único objeto social ser “a gestão de participações sociais noutras sociedades como forma indirecta de exercício de actividades económicas”; o qual também não releva, portanto, para efeitos de aferição do direito à dedução do IVA, o qual deve, pois, ser determinado em conformidade com os critérios gerais.  

            Isto mesmo foi decidido pelo TJUE no acórdão Portugal Telecom (proferido em 6 de setembro de 2012, no processo C-496/11), em que conclui que se for «de considerar que todos os serviços adquiridos a montante têm um nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito a dedução, o sujeito passivo em causa [uma SGPS que, no âmbito da prestação de serviços técnicos de administração às suas participadas, lhes refatura, com IVA, os custos incorridos com a aquisição de serviços de consultoria e outros] teria o direito, ao abrigo do artigo 17.º, n.º 2, da Sexta Diretiva, de deduzir a integralidade do IVA que tenha onerado a aquisição a montante dos serviços em causa no processo principal. Este direito à dedução não pode ser limitado pelo simples facto de a regulamentação nacional, em razão do objeto social da referida sociedade ou da sua atividade geral, qualificar as operações tributadas de acessórias da sua atividade principal.»  

            Afinando ainda mais a nossa análise, importa agora descortinar se uma SGPS que intervém ativamente na gestão das suas participadas, realizando operações tributáveis em sede de IVA, ainda assim realiza operações fora do campo de incidência do imposto, no respeitante a essas mesmas participações sociais.

            É pacificamente aceite que as sociedades holding podem ter um duplo estatuto para efeitos de IVA, ou seja, podem ser sujeito passivo e consumidor final, uma vez que podem estar envolvidas em atividades tributáveis – nomeadamente as prestações de serviços às participadas – e em atividade não económicas e, logo, não tributáveis – a mera detenção e fruição de participações sociais.

            Assim sendo, importa então definir em que termos deve ser feita a aferição do direito à dedução do IVA, para o que existem três testes possíveis, a saber:        

            (1) O IVA é suportado em inputs diretamente relacionados com outputs tributáveis?

            Este teste resulta diretamente do n.º 2 (segundo parágrafo) do artigo 1.º da Diretiva IVA, que estatui que “em cada transacção, o imposto sobre o valor acrescentado, calculado sobre o preço do bem ou do serviço à taxa que for aplicável a esse bem ou serviço, será exigível com dedução prévia do montante do imposto sobre o valor acrescentado que onerou directamente o custo dos diversos elementos constitutivos do preço”.

            A título de exemplo, refere Mariana Gouveia de Oliveira que este seria o «caso de uma SGPS que incorresse em custos directamente relacionados com a prestação de serviços a uma sua participada, por exemplo, com a contratação de um prestador de serviços que ficasse estritamente alocado a uma participada e cujos custos fossem facturados com IVA a essa mesma participada.

            Nestes casos, parece-nos haver um direct link entre o IVA suportado nos inputs e os outputs tributados da SGPS. O IVA assim suportado deveria ser integralmente deduzido.»[13]

            (2) O IVA é suportado em inputs diretamente relacionados com uma das atividades económicas prosseguidas?

            Mesmo nos casos em que não exista uma relação direta entre os inputs e os outputs tributados, poderá ainda assim ser reconhecido o direito à dedução integral do IVA se for estabelecida aquele direct link entre os inputs e um conjunto delimitado de actividades económicas tributadas.

            Isto mesmo foi decidido pelo TJUE no acórdão Abbey National (proferido em 22 de fevereiro de 2001, no processo C-408/98), no qual foi considerado que «se os diversos serviços adquiridos pelo transmitente a fim de realizar a transmissão apresentam uma relação directa e imediata com uma parte claramente delimitada das suas actividades económicas, de modo que os custos dos referidos serviços fazem parte das despesas gerais inerentes à referida parte da empresa, e que todas as operações incluídas nessa parte da empresa estão sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado, este sujeito passivo pode deduzir a totalidade do imposto sobre o valor acrescentado que onerou as despesas que efectuou para adquirir os referidos serviços».

            Assim, nestes casos, o IVA poderá ser deduzido caso exista uma relação direta e imediata com a atividade económica desenvolvida, excluindo-se o direito à dedução quando esteja em causa imposto que foi suportado no exercício de uma atividade não sujeita a IVA.

            (3) O IVA é suportado em custos gerais da actividade económica?

            No caso de inexistir a referida relação direta entre os inputs e os outputs tributados, importa ainda verificar se o direito à dedução do IVA deverá ser reconhecido sempre que as despesas efetuadas com a aquisição de bens e serviços se qualifiquem como despesas gerais da actividade e integrem os elementos constitutivos do preço das operações realizadas pelo sujeito passivo que conferem direito à dedução.

            O TJUE pronunciou-se sobre esta questão, concretamente quanto aos serviços adquiridos por uma sociedade holding (serviços de auditoria de sociedades, intervenção no quadro da negociação do preço de aquisição de ações e montagem da tomada de controlo das sociedades em matéria jurídica e fiscal), no acórdão Cibo Participations SA (proferido em 27 de setembro de 2001, no processo C-16/00), no qual foi considerado que apesar de não se verificar uma relação direta e imediata entre os vários serviços adquiridos por uma holding no âmbito da tomada de participação numa filial e uma ou várias operações a jusante que confiram direito à dedução, os custos dos serviços adquiridos se enquadram nas despesas gerais do sujeito passivo e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos produtos de uma empresa; nessa medida, conclui o acórdão, aqueles serviços têm uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade do sujeito passivo[14].

            A este propósito, como salienta Mariana Gouveia de Oliveira, a verificação deste critério «deve implicar uma dupla análise: por um lado a análise de uma relação funcional, i.e., a existência de uma ligação funcional/causal entre o input e a actividade tributável do sujeito passivo e, por outro, uma relação económica, i.e., um reflexo ao nível do preço dos outputs», visando com essa análise simultaneamente funcional e económica aferir «se os inputs se relacionam com a “manutenção da fonte produtora” da actividade tributável, à semelhança do critério utilizado para efeitos de aferição dos gastos dedutíveis em sede de IRC e se esses custos são susceptíveis de se projectarem na formação dos preços dos outputs tributáveis (ainda que no caso concreto, por vicissitudes externas, se acabem por não repercutir efectivamente).»[15]

            Sérgio Vasques refere que o «TJUE hesita entre um critério funcional, que olha à razão de ser dos custos, e um critério económico, que atende à repercussão dos custos sobre os preços que o sujeito passivo pratica. As decisões do TJUE em matéria de participações sociais deixam ver, no entanto, que um critério económico se mostra largamente inoperante, por ser geralmente impossível comprovar a integração de um custo no preço dos bens e serviços transaccionados pelos operadores económicos, dependente de um conjunto muito variado de circunstâncias. A repercussão do custo sobre os preços poderá, quando muito, ser presumida. E por isso o recurso a um critério funcional acaba por revelar-se sempre determinante na fixação do nexo com uma dada operação passiva ou com o conjunto das actividades tributáveis.»[16]  

            Em síntese conclusiva, temos, pois, que uma SGPS que se dedique à gestão ativa das suas participadas, é um operador económico e um sujeito passivo de IVA.

            No desenvolvimento da sua atividade tributável, a SGPS poderá incorrer em IVA em inputs diretamente conexionados com a sua atividade de gestão das participadas, bem como com custos gerais de funcionamento.   

            No tocante aos primeiros, atenta a natureza tributável do output, não há dúvidas quanto à existência do direito à dedução.

No que respeita às despesas que não se encontrem numa relação direta e imediata com os outputs tributados, constituindo, porém, despesas gerais da atividade da SGPS, deve também ser reconhecido o direito à dedução do IVA.

Subsistindo inputs promíscuos, que são utilizados indistinta e simultaneamente em atividades que conferem o direito à dedução e em outras que não, passa-se à repartição do imposto residual, aplicando as regras do artigo 23.º do Código do IVA[17].

Como método regra, surge o método de afetação real, baseado em critérios ou chaves de repartição que permitam a dedução do IVA suportado na aquisição de bens e serviços na proporção da sua utilização na atividade tributada que confere direito a dedução (artigo 23.º, n.º 2, do Código do IVA).

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§3. DO CASO CONCRETO: DIREITO À DEDUÇÃO DO IVA PELA REQUERENTE

No caso concreto, a AT corrigiu IVA previamente considerado dedutível pela Requerente relativamente aos seguintes serviços adquiridos aos fornecedores que se indicam (cf. facto provado u)):

 

 

A AT fundamentou a não aceitação da dedução do IVA suportado com tais custos da seguinte forma que aqui recuperamos (cf. facto provado u)):

“Os serviços referenciados não apresentam um nexo direto, causal e imediato com as operações económicas a jusante do sujeito passivo – prestação de serviços de assessoria em recursos humanos e prestação de serviços de secretariado e apoio administrativo. Conclui-se que os serviços em causa foram exclusiva e integralmente consumidos na atividade principal de gestão e administração das suas participadas.”

Conforme exposto acima, não basta para concluir pela indedutibilidade do IVA constatar que não há um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante que admitem direito a dedução – como, in casu, faz a AT –, pois essa conclusão só é passível de ser extraída se se demonstrar também que os custos dos serviços em causa não fazem parte das despesas gerais da SGPS, necessárias para levar a cabo a globalidade da sua atividade, pois, neste caso, tais custos têm um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo e são, enquanto tais e numa ótica funcional, elementos constitutivos dos serviços tributados que presta às suas participadas.

Com efeito, dependendo a prestação de serviços do funcionamento global da Requerente, há uma relação direta e imediata entre as despesas gerais necessárias para assegurar esse funcionamento global e a atividade económica que consubstancia a prestação de serviços às participadas, pelo que se afigura errado considerar como necessariamente não conexionados com a prestação de serviços às participadas os custos relativos ao adequado funcionamento global da Requerente, sem o que aquela sua atividade não poderia ser exercida.

Assim, para concluir pela indedutibilidade do IVA suportado pela Requerente é necessário constatar quer que não existe um nexo direto e imediato entre as operações a montante e as operações a jusante que admitem direito à dedução, quer que os custos dos serviços em causa não fazem parte das suas despesas gerais, necessárias para levar a cabo a globalidade da sua atividade.

Por conseguinte, dito de outra forma, tem cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado com bens e serviços que tenham um nexo direto e imediato com os serviços por si prestados às suas participadas com direito à dedução ou que, não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, seja IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais da Requerente que tenham um nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica de prestação de serviços.

Constitui nosso entendimento que estão nessa situação os custos atinentes aos serviços adquiridos pela Requerente aos fornecedores “B…” (com exceção da assessoria jurídica),“F…”, I…e “J…”, pelo que, o respetivo IVA suportado pela Requerente deve ser dedutível.

No concernente ao fornecedor I…, a prestação de serviços por este efetuada à Requerente, para além de estar ancorada e comprovada pelo Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre ambos, em 26/06/2012 (cf. facto provado p)), os serviços por aquele prestados (consultoria na área dos recursos humanos) à Requerente estão diretamente relacionados com os serviços que esta, por sua vez, presta às suas participadas “B…” e “F…” (cf. factos provados k) e m)), pelo que existe aqui um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e várias operações a jusante que admitem direito a dedução do IVA.

No respeitante aos serviços adquiridos pela Requerente à “B…” (com exceção da assessoria jurídica), à “F…” e à “J…”, afigura-se-nos que os mesmos consubstanciam custos respeitantes ao funcionamento da Requerente como SGPS e que, por isso, são de considerar custos gerais da sua atividade que, numa perspetiva funcional, estão conexionados com os serviços prestados pela Requerente às suas participadas – já que sem o funcionamento da Requerente esses serviços não poderiam ser prestados –, tendo pois um nexo direto e imediato com a atividade económica da Requerente tributada em IVA.

Com efeito, consideramos que os custos atinentes quer às assessorias que são prestadas pela “B…” (com exceção da assessoria jurídica) e pela “F…” à Requerente, quer à revisão legal de contas efetuada pela “J…” constituem custos essenciais à atividade da Requerente e, nessa medida, têm subjacente uma lógica de Grupo.

Consequentemente, entendemos que o IVA suportado com aqueles custos está diretamente relacionado com a prestação de serviços pela Requerente às suas participadas, que é uma atividade económica sujeita e não isenta de IVA, pelo que é dedutível.

No tangente aos custos atinentes à assessoria jurídica prestada pela “B…” e aos serviços jurídicos prestados pela “L…” e pela “K…”, como acima já ficou assente, não se logrou apurar em que consistiram concretamente quer aquela assessoria, quer tais serviços.

Como resulta do acima citado acórdão Barlis 06 do TJUE, o conceito de serviços jurídicos abrange um vasto acervo de prestações de serviços e, nomeadamente, prestações que não assumem necessariamente um âmbito empresarial.

Daqui resulta que não se possa considerar que as menções assessoria jurídica, “Prestação de serviços jurídicos” e “Proc. V/P.I.” indiquem, de forma suficientemente detalhada, a natureza dos serviços em causa, nem que permitam evidenciar a extensão dos serviços prestados. 

A Requerente poderia em sede de procedimento inspetivo, quer quando foi instada a fazê-lo (cf. factos provados s) e t)), quer quando foi notificada para o exercício do direito de audição prévia, de que não fez uso (cf. factos provados u) e v)), ter tentado provar, especificando-os detalhadamente, quais foram efetivamente os serviços jurídicos que lhe foram prestados por aquelas três entidades, o que não fez.

Já no âmbito do presente processo arbitral, a Requerente também não carreou para os autos qualquer elemento probatório no sentido de fazer aquela comprovação, pelo que não podemos considerar verificados, quanto a estes custos, os requisitos substantivos do direito da Requerente à dedução do respetivo IVA suportado.

Nestes termos, resulta evidenciado, sem necessidade de maiores considerações, que as correções efetuadas pela AT, quanto ao IVA suportado e deduzido pela Requerente relativo aos serviços que adquiriu à “B…” (com exceção da assessoria jurídica), à “F…”, à “J…” e a I…, enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, radicada na errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 19.º, n.º 1, alínea a) e 20.º, n.º 1, alínea a), do Código do IVA, o que se traduz na ilegalidade parcial do ato de liquidação adicional de IVA n.º 2017… e correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2017…, resultante da compensação n.º 2017…, de que resultou o montante total a pagar de € 56.735,22, o que justifica a sua anulação parcial (artigo 163.º, n.º 1, do CPA, subsidiariamente aplicável, por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT).

*

A Requerente imputa, ainda, à liquidação adicional de IVA impugnada o vício de falta de fundamentação.

No concernente às correções atinentes ao IVA suportado e deduzido pela Requerente relativo aos serviços que adquiriu à “B…” (com exceção da assessoria jurídica), à “F…”, à “J…” e a I…, o pedido de pronúncia arbitral procede com fundamento no vício de violação lei que se indicou, o que impede a renovação do ato nessa parte, pelo que fica aqui prejudicado, por inútil, a apreciação do vício de falta de fundamentação invocado pela Requerente. 

Por isso, apenas se justifica que seja apreciado este vício quanto às correções respeitantes ao IVA suportado e deduzido pela Requerente relativo aos serviços jurídicos que adquiriu à “B…”, à “L…” e à “K…”.

*

§4. DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO

            A Requerente alega que “a liquidação praticada padece de total e absoluta falta de fundamentação de direito, na medida em que desta não resultam os critérios utilizados pela AT na análise dos vários serviços e na diferenciação do respetivo tratamento em sede de direito à dedução”, pelo que, estamos perante um ato de liquidação “que, não obstante ter sido validamente notificado, viola o disposto nos artigos 268.º, n.º 3 da CRP e 77.º, n.º 2 da CRP por carecer, na sua totalidade, de fundamentação legal, na medida em que os Serviços de Inspeção se limitaram a apresentar as conclusões da sua análise”, devendo, consequentemente, ser anulado.

A fundamentação é uma exigência dos atos tributários em geral, sendo uma imposição, desde logo, constitucional (cf. art. 268.º, n.º 3, da CRP), mas também legal (cf. art. 77.º da LGT[18]).

Contudo, como referem Paulo Marques e Carlos Costa[19], ao contrário do que acontece no «texto constitucional (artigo 268.º, n.º 3, da Constituição), em que se exige a fundamentação dos actos «quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos», em sede de procedimento tributário (art. 77.º da LGT), não se entendeu restringir a exigência da fundamentação da decisão apenas aos actos desfavoráveis ao contribuinte, embora deva existir maior densidade da fundamentação nestes últimos casos.»

É hoje pacífico na doutrina e na jurisprudência nacionais que a fundamentação exigível tem de reunir as seguintes características: 

  1. Oficiosidade: deve partir sempre da iniciativa da administração, não sendo admissíveis fundamentações a pedido; 
  2. Contemporaneidade: deve ser coeva da prática do ato, não podendo haver fundamentações diferidas ou a pedido; 
  3. Clareza: deve ser compreensível por um destinatário médio, evitando conceitos polissémicos ou profundamente técnicos. Plenitude: deve conter todos os elementos essenciais e que foram determinantes da decisão tomada. Esta característica desdobra-se em duas exigências, a saber: o dever de justificação (normas legais e factualidade – domínio da legalidade) e de motivação (domínio da discricionariedade ou oportunidade, quando é preciso uma valoração). 

Como nos dão conta Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa[20], no âmbito tributário, «o dever de fundamentação dos actos decisórios de procedimentos tributários e dos actos tributários é concretizado no art. 77.º da LGT.

Como o STA vem entendendo, a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa.

Para ser atingido tal objectivo a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.

No presente art. 77.º [da LGT] estende-se o dever de fundamentação a todas as decisões de procedimentos tributários, pelo que ela é obrigatória mesmo nas decisões favoráveis aos sujeitos passivos dos tributos.

Esta exigência compreende-se em face da pluralidade de razões que impõem a exigência de fundamentação dos actos administrativos, que vão desde a necessidade de possibilitar ao administrado a formulação de um juízo consciente sobre a conveniência ou não de impugnar o acto, até à garantia da transparência e da ponderação da actuação da administração e à necessidade de assegurar a possibilidade de controle hierárquico e jurisdicional do acto.»

Ainda segundo estes autores[21], deve a fundamentação «consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, ou numa declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.»

Como preconiza Joaquim Freitas da Rocha[22], a fundamentação – «que, em geral, abrange quer o dever de motivação (i. é, a exposição das razões ou motivos justificativos da decisão, nomeadamente quando existirem espaços discricionários) quer o dever de justificação (ou seja, a referência ordenada aos pressupostos de facto e de direito que suportam essa mesma decisão)» – deve ser feita de forma oficiosa, completa, clara, atual e expressa, tendo em vista «permitir a um “destinatário normal” a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido prelo autor do acto para proferir a decisão. A falta destes requisitos – fundamentações incompletas, obscuras, abstractamente remissivas – bem assim como a falta da própria fundamentação, constitui ilegalidade, susceptível de conduzir à anulação do acto em causa, mediante meios graciosos ou contenciosos.»

Sendo certo que a fundamentação deve ser feita por via da sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, nada impede, todavia, que possa fazer-se por remissão e apropriação de anteriores pareceres, informações e propostas bem como para o relatório da inspeção tributária, como postula o n.º 1 do art. 77.º da LGT., assumindo então a designação de fundamentação por remissão ou por referência (per relationem ou per remissionem), uma vez que está expressa num outro documento. Assim, «devem ter-se por fundamentadas as liquidações derivadas das correcções da inspecção quando do relatório constam as razões dessa correcção e posterior liquidação. Nesse caso, para se saber se o acto da liquidação está ou não fundamentado, não pode o intérprete alhear-se do relatório da inspecção, uma vez que este constitui o culminar de um procedimento que um conceito amplo de liquidação necessariamente comporta. (…)

No plano do procedimento inspectivo tributário, admitindo a modalidade de fundamentação «per relationem» ou «per remissionem», o artigo 63.º, n.º 1, do RCPIT prevê que os actos tributários ou em matéria tributária que resultem do relatório poderão fundamentar-se nas suas conclusões, através da adesão ou concordância com estas, devendo em todos os casos a entidade competente para a sua prática fundamentar a divergência face às conclusões do relatório. (…)

A importância da motivação de facto e de direito constante do procedimento de inspecção tributária, posteriormente absorvida pela decisão tributária, compreende-se tendo em vista que o acto de liquidação stricto sensu representa o culminar e um extenso e complexo procedimento administrativo assente nos actos preparatórios praticados pelos serviços de inspecção tributária que integram o procedimento de liquidação lato sensu (artigo 11.º do RCPIT).»[23]

Ora, se a fundamentação é, nos termos referidos, necessária e obrigatória, tal não pode nem deve ser entendido de uma forma abstrata e/ou absoluta, ou seja, a fundamentação exigível a um ato tributário concreto, deve ser aquela que funcionalmente é necessária para que aquele não se apresente perante o contribuinte como uma pura demonstração de arbítrio.

A este propósito, os nossos tribunais superiores têm vindo a decidir de forma reiterada nos termos que, a título de exemplo e pela completude de análise, passamos a citar do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 04.12.2012 no processo n.º 06134/12 (http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c 3004c6d 7d/f3c7fc013e01b33780257ad0004becee?OpenDocument):

 «A fundamentação é um conceito relativo que pode variar em função do tipo legal de acto administrativo que estamos a examinar.

Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr. ac. S.T.J. 26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág. 57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág. 687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág. 139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr. por todos, ac. S.T.A-1.ª Secção, 6/2/90, A.D., nº. 351, pág. 339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr. art. 125.º do C.P. Administrativo).

Para apurar se um acto administrativo-tributário está, ou não, fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa (cfr. ac. S.T.A.-2.ª Secção, 13/7/2011, rec. 656/11; ac. T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/6/2012, proc. 3096/09).

Se a fundamentação formal não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr. art. 125.º, n.º 2, do C.P. Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. I, Almedina, 1991, pág. 477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. II, Almedina, 2001, pág. 352 e seg.; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág. 381 e seg.; ac. T.C.A.Sul-2.ª Secção, 2/12/2008, proc. 2606/08; ac. T.C.A.Sul-2.ª Secção, 10/11/2009, proc. 3510/09; ac. T.C.A.Sul-2.ª Secção, 19/6/2012, proc. 3096/09).»

Por outro lado, relativamente à fundamentação de direito, o Supremo Tribunal Administrativo «tem decidido que, para que a mesma se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível – entre tantos outros, os acórdãos proferidos pela 1ª Secção do STA em 27/02/1997, em 17/05/1998, e em 28/02/2002, nos processos n.º 36.197, 32.694 e 48071, respectivamente.

Conforme se dá nota no acórdão da Secção do Contencioso Administrativo proferido em 27/05/2003, no proc. n.º 1835/02, «tem sido entendimento deste Supremo Tribunal Administrativo que, na fundamentação de direito dos actos administrativos não se exige a referência expressa aos preceitos legais, bastando a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado – cf. p. ex., os acºs. de 28.02.02, rec. 48.071, de 28.10.99, rec. 44.051 (respectivo apêndice ao Diário da República, pág. 6103), de 8.6.98, rec. 42.212 (Apêndice, pág. 4263), de 7.5.98, rec. 32.694 (Apêndice, pág. 3223) e do pleno de 27.11.96, rec. 30.218 (Apêndice, pág. 828). Mais do que isto, tem sido dito que em sede de fundamentação de direito, dada a funcionalidade do instituto da fundamentação dos actos administrativos, ou seja, o fim meramente instrumental que o mesmo prossegue, se aceita um conteúdo mínimo traduzido na adução de fundamentos que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, possibilitem a referência da decisão a um quadro legal perfeitamente determinado - cf. Ac. pleno de 25.5.93, rec. 27.387 (Apêndice, pág. 309) e acºs. em subsecção de 27.2.97, rec. 36.197 (Apêndice pág. 1515) e supra citados acºs. de 7.5.98, rec. 32.694 e de 28.10.99, rec. 44.051)».

Orientação que, aliás, foi acolhida pelo Pleno daquela Secção, no acórdão de 25/03/93, no proc. n.º 27387, no qual se afirma que o dever de fundamentação fica assegurado sempre que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, a decisão se situe num determinado e inequívoco quadro legal, perfeitamente cognoscível do ponto de vista de um destinatário normal, concluindo-se, assim, que haverá fundamentação de direito sempre que, face ao texto do acto, forem perfeitamente inteligíveis as razões jurídicas que o determinaram.

Donde decorre que, mesmo perante esta corrente jurisprudencial, que sufragamos sem reservas, só em casos muito particulares (como eram, afinal, os analisados nos arestos citados) se pode concluir que um acto se encontra fundamentado de direito apesar de nenhuma referência legal directa existir no texto do acto. E tal só acontece quando, como se explica naquele acórdão de 27/05/2003, se mostrem verificadas duas condições:

«- A primeira é a de que se possa afirmar, inequivocamente, perante os dados objectivos do procedimento, qual foi o quadro jurídico tido em conta pelo acto;

- A segunda é a de que se possa concluir que esse quadro jurídico era perfeitamente conhecido ou cognoscível pelo destinatário, hipotizando-se que o seria por um destinatário normal na posição em concreto em que aquele se encontra.

A segunda condição não funciona sem a primeira, pois esta integra-a. Se não se sabe qual o quadro jurídico efectivamente tido em conta pelo acto, jamais pode ser realizada; e, por isso, é irrelevante que o destinatário possa saber, e até saiba, qual o quadro jurídico que deveria ter sido considerado. O destinatário não se pode substituir nem ao acto nem ao autor do acto. A fundamentação é requisito do acto. E o destinatário tem o direito de saber qual o quadro jurídico que foi levado em consideração, ao abrigo de que regime legal entendeu o autor do acto praticá-lo.».»[24]

Volvendo ao caso dos autos, não se vislumbra qualquer dificuldade em perceber a fundamentação de facto e de direito das correções respeitantes ao IVA suportado e deduzido pela Requerente relativo aos serviços jurídicos por esta adquiridos à “B…”, à “L…” e à “K…”, a qual emerge do Relatório de Inspeção Tributária que subjaz e enquadra a liquidação adicional de IVA impugnada e que pode ser assim sintetizada: subsumindo a factualidade em apreço ao quadro normativo que indica, a AT considerou que tais serviços não apresentam um nexo direto, causal e imediato com as operações económicas da Requerente a jusante, uma vez que estas se reconduzem à prestação de serviços de assessoria em recursos humanos e prestação de serviços de secretariado e apoio administrativo às suas participadas, pelo que não tem direito à dedução do IVA suportado na aquisição desses serviços. 

Ademais, o próprio pedido de pronúncia arbitral é a prova inequívoca de que a Requerente é perfeitamente conhecedora do itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela AT relativamente às ditas correções efetuadas em sede de IVA, conhecendo, pois, as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, o que lhe permitiu optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação e, nesse âmbito, rebater exaustivamente a atuação da AT.           

Pelo exposto, relativamente às preditas correções, não ocorre o invocado vício de falta de fundamentação.

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§5. DO REEMBOLSO DO MONTANTE PAGO E DO PAGAMENTO DE JUROS INDEMNIZATÓRIOS

A Requerente peticiona, ainda, a condenação da Administração Tributária ao reembolso do IVA indevidamente pago, no montante de € 56.735,22 (cinquenta e seis mil setecentos e trinta e cinco euros e vinte e dois cêntimos), acrescido dos respetivos juros indemnizatórios.

            O artigo 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT preceitua que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, restabelecer a situação que existiria adotando os atos e operações necessários para o efeito, o que se deve entender, em conformidade com o disposto no artigo 100.º da LGT, aplicável ex vi alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, como abrangendo o pagamento de juros indemnizatórios, em consonância, aliás, com o disposto no n.º 5 do mesmo artigo 24.º do RJAT.    

            O artigo 43.º, n.º 1, da LGT determina que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”, decorrendo do n.º 2 do mesmo artigo que também se considera “haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efetuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas”; por seu turno, o n.º 5 do artigo 61.º do CPPT, na parte aqui a considerar, determina que os juros são contados “até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos”.

            No caso concreto, tendo ficado comprovado que a Requerente procedeu ao pagamento integral do aludido montante de IVA adicionalmente liquidado pela AT (€ 56.735,22) e que a ilegalidade e anulação parcial da liquidação controvertida, por erro nos pressupostos de facto e de direito, é inteiramente imputável à AT, resulta apodítico que a Requerente tem direito, em conformidade com o disposto nos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, ao reembolso do imposto indevidamente pago e a juros indemnizatórios, na medida do pagamento indevido, nos termos do estatuído nos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT, calculados desde a data do pagamento, à taxa legal resultante do n.º 4 do artigo 43.º da LGT, até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos.

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IV. DECISÃO

Nestes termos, este Tribunal Arbitral decide:

  1. Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à parte da liquidação adicional de IVA n.º 2017 … e correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2017 …, resultante da compensação n.º 2017 …, que tem como pressuposto as correções atinentes ao IVA suportado e deduzido pela Requerente relativo aos serviços que adquiriu à “B…” (com exceção da assessoria jurídica), à “F…”, à “J…” e a I…, com a consequente anulação na parte respetiva;
  2. Julgar parcialmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à parte da liquidação adicional de IVA n.º 2017 … e correspondente demonstração de acerto de contas n.º 2017 …, resultante da compensação n.º 2017 …, que tem como pressuposto as correções referentes ao IVA suportado e deduzido pela Requerente relativo aos serviços jurídicos que adquiriu à “B…”, à “L…” e à “K…”, com a consequente absolvição da Autoridade Tributária e Aduaneira;
  3. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar à Requerente o montante de IVA indevidamente pago, acrescido dos juros indemnizatórios, na medida do pagamento indevido, calculados desde a data do pagamento, à taxa legal, até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos;
  4. Condenar ambas as Partes no pagamento das custas do processo, na proporção dos respetivos decaimentos.

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VALOR DO PROCESSO

Em conformidade com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, é fixado ao processo o valor de 56.735,22 (cinquenta e seis mil setecentos e trinta e cinco euros e vinte e dois cêntimos).

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CUSTAS

Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT e no artigo 4.º, n.º 4, e na Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o montante das custas é fixado em € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, por cujo pagamento são responsáveis ambas as Partes, na proporção de 20% para a Requerente e de 80% para a Autoridade Tributária e Aduaneira.

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Lisboa, 15 de março de 2018.

 

O Árbitro,

 

(Ricardo Rodrigues Pereira)

 

 



[1] Sérgio Vasques, O Imposto sobre o Valor Acrescentado, Coimbra, Almedina, 2015, p. 333.

[2] Xavier de Basto e Maria Odete Oliveira, “Desfazendo mal-entendidos em matéria de direito à dedução de Imposto sobre o Valor Acrescentado: As recentes alterações do artigo 23.° do Código do IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, 2008, p. 38 referem que “O direito a deduzir o imposto suportado nos bens e serviços instrumentais à produção constitui, como é bem conhecido, a peça fundamental do sistema do imposto sobre o valor acrescentado”.

[3] Sérgio Vasques, ob. cit., p. 338.

[4] Neste sentido, os acórdãos SKF (proferido em 29 de outubro de 2009, no processo C-29/08) e Midland Bank (proferido em 8 de junho de 2000, no processo C-98/98).

[5] Neste sentido, os acórdãos Cibo (proferido em 27 de setembro de 2001, no processo C-16/00) e PPG Holdings (proferido em 18 de julho de 2013, no processo C-26/12) do TJUE.

[6] Acórdão proferido em 22 de outubro de 2015, no processo C-126/14.

[7] Neste sentido, os acórdãos Ampafrance e Sanofi (proferido em 19 de setembro de 2000, nos processos C-177/99 e C-181/99), PARAT (proferido em 23 de abril de 2009, no processo C-74/08) e Oasis East (proferido em 30 de setembro de 2010, no processo C-395/09).

[8] Neste sentido, os acórdãos Ecotrade (proferido em 1 de dezembro de 1998, no processo C-200/97), Nidera (proferido em 21 de outubro de 2010, no processo C-385/09), Dankowski (proferido em 22 de dezembro de 2010, no processo C-438/09) e SEM (proferido em 12 de julho de 2012, no processo C-284/11).

[9] Acórdão Barlis 06, proferido em 15 de setembro de 2016, no processo C-516/14 (http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf;jsessionid=9ea7d0f130de4cbe963f930a4b618c12bbd0c4125beb.e34KaxiLc3eQc40LaxqMbN4Pb34Ke0?text=&docid=183364&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=210075).

[10] Sérgio Vasques, ob. cit., pp. 129-130.

[11] Sérgio Vasques, ob. cit., pp. 146-149, 155 e 156.

[12] Xavier de Basto e Maria Odete Oliveira (ob. cit., p. 66) referem que uma holding pura “não se imiscui nas atividades das sociedades em cujo capital participa”; defendem que a simples receção de dividendos e de juros não releva de uma atividade económica, pelo que não se admite o direito à dedução dos inputs utilizados nessas atividades. No mesmo sentido, Rita de la Feria, “A Natureza das Actividades e Direito à Dedução das Holdings em Sede de IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 4, n.º 3, 2012, pp. 171-197, sustenta que preenchidas determinadas condições, considera-se que as sociedades holding interferiram direta ou indiretamente na gestão das participadas e, assim, “deverão ser tidas como tendo realizado actividades económicas para efeitos da Directiva do IVA” (p. 173). Também o Acórdão de 16 de julho de 2015 do TJUE (Larentia and Minerva + Marenave, processos apensos C-108/14 e C-109/14, parágrafos 19 e 20) preconiza que “a mera aquisição e a mera detenção de partes sociais não devem ser consideradas atividades económicas na aceção da Sexta Diretiva, que confiram ao seu autor a qualidade de sujeito passivo, (…) a situação é diferente quando a participação for acompanhada pela interferência direta ou indireta na gestão das sociedades em que se verificou a tomada de participações, sem prejuízo dos direitos que o detentor das participações tenha na qualidade de acionista ou de sócio”.

[13] Mariana Gouveia de Oliveira, “As SGPS e o direito à dedução em sede de IVA”, in Vasques, Sérgio (Coord.), Cadernos IVA 2013, reimpressão da edição de março de 2013, Coimbra, Almedina, maio de 2014, p. 283. 

[14] A questão do reconhecimento do direito à dedução do IVA quando os custos incorridos com os serviços adquiridos fazem parte dos custos gerais do sujeito passivo e, nessa medida, são elementos constitutivos dos preços dos produtos, foi igualmente abordada pelo TJUE nos acórdãos Midland Bank PLC (já citado), Kretztechnik AG (proferido em 26 de maio de 2005, no processo C-465/03), SKF (já citado) e Portugal Telecom (já citado).

[15] Mariana Gouveia de Oliveira, loc. cit., pp. 285-286.

[16] Sérgio Vasques, ob. cit., pp. 156-157.

[17] Neste sentido, Margarida Carragoso, “As regularizações em sede de IVA, face à adoção do método pro rata, exemplificação prática”, Revista Revisores e Auditores, julho-setembro 2013, p. 40, refere que “a primeira fase do processo de dedução do IVA dos sujeitos passivos mistos é a imputação direta, ou seja, faz-se a alocação direta dos inputs às atividades económicas a que se destinam, deduzindo a totalidade do IVA se o input for consumido numa atividade que concede o direito à dedução, ou não deduzindo qualquer parcela de IVA caso a atividade em que esse input é consumido não confira esse direito. Podem subsistir alguns inputs utilizados de forma indistinta ou simultânea, para exercício de atividades que conferem e outras que não concedem o direito à dedução de IVA. Entramos portanto, numa segunda fase do processo em que se inicia a aplicação da norma contida no art.º 23 do CIVA.”

[18] Os números 1, 2 e 6 (únicos que aqui importa considerar) desta norma legal, epigrafada “Fundamentação e eficácia”, estatuem o seguinte:

“1. A decisão do procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.

2. A fundamentação dos atos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.

6. A eficácia da decisão depende da notificação.”   

[19] A liquidação de imposto e a sua fundamentação, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, p. 68.

[20] Lei Geral Tributária, Anotada e Comentada, 4.ª Edição, Editora Encontro da Escrita, Lisboa, 2012, pp. 675-676.

[21] Idem, ibidem.

[22] Lições de Procedimento e de Processo Tributário, 3.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pp. 113-114.

[23] Paulo Marques e Carlos Costa, ob. cit., pp. 146-148.

[24] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 17 de novembro de 2010, no processo n.º 01051/09 (http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/ff9c17cbc43a7807802577e6 0038b110?OpenDocument).