Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 66/2023-T
Data da decisão: 2023-11-10  IVA  
Valor do pedido: € 388.220,10
Tema: Bovinicultura; subvenção directamente relacionada com o preço; taxa de IVA aplicável.
Versão em PDF

  Sumário:

  1. Qualquer entendimento que a AT assuma na interpretação do Direito não gera direitos adquiridos para quem dele beneficia: nada impede que a AT altere esse entendimento, mesmo que não haja boas razões para tal.
  2. Face à literalidade dos requisitos estabelecidos pelo Acórdão do Tribunal de Justiça no proc. C-184/00 (Office des produits wallons ASBL («OPW») v. Estado Belga), os montantes pagos à A... pelos chamados contrastes leiteiros que realiza, por si e por intermédio de terceiros, são susceptíveis de ser considerados subvenções ao preço para efeito do disposto na alínea c) do n.º 5 do artigo 16.º do Código do IVA.
  3. Tendo em conta que, para poderem ser considerados subvenções ao preço, tais valores – necessariamente pagos no quadro de uma relação trilateral (e, portanto, entre uma entidade financiadora, a entidade prestadora de um serviço e um beneficiário deste [por via da diminuição do preço que lhe seria de outro modo imputado]) – se inserem no elenco das acções que as instâncias da União e do Estado Português consideraram ser meritórias de apoio para a Conservação e melhoramento de recursos genéticos animais, não podem as prestações subsidiadas deixar de ser enquadradas no n.º 4.2 da lista I anexa ao CIVA.

 

DECISÃO ARBITRAL

  1. RELATÓRIO

 

  1. No dia 2 de Fevereiro de 2023 a A... (“A...”), NIPC..., com sede na Rua ..., nº ..., ...-... ... (Requerente), apresentou requerimento de constituição de tribunal arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), e 10.º, n.º 1, al. a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT).
  2. Pretendia que fosse declarada a ilegalidade e se procedesse à consequente anulação parcial dos actos de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) com os seguintes números:

Liquidação 2022 ... referente ao período 201903, com um valor a pagar de 20.813,51 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 201906, com um valor a pagar de 27.134,30 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 201909, com um valor a pagar de 29.844,20 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 201912, com um valor a pagar de 23.535,56 €

Liquidação 2022 ...  referente ao período 202001, com um valor a reaver de 10.462,35 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202003, com um valor a pagar de 12.731,89 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202006, com um valor a pagar de 33.399,59 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202009, com um valor a pagar de 29.009,96 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202012, com um valor a pagar de 18.491,83 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202103, com um valor a pagar de 20.112,97 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202106, com um valor a pagar de 27.923,44 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202109, com um valor a pagar de 29.192,11 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202112, com um valor a pagar de 14.161,78 €

  1. Pretendia igualmente que fosse declarada a ilegalidade e se procedesse à consequente anulação das demonstrações de liquidação de juros com os seguintes números:

Liquidação 2022 ... referente ao período 201903, com um valor a pagar de 3.630,79 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 201906, com um valor a pagar de 3.829,11 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 201909, com um valor a pagar de 3.785,85 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 201912, com um valor a pagar de 2.460,59 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202003, com um valor a pagar de 1.779,85 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202006, com um valor a pagar de 3.198,40 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202009, com um valor a pagar de 2.494,85 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202012, com um valor a pagar de 1.680,87 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202103, com um valor a pagar de 1.405,47 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202106, com um valor a pagar de 1.374,16 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202109, com um valor a pagar de 1.123,94 €

Liquidação 2022 ... referente ao período 202112, com um valor a pagar de 549,93 €

  1. Tudo no montante de € 388.220,10 € (trezentos e oitenta e oito mil, duzentos e vinte euros e dez cêntimos).
  2. Nomeados os presentes árbitros, que aceitaram a designação no prazo aplicável, e não tendo a Requerente, nem a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT ou Requerida), suscitado qualquer objecção, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 12 de Abril de 2023.
  3. Seguindo-se os normais trâmites, em 17 de Maio a AT apresentou resposta e protestou juntar o processo administrativo (PA).
  4. Em 22 de Maio, foi proferido despacho a determinar a indicação dos pontos da matéria de facto sobre os quais a Requerente pretendia que as testemunhas fossem ouvidas.
  5. Por despacho de 16 de Junho, foi agendada para o subsequente dia 30 a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.
  6. Em 30 de Junho foram ouvidas as testemunhas arroladas, B..., Secretário-Geral da D..., e C..., Assessor Financeiro da D... e, entre o mais, foi fixado um prazo para alegações simultâneas até ao dia 1 de Setembro de 2023 e prorrogado o prazo para a decisão até ao dia 12 de Outubro de 2023.
  7. Só a AT apresentou alegações, remetendo para a anterior Resposta.
  8. Nos dias 11 e 12 de Setembro o Tribunal determinou, por despacho, a junção do Processo Administrativo que a Requerida tinha protestado juntar.
  9. Nesse mesmo dia 12, a Requerida apresentou os Relatórios de Inspecção Tributária (RIT), emitidos em cumprimento das Ordens de Serviço externas ns. OI2022..., OI2022... e OI2022..., correspondentes aos períodos de tributação de 2019, 2020 e 2021.
  10. No dia 20 de Setembro a Requerente atravessou requerimento a reclamar da falta dos respectivos processos administrativos e a solicitar recurso ao “ao disposto no artigo 110º, nº 5, do CPPT, aplicável por força do artigo 17º, nº 2, do RJAT.
  11. No dia 6 de Outubro, em requerimento que fazia menção a “que se trata da falta dos anexos”, a AT solicitou que lhe fosse fixado prazo “para solicitar aos Serviços informação e todos os elementos que eventualmente se mostrem em falta nos presentes autos”.
  12. No dia 9 foi proferido novo despacho arbitral, a fixar um prazo de 10 dias para que a AT juntasse aos autos quaisquer elementos em falta e – por assim ficar impossibilitado o cumprimento do prazo fixado no n.º 1 do artigo 21.º do RJAT para a prolação da decisão – a prorrogar o prazo para prolação da decisão nos termos e ao abrigo do n.º 2 do artigo 21.º do RJAT.
  13. Nesse mesmo dia 9 de Outubro, a Requerente veio aos autos fazer notar que o que estava em falta eram “o(s) processo(s) administrativo(s), no seu todo e organizado(s), como é da natureza de um processo”.
  14. No dia 18 de Outubro, a AT juntou todos os elementos referentes às Ordens de Serviço externas ns. OI2022..., OI2022... e OI2022... .

 

 

  1. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

 

  1. O tribunal arbitral foi regularmente constituído e o pedido de pronúncia contém-se no âmbito das suas atribuições.
  2. Requerente e Requerida gozam de personalidade e de capacidade judiciárias, são legítimas, e encontram-se regularmente representadas.
  3. Não foram invocadas excepções ao conhecimento de mérito, nem o Tribunal as divisou.

 

  1. MATÉRIA DE FACTO

III.1. FACTOS PROVADOS

  1. A A... é uma associação técnica de interesse público sem fins lucrativos, constituída em 13 de Junho de 1992, da qual foram fundadores a Direção Geral de Pecuária, a Direção Regional de Agricultura de entre Douro e Minho, a Direção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes, a E... (E...) e a I..., UCRL (I... UCRL);
  2. Tem por objeto “o melhoramento e rendibilidade dos efetivos bovinos leiteiros, designadamente através da introdução e divulgação de novas tecnologias, formação profissional e prestação de serviços aos criadores”, devendo, segundo os seus estatutos, “compatibilizar os seus programas de ação com a satisfação das necessidades dos agricultores e com as orientações da política comum para o setor” (artigo 2.º);
  3. Em resultado de uma reorganização do Ministério da Agricultura, a Direção Geral de Pecuária, a Direção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho e a Direção Regional de Agricultura de Trás-os-Montes deixaram a associação em 1998;
  4. Em 17 de Junho de 1999, a E..., a A... e as outras associações com áreas geográficas de atuação distintas (F...; G...), constituíram a H..., que é também ela uma associação sem fins lucrativos;
  5. A partir de data não apurada, as candidaturas a fundos comunitários passaram a só poder ser apresentados por uma única entidade por raça bovina, o que impedia que cada uma das referidas associações solicitasse, por si só, apoios para a sua actividade de melhoramento genético;
  6. A H... tem como objecto “promover, nomeadamente mediante a celebração de protocolos com os competentes organismos do Estado, o melhoramento e a rendibilidade dos efetivos bovinos leiteiros, através das seguintes ações específicas:
  1. Promover o desenvolvimento e o apoio às ações do contraste leiteiro e do livro genealógico;
  2. Estabelecer e coordenar os programas de melhoramento genético em bovinos leiteiros, bem como gerir os recursos provenientes desses programas;
  3. Centralizar toda a informação zootécnica, promovendo a sua divulgação, e disponibilizar os elementos necessários à avaliação genética dos efetivos;
  4. Colaborar, com as suas associadas, no desenvolvimento de outros serviços de apoio à produção;
  5. Gerir o sistema informático referente às suas funções;
  6. Gerir os recursos financeiros disponibilizados pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas para as ações que lhe estão cometidas de acordo com a legislação em vigor;
  7. Promover o desenvolvimento do Programa Nacional de Testagem de Reprodutores da raça Frísia e a utilização dos reprodutores nacionais” (Artigo 4.º dos Estatutos da H...);
  1. A H... celebrou, na própria data da sua constituição (17 de Junho de 1999) um protocolo de colaboração com a Direção-Geral de Veterinária que tinha por objecto a “definição de um quadro normativo de colaboração institucional entre a H... e a DGV, que favoreça um adequado desenvolvimento, coordenação e execução dos programas de melhoramento genético dos efetivos leiteiros e possibilite a recolha, tratamento, divulgação e disponibilização de informação zootécnica pela H... aos criadores e à DGV” (Cláusula 1.ª) e que se baseava “no princípio da transferência de funções da DGV para a H..., com integral observância, por ambas as partes, das funções definidas no ANEXO I e na avaliação do desempenho dessas funções, através de auditorias de acompanhamento de sistema e de controlo (…) realizadas diretamente pela DGV ou por entidades externas para o efeito mandatadas” (Cláusula 2.ª);
  2. As funções cometidas à H... nesse Anexo são as seguintes:

1. Promover o desenvolvimento, coordenação e a execução das ações constantes do programa de melhoramento do efetivo leiteiro em todo o Território Nacional, aprovado pela DGV, conforme identificadas no ANEXO II.

2. A alimentação e manutenção de uma base de dados nacional, com todos os elementos relativos as ações de melhoramento, cuja informação deverá ser convenientemente tratada, transferindo-a, em condições técnicas a definir para o SNIRB[[1]].

3. Disponibilizar a informação zootécnica obtida, necessária à avaliação genética dos reprodutores, aos seus criadores e à DGV.

4. Elaborar e apresentar à DGV, trimestralmente, relatórios técnicos e financeiros de execução das ações desenvolvidas.

  1. E as acções que a Cláusula 3.ª do Protocolo e o seu Anexo II consideravam poder promover o melhoramento do efetivo leiteiro eram

1. Identificação animal

2. Registo genealógico

3. Classificação morfológica

4. Testes de paternidade

5. Contraste leiteiro

6. Análises laboratoriais

7. Processamento informático dos dados obtidos e sua transferência para o SNIRB”;

  1. Na Cláusula 4.ª do Protocolo prevê-se que o exercício das funções nele integradas “poderá implicar a comparticipação pela DGV, das despesas efetuadas pela H..., no âmbito da execução do programa aprovado, sendo globalmente aprovado, para cada ano, o respetivo valor e número de ações a realizar”;
  2. A Cláusula 5.ª do Protocolo vincula a H... a apresentar à DGV, até 31 de Outubro de cada ano, um plano de actividades do qual deverão constar a natureza e quantificação das acções a realizar;
  3. A H... celebrou com a A..., em 28 de Dezembro de 1999, um outro Protocolo que reconhecia que o exercício pela H... das funções delegadas pela DGV “nomeadamente o desenvolvimento e a coordenação de um Programa Nacional de Melhoramento Genético dos Bovinos Leiteiros, implica uma colaboração perfeita entre as associações responsáveis pela realização e/ou coordenação das ações que lhe estão subjacentes” e que, especificamente para os bovinos da raça frísia, isso “passa pelo conhecimento das potencialidades dos efetivos de que se dispõe e pela sua reprodução controlada, de modo a obter-se nas gerações subsequentes os indivíduos julgados mais capazes” (Preâmbulo);
  4. Cabendo à H..., nos termos do disposto na Cláusula 2.ª desse Protocolo, “a manutenção de uma base de dados nacional, onde constem todos os elementos relativos à produção, reprodução e carateres morfológicos dos bovinos da raça Frísia, das explorações que voluntariamente submetam os seus efetivos às acções do Contraste Leiteiro e Livro Genealógico”, assegurando à A... o acesso a tal base de modo a possibilitar “o registo da informação decorrente das ações que promove no âmbito das suas funções de responsável pela realização do Contraste Leiteiro e identificação de crias para inscrição no Livro Genealógico” (Cláusula 3.ª), devendo a H... promover os “desenvolvimentos informáticos (...) necessários à prossecução das funções cometidas à A... no âmbito do melhoramento genético da raça bovina Frísia” (Cláusula 4.ª);
  5. E cabendo à A... a realização das “acções decorrentes das suas funções como responsável pela realização do Contraste Leiteiro e identificação de crias para inscrição no Livro Genealógico na sua área de influência” (Cláusula 5.ª), bem como “o registo na base de dados nacional da informação recolhida nas ações que realiza no âmbito do melhoramento genético da raça bovina Frísia” (Cláusula 6.ª);
  6. A Portaria n.º 268/2015, de 1 de Setembro, estabelece o regime de aplicação do apoio da Sub-Acção 7.8.3 “Conservação e melhoramento de recursos genéticos animais”, da medida n.º 7, “Agricultura e recursos naturais”, do “Programa Comunitário Específico do PDR 2020” financiados pelo FEADER (Fundo Europeu Agrícola e Desenvolvimento Rural);
  7. O artigo 11.º da Portaria prevê, para as pessoas colectivas constituídas ao abrigo dos artigos 167.º e seguintes do Código Civil, que tenham a seu cargo a gestão de livros genealógicos ou fundadores um “apoio concedido anualmente, sob a forma de subvenção não reembolsável”, que “assume a modalidade de custos forfetários baseados numa taxa de apoio de acordo com o anexo V.”;
  8. Nos termos do anexo V dessa Portaria:

- as inscrições no livro genealógico da raça Frísia, no montante de 1,10€ por cada inscrição, são custeadas a 100%;

- os registos de paternidade provenientes das inseminações artificiais da raça Frísia, no montante de 0,38€ por cada registo, são custeadas a 60%; e

- o contraste leiteiro da espécie bovina, no montante de 28,00€ por cada animal da raça Frísia que perfaça o período mínimo completo de lactação (210 dias no ano), é custeado a 60%;

  1. Nos termos do artigo 18.º da Portaria, os relatórios de execução do programa são apresentados à DGAV até 28 de Fevereiro do ano subsequente e avaliados por esta até 31 de Março seguinte;
  2. Após a execução das acções pela A..., a H... recebe trimestralmente do IFAP - Instituto de Financiamento da Agricultura e Pesca os apoios respeitantes às inscrições no livro genealógico, aos registos de paternidade provenientes das inseminações artificiais e ao contraste leiteiro e transfere-os integralmente para a A...;
  3. Cada pedido de pagamento ao IFAP é instruído pela H... com o reporte das acções efectivamente realizadas pela A..., que formam o corpo do programa apresentado com a candidatura aprovada pela DGAV;
  4. A A... regista-os na sua contabilidade como subsídios à exploração (Conta 75 – Subsídios à exploração, subrubrica 7511 – Subsídios do Estado e Outas Entidades);
  5. A A... nada cobra aos criadores pelas tarefas que visam as inscrições no livro genealógico e os registos de paternidade provenientes das inseminações artificiais;
  6. Além das informações inerentes ao “serviço base” do contraste leiteiro – dados referentes ao volume e tempo de produção de leite, e dos seus níveis de proteína e de gordura – a recolha de dados permite apurar outros indicadores importantes para a gestão da alimentação ou dos cuidados de saúde a ter com cada animal (vg: níveis de ureia, acetose, glicoproteínas, células altas) que são facultados aos criadores mediante pagamento; 
  7. Pelas tarefas inerentes ao contraste leiteiro – subvencionadas ou não –, a A... cobrava aos produtores (ou às cooperativas em que estes se associam) um valor de 0,75€[2], que se reduzia para 0,375€ no caso de o contraste ser realizado junto de cooperadores de cooperativas que integram a União de Cooperativas I... UCRL (pagando esta a diferença);
  8. Ainda que o faça residualmente, a A... cobra os mesmos valores pela execução do contraste leiteiro de quaisquer vacas, mesmo que não sejam certificadamente da raça Frísia, e cobra-os mesmo que tais vacas não atinjam os 210 dias de lactação, e que, portanto, não sejam elegíveis para pagamento da subvenção;
  9. Pela prestação desse serviço, a A... liquida IVA nas respetivas facturas à taxa de 6%, ao abrigo do n.º 4.2 da lista I anexa ao Código do IVA;
  10. O serviço pago aos agentes contrastadores pela recolha do contraste leiteiro é de €0,75 por unidade e a da respetiva análise laboratorial do contraste de €0,60, sendo que em ambos os serviços acresce IVA à taxa normal;
  11. Para além do apoio dos 50% (0,375€) pago pela I... como compensação da redução de preço do contraste leiteiro cobrado pela A... aos produtores I..., o apoio faturado pela A... à I... contempla ainda um valor[3] por cada vaca seca da raça Frísia, ou seja, por lactação completa (que se refere ao espaço temporal de aproximadamente 210 dias);
  12. Sobre essa contraprestação é liquidado IVA à taxa normal (23%);
  13. Além de um montante[4] por vaca seca, o serviço pago às cooperativas e aos agentes contrastadores exteriores à A... pela recolha dos dados do contraste leiteiro é de 0,75€ por unidade, a que acresce IVA à taxa normal (23%);
  14.  O custo da análise laboratorial, seja qual for o canal de recolha (meios próprios da A..., agentes contrastadores e cooperativas) é de 0,60€, a que acresce IVA à taxa normal (23%);
  15. Segundo os RIT, nos anos examinados a A... apresentou os seguintes custos com agentes contrastadores:

- 2019: 112.239,04€;

- 2020: 119.839,10€; e

- 2021: 99.138,47€;

  1. Segundo os RIT, nos anos examinados a A... apresentou os seguintes custos com pagamentos a cooperativas pelos referidos serviços:

- 2019: “aproximadamente 267.460,00€”;

- 2020: “aproximadamente 273.705,49€”; e

- 2021: “aproximadamente 329.155,24€”;

  1. Segundo os RIT, nos anos examinados a A... apresentou os seguintes montantes nas respectivas declarações periódicas de IVA:

- 03 2019 - base tributável de 48.664,17€ (21.365,33€ à taxa reduzida e 24.838,74€ à taxa normal)

- 06 2019 - base tributável de 37.163,03€ (16.458,83€ à taxa reduzida e 20.695,00€ à taxa normal)

- 09 2019 - base tributável de 31.052,84€ (11.768,67€ à taxa reduzida e 18.824,17 € à taxa normal)

- 12 2019 - base tributável de 60.170,08€ (25.895,17€ à taxa reduzida e 34.274,91€ à taxa normal)

- 03 2020 - base tributável de 24.414,13€ (10.046,00€ à taxa reduzida e 14.368,13€ à taxa normal)

- 06 2020 - base tributável de 48.664,17€ (16.648,17€ à taxa reduzida e 25.905,04€ à taxa normal)

- 09 2020 - base tributável de 31.235,35€ (10.867,83€ à taxa reduzida e 20.367,52€ à taxa normal)

- 12 2020 - base tributável de 67.113,13€ (29.569,00€ à taxa reduzida e 33.347,13 € à taxa normal)

- 03 2021 - base tributável de 109.771,16€ (18.759,13€ à taxa reduzida, 20.812,03€ à taxa normal e 70.200,00€ de operações isentas)

- 06 2021 - base tributável de 42.222,70€ (17.234,32€ à taxa reduzida e 24.988,38€ à taxa normal)

- 09 2021 - base tributável de 29.350,11€ (11.081,37€ à taxa reduzida e 18.268,74€ à taxa normal)

- 12 2021 - base tributável de 67.295,28€ (26.762,37€ à taxa reduzida e 39.990,87€ à taxa normal);

  1. A AT levou a cabo ações inspectivas de âmbito parcial em IVA, dirigidas aos períodos de tributação de 2019, 2020 e 2021, em cumprimento das Ordens de Serviço externas ns. OI2022..., OI2022... e OI2022..., respectivamente, que deram origem às liquidações impugnadas nos presentes autos em função do apuramento de imposto que constava dos quadros 9 de cada um dos RIT, e que abaixo se reproduzem:

2019:

 

 

2020:

 

2021:

 

 

            III.2. FACTOS NÃO PROVADOS

            Tendo em conta as posições – e as pretensões – da Requerente e da Requerida e, consequentemente, a matéria relevante para a decisão da presente causa, não houve insuficiência de prova.

O que não se provou – porque não tinha sido alegado – foi que a Requerente tenha pago alguma das importâncias apuradas nas liquidações impugnadas. Como não foi peticionada a devolução de qualquer importância, nem o pagamento de juros – e, portanto, isso não é relevante para nada do que o Tribunal tinha de decidir – tal não pode ser considerado, porém, um facto não provado.

 

            III.3. FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO EM MATÉRIA DE FACTO

Os factos dados como provados resultam dos documentos disponíveis nos autos, do acordo das Partes ou do depoimento das testemunhas que foi esclarecedor e convincente e, atento o que esteve em causa, sem razões para o não ser.

 

  1. DIREITO

IV.1. Questões a decidir

A primeira questão a decidir é a da qualificação da subvenção que é paga à Requerente, que esta considera um subsídio à exploração, mas que a AT, alterando o entendimento que anteriormente mantivera, passou a configurar, em parte[5], como uma subvenção ao preço para efeito do disposto na alínea c) do n.º 5 do artigo 16.º do Código do IVA.

Caso não proceda a tese da Requerente, haverá que qualificar a natureza da sua actividade para efeito de determinação da taxa de IVA aplicável, que a Requerente considera, então, dever ser abrangida na alínea f) (“assistência técnica”) da verba 4.2 (“Prestações de serviços que contribuem para a produção agrícola e aquícola ”) da Lista I anexa ao Código do IVA (“BENS E SERVIÇOS SUJEITOS A TAXA REDUZIDA”), ao contrário da AT, que entende ser de aplicar a taxa normal.

 

 

IV.2. Direito aplicável quanto à primeira questão decidenda

 

            A actualmente vigente Directiva IVA[6], prevê no Capítulo 2 (“Entregas de bens e prestações de serviços”) do seu Título VII (“Valor Tributável”), artigo 73.º, o seguinte:

Nas entregas de bens e às prestações de serviços, que não sejam as referidas nos artigos 74.º a 77.º, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções relacionadas com o preço de tais operações.”.

Na Ordem Jurídica interna, o artigo 16.º do Código do IVA estabelece – em conformidade, mas com duas notas adicionais – o seguinte:

            “Valor tributável nas operações internas

1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 2, o valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto é o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente, do destinatário ou de um terceiro.

(…)

5 - O valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços sujeitas a imposto, inclui:

(…)

c) As subvenções diretamente conexas com o preço da cada operação, considerando como tais as que são estabelecidas em função do número de unidades transmitidas ou do volume dos serviços prestados e sejam fixadas anteriormente à realização das operações;

(…)”.

 

 

IV.3. Posição da Requerente quanto à primeira questão decidenda

 

Depois de proceder ao relato da sua criação e actividade, a Requerente invocou, essencialmente:

  1. Que sempre contabilizou os apoios pagos pelo IFAP através da H... como subsídios à exploração, seguindo o entendimento do despacho de 15 de Outubro de 1991 do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (que juntou como doc. 7), o que foi sempre aceite por anteriores inspecções da AT (como comprovado pelo relatório notificado com data de 28 de Maio de 2004, que juntou como doc. 8);
  2. Que a AT adicionou à base tributável com taxa normal de cada um dos períodos objecto de inspecção 77% dos valores dos fundos correspondentes às acções realizadas, considerando que nos fundos recebidos pela A... uma parte – 23% – corresponderia ao imposto (IVA) sobre eles incidente, à taxa normal;
  3. Que, nos Relatórios de Inspecção Tributária (RIT), a AT considerou que “apesar das ações subsidiadas se inserirem no projeto apresentado pela H..., não podem ser dissociados dos serviços faturados pela A..., nomeadamente no âmbito do contraste leiteiro, pois, “não obstante o contraste leiteiro ser comparticipado por lactação concluída da raça frísia, é atingível que o serviço faz parte integrante do serviço/ação subsidiada de contraste leiteiro”;
  4. Que “como verificou que “o preço do serviço de contraste leiteiro faturado pela A... ... é em muito inferior aos gastos suportados com o referido serviço”, concluiu que as subvenções se relacionariam diretamente com o preço das operações realizadas pela A...,”;
  5. Que, porém, “As subvenções de que a A... beneficia para ações de inscrição no livro genealógico, registos de paternidade provenientes de inseminações artificiais e contraste leiteiro, não lhe são especificamente pagas para que forneça serviços a terceiros...
  6. Que “O preâmbulo e o artigo 2º da Portaria nº 268/2015 permitem concluir que as subvenções visam apoiar o desenvolvimento de ações em benefício da agricultura e da alimentação humana, não tendo por fim proporcionar aos agentes económicos junto dos quais essas ações são desenvolvidas um acesso facilitado, por via de um preço reduzido.”;
  7. Que “Como se lê no citado acórdão OPW do TJUE, invocado pela AT, “o simples facto de uma subvenção poder ter influência sobre os preços dos ... serviços prestados pelo organismo subvencionado não basta para a tornar tributável”.”;
  8. Que “Para que a subvenção esteja diretamente relacionada com o preço das operações, é necessário, além disso, “que seja especificamente paga ao organismo subvencionado para que este ... preste um serviço determinado”.”;
  9. Que “para que se possa dizer diretamente relacionada com o preço das operações, a subvenção deve ser concedida para que o sujeito passivo subvencionado beneficie com preços mais baixos os destinatários dos serviços que presta”;
  10. Que “As subvenções reguladas na Portaria nº 268/2015 são verdadeiros subsídios de funcionamento, como se alcança dos artigos 8º e 11º, nº 2, que dispõem que “São elegíveis as despesas relacionadas com as ações constantes do anexo V ...” e que “O apoio assume a modalidade de custos forfetários, baseados numa taxa de apoio de acordo com o anexo V ...””;
  11. Que isso é “confirmado no ponto 2.4 da já aludida Orientação Técnica Específica do Guia do Beneficiário para a Operação 7.8.3 – Conservação e Melhoramento dos Recursos Genéticos Animais do PDR 2014-2020.”:
  12. Que “As ditas subvenções estão certamente relacionadas com os custos de execução das ações apoiadas, mas não estão (pelo menos diretamente, como a lei exige) relacionadas com o preço da prestação de determinados serviços.”;
  13. Que “Cotejando a realidade com os quatro pressupostos de que depende a tributação das subvenções na interpretação que a AT faz do acórdão OPW, logo se verifica a falta dos dois primeiros: nem as subvenções se inserem numa relação triangular – pois quem as concede abstrai totalmente da prestação de qualquer serviço –, nem (consequentemente) a sua concessão se relaciona diretamente com o preço de operações a realizar por quem as recebe.”;
  14. Que “a relação direta entre a subvenção concedida e o preço da operação implica que a tributação só se pode verificar na exata medida em que se dê a diminuição do preço por efeito da subvenção”, “Como o advogado-geral várias vezes sublinhou perante o TJUE e este consagrou na sua jurisprudência – RUI LAIRES, O Tratamento em IVA das Subvenções na Legislação e na Jurisprudência Comunitária, CTF, 2007, pp. 40-41 e 43-44.
  15. Que essa medida “no caso vertente, estaria sempre totalmente por demonstrar, sabendo-se que a A... cobra pelo contraste leiteiro exatamente o mesmo valor quer a vaca seja de raça Frísia ou não e quer atinja ou não o período mínimo de lactação.”;
  16. Que “cobra dos produtores exatamente o mesmo valor independentemente de a ação de contraste leiteiro se incluir ou não nas ações subvencionadas.”;
  17. Que “a subvenção não ocasiona qualquer discriminação no mercado por motivos fiscais, não distorce a concorrência e não belisca minimamente a neutralidade que o imposto deve respeitar.”;
  18. E que, portanto, “As liquidações em crise assentaram num erro sobre os pressupostos de facto, de que resultou a atribuição às subvenções recebidas pela A... e às operações que esta realiza de caraterísticas e destinatários que não têm (…)”;
  19. Acrescentou ainda que a posição da AT passou, a partir da decisão final no procedimento inspectivo (subsequentemente ao exercício do direito de audição da Requerente), a ser, em parte, contraditória, quando passa da primeira questão decidenda (em que afere os requisitos sujeição a IVA da subvenção da prestação do serviço aos produtores) para a segunda (em que afere a taxa aplicável em função do que diz ser uma prestação indivisível aos produtores e à H...).

 

 

IV.4. Posição da Requerida quanto à primeira questão decidenda

 

Em resposta, quanto à primeira questão decidenda – a saber, a qualificação dos montantes recebidos pela A... como uma subvenção ao preço para efeito do disposto na alínea c) do n.º 5 do artigo 16.º do Código do IVA – a Requerida começou por enumerar os critérios identificados pelo Acórdão do Tribunal de Justiça proferido em 22 de Novembro de 2001 no proc. C-184/00 (Office des produits wallons ASBL («OPW») v. Estado Belga), e que os RIT tinham apresentado assim:

Estabelece o TJUE neste acórdão quatro pressupostos para que as subvenções possam ser tributadas, nomeadamente:

1º pressuposto – A atribuição de uma subvenção por uma entidade pública deve estar inserida num contexto triangular (autoridade que concede, organismo que dela beneficia e o destinatário dos bens/serviços);

2º pressuposto - Assenta na necessidade de a subvenção estar diretamente relacionada com o preço da operação a realizar pelo organismo que recebe a subvenção. Para tanto é necessário que aquela subvenção seja especificamente paga ao operador para que este forneça um bem ou preste um serviço determinado.

3º pressuposto – Está relacionado com o momento em que deve ser determinado o preço do bem ou serviço, para que a subvenção seja considerada como contraprestação. O preço do bem ou do serviço deve ser determinado o mais tardar até ao momento em que ocorre o facto gerador.

4º pressuposto – Assenta no compromisso entre quem concede a subvenção e quem a recebe. O acórdão refere-se que: «[…] o compromisso de pagar a subvenção assumido por aquele que a concede tem como corolário o direito de receber reconhecido ao beneficiário quando a operação tributável foi realizada por este.».”.

 

A AT considerou que, no caso, todos esses requisitos estavam preenchidos. Fê-lo, por um lado, por reprodução das conclusões dos RIT[7]:

Quanto ao primeiro pressuposto, a existência de um nexo direto entre a subvenção e os serviços, na qual resulta uma relação triangular, a mesma encontra-se preenchida na medida em que a subvenção é concedida por uma autoridade no contexto de uma relação triangular entre a autoridade de gestão PDR2020 (Programa de Desenvolvimento Rural 2020) a REQUERENTE (sujeito passivo que beneficiou do subsídio) e o utilizador/destinatário do serviço prestado pela REQUERENTE, isto é, produtores e H... .

Quanto ao segundo pressuposto, verifica-se que a subvenção concedida teve por referência, concreta e específica as ações a realizar, nomeadamente o número de contrastes leiteiros, de registo no livro genealógico e de registos de paternidade, pelo que a subvenção recebida foi especificamente concedida para realização daquelas ações. Assim, o preço das operações que a REQUERENTE realiza quanto às ações subsidiadas, está intrinsecamente relacionado com a subvenção auferida.

O terceiro pressuposto encontra-se igualmente verificado na medida em que a candidatura apresentada, assenta num projeto, onde são identificadas ações a desenvolver pela REQUERENTE, detalhando-as por valor unitário, quantidades/ano, custo globais e nível de apoio percentual (ver Quadro 7). Refira-se que, se tais serviços descritos na submissão da candidatura não fossem realizados, não lhes seria concedido o direito a receber essas importâncias concedidas a título de subvenções.

No que respeita ao quarto pressuposto e de acordo com o definido na portaria que regula o programa, nos artigos 17º e 18º, a execução dos programas, são avaliados anualmente (até dia 31 de março) pela DGAV de acordo com os relatórios de execução apresentados pela entidade beneficiária.

Quanto à formalidade de pagamento da subvenção, apurou-se que o mesmo é pago pelo IFAP (Instituto da Financiamento de Agricultura e Pesca), com base na apresentação de pedido de pagamento que tem como suporte o reporte das ações efetivamente realizadas pela REQUERENTE. Refere ainda a portaria, no artigo 19º, que as entidades beneficiárias podem apresentar quatro pedidos de pagamento anuais, reportando as ações realizadas.

Com base nos documentos de suporte à contabilidade, foi possível verificar que os pedidos e pagamento são efetuados trimestralmente com base nos relatórios de execução das ações apresentados. Assim, é evidente, que o direito da REQUERENTE receber a subvenção está condicionado à realização das ações.”.

            Por outro lado, desenvolvendo uma argumentação paralela a esta, e invocando o tratamento doutrinário proposto por Rui Laires (“O Tratamento em IVA das Subvenções na Legislação e na Jurisprudência Comunitária”, Ciência e Técnica Fiscal, 2007, n.º 419, 7-88), jurisprudência da União Europeia (além do já referido Acórdão OPW, também o Acórdão de 13 de Junho de 2002, caso KNW, proc. C-353/00), o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Outubro de 2020, proc. n.º 09/19.0BEPDL, e anteriores decisões arbitrais (processos ns. 339/2015-T e 589/2019-T) fê-lo, em termos ligeiramente diferentes, nos seguintes termos:

relativamente à primeira condição ou pressuposto, resulta dos elementos dos autos que a subvenção em análise é concedida por uma autoridade pública, no contexto de uma relação triangular, entre a autoridade de gestão, PDR 2020 (Programa de Desenvolvimento Rural 2020), a Requerente (sujeito passivo que beneficiou do subsídio) e o utilizador/destinatário do serviço prestado pela Requerente isto é, os produtores e a H..., donde, deve entender-se verificado este pressuposto.

(…)

verifica-se que a subvenção em análise foi concedida tendo por referência as ações específicas a realizar pela Requerente, designadamente o número de contrastes leiteiros, de registo no livro genealógico e de registos de paternidade, conforme factos atrás mencionados e detalhadamente referidos nos RIT, pelo que também este pressuposto se deve considerar verificado.

(…)  tem que haver um nexo direto entre a subvenção e o preço das operações (…)

Tal nexo existirá quando o preço do bem seja determinável, quanto ao seu princípio, o mais tardar, no momento em que ocorre o facto gerador.

(…)

relativamente ao terceiro pressuposto ou condição, o mesmo verifica-se também, uma vez que a subvenção permite à Requerente praticar preços inferiores ao que exigiria na falta de subvenção, porquanto, na candidatura apresentada, são identificadas ações a desenvolver pela Requerente, detalhando-as por valor unitário, quantidades/ano, custo globais e nível de apoio percentual (ver Quadros 7 dos RIT).

(…) se tais serviços descritos na submissão da candidatura não fossem realizados, não lhes seria concedido o direito a receber essas importâncias concedidas a título de subvenções, donde resulta, inequivocamente, que a fixação das ações/serviços a prestar foi efetuada previamente à realização dessas mesmas ações/serviços.

(…)

Quanto à formalidade de pagamento da subvenção, apurou-se que o mesmo é pago pelo IFAP (Instituto da Financiamento de Agricultura e Pesca), com base na apresentação de pedido de pagamento que tem como suporte o reporte das ações efetivamente realizadas pela Requerente.

 

IV.5. Decidindo a primeira questão

 

Ainda que a definição dos elementos de que depende a caracterização de uma subvenção como subvenção ao preço para efeito do disposto na alínea c) do n.º 5 do artigo 16.º do Código do IVA seja uma questão de Direito, o juízo sobre o preenchimento de cada um dos elementos caracterizadores (na identificação dos quais coincidem Requerente e Requerida) constitui um juízo de facto.

No que diz respeito a duas das acções – ou eixos de intervenção – desenvolvidas pela A... o problema não se põe: em relação às inscrições no Livro Genealógico, como em relação aos registos de paternidade provenientes de inseminações artificiais, quem fixou o “preço”, foi o Secretário de Estado da Agricultura (pela Portaria n.º 268/2015)[8]. Quer dizer que a questão da interferência da subvenção com a fixação dos preços tem de depender inteiramente da sua repercussão nos valores cobrados pelas actividades subvencionadas do contraste leiteiro, que representam o essencial da actividade coberta pela subvenção e, por consequência, o grosso dos custos da A... e que só têm uma componente fixada: a que representa o apoio por animal.

Contrariamente ao que concluíram os RIT, a partir dos valores cobrados aos produtores por cada operação de contraste (0,75€) – a componente do preço que não está fixada na Portaria – e da sua comparação com os pagamentos realizados a agentes contrastadores/cooperativas (0,75€) e ao laboratório que apura os resultados (0,60€) – mais “os gastos com equipamento em material que é fornecido pela A..., os gastos associados à recolha e transporte das amostras, aos serviços de tratamento da informação e disponibilização da mesma.” – não se podia concluir que tal preço era inferior ao custo. E não se podia assim concluir por, pelo menos, três razões:

- por um lado, esses montantes são apenas as componentes variáveis de cada serviço, sendo que, segundo os RIT, a A... recebe – e paga – um outro montante por animal abrangido: recebe por lactação concluída da raça Frísia, 18,50€[9], e paga 9,50€ aos agentes contrastadores e 9,80€ às cooperativas que asseguram esse serviço (alínea dd) – e respectiva nota – dos Factos Provados); portanto, a diferença positiva por animal (de 8,50€ num caso e de 8,20€ no outro, a crer nos cálculos dos RIT) podia ser suficiente para acomodar a insuficiência de cobertura de custos por operação;

- por outro lado, embora todo o universo de activos leiteiros gere receitas por cabeça (60% de 28,00€, ou seja, 16,80€[10]) para a A... (alínea q) dos Factos Provados), nem todo esse universo gera aquisições a terceiros: uma parte das operações não dão origem a pagamentos porque a D... as internaliza na sua própria organização; tais montantes recebidos são líquidos e constituem, portanto, factor de determinação dos preços (sem necessidade de apelo aos montantes da subvenção para os fazer baixar);

- finalmente, a D... recebe também uma compensação da I... .No que concerne a cada operação de contraste leiteiro (que foi o que os RIT tiveram presente), a verba transferida não é relevante (porque se limita a cobrir o custo já computado de 0,75€ por operação), mas já o é o montante de 6,00€ (em 2019 e no primeiro semestre de 2020) ou de 5,00€ (no segundo semestre de 2020 e em 2021) por cada vaca seca da raça Frísia. Tendo em consideração essas outras receitas, a mera comparação das receitas e custos por operação não eram suficientes para fundamentar a conclusão da AT.

O facto de a argumentação dos RIT neste ponto ser insuficiente – não tendo sido sequer retomada na Resposta da AT – não quer dizer que seja errada, muito menos que tenha inquinado a decisão proferida: como se viu, esta não se baseou nessa “impressão”, mas sim no preenchimento dos requisitos fixados na jurisprudência da União (que não exigem que os preços praticados fiquem abaixo dos custos – como, de resto, ficam, e a AT podia ter demonstrado[11]). 

Ora, como o elenco dos requisitos não foi controvertido, a questão do apuramento da natureza da subvenção recebida pela A... ficou já resolvida:

- nos programas de melhoramento da raça Frísia há uma relação triangular – que a AT entendeu estabelecer-se “entre a autoridade de gestão PDR2020 (Programa de Desenvolvimento Rural 2020) a REQUERENTE (sujeito passivo que beneficiou do subsídio) e o utilizador/destinatário do serviço prestado pela REQUERENTE, isto é, produtores e H... .”; alterar os pólos dessa relação não interfere com o sentido útil do requisito, que é excluir situações puramente bilaterais (em que os montantes transferidos de uma entidade para a outra perdem a natureza de subvenção para se configurarem como contraprestação directa de um serviço ou da obtenção de um bem). Assim, para efeito do preenchimento deste requisito, a superação da concepção de “beneficiário jurídico[12] pela de “beneficiário económico[13] não teria implicações: reconfigurar a relação como instituída entre a entidade pagadora (materialmente o IFAP, por intermédio da H...), a entidade prestadora dos serviços (a H..., por si ou por intermédio da A...– que, no caso dos serviços que envolvem o chamado contraste leiteiro, os presta por si, ou por intermédio das cooperativas suas associadas, ou por recurso a agentes contrastadores) e o criador dos animais em relação aos quais se processa a recolha de dados (alíneas l) a n), s), aa) e dd) dos Factos Provados) em nada alteraria a sua trilateralidade;

- o montante da subvenção que é concedido em cada ano (ainda que pago trimestralmente) não só está dependente do orçamentado (ie: da quantidade de acções programadas, nos três eixos, ou serviços, abrangidos pelo programa de melhoramento aprovado – registo de dados de filiação decorrentes da inseminação artificial; inscrição no livro genealógico; e contraste leiteiro), como está dependente do executado (ie: da apresentação dos dados que a A... comunica à DGAV para validação e que são introduzidos na base de dados gerida pela H...[14] – alíneas r) a t) dos Factos Provados; aliás, que o sinalagma é respeitado pela A... decorre até dos procedimentos internos que adoptam para que não sejam feitas comunicações à DGAV de contrastes que não preencham os requisitos do programa – como foi confirmado pela testemunha C...;

- a anterioridade da fixação do preço em relação ao facto gerador não foi posto em causa pela Requerente: os valores da prestação do serviço aos criadores são por estes conhecidos com antecedência[15];

- finalmente, também não foi controvertido o direito que a A... tinha a obter um quantitativo de subvenção correspondente às acções por ela desenvolvidas, directa ou indirectamente.

Tanto basta para dar por preenchidos os requisitos que a jurisprudência (quer da União, quer nacional) tem aplicado para reconduzir as subvenções em causa a subvenções directamente conexas com o preço de cada operação – não obstante o anterior entendimento da AT, consignado no Anexo I ao RIT à A... de 2004 (junto como Doc. 8 pela Requerente), culminasse assim:

Trata-se de subsídios à exploração atribuídos para a compensação de despesas – que, tendo a natureza de subsídios à agricultura, são de excluir da tributação em IVA e não considerados pera efeitos de cálculo do pro rata (cfr. informação n.º 130 de 15/10/91, com despacho favorável do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

 

Mesmo não havendo alterações supervenientes que o justificassem[16], nada impede que a aplicação do Direito evolua no sentido que, mal ou bem, se entende mais adequado: os entendimentos pretéritos da AT não constituem caso julgado para casos novos.

 

 

IV.6. Direito aplicável quanto à segunda questão decidenda

 

Na Lista I (“BENS E SERVIÇOS SUJEITOS A TAXA REDUZIDA”) anexa ao Código do IVA, prevista na alínea a) do n.º 1 do seu artigo 18.º, a verba 4.2 (“Prestações de serviços que contribuem para a produção agrícola e aquícola, designadamente as seguintes:”) contempla 9 actividades que ficam sujeitas à taxa de 6%, entre as quais a da alínea f): “A assistência técnica;”.

O que pode ou não ser “serviços que contribuem para a produção agrícola e aquícola” e do que pode ou não ser “assistência técnica” são questões de Direito.

 

 

IV.7. Posição da Requerente quanto à segunda questão decidenda

 

Quanto à supra enunciada segunda questão – a de saber qual a taxa aplicável à sua actividade – a Requerente invocou, essencialmente:

  1. Que “apesar de a AT se louvar na alínea c) do nº 5 do artigo 16º do CIVA para afirmar que as subvenções auferidas pela A... se incluem no valor tributável das suas prestações de serviços, não aplicou a taxa de 6% que incide sobre esses serviços – que são de assistência técnica à produção agrícola, ou que, pelo menos, contribuem para a produção agrícola e são, portanto, enquadráveis no nº 4.2 da lista I anexa ao CIVA.”;
  2. Que, tendo sido confrontada com essa incongruência em sede de direito de audição, a AT “acrescentou então que a aplicação da taxa normal, de 23%, se impunha por os beneficiários dos serviços não terem sido apenas os produtores, mas também a H... …
  3. … “A qual surgiria como beneficiária dos serviços, não só quanto às inscrições no livro genealógico e aos registos de paternidade provenientes das inseminações artificiais, como também quanto ao contraste leiteiro, ainda que não fosse possível, quanto a este, fazer “a destrinça entre a parte da subvenção ... da qual beneficia a H... e o produtor”.”;
  4. Que, “como, no ver da AT, não seria de aplicar a taxa reduzida (verba 4.2 da Lista I) aos serviços prestados pela A... à H..., por estes terem “uma finalidade genérica” e não contribuírem “de forma direta e inequívoca para a produção agrícola”,
  5. Não haveria remédio senão aplicar a taxa normal de 23% à totalidade da subvenção, face à impossibilidade de distinguir, numa prestação única no plano económico, a parte da subvenção associada aos serviços prestados à H... da parte associada aos prestados ao produtor.”;
  6. Que “A ilegalidade principal das correções à base tributável, permanece, naturalmente, inalterada, pois não é por a argumentação passar a assentar nos serviços supostamente prestados à H... que a AT logra demonstrar uma relação direta entre as subvenções e o preço dos pretensos serviços – preço que, no caso da H..., tão pouco existe...
  7. Uma vez que, como a AT reconhece, as transferências financeiras da H... para a A...  respeitam às subvenções que, por seu intermédio, são pagas à A... pelas ações que esta desenvolve e não ao pagamento do preço de quaisquer serviços.”;
  8. Que “Na relação entre a H... e A... não se verifica qualquer operação que proporcione uma vantagem económica concreta à H..., suscetível de ser configurada como a prestação de um serviço – vantagem concreta que só existe na esfera dos criadores.”;
  9. Que “A considerar-se que as inscrições no livro genealógico e os registos de paternidade provenientes das inseminações artificiais e a realização do contraste leiteiro consubstanciam, no todo ou em parte, serviços prestados à H..., dificilmente se encontrariam serviços mais específicos e mais dirigidos à produção agrícola.”;
  10. Que “quer se considere que a A... apenas presta serviços aos titulares de explorações agrícolas, quer se entenda que também os presta à H..., estar-se-á sempre perante serviços de assistência técnica à produção agrícola, ou que, pelo menos, contribuem para essa produção, e são enquadráveis no nº 4.2 da lista I anexa ao CIVA.”,
  11. Donde que as subvenções, a incluírem-se na matéria tributável dos supostos serviços, nos termos da alínea c) do nº 5 do artigo 16º do CIVA – o que a A... reitera não aceitar –, só poderiam sofrer a incidência da taxa reduzida (6%) que seria aplicável aos próprios serviços.”.
  12. Donde, as liquidações padeceriam de “erro sobre os pressupostos de direito, por errónea interpretação do artigo 16º, nº 5, alínea c), do CIVA e da verba 4.2 da lista I a ele anexa.”.

 

 

IV.8. Posição da Requerida quanto à segunda questão decidenda

 

Em relação à segunda questão decidenda – a da natureza da actividade da Requerente para efeito de determinação da taxa de IVA aplicável – reproduz-se integralmente o que a AT escreveu nos números 62 a 71 da sua Resposta:

Pois, dúvidas não haverá, e o Relatório de Inspeção é claro, que as subvenções atribuídas têm como beneficiário a H... no âmbito dos serviços protocolados entre esta entidade e a REQUERENTE, sendo que, quanto aos serviços de contraste leiteiro, tal como afirmado quer no projeto de relatório, quer no relatório final, na parte das conclusões que passamos a transcrever, é de que “apesar das ações subsidiadas se inserirem no projeto apresentado pela H..., e terem como base os serviços protocolados entre aquela entidade e a REQUERENTE, não podem ser dissociados dos serviços faturados pela REQUERENTE, nomeadamente no âmbito do contraste leiteiro. Pois, não obstante, o contraste leiteiro ser comparticipado por lactação concluída da raça frísia, é atingível que o serviço de contraste leiteiro faturado aos produtores e às Cooperativas faz parte integrante do serviço/ação subsidiada de contraste leiteiro…”, porquanto, referem-se aos mesmos animais objeto de exame e são realizados com a mesma estrutura, humana e material, detida e organizada pelo prestador, a REQUERENTE.

Desta forma e mantendo o já firmado na resposta ao direito de audição constante no relatório de inspeção, e atendendo a que a realização do contraste leiteiro que resulta do serviços prestados à H... é o mesmo que o faturado ao produtores[[17]], concluiu-se então, que os serviços faturados ao produtor fazem também parte integrante do serviço / ação subsidiada, e desta forma não é possível efetuar a destrinça entre a parte da subvenção associada ao contraste leiteiro da qual beneficia a H... e o produtor.

Efetivamente, e tendo por base o protocolo celebrado entre a H... e a REQUERENTE, que decorre na sequência do protocolo realizado entre a H... e DGV, os serviços prestados pela H... à REQUERENTE, sobre as quais foi atribuída a subvenção tem por finalidade a criação de uma base de dados nacional que permita a avaliação do melhoramento genético da raça frísia, ou seja, tem uma finalidade genérica que não contribui direta e inequívoca para a produção agrícola.

Nos termos da verba 4.2 da lista I anexa ao CIVA, estão sujeitas a taxa IVA à taxa reduzida as prestações de serviço que contribuem para a realização de produção agrícola, designadamente as prestações de serviços de assistência técnica (al. f da verba 4.2 da Lista I).

Conforme entendimentos já emanados pelos Serviços do IVA, no âmbito desta matéria, a aplicação desta verba, aplica-se nas situações em que os serviços sejam utilizados na produção agrícola e contribuam diretamente e de forma inequívoca para a produção agrícola.

Assim, o serviço de contraste leiteiro prestado ao produtor teria enquadramento na referida verba, uma vez que este serviço permite a gestão eficaz e eficiente do efetivo leiteiro contribuindo para o melhoramento e aumento da produção.

No entanto é claro que aos serviços prestados pela REQUERENTE à H..., não é de aplicar a taxa reduzida (al. f da verba 4.2 da Lista I), pois têm uma finalidade genérica e não contribuem de forma direta e inequívoca para a produção agrícola.

Assim, e atendendo a que a subvenção, tributável nos termos da alínea c) do nº 5 do artº16 do CIVA, respeita à contrapartida dos serviços prestados à H..., e concomitantemente também aos serviços de contraste leiteiro prestados aos produtores, não nos é possível (nem veio o sujeito passivo fazê-lo no decurso da ação inspetiva ou agora na petição em análise) efetuar a distinção entre a parte da subvenção associada aos serviços prestados à H... e prestados ao produtor.

Então, e seguindo as orientações, emanadas pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, no que se refere a prestações de serviços principais e acessórias, e prestações de serviços únicas e indivisíveis, nomeadamente nos acórdãos de 27 de outubro de 2005, Levob Verzekeringen e OV Bank, C-41/04, acórdão de 25 de fevereiro de 1999, CPP, C-349/96, conclui-se que não só cada prestação de serviços deve normalmente ser considerada distinta e independente como também que a operação constituída por uma única prestação no plano económico não deve ser artificialmente decomposta para não alterar a funcionalidade do sistema do IVA.

Neste sentido e uma vez que estamos perante uma prestação única não sendo possível a divisão da operação (subsídio ao contraste leiteiro à H... e ao produtor), e não sendo de excluir que os serviços prestados ao produtor se poderão considerar acessórios, conclui-se que a subvenção deve ser tributada à taxa normal (23%).

 

IV.9. Decidindo a segunda questão

 

            Como se viu a propósito da primeira questão decidenda, a subvenção paga pelo IFAP à H... e transferida integralmente por esta para a A... (como ficou estabelecido na alínea s) dos Factos Provados[18]) foi reconduzida a uma subvenção directamente conexa com o preço de cada operação por o contraste leiteiro configurar um serviço prestado aos produtores cujo preço não cobria os seus custos[19]. Se no contraste leiteiro – rectius: na componente subvencionada do contraste leiteiro (uma vez que, como explicaram ambas as testemunhas, há um seu upgrade que é um serviço puramente de mercado) – se concluiu que os montantes recebidos do IFAP interferem nos preços praticados, já nos registos de paternidade e nos registos genealógicos se concluiu que não há preços – nem para os criadores, nem para a H... .

Ainda que a AT tenha considerado a H... como beneficiária, aceitar uma tal construção implicaria desconsiderar um dos critérios que o citado acórdão do TJUE no caso OPW fixara para identificar uma subvenção directamente relacionada com o preço: é que, a aceitar-se a tese de que os serviços prestados aos produtores se poderiam considerar acessórios de uma prestação de serviços da A... à H...[20], teríamos de optar por uma de duas construções, qual delas mais ilógica:

- supondo que esses serviços seriam fornecidos à H... sem preço – porque, obviamente, as relações entre a A... e a H... não só não são, em caso algum, mediadas por preços, como até seriam incompreensíveis por intermédio deles (não é crível que a H..., que foi investida numa posição de monopólio na obtenção das subvenções destinadas aos bovinos da raça Frísia, transferisse para entidades alheias – a A... a Norte e outras congéneres no Centro e no Sul – todas as receitas que essa situação lhe proporcionava). Mas então, nesta hipótese de inexistência de contrapartida por tão abnegada actuação – e em que a H... faria o papel do mais altruísta monopolista do Mundo –, sem preço sempre seria impossível que a subvenção recebida pela A... pudesse ser tida como uma subvenção directamente conexa com um preço inexistente;

- em alternativa, a haver contrapartida (“preço”) desses supostos serviços prestados pela A... à H..., ela teria de resultar das importâncias que a A... recebe desta. Mas, a ser assim, o montante da subvenção que a H... se limita a transferir para a A... seria um pagamento daquela a esta – e o requisito básico da relação triangular seria afastado. Ie, não seria uma subvenção, mas sim a contraprestação desses serviços.

Quer dizer que, qualquer que fosse a lógica que se adoptasse, a tese dos RIT quanto à segunda questão decidenda não teria nunca um mínimo de plausibilidade.

 

*

            O único serviço subvencionado[21] que tem preço[22] (e que, de resto, os RIT enquadram expressamente no âmbito de aplicação da taxa reduzida de IVA[23]) é o que a A... presta aos criadores no âmbito do chamado contraste leiteiro. Foi unicamente por causa dessas duas características – serviços vendidos no mercado a um preço inferior ao custo – que a tese da AT teve acolhimento quando o presente Tribunal Colectivo apreciou as suas razões a propósito da primeira questão decidenda (mesmo que a Comissão, que poderia ter actuado contra Portugal se tivesse admitido que a não sujeição das subvenções a IVA, longa de décadas, infringia o sistema harmonizado, não tenha tido qualquer iniciativa nesta matéria[24] – como não teve, que se saiba, em relação a outros Estados-Membros que tenham estado e continuem a estar na mesma situação).

            Assim, a suposta “prestação de serviços” da A... à H...[25] só pode resultar da percepção distorcida de um mesmo mecanismo funcional – em grande medida decorrente da diversidade da escala geográfica dessas entidades: não há qualquer pagamento de uma a outra, nem há mercado algum a relacioná-las. Tratou-se, apenas, de um desdobramento institucional tornado necessário por razões exógenas, como resulta dos Factos Provados a) a n).

Ora, quanto ao único serviço subvencionado pelo qual a A... cobra preços, a AT reconheceu expressamente o seguinte: “o serviço de contraste leiteiro prestado ao produtor teria enquadramento na referida verba, uma vez que este serviço permite a gestão eficaz e eficiente do efetivo leiteiro contribuindo para o melhoramento e aumento da produção.”. Dir-se-ia que não poderia ser de outro modo, até porque a AT nunca pôs em causa a taxa de IVA (de 6%) que a A... aplica nas facturas que emite por tal serviço. Por outro lado, não obstante o cepticismo dos RIT[26] (e da Resposta da AT) os registos no livro genealógico e os registos de paternidade, visando, como visam, o melhoramento genético dos bovinos leiteiros, servem o mesmo propósito de permitir a gestão eficaz e eficiente do efectivo leiteiro. Aliás, nem poderiam fazer parte das actividades especificamente subsidiadas nos termos do programa de melhoramento genético se não tivessem esse mesmo exacto propósito de melhoria e aumento da produção.

Assim, ainda que se quisesse admitir que o juízo dos RIT pudesse ser susceptível de ponderação factual (quais são as evidências de que o apuramento genético – de que os registos são condição necessária – contribuiu “diretamente e de forma inequívoca para a produção agrícola”?), não procurou o presente Colectivo aferi-lo, porque tal juízo não poderia prevalecer sobre o juízo de Direito das entidades que, nas estruturas da União Europeia e do Estado Português, conceberam e delinearam o programa: seria um contra-senso que financiassem especificamente acções que, pelo menos, não fossem presumivelmente adequadas ao resultado pretendido. E daí, também, que se dispense agora este Colectivo de discutir as teses da AT de que é a cauda que abana o cão (ie: que, numa suposta indistinção de serviços prestados, seria o regime dos registos que prevaleceria sobre o dos contrastes leiteiros…) e em que medida é que tais registos podem não constituir o que patentemente aparentam ser: assistência técnica.    

            Em suma: a AT pode rever a sua posição quanto à integração da subvenção recebida pela A... no preço do serviço prestado (prestado aos produtores, claro), com isso criando um custo adicional para a fileira leiteira nacional (e uma desigualdade no mercado interno – artificialmente gerada – se não houver a garantia de que os produtores leiteiros dos demais países membros da União também têm de suportar esse mesmo custo[27]); pode a AT, portanto, no âmbito do quadro jurídico aplicável, criar mais um incentivo para a diminuição da produção interna (por perda de competitividade decorrente do novo enquadramento fiscal). O que não pode, de modo algum, é fazê-lo a uma taxa de 23% face ao disposto no n.º 4.2 da lista I anexa ao CIVA.

            Como foi isso que fez, e não cabe ao Tribunal Arbitral substituir as liquidações por outras, têm estas de ser anuladas na sua totalidade.      

  1. DECISÃO

Termos em que, naturalmente sem prejuízo da necessária observância do disposto no artigo 100.º da Lei Geral Tributária, decide este Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

  1. Anular os actos de liquidação de IVA (identificados em I.2) e os dos respectivos juros (identificados em I.3) respeitantes aos períodos de 2019, 2020 e 2021, no valor total de € 388.220,10 (trezentos e oitenta e oito mil, duzentos e vinte euros e dez cêntimos).
  2. Condenar a Requerida nas custas do processo, abaixo fixadas.

 

  1. VALOR DO PROCESSO

Competindo ao Tribunal fixar o valor da causa (artigo 306.º do Código de Processo Civil, subsidiariamente aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT) e devendo ele, correspondendo à utilidade económica do pedido, equivaler à importância cuja anulação se pretende (alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi da alínea a) do artigo 6.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária - RCPAT), fixa-se o valor do processo em € 388.220,10 (trezentos e oitenta e oito mil, duzentos e vinte euros e dez cêntimos), importância reclamada pela Requerente e que a AT não impugnou.

 

  1. CUSTAS

Custas, no montante de € 6.426,00 (seis mil quatrocentos e vinte e seis euros), determinado nos termos da Tabela I do RCPAT e do disposto no seu artigo 4.º, n.º 5, e nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, a cargo da Requerida, dado que, não obstante ganho de causa sobre uma das questões controvertidas, as liquidações de IVA e dos respectivos juros têm de ser totalmente anuladas.

Lisboa, 10 de Novembro de 2023

 

O Árbitro Presidente e Relator

 

 

Victor Calvete

(Com a declaração de que fui sensível à exortação do n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil e que teria proposto uma diferente solução quanto à primeira questão de Direito se as avisadas considerações do Advogado-Geral Geelhoed nos casos das Forragens Secas tivessem tido maior acolhimento nas respectivas decisões).

 

 

O Árbitro Adjunto

 

José Coutinho Pires

 

A Árbitro Adjunta

 

 

Cristina Coisinha

 

A redacção da presente decisão segue a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990 execepto em transcrições que o sigam.

 

 

 



[1] Acrónimo de Sistema Nacional de Identificação e Registo de Bovinos.

[2] É esse o valor que consta dos RIT. Segundo o depoimento da testemunha B... esse valor é actualmente de 0,95€, mas não é relevante para os casos dos autos, respeitantes a 2019, 2020 e 2021.

 

[3] No RIT de 2019 indicava-se um valor de 6,00€; no de 2021, um valor de 5,00€; no de 2020 indicava-se um valor de 6,00€ para o primeiro semestre e um valor de 5,00€ para o segundo (a partir de 1 de Julho).

 

[4] O valor que consta do ponto V.1.1.4 dos RIT (“Sistematização dos serviços desenvolvidos pela A... no âmbito do protocolado entre a H... – A... e serviços prestados (faturados) aos produtores leiteiros”), que remetem todos para o ponto “V.1.1.3.1 – Subcontratação de serviços contrastadores” é de 9,80€. Porém, o valor que constava em todos os RIT nesse ponto V.1.1.3.1 era de 9,50€: “conclui-se que o valor do contraste leiteiro pago aos contrastadores inclui 0,75€ por contraste efetuado, mais 9,5€ (=28,00€ - 18,5€) por cada bovino da raça frísia contrastado no período completo de lactação”.

Já não assim no ponto V.1.1.3.2 dos RIT (“Subcontratação de serviços às Cooperativas”), em que se referia que “Como contraprestação dos serviços contratados está definido no ponto 5 e anexo I do contrato, que os valores a atribuir às entidades contrastadoras (Cooperativas ), pelo serviço de campo do contraste leiteiro prestado no âmbito do Programa Aprovado de Melhoramento dos Bovinos Leiteiros, para os anos entre 2017 e 2020, é de 9,80€ a atribuir por lactação concluída da raça frísia.” (No RIT referente ao ano de 2021 a mesma passagem tinha apensa a seguinte nota de rodapé: “Apesar do contrato indicar o valor a atribuir para os anos entre 2017 e 2020, de acordo com os esclarecimentos da A..., este contrato esteve vigente também em 2021, pelo que o valor da contraprestação se manteve.”).

[5] Como se verá, a AT considerou que a base tributável da subvenção era líquida de IVA, ou seja, calculou o IVA por dentro. A subvenção real diminui, portanto, na medida da inclusão do IVA.

 

[6] Directiva 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, que substituiu a Directiva 388/77/CEE, de 17 de Maio (Sexta Directiva).

[7] Embora com ligeiras alterações (substituição de “A...” por “REQUERENTE”; supressão de notas e dos sublinhados).

[8] É certo que só nas inscrições no Livro Genealógico o preço fixado cobre os custos: essas inscrições, atenta a percentagem de financiamento estabelecida no Anexo V da Portaria n.º 268/2015, são inteiramente custeadas pelos apoios públicos; sendo, portanto, um serviço gratuito para os produtores, não poderia a A... transferir para estes parte alguma do custo 1,1€ que está fixado no Anexo V da Portaria. Já os registos de paternidade provenientes de inseminações artificiais, sendo custeadas apenas em 60%, conforme estipulado no Anexo V da Portaria n.º 268/2015, implicam que a não cobrança do remanescente – como a A... não cobra – tenha de ser custeado de outra forma. Porém, como a A... tem diversas fontes de financiamento (se, como reconhecem os RIT, “parte substancial (mais de 50%) da atividade A... [é] suportada em subsídios comunitários”, então algo menos do que isso tem de provir de outras fontes), não se pode imputar à subvenção o fundamento para que a A... não cobre aos proprietários dos animais os 15 cêntimos que a Portaria não lhe atribui por cada registo de inseminação (para um preço fixado de 0,38€, só recebe 0,23€). Tendo em conta que, dependendo dos nascimentos em cada exploração, os registos não se fazem em massa (ao contrário dos contrastes leiteiros, que abrangem todos os animais em período de lactação de cada exploração), mais provavelmente terão sido cálculos de custos que levaram a A...a prescindir dessa receita: só a emissão, mesmo que automatizada, de recibos individuais de 15 cêntimos – com intervalos alargados para cada animal – já explicaria a sua não cobrança.

 

[9] Embora seja esse valor que consta de todos os RIT (“a A..., pelos serviços de contraste leiteiro no âmbito do programa de conservação e melhoramento genético recebe um apoio de 60% sobre 28,00€, que corresponde a 18,5€ por cada ação de contraste leiteiro”) e tal valor não tenha sido posto em causa pela A..., o que resulta do Anexo V da Portaria n.º 268/2015, é que a H... (e, por seu intermédio, a A...), pode receber um apoio de 60% do valor fixado para animais de raça bovina no âmbito de intervenção da Direcção-Geral de Agricultura e Pescas do Norte, que é de 28,00€. Ora, 60% de 28,00€ são 16,80€, não 18,50€. Para o que importa, porém, a diferença não tem importância.

[10] Ou de 18,50€, se a AT tiver razão: cfr. nota anterior.

 

[11]  Os RIT referem, correctamente, que “O preço do serviço de contraste leiteiro faturado pela REQUERENTE (0,375€ para produtor I... e 0,75€ para produtor não I...), é em muito inferior aos gastos suportados com o referido serviço.”, mas não apresenta uma demonstração convincente disso. Para tal, com os dados que constavam dos RIT, teria de somar os valores que a A... cobrou, em cada trimestre, à taxa reduzida e à taxa normal (correspondentes, respectivamente, aos recebimentos dos contrastes leiteiros pagos pelos criadores e pela I...– alíneas gg); e z) e cc) dos Factos Provados – e, na medida em que referentes a algo mais, empolados na proporção) e compará-los com os montantes pagos anualmente a agentes contrastadores e cooperativas (a que ainda haveria de somar os valores dos custos laboratoriais e de tudo o mais que constitui custo imputável à A... e não incluído nos serviços externalizados de recolha).

Como decorre dos valores dessas receitas (alínea gg) dos Factos Provados) e dos custos incorridos em cada ano com essa externalização (alíneas ee) e ff) dos Factos Provados), verifica-se o seguinte:

 

 

Receitas:

à taxa reduzida

+

à taxa normal

 

Custos externalizados de recolha dos contrastes

 

Diferença

 

2019

75.488,00€ + 24.838,74€ =

100.326,74€

 

112.239,04€ + 267.460,00€ = 379.699,04€

 

 

-279.372,30€

 

2020

67.131,00€ +

93.987,82€ =

161.118,82€

 

119.839,10€ + 273.705,49€ = 393.544,59€

 

 

-232.425,77€

 

 

2021

73.837,19€ +

104.060,02€ =

177.897,21€

 

 

99.138,47€ + 329.155,24€ = 428.293,71€

 

 

-250.396,50€

           

Resulta do assim apurado que, pelo menos no valor dessas diferenças anuais, os preços praticados pela A... teriam de ser superiores aos valores cobrados.

           

[12] Vejam-se os casos das Forragens Secas (acórdãos do TJUE de 15 de Julho de 2004 nos processos Comissão/Itália, C-381/01, ECLI:EU:C:2004:441; Comissão/Finlândia, C-495/01, ECLI:EU:C:2004:442; Comissão/Alemanha, C-144/02, ECLI:EU:C:2004:444; e Comissão/Suécia, C-463/02, ECLI:EU:C:2004:455). Como aí se estabeleceu:

- uma coisa é o beneficiário jurídico das subvenções (que se pode admitir que, para efeitos de aplicação do Direito interno e da União, o artigo 4.º da Portaria n.º 268/2015 tenha feito corresponder às “as pessoas coletivas constituídas ao abrigo dos artigos 167.º e seguintes do Código Civil, que tenham a seu cargo a gestão de livros genealógicos ou fundadores” (n.º 1) e “no caso da raça bovina frísia, as pessoas coletivas que gerem a base de dados nacional relativa ao melhoramento genético desta raça, com especial incidência nos dados de contraste leiteiro.” (n.º 2)), ou seja, a H... e a A..., em conjunto; e

- outra coisa são os beneficiários económicos, que são os criadores das raças abrangidas. Por exemplo, no §46 do Acórdão proferido no processo C-381-/01, escreveu-se: “não se pode acolher o critério proposto pela Comissão, baseado no conceito de «destinatário jurídico» de uma subvenção, independentemente do benefício económico desta.” (exactamente o mesmo que consta de todos os Acórdãos proferidos nos demais casos) e que, segundo a Comissão decorria de “O Regulamento n.° 603/95 [– não uma Portaria –] não referi[r] outro beneficiário, na acepção jurídica do termo, da ajuda à comercialização das ferragens [sic] secas”.

 

[13] Diga-se que esta reconfiguração teria mais lógica: a dupla posição da H..., que tanto surge como pagadora (por conta do IFAP) como prestadora do serviço (por si e, no caso dos autos, por intermédio da A...) é uma mera consequência da regra da União Europeia que impossibilitou, a dada altura, que cada uma das três associações regionais (a A... no Norte do País e as suas congéneres do Centro e do Sul) continuassem a apresentar os seus próprios programas de melhoramento para efeitos de financiamento (alínea e) dos Factos Provados).

 

[14] O facto de a execução poder, por circunstâncias várias (vg: impossibilidade de realização dos controles dentro dos intervalos de tempo fixados pela Portaria n.º 268/2015; falecimento ou abate do animal; encerramento da exploração) ficar abaixo do orçamentado no programa a de melhoramento a ser comparticipado foi invocado pela Requerente para dissociar a subvenção recebida do preço dos serviços de contraste leiteiro. Porém, sob pena de o sistema colapsar, essas diminuições do montante a receber teriam sempre de apresentar valores residuais.

 

[15] Embora, como se viu, os montantes a cobrar por cada operação de contraste sejam os mais relevantes (ao ponto de, absorvendo os valores das subvenções por animal e por registo, ainda resultar um diferencial entre custos e receitas não subvencionadas), e estes não estejam pré-fixados na Portaria n.º 268/2015, todos os demais estão. Por outro lado, ainda que o PA não tenha incorporado o preçário das relações entre a A... e os produtores, designadamente em matéria de contraste leiteiro (quer na sua componente subvencionada, quer na sua componente não subvencionada), o montante de 0,75€ foi confirmado pela testemunha B... (que também indicou a actualização subsequente desse valor). Do mesmo modo, também não constam do PA os contratos com os agentes contrastadores, mas os RIT transcrevem a sua Cláusula Terceira (“Honorários”), em que estava previsto o pagamento desse montante de 0,75€ a esses agentes.

 

[16] Designadamente uma qualquer interferência dos serviços da União, decorrente de um eventual desvio desse modo de aplicação do Direito em relação ao dos demais Estados Membros da União – como aconteceu nas situações que deram origem aos casos referidos na nota 12.

[17] No caso do contraste aos animais raça frísia e com lactação completa.

[18]Após a execução das acções pela A..., a H... recebe trimestralmente do IFAP os apoios respeitantes às inscrições no livro genealógico, aos registos de paternidade provenientes das inseminações artificiais e ao contraste leiteiro e transfere-os integralmente para a A...;

 

[19] Viu-se que no caso dos serviços de “inscrições no livro genealógico-nascimentos”, e de “registo de paternidade provenientes de inseminações artificiais”, os montantes envolvidos e a sua inadequação a prática em massa justificavam que estes não fossem cobrados aos detentores dos animais, que são os beneficiários económicos de tais registos: basta pensar que sem eles ficam legalmente excluídos do acesso aos apoios do programa de melhoramento da raça Frísia (embora, face à prática adoptada pela A..., tal não gerasse, no horizonte considerado, diferenças de custos).

 

[20] Cfr. último parágrafo, supra transcrito, da Resposta da AT (reproduzindo a tese dos RIT: “uma vez que estamos perante uma prestação única não sendo possível a divisão da operação (subsidio ao contraste leiteiro à H... e ao produtor), e não sendo de excluir que os serviços prestados ao produtor se poderão considerar acessórios, será sempre de tributar a subvenção à taxa normal (23%).”) e o que se escreveu nas notas 12 e 13.

[21] Como se refere nos três RIT, além dos serviços de contraste leiteiro, subvencionados, a A... presta serviços (pagos) de:

- diagnóstico de gestação;

- emparelhamentos correctivos (melhoramento genético);

- identificação de bovinos;

- apoio ao melhoramento dos efectivos leiteiros; e

- genotipagem com avaliação genética.

 

[22] Nas Conclusões (ECLI:EU:C:2003:642) que apresentou em 27 de Novembro de 2003 nos casos das Forragens Secas (supra, nota 12), o Advogado-Geral Geelhoed reproduziu o entendimento da Comissão sobre o requisito para que “a ajuda integre a matéria colectável”: haver

uma relação directa entre a subvenção e o preço de um bem ou serviço. Esta relação deve ser quantificada ou determinável de forma precisa: a ajuda é concedida se e na medida em que o bem ou serviço seja vendido no mercado. Trata-se, pois, de uma subvenção directamente relacionada com o preço.” (§32).

 

[23] Como consta de todos os RIT, em mais do que uma passagem. Por exemplo, escreve-se nos três o seguinte: “as prestações de serviços de contraste leiteiro e prestações dos serviços de emparelhamentos corretivos, são tributados à taxa reduzida, com enquadramento na verba 4.2. al. f) Assistência técnica, da lista I anexa ao CIVA”.

 

[24] Como teve há já cerca de duas décadas – aliás sem sucesso – nos casos referidos na penúltima nota.

 

[25] Na versão dos RIT (após o exercício do direito de audição da Requerente): “A  H... surge como beneficiário no âmbito dos serviços protocolados entre esta entidade e a A..., onde se integram os serviços de contraste leiteiro, registo genealógico e de paternidade.”.

 

[26] Onde se escreve, designadamente, o seguinte:

é claro que aos serviços prestados pela A...  à H..., não é de aplicar a taxa reduzida (al. f da verba 4.2 da Lista I), pois têm uma finalidade genérica e não contribuem de forma direta e inequívoca para a produção agrícola.

[27] A razão pela qual um Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais travou esse mesmo entendimento (ainda que a propósito do subsídio à destilação de vinho) em 1991: “O problema não é líquido. Convém por isso fazer um estudo de direito comparado que evidencie claramente a política seguida em todos os países da CEE onde esta questão também se põe e, pelo que se diz, de modo diferente.” A Informação de 15 de Outubro de 1991 do Serviço de Administração do IVA (Doc. 7 junto pela Requerente) que transcrevia o trecho citado dava nota de que nos dois países em que se tinha feito essa averiguação (Espanha e França) “estas subvenções não são tributadas em IVA”.

Tenha-se presente que nos já referidos casos das Forragens Secas (supra, nota 12), um entendimento da Comissão com pontos de contacto com o que a AT ora defende esbarrou no Tribunal de Justiça porque, designadamente, “o regime de ajuda não constitui um regime de promoção do consumo”.