Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 3/2016-T
Data da decisão: 2016-09-12  IVA  
Valor do pedido: € 30.077,67
Tema: IVA - Simulação fiscal; Contrato de locação financeira
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Decisão Arbitral

 

I – Relatório

 

1.No dia 5.01.2016, o Requerente,  A…, S.A., contribuinte n.º…, com sede na Rua…, …, …-…Lisboa, requereu ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do art. 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à anulação  da Liquidação de imposto sobre o valor acrescentado n.º 2015…, referente ao período de março de 2012, da qual resultou,  após  correções à liquidação inicialmente notificada à Requerente,  um valor a pagar no montante total de € 26.450,00 bem com da   correspondente liquidação de juros compensatórios, da qual resultou um valor a pagar de € 3.087,04 e ainda  liquidação de juros moratórios referente ao alegado retardamento do pagamento do montante correspondente à liquidação do imposto, do que resultou um valor a pagar de € 540,63.

 

A Requerente, alegando ter pago o montante correspondente à liquidação do imposto e ainda os juros compensatórios e moratórios peticiona, ainda, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no reembolso do montante de € 26,450,00 referente à liquidação ora em crise, bem como dos juros que considera indevidamente pagos, no valor total de € 3.627,67, acrescidos dos devidos juros indemnizatórios e ainda de “juros de mora vencidos e vincendos, se a eles houver lugar”.

 

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art. 6.º, do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente aplicável.

O Tribunal Arbitral foi constituído em 23-03-2016.

 

3. Verificando-se a inexistência de qualquer situação prevista no art. 18º, nº 1, do RJAT, que tornasse necessária a reunião arbitral aí prevista, foi dispensada a realização da mesma, com fundamento na proibição da prática de atos inúteis.

Foi ainda dispensada a realização de alegações, nos termos do art. 18º, nº 2, do RJAT, “a contrario”.

 

4. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, sinteticamente, os seguintes:

 

Ilegalidade da Correção e Liquidações Impugnadas por violação do art. 19º, nº 3, do Código do Imposto sobre o valor acrescentado (doravante “CIVA”)

 

  1. A AT instaurou contra a Requerente um procedimento de inspeção relacionado com um contrato de locação financeira, celebrado em 28 de março de 2012, entre a Requerente, na qualidade de locador financeiro e a sociedade B…, Lda., (“B…” ou “Cliente”), na qualidade de locatária financeira e por entender que estaríamos em presença de uma operação simulada, considera que a Requerente procedeu à dedução indevida do IVA que suportou na aquisição do equipamento que deu em locação financeira ao Cliente, nos termos do n.º 3 do art.º 19º do Código do IVA (“CIVA”), e procedeu à correção daquele imposto, no montante de € 26.450,00.
  2. Quanto à aquisição do Equipamento, dispõe o n.º 4 do artigo 1.º das Condições Gerais do Contrato de locação financeira que “o Locatário declara ter escolhido de livre vontade o bem locado e o respectivo fornecedor e ter negociado directamente com este a marca, o modelo, respectivas especificações técnicas ou de utilização, prazo de entrega e condições desta, o preço e demais aspectos aplicáveis mencionados nas Condições Particulares do presente contrato”  e, nos termos do n.º 1 do artigo 4.º das Condições Gerais do Contrato, “todo o processo de escolha do bem locado relativamente às suas características técnicas, garantias, prazo de entrega, preço e outras condições de venda, foi desenvolvido directamente entre o locatário e o fornecedor”.
  3. A B… escolheu, por isso, o bem locado e o respetivo fornecedor – a C…, Lda., contribuinte fiscal n.º …. (“C…”) – com a qual acordou o preço e condições de entrega do Equipamento, informações que forneceu à Requerente para a execução do Contrato.
  4. A Requerente adquiriu à C…, em 27 de março de 2015, a pedido e segundo as instruções da B…, o Equipamento pelo valor total de € 141.450, dos quais € 115.000,00 a título de preço e € 26.450,00 a título de IVA à taxa de 23%  tendo a B… confirmado por escrito e nos termos do Contrato a receção e instalação do Equipamento nas suas instalações, a Requerente procedeu ao pagamento do remanescente do preço à C… .
  5. Com efeito, em 30 de março de 2012, a Requerente ordenou o pagamento de € 100.232,50, por transferência bancária que foi concluída em 3 de abril de 2012 , para a conta bancária indicada pela C… na fatura emitida pela alienação do Equipamento, com o NIB… .
  6. Foi, pois, no âmbito de uma operação como centenas de outras que realiza no âmbito da sua atividade que a Requerente adquiriu à C… (escolhida pela B…) o Equipamento (também eleito pela B…), pelo preço negociado entre ambas (C… e B…), no momento em que a B… atestou ter recebido o mesmo Equipamento.
  7. A Requerente reputa, pois, totalmente ilegal a correção efetuada quanto a este imposto e consequentemente as liquidações aqui em crise, porquanto o IVA suportado no âmbito da aquisição do Equipamento dado em locação pela Requerente à B… é integralmente dedutível pela Requerente, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 19º e seguintes do CIVA.

 

Ilegalidade do Procedimento de Inspeção

 

 

  1. No caso em apreço, a AT classificou formalmente o procedimento de inspeção como um procedimento de inspeção de natureza interna, nos termos do artigo 13.º do RCPIT mas, embora mascarado sob as vestes de um procedimento de inspeção de natureza interna, a AT encetou um verdadeiro procedimento de inspeção externo – praticou atos materiais próprios de procedimentos de inspeção de natureza externa -, do qual resultaram correções e liquidações de imposto e juros, não tendo contudo cumprido as formalidades legais às quais se encontrava vinculada no âmbito de tal procedimento externo, o que inquina este de ilegalidade, projetando-se tal ilegalidade nas liquidações que aqui se impugnam.
  2. Sucede que a AT – ao iniciar um procedimento de inspeção interno, mas praticando atos materiais de procedimento de inspeção externo -, não deu cumprimento às formalidades legalmente previstas nos artigos 46º e 49º do RCPIT, especificamente aplicáveis em sede de procedimento de inspeção externa.
  3. Por outro lado, em matéria de duração do procedimento de inspeção, dispõe o art.º 36.º n.º 2 do RCPIT que “O procedimento de inspeção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início”, podendo, nos termos do n.º 3 do mesmo preceito legal, “ser ampliado por mais dois períodos de três meses”, inter alia, nas “situações tributárias de especial complexidade resultante, nomeadamente, do volume de operações (...)” e  In casu, e como referido supra, a Requerente foi notificada em janeiro de 2014 para a prestação de informações e documentos adicionais à AT, sem que tenha sido cumprida qualquer formalidade legal adicional sendo que tais  consubstanciam os primeiros atos materiais de inspeção externa, a partir dos quais se deverá iniciar a contagem do prazo legal de duração do procedimento de inspeção.
  4. Assim, e tendo o Relatório Final sido notificado à Requerente em 12 de agosto de 2015, decorrido quase um ano e meio do início da prática de atos materiais de inspeção, é o presente procedimento de inspeção também ilegal por incumprimento do prazo de seis meses legalmente estabelecido.

 

  1. Sendo ilegal o procedimento de inspeção, pela preterição e violação das normas acima enunciadas, é necessariamente ilegal o Relatório Final que o conclui, não podendo isso deixar de se considerar ilegais as liquidações ora impugnadas por se fundamentarem em atos procedimentais que são, eles próprios, ilegais pelo que são  também  ilegais as liquidações de juros compensatórios e moratórios sendo que as liquidações de juros sempre seriam ainda, e de qualquer forma, ilegais por não estar demonstrado que existiu culpa ou que o atraso na liquidação é por qualquer forma imputável à Requerente.
  2. Mais padeceria de ilegalidade a liquidação de juros compensatórios e a liquidação de juros de mora aplicados pela AT, por violação do disposto nos artigos 35.º, n.º 1, e 43.º, n.º 5, da LGT, na medida em que os seus pressupostos de aplicação não se encontram verificados no caso em apreço.

 

5. A ATA – Administração Tributária e Aduaneira, chamada a pronunciar-se, contestou a pretensão da Requerente, defendendo-se por impugnação, em síntese, com os fundamentos seguintes:

 

Quanto à alegada Ilegalidade da Correção e Liquidações Impugnadas por violação do art. 19º, nº 3, do CIVA.

 

 

  1. As liquidações controvertidas têm origem no procedimento de inspeção tributária, de natureza interna e âmbito parcial, incidente sobre o IVA do período de Março de 2012, determinado por despacho de 26-02-2015 e realizado ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2015… pelos Serviços de Inspeção Tributária (SIT) da Direção de Finanças de…, porque, no âmbito de tal procedimento, se concluiu que, a 28-03-2012, a referida sociedade celebrou, com a ora Requerente, um contrato de locação financeira com o n.º … relativamente a um equipamento que nunca existiu.
  2. Conforme mencionado supra, no âmbito do procedimento inspetivo efetuado ao sujeito passivo B…, Lda., com o NIF …, a coberto da Ordem de Serviço n.º OI2014…, de 31-01-2014, apurou-se que, em 28-03-2012, esta entidade tinha celebrado um contrato de locação financeira com a Requerente a que corresponde o n.º… .
  3. Igualmente, no âmbito daquele procedimento inspetivo, verificou-se que tal equipamento tinha sido supostamente adquirido pelo Requerente, tendo como documento de suporte a fatura n.º …/12, da sociedade C…, Lda., com data de 27-03-2012.
  4. Acresce que, das diligências efetuadas no âmbito daquele procedimento, concluiu-se que tal equipamento nunca existiu. Essas provas assentaram não só na impossibilidade de verificação física do equipamento, mas também no facto da empresa C…, Lda  estar sem qualquer atividade desde o ano de 2008, conforme informações prestadas pelo TOC da sociedade;  de a factura ter sido emitida num programa diferente do programa de faturação da empresa, que era o … (S-i); do pagamento da fatura, por parte da instituição bancária, ter sido feito por transferência para a conta de outro sujeito passivo do e não para a conta da empresa ou de alguém com ligação à mesma; na justificação dada pelo sujeito passivo beneficiário para a existência da referida transferência que não relaciona a B…, Lda mas uma outra entidade, a D…, Lda e nas informações prestadas pela única empresa em Portugal representante da marca E… e ainda na recusa por parte da B…, Lda em mostrar a máquina no momento em que lhe foi solicitado.
  5. Por assim ser, não existindo o bem identificado na fatura em causa, a Requerida concluiu que aquela não titulava uma operação real, estando-se assim perante uma operação simulada pelo que dispondo o n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA que «Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada […]», por força deste dispositivo legal, o IVA mencionado naquele documento, não pode ser deduzido.
  6. Acresce que, a simulação a que alude o n.º 3 do artigo 19.º do CIVA apela apenas ao sentido de negócio sem aderência à realidade, pelo que improcede o argumento apresentado pela Requerente no que respeita ao facto de os negócios em causa não serem simulados por entender não estarem reunidos os pressupostos da simulação previstos no artigo 240.º do Código Civil.
  7. Ademais, como é consabido, é entendimento reiterado da jurisprudência comunitária que o direito à dedução pode ser vedado não só quando o vendedor participe conscientemente numa fraude como também naqueles casos em que não tenha tomado todas as medidas razoáveis de modo a evitar a sua participação num esquema fraudulento.
  8. Sucedendo que, no caso dos autos, atenta a factualidade constatada, bem como os termos do negócio realizado, constata-se uma evidência flagrante: no mínimo, a Requerente não cuidou de tomar as medidas que tinha ao seu alcance para evitar a sua participação numa fraude

 

Quanto à alegada Ilegalidade do Procedimento de Inspeção

 

  1. Contrariamente ao alegado pela Requerente, verifica-se pelo relatório de inspeção que, quer pelo que nele se encontra determinado e consignado quanto às finalidades e motivos, ao âmbito e ao lugar da realização, quer do seu conteúdo material, a referida inspeção foi, de facto, interna, porque os atos de inspeção se efetuaram exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos, e não total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos, obrigados tributários ou terceiros com quem mantivessem relações económicas ou outro local.
  2. Deste modo, tendo o procedimento sub judice natureza interna, tendo em conta o lugar onde ocorreu, o seu início não tinha de ser comunicado à ora Requerente, uma vez que só o procedimento externo depende de credenciação dos funcionários para tal incumbidos (n.º 1 do artigo 46.º do RCPITA) e da notificação do seu início (artigos 49.º, 50.º e 51.º, n.º 1, todos do RCPITA), não existindo obrigação de comunicar ao Requerente o início do procedimento, por se estar perante procedimento inspetivo de natureza interna, pelo que, é de concluir que o procedimento inspetivo que esteve na origem da correção em análise não é ilegal.
  3. Ainda que assim não fosse, como bem refere o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, 30-04-2014, proferido no processo n.º 06580/13, “tal prazo tem natureza meramente ordenadora, sendo que a única consequência que decorre da sua violação é a que resulta do nº 1 do artº 46º da LGT: o prazo de caducidade, que estava suspenso, cessa esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, ou seja, tudo se passa como se não tivesse sido feita a inspecção correndo o prazo de caducidade continuamente e sem qualquer suspensão.”.
  4. Contrariamente ao alegado pela Requerente, são devidos juros compensatórios, nos termos previstos do n.º 1 do artigo 35.º da LGT, de onde decorre que aqueles são devidos quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária.
  5. Ademais, são também devidos juros de mora, não nos termos do n.º 5 do artigo 43.º da LGT, conforme sugerido pela Requerente mas, antes, nos termos do artigo 44.º do mesmo diploma normativo e do artigo 96.º, n.º 2 do CIVA, conforme, aliás, devidamente evidenciado na notificação da demonstração da liquidação de juros e cujos pressupostos se verificam – máxime, o não pagamento do imposto no respetivo prazo legal.

Por outro lado,

  1. Cumpre ainda acrescentar que, contrariamente ao peticionado pela Requerente, ainda que o presente pedido fosse declarado procedente, o que apenas se admite à cautela e por dever de patrocínio, não lhe seriam devidos juros indemnizatórios uma vez que não se encontram preenchidos os respetivos pressupostos nos termos previstos no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, nomeadamente, o pressuposto necessário da existência de erro imputável aos serviços pois que  a Requerida, face à informação que dispunha, não contraditada pela Requerente, uma vez vinculada ao princípio da legalidade, não poderia ter atuado de outra forma.

 

6. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.

O processo não padece de vícios que o invalidem.

 

7. Cumpre solucionar as seguintes questões:

 

a) Se são ilegais o ato de liquidação de imposto e os juros compensatórios e moratórios objeto do presente processo.

b) Se em caso de procedência da pretensão anulatória tem o Requerente direito à restituição das quantias pagas e de juros indemnizatórios e moratórios sobre as mesmas.

 

 

II – A matéria de facto relevante

 

8.

 

1.A AT instaurou contra o Requerente um procedimento de inspeção relacionado com um contrato de locação financeira celebrado entre a Requerente, na qualidade de locador financeiro, e a sociedade B…, Lda, na qualidade de locatária financeira.  

2.Neste âmbito, foi a Requerente notificada em 29 de janeiro de 2014 do Ofício n.º…, de 27 de janeiro de 2014, para remeter à Direção de Finanças de … por escrito e no prazo de 10 dias os seguintes elementos:

(i). Cópia do contrato de locação financeira celebrado entre a Requerente e a B…;

(ii). Cópia da fatura de compra do equipamento objeto do contrato de locação financeira; e

(iii). Indicação do período no qual o IVA suportado na aquisição do equipamento objeto do contrato de locação financeira foi deduzido pela Requerente.

3.Em resposta à notificação da AT, a Requerente prestou o esclarecimento e entregou os documentos solicitados que fez acompanhar do auto de receção do equipamento objeto do contrato de locação financeira emitido pela B… .

 4.Na sequência dos documentos e esclarecimento facultados, a AT elaborou e notificou a Requerente, em 20 de março de 2015, do projeto de relatório de inspeção tributária donde consta, designadamente, o seguinte:

 

 

 

 

 

5. A correção à matéria tributável em  resultado das conclusões do procedimento de inspeção deu inicialmente origem à liquidação adicional de IVA n.º 2015 … promovida e notificada pela AT à Requerente da qual resultou o valor de € 1.293.921,48 a título de imposto a pagar pela Requerente até ao dia 7 de outubro de 2015, mas posteriormente  procedeu a AT à sua correção mediante a emissão de nova liquidação e de demonstração de acerto de contas, no âmbito da qual se procedeu ao estorno de € 1.267.471,48 (correspondente à diferença entre o imposto inicialmente liquidado – no valor de € 1.293.921,48 – e o valor de imposto efetivamente a liquidar na sequência da correção à matéria tributável efetuada pela AT no âmbito do procedimento de inspeção tributária que foi fixado em  € 26.450,00.

6. Também em matéria de juros compensatórios e de mora, foram inicialmente  liquidados € 151.016,58 a título de juros compensatórios e € 26.447,20 a título de juros de mora, que foram posteriormente corrigidos pela AT para € 3.087,04 e € 540,63.

7. A Requerente procedeu ao pagamento voluntário de € 26.450,00 de IVA, em 7.10.2015, bem como ao pagamento dos juros compensatórios no valor de € 3.087,04, em 21.12.2015, e ainda ao pagamento dos juros  moratórios no valor de € 540,63 em 21.12.2015.   

8. A Requerente exerce, desde 1991, atividade no setor bancário e financeiro em Portugal.

9.No âmbito desta atividade, a Requerente celebrou, em 28 de março de 2012, um contrato de locação financeira mobiliária com a B…, respeitante a uma máquina Industrial marca E… . modelo: …, com uma duração de 60 meses e opção de compra pela locadora no final do Contrato.

10.Pela utilização do Equipamento, a B… obrigou-se ao pagamento de uma renda antecipada de periodicidade mensal.

11.Para garantia de cumprimento desta obrigação de pagamento das rendas por parte da B…, apresentaram os representantes da B…– F… e R…- livrança em branco por si subscrita e avalizada.

12. Quanto à aquisição do Equipamento, dispõe o n.º 4 do artigo 1.º das Condições Gerais do Contrato, que “o Locatário declara ter escolhido de livre vontade o bem locado e o respectivo fornecedor e ter negociado directamente com este a marca, o modelo, respectivas especificações técnicas ou de utilização, prazo de entrega e condições desta, o preço e demais aspectos aplicáveis mencionados nas Condições Particulares do presente contrato”.

14. Nos termos do n.º 1 do artigo 4.º das Condições Gerais do Contrato, “todo o processo de escolha do bem locado relativamente às suas características técnicas, garantias, prazo de entrega, preço e outras condições de venda, foi desenvolvido directamente entre o locatário e o fornecedor”.

15.Nos termos das Condições Particulares do Contrato e do n.º 2 do artigo 4.º das Condições Gerais: “O Locador confere mandato ao Locatário, que o aceita, para proceder à recepção do bem locado”.

16. Nos termos do n.º 3 do artigo 3.º das Condições Gerais do Contrato: “com a recepção dos documentos mencionados no número anterior o Locador fica autorizado a pagar o bem locado ao fornecedor”.

17. Nos termos do n.º 1 do artigo 3.º das respetivas Condições Gerais, o Contrato, embora entrando em vigor na data da sua celebração, apenas produziria efeitos após a entrega à Requerente por parte da B… de alguns documentos, de entre os quais “o «auto de recepção» do bem locado e respectiva factura, devidamente preenchidos, datados e por si assinados, certificando que o bem locado lhe foi entregue em bom estado e de acordo com as condições negociadas com o fornecedor do mesmo”.

18. Em 27 de março de 2012 a Requerente procedeu ao pagamento de € 41.217,50 em duas tranches – de € 20.000 e € 21.217,50 -, a título de adiantamento do preço.

19. Em 27 de março de 2012, a B… emitiu e comunicou à Requerente o auto de receção do bem locado nas suas instalações nos termos do Contrato, no âmbito do qual a B… declarou “ter recebido em 27/03/2012 o equipamento acima mencionado [“Máquinas Industriais. Marca:E…  . Modelo: ... Novo”] e que o mesmo foi devidamente entregue e instalado pelo Fornecedor e corresponde às exigências e especificidades requeridas pelo Locatário, aceitando-o a título definitivo, sem restrições nem reservas, autorizando o A…, S.A. à Liquidação da factura definitiva emitida pelo Fornecedor” .

20. Em 30 de março de 2012, a Requerente ordenou o pagamento de € 100.232,50, por transferência bancária que foi concluída em 3 de abril de 2012.

21. A referida transferência bancária foi efetuada para a conta bancária indicada C… na fatura emitida pela alienação do Equipamento com o NIB … .

22.Nos termos do n.º 5 do artigo 4.º das Condições Gerais do Contrato, “A não entrega do bem locado pelo fornecedor ou a desconformidade do mesmo com a constante nas Condições Particulares não exoneram o Locatário das suas obrigações face ao Locador, nem lhe concedem qualquer direito face a este, competindo-lhe exigir do fornecedor qualquer indemnização a que se ache com direito, nos termos da lei”.

23.Nos termos do n.º 5 deste artigo 4.º das Condições Gerais que “ao Locatário competirá exercer qualquer acção ou direito contra o fornecedor por incumprimento deste relativo ao bem locado,” e que “para este efeito, e atento o disposto nos números anteriores relativamente à responsabilidade do Locatário pela escolha do fornecedor e pela encomenda do bem locado, o Locador subroga, desde já, o Locatário em todos os eventuais direitos relativamente ao fornecedor”.

 24. O Contrato foi, pontual e integralmente cumprido pela B… até ao mês de março de 2015, que procedeu ao pagamento atempado durante três anos de todas as rendas do Contrato que se venceram até à mencionada data, num total de 37 rendas mensais

25. A Requerente deduziu o IVA suportado com a aquisição do Equipamento objeto do Contrato, no valor de € 26.450,00.

 

 

Com interesse para a decisão da causa inexistem factos não provados

 

9. A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto alicerçou-se nos documentos constantes do processo, bem como dos articulados apresentados, sendo de salientar não ocorrer divergência das partes relativamente à matéria de facto, cingindo-se o desacordo à matéria de direito.

 

 

 

 

-III- O Direito aplicável

 

10. Tendo a impugnante imputado diversos vícios aos atos tributários impugnados há que determinar a ordem do conhecimento dos mesmos, devendo ser observada a ordem do art. 124º do CPPT, aplicável por força do art. 29º, nº 1, al. a) do RJAT[1].

A procedência de qualquer dos vícios invocados pela requerente conduzirá à anulação do ato tributário. No entanto, a ilegalidade decorrente de violação do art. 19º, nº 3, do CIVA é aquela que conduzirá à “mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos” na medida em que a sua eventual procedência impedirá a renovação do ato, o que não sucede com a anulação decorrente da ilegalidade do procedimento de inspeção.

Em conformidade, o Tribunal irá apreciar em primeiro lugar do vício de violação de lei, pela alegada infração do art. 19º, nº 3, do CIVA.

 

 

11. Dispunha o art. 19º, nº 3,  do Código do Imposto sobre o valor acrescentado, na redação  à data dos factos, que:

 “Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente.”

Nos termos do art. 11º, nº 2 da Lei Geral Tributária:

Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm salvo se outro decorrer directamente da lei.”

Há assim que começar por indagar o conceito de simulação no direito civil, ramo de que  é originário.

Estabelece o nº 1, do art. 240º do Código Civil, o seguinte:

 

Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado

 

 

Nas palavras de Pedro Pais de Vasconcelos “A simulação é uma divergência bilateral entre a vontade e a declaração, que é pactuada entre as partes com a intenção de enganar terceiros.(…)

São três os elementos estruturais da simulação:

-acordo entre as partes com o fim de criar uma falsa aparência de negócio (pactum simulationis);

-a divergência entre a vontade declarada e a vontade real, isto é, entre a aparência criada (negócio exteriorizado) e a realidade negocial (negócio realmente celebrado);

-Intuito de enganar terceiros.[2]

Somos da opinião que nenhum elemento interpretativo da lei fiscal permite dispensar qualquer um destes elementos.[3]

No caso do contrato de locação financeira a realidade negocial típica apresenta-se como tripartida.

Por um lado temos o contrato de locação financeira entre locador e locatário, por outro o contrato de compra e venda entre o fornecedor e o locador.

Sobre o tema, diz-nos FERNANDO GRAVATO DE MORAIS que:

O esquema típico da operação de locação financeira, globalmente considerada, é o seguinte:

-num primeiro momento, o interessado na celebração do contrato de locação financeira dirige-se a um dado fornecedor, inteirando-se das características essenciais do específico bem a locar (escolhendo, portanto, a coisa) e estabelecendo as condições de aquisição do concedente;

-em seguida, dirige-se à instituição de crédito (ou o fornecedor tem até na sua formulários do locador financeiro com quem mantém relações de colaboração mais ou menos estreitas) e preenche uma “proposta de contrato de locação financeira”, cujo texto foi por aquela previamente elaborado;

-posteriormente, tal instituição, depois de apreciar e de (eventualmente) aprovar a proposta, envia o texto do contrato ao locatário, que o assina;

-concluído o negócio, o locador financeiro adquire ou manda construir a coisa,

-o bem é depois entregue pelo fornecedor (directamente) ao utente, subscrevendo este em seguida um “auto de recepção e de conformidade do equipamento”, que tem por função atestar a entrega do bem e a inexistência de defeitos da coisa”.[4]

Embora a compra e venda seja celebrada entre o fornecedor e o locador, nos termos do art. 1º do DL n.º 149/95, de 24 de Junho a coisa objeto do contrato é adquirida ou construída por indicação do locatário, sendo que nos termos do art. 13º do mesmo Decreto-Lei  este “pode exercer contra o vendedor ou o empreiteiro, quando disso seja caso, todos os direitos relativos ao bem locado ou resultantes do contrato de compra e venda ou de empreitada”.

 

No caso em apreço, os fundamentos de facto invocados pela Requerida poderão indiciar um conluio entre o fornecedor da máquina e o locatário, com declarações de ambos desconforme com a realidade com o intuito de enganar o Requerente, mas não qualquer divergência entre a vontade real e a vontade declarada por parte do Requerente nem, no que a este diz respeito, qualquer outro dos demais elementos estruturantes da simulação.

 

E estando em causa, como está, um negócio jurídico -compra e venda- celebrado entre o Fornecedor C… e o Requerente e não com a locatária  B…, Lda, é quanto basta para que se concluía ser manifesto inexistir simulação.

 

Acrescente-se, aliás, que, no sistema jurídico português vigora, no que respeita à transmissão de propriedade em sede de compra e venda o sistema do titulo e não o sistema do modo, como decorre, designadamente dos art. 874º, 879º, 882ºdo código civil. Assim, a válida celebração do contrato de compra e venda entre a C… e a Requerente e a consequente transmissão da propriedade, não estava sequer dependente da entrega da coisa objeto do contrato.

De resto, conforme decorre do contrato de locação financeira celebrada, ficou convencionado que a entrega seria efetuada ao locatário e este declarou que tal entrega lhe foi feita.

Não há, assim, qualquer indício de que o Requerente tivesse conhecimento de que o equipamento em causa não tivesse sido entregue ao locatário, nem a Requerente o alegou.

 

12. É certo que, em sede de resposta alegou a Requerida que:

 

“(…) é entendimento reiterado da jurisprudência comunitária, (…), que o direito à dedução pode ser vedado não só quando o vendedor participe conscientemente numa fraude como também naqueles casos em que não tenha tomado todas as medidas razoáveis de modo a evitar a sua participação num esquema fraudulento.

 

Sucedendo que, no caso dos autos, atenta a factualidade constatada, bem como os termos do negócio realizado, constata-se uma evidência flagrante: no mínimo, a Requerente não cuidou de tomar as medidas que tinha ao seu alcance para evitar a sua participação numa fraude”, dispondo o nº 4, do art. 19º do CIVA  que Não pode igualmente deduzir-se o imposto que resulte de operações em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento de que o transmitente dos bens ou prestador de serviços não dispõe de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade declarada.”

Porém, nem a Requerida o invocou esta norma   na fundamentação do ato tributário de liquidação do imposto (o que desde logo impediria que o tribunal considerasse tal fundamento, sob pena de violação do princípio da separação de poderes), nem no presente processo provou os factos integrantes da previsão normativa, que, em bom rigor, nem sequer alegou de forma concludente.  

Assim sendo, improcede também esta alegação da Requerida.

Em suma, não ocorrendo simulação no contrato de compra e venda celebrado entre o Requerente e a sociedade C…, Lda, que constituiu o fundamento para a prática do ato tributário de liquidação de imposto sobre o valor acrescentado, não pode o mesmo deixar de ser anulado, ficando, assim, prejudicado o conhecimento das demais questões suscetíveis de fundamentar a anulação da liquidação em causa.

 

13. Passemos a apreciar as questões dos atinentes aos juros compensatórios e aos juros moratórios liquidados ao Requerente.

Estabelece o artigo 24º do RJAT que:

1 - A decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, alternativa ou cumulativamente, consoante o caso:

a) (…);

b) Restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito;

c) Rever os actos tributários que se encontrem numa relação de prejudicialidade ou de dependência com os actos tributários objecto da decisão arbitral, designadamente por se inscreverem no âmbito da mesma relação jurídica de imposto, ainda que correspondentes a obrigações periódicas distintas, alterando-os ou substituindo-os, total ou parcialmente;

(…)”

 

 

Este artigo está em sintonia com a norma do art. 100º da Lei Geral Tributária que estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”

Destas normas decorre que, anulado o ato de liquidação de imposto sobre o valor acrescentado, não pode deixar de ser anulado o ato de liquidação de juros compensatórios, bem como os juros moratórios liquidados.

De resto, sempre se dirá que estabelecendo o nº 2 do art. 96º do CIVA que Sempre que o imposto liquidado pelos serviços ou pelo sujeito passivo não seja pago até ao termo dos prazos legais estabelecidos, são devidos juros de mora nos termos do artigo 44.º da lei geral tributária”. Ora, não tendo o Requerente deixado de pagar o imposto no prazo legal na sequência da liquidação, os juros moratórios sempre careceriam de base legal.

14. Veio, ainda, a Requerente pedir a condenação da Requerida a restituir as quantias pagas correspondentes à liquidação objeto do presente processo, bem como os respetivos juros indemnizatórios.

 

No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos atos de liquidação, há lugar a reembolso do imposto, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado”.

No que concerne aos juros indemnizatórios , o n.º 5 do artigoº 24.º do RJAT ao estabelecer  que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário” deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral  cabendo apreciar esta pretensão à luz do artigo 43º da Lei Geral Tributária, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

Dispõe o nº 1 daquele artigo que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

Sufragamos o entendimento de Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa que sustentam que “O erro imputável aos serviços que operaram a liquidação fica demonstrado quando procederem a reclamação graciosa ou a impugnação judicial dessa mesma liquidação e o erro não for imputável ao contribuinte.[5]

No caso “sub judice”, não sendo o erro que deu origem às liquidações, ora anuladas, imputável ao Requerente, não poderá deixar de proceder o pedido de condenação da Requerida quanto aos juros indemnizatórios.

Assim, deverá a Autoridade Tributária e Aduaneira dar execução à presente decisão, nos termos do artigoº 24.º, n.º 1, do RJAT, restituindo as importâncias pagas pela Requerente relativamente às liquidações anuladas, com juros indemnizatórios, à   taxa legal.

Os juros indemnizatórios são devidos desde a data do pagamento até à do processamento da nota de crédito, em que são incluídos (artigoº 61.º, n.º 5, do CPPT).

 

15. O Requerente veio ainda peticionar a condenação da Requerida ao pagamento de “

juros de mora, se a eles houver lugar”.

Os juros moratórios a favor do sujeito passivo estão previstos no art. 43º, nº 5, da LGT,  que estabelece o seguinte:

No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de

decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas”.

Esta norma tem natureza sancionatória e compulsória[6],  sendo aplicável quando a Administração Tributária não dê cumprimento atempado à decisão proferida pelo tribunal, transitada em julgado, que impunha a obrigação de restituir imposto pago.

É manifesto, pois, que a omissão ilícita pressuposto de aplicação da norma não ocorreu, nem poderia ter ainda ocorrido.

Em todo o caso, e previamente, há que notar que, como escreve Jorge Lopes de Sousa “(…)o cumprimento do dever de executar e as consequências do seu incumprimento situam-se a jusante do processo arbitral, pois os tribunais arbitrais que funcionam no CAAD não têm competências executivas, como resulta do art. 2º, nº 1, do RJAT.[7]

Por isso, caso a Administração não dê cumprimento ao dever de executar ou cumpra esse dever em termos diferentes daqueles que o sujeito passivo entende serem adequados, este terá de utilizar o processo de execução de julgados, previsto nos artigos 173º e seguintes do CPTA, aplicáveis por força do disposto no 29º, nº 1, alíneas a) e c) do RJAT, e nos artigos 102º da LGT, e 146º, nº 1, do CPPT[8]

 Sufragando-se este entendimento, declara-se a incompetência material do Tribunal Arbitral no que respeita a esta pretensão e, em consequência, absolve-se a Requerida da instância relativamente a este pedido.

 

 

-IV- Decisão

 

 

Assim, decide o Tribunal arbitral:

a)         Decretar a anulação dos atos de liquidação de IVA e de juros compensatórios e moratórios, objeto do presente processo.

b)         Condenar a Requerida a   restituir ao requerente os montantes pagos com juros indemnizatórios à taxa legal, contados desde a data do pagamento pelo requerente até à do processamento da nota de crédito.

c)         Absolver a Requerida da instância no que respeita ao pedido de condenação em juros moratórios.

 

 

 

Valor da ação: € 30.077,67 (trinta mil, setenta e sete euros e sessenta e sete cêntimos), nos termos do disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A,n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

 

Custas pela Requerida, no valor de 1 836.00 € (mil oitocentos e trinta e seis euros)nos termos do nº 4, do art. 22º, do RJAT.

                                 

Notifique-se.

 

 

Lisboa, CAAD, 12.09.2016

 

 

O Árbitro

 

Marcolino Pisão Pedreiro

                       

 



[1] Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, in GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, 2013, Almedina, pag. 202.

[2]TEORIA GERAL DO DIREITO CIVIL, Almedina, 2012, 6ª Edição, pag. 682.

[3] Sem prejuízo de sermos da opinião de que “a simulação fiscal, assentando embora em boa parte na formulação conceptual do direito civil, é necessariamente uma figura com traços específicos.

Desde logo, porque para a ocorrência da simulação fiscal, torna-se necessário que da mesma resulte uma distorção da quantificação da obrigação fiscal.  A lei proíbe expressamente a prática de actos inúteis (art. 57º, nº 1 da LGT), pelo que não pode a ATA, declarar para efeitos fiscais uma simulação civil, se da mesma não tiver resultado uma distorção da liquidação do imposto. A idêntica conclusão se chega pela aplicação do princípio da eficiência da administração pública (art. 267º, nº 5 da CRP)”, conforme escrevemos no artigo “Algumas reflexões sobre regimes especiais de simulação em Direito Fiscal: IVA, IMT e CIS”, REVISTA DE FINANÇAS PUBLICAS E DIREITO FISCAL, pags. 143-144,   Em sentido idêntico se pronuncia João Ricardo Catarino in LIÇÕES DE FISCALIDADE, Vol. II, Almedina, 2015, João Ricardo Catarino-Vasco Branco Guimarães (coord.), pags 68-69.

[4] MANUAL DE LOCAÇÃO FINANCEIRA, Almedina, 2006, pags 25-26.

[5] LEI GERAL TRIBUTÁRIA, Anotada e Comentada, encontros da escrita, 4ª Edição, 2012, pág. 342.

[6] Neste sentido Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pág. 344.

[7] Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, in GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, 2013, Almedina, pag. 213.