Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 321/2015-T
Data da decisão: 2016-01-11  Selo  
Valor do pedido: € 26.537,20
Tema: Imposto do Selo; competência do Tribunal Arbitral
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Decisão Arbitral

 

            I – Relatório

 

            1.1. A..., contribuinte fiscal n.º..., ora representado pela B..., S.A., contribuinte fiscal n.º..., com domicílio fiscal na Avenida..., lote..., rés-do-chão C, freguesia ..., concelho de Lisboa (doravante designada por «requerente»), tendo sido notificada dos “actos de liquidação de Imposto do Selo n.º 2015 ... e 2015..., praticados em 20/3/2015 pelo Sr. Director-Geral dos Impostos ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao CIS, dos quais resultou uma colecta total de €26.537,20”, e não se conformando com as mesmas, submeteu à apreciação do presente Tribunal, em 20/5/2015, um pedido de pronúncia arbitral com vista à apreciação da “ilegalidade das [supra referidas] liquidações de Imposto do Selo”, por entender que ocorre “falta de fundamentação do acto de liquidação de imposto reclamado”, “preterição de formalidade legal essencial” e “errónea aplicação da lei pela Administração Tributária”. Requer, por último, “indemnização por garantia indevidamente prestada”.

 

            1.2. Em 7/8/2015 foi constituído o presente Tribunal Arbitral Singular, tendo como árbitro o Exmo. Sr. Dr. Augusto Vieira (nomeado a 22/7/2015).

 

            1.3. Nos termos do art. 17.º, n.º 1, do RJAT, foi a AT citada, enquanto parte requerida, para apresentar resposta, nos termos e para os efeitos do referido artigo, através de despacho de 10/8/2015. Pelo mesmo despacho, foram as partes convidadas a pronunciarem-se sobre a eventual dispensa da realização da reunião a que alude o art. 18.º do RJAT e, ainda, sobre a eventual dispensa de produção de alegações escritas ou orais. Em novo despacho, também de 10/8/2015, relativo à prova testemunhal, o Tribunal decidiu, ao abrigo do disposto no artigo 16.º, al. c), e artigo 19.º, ambos do RJAT, não proceder à audição das testemunhas arroladas pela Requerente, por se entender “que a prova que compete [à factualidade alegada no pedido de pronúncia] é a documental, o que decorre, aliás, da leitura do pedido de pronúncia e dos documentos já juntos ao processo.”

 

1.4. Por despacho de 31/8/2015 do Exmo. Sr. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, foi comunicado às partes o seguinte: “O Exmo. Dr. Augusto Vieira, designado para as funções de árbitro no processo em referência, veio pedir escusa das suas funções. Em tal conformidade, determina-se a substituição, como árbitro no presente processo, do Exmo. Dr. Augusto Vieira pelo Exmo. Prof. Doutor Miguel Patrício.”

 

1.5. A AT apresentou a sua resposta a 1/10/2015, tendo aí argumentado as seguintes excepções: i) excepção por “incompetência do tribunal arbitral” para “a apreciação do pedido formulado, qual seja o da legalidade de uma mera nota de cobrança”; ii) excepção por “inimpugnabilidade dos actos impugnados”, por se entender que “os presentes documentos de cobrança não são impugnáveis de per si”; e, se assim não se entender, alegou-se, ainda, iii) excepção por “incompetência material absoluta do Tribunal Arbitral para reconhecer o direito dos requerentes ao pagamento de uma indemnização por prestação indevida de garantia”, por “falta de previsão legal”. Por impugnação, a AT argumentou, em síntese, que não houve falta de fundamentação, nem preterição de formalidade essencial por alegada violação do art. 60.º da LGT, nem errónea aplicação da lei. Alegou a AT, por último, que não existe “qualquer erro imputável aos serviços pelo que improcede, por infundado, o pedido dos Requerentes a qualquer indemnização por prestação de garantia indevida” e afirmou que não prescindia da realização de alegações escritas.

 

            1.6. A Requerente, notificada da resposta da AT, respondeu, por escrito, às excepções invocadas, em requerimento de 12/10/2015, o qual foi notificado à Requerida. No referido requerimento, a Requerente alegou, em síntese, que as excepções que foram alegadas pela AT são “integralmente improcedentes, por infundadas e não provadas”.

           

            1.7. A 12/10/2015 – e na sequência do despacho de 31/8/2015 do Exmo. Sr. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD –, foi nomeado como árbitro do presente processo o Sr. Professor Doutor Miguel Patrício.

 

            1.8. Em 21/10/2015, a Requerida apresentou requerimento em que requer a dispensa da junção do processo administrativo.

 

            1.9. A 26/10/2015, a Requerente apresentou requerimento no qual inclui cópia dos, por si denominados, “actos tributários” relativos à 3.ª prestação do Imposto do Selo liquidado ao abrigo da verbo 28.1. da TGIS, por constituírem “parte da colecta de Imposto de Selo cuja anulação, na sua totalidade, se requereu nestes autos”. (A 9/7/2015, a ora Requerente tinha requerido a junção aos autos de cópia das notas de cobrança relativas às 2.as prestações.)

 

            1.10. Em 7/12/2015, a Requerente apresentou requerimento em que requer, “ao abrigo dos artigos 53.º e 171.º, n.º 2, do CPPT, em caso de procedência do presente processo arbitral, o pagamento de indemnização à Requerente, correspondente à totalidade dos custos incorridos com a garantia bancária n.º..., prestada em 3 de novembro de 2015, pelo Banco..., S.A., no valor de €23.474,30, para a suspensão dos processos de execução fiscal acima identificados, contabilizados até à data em que seja autorizado o levantamento da garantia.”

 

1.11. Considerando que a ora Requerente já se tinha pronunciado por escrito sobre as excepções alegadas pela Requerida, o presente Tribunal considerou, ao abrigo do disposto no art. 16.º, als. c) e e), e 19.º, ambos do RJAT, dispensável a reunião do art. 18.º do RJAT, bem como a audição de testemunhas, e que o processo prosseguisse para decisão, tendo fixado a data de 11/1/2016 para a prolação da mesma.

 

            1.12. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

            1.13. No seu pedido de pronúncia, a ora Requerente afirma pretender que o Tribunal “aprecie a legalidade das liquidações de Imposto do Selo n.º 2015 ... e 2015..., praticados em 20/03/2015, pelo Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos, ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao Código do Imposto do Selo, dos quais resultou uma colecta total de €26.537,20”. A este respeito, a Requerente especifica que “o objecto do pedido de pronúncia do Tribunal Arbitral são os seguintes atos tributários: - Ato de liquidação de Imposto do Selo n.º 2015..., praticado em 20/03/2015, pelo Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos, por referência ao lote de terreno inscrito na matriz predial da freguesia da..., concelho de Lisboa, sob o artigo..., ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao Código do Imposto do Selo, dos quais resultou uma colecta total de €13.042,50 [e] – Ato de liquidação de Imposto do Selo n.º 2015..., praticado em 20/03/2015, pelo Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos, por referência ao lote de terreno inscrito na matriz predial da freguesia da..., concelho de Lisboa, sob o artigo..., ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao Código do Imposto do Selo, dos quais resultou uma colecta total de €13.494,70”. Em síntese, a Requerente “pretende que seja declarada a ilegalidade dos atos de liquidação de Imposto do Selo [...] e, em consequência, sejam os mesmos anulados, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro”. Peticiona a referida anulação por entender que os “atos de liquidação” supra referidos padecem de “vício de violação de lei”, com fundamento na “falta de fundamentação do acto de liquidação de imposto reclamado” (por, alegadamente, não terem sido “explicados os fundamentos de facto e de direito subjacentes” aos actos tributários em questão), em “preterição de formalidade legal essencial” (por, alegadamente, “a ora Requerente [não ter] sido notificada nos termos previstos na alínea a), do n.º 1, do artigo 60.º da Lei Geral Tributária”) e em “errónea aplicação da lei pela Administração Tributária” (por entender, em síntese, que “não poderiam ambos os imóveis ter sido classificados como «terreno para construção», nos termos e para efeitos do artigo 6.º, n.º 1, alínea c), do Código do IMI, sendo antes mais apropriada à sua realidade material a classificação de «outros», nos termos e para efeitos do artigo 6.º, n.º 1, alínea d), do Código do IMI, em face da sua falta de licenciamento para construção, no caso do imóvel inscrito sob o artigo ... da freguesia da..., ou por força da falta de capacidade construtiva, no caso do imóvel inscrito sob o artigo ... da freguesia da...”). Por último, a Requerente requer “indemnização por garantia indevidamente prestada”.

           

            1.14. A ora Requerente conclui a sua petição requerendo “a ilegalidade dos atos de liquidação do Imposto do Selo [supra identificados, e] a sua consequente anulação, tudo com as legais consequências.” 

 

            1.15. Por seu lado, a AT alegou, na sua resposta, e em síntese, que: a) “a requerente impugna não [...] o acto de liquidação do imposto de selo mas sim as prestações periódicas de pagamento de um imposto único. [Acresce que] o Imposto de Selo a que se refere a verba 28 da TGIS é liquidado anualmente, não sendo o pagamento em prestações mais do que uma técnica de arrecadação do imposto e não um seu pagamento parcial, [pelo que] o pagamento de uma das prestações da liquidação efectuada ao abrigo do disposto na verba 28.1 da TGIS não é um pagamento parcial daquela liquidação, mas tão só uma técnica de cobrança do imposto liquidado. [...] Entende a AT que os documentos de cobrança não são impugnáveis de per si, razão pela qual deve a excepção invocada ser procedente e a AT ser absolvida do pedido”; b) “a Requerente não impugna o acto tributário de liquidação, mas sim o pagamento de uma prestação do acto de liquidação constante de um documento que é uma nota de cobrança, [pelo que] o objecto do processo é a anulação não de um acto tributário (ou de 1/3 de um acto tributário, o que não seria legalmente possível) mas sim de notas de cobrança para o pagamento de [prestações] de um imposto, [o que] extravasa a competência do Tribunal arbitral”; c) não está “prevista a competência do Tribunal Arbitral para o reconhecimento de direitos pelo que se verifica, no caso em apreço, a incompetência material absoluta do tribunal arbitral para proceder ao reconhecimento de direitos, nomeadamente ao pagamento de uma indemnização por prestação indevida de garantia, por falta de previsão legal”. Para além das excepções supra invocadas, a AT argumentou, por impugnação, e em síntese, que não houve falta de fundamentação, nem preterição de formalidade essencial por alegada violação do art. 60.º da LGT, nem errónea aplicação da lei. Alegou, por último, que não existe “qualquer erro imputável aos serviços pelo que improcede, por infundado, o pedido dos Requerentes a qualquer indemnização por prestação de garantia indevida”.

  

            1.16. Conclui a AT que “deve ser julgada procedente a excepção de incompetência do Tribunal arbitral, ou caso assim não se entenda, deve ser considerada procedente a inimpugnabilidade dos actos em causa no pedido de pronúncia arbitral, ou ainda, caso assim não se decidir, deve a presente acção ser julgada improcedente, absolvendo-se a entidade Requerida do pedido com as demais consequências legais.” 

 

*

 

            II – Factualidade Pertinente

 

            2.1. Em Maio de 2015, a ora Requerente entregou um pedido de pronúncia arbitral no CAAD, no qual identifica como “objecto do pedido [...] os seguintes actos tributários: - Ato de liquidação de Imposto do Selo n.º 2015..., praticado em 20/03/2015, pelo Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos, por referência ao lote de terreno inscrito na matriz predial da freguesia da..., concelho de Lisboa, sob o artigo..., ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao Código do Imposto do Selo, dos quais resultou uma colecta total de €13.042,50 (cfr. Documento n.º 1 que se junta); - Ato de liquidação de Imposto do Selo n.º 2015..., praticado em 20/03/2015, pelo Exmo. Senhor Director-Geral dos Impostos, por referência ao lote de terreno inscrito na matriz predial da freguesia da..., concelho de Lisboa, sob o artigo..., ao abrigo da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao Código do Imposto do Selo, dos quais resultou uma colecta total de €13.494,70 (cfr. Documento n.º 2 que se junta). Tudo no montante de €26.537,20.”

 

            2.2. Observando os referidos Documentos n.os 1 e 2, apensos à petição de pronúncia arbitral da Requerente, verifica-se, de forma clara, que a mesma associa a “actos tributários” de liquidação as notas de cobrança (respeitantes à “1.ª prestação” de pagamento dos Impostos únicos do Selo) n.º 2015 ... e n.º 2015..., respectivamente.

 

            2.3. É certo que a Requerente pretendeu, no seu requerimento de 9/7/2015, a inclusão no objecto de pronúncia do Tribunal Arbitral – porque, em seu entender, são “correspondentes a parte da colecta de Imposto do Selo já contestada, na sua totalidade” –, a apreciação da legalidade dos actos n.º 2015 ... e n.º 2015..., relativos à 2.ª prestação; e no seu requerimento de 7/12/2015, a inclusão no objecto de pronúncia do Tribunal Arbitral da legalidade dos actos n.º 2015... e n.º 2015..., relativos à 3.ª prestação. Contudo, também não parece ser menos certo que o que se pretendeu na petição de pronúncia arbitral foi a impugnação autónoma de (primeiras) prestações de Imposto do Selo (mesmo que não se afirmasse tal nestes exactos termos). Com efeito, não pode ser outra a interpretação a fazer porque a ora Requerente invocou, na referida petição, vícios que não podiam deixar de ser referentes às primeiras prestações, e não relativos aos actos de liquidação do Imposto único do Selo – que, na altura, ainda não existiam. Note-se, ainda, que a menção do valor da colecta total nessa petição não permite – ao contrário do que pretende a ora Requerente, no seu requerimento de 12/10/2015 –, superar a constatação acima feita – uma vez que permite, apenas, concluir que não existia, àquela data, factualidade documentada que suportasse o valor global indicado pela ora Requerente (quanto a Impostos únicos que, à data, não existiam e que, por essa razão, não eram impugnáveis). Sendo as mencionadas liquidações indivisíveis, somente os actos únicos de liquidação de IS poderiam ser sindicados, e não as diversas prestações dos mesmos (ainda que posteriormente cumuladas), dado que estas não constituem, de per si, “acto único de liquidação” ou acto lesivo susceptível de impugnação.

 

            III – Da Excepção por Inimpugnabilidade Autónoma das Prestações

 

            Tendo em consideração que foram invocadas pela AT as excepções supra referidas, justifica-se, previamente, a sua apreciação (v. art. 608.º, n.º 1, do CPC, ex vi art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT). Nestes termos, justifica-se, agora, saber se, como alega a ora requerida, ocorre a inimpugnabilidade autónoma das prestações dos actos de liquidação constantes das notas de cobrança que constituem o objecto do presente pedido de pronúncia arbitral.

 

            Com efeito, lendo o disposto no CIS, verifica-se que o imposto em causa é liquidado anualmente (art. 23.º, n.º 7) e que deve ser pago nos prazos, termos e condições definidos no art. 120.º do CIMI (art. 44.º, n.º 5). Por sua vez, o referido art. 120.º do CIMI prevê, no seu n.º 4, que “o não pagamento de uma prestação [...] no prazo estabelecido implica o vencimento imediato das restantes”.

 

Do supra exposto decorre que se está perante um caso em que, à semelhança do que sucede com as prestações de IMI, o pagamento de cada uma das prestações do imposto não constitui pagamento parcial da liquidação, antes uma mera técnica de cobrança do imposto.

 

Também neste sentido, ver, p. ex., a DA proferida no proc. 726/2014-T, de 10/3/2015: “uma prestação não equivale a uma liquidação de imposto, porquanto, nos termos do n.º 7, do artigo 23.º, do Código do Imposto do Selo, na redação que lhe foi dada pelo artigo 3.º, da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, «7 - Tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada prédio urbano, pelos serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI» (sublinhado nosso). Ora, a expressão «o imposto é liquidado anualmente» indicia que é efetuada uma única liquidação anual, embora a mesma possa ser dividida, para efeitos de pagamento, em prestações, e não tantas liquidações quantas as prestações em que o débito deva ser satisfeito – a divisão de uma liquidação em prestações não passará, assim, de uma mera técnica de arrecadação de receitas. [...]. As prestações de pagamento de uma liquidação de IMI ou, na situação em análise, de uma liquidação de Imposto do Selo, nos termos da Verba 28 da TGIS, não são autonomamente sindicáveis, por terem origem numa única obrigação anual, de acordo com a lição de Braz Teixeira: «É necessário não confundir as prestações periódicas, que, embora realizando-se por atos sucessivos, em momentos diversos, têm origem numa mesma obrigação e constituem as várias parcelas de uma mesma prestação que se cindiu, com as prestações que devem efetuar-se periodicamente, não devido a uma divisão da prestação global, mas sim ao nascimento, também periódico, de novas obrigações, pela permanência dos pressupostos de facto da tributação.»” Ver, igualmente, no mesmo sentido, a DA proferida no proc. n.º 205/2013-T, de 7/3/2014: “Da circunstância do valor da liquidação [de Imposto de Selo] poder ser pago em várias prestações, não decorre que existam três liquidações. Trata-se, diferentemente, duma liquidação que pode ser paga em várias prestações”. Igualmente no sentido da incindibilidade, mas agora quanto a actos tributários de IMI (o que aqui é também relevante, dada a remissão prevista no art. 67.º, n.º 2, do CIS), veja-se, por exemplo, a DA proferida no proc. 120/2012-T, de 12/6/2013.  

 

            Também a este respeito, ver, por último – e dada a semelhança com o caso em análise –, a DA proferida no proc. 90/2015-T, de 25/9/2015, com a qual se concorda: “a liquidação de imposto é só uma e só ela constituirá um acto lesivo, susceptível de ser objecto de uma única impugnação, pelo que quando a lei prevê o seu pagamento em várias prestações, escalonadas no tempo, a anulação do acto tributário terá consequências relativamente a todas elas [...]. O que a lei não prevê, nem em sede arbitral, nem em sede de processo de impugnação judicial, é a pretensão anulatória de pagamento de prestações de imposto isoladas uma vez que tal efeito decorrerá apenas da anulação do acto tributário de liquidação que, como vimos, consiste na quantificação do montante total a pagar e que é apenas e tão só um único acto tributário. Assim, do acima exposto resulta que as notas de cobrança de Imposto do Selo, objecto do [...] pedido de pronúncia arbitral, não são impugnáveis de per si, porquanto não constituem actos de liquidação de tributos”. (Sublinhado nosso.)

 

            Como se referiu anteriormente, a petição de pronúncia arbitral pretendia a impugnação autónoma de (primeiras) prestações de Imposto do Selo (mesmo que não o afirmasse nestes exactos termos). Com efeito, não pode ser outra a interpretação a fazer porque a Requerente invocou, na referida petição, vícios que não podiam deixar de ser (apenas) referentes às 1.as prestações, e não relativos aos actos de liquidação do Imposto (único) do Selo (que, na altura, ainda não existiam). Acresce, ainda, que a menção do valor da colecta total na petição não permite – ao contrário do que pretende a ora Requerente, no seu requerimento de 12/10/2015 –, superar aquela constatação – dado permitir, apenas, concluir que não existia, àquela data, factualidade documentada que suportasse o valor global indicado pela Requerente (quanto a Impostos únicos que, à data, não existiam e que, portanto, não eram impugnáveis). Assim, sendo as referidas liquidações indivisíveis, somente os actos únicos de liquidação de IS poderiam ser sindicados, e não as diversas prestações dos mesmos (ainda que posteriormente cumuladas), dado que estas prestações não constituem, de per si, “acto único de liquidação” ou acto lesivo susceptível de impugnação.

 

            Em síntese: não sendo cada uma das prestações relativas a liquidação de Imposto do Selo autonomamente impugnáveis, conclui-se, pelas razões supra indicadas, que este Tribunal é incompetente para apreciar e decidir o pedido objecto do litígio sub judice, nos termos do disposto no art. 89.º, n.º 1, al. c), do CPTA, ex vi art. 29.º, n.º 1, al. c), do RJAT, por ocorrer excepção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no art. 576.º, n.os 1 e 2, do CPC, ex vi art. 2.º, al. e), do CPPT, e art. 29.º, n.º 1, als. a) e e), do RJAT, a qual obsta ao conhecimento do pedido e conduz à absolvição da instância da AT, nos termos dos arts. 576.º, n.º 2, e 577.º, al. a), do CPC, ex vi art. 29.º, n.º 1, als. a) e e), do RJAT.

 

            IV – Das Demais Excepções e do Mérito da Causa

 

Ao abrigo do disposto no art. 608.º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT, “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.

 

Ora, considerando a solução dada à questão da incompetência do presente Tribunal por razão da inimpugnabilidade autónoma das prestações, torna-se inútil a apreciação das demais excepções invocadas, ficando, ainda, necessariamente inviabilizada a apreciação do mérito da causa, incluindo a apreciação do pedido de indemnização por prestação de garantia indevida.

 

***

 

            V – Decisão

 

            Em face do supra exposto, decide-se:

 

            - Julgar procedente a excepção dilatória por razão da inimpugnabilidade autónoma das prestações, invocada pela requerida.

            - Absolver a requerida da instância (artigos 96.º e 278.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a), c) e e), do RJAT).

           

 

Fixa-se o valor do processo em €26.537,20 (vinte e seis mil quinhentos e trinta e sete euros e vinte cêntimos), nos termos do art. 32.º do CPTA e do art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no art. 29.º, n.º 1, als. a) e b), do RJAT, e do art. 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

Custas a cargo da requerente, no montante de €1530,00 (mil quinhentos e trinta euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, dadas as excepções supra assinaladas, e em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e do disposto no art. 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

 

Notifique.

 

Lisboa, 11 de Janeiro de 2016.

 

 

O Árbitro

 

 

 

(Miguel Patrício)

 

***

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto

no art. 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.