Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 323/2015-T
Data da decisão: 2015-11-27  Selo  
Valor do pedido: € 24.867,60
Tema: IS - Verba n.° 28 da TGIS; Propriedade vertical
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Decisão Arbitral

 

A Árbitro Raquel Franco, designada pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o tribunal arbitral singular constituído em 07.08.2015, decide nos termos que se seguem:

 

I. RELATÓRIO

1. No dia 21.05.2015, a sociedade “A… SA”, NIPC…, apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante apenas designada por “AT”).

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 08.06.2015.

3. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

4. As partes foram notificadas dessa designação em 23.07.2015, não se tendo oposto à mesma.

5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 07.08.2015, tendo-se seguido os pertinentes trâmites legais.

6. A pretensão da Requerente nos presentes autos é no sentido de ser declarada a invalidade das liquidações de IS referentes aos exercícios de 2012 e 2013, das quais resultou imposto a pagar no montante de €, 24.867,60€, nos termos do disposto na Verba n.° 28 da TGIS, referentes ao prédio urbano inscrito na matriz da freguesia das ... sob o artigo ….

7. A Requerente sustenta o seu pedido, em síntese, nos seguintes termos:

  • A questão essencial a decidir no presente processo é a de saber, com referência a prédios não constituídos em regime de propriedade horizontal, integrados por diversos andares e divisões com utilização independente, das quais algumas ou todas com afetação habitacional, qual o VPT relevante para efeitos de incidência de imposto do selo ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, nomeadamente, saber se deverá ser o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares (VPT global) como aconteceu no caso “sub iudice”, ou, antes, o VPT atribuído a cada uma das partes ou andares habitacionais.
  • Utilizando o critério que a própria lei introduziu no artigo 67.°, n.°2 do Código do Imposto do Selo, “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.”
  • Ora, sendo assim, considerando que a inscrição na matriz de imóveis em propriedade vertical, constituídos por diferentes partes, andares ou divisões com utilização independente, nos termos do CIMI, obedece às mesmas regras de inscrição dos imóveis constituídos em propriedade horizontal, sendo o respetivo IMI, bem como o novo IS, liquidados individualmente em relação a cada uma das partes, não oferece qualquer dúvida que o critério legal para definir a incidência do novo imposto tem de ser o mesmo.
  • Aliás, a AT admite que este é o critério, razão pela qual a própria liquidação emitida é muito clara nos seus elementos essenciais, donde resulta o valor de incidência ser o correspondente ao VPT de cada uma das frações individualizadas e sendo os documentos de liquidação individualizados sobre a parte do prédio correspondente aos diversos andares.
  • Assim, só haverá lugar a incidência do novo imposto de selo se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00, o que não acontece no caso “sub iudice”.
  • O critério pretendido pela AT, de considerar o valor do somatório dos VPT atribuídos às partes, andares ou divisões com utilização independente, com o argumento do prédio não se encontrar constituído em regime de propriedade horizontal, não encontra sustentação legal e é contrário ao critério que resulta aplicável em sede de CIMI e, por remissão, em sede de IS.
  • Ao que acresce o facto da própria lei estabelecer expressamente, na parte final da verba 28 da TGIS, que o IS a incidir sobre os prédios urbanos de valor igual ou superior a €1.000.000,00 — “sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI.
  • Assim, a adoção do critério defendido pela AT viola os princípios da legalidade e da igualdade fiscal, bem assim como, o da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico4ormal, em claro prejuízo do sujeito passivo.
  • Acresce que a ratio legis subjacente à regra da verba 28 da TGIS, introduzida pela Lei n° 55-A/22012 de 29 de Outubro, e em obediência ao disposto no artigo 9° do Código Civil, segundo o qual a interpretação da norma jurídica não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos e dos restantes elementos de interpretação o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
  • O legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a €1.000.000,00, sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional.
  • Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a €1.000.000,00.
  • A fundamentação da medida designada por “taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor” assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as “casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros.”
  • O legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, suscetível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal.
  • Ora, a existência de um prédio em propriedade vertical ou horizontal não pode ser, por si só, indicador de capacidade contributiva. Pelo contrário, da lei decorre que uns e outros devem receber o mesmo tratamento fiscal em obediência aos princípios da justiça, da igualdade fiscal e da verdade material.
  • Na verdade, será um sujeito passivo mais rico se tiver um prédio em propriedade vertical em que o somatório das divisões individualizáveis é superior a 1 000 000€ do que um indivíduo que tem exatamente um prédio igual mas constituído em propriedade horizontal e cada uma das fracções não excede em VPT € 1.000.000,00.
  • Tal configuraria uma desigualdade fiscal que não é de todo admissível ou aceitável, sendo ilegal e inconstitucional considerar como valor de referência seja o correspondente ao somatório dos VPT atribuídos a cada parte ou divisão. Desde logo, porque essa seria uma nítida violação do princípio da igualdade e proporcionalidade em matéria fiscal.
  • Por isso mesmo é que o artigo 12.°, n.°3 do CIMI diz que “cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial a qual discrimina igualmente o respetivo valor patrimonial tributário.
  • Logo, a verdade material é a que se impõe como critério determinante da capacidade contributiva e não a mera realidade jurídico- formal do prédio.
  • A discriminação operada pela AT traduz uma discriminação arbitrária e ilegal.
  • Não é obrigatório a constituição de propriedade horizontal, aliás presentemente o sujeito passivo já constitui o regime de propriedade horizontal sobre o prédio em causa, não estando sujeito à verba 28.1 da TGIS, contudo o valor das fracções autónomas é o mesmo, quando o prédio estiver em propriedade vertical.

8. Na sua Resposta, a AT invocou, resumidamente, o seguinte:

 

Questão prévia:

A AT alega que, estando em causa as liquidações de imposto do selo da verba 28.1, relativamente aos anos de 2012 e 2013, e tomando só por referência o último ano, o prazo de pagamento da última prestação do ano de 2013 terá ocorrido a 30 de Novembro de 2014 e que, portanto, o pedido de constituição do tribunal arbitral que ocorreu em 21 de Maio de 2015 é manifestamente extemporâneo.

 

Quanto ao mérito da causa:

Resumidamente, os argumentos da AT são os seguintes:

 

  • A sujeição ao imposto de selo da verba 28.1. da Tabela Geral anexa ao CIS resulta da conjugação de dois factos, a saber, a afetação habitacional e o valor patrimonial do prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00.
  • A requerente, para efeitos de IMI e também de imposto selo, por força da redação da referida verba, não é proprietário de 21 fracções autónomas, mas sim de um único prédio.
  • Tendo por adquirido este facto, o que a ora requerente pretende é que a AT considere, para efeitos de liquidação do presente imposto, que exista analogia entre o regime da propriedade total e o da propriedade horizontal, já que não deve existir discriminação no tratamento jurídico-fiscal destes dois regimes de propriedade, por ser ilegal.
  • Como é consabido, a propriedade horizontal é um regime jurídico específico da propriedade previsto no artigo 1414.º e seguintes do Código Civil, cujo modo de constituição se encontra aí previsto, assim como as demais regras sobre direitos e encargos dos condóminos, tendo de se reconhecer nesta estatuição, a existência de um regime mais evoluído de propriedade.
  • Ora, pretender que o intérprete e aplicador da lei fiscal aplique, por analogia, ao regime da propriedade total, o regime da propriedade horizontal é que é abusivo e ilegal.
  • Estes dois regimes de propriedade são regimes do direito civil, os quais foram importados para o direito tributário, designadamente nos termos referidos pelo artigo 2.º do CIMI.
  • E o intérprete da lei fiscal não pode equiparar estes regimes, em consonância com a regra segundo a qual os conceitos dos outros ramos de direito têm o sentido no direito tributário que lhes é dado nesses ramos de direito, ou nas palavras do artigo 11.º, n.º 2 da LGT, sobre a interpretação da lei fiscal: “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer diretamente da lei.”
  • Por outro lado, ainda tendo em conta que na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis, conforme artigo 11.º, n.º 1 da LGT que remete, assim, para o Código Civil, o seu artigo 10.º sobre a aplicação da analogia, determina que esta só será aplicável em caso de lacunas da lei.
  • Ora a lei fiscal não comporta qualquer lacuna. Determina o CIMI, para o qual a citada verba remete, que no regime da propriedade horizontal as fracções constituem prédios. Não estando o prédio submetido a este regime, juridicamente as fracções são partes susceptíveis de utilização independente, sem que haja partes comuns.
  • Encontrando-se o prédio submetido ao regime de propriedade total, mas sendo fisicamente constituído por partes susceptíveis de utilização independente, a lei fiscal atribuiu relevância a esta materialidade, avaliando estas partes individualmente, nos termos do artigo 12.º e consequentemente, nos termos do art. 12.º, n.º 3, do C.I.M.I., cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, mas na mesma matriz, procedendo-se à liquidação do IMI tendo em conta o valor patrimonial tributário de cada parte.
  • A unidade do prédio urbano em propriedade vertical composto por vários andares ou divisões não é, no entanto, afetada pelo facto de todos ou parte desses andares ou divisões serem susceptíveis de utilização económica independente.
  • O facto de o IMI ter sido apurado em função do valor patrimonial tributário de cada parte de prédio com utilização económica independente não afeta igualmente a aplicação da verba 28º, nº 1, da Tabela Geral.
  • É o que resulta de o facto determinante da aplicação dessa verba da Tabela Geral ser o valor patrimonial total do prédio e não separadamente o de cada uma das suas parcelas.
  • Outra interpretação violaria, isso sim, a letra e o espírito da verba 28.1. da Tabela Geral e o princípio da legalidade dos elementos essenciais do imposto previsto no artigo 103º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP).
  • Um tipo de incidência de acordo com o qual o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos de que depende a aplicação da verba 28.1. da Tabela Geral é o valor patrimonial de cada andar ou divisão susceptível de utilização independente e não o valor patrimonial tributário global do prédio urbano com afetação habitacional não tem seguramente qualquer expressão na lei.
  • É, assim, inconstitucional, por ofensiva do princípio da legalidade tributária, a interpretação da verba 28.1. da Tabela Geral, no sentido de o valor patrimonial deque depende a sua incidência ser apurado globalmente e não andar a andar ou andar ou divisão a divisão
  • O facto tributário do imposto de selo da verba 28.1. ao consistir na propriedade, de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do C.I.M.I., seja igual ou superior a € 1.000 000,00, o valor patrimonial relevante para efeitos da incidência do imposto é, assim, o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda quando susceptíveis de utilização independente.
  • E esta interpretação da norma de incidência a imposto de selo resulta da conjugação da outra norma de incidência a IMI que é o artigo 1.º, segundo a qual o IMI incide sobre o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos, atendendo à noção de prédio do artigo 2.º e de prédio urbano constante do artigo 4.º e ainda das espécies de prédios urbanos descritas no artigo 6.º
  • Nesta senda, não logra vingar o pedido da requerente de que seja aplicado, por analogia ao seu prédio o regime da propriedade horizontal, considerando-se que cada uma das fracções susceptíveis de utilização independente constitua um prédio, pois isso não seria interpretar as normas do CIMI, e por consequência do CIS, isso seria subverter todo o regime aí instituído, com as violações dos princípios supra referidos.

 

II. DA QUESTÃO PRÉVIA INVOCADA PELA REQUERIDA

A questão prévia invocada pela AT é relativa ao cumprimento do prazo legalmente fixado para o pedido de constituição do tribunal arbitral. Com efeito, não resulta claro do pedido de pronúncia arbitral tal como ele foi inicialmente formulado pela Requerente o cumprimento do mencionado prazo.

 

Contudo, na sequência de despacho datado de 21.10.2015, veio a Requerente responder à questão suscitada pela AT dizendo o seguinte:

 

  1. O sujeito passivo requereu em 15/01/2015 revisão oficiosa de liquidação dos atos de liquidação de imposto de selo, tendo sido atribuído o número de processo …2015…;
  2. Nos termos do artigo 57.º da LGT o procedimento tributário deve ser concluído no prazo de 4 meses;
  3. Até ao momento o procedimento não foi concluído;
  4. Ao abrigo do disposto no número 5 do artigo 57.º da LGT, presume-se o indeferimento tácito em 15/05/2015;
  5. Nos termos do artigo 102.º do CPPT a impugnação judicial pode ser apresentada no prazo de 3 meses a contar do indeferimento tácito;
  6. O pedido de constituição de tribunal arbitral ocorreu em 21 de maio de 2015;
  7. Não é pois extemporâneo o pedido de constituição de tribunal arbitral nos termos do artigo 3-A da lei 10/2011.

 

Chamada a pronunciar-se sobre o requerimento apresentado pela Requerente, veio a Requerida dizer o seguinte:

  1. O pedido de revisão oficiosa da liquidação não é fundamento para requerer a constituição tribunal arbitral, nos termos da parte final da referida alínea a) do art.º 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
  2. Se for analisado o pedido da ora requerente com fundamento na primeira parte da referida alínea a), isto é com o fundamento constante do artigo 102.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, ou seja, do termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte, o pedido de constituição do tribunal é extemporâneo, porquanto, as liquidações em causa tinham como prazo voluntário de pagamento 30 de Abril de 2014 se se tiver apenas em conta o ano de 2013, quando também impugna também as liquidações do ano de 2012, e o presente pedido foi apresentado pela requerente em 21 de Maio de 2015, portanto muito para além do prazo de 90 dias.
  3. Ora de acordo com o artigo 78.º da LGT o prazo para o pedido de revisão é o prazo da reclamação administrativa, ou seja 3 meses após a liquidação, que in casu se referem ao ano de 2012 e 2013.
  4. Em conclusão, verifica-se uma “dupla” extemporaneidade do pedido, porquanto do pedido de revisão oficiosa não se pode contar o prazo de 90 dias, mas sim do recurso hierárquico que não foi apresentado, e se por hipótese se atender a este facto, o pedido de revisão oficiosa foi apresentado fora de prazo nos termos do artigo 78.º da LGT.

 

Vejamos então:

Quanto ao primeiro argumento da AT, ou seja, de que o pedido de revisão oficiosa da liquidação não é fundamento para requerer a constituição de tribunal arbitral, não lhe assiste razão. Com efeito, sendo o indeferimento, expresso ou tácito, do pedido de revisão do ato tributário, um dos atos lesivos a que se refere o artigo 95.º, n.º 2, alínea d), da LGT, ele é suscetível de impugnação, a qual constitui um direito irrenunciável, salvo nos casos previstos na lei (artigo 96.º, n.º 1, da LGT).

 

Porém, entende ainda a AT que o próprio pedido de revisão das liquidações apresentado pela Requerente foi formulado para além do prazo de “reclamação administrativa” e que, portanto, se verificaria uma dupla extemporaneidade do pedido de pronúncia arbitral.

 

Sobre o significado da expressão “reclamação administrativa” é de assinalar a existência de duas posições doutrinais distintas: a de que esta se reconduz à reclamação administrativa prevista no CPA, cujo prazo regra de interposição é de 15 dias[1], e a de que, na prática, equivale à reclamação graciosa, quer quanto ao prazo para a sua apresentação (120 dias a contar do termo do prazo para pagamento voluntário da liquidação), quer quanto aos seus fundamentos (com fundamento em qualquer ilegalidade) quer, ainda, quanto ao efeito jurídico pretendido, que é a anulação total ou parcial do ato tributário[2]. É esta segunda solução a que nos parece dever ter acolhimento.

 

Contudo, quanto ao caso concreto, importa distinguir entre a liquidação referente ao ano de 2012 e a liquidação referente ao ano de 2013: quanto à primeira, não há dúvida de que, à data do pedido de revisão oficiosa (15.01.2015), já havia decorrido o prazo de reclamação administrativa (graciosa); no que respeita à liquidação do ano de 2013, cujo prazo de pagamento voluntário terminou em 30 de novembro de 2014, em 15.01.2015 aquele prazo ainda não tinha decorrido.

 

Não obstante o decurso daquele prazo de reclamação administrativa relativamente à liquidação do ano de 2012, nada impede que o impulso para a revisão oficiosa da liquidação desse ano caiba ao contribuinte, como decorre do disposto no n.º 7 do artigo 78.º da LGT - em que se faz referência ao efeito interruptivo do respetivo prazo (cfr. ainda os artigos 49.º, n.º 1, da LGT e 86.º, n.º 4, alínea a), do CPPT).

 

Efetivamente, de acordo com a jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Administrativo, recentemente expressa no Acórdão do Pleno da Secção do CT, proferido no processo n.º 0793/14, em 3 de junho de 2015, “(…) quando o pedido de revisão teve por objeto um ato de liquidação que o sujeito passivo reputa de ilegal – por, na sua perspetiva, ter sido emitido ao abrigo de uma errada interpretação e aplicação do Direito aplicável, com desacertada aplicação aos factos relevantes – nada impede que ele possa, no prazo de quatro anos contados da liquidação (ou, caso o tributo não tenha ainda sido pago, a todo o tempo), solicitar à Administração que reveja oficiosamente esse ato, ficando com isso investido de um direito a uma decisão sobre o pedido formulado.”

 

Tratando-se de um procedimento aberto por iniciativa do interessado (cfr. o artigo 54.º, n.º 1, alínea c), da LGT), estava a AT obrigada a pronunciar-se (artigo 56.º, n.º 1, da LGT) e, não o tendo feito dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 57.º, da LGT, presume-se o seu indeferimento, para efeitos de impugnação judicial (artigo 57.º, n.º 5, da LGT e artigo 102.º, n.º 1, alínea d), do CPPT).

 

O pedido de revisão oficiosa das liquidações em análise foi apresentado em 15.01.2015 e, verificados os respetivos pressupostos de admissibilidade, ou seja, quanto à liquidação do ano de 2013, por ter sido efetuado dentro do prazo de reclamação graciosa, em que poderia ser invocada qualquer ilegalidade e, quanto à liquidação do ano de 2012, por não ter ainda decorrido o prazo de 4 anos após a data da sua emissão e por as mesmas terem sido emitidas em erro sobre os pressupostos de direito, por errada interpretação da norma de incidência objetiva constante da verba 28.1, da TGIS, imputável à AT, não pode ter-se por intempestiva a apresentação do pedido de constituição do tribunal arbitral, atendendo ao prazo estabelecido no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.

 

Assim, verificada a tempestividade do pedido, cabe prosseguir para a análise do mérito do pedido.

 

III. SANEAMENTO

 

1. O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.

 

2. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

3. O processo não padece de vícios que o invalidem.

 

IV. MATÉRIA DE FACTO

 

IV.1. Factos provados

 

Antes de entrar na apreciação das questões de direito, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, a qual, examinada a prova documental junta aos autos e tendo ainda em conta os factos alegados, se fixa como segue:

 

  1. A Requerente é dona e legítima proprietária do prédio com 7 pisos, composto de cave, loja e 5 andares, com cobertura de telhado, inscrito na matriz da freguesia das ... sob o artigo ….

 

  1. O referido prédio foi constituído em propriedade horizontal em 18/09/2014.

 

  1. Até àquela data o prédio era constituído pelos seguintes andares com utilização independente:
  1. Loja B — Com o valor patrimonial de 93.840€ e com destino a comércio;
  2. Loja E - Com o valor patrimonial de 656.330€ e com destino a comércio;
  3. 1D — Com o valor patrimonial de 120.040€ e com destino à habitação;
  4. 1E — Com o valor patrimonial de 119.160€ e com destino à habitação;
  5. 2D - Com o valor patrimonial de 120.040€ e com destino à habitação
  6. 2E - Com o valor patrimonial de 119.160€ e com destino à habitação;
  7. g) 3D - Com o valor patrimonial de 120.040€ e com destino à habitação;
  8. h) 3E - Com o valor patrimonial de 119.160€ e com destino à habitação;
  9. 4D - Com o valor patrimonial de 120.040€ e com destino à habitação;
  10. 4E - Com o valor patrimonial actual de 93.860€ e com destino à habitação;
  11. 5D - Com o valor patrimonial de 104.250€ e com destino à habitação;
  12. SE - Com o valor patrimonial de 104.880€ e com destino à habitação;
  13. SF - Com o valor patrimonial de 102.950€ e com destino à habitação;
  14. LOJA 1 D — Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  15. LOJA 1 E - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  16. LOJA 2D - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  17. LOJA 2E - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  18. LOJA 3D - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  19. LOJA 3E - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  20. LOJA 4D - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;
  21. LOJA 4E - Destinado a serviços com o valor patrimonial de € 92.240;

 

  1. O somatório dos VPTs das divisões independentes destinadas a habitação é de € 1.243.380.

 

  1. No ano de 2013, relativamente ao ano de 2012, a Requerida liquidou e a Requerente pagou o valor de € 12.433,80, relativamente ao VPT de todas as divisões consideradas independentes destinadas a habitação.

 

  1. No ano de 2014, relativamente ao ano de 2013, a Requerida liquidou e a Requerente pagou o valor de € 12.433,80 relativamente ao VPT de todas as divisões consideradas independentes destinadas a habitação.

 

  1. Em 15.01.2015, o sujeito passivo requereu a revisão oficiosa dos atos de liquidação de imposto de selo em causa nos presentes autos.

 

  1. No dia 21.05.2015, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral singular.

 

  1. Até essa data, o pedido de revisão oficiosa mencionado em 7. não tinha sido objeto de resposta por parte da AT.

 

IV.2. Factos não provados

 

Não há factos com relevância para a causa que tenham sido considerados não provados.

 

V. THEMA DECIDENDUM

 

A questão essencial em causa no presente processo passa por determinar, com referência a um prédio urbano não constituído em regime de propriedade horizontal, integrado por diversas áreas com utilização independente, com afetação habitacional, se o VPT relevante para efeitos da tributação em sede de imposto do selo ao abrigo da verba 28.1 da TGIS deve ser o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares independentes ou se, pelo contrário, deve ser tido em conta para efeitos de incidência do imposto do selo ao abrigo da verba 28.1 da TGIS o VPT atribuído a cada andar ou divisão com utilização independente.

 

VI. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

 

A verba 28 da TGIS prevê o seguinte:

 

28. “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1.000.000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 Por prédio com afetação habitacional – 1%

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.”

 

No presente processo há que decidir se o VPT relevante como critério de incidência do imposto do selo nos termos da verba 28.1 da TGIS é o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares (VPT global) ou, antes, o VPT atribuído a cada uma das partes ou andares habitacionais.

 

Esta questão já foi apreciada em diversos processos de arbitragem tributária, não se vislumbrando motivos para adotar entendimento diferente daquele que foi adotado em decisões proferidas anteriormente. Assim:

 

Nos termos do n.º 2 do artigo 67.º do CIS, quanto “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.” Reportando-se a norma de incidência da verba 28.1 da TGIS a prédios urbanos, importa buscar o conceito de prédio urbano no CIMI.

 

O CIMI estabelece, no artigo 2.º, n.º 1, o conceito de prédio. Define-o como “toda a fração de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com caráter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou coletiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fração de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial”.

 

Já o artigo 4.º do CIMI estabelece que são prédios urbanos “todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte”.

 

Por sua vez, o artigo 6.º do mesmo Código procede à classificação das diversas espécies de prédios urbanos, distinguindo-os, no n.º 1, em quatro subcategorias: “a) Habitacionais; b) Comerciais, industriais ou para serviços; c) Terrenos para construção; d) Outros”. Por sua vez, o n.º 2 positiva o critério utilizado para essa distinção, definindo que os “Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”.

 

No que concerne à questão concreta objeto da presente decisão, importa atender ao artigo 12.º, n.º 3, do CIMI, nos termos do qual “cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário.”.

 

Por fim, nos termos do artigo 119.º n.º 1 do CIMI, “Os serviços da Direcção-Geral dos Impostos enviam a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, o competente documento de cobrança, com discriminação dos prédios, suas partes suscetíveis de utilização independente, respetivo valor patrimonial tributário e da coleta imputada a cada município da localização dos prédios.”

 

Conforme reconhece a doutrina, o conceito fiscal de prédio afasta-se do conceito civilista de prédio, ao contrário do que sustenta a Requerida, sendo que, “Para efeitos fiscais, o n.º 1 deste artigo [2.º do CIMI] prevê a existência de três requisitos necessários para que se possa estar perante o conceito de prédio, a saber, a estrutura física, a patrimonialidade e o valor económico.”

(Cf. J. Silvério Mateus e L. Corvelo de Freitas, “Os Impostos sobre o Património Imobiliário, o Imposto do Selo, Anotados e Comentados”, Engifisco, 1.ª edição, 2005, pág. 101).

 

Assim, “o elemento físico vem definido pela referência a “toda a fração de território”, abrangendo águas, plantações e construções de qualquer natureza nela incorporadas ou assentes com carácter de permanência. No plano jurídico, é atribuída relevância à patrimonialidade. O bem, no sentido físico, deve ser passível de integração no património de uma pessoa singular ou colectiva. (…) O requisito do valor económico encontra-se, naturalmente, associado ao requisito da patrimonialidade, decorrendo daí a susceptibilidade de gerar rendimentos ou outro tipo de utilidades para o seu titular.” (op.cit.).

 

No caso concreto, parece-nos que todos os três requisitos mencionados se verificam, na medida em que as partes ou divisões suscetíveis de utilização independente objeto dos atos de liquidação em causa têm correspondência física com a realidade, integram o património da Requerente e possuem um valor económico que, quanto mais não seja, decorre do VPT que lhes foi atribuído pela avaliação realizada pela AT.

 

Assim, parece-nos que as partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, preenchendo todos os requisitos para que possam qualificar como um “prédio”, em termos económicos, físicos e de patrimonialidade, deverão ser consideradas autonomamente para efeitos da incidência da verba 28.1 da TGIS.

 

Acresce que, na regra de incidência constante da verba 28.1 da TGIS, o legislador não entendeu relevante distinguir entre os prédios em propriedade horizontal e os prédios em propriedade vertical. E isto, em nosso entender, porque o que releva, em última análise, é o destino económico do imóvel, como decorre, também, do artigo 6.º do CIMI, em face dos princípios constitucionais ínsitos nos artigos 103.º, n.º 1 e 104.º, n.º 3 da CRP. Na verdade, em termos de substância económica, não existe qualquer diferença entre um edifício em propriedade horizontal e um edifício em propriedade vertical ou total constituído por partes ou divisões suscetíveis de utilização independente, justificando-se, portanto, em termos de regras de incidência – e, em particular, da regra constante da verba 28.1 da TGIS – o tratamento igual destas duas situações. Aliás, também o legislador fiscal determina esse tratamento igualitário, no artigo 119.º do CIMI, quando estabelece que o imposto deverá ser liquidado individualmente sobre cada parte ou divisão suscetível de utilização independente, tendo em consideração o VPT de cada parte ou divisão suscetível de utilização independente, individualmente considerada.

 

Resulta do exposto que deverá aplicar-se indistintamente, quer aos prédios urbanos habitacionais constituídos em propriedade horizontal, quer os que se encontram em propriedade total ou vertical, a regra constante da verba 28.1 da TGIS, devendo o imposto incidir sobre o VPT atribuído pela Requerida, através de avaliação geral, a cada uma das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente.

 

Em face do que antecede, e atento o facto de que nenhuma das partes ou divisões suscetíveis de utilização independente objeto dos atos de liquidação impugnados tem um valor patrimonial tributário igual ou superior a € 1.000.000,00, como ficou demonstrado nos presentes autos, conclui-se pela procedência do pedido da Requerente, considerando-se ilegais os atos de liquidação impugnados, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito e violação do artigo 1.º n.º 1 do Código do Imposto do Selo e da verba 28.1 da TGIS, devendo os referidos atos ser anulados.

 

Quanto aos juros indemnizatórios, o artigo 43.º da LGT estipula que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

 

Quanto à existência, no caso, de erro imputável aos serviços, considera-se o mesmo verificado, segundo jurisprudência uniforme do STA (vejam-se, neste sentido, os Acórdãos do STA de 22-05-2002, Proc. n.º 457/02; de 31.10.2001, Proc. n.º 26167 e de 2.12.2009, Proc. n.º 0892/09).

 

Assim, não há dúvidas de que a Requerente tem direito a ser ressarcida através do recebimento de juros indemnizatórios, calculados nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT e do artigo 61.º, números 2, 3 e 5, sobre as quantias pagas referentes às liquidações anuladas.

 

VII. DECISÃO

Em conformidade com que fica exposto supra, decide-se:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, declarar a ilegalidade das liquidações de imposto do selo impugnadas, com a consequente anulação dessas mesmas liquidações;
  2. Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios;
  3. Condenar a Requerida no pagamento das custas do processo.

 

Valor: em conformidade com o disposto nos artigos artigo 97.º - A, n.º 1, alínea a), do CPPT e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 24.867,60.

 

Custas: nos termos do disposto no artigo 22.º, n.º 4, do RJAT e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 1.530.00,00, a pagar pela Requerida nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

Registe-se e notifique-se.

Lisboa, 27 de novembro de 2015

A Árbitro,

 

Raquel Franco

 

 



[1]              Cfr., neste sentido, Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Jorge Lopes de Sousa, “Lei Geral Tributária – anotada e comentada”, 4.ª Edição, Lisboa, Encontro da Escrita, 2012, pp. 707-709.

[2]              Assim, José Casalta Nabais, “Direito Fiscal”, 7.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2014, p. 306 e Joaquim Freitas da Rocha “Lições de Procedimento e Processo Tributário”, 5.ª Edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2014, p. 226.