Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 96/2022-T
Data da decisão: 2023-02-08  IRC  
Valor do pedido: € 122.029,98
Tema: IRC e IVA: operações simuladas / faturas falsas - ónus da prova; juros indemnizatórios.
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SUMÁRIO:

I – Em conformidade com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, os fundamentos da decisão devem, entre outros, ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida e a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final.

II – Nos termos do artigo 74.º, n.º 1 e 75.º da LGT, compete à AT provar a existência de indícios sérios de que a operação faturada não corresponde à realidade ou de que as faturas são “falsas”. Feita esta prova, recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transação.

III – Não se apresentam como indícios suficientemente sólidos conclusões e ilações retiradas de meras conjeturas ou juízos de valor sem qualquer base factual (por exemplo, a compra de uma quantidade elevada ou o pagamento de um preço elevado não pode, por si só, ser considerado um indício de simulação ou da existência de faturas falsas).

 

 

DECISÃO ARBITRAL

I. Relatório

 

  1. A..., LDA, contribuinte n.º ..., com sede na Rua..., n.º ..., ..., ..., ...-... Porto, (doravante designados por “Requerente”), vem, ao abrigo do disposto no DL 10/2011, de 20 de Janeiro e no art. 44º do DL 81/2018, de 15 de Outubro de 2018 apresentar pedido de pronúncia arbitral ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, doravante “RJAT”), tendo em vista obter a anulação das liquidações de IRC e de IVA e respetivos juros compensatórios, com fundamento em erro imputável à AT no valor de €122.029,98 € (cento e vinte e dois mil vinte e nove euros e noventa e oito cêntimos) tendo em vista obter a anulação das liquidações de IRC e de IVA e respetivos juros compensatórios, com fundamento em erro imputável à AT.

 

Afigura-se-nos que decorre com meridiana clareza do pedido de pronúncia arbitral (e.g. intróito), apesar de não constar expressamente do Pedido que a Requerente pretende, também, a declaração de ilegalidade e a anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa oportuna e previamente apresentada (ato imediato).

 

  1. As liquidações de IRC e de IVA, objeto da reclamação graciosa n.º ...2021... são as seguintes:

 

  1. É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, doravante também designada por “Requerida” ou “AT”.
  2. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
  3. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 04-05-2022.
  4. Por comunicação da AT de 19-04-2022, foi parcialmente revogado parcialmente o ato de liquidação de IRC 2018 n.º 2021 …, nos seguintes termos:

“A Autoridade Tributária e Aduaneira, para efeitos do disposto no art. 13° do RJAT, vem informar que o pedido apresentado pela A..., Lda, Requerente nos autos supra referenciados, parcialmente satisfeito através da revogação parcial da correcção efectuada ao exercício de 2018 no montante 20.500,00 €, relativamente à fatura emitida pela sociedade B..., AS”, o que foi superiormente sancionado por despacho de 07/04/2022, notificando-se a Requerente e ordenando a correspondente execução pelos serviços competentes”.

  1. Em 19-04-2022, a Requerente foi notificada pelo Senhor Presidente do CAAD de despacho em cumprimento do art.º 13, n.º 1 do RJAT.
  2. Por requerimento de 04-05-2022, a Requerente declarou ao Tribunal a intenção de prosseguir com o processo arbitral.
  3. Em 04-05-2022, através de Requerimento dirigido ao Tribunal, a Requerida confirmou “a proposta de anulação parcial dos atos contestados, nos termos seguintes: anulação da correção de € 20 500,00 relativa ao período de tributação de 2018 e manutenção das restantes correções de 2017 e 2018”.
  4. A AT apresentou resposta, em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral, por não provado.
  5. Por despacho de 18-06-2022 foi decidido dispensar a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.
  6. Em 05-09-2022, o Tribunal Arbitral notificou as Partes do seguinte despacho:

“Considerando que não existe coincidência entre os números de identificação dos atos tributários de liquidação objeto do pedido de pronúncia arbitral e os constantes da reclamação graciosa, determina-se que seja notificada a Requerente para que, no prazo de 10 dias:

1- Junte cópia das liquidações adicionais emitidas pela Requerida no decurso da ação inspetiva e que foram objeto da reclamação graciosa identificada com o n.º de processo ...2021.... 

2- Junte cópia de outros atos tributários de liquidação adicional ou de autoliquidação que eventualmente tenham sido objeto da referida reclamação graciosa. 

3- Para cada ato tributário de liquidação adicional ou de autoliquidação que foi pago indique o seu número de identificação, valor e data de pagamento e qual o número de identificação de cada uma dessas liquidações no presente PPA.

3- Justifique a razão da não coincidência da identificação na reclamação graciosa e no presente PPA, juntando prova inequívoca de que os atos de liquidação objeto do PPA são os mesmos que foram objeto da reclamação graciosa.”

  1.  A Requerente respondeu em 15-09-2022, referindo com relevância o seguinte: “(...) Os atos de liquidação objeto do presente pedido de pronúncia arbitral são exatamente os mesmos que foram objeto da reclamação graciosa que constitui o seu objeto imediato, a qual foi tramitada sob o n.º ...2021...”.
  2. Em 04-11-2022, considerando a complexidade da matéria em causa, o Tribunal decidiu, ao abrigo do artigo 21.º, n.º 2 do RJAT, prorrogar por 2 meses o prazo para a prolação da decisão arbitral. Posteriormente, em 02-01-2023, o Tribunal decidiu prorrogar o prazo da prolação da decisão arbitral, novamente, por mais 2 meses.
  3. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.
  4. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.
  5. O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, a), artigos 5.º e 6.º, do RJAT.
  6. O processo não enferma de nulidades.

 

 

II. Matéria de facto

II.1. Factos provados

  1. Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
  1. A Requerente é uma sociedade comercial que, nos exercícios de 2017 e 2018, tinha como objecto social: “actividades de consultoria para os negócios e a gestão. Actividades de contabilidade e consultoria fiscal. Estudos de mercado e sondagens de opinião. Atividades de design. Atividades de consultoria científicas, técnicas e similares. Consultoria e programação informática e atividades relacionadas. Formação e/ou atividades de apoio à educação a adultos ou crianças A que posteriormente aditou: “Agentes especializados do comércio por grosso. Comércio por grosso e a retalho de todo o tipo de produtos, não efetuado em estabelecimentos. Comercialização e gestão de portais web, redes sociais e comércio online”.

(Cfr. doc. 16 junto com o PPA, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. A Requerente desenvolve a atividade de prospeção de mercado com base numa rede de parcerias nacionais e internacionais.

(Cfr. arts. 10.º a 14.º do PPA. Facto não contestado pela Requerida).

  1. De acordo com as IES dos anos de 2017 a 2020, e do balancete para o exercício de 2021, foi a seguinte a evolução do volume de negócios da Requerente a nível internacional extracomunitário:

 

(Cfr. art. 15.º do PPA e não contestado pela Requerida).

  1. A Requerente foi objecto de ações de inspeção tributária à sua actividade, relativamente aos exercícios de 2017 e 2018, realizadas a coberto das Ordens de Serviço n.º OI2019..., OI2019... e OI2019... .

(Cfr. Relatório Final de Inspeção Tributária junto com o processo administrativo, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. Em resultado da referida inspeção tributária foram efetuadas correções no âmbito de IRC, IVA e retenções na fonte.
  2. Consequentemente, e com relevo para o presente processo, foram emitidos os seguintes actos de liquidação de IRC e IVA e documentos de acerto de contas (Cfr. docs. apresentados pela Requerente na Resposta ao pedido de esclarecimentos apresentado em 15-09-2022):

 

  1. A Requerente procedeu ao pagamento das liquidações de IRC e IVA emitidas pela AT no âmbito das correções efetuadas na ação de inspeção e relativas aos anos de 2017 e 2018.

(cfr. Documentos n.os 3 a 15 juntos com o PPA).

  1. Os supra referidos atos tributários de liquidação de IRC e IVA resultaram da ação de inspeção tributária acima referida e têm por base a desconsideração, para efeitos de IRC e IVA, das faturas emitidas pelos seguintes fornecedores:
  • C..., Lda
  • D..., Lda;
  • E..., Lda;
  • F…, SA;
  • G..., Lda;

(fls. 11 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo, cujo teor se dá por reproduzido).

  1. A Requerida, em sede de ação inspetiva, desconsiderou, para efeitos de IVA e de IRC, as seguintes faturas:

 

  1. Para efeitos de IRC e em resultado da referida ação inspetiva, nos exercícios de 2017 e 2018, resultaram as seguintes correções aos resultados tributáveis:

 

(fls. 26 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);

  1. Para efeitos de IVA e em resultado da referida ação inspetiva, nos exercícios de 2017 e 2018, resultaram as seguintes correções aos resultados tributáveis:

 

(fls. 27 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo).

  • As correções relacionadas com as faturas emitidas pelo fornecedor “C..., Lda.” foram fundamentadas pela Requerida, nomeadamente, com base nos seguintes argumentos: “não se identificam factos económicos válidos para o reinicio da atividade da C..., durante um mês e meio, após inatividade próxima de 5 anos, nomeadamente: investimentos, aquisições de mercadorias/serviços, contratação de pessoal, etc. Tendo-se aferido que a empresa não disponha de recursos humanos para poder prestar os serviços de “angariação de clientes” (fls. 11 e 12 do Relatório Final de Inspeção).
  • As correções referidas acima foram aceites pela Requerente que, inclusive, procedeu à entrega de declaração de substituição Modelo 22 de IRC (cfr. fls. 36 do Relatório Final de Inspeção e Direito de Audição exercido pela Requerente).
  • A Requerida fundamentou as correções, em sede de IVA e IRC, relacionadas com as faturas emitidas pelo fornecedor “D..., Lda.” com base nos seguintes fundamentos:
  1. “as quantidades de catálogos identificados nas faturas - 12.000 catálogos em 2017 e 17.000 em 2018, quer os montantes suportados €30.000 e de €67.000, respetivamente, indiciam que as faturas documentam operações simuladas e/ou negócios fictícios” (fls. 15 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  2. “as quantidades de catálogos identificadas nas faturas são claramente elevadas e totalmente desajustadas da realidade, desde logo pelo facto dos clientes da A... não serem consumidores finais/particulares (...). O número de potenciais clientes da A..., empresas passíveis de adquirirem os produtos por ela comercializados (peças e acessórios para máquinas de construção, equipamento mineiro, óleos, lubrificantes e material de perfuração para a indústria extrativa) é evidentemente inferior à suposta quantidade de catálogos adquiridos para distribuição” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  3. “outros gastos associados à aquisição de catálogos, em 2018, nomeadamente ao fornecedor “5 de junho, H... Unipessoal, Lda” (...), no valor de €7.900 + IVA, relativa à aquisição de “500 catálogos 30*30 capa dura + laminado veludo”. Constata-se que estas quantidades de catálogos/encargos com publicidade são congruentes com o mercado de potenciais clientes da A...” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  4. “as faturas em análise permitiram documentar investimentos efetuados no âmbito das candidaturas da A... ao subsídio Portugal2020, sendo que as contabilizadas no exercício de 2017, foram integradas no Projeto n.º ..., que foi aprovado, tendo a empresa recebido a totalidade do subsídio não reembolsável” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  5. “o descritivo das faturas [n.º 2533 e 2534], pressupõe a existência de 2 catálogos diferentes, consoante o país de destino - Marrocos ou Argélia. Aferiu-se que na capa de cada um consta simplesmente a indicação de Argélie e de Maroc, suportada pela colagem de uma impressão de letras em papel autocolante transparente, distinguindo-se na textura do papel de catálogo, menção essa que pode ser colocada em qualquer catálogo e em qualquer altura. Por outro lado, as faturas referem “verniz na capa e na contracapa” identificando-se que o papel dos catálogos apresentados é baço na capa e na contracapa” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  6. “o descritivo da fatura [n.º 3176] pressupõe a existência de 3 catálogos diferentes, consoante o país de destino - EUA, Colômbia e Chile. Aferiu-se que na capa de cada um, consta simplesmente a indicação de USA, Chile e Colômbia, nos mesmos moldes do verificado nos 2 catálogos anteriores” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  7. “a identificação do nome do país (...) constitui uma limitação à distribuição dos mesmos, atendendo a que será desajustado disponibilizar um catálogo a um cliente dos EUA com a indicação Colômbia" (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  8. “catálogos identificam diferentes países de destino, mas o conteúdo de todos eles está redigido na língua inglesa, sendo a língua francesa amplamente utilizada por exemplo em Marrocos e na Argélia” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  9. “dada a não apresentação de provas consistentes e credíveis da efetiva realização das operações descritas nas faturas emitidas pela D... considera-se: (...) indevidamente deduzido o IVA contido nos referidos documentos, nos montantes de €6.900 (período 201709), €2.875 (período 201807) e de €12.535 (período 201811) nos termos do estipulado no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA (...) e, não aceite o gasto associado, no montante de €30.000, em 2017, e de €67.000, em 2018, nos termos do art.º 23.º do CIRC (...) pois está suportado contabilisticamente por faturas relativamente à qual existem fortes indícios que não titulam operações reais (...). Nesse sentido, também a alínea d) do n.º 1 do artigo 23.º-A, estipula que esses gastos, apesar de contabilizados, não são dedutíveis para efeitos da determinação do lucro tributável” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  • A Requerida fundamentou as correções, em sede de IVA e IRC, relacionadas com as faturas emitidas pelo “E..., Lda.” com base nos seguintes fundamentos:
    1. “faturas identificam de uma forma genérica os serviços prestados, não cumprindo com os formalismos legais da emissão de documentos, previsto quer no Código do IVA, nomeadamente no n.º 5 do art.º 36.º, quer no CIRC, concretamente no n.º 4 do art.º 23.º. Este incumprimento coloca em questão quer o direito à dedução do IVA, quer a aceitação do gasto em sede de IRC” (fls. 18 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    2. “a fatura [n.º 2018A1/370 e 2018A1/927] menciona “trabalho de fotografia, design e conceção de catálogos e newsletter internacional”, sendo que a A... apresentou dois ficheiros relativos a 2 catálogos - óleos/lubrificantes e material de perfuração, pressupondo assim que a quantidade indicada nas faturas está correta, correspondendo a um custo unitário de €29.500 e de €31.000, apesar de não efetuar a correspondência custo/catálogo” (fls. 19 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    3. “o fornecedor apresentou apenas um catálogo - óleos/lubrificantes, não tendo prestado qualquer informação associada à efetiva produção do mesmo, nomeadamente custos de produção, se o serviço foi subcontratado ou se foi efetuado através dos recursos internos da empresa. Quanto às newsletters internacionais não foi dada qualquer informação, por nenhuma das entidades nomeadamente: quantidades, material utilizado, conteúdo, etc,” (fls. 19 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    4. “da análise efetuada ao ficheiro SAFT-PT, da faturação do exercício de 2018 do fornecedor, aferiu-se que os montantes debitados nas 2 faturas emitidas para a A... são totalmente incongruentes (...). tratam-se das duas faturas de valor mais elevado emitidas pelo fornecedor, referentes a serviços/produtos publicitários e as únicas com o descritivo indicado. Efetuada uma análise sobre a média ponderada por produto/serviço faturado (num universo de 964 códigos de produtos/serviços) verifica-se que o valor médio apurado de €30.250 nos catálogos debitados nas faturas emitidas pela A..., é significativamente o mais elevado. Os valores médios ponderados apurados são de €15.000 e de €9.970” (fls. 20 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    5. [o fornecedor] “enviou o extrato de conta corrente do ano de 2018 (que releva a contabilização das faturas e dos respetivos pagamentos em conformidade com os registos identificados na conta corrente de fornecedor na contabilidade da A...” (fls. 18 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    6. “os montantes de €29.500 e de €31.000 por catálogo debitados à A..., estão sobrevalorizados, quando comparados com os montantes debitados pelos produtos/serviços, prestados para os restantes clientes” (fls. 21 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    7. “considerámos o IVA, no montante de €6.785 (período 201805) e de €7.130 (período 201811) indevidamente deduzido, nos termos do estipulado no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA (....) e não cumprem com o estipulado no art.º 36.º do CIVA” (fls. 21 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
    8. “em sede de IRC, o gasto documentado nas duas faturas emitidas, no montante de €60.500, também não é aceite para efeitos fiscais, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC (...) pois estão suportados contabilisticamente por faturas relativamente às quais existem fortes indícios de não titularem operações reais e nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º-A (...) não cumprem com os requisitos expostos nos n.ºs 3 e 4 do artigo 23.º” (fls. 21 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo);
  • As faturas emitidas pelo fornecedor “B...” foram, igualmente, desconsideradas, para efeitos de IRC e de IVA, pela Requerida, a qual fundamentou estas correções, nomeadamente, com base na:
    1. “não especificação em concreto do serviço/produto constante da fatura, informando apenas que foi produzido pela mesma e identificando consumos de matérias primas de uma forma geral, não tendo efetuado uma identificação clara e concreta do mesmo e dos custos de produção associados (dimensão, stand exterior/ interior, consumos de mão-de-obra, consumos de matérias-primas, etc)” (fls. 22 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo).
    2. Da visualização efetuada ao material que nos foi apresentado, aferimos tratar-se de uma estrutura muito rudimentar de um stand (caixilharia metálica ligeira e painéis dobráveis) transportável numa pequena mala, totalmente incongruente com um custo de €20.500, atendendo simplesmente ao conhecimento do senso comum” (fls. 22 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo).
  • As faturas emitidas pelo fornecedor “G... Lda.” foram, igualmente, desconsideradas, para efeitos de IRC e de IVA, pela Requerida, a qual fundamentou estas correções, nomeadamente, com base na “desistência do serviço”, facto este confirmado pelo fornecedor - que emitiu a respetiva nota de crédito - e pela Requerente (fls. 25 do Relatório Final de Inspeção junto ao processo administrativo).
  • A Requerente candidatou-se ao subsídio Portugal 2020. O projeto SI Internacionalização com o código Norte-02-...-FEDER-... teve início em 1 de outubro de 2015 e fim em 30 de setembro de 2017.

(cfr. doc.  22 junto com o PPA, cujo teor se dá por reproduzido).                        

  1. As faturas FT2017A1-2533 e a FT2017A1-2534 foram as únicas incluídas no Projeto e objeto de financiamento pelo Portugal 2020.

(cfr. art.º 41.º do PPA e fls. 38 do Relatório final de inspeção tributária).

  1. A fatura n.º 3176, do ano 2018 não foi incluída no Projeto SI Internacionalização com o código Norte-02-...-FEDER-... nem foi objecto de financiamento pelo Portugal 2020.

(cfr. Doc. 23 junto com o PPA e artigo 41.º do PPA. Facto este não contestado pela Requerida).

  1. A fatura n.º 2820 utilizada pelo RIT para termo de comparação, contém duas verbas distintas (impressão em papel couché 135g 4/4 cores – 6 catálogos 4/4 cores – 102 unidades, com o preço total de 54,06€ e unitário de 0,53€ e impressão em papel couché 250g 4/4 cores – 4/4 cores e verba 15 monofolhas - 15 unidades, com o preço total de 11,70€ e unitário de 0,78€). (Cfr. doc. 24 junto com o PPA).
  2. As correções resultantes das faturas emitidas pelo fornecedor G... não foram contestadas pela Requerente em sede de ação inspetiva e de procedimento de reclamação graciosa.

(fls. 25 e ss. do Relatório Final de Inspeção e reclamação graciosa, ambos, juntos ao processo administrativo).

  1. A Requerente apresentou, em 30-07-2021, reclamação graciosa dos atos de liquidação de IRC e de IVA e das retenções na fonte (e respectivos juros compensatórios) com os n.os 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021..., 2021... e 2021... .
  2. Por despacho de 22-10-2021, a Requerente foi notificada do projeto de indeferimento da reclamação graciosa, para, querendo, exercer o direito de audição-prévia. (Cfr. Doc. 2 junto com o PPA, cujo teor se dá por reproduzido).
  3. A 23-11-2021, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, por despacho de 17-11-2021, da Chefe de Divisão da Direcção de Finanças do Porto, ao abrigo da subdelegação de competências. (Cfr. Doc. 1 junto com o PPA, cujo teor se dá por reproduzido).
  4. Na decisão final de indeferimento considera-se que a Requerente: “não apresenta novos elementos, tecendo apenas considerações acerca das correcções efectuadas. Desta forma, remete-se e concorda-se com as conclusões e correcções constantes no RIT, sendo de manter as mesmas”. (Cfr. Doc. 1 junto com o PPA, cujo teor se dá por reproduzido).
  5. Por comunicação da AT de 19-04-2022, foi feita a revogação parcial de um dos atos tributários de liquidação de IRC objeto do pedido de pronúncia arbitral relativa ao ano de 2018 no montante de €20.500,00. Esta correção estava relacionada com a fatura emitida pelo fornecedor B... . A AT, no entanto, não anulou / revogou as correções efetuadas em sede de IVA, também, relacionadas com a referida fatura.

(Cfr. comunicação da Requerida de 19/04/2022, junta aos autos).

 

II.2. Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

  1. Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, a) e e), do RJAT).
  2. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 596.º do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, e), do RJAT).
  3. A fixação da matéria de facto baseia-se na análise crítica dos documentos juntos aos autos, tendo sido selecionada de acordo com o disposto no artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e artigo 607.º, n.º 3 e 4, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1 do RJAT e teve em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT.

 

 

III. Posições das Partes

  1. No presente processo, com relevância para a Decisão, a Requerente defende, em suma, o seguinte:
  1. “As liquidações impugnadas padecem de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, tal como o despacho de indeferimento da reclamação graciosa de ilegalidade, por falta de fundamentação e omissão de pronúncia;
  2. A Requerente submeteu à apreciação da AT, por via da reclamação apresentada, a apreciação de determinados atos de liquidação, designadamente no que respeita aos factos constantes do Ponto III.3.2. do RIT, invocando factualidade e juntando documentação, absolutamente desprezada nessa sede, pelo que a decisão de indeferimento da reclamação graciosa padece de ilegalidade por falta de fundamentação;
  3. Apenas as faturas FT2017A1-2533 e a FT2017A1-2534 foram incluídas no Projeto e objeto de financiamento pelo Portugal 2020;
  4. As outras faturas da D... emitidas após o termo do apoio 2020 não podem ser desconsideradas, respeitando a decisões de gestão da Requerente justificadas no facto dos catálogos serem, na sua maior parte, colocados em agentes que a empresa tem nesses países que os distribuem diretamente a potenciais clientes ou em feiras e exposições, fruto da pretendida internacionalização da Requerente;
  5. Não pode haver qualquer ligação entre o número de catálogos e o número de clientes, uma vez que aqueles, que são postos em causa, espelham o começo da prospeção de mercado e de clientes no mercado internacional extracomunitário, por parte da Requerente;
  6. Relativamente à D... a fatura 2820 utilizada pelo RIT para termo de comparação, contém duas verbas distintas (pese embora, e de forma surpreendente, apenas se tenha selecionado uma para o efeito);
  7. Relativamente à E... estão em causa duas faturas emitidas no ano de 2018, uma no mês de maio e outra no de novembro, as duas relativas ao mesmo serviço de “trabalho de fotografia, design e conceção de catálogos e newsletter internacionais”, mas desdobradas;
  8. Ambas as faturas foram emitidas no ano 2018, quando o projeto em execução ...  terminou em 30-09-2017;
  9. Analisando a dita “fundamentação”, inserta no RIT, constata-se que o mesmo conclui que as faturas em causa são “falsas” por não traduzirem verdadeiras operações económicas;
  10. A Requerente não desconhece que, de acordo com a mais recente jurisprudência, perante tal situação - a falsidade das faturas - a AT não tem que a provar “de forma provada”, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo, para poder fazer cessar a aludida presunção estabelecida no artigo 75.º da LGT.
  11. Todavia, para que tal ocorra, “a AT tem que demonstrar a existência de «indícios fundados» (objectivos, sólidos e consistentes, que traduzem uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais), para fazer cessar a presunção de veracidade a favor do contribuinte prevista no art. 75º da LGT” (Acórdão TCA-Sul, de 18-06-2015 - Proc. 07168/13);
  12. Aliás, os serviços de inspeção sabem - porque viram e constam do próprio processo, com exceção óbvia do stand expositivo - que todos os bens constantes das faturas existem. E, mais do que isso, não contesta que foram produzidos pelos emitentes das respetivas faturas, nem que foram efetivamente pagos pela Requerente;
  13. Sendo certo que, além do mais, é sabido que a incerteza sobre a realidade dos factos tributários reverte, em regra, contra a administração fiscal, “… não devendo a administração fiscal efectuar a liquidação se não existirem dados suficientemente consistentes da existência dos factos tributários …” (Lima Guerreiro, Silvério Mateus - C. P. Tributário anotação ao art. 121º);
  14. É manifesto que a pretensa fundamentação contida no RIT, não pode ser considerada como tal, nem nunca poderia justificar a atuação da AT para qualquer tipo de correção”.
  15. Conclui, assim, a Requerente peticionando pela procedência do pedido arbitral e, em consequência, a anulação das liquidações de IRC e de IVA e respetivos juros compensatórios, com as legais consequências, designadamente com a restituição do imposto pago acrescido de juros indemnizatórios.

 

  1. Por sua vez, a AT defende o seguinte na decisão de suporte aos atos impugnados:
  1. Dada a não apresentação de provas consistentes e credíveis de efectiva realização das operações descritas nas faturas emitidas pela D..., considera-se indevidamente deduzido o IVA contido nos referidos documentos, nos montantes de €6.900 (período 201709), €2.875 (período 201807), e de €12.535 (período 201811), nos termos estipulado no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA “Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura” e, não aceite o gasto associado, no montante de €30.000, em 2017, e de €67.000, em 2018, nos termos do artigo 23.º do CIRC, dado não se enquadrar no conceito de gasto ou perda, estabelecido no mesmo, atendendo a que não foi incorrido ou suportado pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, pois está suportado contabilisticamente por faturas relativamente às quais existem fortes indícios que não titulam operações reais. Nesse sentido, também a alínea d) do n.º 1 do art. 23.º-A, estipula esses gastos, apesar de contabilizados, não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável;
  2. A informação recolhida dos procedimentos de validação das operações comerciais suportadas pelas faturas emitidas pela E... não comprova de forma clara e inequívoca a efetiva realização dos serviços, antes pelo contrário, indicia que estamos na presença de uma operação fictícia, suportada pelo facto de não terem sido apresentados elementos consistentes e comprovativos da efectiva execução do material publicitário, quer quanto aos produtos, quer quanto às quantidades, quer quanto aos montantes debitados;
  3. Assim, relativamente às Faturas da A... 2533, 2534 de 2017 e 3176 de 2018 considerou a AT a não dedutibilidade do seu custo para efeitos de IVA com fundamento na falta de verificação de elementos credíveis da realização das operações descritas por resultarem de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura; para efeitos de IRC considerou a AT não ser aceite o gasto das faturas da D... por considerar não ter sido tal custo incorrido ou suportado pela Requerente para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, por estar suportado em faturas relativamente às quais existem fortes indícios que não titulam operações reais;
  4. A conclusão da AT resulta da constatação de que as quantidades de catálogos identificados nas faturas – 12.000 catálogos em 2017 e 17.000 em 2018 – e os respectivos valores, €30.000 e €67.000 indiciam que as faturas documentam operações simuladas ou negócios fictícios por serem muito elevados e totalmente desajustado da realidade pelo facto dos clientes da A... não serem consumidores finais/particulares;
  5. Os exemplares dos catálogos analisados evidenciam incongruências que confirmam que a Requerente ao não apresentar provas consistentes e credíveis da efectiva realização das operações descritas deduziu indevidamente o IVA no período 2017/09, no montante de €6.900, no período de 2018/07 no montante de €2.875 e no período de 2018/11, no valor de €12.535; e
  6. Não aceite o gasto associado, no montante de €30.000, em 2017, e de €67.000, em 2018, nos termos do art. 23.º do CIRC, dado não se enquadrar no conceito de gasto e perda, estabelecido no mesmo, atendendo a que não foi incorrido ou suportado pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, pois, está suportado por faturas relativamente à qual existem fortes indícios que não titulem operações reais.
  7. Quanto ao fornecedor E... estão em causa as faturas 2018A1/370 e 2018A/927, no valor total de €74.415 que identificam de forma genérica os serviços prestados, não cumprindo os formalismos legais da emissão de documentos, previstos quer no Código do IVA, nomeadamente no n.º 5 do artigo 36.º, quer no Código do IRC, concretamente no n.º 4 do art. 23.º;
  8. Ademais, da análise do ficheiro SAFT-PT da faturação do exercício de 2018 aferiu-se que os montantes debitados nas 2 faturas emitidas para a A... são totalmente incongruentes (em valor/quantidade serviços/produtos) com as restantes faturas emitidas, por terem valor mais elevado, considerando uma análise sobre a média ponderada por produto/serviço faturado, concluindo-se, assim, pela não comprovação de forma clara e inequívoca a efectiva realização dos serviços prestados, antes indicia que se está na presença de operações fictícias, suportada pelo facto de não terem sido apresentados elementos consistentes e comprovativos da efectiva execução do material publicitário, quer quanto aos produtos, quer quanto às quantidades, quer quanto aos montantes debitados;
  9. Conclui-se, assim, no RIT que se considera indevida a dedução do IVA, no montante de €6.785 (período 201805) e de €7.130 (período 201811), nos termos do estipulado no n.º 3 do artigo 19.º do Código do IVA: ”Não pode deduzir-se indevidamente imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura”; nos termos da alínea a) do n.º 2 do art. 19.º do Código do IVA, pois, só confere direito à dedução imposto contigo em faturas emitidas na forma legal, o que não se verifica nas faturas em apreço, atendendo a que não cumprem com o estipulado no art. 36.º do Código do IVA, nomeadamente na alínea b) do n.º 5, que consagra que as faturas devem conter A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável…”; e
  10. Em sede de IRC os gastos contemplados nas faturas da E... não são aceites para efeitos fiscais, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, porque não se enquadra no conceito de gasto estabelecido no mesmo, atendendo a que não foram incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, pois, estão suportados por faturas relativamente às quais existem fortes indícios de não titularem operações reais;
  11. Também com fundamento na alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º-A, atendendo a que as faturas não cumprem com os requisitos expostos nos n.ºs 3 e 4 do artigo 23.º; o seu gasto não pode ser aceite;
  12. Pelo exposto, conclui a AT na sua Resposta que a Requerente não apresentou provas consistentes e credíveis da efectiva realização das operações descritas nas faturas, nas quantidades e valores debitados, que dissipe os indícios apurados da falta de veracidade da mesma, no decurso da ação inspetiva descritos do RIT.
  13. Assim, na linha com a jurisprudência dominante cabe à AT o ónus de demonstrar que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade, cabendo, perante a existência dos referidos indícios, ao sujeito passivo demonstrar a efetividade das operações constatadas;
  14. Neste sentido, entende a AT que a informação recolhida dos procedimentos de validação das operações comerciais suportadas pelas faturas emitidas, não comprovam a efectiva realização dos serviços, indiciando que estamos na presença de operações fictícias, suportado pelo facto de não terem sido apresentados elementos consistentes e comprovativos da efectiva execução do material publicitário, quer quanto aos produtos, quer quanto às quantidades, quer quanto aos montantes debitados;
  15. Mais se entende que tratando-se de deduções fiscais cabia à Requerente o ónus da prova, conforme decorre do artigo 74.º, n.º 1 da LGT, não bastando ter pago ao fornecedor ou estar o imposto mencionado em fatura;
  16. Finda a presunção da veracidade da declaração da Requerente, passa a recair sobre esta o ónus de demonstrar quer a materialidade das operações, quer o montante dos encargos que lhe foram faturados;
  17. Todavia, a Requerente não exibiu documentos aptos a produzir tal prova, limitando-se, nos presentes autos, a questionar e a gerar a dúvida acerca das conclusões dos SIT, sem apresentar nada de novo quanto à efetiva aquisição dos bens ou serviços faturados e formação dos preços que se fizeram constar das faturas em causa;
  18. É, neste contexto, de falta de colaboração na apresentação de prova inequívoca e de infrações fiscais que se tem de avaliar os indícios apontados pelos SIT”.
  19. Conclui a AT pela improcedência total do pedido, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os atos tributários de liquidação impugnados.

 

 

IV. Matéria de direito

IV.1. Questões-Prévias

            Da revogação parcial da liquidação adicional de IRC 2018 n.º 2021 ...

 

  1. A Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral dos atos de liquidação de IRC e IVA identificados em I., no valor de €122.029,98 (cento e vinte e dois mil vinte e nove euros e noventa e oito cêntimos).
  2. Dentro do prazo previsto no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT, a AT procedeu à comunicação à Requerente da decisão de anulação parcial do ato tributário de liquidação adicional de IRC 2018 n.º 2021 ..., por força da revogação parcial da correção efetuada ao exercício de 2018. In casu, a AT anulou a correção ao IRC de 2018, resultante da desconsideração de gasto fiscal, no montante de 20.500,00€, titulado por fatura emitida pela sociedade “B..., SA”.
  3. Assim, o processo prosseguirá relativamente ao referido ato de liquidação apenas para apreciação dos efeitos produzidos pelo acto revogatório que subsistem.

 

Das correções efetuadas às operações suportadas pelas faturas emitidas pela C... LDA. e G... LDA. e do pedido de anulação da liquidação adicional de IRC 2018 n.º 2021 ...

  1. Na petição arbitral apresentada, a Requerente peticiona pela anulação da Demonstração de acerto de contas de IRC 2017 n.º 2021 ..., no valor de €18.426,31.
  2. Sendo que, a título prévio, a AT, em sede de Resposta, refere que “esta Demonstração de Acerto de Contas, no montante de 18.426,31 €, resulta da entrega efetuada pelo sujeito passivo de uma DM22 de Substituição referente ao exercício de 2017, em que é alterado o resultado tributável declarado de 10.796,85 € passando para 85.658,85 € (liquidação no 2021 ... de 27.01.2021). Este facto teve a ver com a não aceitação pelos SIT do montante de 74.862,00 € contabilizado pelo sujeito passivo nesse período como comissões referentes a angariação de clientes (conforme se encontra descrito nas páginas 11 e 28 do RIT)”.
  3. Pelo que, conclui a AT, “como a Requerente regularizou essa situação no decurso da ação inspetiva, julgamos não ter cabimento querer agora discuti-la no presente procedimento arbitral”.
  4. É certo que a Requerente gerou alguma confusão ao identificar os atos tributários objeto do presente pedido arbitral através do n.º de demonstração de acerto de contas, quando, em sede de procedimento administrativo, os atos objeto de reclamação graciosa foram identificados através do número da respetiva liquidação.
  5. A demonstração de acerto de contas de IRC de 2017 n.º 2021 ... foi, também ela, objeto de reclamação graciosa. Senão vejamos, a AT emitiu a liquidação (adicional) de IRC n.º 2021..., com o valor a pagar €23.984,17. Este ato tributário foi, indubitavelmente, objeto de reclamação graciosa (vide factos provados, em especial, ponto “w” do probatório).
  6. A AT, no entanto, emitiu 2 (duas) demonstrações de acertos de contas relativas àquele ato tributário. A saber: n.º 2021... (no valor de €5.467,86) e n.º 2021... (no valor de €18.426,31)[1]. Ora, conforme refere a própria AT, “fazem parte integrante desta notificação [de ato tributário]” as notas de cobrança e a demonstração de acerto de contas.
  7. Razão pela qual, tendo a Requerente apresentado reclamação graciosa contra o ato tributário de liquidação, então, naturalmente, estão a ser reclamadas as (duas) demonstrações de acerto de contas com ele relacionadas, pelo que, em consequência, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 4.º, n.º 1, ambos do RJAT e dos artigos 1.º e 2.º, alínea a), da Portaria n.º 112-A/2011, este Tribunal é materialmente competente para apreciar e decidir o pedido da Requerente relativamente ao ato acima identificado.
  8. Não obstante, tais correções estão relacionadas com a não aceitação de gasto fiscal - para efeitos de IRC - no montante de €74.862, titulado por faturas emitidas pela C... LDA., relativamente ao qual a Requerente assumiu o “erro e procedeu à entrega da devida declaração de substituição” (cfr. Direito de Audição exercido pela Requerente após notificação do projeto de relatório de inspeção tributária).
  9. O facto da Requerente ter assumido um erro e substituído a Declaração Modelo 22 de IRC, naturalmente, não a impede de, posteriormente, apresentar reclamação graciosa, nem de apresentar pedido de pronúncia arbitral. Porém, a verdade é que, nesta sede arbitral, no que concerne à identificação da causa de pedir (e também em sede de reclamação graciosa), a Requerente nunca identifica nem vem imputar eventuais ilegalidades cometidas pela Requerida às correcções resultantes da desconsideração do gasto fiscal titulado pelas faturas emitidas pela C... LDA.
  10. A Requerente apenas tece considerações genéricas quanto a um eventual vício de falta de fundamentação ou de omissão de pronúncia, pelo que, atendendo aos poderes de cognição deste tribunal, apenas poderão ser analisadas as correções resultantes da desconsideração do gasto fiscal titulado pelas referidas faturas emitidas pela C... LDA. à luz dos alegados vícios de falta de fundamentação e de omissão de pronúncia.
  11. O que acima se refere é, igualmente, aplicável às correções resultantes da desconsideração do gasto fiscal, para efeitos de IRC de 2018, no montante de €15.000 (resultante de fatura emitida pela G... LDA.), pois, também, quanto a esta correção - a qual foi materializada no referido ato tributário de liquidação de IRC de 2018 - a Requerente, também, não lhe imputa quaisquer vícios específicos, pelo que, este tribunal analisará eventuais vícios destas correções, igualmente, à luz dos vícios de falta de fundamentação e de omissão de pronúncia.

 

Do pedido de anulação da liquidação n.o 2021 ... (e respetivas demonstrações de acerto de contas n.os 2021 ... e 2021 ...)

  1. O que se referiu acima quanto às correções ao IRC resultantes da desconsideração dos gastos fiscais titulados pelas faturas emitidas pela C... LDA. é, igualmente, aplicável, em sede de IVA.
  2. De facto, tais faturas foram, também, desconsideradas para efeitos de IVA, i.e. é o direito à dedução do respetivo IVA, no montante de €17.218,26 (período 201712), foi desconsiderado e, consequentemente, a AT procedeu à emissão da liquidação adicional de IVA n.º 2021 ... (e respetivas demonstrações de acerto de contas n.os 2021  ... e  2021 ...).
  3. Ora, também quanto a esta correção, ao longo do Pedido de Pronúncia Arbitral (e da própria Reclamação Graciosa) não se vislumbra qualquer ilegalidade específica que seja assacada a esta liquidação. Uma vez mais, apenas à luz da genérica invocação de vício de falta de fundamentação e de omissão de pronúncia é que poderá este tribunal analisar a (i)legalidade deste ato tributário.

 

 

IV.2. Apreciação de mérito

 

  1. Da análise do procedimento administrativo, bem como das peças processuais apresentadas pelas partes está, pois, em causa determinar se os atos tributários de IRC e de IVA (de 2017 e 2018) corrigidos pela AT na sequência de ação de inspeção tributária devem ou não permanecer, total ou parcialmente, na ordem jurídica, i.e. está em crise a apreciação da declaração de ilegalidade de atos de liquidação (atos mediatos).
  2. Entendemos ainda, como acima já mencionado, que decorre com meridiana clareza do pedido de pronúncia arbitral (e.g. intróito), apesar de não constar expressamente do pedido, que a Requerente pretende também a declaração de ilegalidade e a anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa oportuna e previamente apresentada (ato imediato).
  3. Aliás, conforme consta da decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 336/2018-T, “Dado que a reclamação graciosa ou o recurso hierárquico se reportam à própria liquidação impugnada, a reacção à decisão de indeferimento na reclamação ou no recurso toma esta decisão por objecto imediato, mas o objecto mediato é, necessariamente, a própria liquidação. Não é descabido que, por cautela, sejam expressamente impugnados, em simultâneo, ambos os actos, o de liquidação (mediatamente) e o de indeferimento (imediatamente). Mas não se afigura que isso seja indispensável, ou sequer necessário”.
  4. Assim, em face dos factos e do enquadramento jurídico que resulta dos autos, está essencialmente em causa determinar se, para efeitos de IVA, as faturas ora em crise, consideradas não dedutíveis pela AT, são ou não ilegais considerando:
  1. A falta de prova da sua efetiva realização, nos termos do artigo 19.º do Código do IVA.
  2. Os requisitos formais previstos no artigo 19.º e 36.º, n.º 5 do Código do IVA;
  1. De igual modo, está em causa determinar se, para efeitos de IRC, as faturas consideradas não dedutíveis pela AT e impugnadas indiretamente pela Requerente, são ou não ilegais considerando:
  1. A existência de fortes indícios que não titulam operações reais, nos termos do disposto no artigo 23.º e alínea d) do n.º 1 do artigo 23.º-A do Código do IRC.
  1. A Requerente invoca, ainda, a falta de fundamentação dos atos de liquidação e da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, sendo que, quanto a este último ato decisório, a Requerente alega, igualmente, omissão de pronúncia.
  2. Note-se que, conforme se refere no Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) no âmbito do processo n.º 0915/05 (datado de 25/01/2006), “o vício formal atinente à fundamentação não é, em regra, o primeiro a ser conhecido; mas tem de o ser quando a motivação do acto falte ou seja insuficiente e o conhecimento das razões em que se fundou o autor do acto seja imprescindível para apreciar os vícios de fundo”.
  3. Neste caso concreto, conforme adiante se verá, este Tribunal considera que algumas das correções em que se fundam os atos tributários padecem de falta de fundamentação e omissão de pronúncia, razão pela qual vão ser primeiramente analisados os vícios de forma.

Vejamos:

 

IV.3 Da falta de fundamentação

  1. O direito à fundamentação dos atos administrativos e tributários que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos é um princípio constitucional consagrado no artigo 268.º da CRP e, encontra-se concretizado pelo legislador ordinário no artigo 77.º da LGT, que determina:

“A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.

  1. Dispondo o n.º 2 do mesmo preceito legal que “A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo”.
  2. Assim, a fundamentação terá de ser:

(i) expressa, através de uma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão;

(ii) clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide;

(iii) suficiente, possibilitando ao sujeito passivo, um conhecimento concreto da motivação, ou seja, das razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a decidir como decidiu;

(iv) congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão.

  1. Conforme refere o STA em acórdão proferido no âmbito do processo n.º 03014/11.1BEPRT (datado de 02/02/2022), um ato (administrativo ou tributário) encontra-se devidamente fundamentado “se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto”.

Vejamos:

 

  1. Em primeiro lugar, cumpre clarificar que a Requerente invoca o vício de falta de fundamentação não só quanto à decisão de indeferimento da reclamação graciosa mas também dos próprios atos de liquidação resultantes da ação inspetiva da AT (veja-se, por exemplo, os artigos 39.º, 65.º ou 93.º do PPA).
  2. Em segundo lugar, conforme resulta claro da Jurisprudência do STA, “em sede de fundamentação formal do acto tributário impugnado, a única a considerar é a que consta do relatório da inspecção que lhe serviu de suporte” (Proc. n.º 03014/11.1BEPRT, de 02/02/2022).
  3. Adiante-se, desde já, que este Tribunal considera que as correções resultantes da não aceitação do gasto fiscal (para efeitos de IRC) titulados pela fatura n.º 2009 (datada de 05/07/2018), emitida pela D..., no valor de €12.500 padece do vício de falta de fundamentação.

Isto porque,

  1. Por um lado, a AT refere que a descrição constante da fatura n.º 2009 é a seguinte: “design e conceção de catálogos internacionais - 5 unidades” (fls. 14 do Relatório de Inspeção Tributária). Este facto é corroborado pela informação prestada pela Requerente durante a ação inspetiva, dado que esta refere que a referida fatura refere-se a “design e conceção de 5 catálogos internacionais direcionados para o mercado do Magreb, promovendo os serviços de consultadoria da A... conforme estratégia delineada para os anos de 2018/2020 a ser financiada pelo projeto P2020 submetido e aprovado sem dotação orçamental” (fls. 15 do Relatório de Inspeção Tributária).
  2. Aquando do referido esclarecimento foram, igualmente, providenciados 5 ficheiros (4 páginas cada) relativos aos referidos catálogos (fls. 15 do Relatório de Inspeção Tributária).
  3. No entanto, aquando da análise do esclarecimento prestado pela Requerente, a AT refere que “por outro lado, a fatura identifica a impressão de 1.000 unidades de cada, num total de 5.000 catálogos, não nos tendo sido apresentado qualquer exemplar” (fls. 15 do Relatório de Inspeção Tributária).
  4. É, pois, evidente a contradição da fundamentação apresentada pois, por um lado, a AT considera que a fatura respeita apenas “design e conceção de catálogos internacionais - 5 unidades” (fls. 14 do Relatório de Inspeção Tributária) mas, por outro lado, considera que a fatura respeita à impressão de 5.000 catálogos (fls. 15 do Relatório de Inspeção Tributária).
  5. Ora, se relativamente à fatura n.º 2009 estão em causa apenas serviços de “design e conceção”, naturalmente, não pode a AT fundamentar a sua correção no facto de - alegadamente - existirem quantidades de catálogos “claramente elevadas e totalmente desajustadas da realidade” (fls. 16 do Relatório de Inspeção Tributária).
  6. Note-se, ainda, que ao longo de todo o Relatório de Inspeção este é o único - e, repita-se, contraditório - fundamento apresentado pela AT para as correções aos gastos fiscais titulados pela fatura n.º 2009.
  7. Aliás, relativamente às correções resultantes de faturas emitidas pela D..., a AT conclui pela “falta de veracidade das operações descritas nas faturas n.º 2533, 2534 de 2017 e n.º 3176 de 2018 do fornecedor” (fls. 17 do Relatório de Inspeção Tributária). Ou seja, não é invocada a fatura n.º 2009 na conclusão da AT pese embora, nas correções tenham sido incluídos os valores constantes fatura n.º 2009.
  8. Assim, conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no âmbito do Proc. n.º 03014/11.1BEPRT, “se a fundamentação não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº.125, nº.2, do C.P.A., então em vigor; artº.153, nº.2, do novo C.P.A.)”.
  9. Em particular, entende este Tribunal que, nesta parte, a fundamentação carreada pela AT é contraditória e insuficiente, pois conforme esclarece o STA, “os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Em conclusão, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final” (Proc. n.º 03014/11.1BEPRT, de 02/02/2022).
  10. Face ao exposto, as correcções sob exame ao IRC de 2018 (gasto considerado não dedutível no montante de €12.500), no montante de €12.500 padece do vício de falta de fundamentação, o qual equivale à anulação, nessa parte, dos atos tributários de liquidação.
  11. Quanto aos restantes atos tributários de liquidação, entende este Tribunal que não pode proceder o vício de falta de fundamentação, pois analisado o Relatório de Inspeção resulta claro que, independentemente da questão de se concordar ou não com a fundamentação, a mesma permitiu à Requerente “conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto” (Acórdão proferido pelo STA no âmbito do processo n.º 03014/11.1BEPRT, datado de 02/02/2022).
  12. Aliás, essa compreensão é, desde logo, claramente visível ao longo do procedimento de reclamação graciosa e do presente processo arbitral, pois a Requerente conhece e compreende os fundamentos da decisão da AT e “ataca” os mesmos de forma inequívoca.
  13. Não obstante, no caso das correções resultantes da desconsideração das faturas emitidas pela C... LDA. e pela G... LDA., resulta, pois, claro, respetivamente, do direito de audição exercido (com a assunção do erro cometido) e dos esclarecimentos prestados em sede de ação inspetiva (fls. 25 do Relatório Final de Inspeção) que a Requerente conhece e compreende de forma cabal os fundamentos das respetivas correções.
  14. Por este motivo, quanto aos restantes atos tributários, por ter a AT fundamentado (de forma clara, suficiente e compreensível) a decisão de indeferir a reclamação graciosa com recurso aos mesmos factos e fundamentos utilizados no Relatório de Inspeção, naturalmente, considera-se essa mesma decisão como devidamente fundamentada.
  15. Face ao exposto, o vício de falta de fundamentação procede apenas quanto às correções resultantes da não aceitação do gasto fiscal (para efeitos de IRC) titulados pela fatura n.º 2009 (de 05/07/2018), emitida pela D... no valor de €12.500.
  16. Em consequência, determina-se a anulação parcial do ato tributário de liquidação de IRC n.º 2021... .

 

 

 

IV.4. Da omissão de pronúncia

  1. Quanto à alegada falta de pronúncia, importa referir que a AT decidiu a reclamação graciosa apresentada pela Requerente tendo mantido as liquidações adicionais efetuadas no âmbito do procedimento de inspeção e com os fundamentos elencados no RIT.
  2. Por seu turno a Requerente referente que “(...) no que respeita aos factos constantes do Ponto III.3.2. do RIT, (tendo) invocado factualidade e juntando documentação, absolutamente desprezada nessa sede” (Art. 19.º do PPA).
  3. Concluindo a Requerente que não ficou “a saber se a AT, na decisão de indeferimento da reclamação, ponderou, ou não, tais factos e documentos” (Art. 21.º do PPA).
  4. Ora, em primeiro lugar, importa referir que a Requerente não é clara quanto aos factos e documentos que - alegadamente - não terão sido ponderados pela AT, dado que limita-se a fazer referências genéricas.
  5. Não obstante, verifica-se que, em sede de reclamação graciosa, a Requerente juntou (i) a decisão de aprovação do projeto SI Internacionalização (ao qual foi o código Norte-02-...-FEDER-... e o n.º de projeto ...) e (ii) um pedido de pagamento ao abrigo do referido projeto (cfr. documentos junto à reclamação graciosa).
  6. Porém, tais elementos / documentos não são novos. De facto, o pedido de pagamento (e o respetivo mapa de despesas) havia já sido apresentado no decurso da ação inspetiva, tendo a AT vindo a pronunciar-se sobre o mesmo no seu Relatório Final de Inspeção (vide, fls. 38 e 39 do Relatório Final de Inspeção), pelo que, naturalmente, quanto a estes não poderá proceder a invocada omissão de pronúncia.
  7. O mesmo se diga quanto à decisão de aprovação. Em sede de reclamação graciosa, a Requerente refere que “o projeto ao SI Internacionalização teve como data de início 2015-10-01 e data de fim 2017-09-30, conforme decisão de aprovação que se anexa como doc. 1” (Art. 12.º da reclamação graciosa junta aos autos). Facto este corroborado pela AT no seu Relatório Final de Inspeção (fls. 38 do Relatório Final de Inspeção).
  8. Pelo que, improcede o alegado vício de omissão de pronúncia.

 

IV.5. Das faturas falsas

  1. No essencial, recorde-se, o presente processo versa sobre correções ao IVA e ao IRC (dos exercícios de 2017 e 2018), porquanto a AT considerou o IVA e os gastos fiscais (IRC) deduzidos pela Requerente estão suportados contabilisticamente por faturas relativamente às quais existem fortes indícios de não titular operações reais (i.e. faturas falsas).
  2. A título prévio cumpre referir que, conforme se conclui no Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Norte (Proc. n.º 00449/09.3BEVIS, de 25/08/2018), “compete à Administração provar a existência de indícios sérios de que a operação faturada não corresponde à realidade (art.º 74º/1 LGT). Feita esta prova, recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transação – vide, entre muitos outros, os acórdãos do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF”.
  3. Ou seja, significa isto que, conforme se extrai do Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Sul, proferido no âmbito do Proc. n.º 1594/09.0BELRA (datado de 25/08/2018):

“Nos termos do n.º 2 alínea a) do referido preceito, a presunção de veracidade não se verifica quando as declarações, contabilidade ou escrita revelem “indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável do sujeito passivo”. No caso dos autos, em que estamos perante situação em que as facturas contabilizadas (títulos de despesa) são emitidas na forma legal, mas que, ao menos na óptica da AT, não têm subjacente a operação económica que reflectem, é à AT que cabe o ónus da prova da verificação dos respectivos indícios ou pressupostos da tributação, nos termos do n.º1 do art.º74.º da LGT, ou seja, dos pressupostos legais da sua actuação correctiva, face à presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes enunciadas no n.º1 do art.º75.º da mesma LGT. Para tanto, é suficiente que a AT demonstre a existência de “indícios fundados” (objectivos, sólidos e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais), para fazer cessar a presunção de veracidade estabelecida a favor do contribuinte no n.º1 do art.º75.º da LGT, não se impondo a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam. Quando se verifique cessação da presunção de veracidade dos elementos declarativos e de contabilidade e escrita, passa a caber ao contribuinte – desprovido do escudo protector da presunção legal (artigos 74.º, n.º1 da LGT e 342.º, n.º1 e 344.º do Código Civil) – o ónus de prova da existência dos factos tributários que invoca como fundamento do seu direito à dedução, como custos fiscais, das verbas representadas pelas facturas consideradas falsas”.

  1. Sendo que, prossegue o citado Acórdão, “indicíos fundados” terão de ser “objectivos, sólidos, consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais”.
  2. Em sentido semelhante, o Acórdão proferido no Proc. n.º 1594/09.0BELRA (datado de 11/10/2018) pelo TCA-Sul esclarece que:

“Estando em causa indícios de facturação falsa, a AT não tem que provar a falsidade das facturas; basta-lhe demonstrar os indícios de falsidade e que estes são consistentes, sérios e reveladores de uma alta probabilidade de que as facturas são «falsas» para cumprir o seu encargo probatório.

Feita esta prova indiciária, a lei faz cessar a presunção de boa-fé creditada às declarações e contabilidade do contribuinte e devolve-lhe o encargo de provar a materialidade das operações subjacentes à facturação indiciada.

Onerado com o ónus da prova da veracidade das operações materiais subjacentes à «facturação indiciada», os esforços que o contribuinte deve mobilizar para abalar os indícios de falsidade recolhidos não podem deixar de ser exigentes e sem margem para dúvidas.

Não basta ao contribuinte gerar a mera dúvida sobre a falsidade das facturas para conseguir ganho de causa. Estando onerado com a prova da materialidade das operações, se persistir a dúvida, esta resolve-se contra a parte onerada com a prova”.

  1. Feita esta introdução cumpre, pois, verificar, em primeiro lugar, se os indícios apurados pela AT consubstanciam “indícios fundados” de que as faturas desconsideradas não têm subjacentes as operações que titulam.
  2. Verificando-se tais indícios, posteriormente, caberá à Requerente provar (e não apenas gerar “mera dúvida”) que tais faturas (reputadas como falsas) demonstram a realidade económica das operações que titulam.
  3. Note-se, por fim, que para efetuarmos esta análise é, conforme esclarece o TCA-Norte, “essencial conhecer-se a motivação dos atos impugnados, de modo a que o tribunal a possa sindicar, uma vez que é à luz dessa fundamentação (vertida no Relatório da Inspeção Tributária – RIT -, uma vez que é neste que reside toda a factualidade que consubstancia a declaração fundamentadora dos atos de liquidação impugnados) que o tribunal (...) tem de sindicar se a AT demonstrou os pressupostos que legitimam a sua atuação” (Proc. n.º 00543/16.4BEPRT, de 03/03/2022).

Vejamos,

 

IV.6. Das Faturas emitidas da D...

Faturas A1/2533 e A1/2534 (exercício de 2017) e Fatura n.º 3176 (exercício de 2018)

  1. Relativamente às faturas emitidas pelo fornecedor D..., recorde-se que a AT fundamenta as correções (para efeitos de IVA e de IRC) devido “aos indícios apurados de falta de veracidade das operações descritas nas faturas n.º 2533, 2534 de 2017 e n.º 3176 de 2018 (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção).
  2. Referiu a AT que “dada a não apresentação de provas consistentes e credíveis da efetiva realização das operações descritas nas faturas emitidas pela D..., considera-se:
  • indevidamente deduzido o IVA contido nos referidos documentos, nos montantes de €6.900 (período 201709), €2.875 (período 201807) e de €12.535 (período 201811), nos termos do estipulado no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA: “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura”;
  • e, não aceite o gasto associado, no montante de €30.000, em 2017, e de €67.000, em 2018, nos termos do art.º 23.º do CIRC, dado que não se enquadrar no conceito de gasto e perda, estabelecido no mesmo, atendendo a que não foi incorrido ou suportado pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, pois está suportado contabilisticamente por faturas relativamente às quais existem fortes indícios que não titulam operações reais (...)” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção).
  1. Entendeu a este propósito a AT que a Requerente não apresentou provas consistentes e credíveis da efectiva realização das operações descritas nas faturas, em especial, por terem sido apresentados 5 catálogos exatamente iguais (apesar de na capa de cada um constar a indicação dos países destinatários, i.e. Marrocos, Argélia, USA, Chile e Colômbia), por se encontrarem redigidos em língua inglesa (quando a língua francesa é “amplamente utilizada, por exemplo, em Marrocos e na Argélia”) e por as quantidades adquiridas serem elevadas e “totalmente desajustadas da realidade” (fls. 16 e 17 do Relatório Final de Inspeção).
  2. Quanto à identificação dos países destinatários refere, ainda, a AT que “não se vislumbra uma justificação válida e credível para a identificação do nome do país, antes pelo contrário, tal menção constitui uma limitação à distribuição dos mesmos” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção).
  3. Em particular quanto às quantidades de catálogos (12.000 em 2017 e 17.000 em 2018 e os montantes de €30.000 e €67.000, respetivamente), refere a AT que “o facto dos clientes da A... não serem consumidores finais/particulares, para justificar a aquisição de um número tão elevado de catálogos. O número de potenciais clientes da A..., empresas passíveis de adquirirem os produtos por ela comercializados) peças e acessórios para máquinas de construção, equipamento mineiro, óleos, lubrificantes e material de perfuração para a indústria extrativa) é evidentemente inferior à suposta quantidade de catálogos adquiridos para distribuição” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção).
  4. Alega, ainda, a AT que analisada a fatura de outro fornecedor, o “o valor de €7.900 + IVA, relativa à aquisição de “500 catálogos 30*30 capa dura + laminado veludo” corresponde, isso sim, a “quantidades de catálogos / encargos com publicidade congruentes com o mercado de potenciais clientes da A...” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção).
  5. Quanto às faturas n.os 2533 e 2534 acrescenta a AT que as “faturas referem “verniz da capa e contracapa” identificando-se que o papel dos catálogos apresentados é baço na capa e na contracapa” (fls. 17 do Relatório Final de Inspeção).
  6. Analisados os indícios apresentados verifica-se que - entende a AT - estamos perante uma operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura (reputada como falsa).
  7. Importa por isso verificar se, sob o prisma do artigo 240.º do Código Civil, que define a simulação, por acordo entre o declarante e o declaratário e no intuito de enganar terceiros - neste caso a AT - se verifica divergência entre a declaração negocial e a vontade real das partes.
  8. Como expende Alberto Anvicchio in A Simulação no Negócio Jurídico, 36, nota simular é tornar semelhante ao que não é verdadeiro pelo que a simulação pode comparar-se a um fantasma em cotejo com a dissimulação que é uma máscara. Dito por outras palavras, na simulação não se dissimula acto algum, e então o acto realizado é uma mera aparência, vazia de qualquer sentido («colorem habet substantiam vero nulam»).
  9. Na verdade, para efeitos de IVA, não há direito à dedução quando a operação é simulada ou se o preço constante da fatura ou documento equivalente é simulado, o que o mesmo é dizer que nessas situações não é admitido o direito à dedução do imposto respetivo a fim de não se obter dedução de um imposto que não foi suportado pelo sujeito passivo.
  10. Do mesmo modo, para efeitos de IRC, tais encargos não são fiscalmente dedutíveis, nos termos dos artigos 23.º e 23.º-A do Código do IRC.
  11. Vejamos, pois, se estes factos elencados pela AT constituem ou não “indícios suficientes ou fortes” da existência de faturas falsas.
  12. Adiante-se, desde já, que este tribunal entende que, em face da prova produzida e dos factos enunciados ao longo do RIT, é forçoso concluir que a AT não reuniu indícios suficientes de que a faturação é falsa.
  13. A fundamentação da AT assenta, no essencial, em juízos subjetivos. De facto, não se alcança como é que o facto de os catálogos serem iguais ou de serem redigidos em língua inglesa (amplamente difundida no universo empresarial) indicia a existência de faturas falsas, sendo certo que tais factos, por si só, provam a existência dos catálogos.
  14. É, também, certo que o facto de terem sido apresentadas versões em pdf dos catálogos (ou existirem poucas versões físicas), por si só, não abala a presunção de veracidade das operações, até porque, naturalmente, os catálogos são feitos para serem distribuídos e, por exemplo, a AT nunca questionou a inexistência de visitas a feiras ou clientes locais (sendo que a candidatura ao Portugal 2020 demonstra que existem custos relacionados com viagens a alguns destes mercados internacionais).
  15. Quanto às quantidades e aos preços alegadamente desajustados, também, não se compreende a fundamentação da AT, até porque não é demonstrado que, por exemplo, os preços não correspondem ao que “normalmente” é praticado no mercado.
  16. Note-se, ainda, que o volume de vendas extracomunitárias, em 2017 e 2018, ascendeu a um total €543.336, pelo que gastos de €90.000 em material publicitário (i.e. 16,56% do volume de vendas extracomunitárias) não é desajustado em face das vendas existentes e das vendas potenciais (cfr. Declarações IES juntas aos autos).
  17. Aliás, o facto das vendas extracomuniárias terem aumentado para €1.335.259 e €1.023.140, respetivamente, em 2019 e 2020, acaba por corroborar os benefícios daquele investimento. 
  18. Considerando a liberdade de gestão subjacente à decisão comercial e a própria explicação adiantada pela Requerente sobre a aquisição dos catálogos, como inserida no âmbito da sua estratégia de expansão internacional e comercial, demonstra-se que a AT a fundamentação não é sustentada.
  19. Ademais, também, não acompanhamos o raciocínio de que os catálogos são superiores ao número de potenciais clientes, sendo que a AT não refere ao certo qual é esse número de potenciais clientes. De facto, não são apresentados quaisquer elementos pela AT que corroborem esta afirmação.
  20. Adicionalmente, existe incoerência nos indícios alegados pela AT dado que, por um lado, a AT considera que a impressão de 6.000 catálogos pelo valor de €15.000 (vide, fatura n.º 2533) é “desajustada” (em termos de preço e quantidade) mas, por outro lado, considera que “o valor de €7.900 + IVA, relativa à aquisição de “500 catálogos 30*30 Capa dura + laminado veludo” [são] congruentes com o mercado de potenciais clientes da A...” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção).
  21. No caso sub judice, a AT não logra, também, ao longo do procedimento e processo tributário demonstrar a existência de factos que lancem a dúvida sobre a falsidade das operações de venda subjacentes às faturas n.os 1/2533 e A1/2534 (exercício de 2017) e Fatura n.º 3176 (exercício de 2018), tais como, por exemplo, a invalidade formal da fatura, o não pagamento (total ou parcial) da mesma pela Requerente, ou a inexistência ou inatividade comercial do fornecedor.
  22. Na verdade, as correções efetuadas pela AT assentam, isso sim, em juízos subjetivos pouco fundamentados, sendo que não pode ser considerado um indício de simulação a compra de muitos catálogos e o pagamento de um preço elevado (e, diga-se que, conforme se demonstrou, quanto a este ponto, a própria fundamentação da AT é incoerente).
  23. Ademais, a insuficiência dos indícios carreados pela AT é, também, notória na referência ao facto de tais faturas terem documentado “investimentos efetuados no âmbito das candidaturas da A..., ao subsídio PORTUGAL2020 (....), que foi aprovado, tendo a empresa recebido a totalidade do subsídio não reembolsável associado” (fls. 16 do Relatório Final de Inspeção Tributário). De facto, não se compreende como é tal facto (candidatura e aprovação de um subsídio) poderá demonstrar / corroborar a conclusão de que os gastos estão suportados contabilisticamente “por faturas relativamente à qual existem fortes indícios de que não titulam operações reais” (fls. 17 e 38 do Relatório Final de Inspeção Tributário)
  24. Vejamos, agora, quais as consequências destas conclusões para efeitos de IVA e de IRC.

 

Para efeitos de IVA:

  1. Sobre o direito à dedução do IVA nos negócios - alegadamente - simulados tem sido entendido pela Jurisprudência que quando a AT desconsidera - fundadamente - as faturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade, o que não sucedeu no caso sub judice.
  2. Tratando-se do direito à dedução do IVA, a declaração de IVA apresentada pelo Requerente presume-se verdadeira quando seja apresentada nos termos previstos na lei e os dados dela constantes se encontram inscritos na sua contabilidade ou escrita, por sua vez organizadas de acordo com a legislação comercial ou fiscal.
  3. Assim, tendo o direito à dedução do IVA relativamente às faturas aqui em análise, por base a declaração da Requerente, cabia à AT infirmar a ocorrência do facto em que se suporta essa dedução invocando a simulação da operação e demonstrando existirem indicadores objetivos de simulação de negócio.
  4. Considerando a situação particular em apreciação nos autos, entende-se que para haver simulação seria necessário que a AT tivesse reunido elementos que relacionassem a utilizadora das faturas com o esquema de fraude, ou que o emitente das faturas não era o verdadeiro fornecedor da mercadoria em apreço, ou que, por exemplo, o preço não foi pago ou foi simulado.
  5. Isto é, cabia à AT abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita da Requerente e dos respectivos documentos de suporte.
  6. Não sendo os indícios reunidos pela AT susceptíveis de colocar em causa a presunção de veracidade, é procedente o pedido de anulação das correções ao IVA deduzido subjacente às faturas em análise, no valor de €6.900 (período 201709) e de €12.535 (período 201811).
  7. Em consequência, determina-se a anulação dos atos tributários de liquidação de IVA n.os 2021 ... e 2021 ... .

 

Para efeitos de IRC:

  1. Ademais, especificamente para efeitos de IRC, tendo em conta a validade fiscal da fatura, conforme referem DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, “nestes casos, se a administração tributária não demonstrar a falta de correspondência entre o teor de tais declarações, contabilidade ou escrita e a realidade, o seu conteúdo terá de se considerar como verdadeiros.” (Lei Geral Tributária – Anotado e Comentado, 4.ª Edição, Encontro da Escrita, Lisboa, 2012, p. 664).
  2. Perante a falta de indícios de existência de faturas falsas, caberia, assim, à AT demonstrar que os catálogos adquiridos pela Requerente não serviram o propósito comercial explicitado pela Requerente, o que não sucedeu.
  3. Em face dos factos apurados pela AT, no RIT, assim como das considerações quanto ao valor normal de mercado dos catálogos subjacentes à fatura não aceite, entende-se que sendo a fatura válida, e face ao exposto, é de aceitar a liberdade de gestão comercial da Requerente subjacente à decisão de compra dos catálogos específicos dos mercados em que se projeta, não sendo as dúvidas suscitadas pela AT nos autos suficientes para colocar em causa tal direito.
  4. Assim, acompanhando a Decisão do CAAD, n.º 204/2016, de 20-04-2017, “Quer nesses casos, quer noutros que podem suscitar mais dúvidas, a Administração teria que, para sustentar o contrário da respetiva contabilização pela Requerente de ter recolhido prova substancialmente diferente e mais aprofundada da dimensão e contexto das obras em causa, como é exigido pelo dever de fundamentação dos actos tributários (artigo 77.º, n.º 1, da LGT)”.
  5. Assim, entende-se que, em face das regras do ónus da prova, é procedente o pedido de anulação das correções resultantes da não aceitação dos gastos fiscais nos montantes de €30.000 (IRC 2017) e €54.500 (IRC 2018).
  6. Razão pela qual, em conformidade, deverá ser anulado o ato tributário de liquidação de IRC de 2017 n.º 2021 ... e, do mesmo modo, o ato tributário de liquidação de IRC de 2018 n.º 2021 ... deve, também, ser anulado na parte em que desconsiderou da dedução do gasto fiscal (no montante de €54.500) titulado pela fatura n.º 3176.

 

IV.7. Das Faturas da E... Entende a Requerente que as faturas n.º 2018 A/370, de 15/05/2018 e 2018 A/927, de 14/11/2018, respetivamente, nos valores de €29.500 (ao que acresce IVA no valor de €6.785) e €31.000 (ao que acresce IVA no valor de €7.130), devidamente identificadas nos autos foram emitidas após o termo do Projeto Portugal 2020 e identificam claramente os serviços prestados – como de fotografia, design e conceção de catálogos.

  1. Sendo que, adiante-se, desde já, resulta dos documentos juntos aos autos que as faturas em questão foram, de facto, emitidas após o termo do projeto Portugal2020, o que decorre da data da sua emissão.
  2. A AT considerou, ainda, que as faturas identificam de uma forma genérica os serviços prestados não cumprindo os formalismos do artigo 36.º n.º 5 do Código do IVA, nem no n.º 4 do artigo 23.º do Código do IRC.
  3. Para além disso, entendeu-se no RIT que a informação recolhida dos procedimentos de validação das operações comerciais suportadas pelas faturas emitidas pela E... não comprova de forma clara e inequívoca a efectiva realização dos serviços, antes pelo contrário, indicia que estamos na presença de uma operação fictícia, suportada pelo facto de não terem sido apresentados elementos consistentes e comprovativos da efetiva execução do material publicitário, quer quanto aos produtos, quer quanto às quantidades, quer quanto aos montantes debitados.
  4. Ora, também, nesta sede os indícios carreados pela a AT não são suficientes para concluir-se pela existência de negócio simulado / faturas falsas.
  5. Por um lado, a AT alega “não dispor de uma especificação concreta do serviços prestados” mas, por outro lado, é evidente e corroborado pelo próprio RIT que “a fatura menciona “trabalho de fotografia, design, conceção de catálogos e newsletter internacionais” e que os catálogos em questão foram fornecidos à AT (fls. 19 do Relatório Final de Inspeção).
  6. Ademais, a Requerente informou a AT que tais faturas respeitaram a “todo o tratamento das imagens fornecidas pelo cliente e Produção/construção dos suportes necessários para a disponibilização dos catálogos quer em formato digital, assim como a preparação de ficheiro vetorial para a produção do mesmo em formato papel”, tendo disponibilizado duas versões dos catálogos em PDF (fls. 18 e 19 do Relatório final de inspeção tributária).
  7. Afigura-se, assim, suficientemente cumprida a exigência de indicação da “denominação usual” dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável, uma vez que está indicado o tipo de serviço, com liquidação de imposto à taxa máxima.
  8. Mesmo que se considerasse insuficiente a descrição dos serviços prestados, tem sido defendido pela jurisprudência que a AT não pode recusar o direito a dedução do IVA pelo simples facto das faturas não preencherem os requisitos exigidos pelo artigo 226.°, n.ºs 6 e 7, da Diretiva 2006/112, se dispuser de todos os dados para verificar se os requisitos substantivos relativos a este direito se encontram satisfeitos (v., neste sentido, acórdãos de 21 de outubro de 2010, Nidera Handelscompagnie, C 385/09, EU:C:2010:627, n.° 42; de 1 de março de 2012, Kopalnia Odkrywkowa Polski Trawertyn P. Granatowicz, M. Wąsiewicz, C 280/10, EU:C:2012:107, n.º 43; e de 9 de julho de 2015, Salomie e Oltean, C 183/14, EU:C:2015:454, n.os 58, 59 e jurisprudência aí referida).
  9. No caso em análise resultou provado que a Requerente forneceu várias explicações à AT, que não colocou em causa nem a validade/existência do prestador de serviços, nem o pagamento pela Requerente dos serviços tutelados nas faturas, cujos catálogos em formato PDF foram exibidos à AT. A Requerente enquadrou também de forma convincente a decisão de gestão de aquisição/investimento nesses catálogos e os projetos internacionais e propósitos de crescimento económico que daí resultaram, conforme se referiu no ponto anterior da presente decisão.
  10. Em consequência, considera-se que as deficiências formais detetadas pela AT não são, em concreto, idóneas a, de per si, afastarem o direito da Requerente à dedução do IVA nelas mencionado (vide CAAD, Proc. 43/2020-T, de 9.02.2021).
  11. Relativamente aos restantes indícios de que as faturas correspondem a uma operação fictícia, suportada pelo facto de não terem sido apresentados elementos consistentes e comprovativos da efetiva execução do material publicitário, quer quanto aos produtos, quer quanto às quantidades, quer quanto aos montantes debitados, ficou demonstrado nestes autos que as faturas foram emitidas a e por sujeito passivo válido, foram pagas pela Requerente, tendo os produtos subjacentes – catálogos - sido exibidos por amostragem de 2 catálogos em PDF. Mais resulta provado o aumento dos volumes de venda da Requerente, por força da expansão comercial internacional, nos anos seguintes ao investimento.
  12. Também por outro prisma, não se acompanha o raciocínio da AT de que as faturas são falsas porquanto não é efetuada uma “correspondência custo/catálogo” ou porque o fornecedor não prestou qualquer “informação associada à efetiva produção do mesmo, nomeadamente, custos de produção, se o serviço foi subcontratado ou se foi efetuado através de recursos internos da empresa” (fls. 19 do Relatório Final de Inspeção). Se a AT pretendia com tais factos demonstrar que o fornecedor não disponha de meios técnicos / materiais para efetuar tal serviço, então, não se compreende, por exemplo, também a razão pela qual a AT analisa o ficheiro SAF-T desse mesmo fornecedor para tentar demonstrar que os “montantes debitados nas 2 faturas emitidas para a A... são totalmente incongruentes (em valor/quantidade serviços/produtos)(fls. 20 do Relatório Final de Inspeção), dado que tal argumento pressupõe, naturalmente, a existência de meios técnicos e humanos para a prestação de serviços..
  13. Quanto a esta análise importa, também, frisar que não podemos acompanhar a comparação entre os serviços em causa (“trabalho de fotografia, design, conceção de catálogos e newsletter internacionais”) e outros serviços prestados pelo mesmo fornecedor, isto porque a AT está a comparar serviços manifestamente distintos (livros, impressão de lona, etc.).
  14. Por fim, relativamente às newsletters internacionais o RIT é, igualmente, ambíguo dado que, por um lado, a AT alega que “não foi dada qualquer informação, por nenhuma das entidades” mas, por outro lado, apenas solicitou ao contribuinte “a disponibilização para consulta de um exemplar dos catálogos e a identificação do destino dado aos mesmos” (fls. 20 do Relatório Final de Inspeção).
  15. Ou seja, também, aqui as correções efetuadas pela AT assentam, isso sim, em juízos subjetivos.

 

Vejamos, agora, quais as consequências destas conclusões para efeitos de IVA e de IRC.

Para efeitos de IVA:

  1. Conforme já explicitado no ponto IV.5. da presente Decisão, sobre o direito à dedução do IVA nos negócios simulados, tem sido entendido pela Jurisprudência que compete à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade.
  2. No caso sub judice, também em relação às faturas agora em apreciação, considera-se que a AT não demonstra existirem factos que evidenciem a falsidade da operação de venda, tais como a invalidade formal da fatura, o não pagamento da mesma pela Requerente, ou a inexistência ou inatividade comercial do fornecedor. O pagamento de um preço alegadamente elevado por catálogos, no âmbito da sua estratégia de gestão privada (explicada pela Requerente à AT), inserida no âmbito da sua estratégia internacional e de expansão comercial, não constitui facto relevante de indício ou indício de falsidade da operação de venda.
  3. Assim, na falta de evidência da existência de um esquema de fraude, ou da inexistência do emitente das faturas, ou da falta de pagamento do preço, não existem indícios capazes de desaplicar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita da Requerente e dos respetivos documentos de suporte, tanto mais que os resultados contabilísticos da Requerente revelam um aumento do lucro tributável consequente.
  4. Não sendo os factos reunidos pela AT suscetíveis de colocar em causa a presunção de veracidade, é procedente o pedido de anulação das correções ao direito à dedução do IVA subjacente às faturas em análise, nos montantes de €6.785 e €7.130 (períodos 201805 e 201811, respetivamente) e dos atos de liquidação subjacentes n.os 2021... e 2021... (e respetivas demonstrações de acerto de contas).

 

Para efeitos de IRC:

  1. Analisados os elementos constantes das faturas, assim como a informação complementar prestada pela Requerente constata-se que a mesma contempla todos os requisitos legais previstos, sendo, portanto, um documento fiscalmente válido.
  2. Ademais, apesar da AT alegar o incumprimento dos n.º 3 e 4, do artigo 23.º do Código do IRC, não especifica em que medida se teria verificado o não cumprimento das exigências em causa, tendo em conta que não indica, em concreto, qual a omissão ou insuficiência imputada a cada uma das faturas.
  3. Em consequência, a desconsideração dos gastos em causa, por aplicação do artigo 23.º-A, n.º 1, al. c) do CIRC é ilegal por vício de insuficiência de fundamentação, equivalente a falta de fundamentação, nos termos do artigo 77.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária e do artigo 153.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo.
  4. Relativamente à não dedutibilidade dos gastos das faturas por existirem fortes indícios de não titularem operações reais, reitera-se os considerandos já tecidos acima de que as dúvidas colocadas pela AT não são suficientes para colocar em causa o direito à dedução da Requerente, sendo de aceitar a liberdade de gestão comercial da Requerente subjacente à decisão de compra dos catálogos específicos dos mercados em que se projeta, em número e investimento elevado.
  5. Conclui-se que, em face das regras do ónus da prova, é procedente o pedido de anulação das correções resultantes da não aceitação do gasto no valor de €60.500. Razão pela qual, em conformidade, deverá ser, nesta parte, anulado o ato tributário de liquidação de IRC n.º 2021... .

 

IV.8. Das Faturas da F...

Impugna, também, a Requerente a não aceitação da dedutibilidade da fatura n.º 2018 A1/40, de 30/04/2018, para efeitos de IVA, com base no disposto no artigo 19.º, n.º 3 do Código do IVA que determina a proibição de ser deduzido imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura e, para efeitos de IRC, por ter a AT entendido tratar-se de gasto suportado por documento relativamente ao qual existem fortes indícios de não titular uma operação real e não contemplar os requisitos previstos nos n.ºs 3 e 4 do artigo 23.º do Código do IRC.

  1. Entendeu a este propósito a AT que a Requerente não apresentou provas consistentes e credíveis da efetiva realização das operações descritas na fatura n.º 2018 A1/40, de 30/04/2018, em especial, por não ser especificado em concreto o serviço/produto constante da fatura, não tendo efetuado uma identificação clara e concreta do mesmo e dos custos de produção associados (dimensão, stand exterior/interior, consumos de mão-de-obra, consumos de matérias-primas), considerando, também, por comparação geral, o preço sobrevalorizado.
  2. Note-se, porém, que da análise da referida fatura resultaram também correções ao IRC de 2018, isto porque, pelas razões supra referidas a AT desconsiderou a dedução para efeitos de gasto fiscal, no montante de €20.500.
  3. No entanto, esta correção para efeitos de IRC foi anulada pela AT ao abrigo do disposto no artigo 13.º do RJAT.
  4. Conforme consta de requerimento apresentado pela AT - junto aos autos - “verifica-se que, na verdade, a fundamentação apresentada pelos SIT para efetuar a presente correção, mostra-se algo subjetiva, emitindo juízos de valor sobre o preço de determinado equipamento, para o qual não estão habilitados nem são entidade competente. Neste sentido, para afastar o valor constante da fatura em apreço, emitida pelo fornecedor “B..., SA”, o técnico que procedeu à referida inspeção tributária, poderia ter inquirido sobre a existência de pedidos de orçamento relativamente à aquisição do referido equipamento, ou ter recolhido outros dados (por exemplo junto de outros fornecedores que disponibilizassem o mesmo tipo de equipamentos), por forma a pôr em questão o preço atribuído ao referido stand.

Não o fazendo na presente situação, julgamos que a presente correção deve ser anulada”.

  1. Ora, sucede porém, que a AT apenas revogou as correções para efeitos de IRC mas não para efeitos de IVA.
  2. Naturalmente, este Tribunal é obrigado a julgar procedente, também, a anulação das correções efetuadas ao direito à dedução do IVA, dado que é a própria AT que admite que os fundamentos utilizados - que são os mesmos tanto para efeitos de IRC como de IVA - são “algo subjetivos” e assentam em “juízos de valor (...) para o qual não estão habilitados nem são entidade competente”.
  3. Assim, em relação à identificação clara e concreta do serviço/produto adquirido remete-se para as considerações já tecidas quanto às restantes faturas, aqui plenamente aplicáveis e, naturalmente, concorda-se, também, com o exposto pela própria AT quanto ao facto desta correção assentar em fundamentos “subjetivos”.
  4. Entende-se, por isso, que não foram evidenciados indícios da existência de uma operação falsa, subjacente à fatura em análise. Razão pela qual, é procedente o pedido de anulação do direito à dedução do IVA subjacente à fatura em análise, no valor de €4.715 (período 201804), devendo ser anulado o ato de liquidação n.º 2021... e os correspondentes demonstrações de acertos de contas.

 

V. Juros compensatórios

  1. Os atos de liquidação de juros compensatórios objeto da decisão da reclamação graciosa impugnada têm como pressuposto as respetivas liquidações de IRC e IVA (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enfermam dos mesmos vícios que afetam estas, justificando-se também a sua anulação, nas partes em que estas liquidações devem ser anuladas.

 

VI. Dos Juros Indemnizatórios

  1. A Requerente pagou as quantias constantes das liquidações emitidas no âmbito da ação inspetiva relativas aos anos de 2017 e 2018.
  2. Após a apresentação do PPA a Requerida veio comunicar que procedia à revogação parcial do ato objeto do pedido de pronúncia arbitral relativa ao ano de 2018 no montante de € 20 500,00.
  3. O n.º 5 do artigo 24.º do RJAT determina que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que permite concluir pelo reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.
  4. O direito a juros indemnizatórios está regulado no artigo 43.º da LGT, que determina no que se aplica aos presentes autos:

“Artigo 43.º

 Pagamento indevido da prestação tributária

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas”.

  1. Ficou provado nos presentes autos que o erro na liquidação é imputável aos serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira, pois foi esta que a emitiu por sua iniciativa e indicou os pressupostos da liquidação no relatório de inspeção que a fundamenta.
  2. Como consequência desse erro, a Requerente viu-se privada de meios financeiros que lhe eram devidos. Determina o artigo 100.º da Lei Geral Tributária, aplicável por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”.
  3. Nos presentes autos conclui-se que, tendo os atos tributários julgados procedentes sido emitidos pela Requerida, o erro é imputável aos serviços, pois, foi esta que as elaborou por sua iniciativa.
  4. Os juros indemnizatórios devem ser contados, a partir da data em que foi efetuado o respetivo pagamento, até ao integral reembolso do montante pago em excesso, à taxa legal, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

 

VII. Decisão

Nestes termos acordam neste Tribunal Arbitral, em face da impugnação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Requerente e dos atos de liquidação identificados no PPA, em:

  1. Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral e declarar a anulação parcial da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa;
  2. Julgar parcialmente procedente o pedido de anulação das liquidações de IRC n.os 2021 ... e 2021 ..., na parte em que desconsiderou a dedução dos gastos fiscais titulados pelas faturas n.os 2533, 3534, 2009 e 3176 (emitidas pela D...) e 2018A1/370 e 2018A/927 (emitidas pela E...) e determinar, em consequência, a restituição do valor dos impostos e respetivos juros compensatórios indevidamente pagos;
  3. Julgar improcedente o pedido de anulação das liquidações de IRC n.o 2021..., na parte em que desconsiderou a dedução dos gastos fiscais titulados pela fatura n.º  2526 (emitida pela G... Lda.);
  4. Julgar totalmente procedente o pedido de anulação das liquidações de IVA n.os 2021..., 2021..., 2021... e 2021... e determinar, em consequência, a restituição do valor dos impostos e respetivos  juros compensatórios indevidamente pagos;
  5. Julgar totalmente improcedente o pedido de anulação da liquidação de IVA n.o 2021...;
  6. Condenar a Requerida a pagar à Requerente juros indemnizatórios calculados com base nas quantias a restituir à taxa legal.

 

VIII. Valor do processo

Em conformidade com o artigo 10.º, n.º 2, alínea e) do RJAT, a Requerente indicou no seu pedido de constituição de tribunal arbitral o valor da utilidade económica do pedido (€122.029,98). De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º -A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor €122.029,98 (Cento e vinte e dois mil Euros e vinte e nove cêntimos) correspondente ao valor do pedido.

 

IX. Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €3.060 de harmonia com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira (84,24%) e o da Requerente (15,76%) na proporção do respetivo decaimento, sem prejuízo de, conforme refere o STA, “um ulterior acertamento por parte da AT, de modo a conformar a parte remanescente do acto com os termos da decisão judicial anulatório, como o impõe no caso a diminuição ao valor da matéria colectável apurada em sede de acção inspectiva” (Proc. n.º 0436/18.0BALSB de 30/01/2019).

Notifique-se

 

 

Lisboa, 8 de fevereiro de 2023

 

 

____________________________________

(Regina de Almeida Monteiro - Árbitro Presidente)

 

 

 

 

 

 

 

 

______________________________________

(Gonçalo Estanque - Árbitro Adjunto e relator)

 

___________________

(Magda Feliciano - Árbitro Adjunta e com declaração de voto)

 

 

 

Declaração de voto

Vencida conforme declaração que segue:

 

Na linha com o defendido na presente decisão, considera-se que que, em geral, a AT não logrou provar os pressupostos da sua actuação, com base na Lei.

 

Não obstante, entende-se que, em face ao direito constituído devidamente interpretado aplicável ao caso concreto as facturas FT2017A1-2533 e a FT2017A1-2534 emitidas pela D... de 2017 foram incluídas no Projecto ... do Portugal 2020, que permitiram documentar investimentos efectuados no âmbito de candidatura da Requerente ao subsídio PORTUGAL 2020, sendo o mesmo não reembolsável. Em consequência, entende-se que o pedido de anulação da liquidação de Impostos correspondente àquelas facturas é improcedente.

 

Também discordo da decisão de c) Julgar improcedente o pedido de anulação das liquidações de IRC n.o 2021..., na parte em que desconsiderou a dedução dos gastos fiscais titulados pela fatura n.º  2526 (emitida pela G... Lda.), uma vez que tal factura não foi impugnada pela Requerente, conforme resulta do PAT (pág. 79).

 

É o que se me oferece dizer.

 

Magda Feliciano



[1] Se dúvidas restassem a soma dos valores das referidas demonstrações de acerto de contas é, precisamente (ou melhor, naturalmente), o mesmo, i.e. €23.984,17.