Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 341/2016-T
Data da decisão: 2016-12-06  IRC  
Valor do pedido: € 550.240,08
Tema: IRC - Encargos financeiros afectos à aquisição de participações sociais
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            Os árbitros Cons. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr.ª Maria Cristina Aragão Seia e Dr. João Cruz (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 20-09-2016, acordam no seguinte:

           

           

1. Relatório

 

            A…- SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, S.A., Pessoa Colectiva n.º …, com sede na … …, Lugar …, …-… …, Distrito de Ovar, veio, nos termos conjugados dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante "RJAT") e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, apresentar um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, tendo em vista a declaração de ilegalidade e anulação da liquidação de IRC n.º 2016…, referente ao exercício de 2012.

            O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA em 12-07-2016.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 05-09-2016, as Partes foram notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 20-09-2016.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou Resposta, em que suscitou a excepção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral e defendeu que este deve ser julgado improcedente.

Por despacho de 25-10-2016, foi dispensada a realização de reunião e acordado que o processo prosseguisse com alegações.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

O processo não enferma de nulidades.

Importa apreciar prioritariamente a excepção suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

·         A Requerente A…- SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, S.A., é a sociedade dominante de um grupo de sociedades tributadas de acordo com o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (adiante designado por RETGS);

·         Até 31-12-2012, o perímetro fiscal do grupo apresentava a seguinte composição.

1. B…, S.A.;

2. C…, SA;

3. D… Lda.;

4. E…, SA;

5. F…, Lda.;

6. G…, SA;

7. H…, SA;

8. I…;

9. J…, SA;

10. K…, SA

·         Relativamente ao exercício de 2012 e tendo em conta os valores declarados em sede de IRC na declaração do grupo, este registou um lucro tributável, nos termos do artigo 70.º do CIRC, de € 2.769.391,62;

·          À Requerente, a título individual, foi efectuada uma acção de inspecção externa a coberto das ordens de serviço OI 2011…/OI 2015…, em que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção à matéria colectável de IRC relativa a encargos financeiros afectos à aquisição de participações sociais que entendeu que deveriam ter sido acrescidos, no montante de €541.067,15, de acordo com o artigo 32.º do EBF e Circular 7/2004, de 30 de Março;

·         No Relatório da Inspecção Tributária relativo a esta inspecção à Requerente enquanto sociedade individual, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais o seguinte:

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III. 1. EM SEDE DE IRC - ANOS DE 2012 E 2013

Tendo em conta os valores declarados pelo sujeito passivo em termos individuais em sede de IRC, nos anos de 2011 a 2013, os resultados líquidos do exercício e os resultados fiscais resumem-se no quadro seguinte:

Conforme se verifica na demonstração dos resultados do sujeito passivo relativa a esses anos, os gastos com juros suportados são sempre muito superiores aos ganhos com juros obtidos.

No ano de 2011, o sujeito passivo acresceu encargos financeiros afetos a aquisições de participações sociais nos termos do n.º 2 do artigo 32º do EBF no valor de € 557.423,79, calculando esse valor tendo em conta a Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC, conforme cálculos apresentados (Anexo 3).

Através de notificação pessoal efetuada ao sujeito passivo em 29-01-2015, na pessoa de L…, na qualidade de TOC, solicitámos que nos justificassem o facto de não terem sido efetuados acréscimos no apuramento do resultado fiscal de IRC nos anos de 2012 e 2013 de encargos financeiros não dedutíveis afetos à aquisição de participações sociais nos termos do n.º 2 do artigo 32º do EBF (Anexo 4). Em resposta, o sujeito passivo refere que até ao ano de 2011, no apuramento do resultado fiscal de IRC, acresceu encargos financeiros" não dedutíveis relativos a partes de capital, de acordo com o estipulado na Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC. A partir do ano de 2012, tendo em conta desenvolvimentos entretanto havidos a nível jurisprudencial no que respeita à ilegalidade da aludida Circular, optou por não aplicar as instruções previstas na mesma, não acrescendo qualquer valor.

Apesar do referido pelo sujeito passivo, é um facto que, tal como nos anos anteriores, em 2012 e 2013, o valor das suas participações sociais em empresas do grupo continuam a ter um peso muito significativo no total dos seus ativos. Assim, também, tal como corretamente efetuou no ano de 2011, em 2012 e 2013 o sujeito passivo deveria acrescer encargos financeiros afetos a partes de capital nos termos do n.º 2 do artigo 32º do EBF. Nesses anos, o sujeito passivo não acresceu qualquer valor, relativo a esses, encargos financeiros, independente do uso ou não da referida Circular, indo contra o estipulado no artigo referido do EBF.

De realçar que no ano de 2012, na 1ª declaração de IRC entregue, no apuramento do resultado fiscal, o sujeito passivo acresceu encargos financeiros afetos a aquisições de participações sociais de € 592.017,60, tendo também calculado esse valor conforme o estipulado na referida Circular 7/2004. Posteriormente, o sujeito passivo procedeu à entrega de uma declaração de substituição de IRC relativa a esse ano, não acrescendo qualquer valor relativo aos encargos financeiros afetos a participações sociais no apuramento do resultado fiscal de IRC, apesar da sua situação patrimonial se ter mantido inalterada, continuando a deter participações sociais, às quais deveriam ser imputados esses encargos nos termos do n.º 2 do artigo 32º do EBF.

De acordo com o n.º 2 do artigo 32º do EBF, "...as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS (...) de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades..."

Para o apuramento dos encargos financeiros suportados afetos à aquisição de participações sociais nos anos de 2012 e 2013, tal como o sujeito passivo efetuou no ano de 2011 e na 1ª declaração de IRC entregue de 2012, recorremos à Circular 7/2004 de 30 de Março da Direção de Serviços de IRC. Esta Circular estipula que os encargos financeiros deverão ser desconsiderados como custos, para efeitos fiscais, no exercício a que os mesmos dizem respeito, isto é, dever-se-á proceder à correção fiscal dos que tiverem sido suportados com a aquisição de participações que sejam suscetíveis de virem a beneficiar do regime especial estabelecido no n.º 2 do artigo 32º do EBF, independentemente de se encontrarem já reunidas todas as condições para a aplicação do regime especial de tributação das mais-valias. Caso se conclua, no momento da alienação das participações, que não se verificam todos os requisitos para aplicação daquele regime, proceder-se-á, nesse exercício, à consideração como custo fiscal dos encargos financeiros que não foram considerados como custo nos exercícios anteriores.

Quanto ao método a utilizar para efeitos de afetação dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização de um método de afetação direta ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efetuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afetando-se o remanescente aos restantes ativos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição.

De acordo com os registos contabilísticos do sujeito passivo, nomeadamente os balancetes contabilísticos dos anos de 2012 e 2013 (Anexo 5) e as informações obtidas no decurso da presente ação de inspeção tributária, aplicando a fórmula da Circular 7/2004 de 30 de Março, que já havia sido aplicada, resultam encargos financeiros afetos à aquisição de participações sociais, que deveriam ter sido acrescidos no apuramento do resultado fiscal de IRC de € 541.067,15 no ano de 2012 e € 1.144.891,38,no ano de 2013, calculados de acordo com o quadro seguinte:

Tendo em conta as correções apuradas, resulta o apuramento de prejuízos fiscais corrigidos em sede de IRC de € 440.709,04 no ano de 2012 e € 8.663,78 no ano de 2013, calculado de acordo com o quadro seguinte:

 

·         Paralelamente, a coberto das OI 2015…/2015…-…, foi efectuada acção inspectiva à sociedade dominada G…, em que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção no valor de €9.172,90, relativa a gastos de depreciações e amortizações afectos a imóveis não arrendados que considerou não dedutíveis em sede de IRC, por força do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, em conjugação com o n.º 3 do artigo 29.º ambos do CIRC;

·         No Relatório da Inspecção Tributária relativo a esta inspecção à G…, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais o seguinte:

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1 EM SEDE DE IRC-ANOS DE 2011, 2012 E 2013

(...)

b) Gastos com amortizações e depreciações não aceites no apuramento do resultado fiscal de IRC dos anos de 2011, 2012 e 2013

O sujeito passivo é proprietário de diversos imóveis registados como propriedades de investimento, mencionados nos seus mapas de amortizações e depreciações dos anos de 2011 a 2013 (ver Anexo 2). De acordo com a informação obtida do sujeito passivo, alguns desses imóveis estão arrendados, sendo que o valor registado como vendas e prestações de serviços nos anos de 2011 a 2013 refere-se às rendas obtidas desses imóveis identificados pelo sujeito passivo (ver Anexo 3). Os restantes imóveis registados como propriedades de investimento estão disponíveis para arrendamento ou venda (ver Anexo 3), não estando a ser utilizados e não gerando rendimentos para o sujeito passivo.

Os gastos com amortizações e depreciações registados nos anos de 2011 a 2013 referem-se à totalidade dos imóveis (deduzido do valor dos terrenos) registados como propriedades de investimento, independentemente de estarem a ser utilizados ou não.

Nos termos do n.º 1 do artigo 23º do Código do IRC (legislação à data), "...Consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora...”  (sublinhado nosso).

Também, nos termos do n.º 3 do artigo 29º do Código do IRC (legislação à data), "...Salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Direção-Geral dos Impostos, os elementos do ativo só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento ou utilização...  " (sublinhado nosso).

Do exposto, as perdas com amortizações dos imóveis registados como propriedades de investimento que não estão a ser utilizados e que não geraram rendimentos sujeitos a IRC não são dedutíveis no apuramento do resultado fiscal de IRC dos anos de 2011 a 2013.

Depois de solicitado, o sujeito passivo indicou as perdas consideradas com amortizações relativas aos imóveis que se encontram em utilização e de que foram obtidas rendas, nos anos de 2011, 2012 e 2013 (Anexo 7).

Do exposto, resultam assim correções aos resultados fiscais de IRC desses anos, relativamente às perdas com amortizações do exercício de imóveis que não se encontravam em utilização e não geraram rendimentos para o sujeito passivo, apuradas de acordo com o quadro seguinte:

Tendo em conta as correções apuradas descritas nos pontos anteriores, resulta o apuramento de prejuízos fiscais corrigidos em sede de IRC de € 308.023,42 no ano de 2011, € 83.099,09 no ano de 2012 e € 95.832,39 no ano de 2013, calculado de acordo com o quadro seguinte:

 

·         Posteriormente, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma acção inspectiva a Requerente relativa ao grupo de sociedades, a coberto da ordem de serviço OI2015…/…;

·         Do Relatório da Inspecção Tributária relativo a esta inspecção ao grupo de sociedades resultaram correcções correspondentes à correcção no montante de € 541.067,15 relativa à Requerente como sociedade individual e à correcção ao resultado fiscal individual em IRC da sociedade “G… S.A.” no valor de € 9.172,90;

·         No Relatório da Inspecção Tributária desta inspecção ao grupo de sociedades, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais o seguinte:

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1. EM SEDE DE IRC

III.1.1. Correção aos resultados fiscais do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante

(...)

III.1.1.2. Ano de 2012

Tendo em conta os valores declarados em sede de IRC na declaração do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante, este registou um lucro tributável de €2.769.391,62 no ano de 2012, nos termos do artigo 70º do Código do IRC.

Relativamente a esse ano, conforme já foi referido, o sujeito passivo e uma empresa do seu grupo, tiveram ações de inspeção tributária externas com correções técnicas ao resultado fiscal em sede de IRC, conforme se descreve no quadro seguinte:

No âmbito destas ações de inspeção tributária, as empresas foram notificadas para exercer o direito de audição relativamente a estas correções, não tendo exercido esse direito.

Face a estas correções, e tendo em conta o artigo 70º do Código do IRC, resulta o apuramento de um resultado fiscal corrigido em sede de IRC do grupo de sociedades em que o sujeito passivo é a sociedade dominante de € 3.319.631,67, conforme o quadro seguinte:

·         Na sequência dessa inspecção ao grupo de sociedades, foi emitida a liquidação de IRC n.º 2015…, datada de 28-10-2015, que conta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que foi determinado o valor a reembolsar de € 87.140,99, tendo em conta as correcções referidas;

·         Em 02-03-2016m, a Requerente enviou à Autoridade Tributária e Aduaneira reclamação graciosa desta liquidação n.º 2015…, que impugnou considerando ilegais as duas correcções referidas;

·         Por carta registada expedida em 25-05-2016, foi notificado à Requerente um parecer, elaborado em 11-05-2016, relativo ao Projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

2.3.2 PARECER

Antes da análise da matéria factual somos a referir que, a reclamante aquando da entrega da 1a declaração de rendimentos do ano de 2012 acresceu no Q07, campo 779 - Encargos financeiros não dedutíveis (ex art. 32º, nº 2 do EBF) - o montante de € 592 017,60, a fls.41 dos autos, tendo calculado esse valor conforme o estipulado na Circular 7/2004. Posteriormente, o sujeito passivo procedeu à entrega de uma declaração de substituição para o mesmo ano, não acrescendo qualquer valor relativo aos encargos financeiros afectos a participações sociais no apuramento do resultado fiscal de IRC, tendo, durante o procedimento inspectivo, justificado o facto com os desenvolvimentos havidos a nível jurisprudencial no que respeita à ilegalidade da aludida Circular.

Questão decidenda: A matéria factual cinge-se ao regime fiscal aplicável às sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), previsto no artº 31º do EBF, à data da ocorrência dos factos, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 32-B/2002, de 30 de Dezembro eº orientações genéricas contidas na Circular 7/2004, de 30 de Março, da DSIRC.

Preconiza o nº 2 do artº 31º do EBF que: "As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades" (n/ sublinhado).

A Circular 7/2004 vem sancionar o entendimento quanto ao regime previsto no artº 31º do EBF, a aplicação temporal deste regime, o exercício em que deverão ser feitas as correcções fiscais dos encargos financeiros e o método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais.

Artigo 31º do EBF e vinculação das Circulares

O artº 55º do CPPT no seu nº 1 dispõe:" É da exclusiva competência do dirigente máximo do serviço ou do funcionário em quem tiver delegado essa competência a emissão de orientações genéricas visando a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços". E o seu nº 2: "Somente as orientações genéricas emitidas pelas entidades referidas no número anterior vinculam a administração tributária" (n/ sublinhado).

Nesse mesmo seguimento o actual artº 68º-A, nº 1 da LGT, com a redacção dada pela Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro, anterior artº 68º, refere: "A administração tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza, independentemente da sua forma de comunicação, visando a uniformização da interpretação e da aplicação das normas tributárias".

Orientações genéricas são assim regulamentos internos típicos da Administração Tributária (AT), ou seja, instruções gerais, vinculativas, dirigidas aos órgãos da administração tributária, funcionários e agentes subalternos, acerca do sentido em que devem mediante interpretação ou integração entenderem-se as normas e princípios jurídicos que, no âmbito do exercício das suas funções, lhes caibam aplicar.

São as orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza emitidas sobre a interpretação das normas tributárias que estiverem em vigor no momento do facto tributário que vinculam a AT.

Quanto à ilegalidade e inconstitucionalidade do método preconizado na Circular invocada pela reclamante, em sede de reclamação graciosa quem analisa a petição está sujeita ao regime disciplinar dos funcionários da Administração Pública, nomeadamente ao dever de obediência, pelo que, não lhe compete avaliar a legalidade ou não de um entendimento emanado por um órgão hierárquico superior e que constitui "lei" enquanto prevalecer.

Por outro lado, estando a AT sujeita ao princípio da legalidade (cfr. art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e art. 55.º da LGT), não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o Tribunal Constitucional (TC) já tenha declarado a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (cfr. art. 281." da CRP) ou se esteja perante violação de normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. art. 18.º, n.º 1, da CRP).

Momento em que os juros perdem a sua dedutibilidade

Não é condição necessária para serem desconsiderados os encargos suportados com a aquisição de partes de capital que as mesmas tenham sido alienadas naquele exercício, dando origem ao apuramento das mais ou menos valias fiscais ou que estejam satisfeitas todas os pressupostos exigidos no nº 2 do artº 31º do EBF. Basta que haja a susceptibilidade de virem a beneficiar desse regime especial.

E isto porque, no momento da alienação das participações se não se verificarem todos os requisitos para aplicação daquele regime, proceder-se-á, nesse exercício, à consideração como custo fiscal dos encargos financeiros que não foram considerados como custo em exercícios anteriores (parte final do ponto 6 da Circular 7/2004).

O que efectivamente tem de ser desconsiderado como custo, e consequentemente ser acrescido ao lucro tributável, são os encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital no exercício a que disserem respeito. Independentemente do momento da alienação dessas partes de capital.

Da imposição do método de determinação dos encargos

Quanto à questão de se poder utilizar um método de afectação directa ou específica, a Direcção de Serviços de IRC, concluiu no sentido de que a fungibilidade da moeda leva a que seja extremamente difícil determinar com exactidão qual a aplicação específica dos capitais próprios obtidos através de um determinado empréstimo. Assim, deverá ser sempre utilizado o método indirecto preconizado no ponto 7 da referida Circular, de modo a evitar manipulação de resultados caso assim não se procedesse.

No entanto, tal "método indirecto" ficcionado não se consubstancia nos pressupostos da aplicação do artº 87º da LGT e consequentemente no procedimento de revisão da matéria tributável nos termos do artº 91º do mesmo diploma legal.

Alega ainda no ponto 90 da petição o facto de não ter sido notificada nos termos do artº 60º, nº 1, al. d) da LGT.

Dispõe a referida al. d), do nº 1, do artº 60º da LGT que: "Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção" (n/sublinhado).

No caso subjudice a al. d) não têm aplicabilidade mas sim a al. e) do mesmo número dado existir relatório de inspecção ("e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária").

Tendo a sociedade A…, enquanto empresa individual, sido notificada através do ofício nº …, de 29-06-2015, para exercer o seu direito de audição sobre o projecto de relatório o mesmo não foi exercido.

Assim, não se verifica qualquer preterição de formalidade essencial e consequentemente a anulabilidade da correcção efectuada.

 

> Da correcção de € 9 172,93, na esfera da "G…", relativa a "Gastos com amortizações e depreciações não aceites no apuramento do resultado fiscal de IRC dos anos de 2012"

Preconizava o artº 23º nº 1 do CIRC, à data dos factos, que: "consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (...)".

Na concepção inicial do Código do IRC seguiu-se um paradigma de tributação assente numa relação de dependência parcial entre o lucro tributável e o resultado contabilístico. Foram assim consagrados determinados requisitos para efeitos da relevância fiscal de um amplo conjunto de rendimentos e de gastos. No tocante aos gastos, o princípio geral da respectiva aceitação constante do referido art. 23º, era de considerar como dedutíveis os que comprovadamente fossem indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Com a Lei nº 2/2014, de 16 de Janeiro, a redacção do artº 23º do CIRC passou a ser: " Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC".

A presente Lei (nº 2/2014) que procedeu à reforma da tributação das sociedades entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. Assim, e de acordo com o artº 12º da LGT "As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer impostos retroactivos".

Estando em causa o exercício de 2012 aplica-se a redação do artº 23º do CIRC que se encontrava em vigor à data dos factos. Ou seja, prevalece o princípio geral de que apenas se consideram dedutíveis os gastos que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto.

Nesta linha de orientação e quanto ao conceito de indispensabilidade do custo, realçamos a título de exemplo, Tomás de Castro Tavares ' o qual alega: "A noção geral de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento, directo ou indirecto, da motivação última de contribuição para a obtenção do lucro. Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em toldos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo (...). O gasto imprescindível equivale a todo o custo realizado em ordem à obtenção dos ingressos e que representem um decaimento económico para a empresa. Em regra, portanto, a dedutibilidade depende, apenas de uma relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa" (n/ sublinhado).

A correcção efectuada cinge-se ao facto de terem sido consideradas como perdas as amortizações dos imóveis registados como propriedades de investimento que não estão a ser utilizados e que não geraram rendimentos sujeitos a IRC.

O artº 29º, nº 1 do CIRC, à data dos factos, referia que: "1- São aceites como gastos as depreciações e amortizações de (...) propriedades de investimento contabilizadas ao custo histórico que, com carácter sistemático, sofram perdas de valor resultantes da sua utilização (...)"(n/ sublinhado).

E no nº 3: "(...) os elementos do activo só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento ou utilização" (n/ sublinhado).

Tendo a reclamante como actividade efectiva a "Compra e venda de imóveis e gestão dos que é proprietária, nomeadamente, através do seu arrendamento", constituindo as rendas obtidas proveitos correntes da sociedade, apenas serão de aceitar como custos dedutíveis as perdas com amortizações dos imóveis registados como propriedades de investimento que tenham sido utilizados e tenham gerado rendimentos sujeitos a IRC.

3. Conclusão

Perante os factos expostos, somos de PARECER que a presente petição deve ser indeferida.

·         Em 28-03-2016, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRC n.º 2016…, que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, relativa ao exercício de 2012, em que é mantido o valor a reembolsar de € 87.140,96:

·         Em 08-06-2016, a Requerente exerceu o direito de audição sobre o projecto de indeferimento da reclamação graciosa, nos termos que constam do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, referindo, além do mais, o seguinte:

1. Como referido na petição inicial de reclamação graciosa, a aqui Reclamante foi objecto de uma acção inspectiva que decorreu sob a ordem de serviço n." OI2015…/…, e que gerou o relatório inspectivo notificado por meio do Ofício n.º…, de 20.10.2015.

2. Como igualmente resulta de tal procedimento, a inspecção tributária gerou a liquidação de IRC do exercício de 2012 com o n." 2015… .

3. Foi contra esse acto tributário que a Reclamante se insurgiu, por entender, como entende, que a mesma está inquinada de ilegalidade.

4. Sucede que, no entretanto, a Reclamante foi notificada de uma nova liquidação de IRC relativamente aio exercício de 2012 com o n." 2016… .

5. Afigura-se à Reclamante, desde logo, que esta última liquidação de imposto substitui a anterior – na medida em que parece reflectir as mesmas correcções resultantes do procedimento inspectivo que decorreu sob a ordem de serviço n.º OI2015…/… .

6. De todo o modo, e em face do procedimento gracioso em causa, cabe à Administração Tributária dilucidar os efeitos da liquidação que emitiu – eventualmente para a aferir da possível inutilidade superveniente da lide.

7. Na falta de tal dilucidação, a Requerente nem sequer está em condições de exercer cabalmente o seu direito de audição quanto ao projecto de decisão – sendo que essa pronúncia poderá ser até qualificada como um acto inútil.

Nestes termos, e em face da existência dos actos tributários referidos, requer a V.Exa se digne pronunciar-se sobre a manutenção do presente procedimento.

 

·         Na Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de … foi emitida a Informação que consta do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

1. Audição prévia

Do projecto de decisão de fls.65 a 69, foi o Dr. N…, na qualidade de mandatário da ora reclamante, notificado - Oficio nº … de 2016-05-25 - para, querendo, exercer o direito de audição previsto no artigo 60º, nº 1, alínea b), da Lei Geral Tributária. Em 2016-06-08, deu entrada resta Direcção de Finanças, o direito de audição apresentando o documento que agora se junta aos autos de fls.73 a 74.

Alega que:

"(...) a reclamante foi objecto de uma acção inspectiva que decorreu sob a ordem de serviço nº 012015.../…, (...) e que gerou a liquidação de IRC do exercício de 2012 com o nº 2015 … (...) e foi contra esse acto tributário que a reclamante se Insurgiu (...)".

A reclamante foi notificada de uma nova liquidação de IRC relativamente ao exercício de 2012 com o n.º 2016… .

Afigura-se à reclamante, desde logo, que esta última liquidação de imposto substitui a anterior - na medida em que parece reflectir as mesmas correcções resultantes do procedimento inspectivo que decorreu sob a ordem de serviço nº OI2015…/… .

(...) em face do procedimento gracioso em causa, cabe à Administração Tributária dilucidar os efeitos ria liquidação que emitiu, eventualmente para aferir da possível inutilidade superveniente da lide.

Quanto à liquidação com o nº 2016…, emitida em 2016-03-30, a mesma teve por base uma correcção efectuada pela Inspecção Tributária referente ao acréscimo de dedução à colecta de IRC relativa a benefícios fiscais em sede da sociedade dominante do grupo, ao abrigo da OI2016…, no montante de € 205 300,81, cujo Relatório Final foi notificado à reclamante através do Oficio nº…, de 17/03/2016, pelo que abstemo-nos de pronunciar sobre a mesma por não constituir o objecto da presente petição.

Refira-se, no entanto, que em termos de valor final da liquidação não houve alteração relativamente à liquidação nº … em virtude do aumento dos beneficies fiscais ter sido compensado com o decréscimo da dedução dos pagamentos especiais por conta (€ 205 300,80).

2. Proposta de decisão

Em face do exposto somos de parecer que será de decidir de harmonia com a proposta acima referida, já notificada ao sujeito passivo, no sentido do indeferimento do pedido.

Na falta de tal dilucidação, a requerente nem sequer este em condições de exercer cabalmente o seu direito de audição quanto ao projecto de decisão - sendo que essa pronúncia poderá ser até qualificada como um acto inútil".

O procedimento gracioso em causa incidiu sobre o acto de liquidação adicional de IRC nº 2015…, de 2015-11-02, que após os movimentos de compensação gerou um valor nulo, a qual teve por base uma correcção ao resultado fiscal do grupo de sociedades no valor total de € 550 240,05 efectuada pela Inspecção Tributária ao abrigo da ordem de serviço interna nº OI2015…/…, mais concretamente à sociedade A… SOC. GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, SA em nome individual (€. 541 067,16) e à sociedade dominada G…, SA (€ 9 172,90), factos afirmados pela reclamante tanto na petição inicial como no ponto 3 do direito de audição.

Sobre este projecto de decisão não foram pela reclamante deduzidos quaisquer factos que possam alterar a proposta de indeferimento da reclamação graciosa.

·         Por despacho de 22-06-2016, proferido pelo Senhor Chefe da Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de …, em regime de substituição, foi indeferida a reclamação graciosa, com conversão em definitivo do projecto de decisão e com os fundamentos do mesmo constantes;

·         No ano de 2012 a Requerente não alienou quaisquer participações sociais (quadro de fls. 7 do Relatório da Inspecção Tributária);

·         No exercício de 2012, a Requerente recebeu € 2.123.314,00 de dividendos (página 22 das «Demonstrações Financeiras Individuais em 31 de dezembro de 2012» que constam do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 24-06-2016, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos que foram juntos com o pedido de pronúncia arbitral e no processo administrativo.

 

3. Matéria de direito

 

3.1. Excepção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira suscita a excepção que de ineptidão do pedido de pronúncia arbitral, com os seguintes fundamentos, em suma:

 

– a causa de pedir é o facto jurídico de que emerge a pretensão do autor;

– não basta a indicação genérica do direito que se pretende tornar efectivo, sendo necessária a indicação específica dos factos constitutivos desse direito;

– no presente processo arbitral, a causa de pedir consubstancia-se na totalidade dos factos de que derivam das correcções levadas a cabo ao resultado fiscal do grupo no valor total de €550.240,05 efectuada pela Inspecção Tributária ao abrigo da ordem de serviço interna n.º OI 2015…/…, em concreto à sociedade A… SGPS, SA em nome individual e à sociedade dominada G… SA, que deram lugar ao acto de liquidação adicional de IRC n.º 2015… de 2015-11-02;

– a Requerente vem deduzir impugnação da liquidação de IRC n.º 2016…, emitida em 30-03-2016, que teve por base uma correcção efectuada pela Inspecção Tributária referente ao acréscimo de dedução à colecta de IRC relativa a benefícios fiscais em sede da sociedade dominante do grupo, ao abrigo da OI 2016…, no montante de € 205 300,81, cujo Relatório Final foi notificado à reclamante através do Ofício n.º…, de 17-03-2016;

– não existe qualquer identidade entre o que se pede e o que sustenta o pedido;

– não se verifica qualquer erro, ou lapso que possa ser corrigido;

– o artigo 18.º, n.º 1, alínea c), do RJAT apenas permite corrigir erros de escrita, pequenas omissões, ou meras imprecisões ou insuficiências na alegação da matéria de facto;

– a Requerente, à semelhança do que invocou aquando do direito de participação da reclamação graciosa, entende que a liquidação cuja anulação pretende (2016…), veio substituir a liquidação sobre a qual versam os factos (2015…);

– a Requerente afirma reiteradamente que não pretende anular a liquidação 2015…, mas sim a liquidação 2016…;

– liquidação que assenta em factos completamente estranhos aos factos sobre os quais versam os presentes autos;

– o pedido de pronúncia arbitral é desprovido de conteúdo, já que não lhe corresponde qualquer causa de pedir;

 

A Requerente respondeu nas alegações dizendo, em suma, o seguinte:

 

– da acção inspectiva que decorreu sob a ordem de serviço n.º OI2015…/… resultaram uma correcção ao resultado fiscal individual em IRC da Requerente, no valor de € 541.067,15 e uma correcção ao resultado fiscal individual em IRC da sociedade “G… S.A.” no valor de €9.172,90;

– em consequência, a matéria colectável da Requerente, quanto ao exercício de 2012, passou de €2.414.127,48 (declarada) para €3.235.330,66 (corrigida);

– a liquidação de IRC do exercício de 2012, com o n.º 2015…, incorpora as sobreditas correcções;

– mas, a Requerente foi notificada de uma nova liquidação de IRC relativamente ao exercício de 2012 com o n.º 2016 … – onde, para além do mais, são liquidados adicionalmente juros de mora e de onde resulta um diferente reembolso;

– a Administração Tributária (AT) notificou a Requerente de que tal acto tributário é passível de reacção graciosa e/ou contenciosa;

– não existe qualquer contradição entre o pedido e a causa de pedir – e isto porque, como resulta da liquidação em causa, a mesma incorpora as correcções à matéria tributável da Requerente decorrentes da acção inspectiva que decorreu sob a ordem de serviço n.º OI2015…/…, que a Autoridade Tributária e Aduaneira que, de resto, aprecia nos pontos subsequentes da sua contestação;

– perante um acto tributário que, para além de considerar uma matéria tributável corrigida de € 3.235.330,66, resultante das correcções efectuada pela AT sob a ordem de serviço n.º OI2015…/…, considera novas operações e, notifica o Contribuinte para reagir contenciosamente, era expectável que este assim o fizesse, no exercício dos seus mais básicos direitos de defesa, pois não tem outro motivo para reagir contra tal acto tributário senão para anular as avultadas correcções que o mesmo inegavelmente reflecte, de que resulta um reembolso inferior ao anteriormente notificado;

– a consideração/dedução dos referidos benefícios fiscais na liquidação em causa constitui também um acto lesivo, na medida em que a sua dedução é efectuada com base numa matéria colectável corrigida pela própria AT e que a Requerente entende ser, a vários títulos, ilegal;

– ambos os actos tributários em causa não subsistem, nem podem subsistir, paralelamente, no ordenamento jurídico;

– o acto tributário em causa constitui uma liquidação distinta da anterior – que implicitamente anula ou, pelo menos, substitui, quer pela consideração de novas operações, quer pela obtenção de um novo resultado;

– a primitiva liquidação padece assim de um vício em sentido próprio – reconhecido pela própria AT - pelo que os seus efeitos cessam de se produzir mercê de um acto jurídico que os constata e que, em consequência, os destrói retroactivamente;

– de liquidações adicionais/correctivas, apenas será impugnável a última delas que se mantenha erecta, por todas as outras anteriores terem sido anuladas e substituídas por esta.

 

A ineptidão da petição inicial está prevista no artigo 98.º do CPPT como nulidade insanável do processo judicial tributário, sendo definida no artigo 186.º do CPC, normas estas subsidiariamente aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas c) e e), do RJAT.

Como resulta da alínea a) do n.º 2 do referido artigo 186.º, no que concerne à causa de pedir, apenas ocorre ineptidão quando ela falte ou seja ininteligível.

Mas, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo 186.º «se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial».

No caso em apreço, é manifesto que não ocorre a falta total de causa de pedir, pois a Requerente indica as razões pelas quais entende que a liquidação que impugna deve ser declarada ilegal.

Por isso, só podendo existir ineptidão por falta de causa de pedir quando nenhuma seja invocada ou seja inteligível, não pode deixar de se concluir que não ocorre ineptidão.

De qualquer forma, como a Autoridade Tributária e Aduaneira na sua Resposta aprecia as questões de legalidade que a Requerente imputa à liquidação n.º 2016…, que são as relativas às correcções que estiveram subjacentes à liquidação 2015… e são incorporadas naquela, constata-se que percebeu bem quais os fundamentos por que a Requerente entende que a primeira liquidação é ilegal, que esta nas suas alegações confirma serem aqueles que a Autoridade Tributária e Aduaneira percebeu.

Por isso, se existisse ineptidão do pedido de pronúncia arbitral, a respectiva arguição sempre teria de ser julgada improcedente, com base no n.º 3 do artigo 186.º do CPC, pois, «ouvido o autor», se verifica «que o réu interpretou convenientemente a petição inicial».

Improcede, assim, a excepção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral.

Questão diferente é a de saber se a Requerente pode impugnar a nova liquidação com base em vícios que já afectavam a primeira.

As duas liquidações tem os seguintes teores:

 

Comparando as duas liquidações, constata-se que é a mesma a matéria colectável considerada, havendo diferenças a nível de pagamento especial por conta e do total das deduções, mas as «importâncias corrigidas» são precisamente as mesmas.

Assim, é de concluir que a liquidação n.º 2016 … mantém as correcções à matéria colectável da Requerente que foram efectuadas na inspecção subjacente à liquidação n.º 2015 … .

Em situações deste tipo, em que a nova liquidação incorpora no cálculo do imposto as correcções que estiveram subjacentes à primeira liquidação, deverá entender-se que opera a sua revogação por substituição, sendo a última e apenas esta que passa a definir a posição final da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a tributação em IRC a aplicar relativamente ao exercício de 2012, o que tem como corolário, designadamente, que não haja lugar a dois reembolsos da quantia a reembolsar apurada, mas apenas o único, que é determinado na segunda liquidação.

Pelo exposto, improcede a excepção da ineptidão da petição inicial e não há obstáculo à apreciação da legalidade da liquidação n.º 2016…, na parte em que tem subjacente a correcção ao resultado fiscal individual em IRC da Requerente, no valor de € 541.067,15 e a correcção ao resultado fiscal individual em IRC da sociedade G… S.A. no valor de €9.172,90.

 

 

3.2. Questão da legalidade da correcção ao resultado fiscal individual em IRC da Requerente, no valor de € 541.067,15

 

3.2.1. Clarificação da fundamentação relevante e da questão que é objecto do processo

 

A correcção ao resultado fiscal individual em IRC da Requerente teve como pressuposto o entendimento da Autoridade Tributária e Aduaneira de que deveriam ter sido considerados para apuramento do lucro tributável do exercício de 2012 os encargos financeiros afectos à aquisição de participações sociais, no montante de € 541.067,15, de acordo com o artigo 32.º, n.º 2, do EBF e Circular 7/2004, de 30 de Março.

A Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003, alterou o artigo 31.º, n.º 2, dando-lhe a seguinte redacção:

 

2 - As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades.

 

Posteriormente, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a Circular n.º 7/2004, de 30 de Março, em que, além do mais, se refere o seguinte:

 

7. Quanto ao método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros suportados à aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização, nesta matéria, de um método de afectação directa ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efectuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS e SCR deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afectando-se o remanescente aos restantes activos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição.

 

Àquele artigo 31.º, n.º 2, do EBF corresponde, na redacção vigente no ano de 2012, o artigo 32.º, n.º 2, que, na redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, estabelece o seguinte:

 

2 - As mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim, os encargos financeiros suportados com a sua aquisição não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades.

 

Até ao ano de 2011, no apuramento do resultado fiscal de IRC, a Requerente acresceu encargos financeiros relativos a partes de capital, de acordo com o estipulado na Circular 7/2004 de 30 de Março da Direcção de Serviços de IRC. Relativamente ao exercício de 2012, a Requerente, numa primeira declaração, procedeu do mesmo modo, mas, posteriormente, entregou uma declaração de substituição de IRC relativa a esse ano, não acrescendo qualquer valor relativo aos encargos financeiros afectos a participações sociais no apuramento do resultado fiscal de IRC, apesar da sua situação patrimonial se ter mantido inalterada, continuando a deter participações sociais.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu ser de aplicar a fórmula prevista na referida Circular n.º 7/2004, dizendo no Relatório da Inspecção Tributária à Requerente:

 

Quanto ao método a utilizar para efeitos de afetação dos encargos financeiros suportados com a aquisição de participações sociais, dada a extrema dificuldade de utilização de um método de afetação direta ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efetuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte: os passivos remunerados das SGPS deverão ser imputados, em primeiro lugar, aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, afetando-se o remanescente aos restantes ativos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respetivo custo de aquisição.

 

No presente processo, a Requerente defende a título principal, em suma, o seguinte:

 

– no decurso do procedimento inspectivo a AT não teve qualquer preocupação de aferir se, no exercício de 2012, foi efectuada qualquer aquisição ou transmissão de participações sociais (mormente com o consequente apuramento de mais ou menos-valias na alienação dessas participações);

– a AT limitou-se a presumir a existência de encargos financeiros suportados para adquirir partes de capital, mediante a aplicação de uma Circular, não especificando sequer que concretas partes de capital terão sido alegadamente adquiridas com o (suposto) recurso a financiamento;

– a AT corrigiu os encargos financeiros supostamente suportados com a aquisição as participações sociais que a Impugnante tem no seu balanço, mas nem sequer cuidou de verificar se e quando tais participações sociais foram alienadas;

– a AT não pode proceder a correcções ao exercício de 2012 quando ainda não se encontram verificados os pressupostos factuais constantes do preceito legal que invoca – mormente o período de detenção e a alienação;

– a existir alguma correcção, e ainda que a AT demonstrasse que foram suportados encargos com um financiamento contratado para a aquisição de partes de capital – o que não sucedeu - a mesma apenas poderia ter lugar no exercício em que essas participações fossem alienadas, sob pena de violação do princípio da especialização dos exercícios, previsto no artigo 18.º, n.º 2, do CIRC;

– no exercício de 2012 a Impugnante não adquiriu nem alienou quaisquer participações sociais;

– a AT considerou apenas os saldos finais de balanço a 31-12-2012, para determinar a proporção dos empréstimos que, supostamente, se destinaram à aquisição de partes sociais - imputando os encargos financeiros segundo essa proporção e usando, para tal, um método criado administrativamente pela Circular n.º 7/2004, de 30 de Março;

– a AT usou, para esse efeito, um método indirecto de matriz aritmética em que nem sequer questiona ou afere se o financiamento foi ou não contraído para a aquisição de acções, sem verificar que partes de capital foram adquiridas ou alienadas, e em que momento, sem aferir se essas partes de capital geraram mais- valia não tributada;

– a AT não efectuou quaisquer diligências no sentido de averiguar se os empréstimos contraídos se destinaram, de facto, à aquisição das participações sociais de que a Impugnante era detentora a 31-12-2012, nomeadamente, comparando datas de aquisição das participações com as datas da contracção dos empréstimos que geraram os encargos financeiros corrigidos;

– a utilização do referido método indirecto viola o princípio da legalidade, pois as orientações administrativas não possuem força normativa de actos legislativos;

– não estabelecendo a lei forma alguma quais os critérios de alocação dos encargos financeiros, não podendo a AT, através da emissão de circulares, vir criar verdadeiras normas de incidência, impondo as suas instruções e interpretações internas com efeitos erga omnes.

 

Como se conclui da fundamentação que consta do Relatório da Inspecção Tributária, a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira reconduz-se a ser de aplicar o método previsto nesta Circular, ficcionando que parte dos encargos financeiros suportados no ano de 2012 se destinaram a financiar a aquisição de participações sociais, independentemente de estas terem ou não sido adquiridas com uso de meios que implicaram o pagamento de encargos financeiros, no exercício em causa. Na verdade, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que esse método indirecto é de aplicar «dada a extrema dificuldade de utilização de um método de afetação direta ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria», não tendo indagado sequer se era possível uma afectação específica ou se houve qualquer «manipulação».

A alegação que a Autoridade Tributária e Aduaneira faz no presente processo de que o método indirecto só é aplicável às SGPS que não procedam ou não sejam capazes de realizar tal afectação específica ou directa constitui uma fundamentação a posteriori que não tem qualquer correspondência no Relatório da Inspecção Tributária que, manifestamente, entende ser aplicável esse método exclusivamente pela «extrema dificuldade de utilização de um método de afetação direta ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria». À face do Relatório da Inspecção Tributária, é a mera dificuldade abstracta de utilização de um método directo e a abstracta possibilidade de manipulação que impõem a aplicação do método indirecto previsto na Circular n.º 7/2004 e não a agora alegada impossibilidade concreta de apurar a afectação directa e específica, que, aliás, no Relatório da Inspecção Tributária nem sequer se esboça procurar demonstrar.

A decisão da reclamação graciosa confirma claramente a posição assumida no Relatório da Inspecção Tributária, no sentido de que «a fungibilidade da moeda leva a que seja extremamente difícil determinar com exactidão qual a aplicação específica dos capitais próprios obtidos através de um determinado empréstimo» e que «deverá ser sempre utilizado o método indirecto preconizado no ponto 7 da referida Circular, de modo a evitar manipulação de resultados caso assim não se procedesse».

Num contencioso de mera anulação, como é o que vigora no processo de impugnação judicial e nos processos arbitrais, que são sua alternativa (artigo 124.º, n.º 2, da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), tem de se aferir da legalidade do acto impugnado tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. ( [1] )

Assim, é a legalidade da posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira no sentido de ser obrigatória a utilização do método previsto no ponto 7 da Circular n.º 7/2004 («deverá ser sempre utilizado o método indirecto») que está em causa no presente processo, quanto à primeira questão colocada pela Requerente.

 

3.2.2. Apreciação da questão da obrigatoriedade da aplicação do método previsto no ponto 7 da Circular n.º 7/2004 e da preterição de formalidade legal relativa à determinação da matéria tributável

 

No n.º 2 do artigo 32.º do EBF estabelece-se que não concorrem para a formação do lucro tributável os «encargos financeiros suportados com a sua aquisição», reportando-se às partes de capital, pelo que é manifesto que o seu teor literal indica que tão só os encargos financeiros que estejam conexionados com a aquisição de participações sociais são abrangidos pela indedutibilidade que aí se estabelece.

Para além de ser esta a interpretação que resulta do teor literal, ela é corroborada pela explicação para a sua introdução no EBF que foi dada no Relatório do Orçamento do Estado para 2003 (Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro).

Na verdade, como se refere na Circular n.º 7/2004, o regime desta norma foi introduzido no EBF pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003, então no artigo 31.º, cujo regime passou a constar do artigo 32.º depois da renumeração operada pelo Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26 de Junho.

Na Proposta de Lei n.º 28-IX, que veio a dar origem à Lei do Orçamento para 2003, constava esse artigo 31.º, n.º 2, com redacção idêntica à vigente em 2011 (no artigo 32.º, n.º 2), sendo a única diferença o aditamento da referência aos «ICR» (abreviatura de «investidores de capital de risco»), que é irrelevante para a interpretação da norma.

No referido Relatório do Orçamento do Estado para 2003 ( [2] ) anuncia-se a introdução desta norma, tendo em vista o «alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade», nos seguintes termos:

«Estabelece-se a desconsideração da dedutibilidade, para efeitos de determinação do lucro tributável, dos encargos de natureza financeira directamente associados à aquisição de partes sociais por parte das SGPS»;

 

É inequívoco, assim, que se pretendeu que apenas os encargos financeiros directamente associados à aquisição de partes sociais ficassem abrangidos pela indedutibilidade.

Por outro lado, com se vê por esta explicação do alcance desta parte final do n.º 2, trata-se de uma medida legislativa autónoma em relação à parte em que se estabelece que as mais-valias e as menos-valias realizadas não concorrem para a formação do lucro tributável, pois é óbvio que o não concurso de mais-valias não alarga a base tributável, antes a diminui e, por isso, não vale aquela razão de ser.

Por aquela referência expressa no Relatório à necessidade de os encargos financeiros estarem directamente associados à aquisição de partes sociais (que também está expressa no texto da norma através da referência aos «encargos financeiros com a sua aquisição»), conclui-se que não basta para determinar a indedutibilidade de encargos financeiros o facto de a SGPS ser titular de participações sociais, sendo necessário demonstrar que há uma relação directa entre certos encargos financeiros e a aquisição de determinadas participações sociais.

Conclui-se assim, que não tem suporte legal a posição adoptada no Relatório da Inspecção Tributária e na decisão da reclamação graciosa no sentido da obrigatoriedade de utilização do método indirecto previsto no ponto 7 daquela Circular, e que não há fundamentação para afastar a regra da dedutibilidade de encargos financeiros, que consta da alínea c) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, em relação a encargos que não estão directamente associados à aquisição de participações sociais.

            Por isso, para além do erro de direito da interpretação adoptada no Relatório da Inspecção Tributária e na decisão da reclamação graciosa, uma conclusão no sentido da indedutibilidade dos encargos financeiros suportados pela Requerente só poderia ser alcançada pela Autoridade Tributária e Aduaneira na sequência da apreciação da forma como foram adquiridas as participações sociais que foram consideradas para afectação dos encargos financeiros.

            Sendo este o regime que está previsto na lei, ele não pode ser alterado por via regulamentar, pois preceitos criados por actos de natureza legislativa não podem ser, com eficácia externa, interpretados, integrados, modificados, suspensos ou revogados por actos de outra natureza (artigo 112.º, n.º 5, da CRP).

Para além disso, a definição dos pressupostos da tributação é matéria sujeita ao princípio da legalidade, desde logo por força do disposto no artigo 103.º, n.º 2, da CRP que estabelece que «os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes».

Este princípio da legalidade é reafirmado e ampliado pela LGT, no seu artigo 8.º.

É, assim, claro que as normas relativas à liquidação de tributos, designadamente, as que definem a incidência e os benefícios fiscais, estão subordinadas ao princípio da legalidade, estando consequentemente afastada a possibilidade de, por via administrativa, serem criadas normas de que resulte uma efectiva oneração para os contribuintes. ( [3] )

O ponto 7 da Circular n.º 7/2004 consubstancia uma norma de natureza inovadora sobre a determinação da matéria tributável de IRC, criando situações de indedutibilidade de encargos financeiros não previstas na lei (aquelas em que não haja relação entre encargos desse tipo e a aquisição de participações sociais), pelo que é inválida por violação do princípio da legalidade.

Por outro lado, se é certo que é abstractamente admissível que «na impossibilidade confessada de afectação específica ou directa, é legítimo à AT, face à letra e ao espírito do nº 2 do art. 32º do EBF, aplicar um método de afectação indirecta ou não específica», por se reconduzir a uma situação de «impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável», para efeitos do n.º 1 do artigo 90.º da LGT, também o é que a utilização de qualquer método indirecto para determinar a matéria tributável depende da satisfação de requisitos legais, previstos nos artigos 85.º e 87.º da LGT, e apenas podem ser utilizados os métodos previstos na lei, designadamente nesse artigo 90.º da LGT, entre os quais não se enquadra o utilizado pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Para além disso, no caso em apreço, nem sequer está demonstrada a impossibilidade de afectação dos encargos financeiros suportados, pois, à face do que consta do Relatório da Inspecção Tributária, a Autoridade Tributária e Aduaneira nem sequer realizou qualquer diligência no sentido de procurar apurar essa afectação.

No que concerne ao ónus da prova, invocado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, é certo que em matéria de benefícios fiscais existem normas especiais de que se infere que o ónus da prova dos factos necessários para deles usufruir cabe a quem os invoca (artigos 14.º, n.º 2, e 74.º, n.º 1, da LGT).

Porém, na específica situação em apreço, não se está perante a invocação de pressupostos de benefícios fiscais, pois a parte do artigo 32.º, n.º 2, do EBF que prevê a não dedutibilidade dos encargos financeiros suportados com a aquisição de partes de capital não estabelece um benefício fiscal, mas sim uma limitação à dedutibilidade de encargos financeiros, negativa para o contribuinte, estabelecida com a finalidade de atenuar o regime fiscalmente favorecido de que usufruem as SGPS em relação às sociedades em geral.

Por isso, ao determinar a não dedutibilidade dos encargos financeiros, a Autoridade Tributária e Aduaneira está levar a cabo uma actividade de natureza desfavorável para o contribuinte, pelo que lhe cabe o ónus da prova dos factos que invocar para fundamentar a sua actuação, designadamente, ao optar pela utilização de método indirecto de determinação da matéria tributável, de provar que se verificava algum ou alguns dos pressupostos legais da sua aplicação, indicados no artigo 87.º da LGT, como decorre do n.º 3 do artigo 74.º da LGT. Será esta a regra especial do ónus da prova a aplicável aos casos de uso de métodos indirectos de determinação da matéria tributável e não a regra geral do artigo 74.º, n.º 1, invocada pela Requerente.

Assim, sendo pressuposto do acto de liquidação que tenham sido suportados encargos financeiros com a aquisição de participações sociais, as dúvidas sobre se eles foram suportados versam sobre a existência ou quantificação do facto tributário, pelo que têm de ser valoradas processualmente a favor do contribuinte e justificam a anulação do acto impugnado, por força do disposto no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

Para além disso, como se entendeu no referido acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 15-01-2015, proferido no processo n.º 00946/09.0BEPRT, «pretendendo a ATA desconsiderar os custos contabilizados pela recorrida com fundamento na violação do art.º 31º/2 do EBF deveria demonstrar os pressupostos do seu direito à tributação, ou seja, deveria provar que esses custos não eram legalmente dedutíveis quer porque se realizaram menos valias com a transmissão onerosa de partes de capital detidas há menos de um ano, quer porque foram suportados e contabilizados encargos financeiros com a sua aquisição».

No caso em apreço, com refere a Requerente, a Autoridade Tributária e Aduaneira «não efectuou quaisquer diligências no sentido de averiguar se os empréstimos contraídos se destinaram, de facto, à aquisição das participações sociais de que a Impugnante era detentora a 31.12.2012 - nomeadamente, comparando datas de aquisição das participações com as datas da contracção dos empréstimos que geraram os encargos financeiros corrigidos», o que consubstancia vício procedimental (preterição de formalidade legal), à face do artigo 58.º da LGT que lhe impõe o dever de «realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material».

Pelo exposto, conclui-se que a liquidação em causa, na parte em que tem como pressuposto a correcção no valor de € 541.067,15, enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a sua anulação, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT, para além de enfermar do vício procedimental que a Requerente lhe imputa de omissão de diligências que deveria ter efectuado e violação das regras sobre a utilização de métodos indirectos, designadamente os artigos 81.º, n.º 1, 85.º, n.º 1, e 87.º da LGT, invocados pela Requerente.

Procedendo o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte, por estas razões, fica prejudicado, por ser inútil (artigo 130.º, n.º 1, do CPC), o conhecimento das restantes questões colocadas sobre a legalidade desta correcção, designadamente a alegada violação do princípio da especialização dos exercícios.

 

3.2.3. Questões de inconstitucionalidade da interpretação da Requerente

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira alega que a interpretação da Requerente viola os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da capacidade contributiva e da tributação do rendimento real, mas esta posição assenta no errado entendimento de que, para efeitos do artigo 32.º, n.º 2, do EBF releva uma afectação indirecta.

 A afectação de financiamentos à aquisição de partes de capital, quando ocorre, é necessariamente directa.

A «afectação indirecta» criada pela Autoridade Tributária e Aduaneira através da Circular n.º 7/2004, que constitui a previsão de um método indirecto, é uma mera ficção, baseada em presunções cujo fundamento não é nela explicado, para levar a concluir que houve uma afectação (a afectação existe ou não, é necessariamente directa) de financiamentos à aquisição de participações sem se apurar se ela ocorreu ou não e em que medida.

Ora, como é óbvio, aos contribuintes em relação aos quais não se provou que afectaram financiamentos à aquisição de partes de capital não pode ser dado o tratamento jurídico que é dado àqueles em que se provou tal afectação, para efeito do artigo 32.º, n.º 2, do EBF, pois a afectação é o pressuposto necessário da sua estatuição.

De resto, nem se vislumbra como tal regime, exigindo a comprovação da conexão de determinados encargos financeiros com a aquisição de determinadas participações sociais, discrimine positiva ou negativamente quaisquer SGPS, pois ele é aplicável a sociedades SGPS de todos os tipos: seja qual for o tipo de SGPS, se suporta encargos com a aquisição de participações sociais não os pode deduzir; seja qual for o tipo de SGPS, se tem outros encargos financeiros relacionados com outros activos ou actividades pode deduzi-los; se uma SGPS, de qualquer tipo, não tem encargos financeiros, então não os pode deduzir, pois nenhuma pode deduzir o que não teve; não constitui discriminação positiva, decerto, uma sociedade de qualquer tipo que suportou mais encargos financeiros que outra poder deduzir mais encargos que esta, pois há uma diferença entre ambas que justifica a diferente dedutibilidade.

No que concerne à alegada inconstitucionalidade do artigo 32.º, n.º 2, do EBF, por violação do princípio da capacidade contributiva, enunciado no artigo 104.º da CRP, quando interpretado no sentido de que, sendo inaplicável o método previsto no ponto 7. da Circular n.º 7/2004, todos e quaisquer encargos financeiros suportados com financiamentos relacionados com aquisições de participações sociais são dedutíveis, independentemente de prova promovida por aquele sujeito passivo para o efeito, nem se percebe a pertinência da sua colocação no caso em apreço, pois a interpretação aqui adoptada é precisamente a contrária: o artigo 32.º, n.º 2, do EBF exige a prova de que os encargos financeiros suportados não estão relacionados com a aquisição de participações sociais e são esses que são dedutíveis e se se provar essa relação os encargos não são dedutíveis.

A interpretação daquela norma adoptada pela Autoridade Tributária e Aduaneira na correcção impugnada, ao impedir essa prova e ao impor sempre a aplicação do método previsto naquela Circular, é que poderia gerar dificuldade da sua compatibilização aquele princípio constitucional, além de outros, se fosse a forma de apuramento da afectação prevista na lei. Mas, como é óbvio, em caso de dúvida sobre afectação dos encargos financeiros aplicam-se as regras do ónus da prova, pelo que a realidade processualmente relevante é a que delas resultar, com o seu corolário a nível da dedutibilidade.

No que concerne ao princípio da tributação fundamentalmente com base no rendimento real, prevista no artigo 104.º, n.º 2, da CRP, não se vê que ele seja afectado, beneficiando as SGPS, por uma norma que prevê, precisamente, a irrelevância de custos financeiros suportados, ao contrário da regra geral do artigo 23.º, n.º 1, alínea c), do CIRC.

A indedutibilidade de custos financeiros prevista na parte final do artigo 32.º, n.º 2, do EBF consubstancia um afastamento da regra da tributação segundo o rendimento real, que é concretizada no artigo 23.º, n.º 1, alínea c), do CIRC, que prevê a dedutibilidade de encargos financeiros.

Por isso, o afastamento da aplicação de uma excepção a essa regra, prevista na parte final do artigo 32.º, n.º 2, do EBF só pode favorecer a regra da tributação segundo o rendimento real.

No que concerne ao princípio da proporcionalidade também não se vislumbra como possa ser violado pela interpretação referida: se se prova a existência de uma situação prevista na parte final da norma do artigo 32.º, n.º 2, do EBF, aplica-se a sua estatuição; se essa prova não se faz, a norma não se aplica. Decerto o que seria incompaginável com o princípio da proporcionalidade seria aplicar a norma a situações em que não se prova a existência de uma situação que se enquadre na hipótese normativa.

Conclui-se, assim, que a não aplicabilidade da regra da parte final do n.º 2 do artigo 32.º do EBF a situações em que não se prova foram suportados encargos financeiros com a aquisição de participações sociais por SGPS não é incompaginável com qualquer dos princípios constitucionais invocados pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

3.3. Questão da legalidade da correcção relativa a gastos com amortizações e depreciações contabilizados pela G…

 

A G… era proprietária de diversos imóveis registados como propriedades de investimento, mencionados nos seus mapas de amortizações e depreciações dos anos de 2011 a 2013.

De acordo com a informação prestada pela G… à Autoridade Tributária e Aduaneira, alguns desses imóveis estão arrendados, sendo que o valor registado como vendas e prestações de serviços nos anos de 2011 a 2013 refere-se às rendas obtidas desses imóveis identificados pelo sujeito passivo. Os restantes imóveis registados como propriedades de investimento estão disponíveis para arrendamento ou venda, não estando a ser utilizados e não gerando rendimentos para a G… .

Os gastos com amortizações e depreciações registados nos anos de 2011 a 2013 referem-se à totalidade dos imóveis (deduzido do valor dos terrenos) registados como propriedades de investimento, independentemente de estarem a ser utilizados ou não.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que as perdas com amortizações dos imóveis registados como propriedades de investimento que não estão a ser utilizados e que não geraram rendimentos sujeitos a IRC não são dedutíveis no apuramento do resultado fiscal de IRC dos anos de 2011 a 2013, fundamentando a sua decisão no n.º 1 do artigo 23.º e no n.º 3 do artigo 29.º do Código do IRC.

A Requerente defende em suma, o seguinte:

– fora do conceito de indispensabilidade ínsito no artigo 23.º do CIRC devem ficar apenas os actos desconformes com o escopo social, ou que não se inserem no interesse da sociedade, devendo a “indispensabilidade” ser interpretada em função do objecto social ou actividade da empresam;

– a lei não exige que o custo tenha um fim imediata e directamente lucrativo, bastando que, na sua origem e na sua causa, tenha um fim empresarial;

– os gastos em causa se reportam a imóveis que estão disponíveis para arrendamento ou venda;

– a materialização de custos ou perdas não tem, sequer, de estar necessariamente relacionada, numa relação causal directa, com a realização de proveitos ou ganhos;

– os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo.

 

O artigo 23.º, n.º 1, do CIRC estabelece a regra de que «consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora».

A interpretação que a Requerente defende do artigo 23.º, n.º 1, está em sintonia com o que a doutrina e a jurisprudência têm entendido sobre o preenchimento do requisito de indispensabilidade utilizado no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC.

Segundo Tomás Tavares, «a noção legal de indispensabilidade recorta-se, portanto, sobre uma perspectiva económico-empresarial, por preenchimento, directo ou indirecto, da motivação última para a obtenção do lucro. Os custos indispensáveis equivalem aos gastos contraídos no interesse da empresa ou, por outras palavras, em todos os actos abstractamente subsumíveis num perfil lucrativo.” (…) A indispensabilidade subsume-se a todo e qualquer acto realizado no interesse da empresa… A noção legal de indispensabilidade reprime, pois, os actos desconformes com o escopo da sociedade, não inseríveis no interesse social, sobretudo porque não visam o lucro”.

No entanto, para os elementos depreciáveis ou amortizáveis, o artigo 29.º do mesmo Código estabelece regras especiais que, por o serem, prevalecem sobre a regra geral do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC.

No caso em apreço, a Autoridade Tributária e Aduaneira invoca a norma do artigo 29.º, n.º 3, do CIRC que estabelece que «salvo razões devidamente justificadas e aceites pela Direcção-Geral dos Impostos, os elementos do activo só se consideram sujeitos a deperecimento depois de entrarem em funcionamento ou utilização».

Esta regra especial, não limita a relevância fiscal como gasto dos bens sujeitos a deperecimento, pelo que não afasta a aplicabilidade do conceito de indispensabilidade que se extrai do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, pelo que os bens sujeitos a deperecimento são amortizáveis totalmente no período que for aplicável, à face da regulamentação que consta do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de Setembro.

No entanto, o que resulta daquele n.º 3 do artigo 29.º é que o início dos períodos de amortização depende da entrada em funcionamento ou utilização dos bens em causa.

No caso em apreço, a utilização dos imóveis referidos no Relatório da Inspecção Tributária cujas amortizações foram corrigidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira não se iniciou até ao final do exercício de 2012, pelo que esta norma é obstáculo a que possam ser efectuadas amortizações neste exercício.

Assim, não merece censura a correcção efectuada à matéria tributável da G…, pelo que improcede o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

4. Decisão

 

Nestes termos, acorda este Tribunal Arbitral em:

 

a)      Julgar improcedente a excepção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral;

b)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e declarar ilegal a correcção no montante de € 541.067,15 relativa à matéria tributável Requerente como sociedade individual e anular aquela correcção e a liquidação de IRC n.º 2016 … na parte em que a tem como pressuposto;

c)      Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à ilegalidade da liquidação na parte em que tem como pressuposto a correcção no montante de € 9.172,90 à matéria tributável da G… S.A.;

 

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 550.240,08.

 

6. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 8.568,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a da Requerente e da Autoridade Tributária e Aduaneira nas percentagens de 1,67% e 98,33% respectivamente.

 

 

Lisboa, 06-12-2016

 

 

Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

(Cristina Aragão Seia)

 

 

 

(João Cruz)

 



[1]Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

–    de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12-4-2001, página 1207;

–    de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em Apêndice ao Diário da República de 10-2-2004, página 4289;

–    de 09/10/2002, processo n.º 600/02;

–   de 12/03/2003, processo n.º 1661/02.

               

                Em sentido idêntico, podem ver-se:

–    MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é «irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto», e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que «não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa»;

–    MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que «as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade».

[3] Neste sentido, defendendo que deve distinguir-se, para efeitos de aplicação do princípio da legalidade, «entre normas que constituem uma efectiva oneração do contribuinte – sujeitas a reserva de lei – e deveres de cooperação de menor monta que daquela podem ser dispensados (tudo resultando do grau de sacrifício que implicarem e da legitimidade da sua exigência em termos de proporcionalidade) e normas organizatórias da cobrança e liquidação, que não faz sentido sujeitar ao princípio da legalidade», pode ver-se SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3.ª edição, páginas 121-122).