Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 99/2016-T
Data da decisão: 2016-10-10  IMT  
Valor do pedido: € 3.485,45
Tema: Imposto Municipal sobre Imóveis. Falta de fundamentação
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Decisão Arbitral

 

 

       O árbitro, Dr. Henrique Nogueira Nunes, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 6 de Maio de 2016, acorda no seguinte:

 

 

1.    RELATÓRIO

 

1.1.A…, com o número de identificação fiscal …, doravante designado por “Requerente”, requereu a constituição do Tribunal Arbitral ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º do Decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”).

 

1.2. O pedido de pronúncia arbitral tem por objecto a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de Imposto Municipal de Imóveis melhor identificado sob os documentos de cobrança emitidos com os números 2014 …, no valor de € 2.786,11; 2014 …, no valor de € 2.786,10, e 2014 …, no valor de € 2.786,10, no valor global de € 8.358,31, referente ao ano de 2014.

 

1.3. A fundamentar o seu pedido alega o Requerente, em síntese, o seguinte vício:

 

(i) Na nota de liquidação em causa nos autos, as fracções correspondentes ao imóvel sito na freguesia de …, concelho de Lisboa, sofreram uma majoração de 30% e 200% da taxa de imposto aplicável, sendo desconhecidas as razões desta majoração pois em momento diz ter sido notificado dos seus motivos e fundamentos.

 

(ii) Refere que não foi notificado da decisão de majorar a taxa de IMI em 30% e 200%; e que nem mesmo a nota de liquidação vem colmatar essa falha, carecendo também ela de fundamentação.

 

(iii) E que cabe à AT, enquanto fundamentação formal do acto de liquidação, a invocação do preenchimento dos concretos pressupostos legais de que depende o seu direito à liquidação, com elementos claros, suficientes e congruentes, de molde a permitir ao administrado ajuizar da correcção/legalidade da mesma de molde a com ela se possa conformar ou vir a impugná-la, graciosa ou judicialmente, se a entender eivada de algum vício que a afecte na sua legalidade.

 

(iv) In casu diz ser manifesta a falta de fundamentação pois, com base nos elementos constantes da nota de liquidação não lhe é possível descortinar as razões pelas quais a AT decidiu da forma que decidiu.

 

(v) Acresce ainda o facto de não ter sido respeitado o direito de audição prévia, previsto no artigo 60.º, n.º1, al. a), da LGT.

 

(vi) Por todo o exposto pugna pela anulação do acto tributário em crise nos autos com todas as consequências legais, por preterição de formalidade essencial, consubstanciada na total ausência de fundamentação e consequente violação dos artigos 268.º da CRP e 77.º da LGT, devendo ordenar-se a restituição do indevidamente pago em consequência, no valor de € 3.485,45, correspondente à diferença entre o valor resultante da aplicação da taxa normal de IMI e o valor obtido com a majoração.

 

1.4. A Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante designada por “Requerida” ou “AT”, respondeu, em síntese, como segue:

(i) Vem suscitar matéria de excepção, por caducidade do direito de agir, porquanto alega que como a data limite de pagamento do acto de liquidação de IMI (1.ª prestação) remonta ao dia 30 de Abril de 2015 e o pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 23 de Fevereiro de 2016, deve o pedido formulado (conducente à anulação daqueles actos de liquidação) ser declarado improcedente, por intempestivo, porquanto a caducidade do direito de acção consubstancia uma excepção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto nos n.º 1 e 2 do artigo 576.º do CPC (ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT e alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

(ii) Adicionalmente, e por impugnação, sustenta que no que respeita à fundamentação dos actos administrativos, o acto está fundamentado quando, pela motivação aduzida, se mostra apto a revelar a um destinatário normal as razões de facto e de direito que determinam a decisão, habilitando-o a reagir eficazmente pelas vias legais contra a respectiva lesividade.

 

(iii) Baseando-se na doutrina que refere que determinado acto, in casu, o acto administrativo-tributário, se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final, citando doutrina variada.

 

(iv) Para se atingir este objectivo, sustenta, basta uma fundamentação sucinta, mas que seja clara, concreta, congruente e que se mostre contextual, sendo a fundamentação do acto administrativo-tributário suficiente se, no contexto em que foi praticado, e atentas as razões de facto e de direito nele expressamente enunciadas, forem capazes ou aptas e bastantes para permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.

 

(v)  E que a fundamentação não tem de ser prolixa, basta que seja suficiente de forma a permitir ao destinatário do acto a reconstituição o iter cognoscitivo feito pela administração fiscal para ter decidido no sentido que decidiu.

 

(vi) Sendo que, alega, a majoração aplicada aos prédios urbanos foi fixada por deliberação da respectiva Assembleia Municipal, nos termos do disposto no artigo 112.º do CIMI.

 

(vii) Entende que constam dos actos de liquidação postos em crise nos presentes autos arbitrais todos os elementos previstos e exigidos na lei, sem excepção, designadamente nos artigos 119.º e 120.º do código do IMI, nomeadamente, discriminação dos prédios, respectivo valor patrimonial tributário e colecta imputada a cada município da localização dos prédios.

 

(viii) E que o Requerente não consultou o serviço de finanças competente, nem a respectiva câmara municipal a fim de obter a desejada informação, conforme preceituado no n.º 2 do artigo 119.º do CIMI.

 

(ix) Não podendo vir agora invocar a falta de fundamentação legal, pelo que se considera que o ónus de fundamentação foi cumprido e que o pedido do Requerente deve improceder.

 

(x) Quanto à falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia, entende que a liquidação aqui impugnada cai no âmbito da excepção prevista no artigo 60.º da LGT, considerando-se, neste caso, que estava dispensada de notificar o Requerente para exercer o direito de audição prévia, termos em que alega que improcedem, também aqui, as pretensões do Requerente.

 

(xi) Pelo que pugna pela total improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a Requerida do pedido, tudo com as devidas e legais consequências.

 

 

1.5. Entendeu o Tribunal, dispensar a realização da primeira reunião do Tribunal Arbitral, de acordo com o disposto no artigo 18.º do RJAT, o que não mereceu qualquer oposição das partes. Foi identificada uma excepção que será apreciada e decidida na presente decisão. Foram as partes notificadas para apresentar alegações, querendo, tendo ambas decidido fazê-lo, reforçando as posições anteriormente expressas.

Foi fixado prazo para o efeito de prolação da decisão arbitral até ao fim do prazo de 30 dias a contar da notificação das alegações da Requerida.

 

* * *

 

1.6. O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, de acordo com o artigo 2.º do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

 

Não foram identificadas nulidades no processo.

 

 

2.    QUESTÕES A DECIDIR

 

       Na petição arbitral o Requerente formula as seguintes questões:

 

1.    O acto de liquidação de IMI em causa nos autos deve ser anulado, por ilegal, por falta de fundamentação legal?

2.    A Requerida violou o direito de participação na decisão final da Requerente, por não ter sido respeitado o direito de audição prévia, previsto no artigo 60.º n.º 1 alínea a) da LGT?

 

       Na sua Resposta, para além de se defender por impugnação, a Requerida vem suscitar uma questão prévia, em matéria de excepção, por caducidade do direito de agir.

 

 

3.         MATÉRIA DE FACTO

 

Com relevo para a apreciação e decisão do mérito, dão-se por provados os seguintes factos:

 

A) O Requerente é proprietário de um prédio urbano sito na Rua …, n.º…, na freguesia de …, concelho de Lisboa, inscrito na matriz sob o artigo … da dita freguesia.

B) O Requerente foi notificado da liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis referente ao ano de 2014, consubstanciado nos documentos de cobrança emitidos com os n.ºs 2014…, 2014 … e 2014 …, no valor global de € 8.358,31.

C) Nos referidos documentos de cobrança as fracções correspondentes ao imóvel sito na freguesia de …, concelho de Lisboa, sofreram uma majoração de 30% e 200% da taxa de imposto aplicável.

D) Tal majoração ocorreu relativamente às fracções (B, E, G, H, I) em que foi aplicável uma majoração de 30% e, quanto às restantes (A, C, D, F, J), uma majoração de 200%.

E) Todas as notas de cobrança do imposto em crise nos autos foram pagas (facto assumido pela Requerente na sua Petição Arbitral e não contestado pela Requerida).

F) No dia 23-02-2016 o Requerente apresentou requerimento de constituição do Tribunal Arbitral junto do CAAD – cfr. requerimento electrónico no sistema do CAAD.

 

 

4.    FACTOS NÃO PROVADOS

 

Não existem factos com relevo para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

 

5.    FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO

 

            Quanto aos factos essenciais a matéria assente encontra-se conformada de forma idêntica por ambas as partes e a convicção do Tribunal formou-se com base nos elementos documentais (oficiais) juntos ao processo e acima discriminados cuja autenticidade e veracidade não foi questionada por nenhuma das partes.

 

 

6.    DO DIREITO

 

 

De acordo com as questões enunciadas, que constam do ponto n.º 2 da presente Decisão, e tendo em conta a matéria de facto fixada no ponto n.º 3, importa agora determinar o Direito aplicável.

 

Desde logo cumpre, primeiramente, apreciar a questão da excepção dilatória aduzida pela AT na sua resposta, atinente à caducidade do direito de acção.

 

 

 

Entende a AT que como a data limite de pagamento da 1.ª prestação do acto de liquidação de IMI remonta ao dia 30/04/2015 e o Requerente apenas apresentou o pedido de pronúncia arbitral em 23 de Fevereiro de 2016, então verificar-se-á, in casu, a caducidade do direito de agir porquanto o pedido de constituição do Tribunal Arbitral deve ser apresentado no prazo de 90 dias a contar da data-limite para o pagamento voluntário do tributo, nos termos do disposto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT, conjugado com o disposto no artigo 102, n.º 1, alínea a) do CPPT.

 

Ou, no limite, referente aos actos de liquidação efectuados nos meses de Abril e Julho de 2015.

 

Vejamos.

 

Só há, como se verá adiante, uma liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis. O imposto decorrente desta liquidação é que pode ser pago em três vezes.

 

Se um contribuinte pretende discutir a legalidade do imposto, o acto que está a ser sindicado é o acto de liquidação que lhe deu lugar, e o prazo de reacção é que se conta da data da primeira, da segunda ou da terceira prestação, como veremos.

 

Como se sabe, a liquidação constitui a operação através da qual se aplica a taxa de imposto à matéria tributável, apurando-se, assim, o valor devido por cada contribuinte.

 

Nos termos do disposto no artigo 113.º do Código do IMI, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada município, pelos serviços centrais da Autoridade Tributária, em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o imposto respeita, sendo efectuada nos meses de Fevereiro e Março do ano seguinte

 

Por sua vez, o artigo 120.º do Código do IMI, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo artigo 215.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2013), apresenta a seguinte redacção:

 

Artigo 120.º - Prazo de pagamento

1 - O imposto deve ser pago:

a) Em uma prestação, no mês de abril, quando o seu montante seja igual ou inferior a € 250;

b) Em duas prestações, nos meses de abril e novembro, quando o seu montante seja superior a € 250 e igual ou inferior a € 500;

c) Em três prestações, nos meses de abril, julho e novembro, quando o seu montante seja superior a € 500.

2 – (…).

3 – (…).

4 - No caso previsto nos n.ºs 1 e 3, o não pagamento de uma prestação ou de uma anuidade, no prazo estabelecido, implica o imediato vencimento das restantes.

5 - Se o atraso na liquidação for imputável ao sujeito passivo é este notificado para proceder ao pagamento do imposto respeitante a todos os anos em atraso.”. 

 

Das normas supra referidas decorre que existe apenas uma liquidação e que o seu pagamento deve ser feito em três prestações, nos meses de Abril, Julho e Novembro, quando o seu montante seja superior a € 500.

 

Ou seja, uma prestação não equivale a uma nova liquidação de imposto. Uma prestação é parte de uma liquidação de imposto que é dividida no tempo para efeitos do seu pagamento.

 

De facto, o momento da liquidação e o momento do pagamento são claramente individualizados na lei, como acima se apontou.

 

A divisão de uma liquidação em prestações não passa, assim, de uma mera técnica de arrecadação de receitas.

 

Do ponto de vista deste Tribunal a possibilidade de pagamento em prestações é uma técnica de cobrança de um determinado acto de liquidação que é único e só este poderá constituir um acto lesivo susceptível de impugnação. Qualquer prestação autonomamente considerada não é um acto de liquidação, nem tão pouco uma parte desse acto, é, como já se disse uma mera técnica de cobrança o que não invalida que um acto de liquidação possa ser parcialmente anulado.

 

No caso concreto, o acto de liquidação do IMI é o acto único de apuramento total do tributo a pagar, a possibilidade desse valor ser pago em prestações não significa que ocorram tantas liquidações quantas as prestações.

 

Com referência à lei em vigor à data do facto tributário em causa nos autos, esse acto único de liquidação, poderia ser impugnado, quer após a notificação para pagamento da 1.ª, da 2.ª ou da 3.ª prestação, bastando, para tanto, que o pedido se dirija ao acto único de liquidação.

 

Ora, in casu, foi o que o Requerente fez, porquanto apresentou um pedido de constituição do Tribunal Arbitral em 23/02/2016, ainda antes de decorrido o prazo de 90 dias da data limite de pagamento da 3.ª prestação de imposto (Novembro de 2015) e, nesse acto, visou a impugnação arbitral do acto tributário de liquidação do IMI referente ao ano de 2014, como, de resto, aponta, desde logo, o cabeçalho do pedido de pronúncia arbitral apresentado.

 

Pelo que improcede a excepção dilatória aduzida pela Requerida.

 

Entrando, agora, na matéria de impugnação, e seguindo a ordem dos vícios que foram imputados pelo Requerente ao acto tributário em crise nos autos, importa apreciar se o acto de liquidação de IMI em causa nos autos deve ser anulado, nos termos peticionados, por falta de fundamentação legal.

 

A questão essencial que importa apreciar e decidir é se as majorações constantes da liquidação de IMI em causa nos autos cumprem com o dever de fundamentação previsto no artigo 77.º da LGT, ou se, como invoca o Requerente, o não fazem, constituindo tal falta fundamento de impugnação do acto tributário nos termos do disposto na alínea c) do artigo 99.º do CPPT, e, consequentemente, fundamento de pedido de pronúncia arbitral, ex vi al. c) do n.º 2 do artigo 10.º do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

 

Ou seja, determinar se não seria exigível, de acordo com as regras gerais consagradas quanto à fundamentação dos actos tributários, designadamente o disposto no n.º 2 do artigo 77.º da LGT, que a AT desse a conhecer ao contribuinte qual a base legal que lhe permite sustentar a aplicação das majorações constantes da liquidação do IMI em causa nos autos.

 

Convém referir que este tipo de questão, relativa à observância do dever de fundamentação do acto tributário foi já objecto de análise em diversos acórdãos.

 

   Vide, por exemplo, o Acórdão do STA, datado de 19/09/2012, proferido no processo n.º 659/12, que decidiu no seguinte sentido: "Os actos tributários estão sujeitos a fundamentação (art. 268.º, n.º 3, art. 77.º da LGT e art. 125.º do CPA). A fundamentação do acto de fixação do VPT, quer resulte de avaliação quer resulte de actualização, deve ser comunicada ao sujeito passivo do IMI a liquidar com base nessa matéria tributável. Se o não tiver sido, e também a liquidação de IMI não der a conhecer a forma como foi determinado o VPT, aquela liquidação não pode ter-se por suficientemente fundamentada, tanto mais que o n.º 2 do art. 77.º da LGT impõe que a fundamentação dos actos tributários seja integrada, entre o mais, pelas operações de apuramento da matéria tributável.".

 

Ou o Acórdão do TCAS, datado de 28/02/2012, proferido no processo n.º 4893/11, que decidiu no seguinte sentido: "Cabe à AT, enquanto fundamentação formal do acto de liquidação, a invocação do preenchimento dos concretos pressupostos legais de que depende o seu direito à liquidação, com elementos claros, suficientes e congruentes, de molde a permitir ao administrado ajuizar da correcção/legalidade da mesma de molde a com ela se possa conformar ou vir a impugná-la, graciosa ou judicialmente, se a entender eivada de algum vício que a afecte na sua legalidade. Mesmo os chamados actos praticados em massa se encontram sujeitos a um mínimo de fundamentação em ordem a atingir aquele desiderato, a qual constitui uma garantia do administrado, até de ordem constitucional.".

 

Ora, no caso concreto, parece-nos que o Requerente tem toda a razão. Efectivamente, em lugar algum da nota de liquidação do IMI em crise nos autos se logra encontrar algum tipo de justificação, por mínima que fosse, susceptível de dar conhecimento ao contribuinte da razão pela qual lhe está a ser aplicada tal majoração.

 

Não é o contribuinte que tem de contactar ou requerer à Administração Tributária para que lhe seja informado o fundamento pelo qual determinado acto tributário foi majorado, mas, antes, é a esta Administração que lhe compete tal ónus, tal dever legal, em obediência ao dever de fundamentação dos actos tributários, imperativo constitucional, recorde-se.

 

A majoração em causa não surge como uma evidência, sem carecer de qualquer justificação[1], sendo que os contribuintes têm direito à fundamentação expressa e acessível dos actos que afectem os seus direitos ou interesses legalmente protegidos (artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa).

 

Entendemos, pois, carecidas da adequada fundamentação – aquela que permitiria ao seu destinatário apreender os motivos pelos quais a AT actuou ou não de forma legal, dando-lhe a possibilidade de se conformar com tal actuação ou de a impugnar com conhecimento de causa – a liquidação sindicada, que, como tal, não se poderá manter, porquanto viola o disposto no n.º 2 do artigo 77.º da LGT ao omitir a referência a qualquer tipo de fundamentação relativamente às majorações constantes da liquidação de IMI em causa nos autos.

 

Pelo exposto, conclui-se pela insuficiência de elementos que permitam perceber como se aplicaram as majorações em causa na liquidação de IMI em crise nos presentes autos arbitrais, pelo que a liquidação em causa é ilegal por falta de fundamentação legal.

 

Quanto à segunda questão, a de se determinar se houve omissão do direito de participação na decisão final por parte do Requerente, por não ter sido alegadamente respeitado o direito de audição prévia, previsto no artigo 60.º n.º 1 alínea a) da LGT considera este Tribunal Arbitral que a procedência do pedido quanto à invalidade em causa na liquidação em crise nos autos confere uma tutela segura e eficaz do interesse do Requerente, prejudicando, assim, o conhecimento desta questão.

 

 

7.         DECISÃO

 

       Em face do exposto, acorda este Tribunal Arbitral Singular em:

 

            - Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e declarar a anulação do acto de liquidação de IMI, nos exactos termos peticionados, melhor identificado sob os documentos de cobrança emitidos com os números 2014 …; 2014 … e 2014 …, e, em consequência, ser ordenada a restituição ao Requerente da quantia de € 3.485,45, correspondente à diferença entre o valor resultante da aplicação da taxa normal de IMI e o valor obtido com a majoração.

 

 

* * *

 

            Fixa-se o valor do processo em Euro 3.485,45, de harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 306.º do CPC. 

 

            O montante das custas é fixado em Euro 612,00, ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4 do RJAT e da Tabela I anexa ao RCPAT, a cargo da Requerida, de acordo com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 do RJAT e 4.º, n.º 4 do RCPAT.

 

            Notifique-se.

 

            Lisboa, 10 de Outubro de 2016.

 

 

O Árbitro,

 

 

                                               Dr. Henrique Nogueira Nunes

 

 

 

 

Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

A redacção da presente decisão arbitral rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.

 

 

 



[1] Aliás em momento algum do processo arbitral foi a AT capaz de justificar tal majoração, parecendo desconhecer a razão da sua existência.