Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 109/2015-T
Data da decisão: 2015-09-22  IRC  
Valor do pedido: € 324.955,39
Tema: IRC - Preços de transferência
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Decisão Arbitral

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo nº 109/2015-T

 

 

Os Árbitros Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Dr. Augusto Vieira e Dr. Paulo Mendonça, designados pelo Conselho Deontológico do CAAD para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 28-04-2015, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A…, S.A., com o número único de pessoa colectiva … e com sede na Avenida …, Lote …, … e …, … Lisboa, notificada, no passado dia 18-11-2014, da decisão de indeferimento (parcial) que recaiu sobre a reclamação graciosa dos actos tributários de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas («IRC»), praticados na sequência da correcção realizada no âmbito do procedimento inspectivo ao exercício de 2011 da sociedade B…, titular do número único de pessoa colectiva …, veio apresentar, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), pedido de pronúncia arbitral com vista à anulação daqueles actos.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 20-02-2015.

O Conselho Deontológico do CAAD designou como Árbitros os signatários que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 13-04-2015.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 28-04-2015.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou Resposta, suscitando a excepção de inimpugnabilidade do acto que a Requerente indica como objecto do pedido de pronúncia arbitral e defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Na reunião realizada nos termos do artigo 18.º do RJAT, o Tribunal Arbitral decidiu que se pronunciará a final sobre a excepção.

Nessa reunião procedeu-se a inquirição das testemunhas e foi acordado que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

O processo não enferma de nulidades.

Foi suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira uma excepção, que pode constituir obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

2. Excepções de falta de objecto do pedido de pronúncia arbitral e de inimpugnabilidade do acto indicado como objecto

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira suscita a questão da falta de objecto do pedido de pronúncia arbitral por, em suma:

– na plataforma do CAAD, a Requerente junta no campo destinado ao acto objecto do pedido um documento que designa por "documento de cobrança" e que consiste numa guia de pagamento de IRC com o nº … … e com um valor a pagar de €324.955,39;

– é este o acto que a Requerente identifica como sendo o objecto do pedido, cuja indicação é obrigatória por força do disposto no artigo 10.º, n.º 2, alínea b) do RJAT;

– este documento, que a Requerente identifica como sendo o acto objecto do presente pedido, não constitui um acto de liquidação, mas uma guia de pagamento;

– a Requerente pretende a apreciação da ilegalidade da correcção realizada no âmbito do procedimento inspectivo ao exercício de 2011, pelo que pretende a anulação dos actos praticados na consequência de uma correcção efectuada pela Requerida;

– a referida regularização é anterior ao termo do procedimento de inspecção, pelo que o acto que originou aquele pagamento não resultou do termo do procedimento de inspecção;

– foi em consequência de uma «projecta correcção”, que solicitou a emissão da guia de pagamento do valor supra referido;

– a «projecta correcção» não origina qualquer dívida;

– foi a própria Requerente que entendeu entregar uma declaração de substituição e proceder ao pagamento do valor supra referido;

– o acto que a Requerente identifica como objecto do pedido, não é impugnável, pois não consubstancia uma liquidação;

– a Requerente limita-se a reclamar a anulação dos actos de liquidação resultantes de uma acção de inspecção, cabendo-lhe o ónus de os identificar devidamente, o que não fez;

– o presente pedido é desprovido de objecto, pois o acto que a Requerente identifica como objecto do pedido não consubstancia uma liquidação;

– pelo que, se verifica uma excepção dilatória, como pugnado, pelo que deverá a mesma ser julgada procedente, absolvendo-se a Requerida da instância, nos termos dos artigos 576º, 577º e 278º do Código de Processo Civil, ex vi, artigo 2.º alínea e) do CPPT e artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT;

– sob pena de, se assim não se entender, tal interpretação ser não só ilegal, mas manifestamente inconstitucional, por violação dos princípios constitucionais do Estado de direito (cf. artigo 2.º da CRP), bem como da legalidade (cf. artigos 3.º, n.º 2, e 266.º, n.º 2, ambos da CRP), como corolário do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários ínsito no artigo 30.º, n.º 2 da LGT, que vinculam o legislador, os tribunais e toda a actividade da AT.

 

A Requerente respondeu, dizendo, em suma, o seguinte:

– o objecto do pedido não é definido por referência aos dados constantes do formulário de registo de entrada do pedido, mas sim no requerimento inicial, referido no n.º 2 do artigo 10.º do RJAT;

– o pedido de pronúncia arbitral foi apresentado na sequência da decisão de indeferimento (parcial) da reclamação graciosa que a Requerente apresentara contra os actos de liquidação praticados no âmbito e em consequência da inspecção tributária realizada à sociedade B…, nomeadamente, contra os actos de liquidação de IRC relativos ao exercício de 2011, n.º …-…-…, n.º 2013 …, a demonstração de acerto de contas n.º 2013 … e a demonstração de liquidação de juros compensatórios n.º 2013 …;

– como vem expressamente referido no artigo 17. º do requerimento iniciai, a REQUERENTE visa «através do presente pedido obter a declaração de ilegalidade (...) dos actos tributários de liquidação de IRC (...) tal como mantidos na ordem jurídica pela decisão de deferimento parcial proferida no âmbito da reclamação graciosa apresentada»;

 

Os factos relevantes para apreciar esta excepção são os seguintes:

 

a)      A Requerente, na qualidade de sociedade dominante do grupo em que se insere, apresentou em 31-05-2012 a declaração modelo 22 cuja cópia consta do documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, se indica como matéria colectável € 13.006.242,67 (campos 311 e 346);

b)      No âmbito de um procedimento de inspecção à sociedade B…, S.A., inserida no grupo de que a Requerente é sociedade dominante, aquela sociedade foi notificada do Projecto de Correções a incluir no Relatório de Inspecção Tributária, nos termos do qual a Administração tributária entendeu ser de «acrescer ao lucro tributável do ano de 2011, o montante de € 3.328.232,48», correspondente ao valor constante da nota de crédito n.º …, de 30-12-2011, emitida pela B… S.A. à C… com o descritivo de Compensation TTpayments, emitida com o valor de 4.306.400 USD;

c)      Em 17-12-2013, na sequência da notificação referida na alínea anterior, a B… S.A., apresentou a declaração de substituição n.º …-…-…, cuja cópia consta do processo administrativo («documento Pa5.pdf»), cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, no campo 744, relativo a «Correções relativas a preços de transferência (art. 63.º, n.º 8)», a quantia de € 3.328.232,48;

d)     Ainda na sequência da notificação referida na alínea anterior, a Requerente apresentou a declaração de substituição modelo 22 do grupo de que é sociedade dominante, cuja cópia consta do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, indicou como matéria colectável € 16.334.474,15 (campo 311), valor que corresponde ao valor indicado na primeira declaração, acrescido do valor da correcção referida no projecto de Relatório da Inspecção Tributária;

e)      Em 20-12-2013, efectuou o pagamento da quantia de € 324.955,39, montante que calculou como sendo o imposto devido correspondente à correcção projectada pela Autoridade Tributária e Aduaneira e que foi pago na sequência do documento n.º … …, modelo P1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

f)       O Relatório da Inspecção Tributária final da inspecção referida foi notificado à B… em 24-12-2013;

g)      Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação n.º 2013 …, com data de 19-12-2013 e data de compensação de 30-12-2013, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, se indica o valor de € 324.955,39 como «Pagamento de autoliquidação» (documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

h)      Em 27-06-2014, a Requerente apresentou reclamação graciosa que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, refere:

os «atos tributários de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas («IRC») n.º 2013 …, relativo ao exercício de 2011 (Doc. 1), de demonstração de acerto de contas n.º 2013 … (Doc. 2) e de liquidação de juros compensatórios n.º 2013 … (Doc. 3), todos praticados pelo Senhor Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira» e diz que vem apresentar a reclamação graciosa «contra os referidos atos tributários e, bem assim, contra o ato de autoliquidação consubstanciado na DECLARAÇÃO MODELO 22 DE IRC DE SUBSTITUIÇÃO N.º …-… apresentada no passado dia 18 de dezembro de 2013»;

 

i)        Em 18-02-2015, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem a este processo, indicando no formulário da página electrónica do CAAD, no campo «Actos(s)» «Doc. de cobrança nº … de 2011» e no campo «Valor económico» «€ 324.955,39»;

j)         No requerimento em que pediu de constituição do tribunal arbitral, a Requerente refere, além do mais, o seguinte:

«... notificada, no passado dia 18 de novembro de 2014, da decisão de indeferimento (parcial) que recaiu sobre a reclamação graciosa dos aros tributários de liquidação de Imposto sobre o 2 Rendimento das Pessoas Coletivas («IRC»), praticados na sequência da correção realizada no âmbito do procedimento inspetivo ao exercício de 2011 da sociedade B…, titular do número único de pessoa coletiva … (Doc. 1), vem, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º-A, n.º 2, e 10.º, n.º 1, alíneas a) e n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, requerer a constituição de tribunal arbitral em matéria tributária, com vista à obtenção da declaração de ilegalidade dos mencionados atos tributários»;

(...)

«... em dezembro de 2013, a sociedade B… foi notificada do Projeto de Correções do Relatório de Inspeção Tributária, nos termos do qual a Administração tributária entendeu ser de «acrescer ao lucro tributável do ano de 2011, o montante de € 3.328.232,48» (Doc. 3)

(...)

Em consequência da projetada correção, e com o singelo propósito de beneficiar do regime excecional de regularização de dívidas de natureza fiscal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 151-A/2013, de 31 de outubro, a REQUERENTE apresentou, na qualidade de sociedade dominante do GRUPO D, a liquidação de IRC n.º …-…-…, tendo refletido aí a mencionada correção e, nessa medida, tendo acrescido à matéria coletável do grupo o indicado valor de € 3.328.232,48 (Doc.4).

(...)

Na sequência, foi emitida a guia de pagamento n.º … … para pagamento do valor do IRC resultante da referida correção, computado em € 324.955,39, pagamento esse que foi efetuado no dia 20 de dezembro de 2013, i.e., dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 2.º do regime excecional de regularização de dívidas de natureza fiscal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 151-A/2013, de 31 de outubro (Doc. 5).

(...)

Já no decurso do mês de janeiro de 2014, a REQUERENTE foi notificada da liquidação adicional de IRC n.º 2013 …, relativo ao IRC do exercício de 2011, a qual foi acompanhado da demonstração de acerto de contas n.º 2013 … e demonstração de liquidação de juros compensatórios n.º 2013 …, nos termos da qual foi apurado um valor adicional apagar de € 166.072,02, tendo estabelecido como data limite para pagamento voluntário o dia 27 de fevereiro de 2014 (Docs. 7, 8 e 9).

(...)

Não se tendo conformado com a correção efetuada pela Administração tributária a REQUERENTE apresentou, em 27 de junho de 2014, uma reclamação graciosa contra os indicados atos tributários de liquidação de IRC e de liquidação de juros compensatórios, contestando a legalidade da indicada correção (Doc. 11)

(...)

«TERMOS EM QUE,

REQUER A VV. EXCELÊNCIAS SE DIGNEM DECLARAR A ILEGALIDADE DA MENCIONADA CORREÇÃO E, NESSA MEDIDA, A ILEGALIDADE DOS ATOS DE LIQUIDAÇÃO CONSEQUENTES, DETERMINANDO-SE A ANULAÇÃO DOS MESMOS, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS» (final)

 

Antes de mais, há que esclarecer que o formulário electrónico do CAAD, preenchido pela Requerente, não tem qualquer efeito para definir o objecto do processo, pois «requerimento enviado por via electrónica ao presidente do Centro de Arbitragem Administrativa» a que alude o artigo 10.º, n.º 2, alínea b), do RJAT é o próprio pedido de constituição do tribunal arbitral e de pronúncia arbitral e não o formulário, que tem por mera função certificar o momento em que o pedido foi recebido no CAAD.

A situação procedimental que se depara nos autos apresenta características peculiares, pelo facto de a Requerente, na sequência da notificação pela Autoridade Tributária e Aduaneira de um projecto de correcção, ter efectuado autoliquidação em consonância com a correcção projectada e pelo facto de, apesar de a Autoridade Tributária e Aduaneira ter considerado que a situação estava regularizada, ter referido no Relatório da Inspecção Tributária final que, «face ao exposto, nos termos da legislação supre referida, não sendo possível determinar a realidade e indispensabilidade da operação bem como a respectiva formação do preço, será de acrescer ao lucro tributável do ano de 2011, o montante de G 3.328.232,48» e ter elaborado uma liquidação em incluiu, no âmbito das «importâncias corrigidas» o valor da autoliquidação.

Neste contexto é de entender que a Autoridade Tributária e Aduaneira confirmou a autoliquidação, com a fundamentação do Relatório da Inspecção Tributária final, incluindo-a expressamente na subsequente liquidação.

   Para além disso, no âmbito da reclamação graciosa, a Autoridade Tributária e Aduaneira elaborou a Informação n.º …-…/2014, em que continuou a falar em «correcção em preços de transferência», a fazer referência ao ponto III.1 do Relatório da Inspecção Tributária e a indicar como valor corrigido o de € 3.328.232,48 e ser esse o valor reclamado, com se vê pelo quadros que seguem:

 

Neste contexto, compreende-se a pouco precisa indicação pela Requerente do acto que é objecto de impugnação no presente processo.

Na verdade, no pedido de pronúncia arbitral, a Requerente faz alusões a uma «correcção efectuada pela Administração Tributária» que, tendo sido projectada, não foi materializada num acto tributário, por a Requerente ter efectuado autoliquidação na sequência da notificação do projecto de Relatório da Inspecção Tributária. No entanto, a correcção efectuada pela Requerente foi confirmada pelo Relatório da Inspecção Tributária final e pela subsequente liquidação.

É também compreensível, neste contexto anómalo, que na parte final do pedido de pronúncia arbitral, a Requerente formule pedidos de declaração de ilegalidade da correcção, pois, apesar de ela não ter sido efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, foi por ela confirmada no Relatório da Inspecção Tributária e na subsequente liquidação.

Mas, no contexto descrito, designadamente em face do teor da reclamação graciosa que a Requerente apresentou, em que refere que, além de reclamar dos actos de liquidação de IRC e juros compensatórios e respectiva demonstração de acerto de contas, reclama também «contra o ato de autoliquidação consubstanciado na DECLARAÇÃO MODELO 22 DE IRC DE SUBSTITUIÇÃO N.º …-… apresentada no passado dia 18 de dezembro de 2013», é manifesto que a Requerente pretende impugnar a autoliquidação, que foi confirmada e incluída na liquidação.

Com efeito, a Autoridade Tributária e Aduaneira indicou expressamente essa autoliquidação na liquidação n.º 2013 …, que efectuou, pelo que é inequívoco que interpretou como autoliquidação a actuação da Requerente subsequente à notificação do projecto do Relatório da Inspecção Tributária. Por outro lado, a extensa fundamentação da correcção que consta do Relatório da Inspecção Tributária final só é explicável como uma confirmação explícita e fundamentada da correcção efectuada pela Requerente que, assim, a Autoridade Tributária e Aduaneira também adoptou.

E, na decisão da reclamação graciosa, a Autoridade Tributária e Aduaneira fez também referência à autoliquidação, no ponto «2. Identificação do processo» referindo: «O sujeito passivo A…, S.A., doravante Reclamante, vem deduzir Reclamação Graciosa nos termos dos artigos 68.° e seguintes do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT) contra a liquidação de IRC n." 2013 … e liquidação de juros n.° 2013 …, bem assim, contra a autoliquidação da Declaração modelo 22 de IRC de substituição n.° …-…-…, referente ao período de tributação de 2011».

Eventualmente, terá sido a incorrecta actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, ao elaborar o Relatório da Inspecção Tributária final e notificá-lo à Requerente fundamentando uma correcção quando esta já estava efectuada e ao ter incluído uma referência à autoliquidação na liquidação que efectuou na sequência da inspecção os factos que poderão ter suscitado alguma confusão sobre qual o objecto do processo.

No entanto, tendo a referência à autoliquidação e ao seu valor sido incluídas nesta liquidação n.º 2013 … e sendo confirmada pela Autoridade Tributária e Aduaneira a correcção efectuada pela Requerente, compreende-se que a Requerente formule pedido da anulação da referida liquidação e dirija críticas à correcção.

De qualquer forma, sendo evidente que o que a Requerente pretende impugnar é a autoliquidação, subjacente à emissão do documento de cobrança n.º … …, baseada numa correcção por si efectuada mas que foi confirmada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, é em sintonia com essa vontade que há que interpretar a referência à anulação da liquidação que formula na parte final do pedido de pronúncia arbitral: isto é, a Requerente pretende que seja anulada a liquidação na parte em que inclui a autoliquidação, que é a única parte daquela a que imputa ilegalidade.

Sendo claro que é a legalidade da autoliquidação e da correcção nela efectuada que é controvertida, a eventual imperfeição na apresentação do requerimento, se tivesse alguma relevância para perfeito entendimento pela Autoridade Tributária e Aduaneira da matéria controvertida e da pretensão da Requerente, apenas justificaria a formulação de convite para correcção, nos termos do artigo 18.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, não permitindo concluir pela procedência de uma excepção por falta de objecto do processo, que está perfeitamente identificado como sendo a autoliquidação subjacente ao documento de cobrança n.º … … e expressamente indicada como tal na liquidação n.º 2013 ….

Por outro lado, como se vê pela Resposta apresentada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, a Autoridade Tributária e Aduaneira percebeu perfeitamente qual é a questão controvertida e a pretensão da Requerente, como já tinha percebido na decisão da reclamação graciosa, que é a legalidade da autoliquidação efectuada pela Requerente, em que se baseou o documento de cobrança n.º … …, autoliquidação essa baseada na correcção confirmada pela Autoridade Tributária e Aduaneira e incluída na liquidação n.º 2013 …, no montante de € 324.955,39, e tem subjacente a inclusão na matéria tributável da B… S.A. da quantia de € 3.328.232,48 relativa a «Correções relativas a preços de transferência (art. 63.º, n.º 8)».

Pelo exposto, é claro qual é o objecto do processo e foi perfeitamente entendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira a pretensão da Requerente, pelo que não se justifica a formulação de qualquer convite para correcção do pedido de pronúncia arbitral.

Por outro lado, para alem de ser impugnável a liquidação, a referida autoliquidação em que se baseou o documento de cobrança n.º … … é também acto impugnável, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e 2.º, alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, já que aquela autoliquidação foi previamente impugnada através de reclamação graciosa,

Assim, improcedem as excepções da falta de objecto do presente processo, que é a autoliquidação, e da inimpugnabilidade desta.

 

 

3. Matéria de facto

 

3.1. Factos provados

 

Dão-se como provados os seguintes factos:

 

a)      A Requerente A…, S.A. é a sociedade dominante do GRUPO D sujeito ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades («RETGS»), em que se inclui a sociedade B…, S.A. (adiante abreviadamente designada por «B…» ou «B» ou «B Portugal»).

b)      A B… contribuinte …, dedica-se ao fabrico de esquentadores, termoacumuladores, caldeiras, sistemas de aquecimento central e sistemas de utilização de energia solar, actividade com o código da CAE número 029720 – Fabricação de aparelhos não eléctricos;

c)      No dia 31-05-2012, a Requerente apresentou a declaração Modelo 22 de IRC relativa ao exercício de 2011 do GRUPO D, declarando, nos campos 311 e 346 do quadro 9 relativo ao apuramento da matéria colectável exercício de 2011 do GRUPO D, o valor de € 13.006.242,67, montante que se encontrava influenciado pelo lucro tributável apurado pela sociedade B… no exercício de 2011 (documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

d)     Em Setembro de 2013, a Autoridade Tributária, através da Unidade dos Grandes Contribuintes, iniciou um procedimento de inspecção externa, de âmbito parcial, ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e ao Imposto do Selo do exercício de 2011 da B…;

e)      Nesse procedimento de inspecção, a B… foi notificada para apresentar a documentação organizada em sede de preços de transferência, através do ofício n.º … de 20-06-2013 e foram pedidos esclarecimentos através de emails de 11 e 26 de Novembro de 2013;

f)       No âmbito desse procedimento de inspecção à sociedade B…, esta sociedade foi notificada do Projecto de Correções a incluir no Relatório de Inspecção Tributária, nos termos do qual a Administração tributária entendeu ser de «acrescer ao lucro tributável do ano de 2011, o montante de € 3.328.232,48», correspondente ao valor constante da nota de crédito n.º …, de 30-12-2011, emitida pela B… S.A. à C… com o descritivo de Compensation TTpayments, emitida com o valor de 4.306.400 USD;

g)      No referido projecto de correcções refere-se além do mais, o seguinte:

lll - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III.1 Custos com a estrutura comercial nos EUA - EUR 3.328.232,48

III.1.1 Das operações e seu enquadramento no regime de preços de transferência

O sujeito passivo indicou no Campo H24-Outros Encargos do Anexo H da declaração de Informação Empresarial Simplificada (IES) do ano de 2011 operações com entidades relacionadas não residentes no montante de € 4.042.692.

Questionado sobre o tipo de operações subjacentes, o mesmo informou que "o valor em causa trata-se essencialmente de custos com garantias nos mercados. Inicialmente suportados petos clientes (13%), e também custos com a estrutura comercial nos EUA. Que é um mercado estratégico para a B…, SA. sendo que a manutenção da estrutura comercial é essencial para a penetração nesse mercado (82%)"(sublinhado nosso).

Os custos de suporte/ manutenção da estrutura comercial nos EUA ascenderam a € 3.328.232,48 e estão suportados na nota de crédito n.º … de 30-12-2011 emitida pelo sujeito passivo à entidade relacionada C... (doravante C) com o descritivo Compensation TT payments. [1]

O sujeito passivo informou ainda que a nota de crédito foi emitida ao abrigo da cláusula 5.3 do contrato de distribuição ("Distribution Agreement") celebrado com a entidade relacionada acima referida, e que o montante da mesma foi apurado com base nas contas da C de novembro de 2011, em virtude de as mesmas revelarem uma margem operacional negativa de 10%, devido a alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado, e ter sido estabelecida uma margem operacional de 2% segundo política de preços de transferência adotada.

De referir que, segundo Tabela 4 do Relatório de Preços de Transferência do exercício de 2011, o volume de vendas à C ascendeu nesse ano a € 3.773.996, montante próximo do valor da nota de crédito.

As compartes no contrato de distribuição subjacente à operação identificada – B… SA (B) e C… (C) - são entidades relacionadas, ou seja, entre as mesmas existem relações especiais à luz do disposto no art. 63.º n.º 4 alínea b) do Código do IRC, segundo o qual considera-se que existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente, entre: b) Entidades em que os mesmos titulares do capital (...) detenham, direta ou indiretamente, uma participação não inferior a 10% no capital ou dos direitos de voto.

Deste modo, e em conformidade com o disposto no n.º 1 do mesmo artigo, nas operações de venda de produtos fabricados pelo sujeito passivo à C, assim como na partilha dos gastos com a estrutura comercial da empresa americana, devem ser contratados aceites e praticados lermos ou condições substancialmente idênticos aos que seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis, ou seja, deve ser respeitado o Princípio de Plena Concorrência (PPC), paradigma em que assenta o regime de Preços de Transferência, assim como as normas reguladoras desta matéria.

Segundo o n.º 6 do art. 63.º do Código do IRC. "O sujeito passivo deve manter organizada, nos termos estatuídos para o processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130.º, a documentação respeitante à política adoptada em matéria de preços de transferência, incluindo as directrizes ou instruções relativas à sua aplicação, os contratos e outros actos jurídicos celebrados com entidades que com ele estão em situação de relações especiais, com as modificações que ocorram e com informação sobre o respectivo cumprimento, a documentação e informação relativa àquelas entidades e bem assim às empresas e aos bens ou serviços usados como termo de comparação, as análises funcionais e financeiras e os dados sectoriais, e demais informação e elementos que tomou em consideração para a determinação dos termos e condições normalmente acordados, aceites ou praticados entre entidades independentes e para a selecção do método ou métodos utilizados.º

Acresce ainda que, no âmbito da matéria de preços de transferência devem ser lidas em consideração, para além das disposições do art. 63.º do Código do IRC, as normas da Portaria 1446-C/2001 de 21 de Dezembro (doravante Portaria) assim como as orientações constantes dos Relatórios da OCDE (Guidelines da OCDE), em conformidade com o disposto no preâmbulo daquela Portaria.

O dever de dispor de documentação organizada em sede de preços de transferência assim como o seu conteúdo, estão regulados nos artigos 13.º a 16.º da Portaria acima referida, tendo o sujeito passivo sido notificado para apresentar a referida documentação, através do nosso ofício n.º … de 20.06.2013.

Constata-se porém, que a documentação fornecida é omissa quanto à política de preços de transferência adotada nas operações visadas na presente análise.

Deste modo, para aferir a aceitabilidade fiscal dos custos com a estrutura comercial nos EUA, refletidos na nota de crédito acima referida, solicitaram-se esclarecimentos/ elementos adicionais através dos nossos emails de 11 e 26 de novembro de 2013, não tendo sido fornecidos os esclarecimentos/elementos necessários à comprovação da indispensabilidade dos referidos custos na esfera da empresa portuguesa, conforme se evidencia seguidamente.

III.1.2 Do Contrato de Distribuição ("Distribution Agreement") e normas de preços intra-grupo

Através do contrato de distribuição a C compromete-se a comprar em seu nome próprio e para revenda no território dos Estados Unidos E do Canadá (Território) os bens produzidos pela B identificados em anexo ao contrato (Produtos Contratados).

Ao nível da definição dos preços, destacam-se as seguintes cláusulas do artigo 3.º do contrato.

o Segundo a cláusula 3.2, os Preços dos Produtos Contratados a praticar entre a B e a C assentam no seguinte cálculo:

• Vendas líquidas da C, segundo a Lista de preços estabelecida no Território para os Produtos Contratados (descontos aferidos em termos médios), deduzidas dos Custos de Distribuição dos Produtos Contratados {estimados com base nos princípios contabilísticos do grupo D para os distribuidores), deduzidas ainda de Margem de Lucro apropriada determinada em conformidade com o Princípio de Plena Concorrência;

o A cláusula 3.3 estabelece que os preços devem ser determinados para cada ano aquando da definição do plano de negócios anual;

o Segundo a cláusula 3.4 em face de qualquer desvio significativo entre os custos efetivos e os custos planeados do distribuidor, assim como Qualquer alteração inesperada nas circunstâncias do mercado, as partes deverão analisar ao abrigo do princípio de plena concorrência se esse desvio deve ser compensado entre as partes:

o A cláusula 3.5 salienta a aplicabilidade da norma TT-VAN051, norma sobre preços intra-grupo e alocação de custos intra-grupo;

• Segundo o disposto no ponto 4.3.1 desta norma os desvios face ao plano de negócios orçamentado podem conduzir quer a ajustamentos nos preços intra-grupo quer a pagamentos compensatórios com o objetivo de garantir à entidade responsável pelas vendas o reconhecimento de um resultado adequado, salientando ainda que esses ajustamentos devem ser devidamente documentados. O referido ponto refere ainda a existência de uma margem/ intervalo de flutuação sendo de promover o ajustamento para o limite inferior quando os resultados se situarem abaixo, ou para o limite superior, quando os resultados se situarem acima.

As situações de atribuição de responsabilidade pelos desvios e consequente obrigação de compensação estão descritas no Anexo 1 ao referido documento. Segundo este Anexo as situações que são da responsabilidade da empresa produtora e que podem dar a origem a compensação respeitam a variações do preço de transferência descoordenadas sem alterações nos preços de venda da distribuidora; alterações na margem decorrentes de diferenças de câmbio desfavoráveis; custos associados à garantia do produto.

• Os desvios associados a variações nas quantidades vendidas e a variações nos preços de venda, assim como, a variações nos custos de desenvolvimento de vendas e de administração, e ainda à materialização do risco de inventários, são em termos gerais da responsabilidade da empresa distribuidora com algumas exceções, que conduzem ao reconhecimento dos mesmo; na esfera da empresa produtora através de correspondente compensação. No que se refere a variações nas quantidades vendidas, essas exceções referem-se a situações de atraso na introdução de novos produtos/entrega de produtos encomendados ou de problemas associados à qualidade dos mesmos imputáveis à unidade produtora. Em termos de variação do preço de venda, a responsabilidade pelos desvios/ perdas decorrentes poderá ser assumida pela unidade produtora caso esta tenha autorizado essa alteração (o reflexo da variação ocorrera através da revisão dos preços de transferência).

Salienta-se ainda a cláusula 5.3 inserida no artigo 5.º do contrato, respeitante à política de vendas (sales policy) segundo a qual a B, no intuito de promover a distribuição dos Produtos Contratados junto dos clientes do Território, aceita suportar parte da estrutura de custos da C no caso de se assistir a alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado. Acresce que essa partilha de custos deverá ser estabelecida entre as partes numa base anual e tendo em consideração a análise de mercado.

> Dos termos contratuais e normas vigentes no grupo resulta que a formação dos preços dos produtos vendidos pela B à C depende da atribuição à C de uma margem apropriada determinada segundo o Princípio de Plena Concorrência. Segundo informação prestada pelo sujeito passivo essa margem é de 2% (ver ponto III.1.3). No entanto, parece ser de concluir que a margem de 2% não está garantida à partida, ou seja, mesmo que tenha sido considerada aquando da fixação inicial dos preços para efeito do plano de negócios anual, os desvios entre custos estimados e custos efetivos, assim como os custos decorrentes de situações inesperadas no mercado, deverão ser objeto de análise própria e averiguação dos termos de partilha entre as partes (cláusulas 3.4 B 5.3).

111.1,3 Da conformidade da margem operacional de 2% com o PPC

Para justificar a margem operacional de 2%, o sujeito passivo exibiu parte de um documento onde se evidenciam os intervalos estatísticos de margens operacionais (2009, 2010 e 2011) de um conjunto de 8 distribuidores americanos independentes apurados para sustentar a conformidade das condições praticadas com o Princípio de Plena Concorrência (PPC).

Da aferição do indicador da margem operacional em termos médios ponderados para o período de 2009 a 2011, resultou o seguinte intervalo de comparabilidade:

De referir que não resulta do citado documento que a margem adequada à C é de 2% mas sim, que a margem operacional ponderada de 2.3% registada está dentro do intervalo encontrado e por isso é de plena concorrência. Ou seja, o estudo foi efetuado na ótica da confirmação das condições praticadas e não na ótica da definição das condições a praticar (note-se que o estudo já inclui dados de 2011).

Questionado sobre a análise funcional e os critérios de seleção subjacentes ao estudo de comparabilidade, o sujeito passivo forneceu informação adicional caracterizando a C como um distribuidor de risco limitado no mercado de equipamentos de aquecimento (aquecedores termoacumuladores. caldeiras, sistemas de aquecimento central), que utiliza ativos rotineiros, realiza funções de marketing, distribuição e vendas, assegura serviço pós-venda e funções de suporte assumindo o risco de inventário e o risco de credito, assim como, o risco de mercado, sendo este assumido de forma partilhada com o produtor dos equipamentos (produtor que assume o perfil de empreendedor).

Ao nível dos critérios de seleção de comparáveis destaca-se a consideração como critério de inclusão a participação em grupo, condição contrária à exigida pela nossa legislação. O facto de uma empresa selecionada como comparável estar inserida num grupo, conduz a que as suas demonstrações financeiras sejam o reflexo de operações que, em princípio, incluem operações vinculadas não estando garantida a sua conformidade com o PPC e por isso, não podendo ser utilizadas como referência numa análise de comparabilidade. Em face do exposto, e por estarmos perante um estudo de benchmarking envolvendo entidades que não cumprem os critérios de independência preconizados na legislação fiscal portuguesa (cfr. n.º 4 do artigo 63-º do Código do IRC), o intervalo apurado não permite concluir acerca da conformidade da margem de 2% com as condições que seriam estabelecidas entre entidades independentes.

Por outro lado, sempre se poderia argumentar se a compensação efetuada deveria possibilitar ao distribuidor uma margem operacional de 2%, ou tão só uma margem em conformidade com o princípio de plena concorrência, ou seja, desde que a margem obtida se situasse no intervalo de plena concorrência.

III.1.4 Das alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado

Relativamente à ocorrência de alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado, susceptíveis de influenciar o quantum do ajustamento subjudice, o sujeito passivo alegou o seguinte" (sublinhados nossos):

"(...) o business plan orçamentado para a C em 2011 - no que concerne à área gás and electric water heaters (GEH) – previa um volume de vendas de 41.6 milhões de USD. tendo-se verificado em termos reais um volume de vendas da cerca de 20,5 milhões de USD, justificado por condições de mercado excepcionais f...)"

" (...) em 2011 verificou-se uma queda significativa da atividade económica nos EUA, altura em que se verificou um dos mais negativos marcos históricos do sector de water heater, ou seja, foi o ano em que se construiu menos casas novas desde a II Guerra Mundial, tendo esta circunstância influenciado de forma material os resultados da C, tendo forcado a C a sair definitivamente do setor de retalho de aquecedores de água a gás (sem tanques).º

"Foi apenas devido a estas condições (severas e excepcioneis) que ocorreu o ajustamento previsto no C_contrat."

"(...) tendo sido previsto um incremento das vendas, e não um decréscimo significativo como acabou por se verificar, não foi possível ajustar o nível de custos associados de forma tão imediata (pela rigidez destes) como acabou por ocorrer do lado dos proveitos. As principais rubricas de despesas (...) respeitam a despesas de marketing. IT/consulting (introdução de novo sistema informático SAP), despesas com pessoal (...)"

> Do exposto resulta que o sujeito passivo invoca alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado no segmento de negócio dos aquecedores de água a gás (sem tanques) que conduziram a um volume de vendas inferior ao orçamentado e subsequente reconhecimento de perdas.

> Porém, o sujeito passivo não forneceu a informação financeira/documental que possa comprovar as razões invocadas, nomeadamente o relatório de gestão e as contas da empresa americana, o detalhe das rubricas de resultados por segmento de negócio, o plano de negócios orçamentado versus efetivo, ou outros documentos que ilustrem a realidade sentida no mercado americano nesse ano e o motivo de a mesma não ter sido antecipada aquando da elaboração do plano de negócios anual.

III.1.5 Do cálculo do compensation payment

O documento de cálculo do compensation payment exibido evidencia, por um lado, a existência de rubricas de gastos operacionais na esfera da C que são excluídas do cálculo (custos de projeto de Ar Condicionado, goodwill, depreciação de stocks, créditos incobráveis. margem associada à venda cie cilindros e de mercadorias adquiridas a outros distribuidores ...) e por outro, que 57% do compensation payment total é atribuído à empresa portuguesa.

Esta percentagem de imputação foi aferida com base nos resultados registados na C em outubro de 2011 e corresponde ao peso do ajustamento, necessário para garantir àquela data a margem operacional (Return on Sa/es) de 2% na venda dos produtos fornecidos pelo sujeito passivo, no total dos ajustamentos (ou seja, incluindo os ajustamentos apurados na esfera dos produtos fornecidos por outras empresas produtoras do grupo), conforme a seguir se ilustra (tabela fornecida pelo sujeito passivo): Verifica-se que o ajustamento de 2.385.000 USD apurado para o sujeito passivo em outubro de 2011 resulta da comparação da margem operacional sobre as vendas efetiva de -48,6% com a margem operacional sobre as vendas projetada de 2%.

É de salientar que convertendo em dólares o documento de suporte do cálculo do compensation payment exibido resulta que o mesmo tem por base um volume de vendas líquido, segundo projeções de novembro de 2011, de 61.025.000 USD (43.586.000 EUR; Taxa de câmbio EUR/USD = 1.4), ou seja, valor superior em cerca de 50% ao total constante da tabela acima, 44.913.000 USD. Ao mesmo tempo, a demonstração de resultados da C para o período de 01-01-2011 a 31-12-2011, ou seja, ano 2011 reflete um volume de vendas efetivo de 76.694.000 USD.

> Face ao exposto, para verificação do cálculo do ajustamento, afigura-se necessário conhecer as rubricas de gastos e respetivos critérios de imputação, subjacentes ao apuramento da Margem Operacional dos produtos fornecidos pela empresa portuguesa (B), ou seja, -48,6%.

> Ao mesmo tempo, considerando que o ajustamento foi calculado com base no volume de vendas da C em outubro de 2011, e que este sofreu uma evolução substancial nos dois meses seguintes, torna-se pertinente averiguar o impacto dessa evolução ao nível desse cálculo para validar a adequabilidade do mesmo.

Acresce uma vez mais que não foi demonstrado pelo sujeito passivo que o ajustamento necessário a permitir uma rentabilidade operacional de 2% ao distribuidor está em conformidade com o princípio de plena concorrência. Dito de outra forma, não se demonstrou que a rentabilidade proporcionada ao distribuidor, atendendo nomeadamente à cláusula 3.4. do contrato, se encontra situada no ponto do intervalo que melhor reflecte os factos e circunstâncias da operação vinculada em apreço (vide §1.48 das orientações da OCDE).

III.1.6 Conclusão

De tudo o exposto é de concluir que o sujeito passivo não forneceu todos os esclarecimentos e elementos necessários à comprovação da aceitabilidade dos custos com a estrutura comercial dos EUA subjacente a nota de crédito emitida.

Este facto resulta no inadimplemento do sujeito passivo quanto às obrigações de prestação de informação consagradas no n.º 6 do art. 63.º do CIRC e regulamentadas pela Portaria, não sendo assim possível concluir sobre a aplicação do princípio de plena concorrência.

Com efeito, se por um lado, o estudo de comparabilidade exibido não permite aferir a conformidade ou desconformidade da margem de 2% com as condições que seriam estabelecidas entre entidades independentes, por não ser consentâneo com a legislação vigente em Portugal, por outro, ainda que esse estudo não seja posto em causa, o sujeito passivo não comprovou nem a quantificação dos custos imputados, nem que o ajustamento era devido tendo em vista garantir uma rentabilidade de plena concorrência ao distribuidor.

A obrigação de prestação de informação consagrada no n.º 6 do art. 63.º do CIRC, conjugada com o n º 1 do art. 74.º da LGT, permite concluir que o ónus de demonstração da aderência ao Princípio de Plena Concorrência recai sobre o sujeito passivo, revertendo para a Administração Fiscal quando verificada a inobservância por parte do sujeito passivo dos requisitos enunciados na Lei e se pretenda proceder à correcção do lucro tributável (cfr. n.º 3 do art. 77.º da LGT)

Salienta-se ainda que o sujeito passivo está obrigado a cooperar na descoberta da verdade material, conforme resulta do Princípio da Cooperação estatuído no art. 59.º da LGT e art. 9.º do RCPIT. Destaca-se pois que, para além da obrigatoriedade da informação solicitada constar no Dossier de Preços de Transferência de 2011, (o qual deverá estar devidamente organizado no prazo estabelecido nos art. 130.º e 117.º do CIRC), o sujeito passivo dispôs de prazo para apresentar a documentação que permita aferir a conformidade da operação ao princípio de plena concorrência.

Adicionalmente, e nos termos do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, consideram-se gastos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. A presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (n.º 1 do art. 75.º da LGT), poderá ser abalada havendo factos susceptíveis para tal, passando o contribuinte a ter o ónus da prova de que as operações apresentam os requisitos enunciados no n.º 1 do art. 23.º do CIRC,

Igualmente no mesmo sentido, o n.º 2 do art. 75.º da LGT estatui que a presunção de veracidade da escrita do contribuinte não se verifica quando "o contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações".

Ora, no caso em apreço, e por força de aplicação da legislação prevista no art 63º do CIRC, e respectiva Portaria, e do inadimplemento das obrigações acessórias aí previstas, não foi possível determinar quer a necessidade económica e indispensabilidade das operações controvertidas quer a fixação do seu preço, apesar das diligências realizadas pela Administração Fiscal para obter a informação e documentação previstas como obrigações acessórias dos sujeitos passivos.

Deste modo, conjugando tudo o que foi exposto anteriormente, concluímos que os gastos controvertidos não foram comprovadamente indispensáveis para a realização dos rendimentos ou a manutenção da fonte produtora.

Assim, face ao exposto, nos termos da legislação supre referida, não sendo possível determinar a realidade e indispensabilidade da operação bem como a respectiva formação do preço, será de acrescer ao lucro tributável do ano de 2011, o montante de € 3.328.232,48.

h)      Em 17-12-2013, na sequência da notificação do Projecto de Relatório da Inspecção Tributária, a B apresentou a declaração de substituição n.º …-…-…, cuja cópia consta do processo administrativo («documento Pa5.pdf»), cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, no campo 744, relativo a «Correções relativas a preços de transferência (art. 63.º, n.º 8)», a quantia de € 3.328.232,48;

i)        Ainda na sequência da notificação referida na alínea anterior, a Requerente apresentou a declaração de substituição modelo 22 do grupo de que é sociedade dominante, cuja cópia consta do documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, indicou como matéria colectável € 16.334.474,15 (campo 311), valor que corresponde ao valor indicado na primeira declaração, acrescido do valor da correcção referida no projecto de Relatório da Inspecção Tributária;

j)        Para beneficiar do regime excepcional de regularização de dívidas aprovado pelo Decreto-Lei n.º 151-A/2013, de 31 de Outubro, a Requerente, em 20-12-2013, efectuou o pagamento da quantia de € 324.955,39, montante que calculou como sendo o imposto devido correspondente à correcção projectada pela Autoridade Tributária e Aduaneira e que foi pago na sequência do documento n.º … …, modelo P1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

k)      Em 24-12-2013, foi notificado à B o Relatório da Final da Inspecção Tributária, em que foi mantida a fundamentação da correcção projectada da matéria colectável, no montante de € 3.328.232,48, mas em que se refere que a aquela empresa, em 17-12-2013 ( [2] ), havia apresentado Declaração Modelo 22 de substituição do período de 2011 com o n.º …-…-…;

l)        Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação n.º 2013 …, com data de 19-12-2013, data de compensação de 30-12-2013 e data limite de pagamento voluntário de 27-02-2014, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, se indica o valor de € 324.955,39 como «Pagamento de autoliquidação» (documento n.º 7 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

m)    Em 26-02-2014, a Requerente pagou a quantia liquidada, no montante de € 166.072,02 (documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, que não foi questionado pela Autoridade Tributária e Aduaneira);

n)      Em 27-06-2014, a Requerente apresentou reclamação graciosa, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, refere os «atos tributários de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas («IRC») n.º 2013 …, relativo ao exercício de 2011 (Doc. 1), de demonstração de acerto de contas n.º 2013 … (Doc. 2) e de liquidação de juros compensatórios n.º 2013 … (Doe. 3), todos praticados pelo Senhor Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira» e diz que vem apresentar a reclamação graciosa «contra os  referidos atos tributários e, bem assim, contra o ato de autoliquidação consubstanciado na DECLARAÇÃO MODELO 22 DE IRC DE SUBSTITUIÇÃO N.º …-… apresentada no passado dia 18 de dezembro de 2013»;

o)      A reclamação graciosa foi indeferida na parte respeitante à alteração da matéria tributável efectuada pela Requerente, no montante de € 3.328.232,48 e à consequente autoliquidação no montante de € 324.955,39;

p)      A decisão de indeferimento da reclamação graciosa baseou-se numa informação que consta do documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

Da documentação respeitante à política adotada em matéria de preços de transferência

De acordo com o Relatório final, a correção reclamada foi promovida em virtude do sujeito passivo, B, não ter fornecido «todos os esclarecimentos e elementos necessários à comprovação da aceitabilidade dos custos com a estrutura comercial dos EUA subjacente à nota de crédito emitida1», faclo que resultou no inadimplemento da obrigação consagrada no n.º 6 do art. 63.º do Código do IRC, não sendo possível concluir pela conformidade ou desconformidade das operações com o Princípio de Plena Concorrência estabelecido no n.º 1 da mesma disposição lega).

Os elementos e esclarecimentos em falta respeitam, não só à comprovação da conformidade da margem de 2% atribuída à C, enquanto distribuidor de risco limitado, com as condições que seriam praticadas entre entidades independentes em condições comparáveis, quer em circunstâncias normais de mercado, quer em circunstâncias extraordinárias, e tendo em consideração o enquadramento legislativo vigente em Portugal, como também à comprovação das rubricas consideradas no cálculo do montante da nota de crédito emitida e à sustentação de que as mesmas têm cabimento nesse cálculo, atendendo à política de grupo e aos lermos do contraio de distribuição estabelecido entre as partes envolvidas.

No contexto da justificação da aplicação da margem de 2%, refere a Reclamante que, «no âmbito da ação de inspeção realizada ao período de 2011, a sociedade B… disponibilizou à Autoridade Tributária parte de um documento interno "...onde se evidenciam os intervalos estatísticos de margens operacionais (2009, 2010 e 2011) de um conjunto de 8 distribuidores americanos independentes apurados para sustentar a conformidade das condições praticadas com o Princípio de Plena Concorrência."»

Ora, em relação à ação inspetiva, onde os serviços de inspeção denotaram que o documento em questão não demonstra que a margem operacional adequada à C é de 2% mas tão-só que a margem operacional de 2,3% se encontra dentro do intervalo encontrado registada e por isso é de plena concorrência, nada de novo é adiantado pela Reclamante, reconhecendo de facto o objetivo desta documentação «de confirmar que as condições praticadas são consistentes com o PPC numa ótica ex-post e este procedimento é perfeitamente aceitável e encontra-se previsto nas Orientações da OCDE de preços de transferência.»

Não obstante, é de referir, por mero dever de raciocínio, que igualmente se concluiria pelo posicionamento da margem da C no intervalo encontrado, caso a margem efetiva da empresa se situasse em níveis negativos de -10% (mínimo do intervalo é -11,1%), por exemplo ou, caso se considere o intervalo interquartil, em 1,9% (1.º Quartil) razão pela qual se refere no relatório de inspeção que "sempre se poderia argumentar se a compensação efetuada deveria possibilitar ao distribuidor uma margem operacional de 2%, ou tão só uma margem em conformidade com o princípio de plena concorrência, ou seja, desde que a margem obtida se situasse no intervalo de plena concorrência."

Independentemente da sua aceitabilidade, fato é que as entidades comparáveis utilizadas no referido estudo, e isto já foi aludido no Relatório final, incluem entidades inseridas em grupos situação divergente da acolhida pela legislação portuguesa atendendo ao conceito de relações especiais preconizado nas alíneas do n.º 4 do art. 63.º do Código do IRC.

Assim, cumprir com os critérios de seleção de entidades comparáveis da legislação Norte-americana, como alega a Reclamante fazer, é simplesmente irrelevante dado que estes diferem dos da lei portuguesa.

E a este respeito não se pode também ignorar a recomendação expressa no parágrafo 3.25 das Guidelines da OCDE de não tomar como comparável, operações (e/ou entidades) que não obedeçam ao critério da independência, podendo, no entanto essa informação ser utilizada para efeitos de avaliação de risco.

Mas, conforme já referido, não só isso determinou os serviços de inspeção a decidirem pelo incumprimento da obrigação constante do n.º 6 do art. 63.º do Código do IRC.

No decurso da ação inspetiva, a B foi interpelada a prestar esclarecimentos sobre o cálculo do ajustamento, nomeadamente, discriminar a estrutura de custos da C e o impacto das alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado nesse cálculo.

Conforme já mencionado no Relatório de Inspeção o sujeito passivo invocou "alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado no segmento de negócio dos aquecedores de água a gás (sem tanques) que conduziram a um volume de vendas inferior ao orçamentado e subsequente reconhecimento de perdas", mas "não forneceu a informação financeira/documental que possa comprovar as razões invocadas, nomeadamente o relatório de gestão e as contas da empresa americana, o detalhe das rubricas de resultados por segmento de negócio, o plano de negócios orçamentado versus efetivo, ou outros documentos que ilustrem a realidade sentida no mercado americano nesse ano e o motivo de a mesma não ter sido antecipada aquando da elaboração do plano de negócios anual".

Acresce que, das cláusulas 3.4 e 5.3 do "Distribution Agreement", resulta que a aplicação da margem operacional de 2% à partida não está garantida, encontrando-se dependente de desvios entre custos estimados e custos efetivos, bem como custos decorrentes de situações inesperadas no mercado, que deverão ser objeto de análise própria e averiguação dos termos de partilha entre as partes.

Em sede do procedimento inspetivo, o sujeito passivo não demonstrou que a rentabilidade proporcionada ao distribuidor, atendendo nomeadamente à cláusula 3.4. do contrato, se encontra situada no ponto do intervalo que melhor reflecte os factos e circunstâncias da operação vinculada em apreço (vide §1.48 das orientações da OCDE)

Não obstante ter fornecido uma exposição mais detalhada do enquadramento do modelo de negócio adotado no grupo e das alterações inesperadas sentidas em 2011 no mercado norte-americano, assim como na ação inspetiva, nesta sede, a Reclamante falha em demonstrar o como chegou a certas conclusões essenciais ao apuramento da Margem Operacional dos produtos fornecidos pela empresa portuguesa.

Nisto, assume particular relevância a utilização de métodos diretos e indiretos de imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras, cujo a Reclamante, ou a B, não demonstram qual ou quais nem a que regras obedecem, e a chave de alocação cuja demonstração da adequabilidade é manifestamente insuficiente.

Com efeito, a Reclamante refere a utilização de métodos diretos e indiretos de imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras sem no entanto concretizar e é neste ponto que se enquadra um dos fundamentos principais da correção com base no inadimplemento de obrigação acessória.

Ora, em sede graciosa a Reclamante mantém-se omissa na questão.

Segundo a informação disponibilizada nos relatórios de preços de transferência, o volume de vendas de produtos à C pela B em 2011, ascendeu a € 3,8M, se bem que a tabela constante do parágrafo 141. da reclamação revela que os gastos imputados aos fornecimentos da empresa portuguesa de janeiro a outubro daquele ano ascenderam a € 7 Milhões, ou seja, quase o dobro das operações da B com a C.

 Importará referir também uma incoerência relativa aos valores da tabela apresentada na reclamação, cifrando-se estes em euros mas são equivalentes aos que constam da tabela fornecida pela B no decurso da ação inspetiva assim como no documento "Resposta AT B….pdf.

Trata-se de erro induzido pela própria B devido a inexatidão dos documentos exibidos.

Num outro ponto, a Reclamante comenta "relativamente à chave de alocação, baseada na proporção dos ajustamentos necessários para proceder à aplicação da política de preços de transferência adotada, entendemos que esta reflete, de forma adequada, o nível de esforço -neste caso em termos de riscos e custos partilhados - de cada um dos participantes (neste caso dos entrepreneurs)."

Ora, considera-se que a argumentação presente neste parágrafo quanto à adequabilidade da chave de alocação é, no mínimo, paupérrima, não permitindo concluir pela adequabilidade da chave de alocação em apreciação.

A chave de alocação baseia-se em ajustamentos calculados com base em dados reais da atividade da C no período decorrente entre janeiro a outubro, logo, sendo possível determinar os ajustamentos relativos a este intervalo, também deveria ser possível determinar para todo o ano, nos mesmos moldes.

Questiona-se assim por que não o é feito e por que razão é necessária esta chave de alocação.

Note-se que estas questões não foram levantadas na fundamentação constante do Relatório final, cingindo-se os serviços de inspeção ao aspeto particular da falta de clarificação dos critérios de imputação dos gastos à B.

Segundo a informação prestada na tabela constante do parágrafo 153., e o disposto no parágrafo 157., alínea b), a Reclamante está a comparar o valor efetivo das vendas (excluindo vendas …/…) de dezembro convertidas em euros com a taxa de câmbio de dezembro" – o equivalente a € 41,6M — com as vendas provisionais em euros resultantes da utilização da taxa de câmbio de out - o equivalente a e 43.6M.

Nisto conclui por uma aproximação entre os valores reais e previsionais que, calculada com este diferencial, não é inteiramente precisa, para além de que o volume de vendas considerado na determinação da chave de alocação é da ordem dos € 32M.

Ainda a respeito da chave de alocação, a Reclamante apresenta, segundo detalhe do cálculo da compensação, na tabela constante do parágrafo 158., valores efetivos referentes a dezembro de 2011, o que origina uma alocação correspondente a 53,4% para s B, mas mais uma vez não demonstra o cálculo.

Do erro sobre a inversão do ónus da prova

A este respeito, estamos plenamente de acordo com a leitura da lei efetuada pela Reclamante no que ao ónus da prova respeita.

No entanto, a Reclamante alega ter cumprido com todas as suas obrigações fiscais, neste caso as obrigações acessórias decorrentes do n.º 6 do art. 63.º do Código do IRC quando de facto, pelo que já foi referido no tópico que antecede, não cumpriu.

Como já foi referido, a aplicação da margem operacional de 2% à partida não está garantida, encontrando-se dependente de desvios entre custos estimados e custos efetivos, bem como custos decorrentes de situações inesperadas no mercado.

Ora, considerando que existiram "alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado no segmento de negócio dos aquecedores de água a gás (sem tanques) que conduziram a um volume de vendas inferior ao orçamentado e subsequente reconhecimento de perdas", deverá ser a aplicação desta margem operacional objeto de análise própria e averiguação dos termos de partilha entre as partes.

Nas palavras de E, Inspetor Principal da DGCI, trazidas a colação pela mão da Reclamante, "o não cumprimento, pelo contribuinte, destas obrigações tem como consequência a inversão do ónus da prova, ou seja, caberá ao contribuinte provar que cumpriu as regras relativas às operações efetuadas com as entidades com as quais se encontra em situação de relações especiais".

Nessa medida, caberá à Reclamante demonstrar e justificar à luz das orientações em matéria de preços de transferência os procedimentos atinentes à imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras, e à utilização da chave de alocação, que suportam as conclusões por si apresentadas, de modo a ilustrar a sua conformidade com o PPC.

Apenas nesse cenário, em face das justificações apresentadas caberia à AT verificar sobre a sua conformação ou não com o PPC, e no caso de não conformação demonstrar porquê.

Da falta de fundamentação quanto à rejeição do método apresentado pela Reclamante

Afirma a Reclamante que os serviços de inspeção limitaram-se a rejeitar a "metodologia apresentada em sede de preços de transferência sem, em contrapartida, identificar qualquer metodologia alternativa ou, sequer, fundamentar em que medida a metodologia adotada poderia conduzir a uma distorção do princípio da plena concorrência."

Reitere-se, não pode a AT, sem estar na posse de todos elementos necessários a comprovação das condições acordadas pela B nas operações vinculadas sob apreciação, pronunciar-se sobre a sua conformação com o PPC, logo não pode a Reclamante exigir que a AT venha "fixar os fatores de comparabilidade pertinentes e selecionar o método mais apropriado para a respetiva comparação, (...) identificar os termos de operações comparáveis realizadas por entidades independentes, (...) demonstrar se — em que medida — de terminada operação vinculada só desviou das condições impostas pelo princípio de plena concorrência."

Tal como a Reclamante afirma haver uma "impossibilidade de realizar uma análise contraditória detalhada da - inexistente - demonstração da verificação das condições de aplicação do regime dos preços de transferência à sociedade B…, também a AT se encontra condicionada por esta mesma prerrogativa, já que existem várias omissões, anteriormente mencionadas e melhor desenvolvidas no tópico subsequente, que impossibilitam também a AT de fazer essa mesma análise.

Da (in)comprovada implementação de condições conformes com o princípio de plena concorrência

Após uma cuidada análise deste tópico, e apesar de já ter sido feito e aceite no decurso da ação inspetiva todo o enquadramento a respeito do modelo de negócio, do contrato de distribuição, normas de preços e política de pricing intra-grupo, cálculo da Return on Sales de mercado, realidade do mercado (alterações inesperadas do mercado), a verdade é que as mesmas reservas levantadas na ação inspetiva se mantém.

Mas também outras se levantam, não fosse a informação respeitante à análise funcional constante do Dossiê de Preços de Transferência (DPT) de 2011 quando comparada com a das tabelas fornecidas pela Reclamante nesta sede e nos documentos fornecidos na análise, relativos especificamente à B e à C.

Verifique-se que, no que respeita às funções marketing, distribuição e vendas, a tabela 1 da reclamação difere da tabela que consta da resposta dada pelo sujeito passivo no âmbito do procedimento.

A este propósito, refere o DPT o seguinte (sublinhado nosso): "Marketing, vendas e distribuição

O Grupo D é responsável pelo desenvolvimento da estratégia de marketing global, sendo que as subsidiárias adoptam a estratégia definida centralmente pelo Grupo procedendo às necessárias adaptações à realidade local onde estão inseridas.

A B… assume os custos com a promoção e marketing local associados aos produtos manufacturados em Portugal. Ato que respeita aos mercados atém fronteiras, os custos associados a este tipo de iniciativas são suportados pelo Grupo."

Estes aspetos da análise funcional poderiam ser relevantes para efeitos de perceber que tipo de gastos são da responsabilidade da B, até porque algumas das situações atípicas verificadas em 2011 resultam de alterações de estratégia de posicionamento no mercado e investimentos na melhoria da perceção da marca no mercado (ver parágrafo 106. da reclamação).

Ou seja, temos por um lado a justificação da metodologia de pricing, por outro, o problema da quantificação do ajustamento e, em associação a estes dois fatores, a perceção da adequabilidade de imputação dos gastos a Portugal atendendo à análise funcional das entidades envolvidas e do grupo em que estão inseridas.

Posto isto, o tipo de gastos da C considerados imputáveis aos fornecimentos efetuados pela empresa portuguesa tem de ser discriminado para se perceber se a política de preços de transferência esta a ser corretamente implementada, não só devido à aplicação da margem dos 2% mas também no que respeita à correta alocação dos gastos entre as empresas do grupo, tendo em conta a análise funcional.

Após tudo o exposto, parece que, e não obstante a melhor sustentação/evidência da situação económica da empresa americana em termos dos fatores conjunturais e da estratégia do negócio adoptada, assim como da política de preços de transferência implementada face ao modelo de negócio existente e inerente alocação de funções, ativos e riscos no Grupo, permanece pouco claro o apuramento do contributo da B para os resultados negativos da C o qual tem impacto na determinação do ajustamento imputável à empresa em Portugal.

4.1.4 Conclusão e proposta de decisão

Em suma, a Reclamante não demonstra, assim como no decurso da ação inspetiva a B não demonstrou, os métodos diretos e indiretos na imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras que usa e o seu cálculo, sendo igualmente omissa em demonstrar a adequabilidade da chave de alocação ou o seu cálculo, pelo que não pode ser dado provimento ao pedido formulado.

 

q)      Os mercados norte-americano e canadiano, no sector particular da termotecnologia, são estratégicos para o GRUPO D, pela sua dimensão e por os seus principais concorrentes terem neles uma forte implementação (depoimento da testemunha F):

r)       O GRUPO D adoptou para a área da termotecnologia um modelo de negócio integrado, no qual as várias entidades que nele participam desenvolvem -- nos mercados dos Estados Unidos da América e do Canadá -- o respectivo negócio em conjunto e de forma concertada (depoimentos das testemunhas F e G);

s)       De acordo com o modelo de negócios adoptado pelo GRUPO D, A B… e outras sociedades do grupo D utilizam a C… (abreviadamente designada como “C”) como plataforma comercial comum no território dos Estados Unidos da América e do Canadá (depoimentos das testemunhas F, G e H);

t)       A B… produz produtos industriais e vende-os à C para posterior revenda nos mercados norte-americano e canadiano (testemunhas G e H);

u)      De acordo com o modelo de negócio implementado na área da termotecno]ogia:

i) Os entrepreneurs ou os principais gerem e controlam, nomeadamente em termos de estratégia a implementar, o negócio e, simultaneamente, centralizam, não só os riscos e os activos relevantes, mas também os lucros ou perdas associados à respectiva área de negócio; e, ii) O distribuidor rotineiro (contratualmente designado porfirm ou distributor), como é o caso da C, actua em nome próprio na condução das suas actividades específicas de distribuição, seguindo a orientação dos entrepreneurs quanto ao restante, nomeadamente em termos de política e de estratégia comerciais (testemunhas G e H);

De acordo com o modelo adoptado pelo grupo D, o distribuidor rotineiro tem um poder de decisão reduzido, limitando-se a realizar, sob aquelas orientações, a promoção e a venda dos produtos nos diferentes canais de distribuição identificados pelos entrepreneurs, operacionalizando, deste modo, as diversas estratégias comerciais locais, incluindo as relativas à penetração no mercado, à promoção das vendas, ao desenvolvimento de campanhas de marketing local, e à avaliação da satisfação dos clientes nos diferentes canais (testemunhas G e H);

v)      Em 27-08-2012 (depois da inclusão de assinaturas também em 10-03-2012 e 10-04-2012) foi formalizado entre a B… e a C o Contrato de Distribuição («Distribution Agreement») que consta do documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, nos termos do qual a primeira se obrigou a vender à segunda, e esta obrigou-se a comprar, determinados produtos listados no anexo ao respectivo contrato, como vista à sua subsequente distribuição e revenda, em nome e por conta própria da C, no território dos Estados Unidos da América e do Canadá;

w)     Nos termos do referido contrato, o preço de venda dos produtos seriam acordados entre as partes para cada exercício antecipadamente com base no plano de negócios previsto para o próximo ano financeiro e os preços seriam baseados nas listas de preços de venda líquidos de descontos médios e deduzidos dos encargos previstos para a actividade de distribuição, baseados nos princípios contabilísticos do grupo D para os distribuidores e, de uma margem de lucro acordada entre as partes tendo por base o princípio da plena concorrência;

x)      Na cláusula 3.4 do referido contrato estabeleceu-se que, para qualquer desvio significativo entre o custo real e o custo planeado do distribuidor, bem como para qualquer mudança inesperada significativa do mercado as partes analisariam se tal desvio deveria ser resolvido entre as Partes tendo em conta o princípio da plena concorrência;

y)      Nos termos da cláusula 3.5. do referido contrato, seria aplicada a norma de preços intra-grupo TT-VAN051, cuja cópia consta do documento n.º 14, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;

z)       Na cláusula 7 do contrato refere-se que o contrato entrará em vigor em 01-02-2012 («This Agreement shall become effective on January l, 2012 after it has been signed by the parties hereto»).

aa)   Estabeleceu-se ainda no referido contrato que, para promover a distribuição dos produtos aos clientes situados naqueles territórios, a B… concordava em apoiar parte dos custos de estrutura suportados pela C em caso de qualquer mudança inesperada significativa da situação do mercado e que e que a quota de custo seria resolvida entre as partes, numa base anual, mediante análise da situação do mercado (ponto 5.3. do contrato);

bb)  Em regra, o plano de negócios da B… -- que incorpora as estratégias empresarias e comerciais a implementar nos mercados internacionais -- começa a ser preparado nos meses de Junho e Agosto do ano N-1, com base na informação disponível no momento, nomeadamente a evolução de negócios até à data, as estimativas de evolução da actividade durante o segundo semestre desse ano, as estratégias empresariais e os objetivos definidos de forma mais recente para os mercados em que a sociedade B… se encontra presente (depoimento da testemunha G);

cc)   Com uma periocidade trimestral, são elaborados relatórios sobre a actividade do segmento DW-Domestic Hot Water, que permitem à B… analisar a evolução das estratégias comerciais definidas, bem como aferir da ponderação de eventuais alinhamentos (pontuais ou mais relevantes) às estratégias inicialmente definidas (depoimento da testemunha G);

dd)  O plano de negócios anual é posteriormente revisto no mês de Maio, Setembro e Dezembro do ano N, de forma a incorporar as melhores estimativas e expectativas em relação ao negócio e à sua evolução (à data) e, bem assim, os pressupostos assumidos na elaboração do mesmo, nomeadamente em termos de repartição dos encargos directos e indirectos entre os entrepreneurs (depoimentos das testemunhas F e G);

ee)    A metodologia observada pelo GRUPO D na alocação dos gastos e rendimentos a cada um dos entrepreneurs para efeitos de elaboração do correspondente plano de negócios é, essencialmente, a seguinte:

( i )  A estimativa referente às rubricas de vendas («net sales») e ao custo de mercadorias («material costs») é alocada de forma directa, isto é, com base no mercado de origem;

( ii ) Relativamente aos demais encargos, designados por «operating expense»>, com, em regra, uma menor expressão nas demonstrações de resultados da C (e em conformidade com o modelo de negócio estabelecido no seio do GRUPO D), os mesmos são estimados tendo por base informação histórica de gestão e/ou dados prospectivos, nomeadamente quando em presença de encargos que se estimem como certos para um determinado período;

( iii ) Tais operating expenses compreendem, quer encargos variáveis, quer encargos fìxos; 

( iv ) Para efeitos de gestão, toda a tipologia de operating expenses é alocada por família de produtos e categoria de produtos, bem como por canal de distribuição («retail» ou «wholesale»), ou ainda por mercado de atuação (EUA ou Canadá), com o objetivo de serem tomadas decisões de gestão pelos entrepreneurs (depoimentos das testemunhas F e G);

ff)     Os encargos com armazenagem são alocados pelas vendas realizadas pela C por mercado de origem (depoimentos das testemunhas F e G);

gg)   As políticas de preços estabelecidas do GRUPO D para os territórios norte-americano e canadiano têm vindo a ser definidas por referência à evolução de negócio desde o ano de 1993 (depoimentos das testemunhas H e G);

hh)   Foram definidas, durante o 3.º trimestre de 2010 e no âmbito da preparação do plano de negócios para o ano de 2011, as margens target de preços de transferência para a C (depoimento da testemunha G);

ii)       A definição da política de preços foi baseada num benchmarking funcional, realizado em meados de 2010 por um consultor independente - a I, tendo sido identificada uma amostra final de distribuidores por grosso de bens duradouros a operar no mercado Norte-Americano, a qual foi seleccionada atendendo aos critérios de comparabilidade considerados relevantes, bem como considerando as melhores práticas e o regime norte-americano de preços de transferência (depoimento da testemunha G);

jj)       Para definição dessa política de preços, o conjunto final de distribuidores por grosso de bens duradouros a operar no mercado Norte-Americano, no triénio 2007-2009, foi composto pelas seguintes empresas: (i) J.; (ii) K.; (iii) L.; (iv) M.; (v) N.; (vi) O; (vii) P.; (viii) Q; (xix) R.; e (x) S sendo encontrados os seguintes valores: (depoimento da testemunha G)

kk)   Tendo por base a pesquisa realizada (e, em particular, utilizando como referencial a mediana), foi definido em cerca de 2% o ROS target a adoptar pela C (depoimento da testemunha G);

ll)       Esta política de preços de transferência foi definida em momento anterior a 2011 (numa óptica ex-ante), tendo sido posteriormente validada a sua natureza de plena concorrência para efeitos da documentação de preços de transferência de 2011 da C (ou seja, numa óptica ex-post) (depoimento da testemunha G);

mm)         Os entrepreneurs (entre os quais a sociedade B…) elaboraram o respetivo plano de negócios para 2011 por forma a assegurar à C uma margem de lucro referencial (o referido ROS ou «Return On Saleg,) de 2%, margem que se encontrava alinhada com o intervalo de ])lena concorrência apurado para o mercado Norte-Americano, tendo flxado, a essa luz, os preços intra-grupo a praticar durante o ano de 2011 (depoimento da testemunha G);

nn)   O declínio do sector da construção habitacional e da economia nacional, verifìcado em particular desde 2008 com o início da crise financeira, alteraram não só a estrutura, como também as relações do lado da procura e da oferta do sector em que a C actua (depoimento da testemunha F);

oo)   As circunstâncias macroeconómicas tiveram uma influência significativa nos planos de compra de sistemas de aquecimento de água por parte dos consumidores dos mercados Norte-Americano e Canadiano (depoimento da testemunha F);

pp)   O elevado número de habitações para venda naqueles mercados, o aumento dos preços do petróleo e do gás natural (um aumento de 30% no preço do petróleo a partir de Outubro de 2011) e a redução gradual (até 2011 inclusive) dos incentivos para a aquisição de produtos de maior eficiência energética, foram alguns dos factores que conduziram à redução das vendas de esquentadores e caldeiras durante o período referido (depoimento da testemunha F);

qq)   O mercado dos esquentadores de água residenciais durante o ano de 2011 registou quebras significativas em relação aos meses homólogos de 2010, em particular nos meses de Janeiro (8)%, Fevereiro (6)%, Abril (4)%, Julho (22)%, mas, também no próprio ano e em relação ao mês imediatamente anterior, em particular em Abril (26)%, Maio (7)%, Julho (34)% e Outubro (17)%,, o que foi B… neste mercado (depoimento da testemunha F);

rr)     Em regra, os consumidores preferem, sobretudo em tempos de conjuntura macroeconómica recessiva, realizar determinadas atividades/tarefas (consideradas de rotina e frequentemente denominadas por "do-it-yourself) através dos seus próprios meios, ao invés de contratarem entidades especializadas para este efeito (depoimento da testemunha F);

ss)    Esta circunstância tem implicado a incorrecta instalação e utilização dos produtos da B…, constituindo esta a principal causa de devolução destes bens ao retalhista e, subsequentemente à C (depoimento da testemunha F);

tt)     Em resultado de diversos problemas de qualidade, não resolvidos, verificados em diversos produtos comercializados pela C, a cadeia de distribuição americana T deixou de comercializar, a partir de Janeiro de 2011, alguns produtos da C e esta pagou àquela uma indemnização no valor de 1.000.000 USD e suportou elevados gastos com a devolução/recompra dos produtos defeituosos, incluindo, os relativos ao transporte e outras taxas (depoimento da testemunha F);

uu)   Estas circunstâncias prejudiciais para a C não foram consideradas, por não terem sido antecipadas, na preparação do piano de negócios de 2011 da C, razão pela qual não foi incorporada no mesmo uma quebra efectiva de vendas em 2011, face ao mesmo período de 2010, em cerca de 176%, num montante total de USD 2.432.726, correspondente a 5% do seu volume de negócios (depoimento da testemunha F);

vv)  O RIS Real da C apurado em Novembro de 2011 foi calculado nos seguintes termos (com base nos valores reais do período de Janeiro a Outubro de 2011 (depoimentos das testemunhas F e G):

ww)         Se da análise realizada com base na informação fìnanceira disponível em Novembro de cada ano se inferior que a performance da C não permite atribuir à mesma uma remuneração adequada ao seu perfil funcional de risco rotineiro e convergente com o ROS target previamente fixado) haverá lugar ao apuramento de uma compensação devida pelos respetivos entrepreneurs, incluindo a B… (depoimentos das testemunhas H e G);

xx)    O objectivo desta compensação é o de repor o ROS médio da C no intervalo inter-quartil apurado no respectivo estudo de preços de transferência, dando assim cumprimento à política de preços acordada no Contrato de Distribuição e imposta pela norma de preços intra-grupo TTVAN-051 (depoimentos das testemunhas H e G);

yy)  Tendo o grupo da Requerente concluído, com base na informação financeira disponível em Novembro de 2011, pela necessidade de repor o ROS target de 2% fixado para a TFNA, através da atribuição de uma compensação, motivada, conforme observado acima, pelo desvio verificado entre o plano de negócios inicialmente aprovado - com base no qual foram, por seu turno, inicialmente fixados os preços a praticar durante esse mesmo ano de 2011 - e os encargos efectivamente suportados pela C nesse período quantificou o valor da referida compensação, o qual veio a ser apurado no final do mês de Novembro (CurrentForecast_Nov. 2011) com base na melhor estimativa de fecho de ano disponível, que incluiu os dados actuais de Janeiro a Outubro bem como os dados estimados para os meses de Novembro e de Dezembro de 2011) (depoimento da testemunha G)

zz)    O valor do ajustamento global, a realizar pelos respetivos entrepreneurs, a favor da C, foi de 7.507.000 USD, cabendo à B… realizar um ajustamento no valor de 4.306.000 USD (depoimento da testemunha G);

aaa)           A B… entregou à C a nota de crédito n.º … datada de 30-12-2011, no valor de € 3.328.232,48;

bbb)         Em 18-02-2015, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem a este processo.

 

3.2. Factos não provados

 

Não há factos com relevo para a apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

 

3.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos provados baseiam-se no Relatório da Inspecção Tributária, na decisão da reclamação graciosa, nos documentos juntos com a petição inicial e nos depoimentos indicados.

Não se demonstrou qualquer razão para não dar credibilidade aos depoimentos das testemunhas.

 

 

4. Matéria de direito

 

4.1. Fundamentação a atender

 

Antes de mais, é necessário precisar qual a fundamentação que importa considerar.

Como se referiu, o acto que concretizou a liquidação do imposto foi o de autoliquidação que, embora fosse levado a cabo por ter existido um projecto de correcção, não tem, por natureza, fundamentação.

Na verdade, na sequência da notificação do projecto de Relatório da Inspecção Tributária em que a Autoridade Tributária e Aduaneira fazia referência, além do mais, à intenção de efectuar uma correcção relativa à nota de crédito n.º …, acima referida, a Requerente apresentou uma declaração de substituição modelo 22, em sintonia com a correcção projectada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, e efectuou a correspondente autoliquidação.

Porém, no Relatório da Inspecção Tributária final constatou-se que a situação estava regularizada através da autoliquidação, mas confirmou-se fundamentadamente a correcção da matéria tributável efectuada pela Requerente, emitindo-se posteriormente uma liquidação em que se faz referência à autoliquidação e ao valor do imposto autoliquidado como elementos de cálculo da quantia liquidada.

Assim, com a confirmação da autoliquidação através do Relatório da Inspecção Tributária e da liquidação, foi com esta configuração e fundamentação que ficou definida a posição jurídica da Autoridade Tributária e Aduaneira em relação à Requerente.

 Mas, nos casos de impugnação administrativa (nomeadamente de reclamação graciosa e recurso hierárquico de actos de liquidação), se a respectiva decisão mantém o acto impugnado com diferente fundamentação, deverá entender-se que se opera revogação por substituição daquele acto, passando a subsistir na ordem jurídica um novo acto que, apesar de manter o mesmo conteúdo decisório, terá a nova fundamentação.

Ora, constata-se que a fundamentação da decisão da reclamação graciosa é essencialmente diferente da que se invocava no projecto de correcção, pois o artigo 23.º do CIRC, que era invocado, embora adicionalmente, como fundamento da projectada correcção, não foi invocado como fundamento do indeferimento da reclamação graciosa, apesar de a Requerente ter suscitado expressamente a questão da legalidade da sua aplicação (pontos 39 a 47 da reclamação graciosa).

Tendo a Requerente suscitado expressamente a questão da legalidade desta fundamentação adicional invocada no Relatório da Inspecção Tributária baseada no artigo 23.º do CIRC, a omissão de referência a ela na decisão da reclamação graciosa que manteve o sentido do acto impugnado não pode deixar de ser interpretada como manifestação de uma intenção de abandonar aquela fundamentação adicional, passando a definir-se a posição da Autoridade Tributária e Aduaneira em relação à Requerente apenas com base na nova fundamentação. 

Na verdade, na decisão da reclamação graciosa não há sequer remissão para a fundamentação global do Relatório da Inspecção Tributária, pelo que é de interpretar a decisão de indeferimento da reclamação graciosa como baseando-se apenas no regime de preços de transferência e não também no acrescido juízo sobre a falta de prova da indispensabilidade de gasto que tinha sido incluído na fundamentação da correcção confirmada pelo Relatório da Inspecção Tributária e pela liquidação subsequente.

Sendo assim, não tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira baseado a manutenção do acto de autoliquidação no regime do artigo 23.º do CIRC, a decisão não pode enfermar dos vícios imputados pela Requerente que têm como pressuposto a aplicação daquele artigo, designadamente os seguintes:

– a da errónea configuração contabilístico-fiscal da compensação atribuída pela B… à C (artigos 108.º a 135.º do pedido de pronúncia arbitral), traduzida na atribuição da natureza de «gasto» à quantia referida na nota de crédito;

– a da inadmissibilidade da conjugação dos artigos 23.º e 63.º do CIRC (artigos 136.º a 153.º do pedido de pronúncia arbitral);

– a da inconstitucionalidade da interpretação do artigo 23.º do CIRC perfilhada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (artigos 154.º a 161.º do pedido de pronúncia arbitral).

 

Assim, improcede o pedido de pronúncia arbitral quanto a estes vícios, não porque eles não ocorressem se tivessem sido invocados estes fundamentos, mas apenas porque o acto praticado pela Autoridade Tributária e Aduaneira que subsiste na ordem jurídica não os tem como pressupostos.

 

 

4.2. Questão da violação do regime dos preços de transferência

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira indeferiu a reclamação graciosa fundamentalmente pelas seguintes razões:

– a Requerente, assim como no decurso da acção inspectiva a B…, não cumpriu a obrigação consagrada no n.º 6 do artigo 63.º do Código do IRC, não sendo possível concluir pela conformidade ou desconformidade das operações com o Princípio de Plena Concorrência estabelecido no n.º 1 da mesma disposição;

– as entidades comparáveis utilizadas no estudo referido pela Requerente incluem entidades inseridas em grupos, situação divergente da acolhida pela legislação portuguesa atendendo ao conceito de relações especiais preconizado nas alíneas do n.º 4 do art. 63.º do Código do IRC;

– cumprir com os critérios de selecção de entidades comparáveis da legislação Norte-americana, é irrelevante dado que estes diferem dos da lei portuguesa e a recomendação expressa no parágrafo 3.25 das Guidelines da OCDE é de não tomar como comparável, operações (e/ou entidades) que não obedeçam ao critério da independência, podendo, no entanto essa informação ser utilizada para efeitos de avaliação de risco;

– a B… invocou "alterações inesperadas nas circunstâncias de mercado no segmento de negócio dos aquecedores de água a gás (sem tanques) que conduziram a um volume de vendas inferior ao orçamentado e subsequente reconhecimento de perdas", mas "não forneceu a informação financeira/documental que possa comprovar as razões invocadas, nomeadamente o relatório de gestão e as contas da empresa americana, o detalhe das rubricas de resultados por segmento de negócio, o plano de negócios orçamentado versus efetivo, ou outros documentos que ilustrem a realidade sentida no mercado americano nesse ano eo motivo de a mesma não ter sido antecipada aquando da elaboração do plano de negócios anual";

– das cláusulas 3.4 e 5.3 do "Distribution Agreement", resulta que a aplicação da margem operacional de 2% á partida não está garantida, encontrando-se dependente de desvios entre custos estimados e custos efectivos, bem como custos decorrentes de situações inesperadas no mercado, que deverão ser objecto de análise própria e averiguação dos termos de partilha entre as partes;

– em sede do procedimento inspectivo, o sujeito passivo não demonstrou que a rentabilidade proporcionada ao distribuidor, atendendo nomeadamente à cláusula 3.4. do contrato, se encontra situada no ponto do intervalo que melhor reflecte os factos e circunstâncias da operação vinculada em apreço (vide §1.48 das orientações da OCDE);

– a Requerente falhou em demonstrar o como chegou a certas conclusões essenciais ao apuramento da Margem Operacional dos produtos fornecidos pela empresa portuguesa, em que assume particular relevância a utilização de métodos directos e indirectos de imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras, não tendo a Requerente e a B… demonstrado qual ou quais nem a que regras obedecem, e a chave de alocação cuja demonstração da adequabilidade é manifestamente insuficiente;

– a Requerente refere a utilização de métodos directos e indirectos de imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras sem no entanto concretizar e é neste ponto que se enquadra um dos fundamentos principais da correcção com base no inadimplemento de obrigação acessória;

– a fundamentação da chave de alocação não permite concluir pela sua adequabilidade;

– o não cumprimento, pelo contribuinte, das obrigações nesta matéria tem como consequência a inversão do ónus da prova, ou seja, caberá ao contribuinte provar que cumpriu as regras relativas ás operações efetuadas com as entidades com as quais se encontra em situação de relações especiais", pelo que cabe à Requerente demonstrar e justificar à luz das orientações em matéria de preços de transferência os procedimentos atinentes à imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras, e à utilização da chave de alocação, que suportam as conclusões por si apresentadas, de modo a ilustrar a sua conformidade com o PPC;

– no que concerne à questão da rejeição do método apresentado pela Requerente sem identificar qualquer metodologia alternativa ou, sequer, fundamentar em que medida a metodologia adoptada poderia conduzir a uma distorção do principio da plena concorrência, a AT não pode, sem estar na posse de todos elementos necessários á comprovação das condições acordadas pela TIPO nas operações vinculadas sob apreciação, pronunciar-se sobre a sua conformação com o PPC, pelo que não pode exigir-se que a AT venha "fixar os factores de comparabilidade pertinentes e seleccionar o método mais apropriado para a respectiva comparação, (.. .) identificar os termos de operações comparáveis realizadas por entidades independentes, (...) demonstrar se e em que medida determinada operação vinculada se desviou das condições impostas pelo principio de plena concorrência;

   – o tipo de gastos da U considerados imputáveis aos fornecimentos efectuados pela empresa portuguesa tem de ser discriminado para se perceber se a política de preços de transferência está a ser correctamente implementada, não só devido à aplicação da margem dos 2% mas também no que respeita à correcta alocação dos gastos entre as empresas do grupo, tendo em conta a análise funcional;

– permanece pouco claro o apuramento do contributo da B para os resultados negativos da U o qual tem impacto na determinação do ajustamento imputável à empresa em Portugal;

– em suma a Requerente não demonstra, assim como no decurso da ação inspectiva a B não demonstrou, os métodos directos e indirectos na imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras que usa e o seu cálculo, sendo igualmente omissa em demonstrar a adequabilidade da chave de alocação ou o seu cálculo.

 

4.1. Desrespeito pelo regime dos preços de transferência

 

A Requerente defende que foi desrespeitado o regime dos preços de transferência, porque, em suma:

– a Autoridade Tributária encontra-se obrigada a fixar os factores de comparabilidade pertinentes e a seleccionar o método mais apropriado para a respectiva comparação, considerando, designadamente, as circunstâncias económicas, o grau de necessidade e a diferente natureza das entidades intervenientes, assim como o contexto de mercado diferenciado em que a operação se efectivou, assegurando o grau de comparabilidade exigido por lei para determinação dos preços de transferência (cf. artigos 4.° a 10.° da Portaria n.° 1446-C/2001, de 21 de Dezembro);

– apenas após identificar os termos de operações comparáveis realizadas por entidades independentes, poderá a Autoridade Tributária demonstrar se – e em que medida – determinada operação vinculada se desviou das condições impostas pelo princípio de plena concorrência, procedendo – sendo esse o caso – à correcção do correspondente desvio;

– no caso vertente, contudo, a Autoridade Tributária limitou-se a manifestar a sua discordância para com a política de preços de transferência implementada pela sociedade B…, alegando, para o efeito, o singelo -- e infundado -- inadimplemento das obrigações acessórias prescritas pelo n.° 6 do artigo 63.° do Código do IRC;

– a falta de quantificação do valor do desvio passível de ser corrigido nos termos do artigo 63.° do Código do IRC, é susceptível de ferir a correcção em causa do vício de falta de fundamentação, sendo que, por maioria de razão, a falta de demonstração de todos eles - como se verifica no presente caso - fere a que correcção que se analisa, inelutavelmente, do vício de - absoluta - falta de fundamentação. (artigos 162.º a 173.º do pedido de pronúncia arbitral).

 

A Requerente tem razão quanto a estas críticas que faz ao acto impugnado, que são corroboradas pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo que cita. ( [3] )

Na verdade, o artigo 77.º, n.º 3, da LGT estabelece expressamente deveres acrescidos de fundamentação de actos que são manifestamente aplicáveis aos casos de aplicação de normas sobre preços de transferência, neste termos:

 

3 – Em caso de existência de operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, ou de operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo de imposto sobre o rendimento e qualquer outra entidade, sujeita ou não a imposto sobre o rendimento, com a qual aquele esteja em situação de relações especiais, e sempre que haja incumprimento de qualquer obrigação estatuída na lei para essa situação, a fundamentação da determinação da matéria tributável corrigida dos efeitos das relações especiais deve observar os seguintes requisitos:

a) Descrição das relações especiais;

b) Indicação das obrigações incumpridas pelo sujeito passivo;

c) Aplicação dos métodos previstos na lei, podendo a Direcção-Geral dos Impostos utilizar quaisquer elementos de que disponha e considerando-se o seu dever de fundamentação dos elementos de comparação adequadamente observado ainda que de tais elementos sejam expurgados os dados susceptíveis de identificar as entidades a quem dizem respeito;

d) Quantificação dos respectivos efeitos.

 

Desta norma conclui-se que é errado o entendimento adoptado pela Autoridade Tributária e Aduaneira na decisão da reclamação graciosa (como já entendera no Relatório da Inspecção Tributária) no sentido de que, não tendo a Requerente demonstrado como chegou a certas conclusões essenciais ao apuramento da margem operacional dos produtos fornecidos pela empresa portuguesa, «cabia à Requerente demonstrar e justificar à luz das orientações em matéria de preços de transferência os procedimentos atinentes à imputação de gastos e rendimentos às empreendedoras, e à utilização da chave de alocação, que suportam as conclusões por si apresentadas, de modo a ilustrar a sua conformidade com o PPC [Preço de Plena Concorrência]» e que «apenas nesse cenário, em face das justificações apresentadas, caberia à AT verificar sobre a sua conformação ou não com o PPC, e no caso de não conformação demonstrar porquê».

Para além disso, embora este artigo 77.º verse sobre a fundamentação dos actos tributários, o conteúdo do seu n.º 3 mostra que a aplicação do regime dos preços de transferência não pode ser efectuada nos termos adoptados pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois, como resulta do teor expresso das alíneas c) e d), em todos os casos em que a Autoridade Tributária e Aduaneira entender efectuar correcções com base nas normas sobre preços de transferência, tem de aplicar os métodos previstos na lei e efectuar a quantificação dos respectivos efeitos, pois só assim os pode incluir na fundamentação.

Por isso, se entende que os comparáveis utilizados pela Requerente na definição da sua política de preços de transferência não são aceitáveis, a Autoridade Tributária e Aduaneira tem de identificar outros comparáveis que entenda adequados, com base nos métodos indicados na lei, designadamente no n.º 3 do artigo 63.º do CIRC e nos artigos 4.º a 10.º da Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro, que regulamentou aquela norma.

Para além disso, é sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira que recai o ónus da prova das condições que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, como vem entendendo uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo ( [4] ).

Assim, tem de se concluir que, para além de não ter dado satisfação aos requisitos de fundamentação exigidos pelo artigo 77.º, n.º 3, da LGT, a Autoridade Tributária e Aduaneira também não actuou da forma como esta norma impõe que proceda ao aplicar ao efectuar correcções com base no regime dos preços de transferência.

Nestes termos, tem de se concluir que a autoliquidação, bem como os actos de liquidação de IRC e de decisão da reclamação graciosa que a confirmaram enfermam de vício de violação de lei, que justifica a sua anulação (artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo de 1991).

 

4.2. Questões de conhecimento prejudicado

 

Procedendo o pedido de pronúncia arbitral por vício de violação de lei que impede a renovação do acto fica prejudicado, por ser inútil, o conhecimento dos restantes vícios invocados pela Requerente.

 

 

5. Decisão

 

 

            De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

a)     Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

b)     Declarar a ilegalidade da liquidação n.º 2013 …, na parte relativa à autoliquidação, no valor de € 324.955,39.

 

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC de 2013, no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 324.955,39.

 

7. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 5.508,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 Lisboa, 22 de Setembro de 2015

 

Os Árbitros

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

(Augusto Vieira)

 

 

(Paulo Mendonça)

 

 

 

 



[1] O montante indicado na nota de crédito corresponde a 4.306.400 USD (laxa de câmbio implícita de 1,29 USD para cada EUR).

[2]              No Relatório da Inspecção Tributária indica-se a data de 27-12-2013, mas por lapso, pois o relatório foi datado de 18-12-2013.

[3]              Designadamente os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:

–  de 17-11-2004, processo n.º 0915/04, em que se entendeu que «o artigo 77.º, n.º 3 alínea b) da Lei Geral  Tributária impõe que na fundamentação do despacho que determine a correcção da matéria colectável para efeitos de IRC com fundamento em relações especiais entre duas sociedades se descrevam os termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes em idênticas circunstâncias»; e

– de 29-11-2006, processo n.º 0401/06, em que se entendeu que, «no que diz respeito à correcção da matéria colectável prevista no citado art. 57º, a fundamentação dos respectivos actos tributários há-de obedecer às regras específicas fixadas no art. 77º, nº 3 da LGT» (o artigo 57.º do CIRC corresponde ao actual artigo 63.º, após a renumeração operada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho).

[4]              Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 14-3-2001, processo n.º 025744; de 26-9-2001, processo n.º 025533; de 12-3-2003, processo n.º 01508/02,