Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 106/2016-T
Data da decisão: 2016-11-22  Selo  
Valor do pedido: € 36.353,28
Tema: IS - verba 1.1 da TGIS; Isenção prevista no artigo 269.º, alínea e) do CIRE
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Decisão Arbitral

 

  1. Relatório

 

1.1 “A…, SA”, doravante designada por «Requerente», NIPC …, com sede na Avenida…, n.º…, em …, requereu a constituição de tribunal arbitral singular, ao abrigo das disposições conjugadas do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) e artigo 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por «RJAT») e artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).

 

1.2 O pedido de pronúncia arbitral, apresentado em 24 de fevereiro de 2016, tem por objeto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, proferida pelo chefe do Serviço de Finanças de ...…, em 30 de novembro de 2015, no Processo n.º …2013… e ap.s, relativo às liquidações adicionais de imposto do selo infra referenciadas, previstas na verba 1.1 da respetiva Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), no montante de 36 353,28 € (trinta e seis mil, trezentos e cinquenta e três euros e vinte e oito cêntimos).

 

1.3 Requer ainda a condenação da Requerida à restituição do referido montante, acrescido dos respetivos juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT) e 61.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.

 

1.4 A Requerente optou por não designar árbitro.

 

1.5 O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à AT em 07 de março de 2016.

 

1.6 O signatário foi designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD como árbitro do tribunal arbitral singular, nos termos do disposto no artigo 6.º do RJAT, e comunicada a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

1.7 Em 16 de maio de 2016, as Partes foram notificadas dessa designação, não se tendo oposto à mesma, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

 

1.8 Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular ficou constituído em 01 de junho de 2016.

 

1.9 A Requerida foi notificada, por despacho arbitral de 06 de junho de 2016, para, nos termos do artigo 17.º, n.º 1 do RJAT e no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, querendo, solicitar a produção de prova adicional.

 

1.10 Mais foi notificada para, no mesmo prazo, apresentar o processo administrativo (PA) referido no artigo 111.º do CPPT.

 

1.11 Em 01 de julho de 2016, a Requerida apresentou a sua Resposta, defendendo-se por exceção (caducidade do direito de ação) e impugnação, pugnando, respetivamente, pela absolvição do pedido, ou, subsidiariamente, pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

 

1.12 Em 01 de julho de 2016 a Requerente foi notificada para responder à invocada exceção.

 

1.13 Considerando que as Partes não requereram a produção de qualquer prova, para além da que a Requerente juntou ao pedido de pronúncia, o Tribunal Arbitral, face aos princípios da autonomia na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidades processuais, ínsitos no n.º 2 dos artigos 19.º e 29.º do RJAT, por despacho de 08 de setembro de 2016, dispensou a realização da reunião prevista no artigo 18.º do mesmo diploma, tendo ainda decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas, facultativas, de forma sucessiva para a Requerida.

 

1.14 Na mesma data foram as Partes notificadas desse despacho, tendo a Requerente, em 16 de setembro de 2016, apresentado as suas alegações e respetivas conclusões e respondido à exceção invocada pela Requerida.

 

1.15 Esta contra-alegou em 21 de setembro de 2016, mantendo a posição assumida em sede de Resposta ao pedido de pronúncia arbitral.

 

1.16 O PA foi junto aos autos em 04 de outubro de 2016 (fl.s 1 a 198) e 24 do mesmo mês (fl.s 199 a final), sendo notificado à Requerente no dia seguinte a este.

 

1.17 Foi designada a data de 31 de outubro de 2016 para a prolação da respetiva decisão arbitral final, posteriormente alterada para 22 de novembro de 2016, face à tardia apresentação do PA.

 

2. Saneamento

 

2.1 Porque a exceção perentória invocada poderá importar a absolvição total do pedido, cfr. artigo 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (CPC), deverá a mesma ser oficiosa e prioritariamente conhecida (artigo 579.º do CPC).

 

Assim:

Para a AT, a Requerente deveria ter apresentado o pedido de pronúncia arbitral no prazo de 90 dias contados da data limite de pagamento voluntário das liquidações, face ao disposto nos artigos 10.º, n.º 1 do RJAT e 102.º, n.ºs 1 e 2 do CPPT.

Pelo que, tendo o último dia do prazo para pagamento voluntário, ocorrido em 16 de dezembro de 2014, cfr. doc. 3 junto pela Requerente, o pedido de pronúncia arbitral é manifestamente extemporâneo por o mesmo haver sido apresentado em 24 de fevereiro de 2016.  

Verificando-se, deste modo, «a caducidade do direito de ação, o que constitui uma exceção dilatória que determina a absolvição da Requerida da instância ao abrigo da alínea h) do n.º 1 do artigo 89.º do CPTA e alínea e) do n.º 1 do 287.º do CPC, aplicável ex vi do art. 2.º do RJAT a qual, desde já, se requer».

Refira-se, desde já, que a caducidade do direito de ação por extemporaneidade do pedido de pronúncia arbitral, configura uma exceção perentória e não dilatória, que importa a absolvição total ou parcial do pedido, cfr. acórdãos do STA de 17-06-2015 (Proc. 0194/15) e 22-05-2013 (Proc. 0340/13).

 

Respondendo à exceção, a Requerente, concordando com a AT quando refere que o objeto de qualquer processo é fixado pelo âmbito do respetivo pedido e causa de pedir, discorda, contudo, que o objeto dos presentes autos sejam as liquidações, mas antes a decisão de indeferimento da reclamação graciosa.

 

Com efeito, quer do petitório quer da introdução do pedido de pronúncia arbitral, resulta claro que a causa de pedir, ou seja, o fundamento do pedido, é a ilegalidade do indeferimento da reclamação graciosa n.º …2013… e ap.s, e o pedido consiste na revogação da respetiva decisão, com as consequências legais daí advenientes, como sejam o reembolso do montante pago e o pagamento de juros indemnizatórios.

 

Assim, considerando:

Que a referida decisão, na qual foi apreciada a questão de mérito, foi notificada à Requerente em 15 de dezembro de 2015, através do ofício n.º … do Serviço de Finanças de ...…, de 07 do mesmo mês, registado com aviso de receção «RF…PT», nos termos do artigo 38.º, n.º 1 do CPPT (fls. 236 a 239 do PA); e

Que o pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 24 de fevereiro de 2016, o mesmo é tempestivo, uma vez que foi observado o prazo de 90 dias previsto na alínea a), n.º 1, do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, contado nos termos da alínea e), n.º 1 do artigo 102.º do CPPT, julga-se improcedente a invocada exceção, deduzida pela Requerida, de caducidade do direito de ação, por extemporaneidade na dedução do pedido de pronúncia arbitral.

 

2.2 As Partes têm personalidade e capacidades judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

2.3 O processo não enferma de nulidades.

 

2.4 Não se verificam quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

 

3. Posição das Partes

  3.1 Da Requerente

·      Nos termos do artigo 164.º do CIRE, adquiriu, por propostas em carta fechada, os prédios constantes do doc. 2.

·      Na declaração modelo 1 prevista no artigo 19.º do CIMT, apresentada para efeitos de liquidação de IMT/IS, identificou o facto tributário com o código « 31 », relativo à aquisição de bens imóveis pelo Estado, Regiões Autónomas e autarquias locais ou ao abrigo de regimes legais de apoio financeiro à habitação, uma vez que, sendo credora privilegiada, declararia nos títulos de adjudicação que os créditos reclamados estariam totalmente liquidados. 

·      As vendas foram efetuadas pelo administrador de insolvência, no próprio processo de insolvência, no exercício dos poderes conferidos nos artigos 158.º e ss. do CIRE, cabendo-lhe confirmar os pressupostos da isenção do IMT e do imposto do selo, uma vez que a mesma é automática.

·      Que a AT liquidou adicionalmente o imposto do selo da verba 1.1 da Tabela Geral, com o fundamento de que as referidas isenções foram indevidamente consideradas pela administrador de insolvência.

·      Que ao contrário do que erroneamente entende a AT, as aquisições em causa, estão isentas do imposto do selo face à interpretação histórica e sistemática do artigo 269.º do CIRE.

·      Que o artigo 120.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresas e de Falência (CPEREF) apenas isentava de imposto do selo, quando a ele se encontrassem sujeitas, entre outras, as seguintes providências de recuperação da empresa: a dação em cumprimento de bens da empresa e a cessão de bens aos credores; e a realização de operações de financiamento, o trespasse ou a cessão da exploração de estabelecimento da empresa, a constituição de sociedades e a transmissão de estabelecimentos comerciais, a venda, permuta ou cessão de elementos do ativo da empresa, bem como a locação de bens, previstos, respetivamente, nas alíneas b), c), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 101.º

·      Que o artigo 9.º, n.º 2 da Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto, habilitou o Governo a isentar do imposto do selo, desde que previstos no plano de insolvência ou de pagamentos ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente, entre outros, os seguintes atos: a dação em cumprimento de bens da empresa e a cessão de bens aos credores; e a realização de operações de financiamento, o trespasse ou a cessão da exploração de estabelecimentos da empresa, a constituição de sociedades e a transferência de estabelecimentos comerciais, a venda, permuta ou cessão de elementos do activo da empresa, bem como a locação de bens.

·      Que, respeitando integralmente a norma habilitante, o artigo 269.º do CIRE isenta de imposto do selo a dação em cumprimento dos bens da empresa e a cessão de bens aos credores, desde que prevista em planos de insolvência, de pagamentos ou recuperação ou efetuada no âmbito da liquidação da massa insolvente.

·      Assim, para beneficiar de isenção, basta que a cessão de bens seja efetuada em benefício dos credores e sejam observados os demais pressupostos antes referidos.

·      Que não é requisito da isenção que os bens, anteriormente à transmissão, integrem o património de qualquer estabelecimento ou empresa, podendo, assim, integrar o património do insolvente particular sem que tal facto prejudique a isenção de imposto do selo.

·      Que o Título XIII do CIRE, que contém os benefícios fiscais dos processos de insolvência e recuperação, é de aplicação comum à insolvência das pessoas coletivas e singulares, ainda que estas não sejam titulares de qualquer estabelecimento ou empresa.

·      Que, nos termos do artigo 250.º do CIRE, os Títulos IX e X não são aplicáveis aos processos de insolvência de não empresários ou titulares de empresa, de onde se extrai a conclusão de que todo o restante código seja aplicável à insolvência destas pessoas.

·      Que o artigo 269.º, constante do Capítulo XIII, abrange os processos de insolvência dos não empresários ou titulares de empresas, sob pena de violação do princípio da igualdade relativamente aos empresários individuais.

·      Que, em todo o caso, o artigo 269.º, alínea d) do CIRE isenta de imposto do selo a cedência dos bens do devedor aos credores, não distinguindo se o bem cedido é da empresa ou do património do insolvente não empresário ou titular da empresa.

·      Que cabe ao administrador de insolvência verificar os pressupostos da isenção, em virtude da mesma ser de reconhecimento automático, não dependendo de prévia intervenção da AT.

 

Em 16-09-2016 vem alegar por escrito, reproduzindo no essencial o anteriormente referido no pedido de pronúncia arbitral.

 

 3.2 Da Requerida

 Defendendo-se, por impugnação, a AT invoca os seguintes argumentos:

·      Que a questão em apreço consiste em saber se se verificam os requisitos da isenção do imposto do selo prevista no artigo 269.º, alínea e) do CIRE.

·      Que os insolventes são pessoas singulares, não exercendo qualquer atividade comercial ou agrícola.

·      Que naquele preceito cabem, entre outros atos, a venda de elementos do ativo da empresa.

·      Que esta é definida no artigo 5.º do CIRE como toda a organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica.

·      Que resulta da lei que a isenção do selo prevista no referido preceito depende de os prédios serem adquiridos a uma empresa ou empresário individual que exerça atividade industrial, comercial ou agrícola e estes prédios estarem integrados no ativo da empresa.

·      Pelo que não há lugar a isenção quando a aquisição é feita a uma pessoa singular não empresária.

 

Termina, pugnando pela total improcedência do pedido de pronúncia arbitral e absolvição da Requerida, uma vez que as liquidações controvertidas não padecem de qualquer vício, já que a AT se limitou a aplicar as normas legais vigentes aos factos em causa, cumprindo integralmente a disciplina jurídica definida pelo legislador.

 

Em 28-09-2016 apresentou alegações, reiterando tudo quanto disse em sede de Resposta, pugnando pela integral improcedência dos pedidos de pronúncia arbitral com a consequente absolvição da instância.

 

4. Objeto do litígio

 

A principal questão que constitui o thema decidenduum reconduz-se a saber se a compra de bens imóveis, no âmbito de processo de insolvência, propriedade de pessoas singulares não empresários nem titulares de empresas, está ou não isenta de imposto do selo, previsto na verba 1.1 da TGIS, por força do disposto na alínea e) do artigo 269.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).

 

 

5.Fundamentação

 5.1 Factos provados

Com relevo para a apreciação e decisão das questões de mérito suscitadas, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

 

5.1.1 Conforme quadro-resumo infra, a Requerente, no âmbito do processo de insolvência, previsto no artigo 1.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), adquiriu, rectius, comprou, na modalidade de proposta em carta fechada, nos termos do artigo 164.º do mesmo diploma, determinados imóveis propriedade dos insolventes e que compunham a respetiva massa insolvente, cfr. doc. 2 junto ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá, aqui, como integralmente reproduzido.

 

5.1.2 Os insolventes são pessoas singulares, não empresários, pelo que os imóveis alienados não constituem elemento do ativo de qualquer empresa, que efetivamente não existe.

 

5.1.3 As referidas aquisições encontram-se sujeitas a imposto do selo, nos termos do artigo 1.º, n.º 1 do Código do Imposto do Selo (CIS) e verba 1.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), à taxa de 0,8% sobre os respetivos valores.

 

5.1.4 Porém, as mesmas, beneficiaram de isenção, indevidamente, uma vez que o Serviço de Finanças de ...…, conforme vem referido a fls. 220 do PA, «aquando do preenchimento das declarações modelo 1 do IMT, foi mencionado indevidamente no quadro 3, o código “31” – Aquisição de imóveis do Estado, Regiões Autónomas e Autarquias Locais; aquisição de imóveis por arresto judicial ou administrativa ou ao abrigo de regimes legais de apoio financeiro à habitação».

 

5.1.5 Em 04 de novembro de 2014, o mesmo serviço de finanças procedeu às liquidações adicionais corretivas que, legalmente, se mostraram devidas, nos termos do artigo 31.º, n.º 2 do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), por remissão expressa do artigo 23.º, n.º 4 do CIS, as quais foram notificadas à Requerente nos termos do artigo 31.º, n.º 4 do CIMT, cfr. doc. 1 junto ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá, aqui, como integralmente reproduzido.

 

5.1.6 As referidas liquidações adicionais, no montante global de 36 353,28 €, foram pagas nas datas constantes do quadro-resumo infra, cfr. doc. 3 junto ao pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá, aqui, como integralmente reproduzido.

 

5.1.7 Em 4 de março de 2015, a Requerente, nos termos dos artigos 68.º e ss. do CPPT, apresentou diversas reclamações graciosas, tendo por objeto a legalidade das liquidações supra, sendo as mesmas apensadas à que foi apresentada em primeiro lugar, daí resultando o Processo n.º …2013… e ap.s, cfr. fls. 12 a 27 do PA.

 

5.1.8 Pelo ofício n.º … (registo: RF … PT) do Serviço de Finanças de ...…, de 28-10-2015, a Requerente foi notificada, na pessoa do respetivo mandatário, do projeto de despacho de indeferimento da referida reclamação, de 19-10-2015 bem como para, querendo, exercer o direito de audição prévia previsto no artigo 60.º da LGT, cfr. fl.s 218/222 do PA.

 

5.1.9 Em 30-11-2015 foi proferido despacho de indeferimento da reclamação graciosa, o qual foi notificado à Requerente, na pessoa do respetivo mandatário, através do ofício n.º … (registo: RD … PT) do mesmo serviço de finanças, de 07-12-2015, cfr. fl.s 225/227 do PA).

 

QUADRO-RESUMO DAS LIQUIDAÇÕES ADICIONAIS

 

Nome

Processo de Insolvência

Artigo

Fra-ções

Freguesia

Liquidação

Montante

(€)

Dt Limite   pagamento

B

 

AD

864,00

05-11-2014

C

 

L

384,00

05-11-2014

D

 

AM FX GO GR

 

665,60

05-11-2014

E

 

--------

--------

AO

586,80

05-11-2014

F

 

--------

896,00

05-11-2014

G

 

F

584,00

05-11-2014

H

 

F

360,00

05-11-2014

I

 

----------------

936,00

05-11-2014

J

 

A

M

480,00

05-11-2014

K

 

AI

IS

435,20

05-11-2014

L

 

--------

1 160,00

05-11-2014

M

 

--------

928,00

05-11-2014

N

 

D

544,00

05-11-2014

O

 

AB

850,00

05-11-2014

P

 

J

504,00

05-11-2014

Q

 

--------

490,00

11-11-2014

R

 

--------

490,00

11-11-2014

S

 

AV

680,00

11-11-2014

T

 

N

430,00

14-11-2014

U

 

R

488,00

14-11-2014

V

 

M

376,00

14-11-2014

W

 

--------

1 400,00

14-11-2014

X

 

I

816,00

14-11-2014

Y

 

--------

880,00

18-11-2014

Z

 

D

560,00

19-11-2014

AA

 

AI

544,00

20-11-2014

BB

 

I

528,00

20-11-2014

CC

 

F

600,00

20-11-2014

DD

 

AE

840,00

20-11-2014

EE

 

AK

J

910,00

20-11-2014

FF

 

R

312,00

20-11-2014

GG

 

Z

324,80

20-11-2014

HH

 

AZ

444,00

21-11-2014

II

 

J

480,00

24-11-2014

JJ

 

--------

528,00

24-11-2014

KK

 

--------

960,00

26-11-2014

LL

 

--------

660,00

26-11-2014

MM

 

--------

2 240,00

26-11-2014

NN

 

..

I

510,00

26-11-2014

OO

 

H

600,00

26-11-2014

PP

 

AG

320,00

26-11-2014

QQ

 

D

E

FJ

FL

1 306,88

26-11-2014

RR

 

L

AN

656.00

11-12-2014

SS

 

N

576,00

11-12-2014

TT

 

AP

704,00

11-12-2014

UU

 

E

400,00

12-12-2014

VV

 

DJ

504,00

12-12-2014

WW

 

E

570,00

16-12-2014

XX

 

BE

640,00

16-12-2014

YY

 

P

440,00

16-12-2014

ZZ

 

B

400.00

16-12-2014

AAA

 

AI

512,00

16-12-2014

BBB

 

--------

1 480,00

16-12-2014

CCC

 

D

576,00

16-12-2014

 

36 353,28

-------------------

 

5.2 Factos não provados

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

5.3 Motivação

 

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor [(cfr. artigos 596º, nº 1 e 607º, nºs 2 a 4 do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29º, nº 1, alíneas a) e e) do RJAT)] e consignar se a considera provada ou não provada (cfr. artigo 123º, nº 2 do CPPT).

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artigo 607º, nº 5 do CPC). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. 

Assim, a convicção do Tribunal fundou-se no acervo documental junto aos autos bem como nas posições assumidas pelas partes.

  

5.4 Matéria de Direito (fundamentação)

 

Questões a decidir:

- Da ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2013… e ap.s; e

- Do pedido de pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

Da ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2013…e ap.s

Diga-se, antes de mais, que as referências feitas pela Requerente ao artigo 270.º, n.º 2 do CIRE, ou seja, à isenção de IMT relativa à venda da empresa, na sua universalidade ou de cada um dos bens imóveis que constituem o seu ativo, constantes do pedido de pronúncia arbitral, não merecem qualquer relevância para a questão que nos ocupa, por esta estar restringida ao imposto do selo.   

 

Refere a Requerente que, nos termos do artigo 164.º do CIRE, adquiriu mediante proposta em carta fechada no âmbito do processo de insolvência, os prédios constantes do documento n.º 2, dos quais eram proprietários pessoas singulares não empresários nem titulares de empresas.

E que «Na verdade, as vendas em causa foram todas efetuadas pelo administrador de insolvência, no próprio Processo de insolvência, no exercício dos poderes conferidos nos arts. 158º e seguintes do CIRE (…)», cfr. artigo 5.º do pedido de pronúncia (sublinhado e negrito, nossos).

Com efeito é a seguinte a redação do n.º 1 do artigo 158.º do CIRE:

«Transitada em julgado a sentença declaratória da insolvência e realizada a assembleia de apreciação do relatório, o administrador da insolvência procede com prontidão à venda de todos os bens apreendidos para a massa insolvente, independentemente da verificação do passivo, na medida em que a tanto se não oponham as deliberações tomadas pelos credores na referida assembleia».

Analisados os documentos que titulam a aquisição dos referidos prédios por parte da Requerente, constantes do documento n.º 2 (instrumentos notariais de compra e venda e títulos de transmissão emitidos nos termos do artigo 900.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, de 1961) verifica-se que os referidos bens imóveis foram vendidos à Requerente, no âmbito do processo de insolvência.

Não se verificou, deste modo, a cessão de bens à Requerente, enquanto credora, pelo que não faz sentido dizer-se:

«De qualquer modo, o artigo 269.º, alínea d) do CPEREF (por lapso foi referido este código em vez do CIRE) isenta de imposto do selo a cedência dos bens do devedor aos credores», cfr. artigo 53.º do pedido de pronúncia;

«Não distingue se o bem cedido é bem da empresa ou património do insolvente não empresário ou titular de empresa», cfr. artigo 54.º; e

«Nem distingue o título por que a cessão deve ser efetuada», cfr. artigo 55.º

 

A cessão de bens aos credores, referida na alínea d) do artigo 269.º do CIRE, é a prevista no artigo 831.º do Código Civil, e ocorre quando os credores, ou algum deles, são encarregados pelo devedor de liquidar o património deste, ou parte dele, e repartir entre si o respetivo produto, para satisfação dos seus créditos.

Esta figura com a natureza jurídica de “mandato”, também conhecida por cessio bonorum evita a execução forçada, limitando-se o devedor a entregar os bens, ou uma parte do património, aos credores, ou a algum deles, para liquidação e pagamento das dívidas. Não se trata, porém, de uma cessão, no sentido rigoroso do termo, visto continuarem os bens a pertencer ao devedor, enquanto não forem alienados (vide Fernando Andrade PIRES de LIMA e João de Matos ANTUNES VARELA, in “Código Civil”, anotado, Volume III, 3.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Limitada, pág. 119).  

 

Assim a isenção de que os atos de venda poderiam beneficiar subsumem-se na alínea e) do referido artigo 269.º do CIRE, cuja redação é a seguinte:

 «Estão isentos de imposto do selo, quando a ele se encontrem sujeitos, os seguintes atos, desde que previstos em planos de insolvência, de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente: 

e) A realização de operações de financiamento, o trespasse ou a cessão da exploração de estabelecimentos da empresa, a constituição de sociedades e a transferência de estabelecimentos comerciais, a venda, permuta ou cessão de elementos do ativo da empresa, bem como a locação de bens» (negrito nosso).

 

Esta isenção constitui um benefício automático por resultar direta e imediatamente da lei, cfr. artigo 5.º, n.º 1 do Estatuto dos Benefícios Fiscais, competindo a sua verificação e declaração ao serviço de finanças onde foi apresentada a declaração prevista no n.º 1 do artigo 19.º do CIMT, ou seja, ao Serviço de Finanças de ...…, cfr. artigo alínea d) do CIMT, aplicável ex vi do artigo 23.º, n.º 4 do Código do Imposto do Selo.

 

Aqui chegados cumpre-nos decidir se, no caso concreto, estão reunidos os pressupostos necessários à verificação da referida isenção prevista no artigo 269.º, alínea e) do CIRE.

De forma apodítica podemos afirmar que os proprietários dos imóveis alienados à Requerente e devedores desta, são pessoas singulares, não empresários, que não exercem uma atividade de natureza industrial, comercial ou agrícola, cfr. 5.1.2 do probatório.

Assim tais imóveis não constituem elementos do ativo de uma qualquer empresa, que, como é óbvio, não existe, e que o artigo 5.º do CIRE define como «toda a organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica».

Considerando o teor literal da norma em apreço, resulta que se encontram isentas de IS a venda de elementos do ativo da empresa, desde que previsto em planos de insolvência, de pagamentos ou de recuperação ou praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente.

 

Para a Requerente é irrelevante que os bens imóveis vendidos constituam elementos do ativo de uma empresa.

 

Assim mostra-se necessário convocar o artigo 11º, nº 1, da LGT que dispõe:

«Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis». 

 

Estes princípios encontram-se vazados no artigo 9º do Código Civil, nos seguintes termos: 

«1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados».

Como se sabe, o primeiro elemento de interpretação é a letra da lei, o chamado elemento gramatical. Porém, o teor verbal da lei pode não ser suficiente, não só porque as palavras e expressões utilizadas podem ser polissémicas, oferecendo uma pluralidade de sentidos, como, sobretudo, porque é sabido que frequentemente existe uma distância, maior ou menor, entre o pensamento legislativo e a sua expressão escrita.

Daí que, para além do teor verbal da lei, o intérprete deva socorrer-se de outros meios disponíveis na panóplia hermenêutica: o elemento lógico e racional ou teleológico (que parte do pressuposto de que uma norma tem uma função a cumprir, um fim ou thelos, incumbindo, incumbindo ao seu intérprete surpreender o seu sentido em correlação com o escopo visado pela lei) e o elemento histórico (segundo o qual o intérprete deve socorrer-se da história do preceito, da disciplina de certa matéria, de certas instituições dogmáticas, na procura do sentido da norma), vide João BAPTISTA MACHADO, in “Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador”, 12.ª Reimpressão, Almedina, pp.175 e seguintes.

A ratio da norma poderia, em princípio, abranger os atos de venda que tivessem origem em insolvência de pessoas singulares, não empresários ou titulares de empresas, pois, sendo o objetivo da norma o de facilitar a realização daquelas operações em situações de insolvência ou de recuperação, não se vislumbra nenhum impedimento a tal previsão legal quanto às pessoas singulares.

Não obstante, a norma em análise prevê clara e expressamente que a isenção de IS se aplica à «venda, permuta ou cessão de elementos do ativo da empresa» e não prevê que a isenção de IS se aplica à venda, permuta ou cessão de elementos detidos por pessoas singulares que façam parte do seu património particular. Assim, ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus (onde a lei não distingue, também o interprete não deve distinguir).

Neste sentido, pode ver o acórdão do STA, de 25-09-2013 (Proc. 0866/13), assim sumariado:

I – De acordo com o disposto no art. 269.º, alínea e), do CIRE, ficam isentas de IS as vendas de «elementos do activo da empresa».

II – Assim sendo, a referida isenção não abrange a venda de prédio urbano destinado à habitação que pertence a pessoa singular, não bastando para beneficiar daquela isenção o facto de se tratar de actos de venda praticados no âmbito da liquidação da massa insolvente, antes havendo de demonstrar-se que o bem vendido integra o activo de uma empresa.

 

Bem como o Processo n.º 649/2015-T, de 26-09-2016, do CAAD:

«(…) E também quanto ao Imposto do Selo, relativamente ao qual é invocada a aplicação da alínea e) do artigo 269º do CIRE, apesar de esta norma abranger actos de transmissão de imóveis de empresa, não há lugar, nestes autos, à aplicação da isenção, porque não está em causa a venda de um bem imóvel pertença de uma empresa ou destinado ao exercício de actividade empresarial (…)».

 

E ainda os n.ºs 139/2016-T, de 28-09-2016 e 13/2016-T, de 22-06-2016, entre outros.

 

 

Assim, considerando que a Requerente adquiriu, por compra, no âmbito de processos de insolvência, imóveis propriedade de pessoas singulares, não empresários nem titulares de empresas, a situação decidenda não é subsumível na previsão ínsita na alínea e) do artigo 269.º do CIRE, que se refere exclusivamente à venda de “elementos do ativo da empresa”.

 

 

Por todo o exposto entendemos que o despacho de indeferimento da reclamação graciosa, proferida pelo chefe do Serviço de Finanças de …, em 30 de novembro de 2015, no Processo n.º …2013… e ap.s, relativo às liquidações adicionais de imposto do selo supra referenciadas, previstas na verba 1.1 da respetiva Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), no montante de 36 353,28 € (trinta e seis mil, trezentos e cinquenta e três euros e vinte e oito cêntimos), não enferma de qualquer vício, sendo de manter na ordem jurídica.

Do pedido de juros indemnizatórios -

Estando este pedido dependente da procedência do pedido anterior, improcedendo aquele, improcede também este, não havendo qualquer condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.

 

 

***

 

 

6.Decisão

Em face do exposto, decide-se:

a)      Julgar improcedente a exceção perentória de caducidade do direito de ação invocada pela Requerida ;

b)      Julgar improcedente o pedido de anulação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de ...…, de 30 de novembro de 2015, proferido no processo de reclamação graciosa n.º …2013… e ap.s ;

c)      Julgar improcedente o pedido de anulação das liquidações adicionais de imposto do selo (verba n.º 1.1 da TGIS), supra referidas, no montante de 36 353,28 € ;

d)     Julgar improcedente o pedido de pagamento de quaisquer juros indemnizatórios ; e

e)      Condenar a Requerente no pagamento das custas do processo arbitral, no montante de 1 836,00 €, cfr. n.º 1 do artigo 527.º do CPC e artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

 

 

7. Valor do Processo

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do RCPAT, fixa-se ao processo o valor de 36 353,28 €.

 

 

 

8. Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 3 do RJAT, fixa-se o montante das custas em 1 836,00 €, nos termos da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

 

Notifique.

 

 

Lisboa, 22 de novembro de 2016.

 

 

 

O Árbitro,

 

 

(Rui Ferreira Rodrigues)

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.