SUMÁRIO: A revogação do ato tributário objeto do Pedido de Pronúncia Arbitral após a constituição do Tribunal Arbitral, que dá satisfação às pretensões formuladas pela Requerente, é causa de extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artº. 277.º, alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi do artº. 29.º, 1, alínea e) do RJAT.
DECISÃO ARBITRAL
I – RELATÓRIO
1. Em 12 de abril de 2025, A..., Médica Veterinária e Gestora, com domicílio profissional na Av. ..., ...-... Lisboa, portadora do passaporte n.º ..., emitido em 20/02/2023 pela Embaixada Francesa em Portugal, contribuinte número ..., com domicílio na Rua ... n.º..., ...-... (doravante designado por “Requerente”), solicitou a constituição de tribunal arbitral e procedeu a um pedido de pronúncia arbitral, nos termos conjugados do artigo 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei nº. 10/2011 de 20 de janeiro, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, (doravante apenas designado por RJAT), e dos artigos 1 e 2 da Portaria nº. 112-A/2011, de 22 de março, com vista à declaração de ilegalidade do indeferimento tácito da Reclamação Graciosa apresentada em 18 de outubro contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), no montante de € 56.623,96 (cinquenta e seis mil seiscentos e vinte e três euros e noventa e seis cêntimos), relativa ao ano de 2023.
2. A Requerente é representada, no âmbito dos presentes autos, pelo seu mandatário Drº. ..., e a Requerida, a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT) é representada pelas juristas, Drª. ... e Drª. ... .
3. Verificada a regularidade formal do pedido, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º do RJAT, foi designado pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, como árbitro, o signatário.
4. O Árbitro aceitou a designação efetuada, tendo o Tribunal Arbitral sido constituído no dia 26 de junho de 2025, na sede do CAAD, sita na Avenida Duque de Loulé, n.º 72-A, em Lisboa, conforme comunicação da constituição do tribunal arbitral que se encontra junta aos presentes autos.
5. No dia 26 de junho de 2025, o Tribunal notificou o dirigente máximo do serviço da Autoridade Tributária e Aduaneira, para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta, juntar o processo administrativo, e caso o pretenda, solicitar a produção de prova adicional, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17º. do RJAT.
6. A Requerida não apresentou resposta.
7. No dia 10 de julho de 2025, a Requerida apresentou um requerimento por intermédio do qual dá conta da revogação dos atos impugnados, conforme Despacho de 8 de julho de 2025, da Senhora Subdiretora-geral da Área de Gestão Tributária, juntando para o efeito a respetiva Informação dos Serviços da AT.
8. No dia 12 de agosto de 2025, o presente Tribunal notificou a Requerente, para, em 5 dias, se pronunciar sobre o teor do requerimento identificado no ponto 7 supra.
9. No dia 25 de agosto de 2025, a Requerente, em resposta ao despacho identificado em 8 supra, vem informar o Tribunal de que “…atenta a revogação da liquidação nos termos da causa de pedir invocada e consequências associadas, e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, não se opõe à extinção da lide por inutilidade superveniente da mesma, sem prejuízo da condenação em custas da parte, a AT, que lhe deu causa.”
10. No dia 29 de setembro o Tribunal lavrou o seguinte Despacho:
“O presente processo encontra-se em fase de agendamento da reunião a que se refere o art.º 18.º do RJAT.
Entretanto a Autoridade Tributária procedeu à revogação dos atos tributários em causa.
A Requerente pronunciou-se no sentido de não se opor à extinção da lide, sem prejuízo da condenação da AT em custas da parte.
Da análise que se faz do processo, determina-se o seguinte:
1. Não existindo necessidade de produção de prova adicional, para além daquela que documentalmente já se encontra incorporada nos autos, reunindo o processo todos os elementos necessários para prolação da decisão, atendendo igualmente a que a Autoridade Tributária procedeu à revogação dos atos tributários em causa, por razões de economia e celeridade processual, da proibição da prática de atos inúteis, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal na condução do processo, da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2 e 29.º, nº. 2 do RJAT) o Tribunal entende ser de dispensar a realização da reunião a que se refere o art.º 18 do RJAT, sendo igualmente de dispensar a apresentação de alegações.
2. A decisão final será proferida até ao termo do prazo fixado no art.º 21.º, nº. 1 do RJAT.
3. Deverá a Requerente, até à data da prolação da decisão arbitral, proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do n.º 3 do art.º 4 do Regulamento das Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e comunicar o mesmo pagamento ao CAAD.
4. Notifiquem-se as partes do presente despacho.”
11. No dia 8 de outubro, quando se preparava para proferir Decisão e face à situação então constatada, o Tribunal lavrou o seguinte Despacho:
Da análise do processo resulta o seguinte:
1. A Autoridade Tributária procedeu à revogação do ato aqui controvertido;
2. A Requerente, notificada para se pronunciar, informou o Tribunal de que “…atenta a revogação da liquidação nos termos da causa de pedir invocada e consequências associadas, e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, não se opõe à extinção da lide por inutilidade superveniente da mesma, sem prejuízo da condenação em custas da parte, a AT, que lhe deu causa.”
3. Contudo, a Requerente nos artigos 87º. do no seu PPA e nas respetivas conclusões vem solicitar que se lhe reconheça o:
“direito a remuneração compensatória prevista e regulada nos artigos 96.º, n.ºs 2 e 3, e 102.º-A, do Código do IRS, por referência a esta retenção na fonte no montante de € 56.623,96 a reembolsar, computada até ao mês anterior ao da liquidação…”.
4. Tratando-se de uma questão que importa resolver e sobre a qual nem a Requerida nem a Requerente se pronunciaram, vem o Tribunal determinar que, num prazo de 5 dias, a Requerente informe o Tribunal se pretende que o processo prossiga para apreciação desta questão, e em caso afirmativo, que a Requerida exerça o respetivo contraditório no prazo de 5 dias após o final do prazo da Requerente para cumprimento do presente Despacho.”
12. No dia 10 de outubro de 2025, a Requerente apresenta Requerimento do qual consta o seguinte:
“… tendo em conta ser razoável e prudente o entendimento de que o ato de revogação da AT não contemplará a questão da remuneração compensatória suscitada na PI, vem manifestar a sua vontade de que o processo prossiga para apreciação desta questão.”
13. Por seu turno, no dia 15 de outubro de 2025, a entidade Requerida apresentou Requerimento em que:
“…vem, ao abrigo do princípio do contraditório, informar “que a remuneração decorrente do preceituado nos artigos 96º e 102º-A do CIRS, já se encontra contemplada na liquidação vigente nº 2025..., datada de 2025-09-19, ou seja, em momento posterior ao deferimento do pedido formulado pela contribuinte, no Processo descrito em epígrafe, mormente no respetivo campo 26, intitulado “Juros de retenção-poupança”, no valor de 1.453,04€” conforme informação prestada pela DSIRS.
Requer-se ainda a junção da liquidação n.º 2025..., datada de 2025-09-19 (doc. 1), bem como a respetiva data de emissão (doc. 2).”, juntando dos documentos a que faz referência.
II - SANEAMENTO
O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e dos artigos 5.º e 6.º, todos do RJAT.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas, encontram-se regularmente representadas e o processo não enferma de nulidades, nos termos do disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.
III - MATÉRIA DE FACTO
Relativamente à matéria de facto, importa, antes de mais, salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e distinguir a matéria provada da não provada, tudo conforme o artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e o artigo 607.º, n.ºs 3 e 4 do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.
Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. artigo 511.º, n.º 1, do anterior CPC, correspondente ao artigo 596.º do atual CPC).
Assim, atendendo às posições assumidas pelas partes no pedido de constituição arbitral, aos diversos requerimentos apresentados pelas Partes e à prova documental junta aos autos consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:
a. Factos dados como provados
Com interesse para a decisão, dão-se por provados os seguintes factos:
A. A Requerente foi notificada da liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), relativa a 2023, donde resulta uma coleta líquida de € 101.401,13 e um imposto a reembolsar de € 1.324,87, em virtude de terem sido efetuadas retenções na fonte no montante de € 102.626,00 (Vd. Doc. 2);
B. O valor de imposto, referente às retenções efetuadas, foi devidamente entregue nos Cofres do Estado (AT não coloca este pagamento em causa);
C. A Requerente, apresentou reclamação graciosa da referida liquidação, que deu entrada no Serviço de Finanças de Lisboa-... no dia 18 de outubro de 2024 (Vd. Doc. 1);
D. Ultrapassado o prazo de 4 meses de que a AT dispunha para apreciar a referida reclamação, o seu indeferimento tácito ocorreu em 18 de fevereiro de 2025 (Vd. art.º 57º. da LGT);
E. Em 12 de abril de 2025 a Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral, por intermédio do qual solicitava o seguinte:
a) ser declarada a ilegalidade e anulado o indeferimento tácito da reclamação graciosa na medida em que recusou a anulação nos termos que aqui se discutiram, da identificada liquidação de IRS, com isso violando o princípio da legalidade;
b) ser declarada a ilegalidade parcial desta liquidação (e ser consequentemente anulada), no montante de € 56.623,96;
c) ser, consequentemente, reconhecido o direito ao reembolso do montante de € 56.623,96 e, bem assim, o direito a juros indemnizatórios pelo pagamento deste imposto indevidamente liquidado e suportado, contados desde 01.09.2024 inclusive, até ao integral reembolso do referido montante, e bem assim, ainda, o direito a remuneração compensatória prevista e regulada nos artigos 96.º, n.ºs 2 e 3, e 102.º-A, do Código do IRS, por estar em causa imposto a reembolsar de € 56.623,96, pago antecipadamente via retenção na fonte, computada até ao mês anterior ao da liquidação.”
F. A Requerente entende que “ao invés do actual apuramento de um IRS (colecta líquida) de € 101.401,13, liquidação de IRS no valor de apenas € 44 777.17, donde estar em causa liquidação de IRS em excesso no valor de € 56.623,96 (€ 101.401,13 - € 44 777.17), que anulada neste excesso se traduz na necessidade de reembolso adicional desse montante de € 56.623,96 (e não de apenas € 1.324,87, conforme apurado na actual liquidação de IRS – cfr. o Doc. n.º 2);
G. No dia 10 de julho de 2025, a Requerida apresentou um requerimento por intermédio do qual dá conta da revogação da liquidação objeto do pedido, conforme Despacho de 8 de julho de 2025, da Senhora Subdiretora-geral da Área de Gestão Tributária, juntando para o efeito a respetiva Informação dos Serviços da AT;
H. O ato de revogação ocorreu em momento posterior à constituição do Tribunal Arbitral, que se verificou em 26 de junho de 2025;
I. No dia 12 de agosto de 2025, o presente Tribunal notificou a Requerente, para se pronunciar sobre o teor do Requerimento apresentado pela Requerida, que dá conta da revogação do ato tributário aqui em causa;
J. No dia 25 de agosto de 2025, a Requerente, em resposta ao despacho identificado em 8 supra, vem informar o Tribunal de que “…atenta a revogação da liquidação nos termos da causa de pedir invocada e consequências associadas, e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, não se opõe à extinção da lide por inutilidade superveniente da mesma, sem prejuízo da condenação em custas da parte, a AT, que lhe deu causa.”;
14. No dia 8 de outubro, o Tribunal notificou as partes para se pronunciarem sobre o “direito a remuneração compensatória prevista e regulada nos artigos 96.º, n.ºs 2 e 3, e 102.º-A, do Código do IRS, por referência a esta retenção na fonte no montante de € 56.623,96 a reembolsar, computada até ao mês anterior ao da liquidação…” solicitada pela Requerente.
15. A remuneração decorrente do preceituado nos artigos 96º e 102º-A do CIRS, já se encontra contemplada na liquidação vigente nº 2025..., datada de 2025-09-19, mormente no respetivo campo 26, intitulado “Juros de retenção-poupança”, no valor de 1.453,04€” conforme informação prestada pela DSIRS (tudo conforme consta da liquidação n.º 2025..., datada de 2025-09-19 (Doc. nº. 1 junto ao Requerimento da Requerida de 15 de outubro), bem como a respetiva data de emissão (Doc. nº. 2, junto ao Requerimento da Requerida de 15 de outubro).”
b. Factos dados como não provados.
Não existem factos dados como não provados, porque todos os factos relevantes para a apreciação do pedido foram dados como provados.
IV - DO DIREITO
1. O Requerente solicitou à declaração de ilegalidade do indeferimento tácito da Reclamação Graciosa apresentada em 18 de outubro contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) do ano de 2023.
2. A Requerida não apresentou Resposta.
3. Por Despacho de 8 de julho de 2025, da Senhora Subdiretora-geral da Área de Gestão Tributária, o ato tributário impugnado foi revogado.
4. Ora, após a informação por parte da entidade Requerida de que AT tinha procedido à revogação do ato tributário, a Requerente vem informar o Tribunal de que “…atenta a revogação da liquidação nos termos da causa de pedir invocada e consequências associadas, e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios, não se opõe à extinção da lide por inutilidade superveniente da mesma, sem prejuízo da condenação em custas da parte, a AT, que lhe deu causa.”
5. Ora, a AT revogou o ato tributário objeto de litígio, anulando consequentemente a liquidação em causa, tudo conforme pretendia o Requerente com a apresentação deste PPA.
6. Torna-se evidente a inutilidade superveniente da lide.
7. E sendo tal inutilidade reconhecida e determinada por este Tribunal nada mais haverá a decidir nem apreciar.
8. Efetivamente, temos que atender a que a mesma foi efetuada na pendência da presente ação, perdendo, assim, o pedido de pronúncia arbitral o seu objeto principal, inexistindo, por consequência, qualquer utilidade na pronúncia solicitada, conforme também manifestado pela Requerente.
9. Com efeito, a referida revogação foi dada a conhecer ao presente Tribunal, através do requerimento apresentado pela Requerida no dia 10 de julho de 2025, juntando para o efeito a respetiva Informação dos serviços da AT, ou seja, na pendência do processo.
10. Acontece que a inutilidade superveniente da lide é, nos termos do disposto na alínea e) do artigo 277.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 29.º do RJAT, uma causa de extinção da instância, a qual ocorre quando, «por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio.» - cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no processo n.º 0875/14, de 30.07.2014, o qual sumariamente, explica que:
«I – A inutilidade superveniente da lide (que constitui causa de extinção da instância - al. e) do art. 277º do CPC) verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de interessar, por o resultado que a parte visava obter ter sido atingido por outro meio.»
11. Aduz, em complemento a esta questão, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no processo n.º 07433/14, de 10.04.2014, que:
«1. Entre as causas de extinção da instância do processo declarativo, as quais são aplicáveis à execução supletivamente, conforme dispõe o artº.551, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, vamos encontrar a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide (cfr. artº.277, al.e), do C.P.Civil).
2. Esta causa de extinção da instância contém dois requisitos que necessitam estar verificados para a sua aplicação. São eles, a inutilidade da lide, e que essa inutilidade decorra de facto posterior ao início da instância, para poder dizer-se que é superveniente, a qual dá lugar à mesma extinção da instância sem apreciação do mérito da causa.
3. Também neste sentido segue a doutrina e a jurisprudência, ao referirem que a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide se dá quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo ou, por outro lado, porque encontra satisfação fora do esquema da proveniência pretendida. Num e noutro caso, a causa deixa de interessar - além por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios.
4. Só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica. A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor/recorrente.»
12. Ora, Lebre de Freitas, entre outros autores, considera que “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá- se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objeto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da proveniência pretendida. Num e noutro caso, a proveniência deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios” – Cfr “Código de Processo Civil Anotado”, vol. III, pág. 633.
13. Assim, considerando que a pretensão da Requerente se encontra satisfeita, incluindo a remuneração compensatória prevista e regulada nos artigos 96.º, n.ºs 2 e 3, e 102.º-A, do Código do IRS, em virtude da revogação do ato tributário impugnado e a sua consequente anulação, e não se vislumbrando a utilidade ou interesse na manutenção da pronúncia arbitral, por ter operado a inutilidade superveniente da lide, deve a decisão do presente Tribunal ser no sentido de declarar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide relativamente ao pedido de pronúncia realizado, em conformidade com o previsto no disposto na alínea c) do artigo 277.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.
V - JUROS INDEMNIZATÓRIOS
1. A Requerente, demonstra e a AT não contesta, que o imposto referente ao IRS do ano de 2023, foi pago por via do recurso ao mecanismo de retenção na fonte, e por isso invoca que:
“Na liquidação de IRS que se contesta foi liquidado um montante de imposto (colecta líquida) de € 101.401,13, e consequentemente um montante a reembolsar (por excesso de retenções na fonte) de € 1.324,87 (Doc. n.º 2),”.
2. Para de seguida concretizar:
“…quando devia ter sido apurado, em razão da aplicabilidade ao caso do regime do RNH, um montante de imposto (colecta líquida) de € 44.777.17, e consequentemente um montante a reembolsar (por excesso de retenções na fonte) de 57.948.83 (e não de apenas de € 1.324,87), excesso pois, de imposto liquidado e por conseguinte défice de reembolso, no montante de € 56.623,96.”
3. Prossegue a Requerente que, declarada a ilegalidade da liquidação em causa, o que aqui se concede, por via da revogação do ato por parte da Autoridade Tributária, a mesma tem direito “…ao abrigo do artigo 43.º da LGT, a juros indemnizatórios, contados desde 1 de Setembro de 2024 inclusive até integral reembolso do mesmo, por falta de restituição de retenções na fonte neste montante até 31 de Agosto de 2024 nos termos conjugados dos artigos 96.º, n.º 1, 97.º, n.º 1, alínea a), e 102.º-B do Código do IRS.”
4. Direito esse que a Informação dos Serviços da AT supra identificada e que mereceu Despacho de concordância, proferido 8 de julho de 2025, da Senhora Subdiretora-geral da Área de Gestão Tributária, reconhece expressamente ao referir que:
5. “… sendo manifesta a violação da lei, é entendimento dos serviços determinar o direito ao pagamento de juros indemnizatórios, por pagamento indevido de imposto.”
6. O que, naturalmente, este Tribunal igualmente determina.
7. Concluindo:
Sendo imputável à Requerida, por força da revogação do ato, a inutilidade superveniente da lide e estando demonstrado que a Requerente pagou o imposto impugnado, o que se revelou indevido, por força do disposto nos artºs 61.º do CPPT e 43.º da LGT, tem o Requerente direito aos juros indemnizatórios requeridos, juros esses a serem contados desde a data do pagamento do imposto indevido (anulado) até à data da emissão da respetiva nota de crédito, contando-se o prazo para esse pagamento do início do prazo para a execução espontânea da presente decisão (art.º 61.º, n.ºs 2.ºa 5, do CPPT), tudo à taxa apurada de harmonia com o disposto no n.º 4.º do artigo 43.º da LGT.
8. Razão pela qual, dá-se assim provimento ao pedido da Requerente.
VI - DECISÃO
De harmonia com o exposto, decide-se declarar a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, em virtude da revogação do ato tributário sindicado e a sua consequente anulação e condenar a AT, nos termos expostos, ao pagamento de juros indemnizatórios.
VII - VALOR DO PROCESSO
Fixa-se o valor do processo em € 56.623,96 (cinquenta e seis mil seiscentos e vinte e três euros e noventa e seis euros), nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.
VIII - CUSTAS
Custas a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do RJAT, do artigo 4.º do RCPAT, e da Tabela I anexa a este último, que se fixam no montante de € 2.142,00 (dois mil cento e quarenta e dois euros), em virtude de ter sido a AT quem deu causa à declaração de extinção da instância, face à revogação do ato tributário impugnado na pendência do processo arbitral.
Notifique-se.
Lisboa, 22 de outubro de 2025.
O Árbitro
Jorge Carita