Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 561/2024-T
Data da decisão: 2025-06-30   Outros 
Valor do pedido: € 33.017,30
Tema: ASSB - Adicional de Solidariedade sobre o Sector Bancário. Princípio da igualdade. Princípio da capacidade contributiva e da proporcionalidade.
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SUMÁRIO: 

1.    As normas conjugadas dos artigos 1.º, n.º 2, 2.º e 3.º, n.º 1, alínea a) do Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, são inconstitucionais, por violação do princípio da igualdade, na dimensão da proibição do arbítrio, e por violação do princípio da capacidade contributiva e da proporcionalidade, enquanto decorrência do princípio da igualdade tributária. (Acórdão do TC n.º 469/2024, de 19.06.2024 e 529/2024, de 02.07.2024).

2.    Em consequência, os atos de liquidação de “ASSB” relativos ao período de tributação do ano de 2021 são ilegais, bem como é ilegal a decisão de rejeição liminar do pedido de revisão oficiosa deduzido.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I.    RELATÓRIO

I.1 Enquadramento

1.  A..., CRL, com o NIPC ..., com sede na Rua ..., n.º..., ...-...  ...; B..., CRL, com o NIPC ..., com sede na Rua ..., ...-......; C..., CRL, com o NIPC..., com sede no..., ...– ... ..., e D..., CRL, com o NIPC ..., com sede na ..., n.ºs ... - ..., ...-... ..., (doravante designadas como Requerentes), ao abrigo do artigo 3.º do RJAT, em coligação de autores e cumulação de pedidos, apresentaram junto do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), pedido de constituição de Tribunal Arbitral singular, ao abrigo das disposições conjugadas nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º, n.º 1, 5.º, n.º 3, alínea a), e 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), (de ora em diante designada por Requerida).

2.  No pedido de pronúncia arbitral (ppa), apresentado em 15.04.2024, as Requerentes peticionam que seja declarada ilegal a decisão de rejeição do pedido de revisão oficiosa n.º ...2023..., deduzido contra os atos de autoliquidação do Adicional de Solidariedade sobre o Setor Bancário (adiante “ASSB”), aprovado pela Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, Lei do Orçamento do Estado Suplementar para 2020, por referência ao ano de 2021, e que se determine a anulação dos atos de autoliquidação do “ASSB” em crise, por referência ao ano de 2021, no valor total de € 33.017,30; e, consequentemente, se condene a Autoridade Tributária no reembolso do “ASSB” indevidamente pago pelas Requerentes, acrescido de juros indemnizatórios, desde a data do pagamento da quantia até efetivo reembolso, calculados à taxa legal em vigor, com as demais consequências legais.

3.  Em 17.04.2024, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e foi de imediato notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira. O Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 6.º do RJAT, em 11.06.2024 foi designado, pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, o ora signatário como Árbitro para integrar o tribunal arbitral singular, o qual, no prazo legal, comunicou a aceitação do encargo.

4.  Tendo sido notificadas desta designação, as Partes não manifestaram vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

5.  Em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º, do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, em 01.07.2024, verificou-se a constituição do Tribunal arbitral.

6.  Em 01.07.2024 foi proferido despacho arbitral para a Exm.ª Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira apresentar resposta no prazo legal, nos termos e para os efeitos previstos nas normas do artigo 17.º do RJAT. 

7.  Em 13.09.2024, a Requerida veio juntar aos autos a sua resposta, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida. A Requerida defende-se por exceção e por impugnação e pugna que, atentas as razões invocadas, deve o pedido de pronúncia arbitral ser julgado totalmente improcedente. Com a sua resposta a Requerida juntou o processo administrativo (pa). 

8.    Em face do conhecimento que decorre das peças processuais e dos documentos juntos pelas Partes, por despacho de 12.11.2024 ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidade processuais (artigos 19.º, n.º 2, e 29.º, n.º 2, do RJAT), não obstante as exceções invocadas pela Requerida na sua resposta, e atenta a circunstância das questões a decidir ser matéria de direito, em ordem a fazer a correta aplicação do direito, o Tribunal decidiu:

a)  Que as exceções invocadas pela Requerida serão apreciadas na decisão arbitral;

b)  Notificar as Requerentes para que, no prazo infra fixado para alegações, se pronunciar sobre as exceções invocadas pela Requerida na sua Resposta;

c)  Dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT;

d)  Determinar que o processo prossiga com alegações escritas facultativas, a apresentar no prazo de 20 dias, cumulativo, por aplicação conjunta do previsto no artigo 91.º, n.º 5, do CPTA, e no artigo 120.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º do RJAT;

e)  Determinar que a decisão arbitral seria proferida até ao termo do prazo previsto no n.º 1 do artigo 21.º do RJAT. Todavia, pelas razões invocadas nos respetivos despachos arbitrais o prazo de prolação da decisão teve de ser prorrogado por mais de uma vez.

9.  Em matéria de alegacões, em requerimento apresentado em 18.11.2024, as Requerentes apresentaram as suas alegações e informaram que não se opunham à não realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e que, em requerimento apresentado em 25.09.2024, já se tinham pronunciado sobre as exceções invocadas pela Requerida. Em requerimento apresentado em 05.12.2024, as requerentes vieram juntar aos autos as decisões do CAAD n.ºs 548/2024-T, 568/2024-T e 567/2024-T.

10.  A Requerida apresentou as suas alegações em 10.12.2024, as quais aqui se dão por integralmente reproduzidas.

 

I.2   Da posição das Requerentes

11. As Requerentes alegam que o pedido de pronúncia arbitral tem por objeto imediato a decisão de Rejeição do Pedido de Revisão Oficiosa n.º ...2023..., e por objeto mediato os atos de autoliquidação do “ASSB”, todos por referência ao ano de 2021, devendo o “ASSB”, em face da sua ilegalidade e inconstitucionalidade, ser objeto de reembolso, acrescido de juros indemnizatórios.

12. As Requerentes sublinham que o artigo 21.º da LOE Suplementar para o ano de 2020 consagra, para os anos de 2020 e 2021, uma disposição transitória que prevê que:

“Em 2020 e 2021, a liquidação e o pagamento do adicional de solidariedade sobre o setor bancário previsto no regime que consta do anexo VI à presente lei efetua-se de acordo com as seguintes regras: 

a)    A base de incidência apurada nos termos dos artigos 3.º e 4.º do regime é calculada por referência à média semestral dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas relativas ao primeiro semestre de 2020, no caso do adicional de solidariedade devido em 2020, e nas contas relativas ao segundo semestre de 2020, no caso do adicional de solidariedade devido em 2021;

b)    A liquidação é efetuada pelo próprio sujeito passivo, através de declaração de modelo oficial aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, que deve ser enviada até ao dia 15 de dezembro de 2020 e 2021, respetivamente”.

13. As Requerentes alegam que nunca deveriam ter suportado o “ASSB”, seja com fundamento na ilegalidade da própria existência desse tributo (existência fixada através de um regime impregnado das mais variadas violações do texto Constitucional), seja porque a sua aplicação às Requerentes viola diretamente o seu Direito a uma tributação em conformidade com a legalidade, em respeito da igualdade e da capacidade contributiva, todos valores legais ignorados pelo próprio tributo.

14. As Requerentes consideram que estavam preenchidos os pressupostos legais para a revisão dos atos tributários de autoliquidação do “ASSB”, quer quanto ao erro por parte dos serviços da AT, quer quanto ao fundamento de injustiça grave e notória.

15. As Requerentes consideram que o “ASSB” liquidado e pago não era devido, e não se conformam com os atos de autoliquidação do “ASSB”, considerando que estes enfermam de erro de facto e de direito e que o respetivo regime que o criou do “ASSB” padece de inúmeras ilegalidades e inconstitucionalidades.

16. As Requerentes não se conformam com a decisão de Rejeição da AT, nomeadamente por considerarem que o regime do “ASSB” padece de inúmeras ilegalidades e inconstitucionalidades, não devendo as Requerentes encontrar-se sujeitas ao “ASSB”.

17. E que apresentaram o pedido de pronúncia arbitral para obter uma decisão que declarar a nulidade ou, caso assim não seja entendido, a anulação dos atos seguintes:

a) Decisão de Rejeição do Pedido de Revisão Oficiosa n.º ...2023...; 

b) Atos de autoliquidação do ASSB, referentes ao ano de 2021, os quais foram indevidamente liquidados e pagos, no valor total de € 33.017,30.

18. As Requerentes entendem que a AT ao proferir o despacho de Rejeição do Pedido de Revisão Oficiosa, agiu em violação do seu poder-dever, desde logo ao não ter procedido à correção dos erros das liquidações que conduziram à arrecadação de quantias pecuniárias que não deveriam ser devidas à face da lei.

19. As Requerentes alegam que existem dois fundamentos base para a interposição do presente pedido de pronúncia arbitral, nomeadamente, i) o facto de a liquidação resultar de erro dos serviços, e ii) o facto de a liquidação gerar uma injustiça grave na esfera das Requerentes, as quais foram alvo de incremento substancial, injustificado e ilegítimo da sua carga fiscal, em violação direta dos artigos 13.º, n.º 2, 18.º e 268.º, todos da Constituição.

20. As Requerentes alegam que o “ASSB”, foi criado pelo artigo 18.º e o Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, Lei do Orçamento do Estado Suplementar para 2020 (LOE Suplementar 2020), como sendo um adicional de um tributo principal “CSB”, mas que atenta a sua qualificação jurídico tributária, o “ASSB” constitui um tributo totalmente autónomo da Contribuição do Setor Bancário “CSB”, constituindo, assim, um imposto especial sobre o setor bancário, cuja receita foi consignada ao Fundo de Estabilização da Segurança Social.

21. Em face dos normativos dos artigos 1.º e 2.º do Regime do “ASSB”, importa concluir que este tem por objetivo reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, como forma de compensação pela isenção de IVA aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, e tem como sujeitos passivos, as instituições de crédito, filiais e sucursais destas em Portugal, em função da incidência subjetiva estabelecida no n.º 1 do artigo 2.º do regime da “ASSB”.

22. As Requerentes consideram que o “ASSB” constitui uma prestação pecuniária, unilateral e coativa, exigida pelo Estado às instituições de crédito, filiais e sucursais destas, enquanto sujeitos passivos detentores de capacidade contributiva, sem qualquer sinalagma de atividade.

23. E, assim sendo, o “ASSB” não tem contrapartida administrativa, nem específica nem genérica, provocada ou aproveitada pela generalidade dos sujeitos passivos (ou pelo setor em que estes se inserem, i.e., o setor bancário). O “ASSB” só é exigido às instituições de crédito que manifestem uma determinada capacidade contributiva, característica que é própria dos impostos.

24. As Requerentes alegam que a imputação principal que é feita aos sujeitos passivos do “ASSB” repousa predominantemente num custo, o associado ao sistema de segurança social, e esse custo não tem como propósito remunerar qualquer tipo de atividade prestativa. Acresce que, a simples afirmação de uma intenção de compensar os custos de uma prestação pública – cf. n.º 2 do artigo 1.º do Regime do ASSB – não permite a qualificação de um tributo como contribuição financeira.

25. As Requerentes alegam que, ao contrário da “CSB”, em que o Tribunal Constitucional veio afirmar que um dos propósitos na criação do tributo era o de “garantir que é o setor bancário que suporta os encargos que ele próprio gera”, o “ASSB” não tem subjacente quaisquer encargos gerados pelas instituições de crédito. Isto é, no caso do “ASSB” não se encontra em causa um tributo indexado à mitigação dos efeitos adversos provenientes do risco sistémico bancário.

26. Na verdade, o que está em causa é, tão somente, um tributo de cariz predominantemente unilateral que procura incutir aos respetivos sujeitos passivos uma nova sobrecarga contributiva, tratando-se, por isso, de uma escolha política e não técnico-fiscal, que tem vindo a gerar atos ilegais, como aqueles que estão impugnados no presente ppa.

27. As Requerentes invocam diversas posições doutrinais, a posição da Provedoria de Justiça sobre a qualificação jurídico-tributária do “ASSB”, bem como diversas decisões dos Tribunais arbitrais do CAAD, para concluir que o “ASSB” deve ser qualificado como verdadeiro imposto especial sobre o setor bancário, constituindo um tributo completamente autónomo e não se tratando de um adicional de qualquer tributo principal, como seja a “CSB”.

28. As Requerentes consideram que sendo o “ASSB” um imposto, o regime que o criou enferma das ilegalidades e inconstitucionalidades materiais seguintes:

i. Violação do Princípio Constitucional da Igualdade, previsto no artigo 13.º da Constituição, nas suas vertentes de generalidade e universalidade dos impostos e de proibição do arbítrio; 

ii. Violação do Princípio da Capacidade Contributiva, previsto nos artigos 13.º, 103.º e 104.º da Constituição, enquanto decorrência do Princípio da Igualdade Tributária;

iii. Violação do Princípio da Proporcionalidade Legislativa, previsto no n.º 2 do artigo 18.º e no n.º 4 do artigo 104.º, ambos da Constituição, na sua dimensão de proibição do excesso.

29.O “ASSB” é aplicável a um setor específico e determinado – o setor bancário –, o que consubstancia uma especificação setorial contrária aos corolários dos princípios da generalidade e universalidade que devem nortear a tributação, o que já representa um tratamento discriminatório, devendo verificar-se se existe uma justificação atendível para essa discriminação.

30. As requerentes consideram que, não obstante, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º do Regime do ASSB, este ter por objetivo reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social e servir como forma de compensação pela isenção de IVA aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, aproximando a carga fiscal suportada pelo setor financeiro à que onera os demais setores, as justificações invocadas para criar o “ASSB” não podem ser acolhidas, designadamente, atentas as razões seguintes:

·     O Princípio da Igualdade excluí as diferenciações não racionalmente compreensíveis ou que, sendo compreensíveis, são, evidentemente, inadmissíveis no Estado de Direito;

·     As isenções que vigoram para determinados serviços e operações financeiras são expressamente consentidas, e mesmo impostas, por Diretiva europeia – Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006;

·     Outrossim, vigoram isenções de IVA para os serviços e operações levados a cabo pelos setores da saúde, do ensino, dos seguros, entre outros;

·     Não se configura qualquer relação entre a despesa fiscal associada às isenções de IVA aplicáveis a serviços e operações financeiras e a parcela da receita que se encontra afeta ao FEFSS;

·     A despesa fiscal associada à isenção de IVA que vigora para serviços e operações financeiras está intimamente relacionada com a respetiva sujeição a Imposto do Selo.

·     Não pode o legislador fundamentar a criação do “ASSB” como forma de compensação pela isenção de IVA aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, uma vez que o Imposto do Selo cumpre já essa função;

·     O passivo das entidades do setor bancário não tem qualquer relação, mediata ou imediata, com qualquer um dos fundamentos apresentados pelo legislador para a criação do “ASSB” – seja a despesa fiscal associada às isenções de IVA que vigoram para os serviços e operações financeiras, seja a sustentabilidade económico-financeira do FEFSS;

·     O “ASSB” consubstancia um imposto que apenas visa um único setor de contribuintes para suportar uma despesa de que esse setor apenas é responsável em parte, não passando de um tributo que mais não pretende senão gerar uma fonte adicional de receita para o Estado à custa de um só setor de atividade económica;

·     A proibição do arbítrio na atuação Estadual traduz-se, precisamente na exigência de um sentido de justiça mínimo comummente reconhecido e, em si mesmo, não controverso.

31. As Requerentes concluem que o artigo 2.º do Anexo VI à LOE Suplementar 2020 é inconstitucional por violação dos imperativos e limites traçados pelo Princípio Constitucional da Igualdade, nas suas vertentes de generalidade e universalidade dos impostos e de proibição do arbítrio, ao onerar desigual e injustificadamente determinados contribuintes em detrimento de outros e por essa discriminação ser completamente arbitrária.

32. Quanto à violação do princípio da capacidade contributiva, de entre as razões invocadas pelas Requerentes destacam-se as seguintes:

·     Sendo o “ASSB” um imposto, essencialmente com finalidades fiscais ou creditícias, encontra-se sujeito e ao abrigo do Princípio da Capacidade Contributiva, enquanto corolário do Princípio da Igualdade Tributária, com previsão nos artigos 13.º, 103.º e 104.º da CRP;

·      De modo a obedecer ao Princípio da Capacidade Contributiva, o imposto em causa deve recair sobre um de três elementos; a saber: i) rendimento; ii) consumo; e/ou iii) património – cfr. n.º 1 do artigo 4.º da LGT;

·     O fundamento e o limite da cobrança do “ASSB” não são, de modo algum, aferidos com base na respetiva capacidade contributiva dos sujeitos passivos.

33. As Requerentes consideram que o regime do “ASSB”, nomeadamente, as normas conjugadas do n.º 1 do artigo 1.º, do artigo 2.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º, todos do Anexo VI à LOE Suplementar 2020, padece de vício de inconstitucionalidade, por violação do Princípio da Capacidade Contributiva enquanto decorrência do Princípio da Igualdade Tributária, porquanto, aquele regime não evidencia qualquer tipo de vinculação a critérios reveladores de capacidade contributiva.

34. Quanto à violação do princípio da do Princípio da Proporcionalidade Legislativa, de entre as razões invocadas pelas Requerentes destacam-se as seguintes:

·     O “ASSB” constitui um imposto de natureza totalmente distinta da “CSB”, assumindo-se como um imposto especial sobre o setor bancário;

·     Em comum com a “CSB”, o “ASSB” só tem a circunstância de os respetivos regimes partilharem as mesmas estruturas de incidência subjetiva e objetiva;

·     O “ASSB” não pode constituir um adicional ou um adicionamento à “CSB”, prefigurando um tributo completamente autónomo deste;

·     É necessário considerar a possibilidade de coexistência da “CSB” e do “ASSB”, na medida em que a criação deste último possa implicar uma dupla tributação dos respetivos sujeitos passivos.

·     Com o “ASSB” criou-se um mecanismo já de si ilegal, que cria dupla tributação com os restantes tributos e que não corresponde a nenhum mecanismo tributário permitido no Direito Português;

·     A consagração do “ASSB” também se revela uma medida desadequada, desnecessária e excessiva face ao objetivo alegadamente prosseguido pelo legislador aquando da criação do tributo ora em crise.

35. As Requerentes concluem que a coexistência do “ASSB” com a “CSB” se traduz numa dupla tributação que recai sobre os respetivos sujeitos passivos, sendo que, as normas dos artigos 2.º e 3.º do Anexo VI à LOE Suplementar 2020, que consagram a incidência subjetiva e objetiva do “ASSB”, padecem de vício de inconstitucionalidade, por violação do Princípio da Proporcionalidade,

36. As Requerentes, outrossim, consideram que se verifica a violação do Direito da União Europeia, por violação da liberdade de estabelecimento, prevista no artigo 49.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (adiante ‘TFUE’), bem como a violação da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio, na medida em que o “ASSB” constitui um tributo sui generis, não previsto na Diretiva 2014/59/EU, o que viola o regime de contribuições consagrado na referida Diretiva e perverte o objetivo final de criação da própria Diretiva e do regime harmonizado europeu.

37. Na medida, em que o regime jurídico do “ASSB” viola a liberdade de estabelecimento na medida e extensão em que esta deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que permite exclusivamente às instituições de crédito residentes e às filiais de instituições de crédito não residentes, com personalidade jurídica (excluindo, por conseguinte, as sucursais de instituições de crédito não residentes, sem personalidade jurídica), deduzir os respetivos fundos próprios, bem como os instrumentos de dívida equiparáveis, da base de incidência de um imposto que incide sobre o passivo dessas entidades.

38. É, ainda, relevante considerar a liberdade de circulação, ínsita no artigo 63.º do TFUE, à imagem de qualquer liberdade fundamental do Direito da União Europeia, é diretamente aplicável quer à administração pública, quer aos particulares, tem precedente sobre a lei doméstica (numa valoração de pluralismo jurídico contida no artigo 8.º da Constituição) e funciona numa valoração quer positiva, quer negativa.

39. Quanto às exceções invocadas pela Requerida defendem as Requerentes que as mesmas devem ser consideradas improcedentes, com fundamento nas razões seguintes:

·     Encontra-se absolutamente assente a posição de que o meio processual de impugnação judicial é o meio próprio em todas as situações onde se visem atos relativos a questões tributárias que impliquem com a apreciação da legalidade do ato de liquidação, ainda que no mesmo processo se tenham de analisar questões relacionadas apenas com um procedimento prévio;

·     Nos presentes Autos não se discutem, nem exclusiva nem sequer predominantemente (muito pelo contrário), questões tributárias meramente formais e desconexas com a liquidação de tributos;

·     A posição da AT não merece qualquer acolhimento, pelo que, sem mais, é de improceder a exceção da impropriedade do meio processual invocada pela Requerida;

·     A AT entende que lhe competia uma oportunidade para se pronunciar sobre os atos em crise previamente à presente a via arbitral, mas, como a mesma AT não se quis pronunciar quanto ao fundo da Revisão (por entender que não estavam reunidos os pressupostos para tal), vem agora sustentar que, afinal, não houve um verdadeiro pronunciamento seu, pelo que qualquer reação subsequente fica prejudicada;

·     O Tribunal Arbitral é competente para apreciar as pretensões relacionadas com a declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação de tributos, tal como é caso em crise (Atos de autoliquidação do “ASSB”), pelo que também neste aspeto deve improceder a exceção de incompetência invocada pela Requerida.

40. Face de todas as razões expostas, as Requerentes consideram que o pedido de pronúncia arbitral deve ser considerado procedente e, em consequência, ser anulado o despacho de rejeição liminar do pedido de revisão oficiosa, por ser ilegal, e anulados os atos de autoliquidação do Adicional de Solidariedade sobre o Setor Bancário, no valor total de € 33.017,30, referentes ao ano de 2021, com os inerentes efeitos legais.

 

I.3   Da posição da Requerida

41. A requerida, em face da análise que fez dos factos e dos argumentos explicitados pelas Requerentes, considera que o pedido de pronúncia arbitral deve ser considerado improcedente e mantidos na ordem jurídica os atos de autoliquidação do “ASSB” referentes ao ano de 2021, no valor total de € 33.017,30.

42. A Requerida considera que, quer o pedido de pronúncia arbitral, quer o Tribunal Arbitral são, respetivamente, inidóneos e incompetentes quanto à pretensa ilegalidade da decisão de rejeição liminar do pedido de revisão oficiosa (PRO).

43. A Requerida limitou-se a aferir dos pressupostos do PRO (condição prévia para a subsequente análise do mérito do pedido), tendo concluído que o requisito da competência não se encontrava preenchido. O indeferimento liminar do PRO constitui um ato administrativo em matéria tributária (porquanto tal decisão não apreciou ou discutiu a legalidade de um ato de liquidação), e não um ato tributário.

44.A Requerida considera que só a Ação Administrativa constitui o meio processual adequado para impugnar a decisão de rejeição liminar sub judice, conforme decorre do artigo 97.º/1-p) do CPPT. E não o Pedido de Pronúncia Arbitral, pois que este constitui um dos meios de reação destinados a apreciar atos tributários (artigo 2.º/1 do RJAT).

45. A impropriedade do meio processual consubstancia uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, conducente à absolvição da instância quanto à pretensão em causa, de acordo com o previsto nos artigos 577.º e 278.º/1 ambos do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis ex vi do artigo 29.º/1-e) do RJAT.

46. A Requerida, de igual modo, suscitou a incompetência do Tribunal Arbitral, porquanto, a apreciação de tal matéria extravasa as competências que lhe estão reservadas por lei.

47. E, assim, a Requerida considera que a incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar a decisão de rejeição liminar do PRO consubstancia uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, conducente à absolvição da instância quanto à pretensão em causa, de acordo com o previsto no artigo 576.º/1 e 2 e no artigo 577.º-a) do CPC ex vi do artigo 29.º/1-e) do RJAT.

48.A Requerida invoca que estão excluídas da jurisdição do CAAD as pretensões relativas à ilegalidade de autoliquidações que não tenham sido precedidas de recurso à via administrativa (artigo 2.º/1-a) da Portaria 112-A/2011, de 22 de março).

49.A Requerida considera que, uma vez que o PRO foi liminarmente indeferido, não tendo o CAAD competência para analisar da legalidade dos fundamentos invocados pela AT na decisão de indeferimento liminar.

50. A Requerida considera relevante notar que o PRO foi apresentado muito depois do prazo de dois anos previsto para a reclamação administrativa (Art.º 131.º do CPPT).

51.A Requerida salienta que o PRO foi liminarmente rejeitado, e além disso, foi apresentado extemporaneamente, razão pela qual nunca poderá ser equiparado à impugnação administrativa a que se refere o artigo 131.º/1 do CPPT, sendo por isso forçoso concluir pela inimpugnabilidade dos atos autoliquidação de “ASSB” em crise por falta de precedência de impugnação administrativa dentro do prazo legalmente previsto.

52. A criação do “ASSB” está indissociavelmente relacionada com o contexto histórico da pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2. O “ASSB” foi uma das várias medidas fiscais previstas no Programa de Estabilização Económica e Social (PEES), aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros (RCM) n.º 41/2020, de 6 de junho, com vista a mitigar os impactos económicos e sociais decorrentes da resposta pública à crise sanitária.

53. A RCM n.º 41/2020, de 6 de junho, determinou que a receita do “ASSB” fosse integralmente “(…) adstrita a contribuir para suportar os custos da resposta pública à atual crise, através da sua consignação ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social [FEFSS]”, atento o impacto direto e significativo que, como é notório, as diversas medidas adotadas em contexto pandémico tiveram no financiamento do sistema de segurança social.

54. Foi nesta conjuntura pandémica de crescente pressão sobre o sistema de segurança social que a Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, procedeu à segunda alteração à Lei n.º 2/2020, de 31 de março (Orçamento do Estado para 2020), e aprovou, no seu artigo 18.º, o regime que criou o “ASSB”, previsto no Anexo VI.

55. O “ASSB” apresenta-se como um tributo que assume natureza de imposto indireto, na medida em que visa compensar a não tributação em IVA da generalidade das operações financeiras. Sendo de referir que, nos termos do artigo 9.º do Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, “a receita do adicional de solidariedade sobre o setor bancário constitui receita geral do Estado, e é integralmente consignado ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social”, tal como determinado pela RCM n.º 41/2020, de 6 de junho.

56. A propósito da violação do princípio da igualdade, a Requeridas invoca diversa doutrina e abundante jurisprudência, e considera ser inequívoco que que a opção do legislador de sujeitar as instituições de crédito ao “ASSB” assenta num critério distintivo objetivo, razoável e materialmente justificado. E, assim, a tributação das instituições de crédito em sede de “ASSB” não configura qualquer diferenciação arbitrária em desfavor do setor financeiro em geral e, em particular, das instituições de crédito.

57. A Requerida salienta que, no âmbito da sua liberdade de conformação ou discricionariedade legislativa, o legislador entendeu dever sujeitar as instituições de crédito ao “ASSB” como forma de compensar a isenção de IVA aplicável aos serviços e operações financeiras por força do disposto no n.º 27 do artigo 9.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) e, com isso, reduzir a discrepância entre a carga fiscal suportada pelo setor financeiro e aquela, mais penosa, que onera os demais setores de atividade sujeitos e não isentos de IVA.

58. Considerando que o IVA constitui, per se, uma das fontes de financiamento da Segurança Social, através da consignação de uma parcela da sua receita para essa finalidade (o denominado “IVA social”), a criação do “ASSB” como forma de contrabalançar a isenção de IVA associada aos serviços e operações financeiras, com a consequente consignação da sua receita ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), apresenta-se como uma opção natural e coerente do legislador.

59. Sendo, por isso, razoável e materialmente justificado que um setor reconhecidamente subtributado em matéria de fiscalidade indireta, como é o caso do setor financeiro e, em concreto, das instituições de crédito, seja, também ele, chamado a contribuir para o sistema de segurança social.

60. O que, aliás, vai ao encontro da permanente preocupação, cada vez mais justificada, de assegurar a sustentabilidade e estabilidade da Segurança Social, designadamente através da diversificação das suas fontes de financiamento, que constitui um princípio há muito adotado nas Leis de Bases da Segurança Social (cfr. artigo 78.º da Lei n.º 17/2000, de 8 de agosto, artigo 107.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de dezembro e artigo 88.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro).

61.O benefício decorrente da isenção é ainda mais patente no caso dos serviços e operações financeiras que, apesar de também estarem isentas de IVA, proporcionam o direito a dedução do imposto suportado a montante, em conformidade com o disposto na subalínea v), da alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, por transposição da norma prevista na alínea c) do artigo 169.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (Diretiva do IVA).

62. E não se diga que a isenção aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras não representa, em bom rigor, um benefício efetivo para os sujeitos passivos, in casu, as instituições de crédito, por se tratar de uma isenção simples ou incompleta, ou seja, que não confere direito a dedução do imposto suportado a montante nas operações internas.

63. Desde logo porque admitir que a tributação em IVA dos serviços e operações financeiras, com a consequente possibilidade de dedução do IVA suportado a montante para a sua realização, é que seria benéfica para o setor bancário, aumentando o seu lucro, significaria, na prática, que a atividade deste setor não gera valor acrescentado em termos de resultado dos exercícios, o que não se crê, mesmo empiricamente, que seja verosímil.

64. A Requerida salienta que não se pode ignorar que a isenção de IVA desonera objetivamente de tributação o valor acrescentado a final no setor bancário, em detrimento de outros setores cujas atividades estão sujeitas e não isentas de tributação indireta em sede de IVA que, como já se demonstrou acima, contribuem para o FEFSS através do denominado “IVA social”.

65. Em Portugal, somente uma parte diminuta da atividade financeira das instituições de crédito está sujeita a tributação indireta, mais concretamente em sede de Imposto do Selo, o qual, aliás, desde a reforma do Código do Imposto do Selo (CIS) levada a cabo pela Lei n.º 150/99, de 11 de setembro, apresenta um mecanismo de funcionamento semelhante ao do IVA, porquanto o imposto é liquidado e entregue ao Estado pelo sujeito passivo e repercutido no adquirente.

66. A receita do Imposto do Selo incidente sobre os serviços e operações financeiras é, em termos comparativos, consideravelmente mais baixa do que aquela que seria arrecadada com a tributação, em sede de IVA, do valor acrescentado pela atividade bancária.

67. Não se pode ainda olvidar que a receita do Imposto do Selo não está, nem mesmo parcialmente, consignada à Segurança Social, diversamente do que sucede com o IVA e o “ASSB”.

68. A Requerida salienta que, de acordo com os valores apurados pela AT (cfr. quadros juntos à Resposta - Doc. n.º 1), no período em análise, ou seja, entre 2016 e 2022, o valor do Imposto do Selo relativo a operações financeiras (verba 17 da TGIS) correspondeu a apenas 6,2% do produto bancário (oscilando entre o mínimo de 5,1%, em 2017, e um máximo de 7,0%, em 2019) e a 7,8% do produto bancário deduzido dos outros gastos gerais administrativos (oscilando entre o mínimo de 6,4%, em 2017, e o máximo de 8,5%, em 2019), o que considerando que este último indicador corresponde a uma boa aproximação do valor acrescentado bruto do setor bancário implica uma taxa efetiva de imposto sobre as operações financeiras significativamente inferior à taxa normal do IVA. 

69. Atenta a relevância económica do setor financeiro na produção de riqueza em Portugal, a não incidência de tributação indireta sobre uma parte relevante das suas operações suscita não só questões de perda de receita fiscal e de distorção e desigualdade entre operadores, como também de desigualdade na distribuição do esforço tributário.

70. A Requerida salienta que a isenção de IVA aplicável aos serviços e operações financeiras constitui um dos principais fundamentos assinalados em experiências internacionais – nas quais, inclusive, Portugal fez ou ainda faz parte – com vista a introdução de impostos indiretos que incidem sobre este setor, designadamente impostos sobre transações financeiras (Financial Transactions Tax – FTT) e impostos sobre atividades financeiras (Financial Activities Tax – FAT).

71. A justificação aduzida pelo legislador para sujeitar as instituições de crédito ao “ASSB” tem como fundamento material a ideia de justiça fiscal, mais concretamente de reposição da igualdade através da distribuição do esforço tributário entre os diversos operadores económicos, reduzindo-se assim a discrepância entre a carga fiscal suportada pelo setor financeiro e aquela, mais penosa, que onera os demais setores de atividade, atenta a isenção de IVA de que os serviços e operações financeiras beneficiam e que é apenas parcialmente colmatada, em matéria de fiscalidade indireta, pela tributação em sede de Imposto do Selo.

72. A Requerida conclui que a criação do “ASSB” apenas violaria o princípio da igualdade se os setores não financeiros não estivessem sujeitos a uma tributação indireta equivalente ou, pelo menos, comparável.

73. A propósito do princípio da capacidade contributiva, a Requerida salienta que o “ASSB” se assume como um imposto que visa colmatar a ausência do IVA (também ele um imposto indireto) tendo como alvo um determinado setor que dele é isento, assumindo um recorte idêntico ao da “CSB”, no que toca à incidência objetiva - abarca operações registadas no passivo e instrumentos financeiros derivados fora do balanço.

74. Ao fazer coincidir a base de incidência do “ASSB” com a da “CSB”, logrou o legislador alcançar significativos ganhos de eficiência, desde logo ao mitigar custos de implementação e contexto, que se afiguram como sendo, desde logo, uma das principais dificuldades na criação de impostos de consumo nos serviços financeiros.

75. O legislador agiu dentro do escopo da liberdade de conformação fiscal, e encontrou como fundamento para delinear o âmbito de incidência do novo “ASSB”, a ausência ou a menor tributação num imposto indireto – IVA e Imposto do Selo – de determinadas operações.

76. A Requerida salienta que, ao contrário do que propugnam as Requerentes, o “ASSB” permite atingir adequadamente as formas de expressão da capacidade contributiva, que se propõe enquanto imposto que visa compensar a isenção do IVA nas operações financeiras, sendo até possível enquadrá-lo em experiências internacionais, sempre com inteiro respeito pelo princípio constitucional da igualdade tributária.

77. No sentido de que o “ASSB” não enferma das inconstitucionalidades apontadas pelas Requerentes, a Requerida invoca a posição do Professor Doutor Tomás Cantista Tavares, na decisão proferida no processo arbitral n.º 609/2023-T, quando refere que “I. O Acórdão C-340/23 do TJUE definiu o critério interpretativo da violação do Direito Europeu, mas remeteu para o Tribunal nacional, a questão do apuramento da tela factual de existência (ou não) de identidade no regime jurídico do ASSB para as sucursais e para as sociedades residentes em Portugal. II. A liquidação de ASSB não viola o princípio da não discriminação da União Europeia, pois a base tributária da sucursal financeira em Portugal é idêntica às das instituições homólogas com residência em Portugal (cfr. Ac. STA, n.º 090/21.2BELRS, de 31/5/2023). III. A liquidação de ASSB não viola ao princípio da igualdade: na dimensão de generalidade, igualdade comparativa e respeito pela capacidade contributiva. IV. A liquidação de ASSB não viola os princípios da não consignação e especificação, previstos, respetivamente, no art.º 16.º e 17.º da Lei n.º 151/2015”.

78. A Requerida traz, ainda, à colação os votos de vencidos do Professor Doutor Tomás Cantista Tavares, exarado no processo arbitral n.º 325/2023-T, e do Dr. António Lima Guerreiro, no processo arbitral n.º 548/2024-T.

79. Em matéria de juros indemnizatórios, a Requerida salienta que a AT está obrigada a aplicar os diplomas legais criados pela Assembleia da República e pelo Governo, estando-lhe, consequentemente, vedado anular ao atos de autoliquidação em crise, dado que não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o Tribunal Constitucional já tenha declarado a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (art.ºs. 281.º e 282.º da CRP), ou se esteja perante o desrespeito por normas constitucionais diretamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (art.º 18.º da CRP), o que não é o caso.

80. Contrariamente ao afirmado pelas Requerentes, o erro não pode ser imputável à AT, mesmo tendo sido chamada a pronunciar-se em sede de pedido de revisão oficiosa, e tendo este sido liminarmente indeferido.

81. A requerida considera que o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios deve ser indeferido, porque não existe erro imputável aos serviços, nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT, bem como a aplicação do artigo 43.º, n.º 3 alínea d) da LGT é ilegal e inconstitucional, por violar os artigos 18.º, 281.º e 282º da CRP.

82. Sem prejuízo das exceções invocadas, a Requerida advoga que o presente ppa deve ser julgado totalmente improcedente, dado que as normas conjugadas dos artigos 1.º, n.º 2, 2.º e 3.º, n.º 1, al. a), da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, não violam o princípio constitucional da igualdade, em qualquer uma das suas dimensões, designadamente, proibição de arbítrio, criação de impostos desproporcionais e não genéricos, não viola o princípio da proporcionalidade legislativa, nem qualquer outro princípio constitucional, devendo manter-se na ordem jurídica os atos tributários de autoliquidação do “ASSB”, relativos ao período de tributação do ano de 2021, impugnados pelas Requerentes.

 

II.  SANEAMENTO

83. O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro. 

84. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.

85. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (cfr. art.º 4.º e n.º 2 do art.º 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 e art.º 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de março).

86. O processo não enferma de nulidades, importando proceder à apreciação das exceções invocadas pela Requerida antes de efetuar a apreciação e decisão sobre o mérito da matéria em causa.

 

III.    FUNDAMENTAÇÃO

III.1. MATÉRIA DE FACTO

III.1.1. Factos provados

 

87. Em relação à matéria de facto, o Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe, nos termos do n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e do n.º 3 do artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do artigo 29.º do RJAT, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar os factos considerados provados e os não provados. O tribunal considera provados e relevantes para a decisão arbitral os factos seguintes:

87.1  As Requerente são todas instituições de crédito, com sede principal e administração efetiva em Portugal, partilhando uma base de atividade comum, o que significa que todas apresentaram as suas declarações com base na mesma alínea do artigo 2.º do Regime do “ASSB”;

87.2  Todas as Requerentes constam da lista de contribuintes cuja situação tributária deve ser acompanhada pela Unidade dos Grandes Contribuintes, de acordo com o Despacho n.º 7048/2022, de 27 de maio, conforme anexo 1 ao referido Despacho – cfr. Doc. n.º 5 junto ao ppa;

87.3  As Requerentes autoliquidaram o “ASSB” relativo ao ano de 2021, e entregaram as respetivas Declarações Modelo 57 até ao dia 15 de dezembro de 2021 – cfr. Doc. n.º 2 junto ao ppa;

87.4  Em 14.12.2023, as Requerentes apresentaram na Unidade dos Grandes Contribuintes o pedido de revisão oficiosa, com vista à anulação dos atos de autoliquidação do “ASSB”, referentes ao ano de 2021, tendo-lhe sido atribuído o n.º ...2023... – cfr. Doc.n.º 3, junto ao ppa;

87.5  Em 07.02.2024, as Requerentes foram notificadas do despacho de rejeição do pedido de revisão oficiosa deduzido contra os atos de autoliquidação do “ASSB”, referentes ao ano de 2021; proferido, ao abrigo de subdelegação de competências, pelo chefe de Divisão de Serviço Central, e notificado através do ofício n.º .../DJT/2024, de 07.02.2024, da Unidade dos Grandes Contribuintes – cfr. Doc. n.º 1 junto ao ppa;

87.6  As Requerentes (A..., CRL, B..., CRL, C..., CRL, D..., CRL), procederam à autoliquidação do “ASSB”, respetivamente, nas datas seguintes: em 09.11.2021, no valor de € 4.919,54; em 18.11.2021, no valor de € 11.728,67; em 04.11.2021, no valor de € 11.094,99; em 06.10.2021, no valor de € 5.274,10, o que perfaz o valor total de € 33.017,30. A entrega do “ASSB” nos cofres do Estado ocorreu, respetivamente, nas datas seguintes: 09.11.2021, 18.11.2021, 04.11,2021 e em 06.11.2021 – cfr. Docs. n.º 6, 7 e 8 juntos ao ppa;

87.7  O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 15.04.2024.

 

III.1.2. Da Motivação e dos Factos não provados

88. Os factos provados baseiam-se nos documentos apresentados pelas Partes e juntos ao processo arbitral, não existindo, com relevo para a decisão, factos que devam considerar-se como não provados.

III.2. MATÉRIA DE DIREITO

89. Em face da matéria de facto controvertida e dos argumentos aduzidos pelas Partes – Requerente e Requerida – a questão de direito que importa decidir é sobre a conformidade do regime do “ASSB” com a Constituição da República Portuguesa e com o Direito Europeu. Todavia, antes da apreciação do mérito do pedido de pronúncia, importa apreciar as exceções de inidoneidade do meio processual e da incompetência do Tribunal arbitral para apreciar a pretensão deduzida pelas Requerentes no presente pedido de pronúncia arbitral.

 

III.2.1 DAS EXCEÇÕES INVOCADAS PELA REQUERIDA

90. A Requerida defende que é a ação administrativa e não a impugnação judicial do indeferimento de pedido de revisão oficiosa da autoliquidação o meio processual adequado para impugnar a decisão de rejeição liminar da presente pretensão, nos termos da alínea p) do n.º 1 do artigo 97.º do CPPT, pelo que o Tribunal Arbitral seria incompetente para o conhecimento da causa, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT. No entanto, a jurisprudência mais recente dos tribunais superiores tem rejeitado essa interpretação da lei, afirmando que o meio processual adequado para discutir a legalidade do ato de liquidação é sempre a impugnação judicial independentemente de esta ter sido ou não precedida de meio gracioso e, no caso de assim ter acontecido, independentemente do teor da decisão que sobre ele recaiu ser formal ou de mérito.

91. Não seria, assim, meio adequado a ação administrativa regulada no Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), o que, nos termos do n.º 1 do artigo 2º do RJAT, excluiria a presente causa da jurisdição arbitral. A impugnação judicial de indeferimento de reclamação graciosa (ou de pedido de revisão oficiosa) tem sempre por objeto imediato a decisão da reclamação (ou de PRO) e apenas por objeto mediato os vícios imputados ao ato de liquidação (Acórdão do STA, proferido no processo n.º 01438/16.7BELRS, 16.09.2020).

92. Assim, os tribunais arbitrais podem apreciar a legalidade do indeferimento da reclamação (ou do PRO) com fundamentos em intempestividade, o que é, aliás, a solução mais razoável do ângulo da racionalidade processual, já que, de outro modo, a competência para apreciação dos requisitos formais e do mérito da ação pertenceria a tribunais diferentes e o seu conhecimento seguiria meios processuais também diferentes. Anulado o indeferimento da reclamação (ou do PRO) por vício procedimental, por a decisão impugnada ter indevidamente considerado intempestiva a reclamação (ou do PRO), de acordo com esse critério, cabe ao tribunal conhecer dos restantes vícios imputados ao ato tributário, uma vez que este é competente conhecer em tal impugnação, quer do indeferimento da reclamação (ou do PRO), quer dos vícios imputados ao ato tributário. São diversas as decisões dos Tribunais Tributários judiciais Superiores nesse sentido, de que se destacam os Acórdãos do STA proferidos no processo n.º 01138/12, de 11.09.2013, no processo n.º 01942/13, de 18.06.2014, no processo n.º 01021/14, de, 20.05.2015, no processo n.º 0427/16, de 12/10/16, no processo n.º 02546/08.3BEPRT 0192/18, de 08.01.2020, processo n.º 0608/13.4BEALM 0245/18, de 18.11.2020, no processo n.º 0129/18.9BEAVR, de 13.11.2021.

93. Esse princípio prevalece, outrossim, na própria circunstância de a Administração Tributária rejeitar liminarmente o pedido de revisão oficiosa com fundamento na sua alegada extemporaneidade, recusando sequer apreciar se houve ou não erro imputável aos serviços na liquidação. O entendimento da Requerida contrário à jurisprudência maioritária do STA, a ser aceite, redundaria na inutilidade do objeto da ação, mais se revelando contrário ao princípio da promoção do acesso à justiça, que deve imperar na interpretação das normas processuais (cfr. art.º 7.º do CPTA, aplicável ex vi da alínea c) do artigo 2.º do CPPT). Nesse sentido, veja-se também, o Acórdão do Tribunal Central Sul, proferido no processo n.º 96/17.6BCLSB, de 26.05.2022.

94. Essa jurisprudência não é obviamente incompatível com o ónus de reclamação necessária do ato de autoliquidação, do cumprimento do qual depende o acesso à jurisdição arbitral, nos termos da parte final da alínea a) do artigo 2.º da Portaria n.º 112- A/2011, de 22/3 (Portaria de Vinculação).

95. Conforme se refere na Decisão Arbitral n.º 9/2021- T: a tempestividade do pedido de pronúncia arbitral não pode ser justificada a partir do indeferimento de um pedido de revisão de ato tributário quando este se mostre extemporâneo: a questão da tempestividade do pedido de revisão deve ser sempre autonomizada da questão da tempestividade do pedido de pronúncia arbitral. Sendo o pedido de revisão intempestivo: o pedido de pronúncia arbitral não pode ser considerado tempestivo, o que seria contraditório: nesse sentido, pronunciar-se-ia, a propósito dos atos de autoliquidação e retenção na fonte, em recurso para uniformização de jurisprudência, o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, proferido no processo n.º 0117/24.6BALSB, de 22.01.2025. 

96. Não está, assim, em causa a sindicabilidade pelos tribunais estaduais ou arbitrais do pedido de anulação do ato de indeferimento, liminar ou não, do pedido de revisão oficiosa da liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços, bem como a competência dos tribunais arbitrais para o seu conhecimento, mas a sujeição da utilização desse meio processual ao ónus de reclamação necessária, que apenas fica afastado nas circunstâncias referidas quando estiver exclusivamente em causa matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, o que cabe ao Tribunal Arbitral apreciar. 

97. Com efeito, ainda que se atribua ao pedido de revisão oficiosa o mesmo efeito jurídico da reclamação graciosa, essa equivalência apenas pode ser reconhecida quando o pedido de revisão oficiosa tenha sido apresentado dentro do prazo previsto para aquela forma de impugnação administrativa, isto é, dentro do prazo de dois anos do n.º 2 do artigo 131º do CPPT. Nesse sentido, concorrem as Decisões Arbitrais n.ºs 840/2021-T e 778/2023-T. No mesmo sentido, a Decisão Arbitral nº 493/2024/T pronunciar-se-ia no sentido de que “Ainda que se atribua ao pedido de revisão oficiosa o mesmo efeito jurídico da reclamação graciosa para efeitos do artigo 131.º, n.º 1, do CPPT, essa equivalência apenas pode ser reconhecida quando o pedido de revisão oficiosa tenha sido apresentado dentro do prazo previsto para aquela forma de impugnação administrativa, isto é, dentro do prazo de dois anos”.

98. A decisão arbitral n.º 2015/2024-T pronunciar-se-ia do seguinte modo: “A competência dos Tribunais arbitrais para se pronunciarem sobre o indeferimento de pedido de revisão de autoliquidação, sem prévia apresentação de reclamação graciosa, há muito está esclarecida por jurisprudência dos nossos tribunais superiores. A este propósito, veja-se a decisão contida no Acórdão do Tribunal Administrativo Sul, proferida no processo n.º 96/17.6BCLSB, de 26.05.2022, em que afirma que: “O que cumpre aqui aferir é se estão ou não abrangidas, na competência material dos tribunais arbitrais tributários, as situações de reação a indeferimento de pedido de revisão de autoliquidação, em relação à qual não foi apresentada reclamação graciosa. Adiantemos, desde já, que a resposta é afirmativa, como, aliás, tem vindo a ser decidido”.

99. De acordo com tal jurisprudência, não haveria jamais sujeição da reclamação a um ónus de reclamação necessária, como se o regime do artigo 131.º do CPPT não existisse. O regime do artigo 131.º do CPPT seria uma mera faculdade do sujeito passivo de IRC poderia exercer ou não, sem que o não exercício tivesse quaisquer consequências.

100.  Essa pronúncia, na medida em que, sem qualquer apoio legal, recusa qualquer tipo de reclamação necessária, só seria compatível com a jurisprudência uniformizada do STA quando estivesse exclusivamente em causa matéria de direito e a autoliquidação tivesse sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária, já que só nesses casos a reclamação necessária é dispensada. Ainda assim, havendo dispensa de reclamação necessária, o prazo de impugnação judicial correria sempre continuadamente, a partir da autoliquidação, e não da reclamação facultativa que o contribuinte entenda apresentar, pelo que se verificaria sempre a caducidade do exercício de tal direito.

101.  A jurisprudência constante do STA tem considerado a “CSB” como uma mera contribuição financeira a favor do Fundo de Resolução, prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 153.º-F do RGICSF, e não como imposto, com fundamento no carácter comutativo e não unilateral dessa prestação. O conhecimento da legalidade dos atos da sua liquidação e cobrança estaria, assim. fora do âmbito da jurisdição arbitral nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, o que não é o caso do conhecimento da legalidade da liquidação e cobrança do “ASSB” caso este seja considerado imposto, que os contribuintes podem submeter aos tribunais arbitrais.

102.  Aqui chegados, importa ter em consideração a jurisprudência do STA, firmada no Acórdão proferido no processo 0653/05, de 06.10.2025, em que se dispõe que “I. Mesmo depois do decurso dos prazos de reclamação graciosa e de impugnação judicial, a Administração Tributária tem o dever de revogar actos de liquidação de tributos que sejam ilegais, nas condições e com os limites temporais referidos no art.º 78.º da LGT. II. O dever de a Administração efectuar a revisão de actos tributários, quando detectar uma situação de cobrança ilegal de tributos, existe em relação a todos os tributos, pois os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a administração tributária tem de observar na globalidade da sua actividade (art.º 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da L.G.T.), impõem que sejam oficiosamente corrigidos, dentro dos limites temporais fixados no art.º 78.º da LGT, os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de quantias de tributos que não são devidas à face da lei. III. A revisão do acto tributário com fundamento em erro imputável aos serviços deve ser efectuada pela Administração tributária por sua própria iniciativa, mas, como se conclui do n.º 7 (anterior n.º 6) do art.º 78.º da LGT, o contribuinte pode pedir que seja cumprido esse dever, dentro dos limites temporais em que Administração tributária o pode exercer. IV. O indeferimento, expresso ou tácito, do pedido de revisão, mesmo nos casos em não é formulado dentro do prazo da reclamação administrativa mas dentro dos limites temporais em que a Administração tributária pode rever o acto com fundamento em erro imputável aos serviços, pode ser impugnado contenciosamente pelo contribuinte [art.º 95.º, n.ºs 1 e 2, alínea d), da LGT].

103. Deste modo, o Tribunal considera improcedentes as exceções invocadas pela Requerida e, consequentemente, ir-se-á proceder à apreciação do mérito do pedido de pronúncia arbitral.

 

III. 2.2 DO MÉRITO DO PEDIDO 

104.  Estão em causa nos presentes autos os atos de autoliquidação de adicional de solidariedade sobre o setor bancário “ASSB”, relativos ao ano de 2021 e relativamente aos quais, em face da jurisprudência recentemente proferida acerca desta temática, a Requerente vem solicitar a anulação e, consequentemente, o reembolso do imposto. Assim, as Requerentes pretendem a concretização da anulação do indeferimento do pedido de revisão oficiosa que foi apresentado contra os atos de autoliquidação do Adicional de Solidariedade sobre o Setor Bancário “ASSB”, referente ao passivo apurado no ano de 2021, autoliquidado e pago em 2021.

105.  O “ASSB” foi criado pelo artigo 18.º da Lei n.º 27-A/ 2020, de 29 de julho, que altera a Lei do Orçamento do Estado para 2020 (Lei n.º 2/2020, de 31 de março) e cujo regime jurídico consta do Anexo VI a essa Lei. O “ASSB” tem por objetivo reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, como forma de compensação pela isenção de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, aproximando a carga fiscal suportada pelo setor financeiro à que onera os demais setores (artigo 1.º, n.º 2) e tendo como sujeitos passivos as instituições de crédito com sede principal e efetiva da administração situada em território português, as filiais, em Portugal, de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal e efetiva da administração em território português e as sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora do território português (artigo 2.º, n.º 1).

106.  O “ASSB” tem como âmbito de incidência objetiva o passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos e o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço apurado pelos sujeitos passivos, com as especificações constantes do artigo 3.º. O artigo 4.º do Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020 refere-se à quantificação da base de incidência, definindo, no seu n.º 1, como passivo, o “conjunto dos elementos reconhecidos em balanço que, independentemente da sua forma ou modalidade, representem uma dívida para com terceiros”, com as exceções constantes das diversas alíneas desse número, e como instrumento financeiro derivado o que seja qualificado como tal pelas normas de contabilidade aplicáveis, com exceção dos instrumentos financeiros derivados de cobertura ou cujas posições em risco se compensem mutuamente (artigo 4.º, n.ºs 1, 2 e 3). O n.º 4 desse artigo 4.º esclarece ainda que a base de incidência apurada nos termos do artigo 3.º e dos números anteriores é calculada por referência à média anual dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas anuais do próprio ano a que respeita o adicional, tal como aprovadas no ano seguinte. Os artigos 5.º, 6.º. 7.º e 8.º referem-se, respetivamente, às taxas aplicáveis à base de incidência e aos procedimentos de liquidação e cobrança, e o artigo 9.º, sob a epígrafe “Consignação da Receita”, declara que a receita do adicional de solidariedade sobre o setor bancário constitui receita geral do Estado, sendo integralmente consignado ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.

107.  Tendo em conta a natureza das questões suscitadas como fundamento do pedido arbitral, interessa ainda ter em consideração a disposição transitória do artigo 21.º, n.º 1, da Lei n.º 27-A/ 2020, que é do seguinte teor: “Artigo 21.º Disposição transitória 

1 - Em 2020 e 2021, a liquidação e o pagamento do adicional de solidariedade sobre o setor bancário previsto no regime que consta do anexo VI à presente lei efetua-se de acordo com as seguintes regras: a) A base de incidência apurada nos termos dos artigos 3.º e 4.º do regime é calculada por referência à média semestral dos saldos finais de cada mês, que tenham correspondência nas contas relativas ao primeiro semestre de 2020, no caso do adicional de solidariedade devido em 2020, e nas contas relativas ao segundo semestre de 2020, no caso do adicional de solidariedade devido em 2021, publicadas em cumprimento da obrigação estabelecida no Aviso do Banco de Portugal n.º 1/2019, de 31 de janeiro, que atualiza o enquadramento normativo do Banco de Portugal sobre os elementos de prestação de contas; b) A liquidação é efetuada pelo próprio sujeito passivo, através de declaração de modelo oficial aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, que deve ser enviada até ao dia 15 de dezembro de 2020 e 2021, respetivamente; […]”. 

108.  Resta referir que a Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 33/XIV, que originou a Lei n.º 27-A/2020, em consonância com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho de 2020, limita-se a assinalar que “[é] igualmente criado um adicional de solidariedade sobre o setor bancário, cuja receita é adstrita a contribuir para suportar os custos da resposta pública à atual crise, através da sua consignação ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social”. 

109.  Por seu lado, e por estarem em causa liquidações de “ASSB” relativamente ao ano de 2021 refira-se que o “ASSB” foi criado no pressuposto de ser um tributo de caráter extraordinário, tendo a sua vigência sido definida com uma base anual, a qual tem vindo a ser prorrogada ao longo dos anos, nomeadamente, em 2021, através do artigo 410.º da Lei n.º 75.B/2020, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado de 2021).

 

III.2.2.1 A. DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO TRIBUTO

110.  As partes convergem na qualificação deste tributo como imposto. Porém, sendo esta uma questão de direito, não pode o tribunal considerá-la ultrapassada por acordo entre as partes. Também nós consideramos estar-se, inquestionavelmente perante um imposto. Assumindo como pressuposto a trilogia dos tributos constitucionalmente admitida, temos que o “ASSB” não é, claramente, uma taxa, porquanto ao seu pagamento não corresponde uma qualquer contraprestação individualizada por parte de um qualquer ente público. O “ASSB” não é, também, uma contribuição financeira, na medida em que o “grupo” sujeito ao pagamento deste tributo (as instituições de crédito sedeadas ou operando em Portugal) não corresponde a um “grupo” que usufrua de especiais vantagens resultantes da atuação do ente público assim financiado, ou a um “grupo” que surja como especialmente causador da necessidade da existência de determinado serviço público. Na realidade, sendo a segurança social universal, podemos dizer que aproveita a todos e não a um qualquer “grupo”. Sendo assim, por exclusão, estaremos necessariamente perante um imposto.

111.  A qualificação legislativa deste tributo como sendo um adicional assume particular relevância no caso concreto. Embora o nomen júris não vincule o intérprete, porque este imposto foi apelidado pelo legislador como sendo um adicional, haverá natural tendência para entender o “ASSB” como sendo acessório de outro tributo, tido por principal, (Contribuição sobre o Sector Bancário), pelo que, materialmente, partilharia a legitimidade constitucional deste. Com Filipe Vasconcelos Fernandes, “o entendimento e aferição da conformidade constitucional do regime que cria o “ASSB” pode e deve efetuar-se com a necessária autonomia face à jurisprudência existente e contínua sobre a “CSB”, dada a diferença de pressupostos e qualificação jurídica-tributária de cada um dos referidos tributos. 

112.  Encontrando-se, por isso totalmente excluída a alusão a um “caso estruturalmente semelhante” – para nos referirmos a uma expressão habitualmente utilizada na jurisprudência do TC – na medida em que a jurisprudência já existente e relativa à “CSB” se projeta sobre pressupostos e realidades totalmente distintos daqueles que agora relevam ao nível do regime que cria o “ASSB”.

113.  Se o legislador com poderes constituintes, em 1997, decidiu prever a existência de três espécies de tributos, foi porque reconheceu serem diferentes. E fez corresponder ao imposto um regime mais exigente ao nível da reserva de lei parlamentar. Mas resultam também diferentes os princípios, materialmente constitucionais, conformadores de cada uma destas espécies tributárias, no que nos interessa, impostos e contribuições financeiras.

114.  O “ASSB” nem sequer é um tributo acessório da “CSB”, pois não remete para as normas de incidência desta. O “ASSB” é um tributo completo, na medida em que a Lei que o criou o respetivo regime prevê todos os seus elementos essenciais, nomeadamente, a incidência subjetiva e objetiva. O que acontece é que se verifica como que uma “duplicação” da “CSB, o que mostra bem que o uso do termo “adicional” não obedeceu a qualquer razão técnico-legislativa, mas ao propósito político de atribuir ao “ASSB” um nome suscetível de “camuflar” a sua natureza jurídica.

 

III.2.2.2 DA VIOLAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO – Em especial do princípio da igualdade

115.  Tendo sido impugnados os atos de autoliquidação do “ASSB” relativamente ao período de tributação do ano de 2021, as Requerentes alegam ainda que o artigo 1.º do Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020 viola o princípio da igualdade, na sua vertente de proibição do arbítrio e da proporcionalidade, ao impor ao setor financeiro um ónus acrescido no que respeita ao financiamento do Sistema Previdencial da Segurança Social que não tem fundamento substancial válido, e ainda a violação do princípio da capacidade contributiva, na medida em que o imposto incide sobre determinados elementos do passivo dos contribuintes e não tem qualquer correlação com os indicadores possíveis de revelação dessa capacidade, como seja o rendimento, o consumo ou o património. 

116.  Para dar resposta a estas questões deve começar-se por efetuar, ainda que em termos sucintos, a caracterização dos princípios constitucionais da igualdade fiscal e da capacidade contributiva. Conforme refere Casalta Nabais, o princípio da igualdade fiscal tem ínsita sobretudo “a ideia de generalidade ou universalidade, nos termos da qual todos os cidadãos se encontram adstritos ao cumprimento do dever de pagar impostos, e da uniformidade, a exigir que semelhante dever seja aferido por um mesmo critério - o critério da capacidade contributiva. Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos) para os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção desta diferença (igualdade vertical)» (Direito Fiscal, 11ª edição, Coimbra, 2021, págs. 154-155). 

117.  Configurando-se o princípio geral da igualdade como uma igualdade material, o princípio da capacidade contributiva – segundo o mesmo autor - enquanto tertium comparationis da igualdade no domínio dos impostos, não carece de um específico e directo preceito constitucional. O seu fundamento constitucional é o princípio da igualdade articulado com os demais princípios e preceitos da respetiva “constituição fiscal” e, em especial, aqueles que decorrem já dos princípios estruturantes do sistema fiscal que constam dos artigos 103.º e 104.º da Constituição (ob. cit., pág. 155). Como pressuposto e critério da tributação, o princípio da capacidade contributiva – dentro da mesma linha de entendimento – “afasta o legislador fiscal do arbítrio, obrigando-o a que na seleção e articulação dos factos tributários, se atenha a revelações da capacidade contributiva, ou seja, erija em objeto e matéria coletável de cada imposto um determinado pressuposto económico que seja manifestação o dessa capacidade e esteja presente nas diversas hipóteses legais do respetivo imposto” (ob. cit., pág. 157).

118.    Também o Tribunal Constitucional tem analisado o princípio da igualdade fiscal sob o prisma da capacidade contributiva, como se pode constatar designadamente no Acórdão n.º 142/2004, onde se consigna que “[o] princípio da capacidade contributiva exprime e concretiza o princípio da igualdade fiscal ou tributária na sua vertente de uniformidade – o dever de todos pagarem impostos segundo o mesmo critério – preenchendo a capacidade contributiva o critério unitário da tributação”. O reconhecimento do princípio da capacidade contributiva como critério destinado a aferir da inadmissibilidade constitucional de certa ou certas soluções adotadas pelo legislador fiscal tem conduzido também à ideia, expressa por exemplo no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 348/97, de que a tributação conforme com o princípio da capacidade contributiva implicará “a existência e a manutenção de uma efetiva conexão entre a prestação tributária e o pressuposto económico selecionado para objeto do imposto, exigindo-se, por isso, um mínimo de coerência lógica das diversas hipóteses concretas de imposto previstas na lei com o correspondente objeto do mesmo”. 

119.  O Tribunal Constitucional tem vindo, portanto, a afastar-se de um controlo meramente negativo da igualdade tributária, passando a adotar o princípio da capacidade contributiva como critério adequado à repartição dos impostos; mas não deixa de aceitar a proibição do arbítrio como um elemento adjuvante na verificação da validade constitucional das soluções normativas de âmbito fiscal, mormente quando estas sejam ditadas por considerações de política legislativa relacionadas com a racionalização do sistema. 

120.  Em suma, o princípio da igualdade tributária pode ser concretizado através de vertentes diversas: uma primeira está na generalidade da lei de imposto, na sua aplicação a todos sem exceção; uma segunda, na uniformidade da lei de imposto, no tratar de modo igual os contribuintes que se encontrem em situações iguais e de modo diferente aqueles que se encontrem em situações diferentes, na medida da diferença, a aferir pela capacidade contributiva; uma última, está na proibição do arbítrio, no vedar a introdução de discriminações entre contribuintes que sejam desprovidas de fundamento racional (cfr. acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 306/2010 e n.º 695/2014). 

121.  Como se deixou exposto, o “ASSB” tem por objetivo reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, como forma de compensação pela isenção de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras e incide sobre instituições de crédito sediadas em território português e filiais ou sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora do território português (artigos 1.º e 2.º). Tem uma estrutura de incidência objetiva e subjetiva similar ao previsto para a Contribuição sobre o Sector Bancário (artigo 3.º), com a significativa diferença de a receita do adicional de solidariedade sobre o setor bancário constituir receita geral do Estado, consignada ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (artigo 9.º).

122.Assim, importa fazer notar que, não obstante a similitude de incidência com a Contribuição sobre o Setor Bancário “CSB”, o “ASSB” não pode ser entendido como uma tributação acessória ou adicional do “CSB”, nem constitui uma contribuição de estabilidade financeira.

123.    A Contribuição sobre o Sector Bancário foi criada pelo artigo 141.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011, entretanto alterada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, como uma contribuição extraordinária, que constitui receita do Fundo de Resolução, criado mediante a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 31-A/2012, de 10 de fevereiro, ao Regime das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (artigo 153.º-F, alínea a)) e definido como pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, que funciona junto do Banco de Portugal (artigo 153.º-B). O Fundo tem por objeto prestar apoio financeiro à aplicação de medidas de resolução adotadas pelo Banco de Portugal e desempenhar todas as demais funções que lhe sejam conferidas pela lei no âmbito da execução de tais medidas (artigo 153.º-C) e nele participam obrigatoriamente, entre outras entidades, as instituições de crédito com sede em Portugal (artigo 153.º-D). 

124.  O próprio Relatório do Orçamento de Estado para 2011 explica a génese da Contribuição sobre o Sector Bancário em termos suficientemente elucidativos quanto aos objetivos que se pretendiam atingir, aí se afirmando (pág. 73): “A Proposta do Orçamento do Estado para 2011 procede ainda à criação de uma contribuição sobre o sector bancário na linha daquelas que foram já́ introduzidas noutros Estados Membros, com o propósito de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémicos, protegendo também, assim, os trabalhadores do sector e os mecanismos de segurança social. A contribuição incide, assim, sobre as instituições de crédito com sede principal e efetiva da administração situada em território português, sobre as filiais de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal e efetiva da administração em território português e sobre as sucursais, instaladas em território português, de instituições de crédito com sede principal e efetiva da administração em Estados terceiros”.

125.  Face ao seu regime jurídico, a “CSB” tem por base uma contraprestação de natureza grupal, na medida em que constitui um preço público a pagar pelo conjunto dos regulados à respetiva entidade ou agência de regulação. Não se reconduz à taxa stricto sensu, visto que não incide sobre uma prestação concreta e individualizada que a Administração dirija aos respetivos sujeitos passivos, nem se caracteriza como um imposto, pois, que não se verifica o requisito de unilateralidade: não tem como finalidade exclusiva a angariação de receita (não se destina a que “as instituições participantes concorram para os gastos da comunidade, em cumprimento de um qualquer dever de solidariedade”), antes se pretendendo que o sector financeiro contribua para a cobertura do risco sistémico que é inerente à sua atividade. 

126.  E a sua natureza não é afastada pela circunstância de as receitas provenientes da “CSB” serem consignadas ao Fundo de Resolução, porquanto o Fundo tem por objeto prestar apoio financeiro à aplicação de medidas pelo Banco de Portugal e visa a prevenção dos riscos sistémicos do sector bancário. Esse mesmo objetivo é assinalado na nota preambular da Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, onde se refere que os elementos essenciais da “CSB” são definidos “em termos semelhantes aos de contribuições já introduzidas por outros Estados Membros da União Europeia, com o duplo propósito de reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados”. Como se concluiu no acórdão do STA de 19 de Junho de 2019 (Processo n.º 02340/13), a motivação legislativa constante dos diplomas que regularam a contribuição para o sector bancário e o Fundo de Resolução legitima a ilação de que a contribuição visou, em primeiro lugar e desde o início, atenuar as consequências resultantes das intervenções públicas no sector financeiro, face à situação de crise financeira então desencadeada no âmbito desse mesmo sector, reconduzindo-se a um instrumento de apoio na prevenção dos inerentes riscos do sistema, não se destinando a colmatar necessidades genéricas de financiamento do Estado. 

127.  Trata-se, nestes termos, de um tributo que, interessando a um grupo homogéneo de destinatários e visando prevenir riscos a este grupo associados, se efetiva na compensação de eventual intervenção pública na resolução de dificuldades financeiras das entidades desse sector, assumindo assim a natureza jurídica de contribuição financeira (cfr., neste preciso sentido, a decisão arbitral proferida no Processo n.º 706/2018-T).

128.    Ao invés, o “ASSB” é um verdadeiro imposto que constitui receita geral do Estado e se encontra consignada ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, e, embora destinado a fazer face de modo indistinto às necessidades de financiamento da segurança social, se carateriza como um imposto sectorial na medida em que incide exclusivamente sobre o sector financeiro.

129.  A Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2020, de 6 de junho de 2020, que, na sequência da pandemia causada pelo vírus SARS-CoV-2, aprovou o Programa de Estabilização Económica e Social, refere-se no ponto 4.3.5 à criação de um adicional de solidariedade sobre o setor bancário, “cuja receita é adstrita a contribuir para suportar os custos da resposta pública à atual crise”. Esse mesmo propósito é mencionado na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 33/XIV, que originou a Lei n.º 27-A/2020, e a que supra já se fez referência.

130.  O artigo 1.º, n.º 2, do Regime do “ASSB”, já transcrito, refere ainda que o tributo tem por objetivo reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, como forma de compensação pela isenção de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, aproximando a carga fiscal suportada pelo setor financeiro à que onera os demais setores. No entanto, o próprio Relatório da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), incidente sobre a proposta de alteração da lei orçamental para 2020 (Relatório n.º 13/2020), consigna que “a iniciativa legislativa não tem justificação no contexto COVID-19, antes sendo apresentada pelo Governo para contribuir, de modo permanente, para a diversificação das fontes de financiamento das pensões pagas pelo sistema previdencial da Segurança Social Pública” e acrescenta que, “do ponto de vista técnico, não se entende a necessidade de justificar publicamente a criação do imposto como sendo uma compensação por o sector das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras estar isento de IVA nas transmissões efetuadas”, quando “deveria também dizer-se que as operações deste sector são tributadas por uma miríade de taxas do imposto do selo”.

131.  E, com efeito, dificilmente se compreende a justificação fornecida pelo legislador quando pretende associar a sujeição das instituições de crédito ao “ASSB” à despesa fiscal decorrente da isenção aplicável a serviços e operações financeiras.

132.  A isenção de IVA relativamente a operações bancárias e financeiras está expressamente prevista na Diretiva 2006/112/CE (artigo 135.º) e o artigo 9.º, n.º 27, do Código do IVA limita-se a efetuar a transposição dessa regra para o direito interno. E, por outro lado, o conteúdo das isenções não pode ser alterado pelos Estados Membros, dado que estão em causa conceitos autónomos de direito europeu que têm por objetivo evitar divergências na aplicação do regime do IVA, devendo ainda ser objeto de uma interpretação restritiva, na medida em que constituem derrogações ao princípio geral segundo o qual o imposto sobre o valor acrescentado é cobrado sobre todas as prestações de serviços efetuadas a título oneroso por um sujeito passivo (cfr. acórdãos do TJUE, nos Processos n.ºs C-348/1987 e C-455/05). Acresce que, como esclarece Clotilde Celorico Palma, “[a]s isenções em sede de IVA assumem uma natureza objetiva, ou seja, para efeitos da sua concessão releva essencialmente a natureza da atividade prosseguida e não a natureza jurídica da entidade que prossegue a atividade”. Além de que as isenções em IVA têm uma lógica diferente das isenções concedidas no âmbito dos impostos sobre o rendimento. Como refere a mesma Autora, “[a]o passo que nestes impostos, a isenção libera o beneficiário do pagamento do imposto, no IVA as situações de isenção clássica traduzem-se na não liquidação do imposto nas operações ativas por parte sujeito passivo beneficiário (o beneficiário paga imposto, mas não líquida). Isto é, nas suas operações passivas (aquisições de bens e prestações de serviços) os sujeitos passivos de IVA não beneficiam de isenção” (Introdução sobre o Imposto sobre o Valor Acrescentado, Coimbra, 6.ª edição, págs. 172-174).

133.  Na situação prevista no artigo 135.º da Diretiva IVA, como explica ainda Sérgio Vasques, trata-se de “isenções simples ou incompletas que não conferem direito à dedução do imposto suportado a montante, pelo que o sujeito passivo, não liquidando IVA imposto sobre a operação isenta, não deduz o imposto em que incorra nas aquisições destinadas à sua realização”. E, nesse sentido, “o sujeito passivo passa a ocupar posição idêntica à do consumidor final, suportando na sua esfera o imposto relativo às suas aquisições”, pelo que a isenção não representa um verdadeiro benefício para o sujeito passivo, como sucede com a generalidade das isenções de imposto, na medida em que acaba por suportar o peso do imposto por via das suas aquisições, originando um imposto oculto pela incorporação do IVA incorrido a montante no preço dos bens e serviços prestados a terceiros (O Imposto sobre o Valor Acrescentado, Coimbra, 2015, págs. 312-313; em idêntico sentido, Angelina Tibúrcio, Código do IVA e RITI Notas e Comentários, Coimbra, 2014, pág. 160). 

134.  Por outro lado, como refere o Autor antes citado, as isenções de IVA relativas a serviços financeiros são motivadas por razões de ordem técnica que respeitam à dificuldade em apurar o valor acrescentado inerente a essas operações e, em especial, no que se refere à determinação da matéria coletável e do montante do IVA dedutível (ob. cit., págs. 318-319, e ainda o acórdão do TJUE, no Processo n.º C-455/05, considerando 24.) Num outro plano de análise, importa ainda reter que a isenção de IVA para serviços e operações financeiras tem como contraponto a sujeição das operações financeiras a imposto do selo, nos termos da verba 17 da Tabela Geral do Imposto do Selo, sendo sintomático, quanto ao nível de dependência entre os dois impostos, que o artigo 1.º, n.º 2, do Código do Imposto do Selo exclua do âmbito de incidência objetiva do imposto “as operações sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado e dele não isentas”. Como assinala Saldanha Sanches, “o imposto do selo assume a sua vocação de tributar aquilo que não pode ser tributado de outra forma” e ao contribuinte assiste o direito de ser tributado da forma que melhor se adequa ao normal funcionamento da economia de mercado e ao princípio da tributação segundo a capacidade contributiva do sujeito passivo (Manual de Direito Fiscal, 3ª edição, Coimbra, pág. 435).

135.  Em todo este contexto, não é possível determinar objetivamente o critério de diferenciação que conduziu o legislador a sujeitar as instituições de crédito a um imposto especial sobre o sector bancário, nem é possível discernir qual a sua real fundamentação. Encontrando-se a medida legislativa descrita como sendo um tributo destinado a compensar a isenção de IVA de que beneficia o setor financeiro, não se compreende que, simultaneamente, sejam excluídas outras categorias de atividades que se encontram igualmente isentas e que poderão revelar idêntica ou superior capacidade contributiva. E não é tido em devida consideração, na aplicação da medida, que as isenções previstas na Diretiva, e transpostas para o direito interno pelo artigo 9.º do Código do IVA, são de carácter obrigatório, e, no que se refere aos serviços e operações financeiras previstos no artigo 135.º da Diretiva, essas isenções são motivadas pelas dificuldades práticas de apuramento do valor acrescentado e de aplicação do imposto, e não por qualquer propósito de favorecimento fiscal. 

136.  O legislador desconsidera ainda que a isenção simples, que é aplicável ao caso, não confere o direito à dedução do imposto a montante, e não representa, por isso, uma efetiva vantagem para o sujeito passivo, que acaba por suportar a incidência do imposto através das suas aquisições. Além de que não se tem em linha de conta que essa isenção, no direito nacional, já é contrabalançada pelo imposto do selo, que abrange a generalidade das operações financeiras, tal como sucede, em geral, na legislação dos Estados Membros, em que as operações relativamente às quais se afasta a aplicação da diretiva, são sujeitas a impostos especiais (cfr. Sérgio Vasques, O Imposto sobre o Valor Acrescentado, citado, pág. 317). Em todo este condicionalismo, a criação do “ASSB” como um imposto especial incidente sobre o sector bancário, como forma de compensar a isenção de IVA, configura-se como uma diferenciação arbitrária na medida em que o critério utilizado não apresenta um mínimo de coerência nem se encontra materialmente justificado.

137.  Adicionalmente, e como ressalta do disposto no artigo 4.º, n.º 1, da LGT, em linha com o artigo 104.º da Constituição, “os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património”, pelo que são esses os indicadores possíveis do critério de repartição dos impostos. Nesse mesmo sentido, Sérgio Vasques considera que, em razão do princípio da capacidade contributiva, “os impostos devem adequar-se à força económica do contribuinte e por isso o seu alcance mais elementar está na exigência de que o imposto incida sobre manifestações de riqueza e que todas as manifestações de riqueza lhe fiquem sujeitas”. E sublinha que, “para que o imposto corresponda à força económica de quem o paga, é forçoso que incida sobre realidades economicamente relevantes, realidades que se podem reconduzir sinteticamente ao rendimento, ao património e ao consumo” (Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2015, pág. 295). 

138.  Como explicita Filipe de Vasconcelos Fernandes (ob. cit., págs. 107-109), o rendimento corresponde ao produto imputável, regularmente e durante um certo período, a uma fonte durável, designadamente ao trabalho (salários, comissões, etc.), ao património (rendas, juros, etc.) ou a uma combinação integrada de trabalho e património (lucros de uma exploração industrial ou comercial). Por outro lado, o rendimento pode corresponder, além do rendimento consumido, à diferença, num determinado período, entre o património final e inicial do contribuinte, compreendendo o rendimento não consumido ou aforrado, os bens adquiridos a título gratuito ou aleatório e as valorizações do ativo, na conceção de rendimento-acréscimo.

139.  Os impostos sobre o consumo tributam o rendimento através da sua manifestação em atos de despesa, ou seja, o rendimento propriamente gasto com a aquisição de bens ou serviços. Podem revestir a forma de impostos gerais (IVA) ou de impostos especiais (IEC), apresentando em comum a circunstância de onerarem a transmissão de bens ou serviço. Os impostos sobre o património incidem sobre o rendimento acumulado que, entretanto, foi transformado em valor patrimonial tributário, quer considerado estaticamente o património em si mesmo (IMI), quer numa perspetiva dinâmica, tributando-se o património apenas no momento da respetiva transmissão (IMT). No caso do “ASSB”, como conclui o mesmo Autor, não está em causa qualquer modalidade de tributação do rendimento, mas tão só a sujeição a imposto de uma parte das componentes do passivo.

140.  Do mesmo modo que não se trata da oneração de atos de despesa, que pudesse reconduzir-se a um imposto sobre atividades financeiras ou sobre transações financeiras. E, por outro lado, ainda que pudesse dizer-se, de um ponto de vista contabilístico e financeiro, que os elementos do passivo que são objeto de tributação por via do “ASSB” integram o balanço dos sujeitos passivos, não poderá entender-se que estamos aí perante modalidade de tributação do património. A ausência de uma cabal correspondência entre o “ASSB” e um concreto índice de valoração de capacidade contributiva coloca em causa a viabilidade constitucional do imposto, na medida em que impossibilita o estabelecimento de qualquer tipo de relação causal entre o objeto da tributação que é imposto aos sujeitos passivos e um efetivo incremento de capacidade contributiva, sobretudo quando não está em causa uma contrapartida pela prevenção de riscos sistémicos em que as instituições de crédito possam estar envolvidas (como sucedia com a CSB), mas uma exclusiva medida de angariação de receita.

141.  Como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 217/15, o princípio da capacidade contributiva assume um valor paramétrico, fundamentalmente como condição da tributação, de molde a impedir que determinado imposto atinja uma riqueza ou rendimento que não existe, vedando a exação de uma capacidade de gastar que verdadeiramente não se verifica. Em idênticos termos, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 142/2004 consigna que a capacidade contributiva preenche o critério unitário da tributação, entendendo-se esse critério como sendo aquele em que “a incidência e a repartição dos impostos se deverá fazer segundo a capacidade económica ou capacidade de gastar de cada um e não segundo o que cada um eventualmente receba em bens ou serviços públicos (critério do benefício)”. 

142.  No caso do “ASSB”, não se denota qualquer relação entre a incidência real do imposto e os fatores que possam revelar uma maior capacidade contributiva, quando é certo, como se deixou dito, a solidariedade assente no falso pressuposto de que as instituições de crédito poderão suportar um agravamento da carga fiscal porque se encontram isentas de IVA relativamente aos serviços financeiros que prestam.

143.  Deste modo, importa concluir que as normas conjugadas dos artigos 1.º, n.º 2, 2.º e 3.º, n.º 1, alínea a) do Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, são inconstitucionais, por violação do princípio da igualdade, na dimensão da proibição do arbítrio, e por violação do princípio da capacidade contributiva, enquanto decorrência do princípio da igualdade tributária. Resta acrescentar que, no mesmo sentido, se pronunciaram os acórdãos proferidos nos Processos n.ºs 598/2022-T, 674/2022-T, 324/2023-T, 492/2024-T, 21/2024-T, 522/2024-T e 640/2024-T, : 720/2024-T, 843/2024-T, 1182/2024-T, 1252/2024-T, 1254/2024-T. E, entretanto, o julgamento de inconstitucionalidade formulado no Processo n.º 598/2022-T foi confirmado, em recurso obrigatório, pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 469/2024, de 19 de junho de 2024. O Tribunal Constitucional veio ainda a decidir no mesmo sentido no acórdão n.º 529/2024, de 2 de julho de 2024, também em recurso interposto de decisão arbitral proferida no CAAD. 

144.  Em consequência, os atos de autoliquidação de “ASSB” relativos ao período de tributação de 2021, bem como a decisão de rejeição do pedido de revisão oficiosa contra eles deduzido, são ilegais, devendo ser anulados com os subsequentes efeitos legais, ficando prejudicando os demais aspetos suscitados.

 

III.3. JUROS INDEMNIZATÓRIOS

145.  A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre o valor do imposto indevido, até ao reembolso integral da quantia devida. 

146.  De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

147.  Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos no artigo 43.º, n.º 1 da Lei Geral Tributária e no artigo 61.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.

148.  Todavia, a Autoridade Tributária e Aduaneira defende que a AT está obrigada a aplicar os diplomas legais criados pela Assembleia da República e pelo Governo, estando-lhe, consequentemente, vedado anular os atos de autoliquidação em crise, dado que não pode deixar de aplicar uma norma com fundamento em inconstitucionalidade, a menos que o Tribunal Constitucional já tenha declarado a inconstitucionalidade da mesma com força obrigatória geral (art.ºs. 281.º e 282.º da CRP), ou se esteja perante o desrespeito por normas constitucionais diretamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (artigo 18.º da CRP), pelo que o erro da autoliquidação não lhe pode ser imputado.

149.  No entanto, nos termos do n.º 2 do artigo 43.º da LGT, considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efetuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

150.  Neste caso, as Requerentes efetuaram as autoliquidações de acordo com as instruções genéricas sobre o preenchimento da declaração modelo 57, que constam da Portaria n.º 191/2020, de 10 de Agosto, emitida pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que, nos termos do n.º 3 do artigo 1.º da LGT, integra a Administração Tributária quando exerce competências administrativas no domínio tributário, como é o caso de emissão de diplomas regulamentares (artigo 138.º do Código do Procedimento Administrativo) e também com as que constam do Oficio Circulado nº 55003/2022, de 5 de Maio, da Unidade dos Grandes Contribuintes. Por isso, está-se perante uma situação em que se considera existir erro imputável aos serviços, por força do n.º 2 do artigo 43.º da LGT.

151.  Atenta a circunstância das Requerentes, em 14.12.2023, terem apresentado um pedido de revisão oficiosa contra os atos de autoliquidação do “ASSB”, referentes ao ano de 2021, no valor total de 33.017,30, importa considerar a jurisprudência firmada no Acórdão Supremo Tribunal Administrativo n.º 4/2023, publicado Diário da República, 1.ª série, de 16 de novembro de 2023, proferido no processo n.º 40/19.6BALSB, de 30.09.2020, em que se uniformiza jurisprudência no sentido de que “Só são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após o pedido de promoção da revisão oficiosa e até à data da emissão das respetivas notas de crédito a favor da Recorrida”.

152. Em face da anulação dos atos de autoliquidação do “ASSB”, relativos ao ano de 2021, no valor total de € 33.017,30, nos termos dos normativos do artigos 43.º, n.º 1, alínea c) da LGT e do artigo 61.º do CPPT, às Requerentes são devidos juros indemnizatórios depois de decorrido um ano, contado da apresentação do pedido de revisão oficiosa, até à data do processamento da respetiva nota de crédito, e não desde a data do pagamento indevido do imposto, isto é, os juros indemnizatórios são devidos desde 15.12.2024, à taxa legal, e até emissão da nota de crédito.

 

IV DECISÃO

Nestes termos, o Tribunal Arbitral decide:

a)  Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pelas Requerentes, com as legais consequências;

b)  Anular o despacho de rejeição liminar do pedido de revisão oficiosa apresentado em 14.12.2023;

c)  Condenar a Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos estabelecidos no ponto 152 – III.3; 

d)  Condenar a Requerida no pagamento das custas processuais.

 

V.  VALOR DO PROCESSO

De harmonia com o disposto nos artigos 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), artigo 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e artigo 306.º do Código de Processo Civil (CPC), fixa-se o valor do processo em € 33.017,30 (Trinta e três mil, dezassete euros e trinta cêntimos), valor que corresponde ao valor total dos atos de autoliquidação de “ASSB” impugnados pelas Requerentes.

 

VI. CUSTAS 

O valor das custas é fixado em € 1.836,00 (mil oitocentos e trinta e seis euros) ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4 do RJAT e da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), a cargo da Requerida, de acordo com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2 do RJAT e 4.º, n.º 5 do RCPAT.

 

VII. NOTIFICAÇÃO AO MINISTÉRIO PÚBLICO 

Nos termos do disposto no artigo 17.º, n.º 3, do RJAT, notifique-se o representante do Ministério Público junto do Tribunal competente, para efeito do recurso previsto no n.º 3 do artigo 72.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 30 de junho de 2025

 

O Árbitro

 

Jesuíno Alcântara Martins