Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 1034/2024-T
Data da decisão: 2025-05-07  IRC  
Valor do pedido: € 3.970.078,32
Tema: IRC - derrama estadual e derramas regionais das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
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SUMÁRIO:

  1. A tributação de uma sociedade ao abrigo do Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades não exclui a aplicabilidade das derramas regionais vigentes na Região Autónoma dos Açores e na Região Autónoma da Madeira;
  2. Um sujeito passivo de IRC, com sede no território continental português, que desenvolve uma parte da sua actividade comercial na Região Autónoma dos Açores e na Região Autónoma da Madeira, através de estabelecimentos estáveis aí situados, está sujeito às derramas regionais previstas naquelas regiões autónomas pela parcela do lucro tributável imputável àqueles estabelecimentos estáveis;
  3. O cálculo do montante devido por esse sujeito passivo, seja a título de derrama estadual, seja a título de cada uma das derramas regionais que lhe sejam aplicáveis, deve ser aferido com base no critério de imputação previsto no artigo 26.º, n.º 2, da Lei das Finanças das Regiões Autónomas, o qual prevê que o imposto a suportar pelo sujeito passivo em cada circunscrição deverá ser repartido com base na proporção do volume de negócios apurado por referência à actividade que nela foi efectivamente desenvolvida por parte daquele sujeito passivo.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os Árbitros Carla Castelo Trindade, Cristina Coisinha e Magda Feliciano, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o Tribunal Arbitral, decidem no seguinte:

 

 

RELATÓRIO

 

  1. A..., S.A., pessoa colectiva n.º..., com sede no ..., ... (“Requerente”), apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), e 10.º e seguintes, todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (“RJAT”), tendo em vista a declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (“IRC”) n.ºs 2023... e 2023..., referentes aos exercícios de 2021 e 2022, emitidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira (“Requerida”), das quais resultaram derrama estadual paga pela Requerente no montante de € 487.992,42 e € 3.482.085,90.

 

  1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, apresentado pela Requerente no dia 3 de Setembro de 2024, foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.

 

  1. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do Tribunal Arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. As partes foram notificadas dessa designação em 23 de Outubro de 2024, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.

 

  1. Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 13 de Novembro de 2024.

 

  1. Tendo sido devidamente notificada para o efeito, a Requerida apresentou a sua resposta, no dia 18 de Dezembro de 2024, tendo-se defendido por impugnação.

 

  1. Em tal resposta, a Requerida pugnou, a final, pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, mantendo-se na ordem jurídica os actos de liquidação impugnados, com a consequente absolvição da Requerida do pedido aí formulado.

 

  1. Nessa ocasião, a Requerida juntou ainda o processo administrativo.

 

  1. Em 19 de Fevereiro de 2025, foi proferido despacho arbitral a dispensar a realização da reunião a que alude o artigo 18.º, do RJAT, e a notificar as partes para, querendo, de modo simultâneo, apresentarem alegações escritas no prazo de 15 dias.

 

  1. A Requerente apresentou as suas alegações escritas, no dia 10 de Março de 2025, e a Requerida, no dia 11 de Março de 2025, apresentou igualmente as suas alegações escritas.

 

POSIÇÕES DAS PARTES

 

§1     Posição da Requerente

 

  1. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, em síntese, os seguintes:
    1. A questão controvertida nos autos centra-se na incidência da derrama estadual sobre o lucro tributável exclusivamente imputável a estabelecimentos estáveis da Requerente (Aeroportos) na Região Autónoma dos Açores (“RAA”) e na Região Autónoma da Madeira (“RAM”) que, no entender da Requerente, foi ilegalmente liquidada, já que o lucro tributável imputável aos estabelecimentos estáveis da Requerente nas regiões autónomas deveria ser sujeito a derrama regional (ao invés da derrama estadual, como foi o caso nas liquidações de IRC);
    2. O entendimento da Requerente baseia-se, em primeiro lugar, na letra e no espírito dos artigos 87.º-A do Código do IRC e da Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de Setembro (Lei das Finanças das Regiões Autónomas ou “LFRA”) -, mormente no seu artigo 26.º e, bem assim, do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto Legislativo Regional (“DLR”) n.º 21/2016-A, de 17 de Outubro, para a derrama regional da RAA, e do artigo 20.º, do DLR n.º 18/2020/M de 31 de Dezembro de 2020, para a derrama regional da RAM, e na leitura da mais recente jurisprudência dos tribunais administrativos e fiscais e decisões arbitrais proferidas no seio do CAAD;
    3. A Requerida, ao discriminar as opções empresariais dos sujeitos passivos de IRC em Portugal, viola o princípio da liberdade de estabelecimento, previsto no artigo 49.º, do Tratado de Funcionamento da União Europeia (“TFUE”);
    4. Num plano constitucional, entende a Requerente que são inconstitucionais os artigos 87.º-A, do Código do IRC, e 26.º, n.º 2, da LFRA, em conjugação com o regime jurídico da derrama regional previsto no DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, para a RAM, e no DLR n.º 21/2016/A, de 17 de Outubro, para a RAA, quando interpretados no sentido de que está sujeito a derrama estadual a totalidade do lucro tributável apurado por um sujeito passivo de IRC residente em território continental e com estabelecimentos estáveis na RAA e na RAM, incluindo a parte do lucro tributável imputável à actividade efectivamente exercida pelo sujeito passivo na RAA e na RAM, por violação dos princípios do primado do Direito da União Europeia, da igualdade, da capacidade contributiva, e da autonomia legislativa e financeira das regiões autónomas, previstos nos artigos 13.º, 103.º, 104.º e 227, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”);
    5. Nos exercícios de 2021 e de 2022, o modelo oficial da Declaração Modelo 22 do IRC não continha quaisquer campos para apuramento de derramas regionais equivalentes aos campos 350 (“Imposto imputável à Região Autónoma dos Açores”) e 370 (“Imposto Imputável à Região Autónoma da Madeira”) para apuramento do IRC imputável a cada uma das regiões autónomas, pelo que foi impossível à Requerente efectuar o apuramento da derrama regional separadamente por cada uma das regiões autónomas e da derrama estadual sobre o remanescente imputável ao território continental;
    6. Por falta de alternativa, no cálculo da sua derrama estadual individual no âmbito da Modelo 22 de IRC, a Requerente alocou o total do seu lucro tributável exclusivamente à derrama estadual, facto que fundamenta a alegação de que existe erro dos serviços imputável à Requerida na reclamação graciosa, cujo indeferimento é objecto destes autos;
    7. A Requerente entende que apenas deveria ter considerado o lucro tributável da Requerente imputável à actividade desenvolvida em Portugal continental, com a aplicação de derrama estadual a este lucro tributável, e segregado o volume de negócios da Requerente e, correspondentemente, do lucro tributável imputável à RAM e à RAA, respectivamente, e aplicação da derrama regional ao lucro tributável assim determinado;
    8. Para que seja possível apurar a derrama regional a imputar a cada uma das regiões autónomas, é necessário efectuar a segregação do montante dos volumes de negócios, dos lucros tributáveis e das derramas regionais imputáveis à RAA e à RAM;
    9. É ilegal a liquidação de IRC individual da Requerente no que respeita à parte da derrama estadual que recaiu sobre a componente do lucro tributável imputável à RAM e à RAA, porque esta componente não deveria ter sido considerada no apuramento da derrama estadual paga pela Requerente e, consequentemente, na liquidação de IRC do grupo fiscal encabeçado pela Requerente nos anos de 2021 e 2022;
    10. Verificados que estejam os pressupostos de aplicação das derramas regionais, não podem as derramas regionais deixar de ser aplicadas, sob pena de captura das receitas regionais pela receita fiscal nacional e, consequentemente, de grave violação, desde logo, da LFRA e da CRP;

 

  1. O artigo 26.º, n.º 2, da LFRA, prevê que o cálculo do quantum devido a título de IRC deve ser aferido com base no critério de imputação previsto, que determina uma repartição do imposto a suportar pelo sujeito passivo em cada circunscrição geográfica com base na proporção do volume de negócios apurado por referência à actividade que nela foi efectivamente desenvolvida;
  2. No âmbito do poder tributário próprio que lhe assiste, a RAA aprovou o DLR n.º 21/2016-A, de 17 de Outubro, através do qual estabeleceu a derrama a vigorar naquela região, estipulando no seu artigo 2.º, n.º 1, a seguinte norma de incidência: “Sobre a parte do lucro tributável superior a € 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros) sujeito a não isento de imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas, apurado por sujeitos passivos residentes na Região Autónoma dos Açores, bem como por sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável na Região Autónoma dos Açores, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, incide derrama regional (…)”;
  3. O conceito de “não residente com estabelecimento estável” reportado no artigo acima citado abrange os residentes em território nacional e que têm ali sucursais, instalações ou estabelecimentos ou quaisquer formas de representação, às quais sejam imputáveis os rendimentos;
  4. A derrama regional criada pela RAA é aplicável (i) a estabelecimentos estáveis localizados na RAA de sujeitos passivos com sede no território continental, nos termos do artigo 2.º do DLR n.º 21/2016-A, de 17 de Outubro, e (ii) sobre a “proporção entre o volume anual de negócios do exercício correspondente às instalações situadas em cada região autónoma e o volume anual total de negócios do exercício”, nos termos do artigo 26.º, n.º 2, da LFRA;
  5. No âmbito do poder tributário próprio que lhe assiste, a RAM aprovou o regime da derrama regional através dos artigos 3.º a 6.º, do DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, que, na alteração introduzida pelo artigo 20.º, do DLR n.º 18/2020/M, de 31 de Dezembro de 2020, que aprovou o Orçamento da Região Autónoma da Madeira, passou a ter a seguinte redacção: “Sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado pelos sujeitos passivos enquadrados no n.º 1 do Artigo 26.º da Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de setembro, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, incidem as taxas adicionais (…)”;
  6. O regime regional da derrama da RAM, em particular o seu artigo 4.º, n.º 1, do DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, na redacção do DLR n.º 18/2020/M, de 31 de Dezembro de 2020, remete para o n.º 1 do artigo 26.º da LFRA, que na sua alínea b) inclui expressamente os sujeitos passivos residentes no território continental português, mas com estabelecimento estável nas regiões autónomas como sujeitos passivos do imposto regional (i.e., o imposto regional será também “Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede ou direção efetiva em território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica própria em mais de uma circunscrição (…)”);
  7. Da própria redacção do artigo 4.º, n.º 1, do referido DLR aplicável resulta a aplicação da derrama regional da RAM a estabelecimentos estáveis localizados na RAM de sujeitos passivos com sede no território continental, por remissão expressa para o artigo 26.º, da LFRA, não restando qualquer margem para dúvidas sobre o preenchimento pela Requerente do critério de incidência subjectiva prevista na derrama regional da RAM;
  8. A derrama regional criada pela RAM é (à semelhança da derrama regional criada pela RAA) aplicável (i) a estabelecimentos estáveis localizados na RAM de sujeitos passivos com sede no território continental, nos termos conjugados do artigo 4.º, do DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, na redacção do DLR n.º 18/2020/M, de 31 de Dezembro de 2020, e do n.º 1 do artigo 26.º da LFRA, para o qual remete, e (ii) sobre a “proporção entre o volume anual de negócios do exercício correspondente às instalações situadas em cada região autónoma e o volume anual total de negócios do exercício”, nos termos do artigo 26.º, n.º 2, da LFRA;
  9. Os DLR que aprovam as derramas regionais estabelecem expressamente que a incidência subjectiva das derramas regionais abrange todos os estabelecimentos estáveis situados na região por qualquer não residente nas regiões autónomas e não apenas os estabelecimentos estáveis detidos por não residentes em território português;
  10. Tendo em conta a actividade exercida pela Requerente, resulta evidente que os aeroportos que a Requerente gere e explora na RAM e na RAA preenchem o conceito de estabelecimento estável constante do artigo 5.º, do Código do IRC;
  11. Concluindo-se que a Requerente tem estabelecimentos estáveis nas regiões autónomas, não pode deixar de ser aplicável a derrama regional na proporção do volume de negócios gerado através desses mesmos estabelecimentos nas regiões autónomas;
  12. A posição da Requerida na decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Requerente enferma do vício de violação de lei por não ter respeitado o referido artigo 87.º-A, do Código do IRC, na parte referente à parcela da derrama estadual apurada por referência ao lucro tributável imputável aos estabelecimentos estáveis da Requerente na RAM e na RAA;
  13. Essa decisão de indeferimento e, consequentemente, as liquidações de IRC que se mantêm na ordem jurídica, são ilegais por violação da liberdade europeia de estabelecimento consagrada no artigo 49.º, do TFUE, o qual é vigente em Portugal em virtude do princípio do efeito directo do direito primário da União Europeia, do qual os Tratados fazem parte, já que resulta numa discriminação indirecta, na medida em que, ainda que aparentemente se aplique indistintamente a todas as empresas que visem operar na RAA ou na RAM, ao introduzir uma diferenciação entre a forma societária a adoptar para beneficiar das derramas regionais, está a discriminar aquelas que aí querendo operar, querem apenas fazê-lo via estabelecimento estável;
  14. Ao negar a aplicabilidade da derrama regional a actividades efectivamente exercidas nas regiões autónomas por via de estabelecimento estável, como fez a Requerida, retira-se âmbito de incidência – não determinado por lei, nacional ou regional – a normas criadas no exercício de um poder constitucionalmente concedido às regiões autónomas;
  15. A Requerida atenta contra o princípio da autonomia quer legislativa – na medida em que não aceita a legislação da derrama regional e a sua aplicação nos termos previstos pelas regiões autónomas – quer financeira – na medida em que recusa a redistribuição da derrama estadual recebida de acordo com critérios de imputação por volume de negócios gerado através dos estabelecimentos estáveis da Requerente nas regiões autónomas;
  16. O exercício de actividade nas regiões autónomas através de estabelecimentos estáveis constitui uma opção empresarial legítima, absolutamente equiparável à opção de constituir uma sociedade comercial para os mesmos efeitos nas regiões autónomas;
  17. Aceitar que apenas as entidades com sede na RAA ou na RAM podem beneficiar da derrama regional, não o permitindo nos casos em que exista um estabelecimento estável com sede no continente, parece contrário ao princípio basilar da igualdade que pressupõe tratar por igual o que é igual e desigual o que é desigual, na medida dessa diferença; e
  18. Havendo um erro imputável aos serviços motivado pelo facto de o modelo oficial da Declaração Modelo 22 de IRC, referente aos exercícios de 2021 e de 2022, não conter quaisquer campos para apuramento de derramas regionais equivalentes aos campos 350 (“Imposto imputável à Região Autónoma dos Açores”) e 370 (“Imposto Imputável à Região Autónoma da Madeira”) no que se refere ao IRC imputável e apurado por cada uma das regiões autónomas, do qual resultou ao pagamento de excesso de derrama estadual por referência ao anos de 2021 e 2022, no valor total de € 3.970.078,32, o que se revela ilegal por desconformidade com o critério de imputação previsto no artigo 26.º, n.º 2, da LFRA, deve o imposto pago em excesso ser reembolsado na íntegra, acrescido de juros indemnizatórios devidos nos termos dos artigos 43.º e 100.º, ambos da LGT.

 

§2     Posição da Requerida

 

  1. Por seu turno, a Requerida contestou a posição da Requerente, defendendo-se, em síntese, com os fundamentos seguintes:
    1. Segundo o n.º 1 do artigo 5.º, da CRP, Portugal abrange o território historicamente definido no continente europeu e os arquipélagos dos Açores e da Madeira, os quais constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos e de órgãos de governo próprio (cfr. n.º 2 do artigo 6.º da CRP);
    2. As regiões autónomas têm um poder tributário próprio, um poder tributário de adaptação e um direito a determinadas receitas;
    3. Para regular estes poderes, a Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de Setembro, aprovou a LFRA, que tem por objecto, conforme artigo 1.º, a definição dos meios de que dispõem a RAA e a RAM para a concretização da autonomia financeira consagrada na constituição e nos estatutos político-administrativos;
    4. Esta Lei Orgânica abrange as matérias relativas à administração financeira, às receitas regionais, ao poder tributário próprio das regiões autónomas, à adaptação do sistema fiscal nacional e às relações financeiras entre as regiões autónomas e as autarquias locais nelas sediadas (artigo 2.º);
    5. Os poderes das regiões autónomas atrás referidos devem ser exercidos em obediência ao princípio da coerência entre o sistema fiscal nacional e os sistemas fiscais regionais, previsto na alínea a) do artigo 55.º da LFRA, e do princípio da suficiência, no sentido de que as cobranças tributárias regionais, em princípio, visam a cobertura das despesas públicas regionais (al. f) do artigo 55.º da LFRA), entre outros;
    6. A propósito do poder de criar impostos regionais, determina o n.º 1 do artigo 57.º, da LFRA, que tal poder deve ser exercido em matérias não sujeitas à incidência efectiva ou potencial de impostos de âmbito nacional e que não funcionem como um obstáculo ao comércio com os diferentes pontos do território nacional;
    7. A competência atribuída às regiões autónomas para adaptar o sistema nacional às especificidades regionais consiste na diminuição das taxas de IRS, do IRC, IVA e impostos especiais de consumo, na concepção de deduções à colecta e na concepção de benefícios fiscais temporários e condicionados (artigo 59.º, da LFRA);
    8. O poder tributário das regiões autónomas está limitado à criação de impostos relacionados especificamente com as regiões autónomas e à adaptação do sistema fiscal nacional;
    9. Tal competência não compreende o poder de revogar ou afastar leis gerais da República em matéria fiscal;
    10. No que se refere ao direito das regiões autónomas às receitas fiscais, determina o artigo 24.º da LFRA que “(...) as Regiões Autónomas têm direito à entrega pelo Governo da República das receitas fiscais relativas aos impostos que devam pertencer-lhes, (...), bem como a outras receitas que lhes sejam atribuídas por lei”;
    11. No âmbito da adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades de cada região, designadamente da RAM, através do DLR n.º 2/2001/M, de 20 de Fevereiro, adapta o sistema fiscal nacional às especificidades da região, “continuando a favorecer o investimento produtivo e contribuindo para a correção das assimetrias de distribuição de rendimento resultantes da insularidade e para a melhoria das condições de vida dos seus residentes”;
    12. Relativamente às pessoas colectivas com sede em Portugal, no território continental, apenas beneficiam de taxa de IRC, as que possuam uma “representação permanente sem personalidade jurídica própria” em mais de uma circunscrição, ou seja, em território da região autónoma, e desde que não integrem um grupo de sociedades, tributado, por opção, pelo Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades (“RETGS”) previsto no artigo 69.º, do Código do IRC;

 

  1. Relativamente à RAA, a taxa de IRC para as entidades que exercem, a título principal, actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola, em vigor na RAA, foi estabelecida no artigo 5.º, do DLR n.º 2/99/A, de 20 de Janeiro, com a redacção dada pelo DLR n.º 2/2014/A, de 29 de Janeiro;
  2. Tal como relativamente à RAM, das disposições legais aplicáveis à RAA, resulta que, relativamente às pessoas colectivas com sede em Portugal, no território continental, apenas beneficiam da redução de taxa de IRC, aquelas que possuam uma “representação permanente sem personalidade jurídica próprias” em mais de uma circunscrição, ou seja, em território da região autónoma e desde que, não integrem um Grupo de sociedades, tributado, por opção, pelo RETGS previsto no artigo 69.º, do Código do IRC;
  3. Em relação à RAA e no que concerne à derrama regional, constata-se que a mesma foi criada pelo DLR n.º 21/2016/A, de 17 de Outubro, tendo as taxas sido alteradas pelo DLR n.º 1/2018/A, de 3 de Janeiro, o qual determina que a derrama regional é aplicável aos sujeitos residentes na RAA, bem como aos não residentes com estabelecimento estável na RAA, que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;
  4. Pelo que, no caso dos autos, não é possível aplicar a referida norma, porquanto nenhuma das sociedades dominadas são residentes na RAA;
  5. No que se refere à derrama regional da RAM, o regime jurídico foi criado pelo DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, tendo as taxas sido alteradas, sucessivamente, pelos DLR n.ºs 5-A/2014/M, de 23 de Julho e 2/2018/M, de 9 de Janeiro;
  6. De acordo com aquele regime, a derrama regional incide sobre a parte do lucro tributável superior a € 1.500.000,00 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas apurado pelos sujeitos passivos enquadrados no n.º 1 do artigo 26.º da LFRA, que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;

 

 

  1. Nem a Requerente, nem nenhuma das sociedades dominadas, são residentes nas regiões autónomas nem são sociedades não residentes com estabelecimento estável em qualquer das regiões autónomas, pelo que não se lhes aplica a derrama regional;
  2. A derrama estadual foi aprovada pela Lei n.º 12-A/2010, de 30 de Junho, por aditamento ao Código do IRC, dos artigos 87.º-A, 104.º-A e 105.º-A do Código do IRC;
  3. O artigo 87.º-A, do Código do IRC, define quem são os sujeitos passivos (a incidência subjectiva), incidência objectiva, a matéria colectável, a taxa do imposto e o facto gerador que determina o nascimento da referida obrigação de imposto;
  4. No que respeita à sua natureza jurídico-fiscal, a derrama estadual configura-se como uma receita do Estado e constitui um imposto acessório relativamente ao IRC tendo a natureza de IRC, que incide sobre a parte do lucro tributável superior a € 1.500.000,00 sujeito e não isento de IRC apurado pelos sujeitos passivos residentes em território português que exerçam a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e ainda por não residentes com estabelecimento estável em território português; e
  5. Como tal, haverá que concluir que a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, com referência aos exercícios de 2021 e 2022, não padece de qualquer vício, devendo a sua conformidade com a lei ser reconhecida pelo tribunal arbitral.

 

SANEAMENTO

 

  1. O pedido foi tempestivamente apresentado, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

 

  1. O Tribunal Arbitral colectivo foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 10.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT.
  2. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e estão regularmente representadas, em conformidade com o disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e nos artigos 1.º a 3.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

  1. Em tudo o que de mais possa relevar para a boa decisão da causa, o processo não enferma de nulidades, nem existem excepções ou questões prévias que cumpram conhecer e que obstem à apreciação do mérito da causa.

 

MATÉRIA DE FACTO

 

§1 -   Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

  1. O Tribunal Arbitral tem o dever de seleccionar os factos que interessam à decisão da causa e discriminar os factos provados e não provados, não tendo de se pronunciar quanto a todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), e do artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

 

  1. Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram seleccionados e conformados em função da sua relevância jurídica, determinada com base nas posições assumidas pelas partes e nas várias soluções plausíveis das questões de direito para o objecto do litígio, conforme decorre do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

  1. Os factos dados como provados e não provados resultaram da análise da prova produzida no presente processo, designadamente a prova documental junta aos autos pela Requerente, do processo administrativo junto aos autos pela Requerida, tendo os mesmos sido apreciados pelo Tribunal Arbitral de acordo com o princípio da livre apreciação dos factos, conforme decorre do artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e do artigo 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

  1. Não se deram como provadas nem como não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

 

§2 -   Factos provados

 

  1. Analisada a prova produzida nos presentes autos, com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:
    1. A Requerente é uma sociedade anónima de direito português, criada pelo Decreto-Lei n.º 404/98, de 18 de Dezembro, que aprovou a cisão da Empresa Pública C..., à qual foi atribuída a concessão de serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil;
    2. O Estado Português celebrou, em 14 de Dezembro de 2012, com a Requerente um contrato de concessão de serviço público aeroportuário de apoio à aviação civil, ao abrigo do quadro jurídico estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 254/2012, de 28 de Novembro;
    3. Este contrato de concessão tem por objecto a prestação de actividades e serviços aeroportuários, por um período de 50 anos, nos aeroportos de Lisboa, Porto, Faro e no terminal civil de Beja, em Portugal Continental, nos aeroportos de Ponta Delgada, Santa Maria, Horta e Flores, na RAA;
    4. Na sequência da operação de fusão por incorporação da B..., S.A. na Requerente, esta sucedeu àquela entidade como concessionária no contrato de serviço público aeroportuário de apoio à aviação nos aeroportos do Funchal e de Porto Santo, na RAM, celebrado com o Estado Português em 10 de Setembro de 2013;
    5. A Requerente tem sede e direcção efectiva no território continental português;
    6. A Requerente, através da exploração da concessão de aeroportos em território nacional, quer no continente, quer na RAM e na RAA, assegura as operações aeroportuárias e de logística, envolvendo a gestão operacional e terminal de bagagem, as operações aeroportuárias, as operações de socorros, a segurança (safety e security) e a facilitação;
    7. A Requerente, na RAM e RAA, assegura o exercício da sua actividade de exploração e gestão aeroportuária através de instalações fixas, equipamentos e equipas permanentes necessárias àquela actividade;
    8. A Requerente tem equipas de gestão associada a cada um dos grupos de aeroportos localizados da RAM e da RAA, individualizadas e regulamentadas internamente, de forma autónoma, da equipa de gestão dos restantes aeroportos localizados no continente, através da Direcção dos Aeroportos da ... e da Direcção dos Aeroportos dos ...;
    9. A Requerente é a sociedade dominada designada para assumir a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações que incumbem à sociedade dominante no contexto de um grupo tributado ao abrigo do RETGS;
    10. A Requerente entregou a sua declaração de rendimentos individual Modelo 22 do IRC referente ao exercício de 2021, em 3 de Junho de 2022;
    11. A Requerente entregou uma declaração de rendimentos individual Modelo 22 do IRC referente ao exercício de 2021, de substituição, em 23 de Maio de 2023;
    12. Nesta declaração de rendimentos, a Requerente apurou um lucro tributável no montante de € 48.166.646,80;
    13. Nesta declaração de rendimentos, a Requerente apurou uma derrama estadual no montante de € 2.741.798,21;
    14. A Requerente entregou a sua declaração individual Modelo 22 do IRC referente ao exercício de 2022, em 2 de Junho de 2023;
    15. Nesta declaração de rendimentos, a Requerente apurou um lucro tributável no montante de € 485.131.076,12;
    16. Nessa declaração de rendimentos, a Requerente apurou uma derrama estadual no montante de € 42.066.796,85;
    17. No exercício de 2021 e no exercício de 2022, o modelo oficial da declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC não continha quaisquer campos para apuramento de derramas regionais equivalentes aos campos 350 (“Imposto imputável à Região Autónoma dos Açores”) e 370 (“Imposto Imputável à Região Autónoma da Madeira”) para apuramento do IRC imputável a cada uma das regiões autónomas;
    18. Por limitação do formulário da declaração de rendimentos Modelo 22 do IRC de IRC, não foi possível à Requerente efectuar o apuramento da derrama regional separadamente por cada uma das regiões autónomas e da derrama estadual sobre o remanescente imputável ao território continental;
    19. A Requerente, no cálculo da sua derrama estadual individual nas declarações de rendimentos Modelo 22 de IRC, dos exercícios de 2021 e 2022, alocou o total do seu lucro tributável exclusivamente à derrama estadual;
    20. A Requerente apresentou, em 3 de Junho de 2022, a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do Grupo, referente ao exercício de 2021;
    21. A Requerente apresentou, em 2 de Junho de 2023, a declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC do Grupo, referente ao exercício de 2022;
    22. Nestas declarações do RETGS apresentadas pela Requerente foram incluídas as derramas estaduais apuradas no RETGS que perfizeram um total de € 45.571.934,72, repartido da seguinte forma:
      1. € 2.818.694,41 por referência ao exercício de 2021, correspondente ao somatório das derramas estaduais apuradas individualmente por cada sociedade do RETGS (e que incluem a derrama apurada individualmente pela Requerente); e,
      2. € 42.753.240,31, por referência ao exercício de 2022, correspondente ao somatório das derramas estaduais apuradas individualmente por cada sociedade do RETGS (e que incluem a derrama apurada individualmente pela Requerente).
    23. Na sequência das declarações apresentadas pela Requerente em representação do RETGS, foram emitidas as seguintes liquidações de IRC:
      1. Em 26 de Maio de 2023, a liquidação de IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2021, da qual resultou a liquidação de um valor total de derrama estadual a pagar de € 2.818.694,41; e
      2. Em 8 de Agosto de 2023, a liquidação de IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2022, da qual resultou a liquidação de um valor total de derrama estadual a pagar de € 42.753.240,31.
    24. Ficou provado que a Requerente pagou as derramas estaduais referentes aos exercícios de 2021 e 2022, nos termos em que as mesmas foram liquidadas;
    25. Nos exercícios de 2021 e 2022, a Requerente apresentou o seguinte volume de negócios, imputável à RAM e à RAA:

 

  1. Nos exercícios de 2021 e 2022, a Requerente a Requerente apurou o seguinte rácio de repartição do volume anual de negócios entre Portugal Continental, RAM e RAA:

 

  1. Nos exercícios de 2021 e 2022, através da aplicação do rácio de repartição do volume de negócios ao total do lucro tributável da Requerente, foi apurado o seguinte lucro tributável da Requerente imputável a Portugal Continental, à RAM e à RAA:

 

 

  1. No dia 11 de Abril de 2024, a Requerente apresentou reclamação graciosa, contestando a legalidade das liquidações de IRC mencionadas acima no ponto xxiii;
  2. Nessa reclamação graciosa, a Requerente peticionou pela anulação parcial das liquidações relativas aos exercícios de 2021 e 2022, circunscrita à parte da derrama estadual indevidamente apurada por referência ao lucro tributável imputável à RAM e RAA, no valor total de € 3.970.078,32, e consequentemente a restituição desse valor acrescido de juros indemnizatórios, porque indevidamente pago;
  3. Através do ofício n.º ...-DJT/2024, de 09.05.2024, a Requerente foi notificada do projecto de decisão da Requerida de indeferimento da reclamação graciosa;
  4. Para fundamentar o projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a Requerida enunciou que:
    1. A derrama regional apenas se aplica a residentes nas regiões autónomas ou a não residentes com estabelecimento estável nas regiões autónomas;
    2. A Requerente tem sede em Portugal continental, não se verificando preenchidos os requisitos de aplicação da derrama regional;
    3. A derrama estadual aplica-se ao lucro tributável de sujeitos passivos residentes em território português, nos termos do artigo 87.º-A, do Código do IRC, pelo que a Requerente encontra-se sujeita a derrama estadual por aplicação desta norma e não às taxas reduzidas previstas nos DLRs que estabeleceram as derramas regionais; e
    4. Relativamente às questões de inconstitucionalidade e de violação da liberdade de circulação de capitais e pessoas, prevista no artigo 49.º, do TFUE, a Requerida, como órgão da administração pública sob direcção do Governo, não tem competências no foro da apreciação da legalidade constitucional de normas jurídicas ou da actividade legiferante, não se pronunciando sobre estes fundamentos de ilegalidade invocados pela Requerente;
  5. Em 24 de Maio de 2024, em resposta ao projecto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, a Requerente exerceu o seu direito de audição prévia;

 

  1. Em 11 de Junho de 2024, a Requerente foi notificada, através do Ofício n.º 556-DJT/2024, de 6 de Junho de 2024, da decisão final da Requerida de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as liquidações de IRC mencionadas acima no ponto xxiii;
  2. Na decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, a Requerida manteve o seu entendimento, arguindo ainda que a base de incidência da derrama estadual é a globalidade do lucro tributável obtido pelos sujeitos passivos, não devendo fazer-se qualquer segregação ou exclusão de incidência em função da circunscrição geográfica a que o mesmo é imputado.

 

§3 -   Factos não provados

 

  1. Analisada a prova produzida nos presentes autos, com relevo para a decisão da causa, inexistem factos que se tenham considerado não provados.

 

MATÉRIA DE DIREITO

 

  1. Passando-se à apreciação do mérito da causa a analisar nos presentes autos, entende-se que a matéria controvertida que foi sujeita à apreciação deste Tribunal se resume à análise de três questões essenciais, a saber:
  1. Apurar se a circunstância de a Requerente ser uma sociedade e um sujeito passivo de IRC que é tributada ao abrigo do RETGS condiciona os moldes como a derrama estadual prevista no artigo 87.º-A, do Código do IRC deve ser calculada;
  2. Determinar se, em vez das taxas de derrama estadual previstas naquela norma do Código do IRC, devem ser aplicadas as taxas reduzidas de derramas regionais, nos moldes previstos nos respectivos DLRs, aos rendimentos da Requerente que foram obtidos na RAA e na RAM, nos exercícios de 2021 e 2022; e

 

 

  1. Aferir se o conceito de “não residente com estabelecimento estável”, se reporta apenas a entidades que não sejam de todo residentes em qualquer circunscrição do território português e que tenham na RAA e RAM estabelecimento estável ou, pelo contrário, se para além destes também inclui os sujeitos passivos que apesar de terem naquelas regiões um estabelecimento estável são residentes no território continental português.

 

Então vejamos,

 

  1. Passando-se, agora, à apreciação da questão central a analisar nos presentes autos, crê-se que importa fixar a base legal relevante, tendo por referência o que se encontrava consagrado na legislação fiscal relevante, à data dos factos tributários aqui em causa:
    1. Artigo 26.º, da LFRA:

1 - Constitui receita de cada região autónoma o imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC):

a) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável numa única região;

b) Devido por pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede ou direção efetiva em território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica própria em mais de uma circunscrição, nos termos referidos no número seguinte;

c) Retido, a título definitivo, pelos rendimentos gerados em cada circunscrição, relativamente às pessoas coletivas ou equiparadas que não tenham sede, direção efetiva ou estabelecimento estável em território nacional.

2 - Relativamente ao imposto referido na alínea b) do número anterior, as receitas de cada circunscrição são determinadas pela proporção entre o volume anual de negócios do exercício correspondente às instalações situadas em cada região autónoma e o volume anual total de negócios do exercício.

3 - Para efeitos do disposto no presente artigo, entende-se por volume anual de negócios o valor das transmissões de bens e prestações de serviços, com exclusão do imposto sobre o valor acrescentado (IVA)”;

  1. Artigo 5.º, n.ºs 1 e 2, do Código do IRC:

1 - Considera-se estabelecimento estável qualquer instalação fixa através da qual seja exercida uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.

2 - Incluem-se na noção de estabelecimento estável, desde que satisfeitas as condições estipuladas no número anterior:

a) Um local de direção;

b) Uma sucursal;

c) Um escritório;

d) Uma fábrica;

e) Uma oficina;

f) Uma mina, um poço de petróleo ou de gás, uma pedreira ou qualquer outro local de extração de recursos naturais situado em território português.

  1. Artigo 87.º-A, do Código do IRC:

1 - Sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado por sujeitos passivos residentes em território português que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e por não residentes com estabelecimento estável em território português, incidem as taxas adicionais constantes da tabela seguinte:

2- O quantitativo da parte do lucro tributável que exceda (euro) 1 500 000:

a) Quando superior a (euro) 7 500 000 e até (euro) 35 000 000, é dividido em duas partes: uma, igual a (euro) 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 3 %; outra, igual ao lucro tributável que exceda (euro) 7 500 000, à qual se aplica a taxa de 5 %;

b) Quando superior a (euro) 35 000 000, é dividido em três partes: uma, igual a (euro) 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 3 %; outra, igual a (euro) 27 500 000, à qual se aplica a taxa de 5 %, e outra igual ao lucro tributável que exceda (euro) 35 000 000, à qual se aplica a taxa de 9 %.

3 - Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as taxas a que se refere o n.º 1 incidem sobre o lucro tributável apurado na declaração periódica individual de cada uma das sociedades do grupo, incluindo a da sociedade dominante.

4 - Os sujeitos passivos referidos nos números anteriores devem proceder à liquidação da derrama adicional na declaração periódica de rendimentos a que se refere o artigo 120.º”;

  1. Artigos 1.º, 2.º e 5.º, do DLR n.º 21/2016/A, de 17 de Outubro:

Artigo 1.º

Derrama Regional

É criada a derrama regional a vigorar na Região Autónoma dos Açores e é aprovado o respetivo regime jurídico.

Artigo 2.º

Incidência

1 - Sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros) sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas, apurado por sujeitos passivos residentes na Região Autónoma dos Açores, bem como por sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável na Região Autónoma dos Açores, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, incide derrama regional às taxas constantes da tabela seguinte:

 

2 - O quantitativo da parte do lucro tributável que exceda (euro) 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros):

a) Quando superior a (euro) 7.500.000,00 (sete milhões e quinhentos mil euros) e até (euro) 35.000.000,00 (trinta e cinco milhões de euros) é dividido em duas partes: uma, igual a (euro) 6.000.000,00 (seis milhões de euros) à qual se aplica a taxa de 2,4 %; outra, igual ao lucro tributável que exceda (euro) 7.500.000,00 (sete milhões e quinhentos mil euros) à qual se aplica a taxa de 4 %;

b) Quando superior a (euro) 35.000.000,00 (trinta e cinco milhões de euros) é dividido em três partes: uma, igual a (euro) 6.000.000,00 (seis milhões de euros) à qual se aplica a taxa de 2,4 %; outra, igual a (euro) 27.500.000,00 (vinte e sete milhões e quinhentos mil euros) à qual se aplica a taxa de 4 %, e outra igual ao lucro tributável que exceda (euro) 35.000.000,00 (trinta e cinco milhões de euros) à qual se aplica a taxa de 5,6 %.

3 - Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as taxas a que se refere o n.º 1 incidem sobre o lucro tributável apurado na declaração periódica de rendimentos individual de cada uma das sociedades do grupo, incluindo a da sociedade dominante, referida na alínea b), do n.º 6, do artigo 120.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC).

4 - Os sujeitos passivos referidos nos números anteriores devem proceder à liquidação da derrama regional na declaração periódica de rendimentos a que se refere o artigo 120.º do CIRC.

(…)

Artigo 5.º

Disposições finais

1 - O presente diploma entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

2 - Não são aplicáveis aos sujeitos passivos, mencionados no artigo 2.º, os artigos 87.º-A, 104.º-A e 105.º-A do CIRC.”;

  1. Artigos 1.º, 2.º e 4.º, do DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, republicado pelo DLR n.º 5-A/2014/M, de 23 de Julho:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma aprova as alterações ao regime jurídico da derrama regional, aprovado pelo artigos 3.º a 6.º do Decreto Legislativo Regional n.º 14/2010/M, de 5 de agosto, adaptando às especificidades regionais, os artigos 87.º-A e 105.º-A do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, e republicado pela Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro.

Artigo 2.º

Derrama Regional

1 - Nos termos dos n.ºs 1 e 2 alínea b) do artigo 56.º da Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de setembro, conjugado com os artigos 87.º-A e 105.º-A do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de novembro, e republicado pela Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, com a aprovação nos artigos 3.º a 6.º do Decreto Legislativo Regional n.º 14/2010/M, de 5 de agosto, e alterações posteriores do artigo 16.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/2011/M, de 10 de janeiro, do n.º 2 do artigo 15.º do Decreto Legislativo Regional n.º 5/2012/M, de 30 de março, do n.º 2 do artigo 17.º do Decreto Legislativo Regional n.º 42/2012/M, de 31 de dezembro, e prorrogado pelo artigo 19.º do Decreto Legislativo Regional n.º 31-A/2013/M, de 31 de dezembro, o regime da derrama regional passa a ter a seguinte redação:

(…)

Artigo 4.º

Incidência

1 - Sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado por sujeitos passivos enquadrados no n.º 1 do artigo 26.º da Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de setembro, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, incidem as taxas adicionais constantes da tabela seguinte:

 

a) Quando superior a (euro) 7 500 000 e até (euro) 35 000 000, é dividido em duas partes: uma, igual a (euro) 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 3 %; outra, igual ao lucro tributável que exceda (euro) 7500 000, à qual se aplica a taxa de 5 %;

b) Quando superior a (euro) 35 000 000, é dividido em três partes: uma, igual a (euro) 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 3 %; outra, igual a (euro) 27 500 000, à qual se aplica a taxa de 5 % e outra igual ao lucro tributável que exceda (euro) 35 000 000, à qual se aplica a taxa de 7 %.

3 - Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as taxas a que se refere o número anterior incidem sobre o lucro tributável apurado na declaração individual de cada uma das sociedades do grupo, incluindo a da sociedade dominante.

4 - Os sujeitos passivos referidos nos números anteriores devem proceder à liquidação da derrama adicional na declaração periódica de rendimentos a que se refere o artigo 120.º do CIRC.”;

  1. DLR n.º 18/2020/M, de 31 de Dezembro, que alterou o artigo 4.º do DLR n.º 14/2010/M, de 5 de Agosto, republicado pelo DLR n.º 5-A/2014/M, de 23 de Julho, nos seguintes termos:

Artigo 4.º

Incidência

1 - Sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado por sujeitos passivos enquadrados no n.º 1 do artigo 26.º da Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de setembro, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, incidem as taxas adicionais constantes da tabela seguinte:

 

2 - O quantitativo da parte do lucro tributável que exceda (euro) 1 500 000:

a) Quando superior a € 7 500 000 e até € 35 000 000, é dividido em duas partes: uma, igual a € 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 2,1 %; outra, igual ao lucro tributável que exceda € 7500 000, à qual se aplica a taxa de 3,5 %;

b) Quando superior a € 35 000 000, é dividido em três partes: uma, igual a € 6 000 000, à qual se aplica a taxa de 2,1 %; outra, igual a € 27 500 000, à qual se aplica a taxa de 3,5 %, e outra igual ao lucro tributável que exceda € 35 000 000, à qual se aplica a taxa de 6,3 %.

3 - Quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as taxas a que se refere o número anterior incidem sobre o lucro tributável apurado na declaração individual de cada uma das sociedades do grupo, incluindo a da sociedade dominante.

4 - Os sujeitos passivos referidos nos números anteriores devem proceder à liquidação da derrama adicional na declaração periódica de rendimentos a que se refere o artigo 120.º do CIRC”.

 

  1. Conforme decorre de tudo o anteriormente exposto e do enquadramento legislativo acima citado, o objecto central do presente litígio foca-se na aplicação e compatibilização do regime jurídico da derrama estadual consagrada no Código do IRC com os regimes jurídicos das derramas regionais previstas nos DLRs respectivamente aplicáveis à RAM e à RAA.

 

  1. Para tal, importa começar por aferir se a circunstância de a Requerente fazer parte de um grupo de sociedades que é tributado no âmbito do RETGS tem, ou não, algum impacto no cálculo da derrama estadual (e, por consequência na alocação de lucros tributáveis imputáveis à RAM e à RAA e aí sujeitos às derramas regionais respectivas).
  2. Ora, a resposta a esta questão já foi dada em diversa inúmera jurisprudência arbitral, mormente nas decisões arbitrais proferidas em 28.11.2020, no processo n.º 742/2019-T; em 15.10.2021, no processo n.º 187/2020-T; em 26.09.2022, no processo n.º 836/2021-T; e em 21.08.2023, no processo n.º 792/2022-T.

 

  1. Esta jurisprudência arbitral deverá ser tida em consideração por respeito aos princípios da segurança jurídica e da uniformização da jurisprudência e também pelo disposto no artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil, segundo o qual “nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito”.

 

  1. Assim, a título de exemplo e por uma questão de economia, remetemos para o exposto na decisão arbitral n.º 792/2022-T atrás mencionada, a qual refere o seguinte:

(…) desde já se refere que o facto de a Requerente ser tributada ao abrigo do RETGS em nada interfere com o cálculo da derrama estadual.

35. Isto na medida em que o legislador previu expressamente no n.º 3, do artigo 87.º-A do CIRC que, mesmo nos casos em que o RETGS seja aplicável, não é o lucro tributável agregado do grupo que será objecto da derrama estadual, mas sim o lucro tributável apurado na declaração periódica individual de cada uma das sociedades que o integram, incluindo a da sociedade dominante.

36. Para além disto, o facto de o Grupo Fiscal B... ser tributado ao abrigo do RETGS também não interfere com o cálculo das derramas regionais eventualmente aplicáveis e com a sua articulação com a derrama estadual.

37. É certo que as derramas regionais da RAA e da RAM estabelecem taxas de tributação mais reduzidas comparativamente às taxas da derrama estadual, e é certo que o artigo 69.º, n.º 3, alínea a) do CIRC faz depender a aplicação do RETGS da tributação de todas as sociedades no perímetro do grupo, pela totalidade dos seus rendimentos, com base no regime geral de tributação em IRC e à taxa normal mais elevada com renúncia à aplicação de taxas inferires àquela.

38. No entanto, a eventual aplicação das derramas regionais da RAA e da RAM, enquanto regimes acessórios de tributação adicional em sede de IRC que são, não têm a virtualidade de afastar o regime geral de tributação em IRC, nem tampouco a aplicação da taxa normal mais elevada, que é a que se encontra prevista no n.º 1, do artigo 87.º do CIRC.

39. O que quer dizer que a aplicação do RETGS não implica uma renúncia pela Requerente à aplicação dos regimes especiais das derramas regionais em face da sujeição única à derrama estadual prevista no artigo 87.º-A do CIRC, conforme sustenta a Requerida”.

 

  1. Estando assente a (ir)relevância da aplicação do RETGS para efeitos da eventual sujeição dos lucros tributáveis obtidos pela Requerente às derramas regionais vigentes na RAM e na RAA, passemos agora à análise sobre se, em vez das taxas de derrama estadual previstas no artigo 87.º-A do Código do IRC, devem, efectivamente, ser aplicadas as taxas reduzidas de derramas regionais aos rendimentos da Requerente que foram gerados e obtidos na RAA e na RAM, nos exercícios de 2021 e 2022.

 

  1. Em relação a esta matéria, é unânime entre as partes que, por desígnio constitucional (vide artigo 227.º, n.º 1, alínea i), da CRP), a RAM e a RAA dispõem de um poder tributário próprio, um poder de adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades próprias regionais e um poder de dispor de um conjunto de receitas fiscais (nomeadamente as nelas cobradas ou geradas).

 

  1. E também é pacífico entre as partes que a regulação de tais poderes se encontra instituída primeiramente na LFRA e, secundariamente, em diversos DLRs.

 

  1. Também não existe dissídio entre as partes no que tange à circunstância de, quer a RAM, quer a RAA, no âmbito dos seus poderes próprios em matéria tributária, terem legitimamente estabelecido derramas regionais que deveriam ser aplicadas em cada uma daquelas regiões autónomas, nos termos que uma e outra assim decidiram fixar.
  2. Neste ponto, a controvérsia entre as partes surge na avaliação que cada uma faz da circunstância de a Requerente ser uma sociedade com sede ou direcção efectiva no território de Portugal continental que “apenas” exerce a sua actividade na RAM e na RAA através de um conjunto de infraestruturas fixas, equipamentos e recursos humanos especificamente alocados e localizados naquelas regiões autónomas.

 

  1. Para a Requerente, essa circunstância não é impeditiva de à mesma poderem ser aplicadas as derramas regionais previstas, respectivamente, na RAM e na RAA, em virtude de se verificarem as competentes regras de incidência (em particular, a subjectiva).

 

  1. Para a Requerida, tal circunstância exclui a Requerente do âmbito de incidência subjectiva das derramas regionais vigentes na RAM e na RAA, pelo que apenas será aplicável a esta a derrama estadual, a qual incidirá sobre todo o lucro tributável que a aquela tenha obtido, independentemente de o mesmo ter sido gerado no território de Portugal continental e/ou nas regiões autónomas.

 

  1. Ora, em relação a esta questão, em face do enquadramento legislativo acima citado e dada a matéria de facto dada por provada nestes autos, desde já se anuncia que se subscreve a posição que a Requerente pugnou nestes autos.

 

  1. De resto, é este o entendimento que tem sido seguido também por inúmera jurisprudência arbitral em casos em tudo idênticos ao descrito nos presentes autos, mormente nas decisões proferidas em 06.03.2023, no processo n.º 437/2022-T; em 11.03.2024, no processo n.º 805/2023-T; em 21.08.2023, no processo n.º 792/2022-T; em 08.05.2024, no processo n.º 1056/2023-T, e em 20.05.2024, no processo n.º 11/2024-T.

 

  1. Veja-se, a título exemplificativo, as considerações feitas a este respeito na supra mencionada decisão arbitral proferida em 11.03.2024, no âmbito do processo n.º 805/2023-T:

 

3.2.1.Questão da aplicação da derrama regional da Madeira

Relativamente à derrama regional da Madeira, incide sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado por sujeitos passivos enquadrados no n.º 1 do artigo 26.º da Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de Setembro, que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.

O artigo 26.º, n.º 1, da referida Lei Orgânica n.º 2/2013 (Lei das Finanças das Regiões Autónomas – LFRA) refere na sua alínea b) as «pessoas coletivas ou equiparadas que tenham sede ou direção efetiva em território português e possuam sucursais, delegações, agências, escritórios, instalações ou quaisquer formas de representação permanente sem personalidade jurídica própria em mais de uma circunscrição».

«Circunscrição», é o território do continente ou de uma região autónoma, consoante o caso, como se refere na alínea b) do artigo 23.º da LFRA.

É manifesto que as situações das 2.ª e 3.ª Requerentes se enquadram nesta norma, pois, tanto em 2020 como em 2021:

– tinham sede em território português;

– possuíam instalações permanentes em mais de uma circunscrição, designadamente no continente e em pelo menos uma das regiões autónomas. 

Por isso, conclui-se que às 2.º e 3.ª Requerentes era aplicável a derrama regional da Madeira e não a derrama estadual, relativamente aos rendimentos obtidos nesta Região Autónoma.

3.2.2. Questão da aplicação da derrama regional dos Açores

No que concerne à derrama regional dos Açores, aplica-se, nos termos do artigo 2.º do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A, aos sujeitos passivos residentes na Região Autónoma dos Açores, bem como por sujeitos passivos não residentes com estabelecimento estável na Região Autónoma dos Açores, que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.

As 2.ª e 3.ª Requerentes não eram residentes na Região Autónoma dos Açores, mas tinham nela instalações enquadráveis no conceito de estabelecimento estável, definido no artigo 5.º do CIRC.

Assim, a questão que se pode levantar, com pertinência, é a de saber se a referência a «sujeitos passivos não residentes» se reporta a não residentes em território nacional ou a não residentes no território da Região Autónoma dos Açores.

Como há muito vem decidindo o Supremo Tribunal Administrativo, a propósito da questão paralela que se coloca a nível das reduções de taxas de IRC nas regiões autónomas, a referência a «não residentes» reporta-se todos os sujeitos passivos que não residem na região autónoma, quer residam no estrangeiro quer em outra parte do território nacional: «o conceito de estabelecimento estável para efeito dessa redução de taxa abrange instalações, onde seja exercida efectiva actividade económica, dos sujeitos passivos residentes ou não no território nacional, sob pena de violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP)». (…)

Neste artigo 13.º da CRP estabelece-se o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei.

Este princípio, como limite à discricionariedade legislativa, não exige o tratamento igual de todas as situações, mas, antes, implica que sejam tratados igualmente os que se encontram em situações iguais e tratados desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de maneira a não serem criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento material bastante. O princípio da igualdade não proíbe se estabeleçam distinções, mas sim, distinções desprovidas de justificação objectiva e racional. (…)

No caso em apreço, não se vislumbra qualquer razão que possa levar a que empresas com sede e direcção efectiva fora da Região Autónoma dos Açores que nela tenham instalações idênticas qualificáveis como «estabelecimento estável», à face do art. 5.º do CIRC, e que desenvolvam a mesma actividade, possam beneficiar de taxas de IRC e derrama diferentes pelo facto de a sede ou direcção efectiva, fora da área daquela Região, se situar no território nacional ou no estrangeiro.

Na verdade, para além da identidade material da situação real a nível da Região Autónoma dos Açores, as razões que justificou a criação de taxas reduzidas de IRC e de derrama para entidades não residentes, que são melhorar «a competitividade e criação de emprego das empresas com actividade no arquipélago, que suportam os custos incontornáveis da insularidade» (Preâmbulo do determinação do lucro tributável 2/99/A, de 6 de Março) e a «promoção da economia e reforço dos meios dos agentes económicos na concretização de investimento e criação de emprego, em benefício do desenvolvimento sustentável da Região Autónoma dos Açores» (Preâmbulo do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A) valem igualmente tanto para o investimento por empresas estrangeiras como para o investimento por empresas nacionais.

Assim, é de concluir que a interpretação do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto Legislativo Regional n.º 21/2016/A no sentido da aplicação da taxa reduzida de derrama a todas as entidades que não tenham sede ou direcção efectiva na Região Autónoma da Madeira que nela tenham instalações qualificáveis como «estabelecimento estável», à face do artigo 5.º do CIRC, é a única que se sintoniza com o princípio constitucional da igualdade.

Por isso, há que adoptar esta interpretação conforme à Constituição.

De resto, é também esta a interpretação que permite melhor satisfazer o primacial interesse visado com a redução de IRC, que é incentivar ao investimento na Região Autónoma dos Açores, pelo que é de presumir ter sido a solução adoptada na lei, por ser a mais acertada (art. 9.º, n.º 3, do CC). (…)

E é também esta a interpretação que se melhor se compagina com a imputação das receitas de IRC às regiões autónomas que se faz no artigo 26.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, da LFRA, em que se incluem as devidas por pessoas colectivas com sede ou direcção efectiva em território português que tenham na região um estabelecimento estável, sendo as receitas de cada circunscrição são determinadas pela proporção entre o volume anual de negócios do exercício correspondente às instalações situadas em cada região autónoma e o volume anual total de negócios do exercício.

Na verdade, nestas normas do artigo 26.º da LFRA explicitamente se dá relevância a instalações de pessoas colectivas residentes em território português qualificáveis como estabelecimentos estáveis, o que confirma o entendimento que vem sendo adoptado pelo Supremo Tribunal Administrativo, que se referiu.

Pelo exposto, também em relação à actividade das Requerentes nos Açores, era aplicável às Requerentes a respectiva derrama regional e não a derrama nacional.

3.2.3. Compatibilização das derramas regionais com a derrama estadual

Tendo as 2.ª e 3.ª Requerentes actividade no continente, a par das actividades nas regiões autónomas, desenvolvidas através de instalações qualificáveis como «estabelecimentos estáveis», torna-se necessário compatibilizar a aplicação das derramas.

Como se refere no acórdão arbitral de 21-08-2023, proferido no processo n.º 792/2022-T, «quanto a este ponto, haverá que recorrer ao critério de imputação previsto no artigo 26.º, n.º 2, da Lei das Finanças Regionais, que fixa uma repartição do imposto a suportar pelo sujeito passivo em cada circunscrição com base na proporção do volume de negócios apurado por referência à actividade efectivamente desenvolvida em cada região». Isto é, no cálculo do quantum devido a título de derrama estadual não deverá ser tida em consideração a proporção do lucro tributável imputável aos estabelecimentos estáveis sitos na RAA e na RAM, que se encontra sujeito às derramas regionais especificamente previstas em cada uma daquelas circunscrições” (com negritos no próprio texto).

 

  1. Em face do acima exposto, conclui-se que, ao contrário do pugnado pela Requerida nestes autos, os rendimentos (lucros) obtidos pela Requerente que tenham sido gerados na RAM e na RAA, através de estabelecimentos estáveis seus situados nessas regiões autónomas, estão sujeitos às derramas regionais vigentes em cada uma dessas regiões autónomas, de acordo com a LFRA e os respectivos DLRs, e não à derrama estadual prevista no artigo 87.º-A, do Código do IRC.

 

  1. Este entendimento é também aquele que se revela conducente com os princípios e regras enunciados na LFRA (além do artigo 26.º anteriormente citado, atente-se também ao disposto nos artigos 3.º, 8.º, 9.º, e 55.º), bem como com o já mencionado poder tributário próprio que foi conferido à RAM e à RAA por determinação constitucional (vide artigo 227.º, n.º 1, alínea i), da CRP).

 

 

  1. Complementando o acima exposto, numa situação análoga à descrita nos presentes autos, o Tribunal Arbitral decidiu, no processo n.º 437/2022 já referido, que “As partes superiores dos aeroportos, como as torres de controlo, destinadas à prestação de serviços de controlo aéreo, em geral por controladores de tráfego aéreo, visando uma adequada gestão da navegação aérea e a evitação de acidentes, são, assim, estabelecimentos estáveis para efeitos da incidência da derrama regional dos Açores: são instalações permanentes e não temporárias, onde é exercida com autonomia, com meios materiais e humanos próprios, uma atividade principal de prestação de serviços da A...”.

 

  1. Acrescentou esse mesmo Tribunal Arbitral, nessa mesma decisão que o “facto de as torres de controlo e os centros de controlo de tráfego não serem sucursais ou agências da A..., nem exercerem funções de representação desta, não prejudica a qualificação dessas instalações fixas como estabelecimento estável da A..., já que assim o não exige o nº 1 do artigo 5º do CIRC”.

 

  1. Ora, no caso concreto, as instalações fixas, os equipamentos e os recursos humanos (seja ao nível da gestão, seja ao nível operacional) que a Requerente mantém alocadas aos aeroportos localizados na RAM e na RAA permitem que a mesma possa aí desenvolver a sua actividade, nos moldes em que a mesma lhe foi concessionada pelo Estado Português.

 

  1. Pelo que, atendendo ao conceito e aos requisitos associados à figura do “estabelecimento estável”, nos moldes em que os mesmos são explicitados no artigo 5.º, do Código do IRC, acima citado, e à luz do pugnado pelo Tribunal Arbitral, na decisão proferida no processo n.º 437/2022, conclui-se, igualmente, que a Requerente possui “estabelecimentos estáveis” (na terminologia constante daquela norma do Código do IRC), quer na RAM, quer na RAA.

 

  1. Dir-se-á, de resto, que o entendimento ora professado está igualmente em linha com o pugnado pelo Supremo Tribunal Administrativo (“STA”), no acórdão proferido no processo n.º 0958/10.1BELRS, de 18.11.2020, em que se afirma que o “conceito de estabelecimento estável para efeito dessa redução de taxa abrange instalações, onde seja exercida efetiva atividade económica, dos sujeitos passivos residentes ou não residentes no território nacional, sob pena de violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP)”.

 

  1. O entendimento proferido pelo STA neste acórdão ora citado tem, de resto, sido igualmente adoptado noutros acórdãos proferidos quer por este tribunal superior (e.g., 058/14, de 14.01.2015, 0292/09, de 17.06.2009, 0668/08, de 21.01.2009, 0669/08, de 07.01.2009), quer pelo Tribunal Central Administrativo Sul (e.g., 1468/09.5BELRS, de 04.10.2023, e 928/09, de 29.06.2017).

 

  1. Aliás, o Tribunal Central Administrativo Sul, no mencionado acórdão de 1468/09.5BELRS, de 04.10.2023, vem acrescentar as seguintes lições que, ainda que com as devidas e necessárias adaptações, aqui se julga importante recordar, porquanto aplicáveis aos presentes autos:

não há o obstáculo textual invocado pela Fazenda Pública a que, no âmbito da tributação das Regiões Autónomas, se aplique o conceito de «estabelecimento estável» a entidades residentes no território português (isto é, com sede ou direcção efectiva em território português) fora da Região Autónoma a que essa tributação se reporta. (…)  a Impugnante defende que será materialmente inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, uma interpretação no sentido de excluir (…) as entidades com sede ou direcção efectiva no território português, fora da Região Autónoma da Madeira, que possuam nela instalações qualificáveis como «estabelecimento estável». E tem efectivamente razão. No art. 13.º da C.R.P. estabelece-se o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei [o qual proíbe] distinções desprovidas de justificação objectiva e racional. (…) não se vislumbra qualquer razão que possa levar a que empresas com sede e direcção efectiva fora da Região Autónoma da Madeira que nela tenham instalações idênticas qualificáveis como «estabelecimento estável», à face do art. 5.º do CIRC, e que desenvolvam a mesma actividade, possam beneficiar de taxas (…) diferentes pelo facto de a sede ou direcção efectiva se situar no território nacional ou no estrangeiro. (…) [esta interpretação] é a única que se sintoniza com o princípio constitucional da igualdade [pelo que] ter-se-á de concluir que a taxa (…) é aplicável aos sujeitos passivos que tenham sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável na Região Autónoma da Madeira, sejam eles residentes, entenda-se com sede noutra área do território nacional, ou não residentes, porquanto, como visto, a única interpretação que se encontra conforme com a CRP, e congruente com o desiderato inerente à própria implementação da redução de taxa” (com negritos e sublinhados no próprio texto).

 

  1. Ou seja, e em resumo, o conceito de “estabelecimento estável” previsto no artigo 5.º, do Código do IRC, pode ser aplicável quer a entidades que sejam não residentes em toda a extensão e circunscrição do território português (continente e regiões autónomas), quer a entidades que, ainda que tendo sede ou direcção efectiva em território continental português, desenvolvam as suas actividades económicas nas regiões autónomas portuguesas através de “qualquer instalação fixa através da qual seja exercida uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola”.

 

  1. Por se concordar integralmente com o que foi decidido e com os fundamentos enunciados nas decisões arbitrais e jurisprudenciais acima mencionadas e uma vez que a reprodução detalhada dos argumentos acabados de citar traduzir-se-ia num acto inútil para o processo e nessa medida proibido (artigo 130.º, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT), adere o presente Tribunal Arbitral aos argumentos constantes daquelas decisões arbitrais e jurisprudenciais.

 

  1. Perante o acima exposto, e concluindo-se pela aplicação das derramas regionais instituídas na RAM e na RAA aos lucros tributáveis gerados pela Requerente através de estabelecimentos estáveis ali localizados, é imperativo aferir-se acerca dos moldes de compatibilização entre aquelas derramas regionais e a derrama estadual, tendo em conta os lucros tributáveis que foram apurados individualmente pela Requerente, nos exercícios de 2021 e 2022, em conformidade com as disposições do Código do IRC e dos DLRs acima citadas.

 

  1. Sobre a este ponto, e recorrendo-se novamente às palavras constantes da decisão arbitral n.º 792/2022-T atrás referida, “haverá que recorrer ao critério de imputação previsto no artigo 26.º, n.º 2, da Lei das Finanças Regionais, que fixa uma repartição do imposto a suportar pelo sujeito passivo em cada circunscrição com base na proporção do volume de negócios apurado por referência à actividade efectivamente desenvolvida em cada região” pelo que “[s]ignifica isto que no cálculo do quantum devido a título de derrama estadual pela Requerente não deverá ser tida em consideração a proporção do lucro tributável imputável aos estabelecimentos estáveis sitos na RAA e na RAM, que se encontra sujeito às derramas regionais especificamente previstas em cada uma daquelas circunscrições”.

 

  1. Por conseguinte, conclui-se que são ilegais, por erro sobre os pressupostos de Facto e de Direito, decorrente de uma errónea interpretação e aplicação do enunciado nos artigos constantes da LFRA, do Código do IRC e dos DLRs acima identificados e citados, as liquidações de IRC, referentes aos exercícios de 2021 e 2022, emitidas pela Requerida impugnadas pela Requerente, bem como, em consequência, a decisão final de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra as mesmas, devendo tais actos ser anulados, na parte referente à derrama estadual ilegalmente apurada e indevidamente cobrada à Requerente.

 

  1. Em virtude de a Requerente obter já o efeito útil pretendido com o seu pedido de pronúncia arbitral, consubstanciado na declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos actos de liquidação de IRC acima identificados e da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra os mesmos, fica prejudicado o conhecimento e apreciação dos demais vícios invocados pela Requerente, seja no que tange à desconformidade daquelas liquidações com as normas (e.g., artigos 13.º, 103.º, 104.º, 227.º) consagradas na CRP, seja no que respeita à eventual violação do artigo 49.º, do TFUE, por a sua apreciação representar a prática de um acto inútil no processo, proibido nos termos e com os fundamentos anteriormente enunciados.

 

  1. Em face do exposto, julga-se procedente o pedido formulado pela Requerente.

 

Do reembolso do imposto liquidado e pago indevidamente e dos juros indemnizatórios

 

  1. Em face desta decisão e em face dos pedidos formulados pela Requerente, há que restabelecer a situação que existiria se a ilegalidade em causa não tivesse sido praticada, em conformidade com os artigos 24.º, n.º 1, alínea b), ambos do RJAT, e artigo 100.º, da LGT.

 

  1. Esse restabelecimento da situação que existiria caso a ilegalidade não tivesse sido praticada implica, nos presentes autos, a condenação da Requerida de reembolsar a Requerente do montante de imposto indevidamente liquidado e pago, sendo que o valor exacto desse reembolso dependerá de actos materiais de execução desta decisão arbitral anulatória a praticar pela Requerida, bem como o pagamento de juros indemnizatórios que se mostrarem devidos.

 

  1. O direito a tais juros encontra-se regulado no artigo 43.º, n.º 1, da LGT, que, ao que importa, estabelece que “[s]ão devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”.

 

  1. Ora, resultando provado que os actos de liquidação contestados enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de Facto e de Direito, e considerando-se que tal erro é imputável aos serviços, é devido pela Requerida o pagamento de juros indemnizatórios, contados sobre o valor do imposto indevidamente pago, desde a data do pagamento indevido, à taxa legal supletiva e até à data da emissão da correspondente nota de crédito, nos termos conjugados dos artigos 43.º, n.º 1, e 100.º, ambos da LGT, artigo 61.º, do CPPT, e artigo 24.º, n.º 5, do RJAT.

 

DECISÃO

 

Termos em que, com os fundamentos de facto e de direito que supra ficaram expostos, decide o Tribunal Arbitral Colectivo:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente e, em consequência, declarar a ilegalidade dos actos de liquidação de IRC, referentes aos períodos de tributação de 2021 e de 2022, na parte respeitante ao apuramento da derrama estadual, e, bem assim, da ilegalidade da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa;
  2. Condenar a Requerida a, em conformidade com o disposto no artigo 24.º, n.º 1, do RJAT, a praticar os actos consequentes à condenação do pedido anterior;
  3. Condenar a Requerida ao pagamento dos juros indemnizatórios; e
  4. Condenar a Requerida no pagamento das custas do processo.

 

VALOR DO PROCESSO

 

Atendendo ao disposto no artigo 97.º-A do CPPT, aplicável 2 artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 3.970.078,32 (três milhões, novecentos e setenta mil, setenta e oito euros e trinta e dois cêntimos).

 

 

 

 

 

 

CUSTAS

 

Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 50.184,00, a pagar pela Requerida, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 7 de Maio de 2025

 

Os árbitros,

 

 

Carla Castelo Trindade

(Árbitra Presidente e Relatora)

 

 

Cristina Coisinha

(Árbitra Adjunto)

 

 

Magda Feliciano

(Árbitra Adjunto)