Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 731/2024-T
Data da decisão: 2025-04-15  IRC  
Valor do pedido: € 30.779,28
Tema: IRC – Falta de entrega da declaração Modelo 22
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Sumário

 

I. Nos termos do disposto no artigo 90.º, n.º 1, alínea b) do CIRC, na falta de apresentação tempestiva da Declaração Modelo 22 de IRC, a liquidação é efetuada pela AT nos termos aí previstos.

II – Nos termos do disposto no artigo 75.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), da LGT, compete ao contribuinte cumprir os deveres de esclarecimento da sua situação tributária, fornecendo à AT os elementos solicitados, sob pena de a presunção de verdade e boa-fé das suas declarações deixar de se verificar.

 

Decisão Arbitral

 

1. Relatório

           

         A... UNIPESSOAL LDA., NIF..., com sede na Rua ..., n.º...– ...-... Algés, doravante, abreviadamente designada por «Requerente», veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), pretendendo que seja apreciada a legalidade da liquidação oficiosa de IRC, relativo ao exercício de 2020, com o n.º 2023..., datado de 12 de Janeiro de 2023, do qual resultou a obrigação de pagamento pela contribuinte do valor de € 30.779,28, bem como do despacho de indeferimento, notificado à Requerente a 4/5/2024 pelo Diretor Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa, que indeferiu a Reclamação Graciosa apresentada contra o referido ato de liquidação oficiosa, pedindo que esses atos sejam anulados e substituídos pela declaração apresentada pela Contribuinte, com o lucro fiscal líquido de € 1.224,10 e não os € 30.779,28 liquidados pela AT. 

A Requerente invoca, em abono da sua pretensão:

  1. A errónea quantificação do ato tributário, ao abrigo do artigo 99.º, alínea a) do CPPT;
  2. A violação do direito da participação do contribuinte nos atos tributários que lhe dizem respeito, expresso no artigo 60.º da LGT;
  3. A ausência de fundamentação legalmente exigida do ato de liquidação, ao abrigo do disposto nos artigos 99.º, al. c) do CPPT, 77.º da LGT e 268.º, n.º 3 da CRP.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT”).

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 06-06-2024.

 

A signatária, designada como Árbitra pelo Conselho Deontológico do CAAD, aceitou a designação no prazo aplicável. Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 25-07-2024, nada tendo sido oposto por estas.

 

A AT apresentou Resposta em 27.09.2024, em que sustentou a manutenção dos atos impugnados, considerando que a argumentação da Requerente, quer de facto, quer de direito, não é adequada a sustentar as suas pretensões e que, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova consagradas no artigo 74.º da LGT, caberia à Requerente fazer prova de que houve erro ou excesso manifesto na matéria coletável quantificada pela AT, o que não aconteceu.

 

A reunião prevista no artigo 18.º do RJAT realizou-se no dia 28.03.2025 e as Partes apresentaram as suas alegações a 03.04.2025.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

 

O processo não enferma de nulidades.

 

            2. Matéria de facto

 

2.1 Factos provados

 

  1. A contribuinte dedica-se à venda a retalho de material óptico (CAE 47782), através de uma loja aberta ao público.

 

  1. Em termos fiscais, está enquadrada no regime geral de IRC, com contabilidade organizada, e, para efeitos de IVA, está enquadrada no regime normal de periodicidade trimestral.

 

  1. No ano de 2020, a sua atividade foi fortemente afetada pela pandemia do Covid_19, tendo a sua loja sido forçada a encerrar por longos períodos de tempo.

 

  1. Em consequência, a Requerente não procedeu à entrega da declaração de rendimentos modelo (DM22), cujo termo do prazo de entrega ocorreu em 31-05-2021.

 

  1. Por aviso emitido no dia 16-11-2021, a Requerente foi notificada, via CTT, para, num prazo   de 15 dias, apresentar a declaração de rendimentos em falta.

 

  1. No mesmo aviso, foi informada de que, caso não entregasse a declaração em falta, seria sancionada com uma contraordenação, nos termos do Regime Geral das Infrações Tributária
  2. (RGIT), e seria também emitida uma declaração oficiosa, nos termos do artigo 90.º, n.º 1, alínea b), do CIRC.

 

  1. Em 30-11-2021, uma vez que a Requerente não tinha, entretanto, dado cumprimento àquela notificação, a AT procedeu à recolha oficiosa da declaração de rendimentos, apurando matéria coletável no valor de € 144.305,88, em conformidade com o previsto no artigo 90.º, n.º 1, al. b), do CIRC.

 

  1. Em consequência, foi emitida, em 12-01-2023, a liquidação oficiosa de IRC n.º 2023..., da qual resultou o montante total a pagar de € 30.779,28.

 

  1. A Requerente não efetuou o pagamento dentro do prazo estipulado para o efeito, o que provocou a instauração, no dia 19-04-2023, do processo de execução fiscal n.º ...2023... .

 

  1. No dia 28-06-2023, a Requerente submeteu a declaração de rendimentos de IRC relativa ao exercício de 2020, na qual declarou prejuízo fiscal no montante de € 11.526,01 e apurou imposto a pagar de € 124,13.

 

  1. Por outro lado, a Requerente apresentou, em 04-07-2023, reclamação graciosa, na qual argumentou que, por ter passado por algumas dificuldades no acesso à plataforma do Banco e por, consequentemente, ter tido dificuldades na organização dos documentos para a contabilidade, se atrasou na preparação e submissão das declarações fiscais anuais do ano de 2020, tendo ainda informado que, entretanto, havia apurado um resultado líquido contabilístico (negativo) em 2020 de € 12.387,34.

 

  1. A Requerente justificou a matéria coletável por si apurada com base nos seguintes documentos:

- Faturas de compras intracomunitárias;

- Cópias de documentos relativos à conta 61 – CEVC;

- Cópias de documentos relativos à conta 62 – FSE;

 

  1. No sentido de comprovar os valores declarados com trabalhos especializados, serviços bancários, EDP, gasóleo, refeições, transportes, alojamento, arrendamento, comunicação, Contencioso e notariado, limpeza higiene e conforto, juntou ainda os seguintes documentos:
  • Cópias de documentos relativos à conta 63 – Gastos com o pessoal;
  • Cópias de documentos relativos à conta 64 – Depreciações e amortizações;
  • Cópias de documentos relativos à conta 68 – Outros gastos;
  • Cópias de documentos relativos à conta 69 – Gastos de financiamento;
  • Cópias de documentos relativos à conta 71 – Vendas;
  • Conta 81 – resultado líquido do período – saldo final constante do 2º balancete;
  • Balancetes analíticos antes e após fecho de contas;
  • Extrato de contas das contas 3112 (compras no mercado intracomunitário) e 69151 (Juros de mora).

 

  1. Tendo analisado os referidos documentos, os serviços da AT concluíram o seguinte:

“Quanto ao valor do resultado líquido negativo do exercício, verifica-se que a reclamante declarou o montante de € 11.526,01, na declaração de rendimentos modelo 22 submetida em 28-06-2023, mas este valor não corresponde ao valor contabilístico negativo apurado no balancete, no montante de €12.387,34, conforme saldo da "Conta 818 -Resultado Líquido" constante do "Balancete".

- Na modelo 22 de IRC, a reclamante inscreveu os seguintes valores no Q07:

Campo 728: Multas, coimas e demais encargos - € 240,68

Campo 733: Encargos com combustíveis - € 620,65

No entanto, verifica-se que não foi apresentada qualquer justificação para as despesas não devidamente documentadas, uma vez que apenas foram apresentadas "cópias de documentos das sub-rubricas com valores mais significativos no sentido de comprovar os valores declarados" sem qualquer referência à eventual relação com esta rubrica.

Em relação ao valor de tributações autónomas inscrito na modelo 22, no montante de € 124,13, verifica-se que não foram apresentados mapas ou boletins itinerários para sua justificação. Convém acrescentar que não foram apresentados, nomeadamente, os extratos de conta para validação dos valores declarados na modelo 22 de IRC do ano em referência, pois apresentou os documentos constantes da lista acima referenciada, mas não os respetivos extratos nem sequer o mapa das amortizações.

Assim, não sendo coincidente o valor do resultado contabilístico apurado e declarado na modelo 22 com os valores apurados na sua contabilidade, também no que se refere aos movimentos das outras contas, que fazem parte do cômputo no apuramento do resultado líquido do exercício, e que se mostram essenciais para que se verifique se o resultado tributável apurado traduz, efetivamente, a realidade contabilístico-fiscal da reclamante, com referência ao exercício aqui em análise, não foi possível proceder a essa verificação, dado a insuficiência dos documentos apresentados.

Ora no caso aqui em concreto, após a conciliação e comparação de toda a informação constante dos documentos apresentados nesta sede, e a que a AT dispõe, também esta comunicada pela reclamante em cumprimento das suas obrigações declarativas, verifica-se que a AT agiu em conformidade com as competências e prerrogativas que lhe estão atribuídas.

Face ao exposto, verifica-se que os documentos apresentados não se mostraram suficientes para que se possa verificar e validar os valores considerados na declaração de rendimentos modelo 22, que pretende ver validada e não sendo a informação que deles consta suficiente, cabendo-lhe o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos que alega, nos termos do n.º 1 do artigo 74.° da LGT, pelo que se afigura ser de manter o valor de matéria coletável, para o período de tributação de 2020, no montante de €144.305,88, conforme valores propostos no projeto de decisão.»

 

  1. A Requerente foi notificada, via CTT, para, no prazo de 15 dias, exercer o direito de audição, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT, tendo a notificação sido entregue na sua caixa postal eletrónica em 14-03-2024 e considerando-se notificada em 01-04-2024.

 

  1. A Requerente não exerceu o seu direito de audição sobre o projeto de decisão de indeferimento da RG, que se convolou em definitiva.

 

  1. No dia 04-06-2024, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral.

 

2.2 Factos não provados e fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada (cf. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

 

 Os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis das questões objeto do litígio (cf. o artigo 596.º, n.º 1, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

Assim, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, os quais foram dados como provados com base nos documentos juntos pela Requerente, no processo administrativo e na prova testemunhal produzida em audiência.

 

3. Matéria de direito

 

A Requerente é um sujeito passivo de IRC, incidindo este imposto sobre o seu lucro, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do CIRC. Encontrando-se a Requerente enquadrada no regime geral de apuramento do lucro tributável, este é determinado nos termos do artigo 17.º do CIRC, competindo à Requerente a entrega da Declaração Anual Modelo 22, nos termos e prazos previstos no artigo 120.º do CIRC.

 

Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 75.º da LGT, presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos.  Contudo, esclarece o número 2 da mesma disposição legal que a presunção referida no número anterior não se verifica, nomeadamente, quando:

a) As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo;

b) O contribuinte não cumprir os deveres que lhe couberem de esclarecimento da sua situação tributária, salvo quando, nos termos da presente lei, for legítima a recusa da prestação de informações.

 

Assim, na falta de entrega dessa declaração, dispõe a alínea b) do n.º 1 do artigo 90.º que a liquidação é efetuada até 30 de novembro do ano seguinte àquele a que respeita ou, no caso previsto no n.º 2 do referido artigo, até ao fim do 6.º mês seguinte ao do termo do prazo para apresentação da declaração aí mencionada e tem por base o maior dos seguintes montantes:

1) A matéria coletável determinada, com base nos elementos de que a administração tributária e aduaneira disponha, de acordo com as regras do regime simplificado, com aplicação do coeficiente de 0,75;

2) A totalidade da matéria coletável do período de tributação mais próximo que se encontre determinada;

3) O valor anual da retribuição mínima mensal.

 

         No presente caso, a AT apurou a matéria coletável nos termos do previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 90.º do Código do IRC (CIRC), de acordo com as regras do regime simplificado, aplicando o coeficiente de 0,75 ao montante da base tributável das faturas emitidas e declaradas no sistema “E-Fatura” em 2020, menos o total da base tributável das Notas de Crédito emitidas e declaradas igualmente no sistema “E- Fatura” para 2020, resultando o apuramento da matéria coletável em 2020 de €144.305,88, de acordo com a subalínea 1) da alínea b) do n.º 1 do artigo 90.º do CIRC.

 

         Com efeito, embora vigore no nosso ordenamento jurídico-tributário o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, tal como supra referido a propósito do artigo 75.º da LGT, privilegiando-se a declaração e os elementos apresentados pelo sujeito passivo, o CIRC contém, também, mecanismos destinados a suprir as situações em que o próprio sujeito passivo não colabora com a administração tributária em termos que lhe permitam efetuar a liquidação das declarações apresentadas. É nesse contexto que o artigo 90.º do CIRC determina a aplicação, por parte da AT, de métodos indiretos de apuramento da matéria coletável, bem como a emissão de uma liquidação oficiosa.

 

         Por outro lado, a apresentação fora de prazo da Declaração Modelo 22, que veio a ocorrer depois dos prazos previstos para o efeito e depois de emitida a liquidação oficiosa, tem como consequência a preclusão da presunção de veracidade prevista no artigo 75.º da LGT, passando a recair sobre o contribuinte a prova dos factos nela inscritos. Contudo, a AT apresenta uma extensa lista de motivos pelos quais entende que a Requerente não fez prova dos elementos constantes da Declaração Modelo 22 apresentada no dia 28 de junho de 2023, nomeadamente:

- no que concerne ao valor do resultado líquido negativo do exercício, no montante de € 11.526,01, considerado na declaração modelo 22 (DM22) submetida em 2023 pela Requerente, verificou-se que este não corresponde ao valor contabilístico negativo apurado no balancete, no montante de € 12.387,34, conforme saldo da “Conta 818- Resultado Líquido” constante do “Balancete”;

- na DM22 de IRC, a Requerente indicou os seguintes valores no Q07:

• Campo 728: Multas, coimas e demais encargos – € 240,68;

• Campo 733: Encargos com combustíveis – € 620,65.

- A Requerente não apresentou qualquer justificação para as despesas não devidamente documentadas; a Requerente apenas apresentou cópias de documentos das sub-rubricas com valores mais significativos no sentido de comprovar os valores declarados, sem qualquer referência à eventual relação com esta rubrica.

- Em relação ao valor de tributações autónomas inscrito na DM22, no montante de € 124,13, não foram juntos mapas ou boletins itinerários para sua justificação.

- A Requerente apresentou os documentos constantes da lista acima referenciada, mas

não procedeu à junção dos respetivos extratos de conta.

- A Requerente apenas juntou extratos de conta corrente desde a conta 3112 – compras de mercadorias mercado intracomunitário - até à conta 69151- Juros de mora, ou seja, não foram apresentados os extratos de conta corrente das contas de rendimentos, nem das contas 12 à conta 3111 - compras de mercadorias mercado nacional, documentação contabilística essencial para validar o alegado montante da matéria tributável.

- A Requerente não apresenta quaisquer documentos justificativos das operações efetuadas no exercício em apreço, nomeadamente das aquisições de bens e serviços necessários ao desenvolvimento da sua atividade comercial.

- A Requerente dedica-se ao comércio a retalho de material ótico (CAE 47782), tendo uma loja aberta ao público, tal como a própria assume no PPA. Contudo, a Requerente não apresenta elementos contabilísticos respeitantes ao inventário inicial e final de mercadorias, referente aos bens comercializados, não constando tais elementos nem dos balancetes, nem dos extratos de conta corrente.

- A conta 321 – Mercadorias – existências apresenta um saldo nulo.  Ou seja, não é possível validar uma das rubricas de gastos mais pertinentes para efeitos de apuramento do resultado líquido e consequentemente do resultado tributável, o custo das mercadorias vendidas, pois faltam elementos essenciais, mormente os respetivos inventários de mercadorias, além dos extratos de conta corrente da conta de 3111 - compras de mercadorias mercado nacional.

- da documentação apresentada pela Requerente resulta que uma das componentes dos gastos relevantes para efeitos do apuramento do resultado líquido refere-se a amortizações, no montante de 80.000,00, relativas a ativos intangíveis – Goodwiill mensurados pelo montante de 800.000,00. Ora, para além de não ter apresentado o mapa Modelo 32 - "Mapa de Depreciações e Amortizações", a Requerente não juntou aos autos elementos capazes de justificar a dedutibilidade fiscal daquelas amortizações, tendo, designadamente em conta que, fiscalmente, as amortizações reconhecidas na contabilidade referentes a ativos intangíveis estão dependentes da prova dos requisitos previstos no artigo 29.º do CIRC, conjugado com o artigo 16.º do Dec. Regulamentar n.º 25/2009.

 

         Realizada a audiência prevista no artigo 18.º do RJAT, nomeadamente para produção de prova testemunhal, não houve qualquer referência aos elementos supra listados, nem às insuficiências da contabilidade em geral. Com efeito, as inquirições destinaram-se, essencialmente, a provar as razões pelas quais a Declaração Modelo 22 do exercício de 2020 tinha sido apresentada fora de prazo, mas sem alusão relevante aos elementos em falta na contabilidade ou às insuficiências apontadas pela AT. Perante este cenário, outra não pode ser a consequência a extrair da matéria de facto provada senão a de que os factos que cabia à Requerente provar – em suma, aqueles que resultam da sua própria Declaração Modelo 22, tardiamente apresentada, designadamente os que lhe permitiram chegar à conclusão de um valor de prejuízo fiscal de € 11.526,01 – não lograram ser provados, com a consequência inevitável de que a liquidação oficiosa promovida pela AT nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 90.º do CIRC é a que deve relevar para efeitos de apuramento do IRC a pagar no exercício em causa.

 

         Quanto à alegada violação do direito de participação previsto no artigo 60.º da LGT, por entender a Requerente que a AT dispunha de todos os elementos necessários ao apuramento do IRC através de elementos reais e não ficcionados, não pode o mesmo proceder. Conforme refere a AT na sua Resposta, o próprio n.º 2 do artigo 60.º da LGT prevê que, na respetiva alínea b), que a audição é dispensada quando a «liquidação se efectuar oficiosamente, com base em valores objetivos previstos na lei, desde que o contribuinte tenha sido notificado para apresentação da declaração em falta, sem que o tenha feito.» Aliás, no presente caso, a Requerente foi notificada, no dia 1 de abril de 2024 para, querendo, exercer o direito de audição previsto no artigo 60.º, n.º 1, alínea b), tendo optado por não exercer tal direito.

 

         Por fim, deve também improceder o argumento de que a liquidação efetuada pela AT não está bem fundamentada, pelas razões que já se apontaram supra: (i) a AT limitou-se a aplicar o regime previsto no Código do IRC para as situações em que o contribuinte não apresenta a Declaração Modelo 22 dentro dos prazos legalmente aplicáveis, designadamente o decorrente da alínea b) do n.º 1 do artigo 90.º do CIRC; (ii) a Requerente não logrou efetuar prova dos factos constantes da Declaração Modelo 22 que veio a entregar já depois de terminado o prazo para o efeito na medida em que existem diversas insuficiências na sua contabilidade que não permitem estabelecer a veracidade dos elementos declarados, nos termos do disposto no artigo 75.º, n.º 2, alínea a) da LGT. Salienta-se, ainda, para este efeito, o disposto no artigo 31.º, n.º 2, da LGT, nos termos do qual “[s]ão obrigações acessórias do sujeito passivo, designadamente, as que visam possibilitar o apuramento da obrigação de imposto, nomeadamente a apresentação de declarações, a exibição de documentos fiscalmente relevantes, incluindo a contabilidade ou escrita, e a prestação de informações.”, bem como o disposto no artigo 123.º, n.º 2 e 3, do CIRC, nos termos do qual todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e suscetíveis de serem apresentados sempre que necessário.

 

4. Decisão

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar improcedente o pedido mantendo-se na ordem jurídica o ato impugnado e absolvendo-se, em conformidade, a Requerida do pedido.

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º -A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 30.779,28, indicado pela Requerente sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

6 . Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 1.836,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente.

 

 

Lisboa, 15 de abril de 2025,

 

A Árbitra,

 

 

 

(Raquel Franco)