Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 921/2024-T
Data da decisão: 2025-04-02  IRC  
Valor do pedido: € 122.977,66
Tema: IRC. Benefícios fiscais. RFAI e CFEI II
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SUMÁRIO:

 

 

  1. Há que determinar, do conjunto de investimentos em ativos realizados pela Requerente, o que é relevante para efeitos de RFAI, dentro da referida tipologia: aumento da capacidade de um estabelecimento já existente. O que passa necessariamente pela avaliação da existência de aumento da capacidade instalada e pela criação de postos de trabalho. Acresce não se poder tratar de meros investimentos de substituição, da aquisição de bens usados ou de meras despesas sobre ativos já anteriormente adquiridos.
  2. No que concerne ao CFEI II, não são relevantes meras despesas sobre ativos já anteriormente adquiridos e é, obviamente, fundamental a prova da afetação dos ativos à atividade do sujeito passivo.

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

Os árbitros Professor Doutor Victor Calvete (presidente), Dr. Nuno Pombo e Dra. Maria Antónia Torres (vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formarem este Tribunal Arbitral Coletivo no processo identificado em epígrafe, acordam no seguinte:

 

 

 

 

I – Relatório

 

A..., S.A., com número de pessoa coletiva ...  e registada sob o mesmo número na Conservatória do Registo Comercial, com sede na Rua ..., ..., ...-... ... ..., vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciação e declaração de ilegalidade, e consequente anulação, das liquidações adicionais de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) que se seguem:

 

 

- Liquidação n.º 2024..., de 08/04/2024, relativa ao exercício de 2018, que gerou correções no valor de 29.283,01 Euros (Regime Fiscal de Apoio ao Investimento – “RFAI”) e correções meramente aritméticas em sede de dedução por lucros retidos e reinvestidos (“DLRR”) e respetiva liquidação de acerto de contas n.º 2024...;

- Liquidação n.º 2024..., de 11/04/2024, relativa ao exercício de 2019, que gerou correções no valor de 44.034,06 Euros, correspondentes a 36.316,31 Euros (RFAI) + 7.717,75 Euros (postos de trabalho), liquidação de juros n.º 2024 ... e respetiva liquidação de acerto de contas n.º 2024..., da qual resulta um valor a pagar de 77.430,32 Euros;

- Liquidação n.º 2024..., de 25/06/2024, relativa ao exercício de 2020, no valor de 49.660,59 Euros, correspondentes a 26.413,65 Euros (RFAI) + 16.253,74 Euros (Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento – “CFEI II”) + 6.993,20 Euros (postos de trabalho) e respetiva liquidação de acerto de contas n.º 2024..., da qual resulta um valor a pagar de 104,89 Euros;

 

A Requerente fundamenta a sua petição conforme segue.

A Requerente está de acordo com as correções efetuadas em sede do benefício à criação líquida de emprego, nos termos do disposto no artigo 19.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (“EBF”), aceitando a exclusão do “subsídio de alimentação” para este efeito, no montante de 7.717,75 Euros, relativos ao exercício de 2019, e no montante de 6.993,20 Euros, relativos ao exercício de 2020.

 

Assim, a presente ação centrar-se-á na verificação e aplicação dos benefícios de RFAI, DLRR e CFEI II.

 

  1. Da tempestividade, cumulatividade de pedidos e caducidade parcial das liquidações

 

Após defender a tempestividade da petição inicial e a possibilidade de cumulação dos pedidos, o que não foi contestado pela Requerida, a Requerente veio defender a caducidade parcial das liquidações sub judice.

Relativamente às correções efetuadas no período de 2018 e 2019, a Requerente declarou que os investimentos efetuados com benefícios de RFAI, tiveram como objetivo o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, no período compreendido entre 2016 e 2018 (cuja dedução à coleta foi efetuada no ano de 2019) e entre 2019 e 2022, respetivamente. Continua arguindo que “a suspensão da caducidade prevista na alínea c) do n.º 2 do art. 46.º da LGT deve entender-se aplicável ao controlo das condições apostas” referindo que, fora desta situação, deve permanecer a regra geral dos 4 anos, nos termos do art.º 45.º da Lei Geral Tributária (“LGT”), defendendo que a regra especial, no caso dos benefícios fiscais deve ser interpretada de forma restritiva.

 

Qualquer solução que estenda o efeito suspensivo da alínea c) do número 2 do artigo 46.º da LGT além do controlo do cumprimento da condição aí prevista é, entende a Requerente, claramente desproporcional e, por isso, inconstitucional.

 

Por seu lado, a Requerida, e conforme o plasmado no Relatório de Inspeção Tributária (“RIT”), entende que, segundo o disposto na alínea c) do n.º 2 do art.º 46.º da LGT, o prazo de caducidade suspende-se “em caso de benefícios fiscais de natureza condicionada, desde a apresentação da declaração até ao termo do prazo legal do cumprimento da condição”.

 

Continua referindo que a alínea c) do n.º 4 do art.º 22.º do Código Fiscal do Investimento (“CFI”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, impõe como requisito que os sujeitos passivos: “c) Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis nºs 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras prevista no artigo 31.º-B do Código do IRC”.

 

E que, por outro lado, a alínea f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, determina que os sujeitos passivos são obrigados a efetuar “investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c)”, sendo que esta alínea remete para “um período mínimo de três anos” (no caso das PME’s, em que se enquadra o sujeito passivo).

 

Assim, a Requerida entende que, no caso de um investimento concretizado no período de tributação de 2016 a 2018, o termo do prazo legal do cumprimento da condição (pessoal - 3 anos) terminou a 2021-12-31.

 

Tendo em conta que o RFAI se configura como um regime de “benefícios fiscais de natureza condicionada”, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 46.º da LGT, o prazo de caducidade da liquidação dos tributos encontra-se suspenso desde a apresentação da declaração do período de tributação de 2018 (2019-06-28) até ao termo do prazo legal do cumprimento da condição 2021-12-31, tendo decorrido 917 dias (2 anos, 6 meses e 2 dias), durante os quais o prazo de caducidade se encontrou suspenso.

 

A data-limite decorrente do prazo normal da caducidade previsto no n.º 1 do art.º 45.º da LGT permitia à AT o direito de liquidar os tributos com a liquidação notificada no prazo de 4 anos, ou seja, em relação ao IRC do ano de 2018, até 31 de dezembro de 2022. Acrescidos os 917 dias (2 anos, 6 meses e 2 dias) da suspensão da caducidade fica a AT legitimada a proceder à notificação da liquidação do IRC relativo ao período de 2018 até 5 de julho de 2025.

 

Assim sendo, considerando a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação nos termos referidos, entende a Requerida que é manifesto que, à data em que a Requerente foi notificada da liquidação de IRC do exercício de 2018, não se havia completado o prazo de caducidade de quatro anos previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT.

 

Quanto às correções efetuadas no ano de 2019, a Requerida, no mesmo sentido, conclui que considerando a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação nos termos referidos, é manifesto que, à data em que a Requerente foi notificada da liquidação de IRC, do exercício de 2019, não se havia completado o prazo de caducidade de quatro anos previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT, conjugado com o art.º 46.º, nº 2, al. c) do mesmo diploma legal.

 

  1. DO RFAI

 

Entende a Requerente que as liquidações impugnadas erram, de facto e de Direito, em especial, na desconsideração de verbas admitidas como investimento elegível no âmbito do RFAI:

  • na liquidação de 2018, no montante total de 117.132,00 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 29.283,01 Euros), relativas à aquisição de:
  • uma Máquina de Corte Twin Electra 550 400V no valor inscrito de 34.500,00 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 8.625,00 Euros);
  • equipamento informático (computadores portáteis e impressoras), inscrito no valor de 13.499,00 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 3.374,75 Euros);
  • matrizes, desenvolvimento de perfis, inscritos pelo valor de 65.208,01 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 16.302,01 Euros);
  • porta seccionada, inscrita no valor de 1.333,00 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 333,25 Euros);
  • licença Schucal, inscrita no valor de 2.592,00 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 648,00 Euros);
  • na liquidação de 2019, na desconsideração da qualidade de investimento inicial, inscrito no valor de 145.265,22 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 36.316,31 Euros) (a que acresce o saldo não transitado de 2018 de 29.283,01 Euros, num total de correções em 2019 de 65.599,32 Euros) correspondentes às seguintes verbas:
  • matrizes, desenvolvimento de perfis, inscritos pelo valor de 124.759,30 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 31.189,83 Euros);
  • alteração e retificação de matrizes, inscritos pelo valor de 11.677,00 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 2.919,25 Euros);
  • portadas e deck inscritos pelo valor de 8.828,92 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 2.207,23 Euros).
  • na liquidação de 2020, na desconsideração da qualidade de investimento inicial, inscrito no valor de 133.154,59 Euros, corrigido em 105.654,59 Euros, correspondentes às seguintes verbas:
  • matrizes, desenvolvimento de perfis, inscritos pelo valor de 105.167,09 Euros (correspondente a um crédito de RFAI 26.291,77 Euros);
  • fornecimento de ar-condicionado, no valor de 487,50 Euros (correspondente a um crédito de RFAI de 121,88 Euros).

 

Entende a Requerente que importa começar por clarificar a confusão feita pela Requerida quando entende que, para aplicação do presente benefício, é necessário verificar-se, além de um “aumento da capacidade de um estabelecimento existente” (conceito que cabe na determinação legal do que é um “investimento inicial”), um verdadeiro “novo investimento” inicial – diferente do realizado anteriormente.

 

A Requerida não se limita a analisar se cada um dos ativos adquiridos pela Requerente se encontrava em “estado novo” ou a aferir a sua correlação com o aumento da capacidade do estabelecimento, mas a entender, de forma singular, que cada um dos investimentos realizados pela Requerente não preenchem o próprio conceito de “investimento inicial” por não se enquadrarem, por si só, num novo investimento.

 

Ora, entende a Requerente, que a AT não pode acrescentar novos requisitos à previsão legal aplicável (alínea a) do § 49.º do artigo 2.º do Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, também conhecido por  Regulamento Geral de Isenção por Categoria,– “RGIC”), nem considerar o “investimento inicial” como um conceito indeterminado passível de diferentes interpretações, sob pena de violar o princípio da separação de poderes. E continua a Requerente, dizendo que este não é requisito previsto na lei, pelo que não se pode aceitar que seja acrescentado pela Requerida.

 

 

A Requerente entende que um investimento deve ser considerado “inicial”, para este efeito, se permitir o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente”. Não se exigindo, na definição deste conceito, que os concretos investimentos realizados sejam em “novos”, na acepção utilizada pela AT, bastando que se verifique o referido “aumento da capacidade de um estabelecimento existente”.

 

Nada impõe – nem poderia impor, segundo a Requerente, como facilmente se depreende – que se tenha de tratar de equipamentos funcionalmente diferentes dos já existentes nas instalações da Requerente anteriormente ao investimento realizado no âmbito de um determinado projeto.

 

Da correlação do investimento realizado com o “aumento da capacidade de um estabelecimento já existente

 

De acordo com o entendimento da Requerente, a Empresa pode provar o aumento da sua capacidade produtiva de bens e/ou serviços já produzidos nesse estabelecimento, demonstrando o cumprimento de um aumento mínimo de 20% da sua capacidade de produção instalada na situação pós-projeto, quando comparado com a dita capacidade de produção instalada em momento anterior ao investimento.

 

Esta evidência pode ser comprovada pelo aumento do Valor Bruto da Produção (VBP) ou de outro critério, desde que tecnicamente sustentável, como por exemplo, a utilização de uma unidade de medida que mais se adeque à sua produção (e.g. toneladas, litros, n.º de produtos) – em conformidade com a resposta à questão n.º 2 das “Questões Frequentes Domínio da Competitividade e Internacionalização” na secção “Inovação Produtiva”.

 

Em face do supramencionado, e impondo a lei, como requisito, que os bens adquiridos possibilitem ou permitam aumentar a capacidade produtiva da fábrica por via da sua natureza planeada e prospetiva, os investimentos levados a cabo no âmbito dos projetos de investimento em causa (2016 a 2018 e 2019 a 2021 (este último não se encontrando ainda concluído)), contribuem estrategicamente para o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente”, determinado por via da comparação entre a capacidade instalada nos anos pré-projeto (2015 e 2018, respetivamente) e a capacidade instalada nos anos pós-projeto (2019 e 2022  - neste caso, por mero exercício académico, visto o projeto não se encontrar ainda concluído).

 

Nesta sequência, a estratégia de investimento assumida pela Requerente, com a finalidade de atingir o fim subjacente à tipologia de investimento em apreço, resultou numa variação positiva do Valor Bruto de Produção (VBP) e do Valor Acrescentado Bruto (VAB), tal como entende ter demonstrado na petição inicial.

 

Conclui assim a Requerente que o investimento realizado contribuiu inequivocamente para o “aumento de capacidade de produção”.

 

Relativamente às correções efectuadas pela AT:

 

Da desconsideração da verba relativa à Máquina de Corte Twin Electra 550 400V

 

Entendeu a AT que este equipamento por – alegadamente – não ser novo – não poderia ser considerado como «investimento inicial», não colocando em causa o facto de o investimento em questão contribuir para o aumento de capacidade do estabelecimento.

 

Ora, entende a Requerente que este entendimento é ilegal por violação da norma extraída a partir da interpretação conforme do CFI ao disposto no n.º 6 do artigo 14.º do RGIC no qual se estabelece que “os ativos adquiridos devem ser novos, exceto no que se refere às PME e à aquisição de um estabelecimento”. E é nestes termos que deve ser interpretada a al. a) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI quando refere a aquisição de “ativos fixos tangíveis em estado novo”.

 

Por seu lado, a Requerida refere que há que esclarecer que o disposto no n.º 6 do artigo 14.º do RGIC se reporta à aquisição de um estabelecimento, por uma PME, pelo que o silogismo interpretativo que a Requerente pretende fazer não pode vingar.

 

Acrescenta a Requerida que a legislação nacional é inequívoca quanto à exigência dos bens em estado de novo, para efeitos da sua consideração como aplicações relevantes, o que não foi o caso da máquina em questão.

 

Da desconsideração do equipamento informático (computadores portáteis e impressoras)

 

Entendeu a Requerida que este investimento não pode ser considerado elegível para efeitos de RFAI por não se provar a sua relação com o aumento da capacidade produtiva da empresa, tratando-se, de facto, de uma aquisição isolada e de um investimento na aquisição de equipamentos de substituição.

 

Por seu lado, a Requerente entende que tal entendimento é ilegal. Trata-se da aquisição de um conjunto de equipamentos informáticos de suporte à atividade da empresa, decorrentes da expansão/ampliação da unidade fabril, sem os quais não é possível garantir a execução dos processos operacionais e administrativos inerentes à atividade produtiva da Requerente.

 

Entende a Requerente que o aumento da capacidade de produção exige que toda a estrutura da empresa acompanhe esse aumento, designadamente a logística, área administrativa, equipamentos informáticos e software, entre outros (neste sentido, decisão arbitral n.º 574/2020-T) – como é aqui o caso.

 

Relativamente ao argumento de que se trata de investimento em ativos de substituição, entende a Requerente que tal constatação carece de fundamentação, porque não foi abatido/alienado qualquer equipamento da mesma natureza, pelo que os ativos em questão vieram necessariamente satisfazer necessidades adicionais face aos equipamentos anteriormente existentes.

 

Da desconsideração das matrizes, desenvolvimento de perfis e da alteração e retificação de matrizes

 

Entendeu a AT que o investimento nestes equipamentos não pode ser enquadrado como investimento inicial por não ser distinto do já existente e que este investimento é necessário à realização da atividade de exploração corrente da sociedade, sendo utilizado nas máquinas pertencentes aos fornecedores de perfis.

 

Além disso, considera a AT que o investimento não pode ser considerado elegível para efeitos de RFAI, uma vez que não se localiza nem está a ser utilizado nas instalações da Requerente, não se encontrando, por isso, afeto à sua exploração, não contribuindo para o aumento da sua capacidade produtiva.

 

Alega ainda a AT que o investimento em causa não tem correlação direta com a criação de postos de trabalho.

 

Relativamente ao investimento realizado com a alteração e retificação de matrizes, defende a AT que se trata de uma mera alteração de um bem já existente, não consistindo na aquisição de um equipamento novo.

 

Ao contrário do defendido pela Requerida, a Requerente reitera que a criação das matrizes e o desenvolvimento de perfis constitui-se num processo que tem por efeito e resultado o “aumento da capacidade de um estabelecimento existente” que é o único requisito legal previsto e como tal tem de ser admitida no regime do RFAI.

 

Vale aqui, segundo entende a Requerente, a distinção traçada já entre o conceito de “investimento inicial” e o conceito de investimento no “aumento da capacidade de um estabelecimento existente” (que mais não é do que a concretização do que é um “investimento inicial”) previsto no regime conjugado dos parágrafos 41), 49) e 51) do artigo 2.º do RGIC e que determina, suficientemente, a invalidade desta correção.

 

Não se compreende um argumento, segundo a Requerente, no sentido de que aquisições da mesma série em anos consecutivos evidencia não se tratar de um investimento adicional, novo, distinto do já existente, mas antes de uma necessidade reiterada. O aumento da capacidade de produção da Requerente implica a necessidade de maior produção de perfis, inclusive da mesma série produzida anteriormente.

 

Salienta-se, uma vez mais, segundo a Requerente, que não resulta do RFAI qualquer limitação à aquisição de ativos da mesma natureza dos adquiridos em anos anteriores, nem se poderá admitir que a AT acrescente ao regime legal  requisitos que não estão nele taxativamente previstos.

 

Continua dizendo que a atividade da empresa não é exequível sem as matrizes e ferramentas com base nas quais são fabricados os perfis. Sem as matrizes, sustenta a Requerente, a empresa não conseguiria produzir perfis específicos, com os quais aumentou a sua capacidade produtiva (veja-se, neste sentido, a título de exemplo, as decisões arbitrais proferidas nos processos n.º 427/2020-T, n.º 726/2020-T e n.º 156/2022-T).

 

O facto das matrizes se encontrarem fora das instalações da empresa não coloca em causa, segundo a Requerente, a sua conexão com o aumento da sua capacidade produtiva (sem prejuízo de aumentar, de igual forma, a capacidade de produção dos seus fornecedores).  Não há qualquer suporte legal que autorize o entendimento de que a elegibilidade depende de todo o processo de produção ser diretamente assegurado pela empresa que faz o investimento, como bem se refere na decisão arbitral relativa ao processo n.º 726/2020-T.  Os ativos estão afetos à exploração da empresa, desde que sejam utilizados para fabricar os seus produtos, independentemente de quem utiliza os equipamentos em causa (neste sentido, decisão arbitral n.º 726/2020-T).

 

O n.º 49 do artigo 2.º do RGIC e o artigo 2.º, n.º 2, alínea d), da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, apenas exigem que os investimentos estejam "relacionados" com aumento da capacidade de um estabelecimento existente. E, entende a Requerente, é inegável que isto acontece no caso em apreço.

 

Face ao exposto, continua, dúvidas não restarão de que as matrizes aqui em causa são adquiridas pela Requerente, são sua propriedade e são apenas usadas no seu processo de produção, não sendo, contudo, economicamente rentável ou eficiente adquirir as referidas máquinas extrusoras, dado o seu elevado valor e a escassa utilização que a Requerente daria às mesmas (estimando-se uma utilização, em termos de rentabilidade, inferior a 10% da sua capacidade). Porém, a titularidade das matrizes pertence sempre à Requerente e não têm outra utilização que não seja no âmbito do processo de produção dos bens que comercializa.

 

Quanto à criação de postos de trabalho, a Requerente entende que o argumento é inválido quando se afere que, na globalidade, há lugar à criação de postos de trabalho (e, portanto, contrário à conclusão expressa no próprio RIT (secção V.1.2.1.1.).

 

Ainda assim, salienta que o investimento em matrizes, contribuindo para o aumento de capacidade de produção do estabelecimento, contribui, mesmo que indiretamente, para a criação de postos de trabalho.

 

A Requerida entende que, apesar de constar no RIT que a Requerente cumpre com a condição da criação de postos de trabalho, quando se efetua a comparação média dos trabalhadores efetivos do ano anterior ao início do projeto, com o ano do fim do projeto, certo é que, neste caso das matrizes, não existe o cumprimento da condição ínsita na alínea f) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, porquanto, não se verifica o nexo de causalidade entre a aquisição das matrizes e a criação dos postos de trabalho, não estando estes bens a ser utilizados pelos seus trabalhadores.

 

Continua dizendo que o sujeito passivo não demonstrou, neste caso em específico, “o nexo de causalidade entre o ativo, o projeto de investimento e a criação dos postos de trabalho”, que tal despesa tivesse constituído um investimento inicial e demonstrado o seu contributo para o aumento da capacidade produtiva relacionando com a criação dos postos de trabalho, por não ser possível, visto que as matrizes não são utilizadas na exploração da atividade da Requerente.

 

Desconsideração da porta seccionada

 

A Requerida entende, mais uma vez, que este investimento não cabe na qualidade de «investimento inicial», por se tratar da substituição de portão já existente, não cabendo, por isso, no referido conceito, não existindo uma ligação direta com o aumento da capacidade produtiva da empresa.

 

A Requerente, por sua vez, reafirma os ganhos de produtividade implicados na instalação da porta seccionada que a constituíram num efetivo “aumento da capacidade de um estabelecimento existente”. Ao concretizar este investimento, a Requerente eliminou a complexidade e morosidade do procedimento de abertura e fecho da dita porta, verificada anteriormente, e introduziu eficiência e automação no seu processo de produção.

 

Desconsideração da licença Schucal

 

A Requerida começa por referir que, de acordo com a alínea b) do n.º 2 do artigo 22.º do CFI, os ativos intangíveis são constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

 

Ora, o que está em causa neste caso, entende, não é uma transferência de tecnologia mas apenas o pagamento trimestral de uma licença para a utilização de um programa informático para efetuar a orçamentação e modelação.

 

A Requerente, por sua vez, reitera que é elegível para o benefício fiscal aqui previsto todo o investimento efetuado no «aumento da capacidade de um estabelecimento existente», e, por outro lado, o reconhecido potencial transformador da utilização das tecnologias de informação nas organizações como a Requerente com reflexos em toda a sua produção.

 

Desconsideração das portadas e deck

 

A Requerida começa por referir que, questionada a Requerente sobre a finalidade da aquisição do bem e a sua alocação, em sede inspetiva, esta declarou que: “Trata-se de material utilizado no espaço designado para demonstração dos produtos da A... aos seus clientes”.

 

Ao que acresce que, na visita realizada pelo SIT, os bens não se encontravam nas instalações da Requerente, motivo pelo qual foi questionado o Sr. B..., para indicar onde se encontravam os bens. Foi esclarecido que “…os investimentos em causa dizem respeito à colocação de uma portada nas instalações da A... . Não obstante, esta solução não se revelou funcional pelo que a mesma foi substituída por uma solução alternativa. Contudo, e para vossa melhor referência, remetemos em anexo, evidências fotográficas através das quais é possível contemplar a portada em questão, quando ainda se encontrava nas instalações da A... .”

 

A Requerente entende que valem aqui as considerações já feitas a propósito da distinção entre o conceito de «investimento inicial» e investimento no «aumento da capacidade de um estabelecimento existente», que seriam razão suficiente para anular as liquidações ora impugnadas, assim como não deve ser dada relevância ao facto dos bens não se encontrarem nas instalações da Requerente.

 

Termina a Requerente dizendo que a falta de consideração das disposições legais do RGIC nas liquidações ora impugnadas, perante a qual a ora Requerente não teve oportunidade de se pronunciar, sempre significaria uma violação das suas garantias de defesa, nos termos do artigo 60.º da LGT, e, inclusivamente, vicia a liquidação impugnada de falta de fundamento legal, em qualquer dos casos suficiente para anular as liquidações ora impugnadas, por:

 

- falta de fundamento legal, em violação do princípio da legalidade, nos termos do número 2 do artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) e do artigo 8.º da LGT, e

- absoluta falta de fundamentação, nos termos conjugados do número 4 do artigo 268.º da CRP e do número 1 do artigo 77.º da LGT.

 

  1. DA DLRR

 

No que à DLRR concerne, a Requerente defende-se da seguinte forma.

 

Na fundamentação das liquidações ora impugnadas, os relatórios de inspeção referem que a Requerente constituiu as seguintes reservas especiais de DLRR, com referência aos lucros dos seguintes anos:

  • 2017: 1.588.999,10 Euros;
  • 2018: 557.689,90 Euros;
  • 2019: 2.000.000,00 Euros.

 

Nos mesmos relatórios, refere-se que a Requerente não procedeu ao investimento elegível da totalidade destas reservas, no prazo de 4 anos, reclamando-se nas liquidações ora impugnadas as respetivas diferenças, acrescidas dos juros compensatórios devidos à taxa de 15%:

  • até 2021: 5.789,44 Euros;
  • em 2022: 407.233,89 Euros;
  • em 2023: 628.012,24 Euros.

 

Entende a Requerente que erram as presentes correções, de facto e de direito, em especial, na desconsideração das verbas admitidas como reinvestimento da DLRR.

 

A este respeito, refira-se ainda que, segundo a Requerente, relativamente à liquidação de 2020, a AT assumiu indevidamente que o reinvestimento para efeitos de DLRR nesse exercício ascendeu ao mesmo montante das aplicações consideradas relevantes para efeitos de RFAI – o que refere ser falso. Na verdade, o reinvestimento para efeitos de DLRR realizado em 2020, refere a Requerente, ascendeu a € 152.826,15 (conforme Doc. 9, que junta à PI), pelo que, face às correções da AT e assumindo as mesmas como certas – o que apenas se admite para mero efeito de raciocínio –, o reinvestimento realizado em 2020 ascende a € 47.171,55 (e não a € 27.500 como conclui a AT).

 

Ora, os investimentos desconsiderados são os mesmos investimentos recusados em sede de RFAI, razão pela qual se remete para tudo o que vai referido a propósito dos mesmos investimentos em sede de RFAI.

 

A Requerida, por seu lado, vem referir que, para efeitos da DLRR, as aplicações consideradas relevantes constam do artigo 30.º do CFI, não divergindo, no essencial, das admitidas no regime RFAI, sempre dependentes, também, do prévio enquadramento no âmbito do conceito de “investimento inicial” (nexo causal entre a estratégia definida e as necessidades de investimento), tal como definido na alínea d) do n.º 2 dos artigos 2.º e artigo 3.º da Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro, em concordância expressa com a alínea a) do § 49 do artigo 2.º do RGIC, por remissão do artigo 11.º da mencionada Portaria.

 

Nessa mesma linha de raciocínio, a Requerida remete para os argumentos dados para a desconsideração dos mesmos ativos para efeitos de RFAI. 

 

A não concretização da totalidade do investimento, segundo a Requerida, implica a devolução do imposto que deixou de ser liquidado na parte correspondente ao montante dos lucros não reinvestidos, acrescido dos juros compensatórios majorados em 15 pontos percentuais, de acordo com o artigo 34º do CFI.

 

Finaliza dizendo que, nos RIT elaborados foram descritos os valores da DLRR, considerados pelo sujeito passivo e os valores de investimento a considerar, apurando-se os valores que não foram reinvestidos, face aos prazos previstos na lei.  Estes montantes não foram tidos em conta para as liquidações em causa, dado que as correções só se poderão efetivar nas liquidações dos períodos de tributação dos anos de 2021, 2022 e 2023.

 

  1. DO CFEI II

 

À declaração de 2020 da Requerente, em sede de CFEI II, foram corrigidos os investimentos elegíveis em 81.268,71 Euros, o que implicou uma correção à dotação de 16.253,74 Euros.

 

Da desconsideração da “manutenção de máquina de assemblagem”

 

Este investimento está inscrito no valor de 15.534,76 Euros, com um benefício de 3.106,95 Euros, referindo a Requerida que não tem enquadramento no artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020. A Requerida refere não se tratar de um elemento da propriedade industrial, nem sequer da aquisição de um bem, mas sim de uma prestação de serviços de manutenção a uma máquina.

 

A Requerente discorda, em primeiro lugar, porque entende que a Requerida não explica as razões que a levam a excluir esta despesa do elencado na referida disposição legal, o que – por si só – é razão mais do que suficiente para anular a liquidação ora impugnada por falta de fundamentação.

 

Entende a Requerente que, seja como for, cumpre dizer que esta despesa não cabe nas exclusões de 4 a 8 do artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020. Na verdade, este investimento cabe entre as «despesas com elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo», previstas na alínea b) do número 2 do artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020.

 

Segundo a Requerente, este artigo não especifica que estas despesas se limitem a bens, mas referem-se a “despesas”, admitindo assim despesas diretamente relacionadas com a aquisição de bens de investimento, bem como despesas acessórias, como aquelas aqui referidas com a “manutenção” de uma máquina envolvida num muito relevante “processo de produção”, altamente inovador e relevante para a produção da Requerente.

 

Da desconsideração do investimento em “matrizes, desenvolvimento de perfis”

 

Relativamente ao investimento em “matrizes, desenvolvimento de perfis”, inscritos pelo valor de 57.133,95 Euros, foi feita uma correção de 11.426,79 Euros, uma vez que, de acordo com a Requerida, não são consideradas “afetos à atividade da empresa”, nos termos do número 1 do artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho.

 

O fundamento invocado pela Requerida para a não consideração do investimento feito em “matrizes, desenvolvimento de perfis”, de forma semelhante ao que foi, anteriormente, referido a propósito do RFAI e da DLRR, foi o facto de não serem considerados “afetos à atividade da empresa”, nos termos do número 1 do artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho.

 

As matrizes são adquiridas pela Requerente, são sua propriedade e são usadas no seu processo de produção, reiterando aqui a Requerente todos os argumentos usados em sede de RFAI.

 

Da desconsideração da “Grua de movimentação manual - GGR Liftboy 700”

 

No que se refere à desconsideração em sede de CFEI II da “Grua de movimentação manual - GGR Liftboy 700”, inscrita pelo valor de 8.600 Euros, que leva a uma correção de 1.720 Euros, a argumentação da Requerida é que a mesma não se encontrava nas instalações do sujeito passivo, nem afeta à sua exploração.

 

No RIT refere a Requerida que “o sujeito passivo considerou para efeitos de CFEI II a aquisição de uma “grua movimentação manual GGR Liftboy 700”, constante da fatura n.º D120/189 emitida por “C...; Lda.”, no valor de 8.600,00 Euros.

 

No entanto, continua a Requerida, verificou-se que este equipamento não se encontra nas instalações da empresa. Solicitado ao sujeito passivo justificação para este facto, bem como a indicação do local onde se encontra, comprovando documentalmente o envio da grua, este enviou através de correio eletrónico a seguinte justificação: “A Grua movimentação Liftboy 700 encontra-se na morada: ..., ...-... Mealhada e informamos que não temos na nossa posse a guia de transporte que acompanhou o trajeto da máquina.  A razão dessa deslocação prende-se com a montagem de um protótipo da A..., S.A. nessas instalações.” Ou seja, não foi identificado o fornecedor em causa, apenas foi indicada uma morada, Zona Industrial de Viadores, que corresponde à sede de uma empresa relacionada (D..., S.A.), o equipamento não foi acompanhado de guia de transporte, não sendo exibido qualquer documento que comprove este transporte.

 

Já a Requerente entende que nada no regime legal previsto no número 1 do artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, exige que os bens de investimento se encontrem fisicamente nas instalações da Requerente.

Em todo o caso, salienta a Requerente, a “Grua de movimentação manual - GGR Liftboy 700” encontra-se afeta à atividade da Requerente, na medida em que, como se disse em sede de inspeção, apenas se encontra nas instalações do fornecedor para auxiliar na montagem de um protótipo da Requerente nessas instalações.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD em 1 de agosto de 2024 e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), na redação introduzida pelo artigo 228° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral foi regularmente constituído em 8 de outubro de 2024.

 

Notificada a Requerida, a 11 de outubro de 2024, para apresentar a sua Resposta fê-lo em 13 de novembro de 2014, tendo junto o processo administrativo a 18 de novembro de 2024.

 

A reunião prevista no artigo 18º do RJAT realizou-se no dia 10 de fevereiro de 2025, tendo sido inquiridas as três testemunhas apresentadas pela Requerente, sobre os quesitos para as quais foram indicadas.

 

Quer a Requerente, quer a Requerida indicaram ao Tribunal pretenderem apresentar alegações, para o que lhes foi dado pelo Tribunal um prazo simultâneo de 15 dias.

 

As partes apresentaram as suas alegações no dia 24 de fevereiro e no dia 26 de fevereiro, respectivamente.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas exceções.

 

Cabe, então, apreciar e decidir.

 

II - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes:

 

i. A Requerente A... S.A., com o NIF..., com sede estabelecida na Rua ..., ..., ..., ..., está coletada pela atividade principal de “Fabricação de portas, janelas e elementos similares em metal” (CAE 25120) e é qualificada como PME (Pequena ou Média Empresa), facto referido pela Requerente e confirmado pela Requerida no RIT.

 

ii. Os SIT, da Direção de Finanças de Porto, realizaram três procedimentos de inspeção, todos dirigidos à análise da situação tributária da Requerente, no âmbito do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), para controlo dos benefícios fiscais, um relativamente ao ano de 2019, credenciado pela ordem de serviço n.º OI2023..., parcial, externo, que inclui uma dotação do ano de 2018, pelo que foi efetuado procedimento inspetivo ao ano de 2018, credenciado pela ordem de serviço n.º OI2024... e um relativo ao exercício de 2020, credenciado pela ordem de serviço n.º OI2023... .

 

iii. Da análise aos investimentos efetuados, à documentação de suporte e às instalações da Requerente, em 28/11/2023, os SIT apuraram que a Requerente não cumpriu, relativamente a alguns investimentos, conforme atrás abordado mais em detalhe, as condições previstas nos regimes legais aplicáveis aos benefícios fiscais em questão.

 

iv. Com base na informação junta ao processo e na inquirição de testemunhas, entende este Tribunal que ficou provado, relativamente ao investimento em matrizes, no que releva para a decisão, para efeitos de aplicação do benefício do RFAI e do CFEI II, o seguinte:

- As matrizes são propriedade da Requerente, apesar de estarem localizadas nas instalações dos fornecedores de perfis;

- As matrizes são um activo essencial na actividade da Requerente, nomeadamente no processo de fabrico dos seus produtos, tendo ficado provada a sua conexão com a actividade da Requerente;

- É usual e tem sentido económico o desenvolvimento de perfis (para o que se utilizam as matrizes) ocorrer nos fornecedores e não ser um processo internalizado nas empresas do sector da Requerente;

- As matrizes têm uma ligação directa com a capacidade de produção da Requerente, sendo um investimento necessário quer para a produção de modelos diferentes de produtos, quer para o incremento da sua produção.

 

v. No período em análise existiu criação de postos de trabalho na Requerente, facto confirmado pela Requerida.

 

vi. Dos procedimentos de inspeção resultaram as liquidações adicionais de IRC que se seguem:

- Liquidação n.º 2024..., de 08/04/2024, relativa ao exercício de 2018, que gerou correções no valor de 29.283,01 Euros (RFAI) e correções meramente aritméticas em sede de DLRR e respetiva liquidação de acerto de contas n.º 2024...;

- Liquidação n.º 2024..., de 11/04/2024, relativa ao exercício de 2019, que gerou correções no valor de 44.034,06 Euros, correspondentes a 36.316,31 Euros (RFAI) + 7.717,75 Euros (postos de trabalho), liquidação de juros n.º 2024 ... e respetiva liquidação de acerto de contas n.º 2024..., da qual resulta um valor a pagar de 77.430,32 Euros;

- Liquidação n.º 2024..., de 25/06/2024, relativa ao exercício de 2020, no valor de 49.660,59 Euros, correspondentes a 26.413,65 Euros  (RFAI) + 16.253,74 Euros (CFEI II) + 6.993,20  Euros (postos de trabalho) e respetiva liquidação de acerto de contas n.º 2024..., da qual resulta um valor a pagar de 104,89 Euros;

 

vii. Tais liquidações resultaram num total de correções 122.977,66 Euros, que versaram sobre RFAI, CFEI II e criação de postos de trabalho, não tendo, contudo, a Requerente contestado a correcção relativa a criação de postos de trabalho, no montante de 14.710,95 Euros.

 

viii. No que que se refere à DLRR, apesar dos cálculos de potenciais correcções constarem dos RIT, não estão reflectidos nas liquidações adicionais sub judice, dado que tais correcções apenas se reflectirão em exercícios subsequentes. 

 

Factos não provados

 

Com base na prova junta ao processo e na inquirição efectuada às testemunhas apresentadas pela Requerente, dá-se como não provado o enquadramento dos activos abaixo listados no regime do RFAI, pelo não cumprimento dos requisitos que à frente se indicam.

 

 

 

 

No que concerne ao CFEI II, dá-se como não provado o enquadramento no seu regime das despesas seguintes:

 

 

Não ficou provado que a despesa com manutenção de uma máquina de assemblagem se tratasse da aquisição de um activo tangível, nem tão pouco de uma despesa com elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados.

 

Relativamente à grua de movimentação manual - GGR Liftboy 700, a Requerente não conseguiu comprovar de forma cabal o local onde a mesma se encontrava nem, consequentemente, a afectação da mesma à sua actividade. 

 

Não há outros factos não provados que se entendam relevantes para a decisão da causa.

 

 

Motivação da matéria de facto

 

Ao Tribunal Arbitral incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão da causa e discriminar os factos provados e não provados, não existindo um dever de pronúncia quanto a todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, determinada com base nas posições assumidas pelas partes e nas várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, conforme decorre do artigo 596.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

Os factos dados como provados e não provados resultaram da análise da prova produzida no presente processo, designadamente da prova documental junta aos autos pelo Requerente, do PA e respetiva prova junta aos autos pela Requerida e ainda do depoimento das testemunhas inquiridas, que foram apreciados pelo Tribunal Arbitral de acordo com o princípio da livre apreciação dos factos e tendo presente a ausência da sua contestação especificada pelas partes, conforme decorre do artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e do artigo 607.º, n.ºs 4 e 5, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

Matéria de direito

 

Entende-se que a matéria controvertida que foi sujeita à apreciação deste Tribunal, se resume à análise das seguintes questões essenciais:

  1. Cumulação dos pedidos e caducidade do direito à liquidação;
  2. Falta de fundamentação;
  3. Se estão verificados todos os pressupostos para que a Requerente possa beneficiar do regime do RFAI, conforme artigo 22.º e seguintes do CFI;
  4. Se estão reunidos todos os requisitos para que a Requerente possa beneficiar do regime da DLRR, os quais estão previstos no artigo 41.º - A do EBF;
  5. E, por fim, se se observam todos os requisitos para que a Requerente beneficie do regime do CFEI II, os quais estão previstos no artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020.

 

Então vejamos.

 

Cumulação dos pedidos e caducidade do direito à liquidação

 

A Requerente requereu expressamente que o Tribunal se pronuncie sobre a admissibilidade da cumulação de pedidos no caso em apreço, por serem as mesmas as circunstâncias de facto relevantes para todas as liquidações contestadas, motivadas com fundamento no mesmo Relatório de Inspeção Tributária, por a vexata quaestio ser transversal a todas as liquidações contestadas, e por o Tribunal Arbitral ser competente para apreciar a legalidade de todas elas.

 

A Requerida não se opôs à cumulação de pedidos.

 

Analisando os factos, julga-se admitida a cumulação de pedidos, face ao disposto no artigo 3.º, n.º 1, do RJAT, no qual se pode ler que a mesma deverá ser admitida quando “a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito”.

 

Quanto à caducidade do direito à liquidação, estão em questão, segundo a Requerente, as liquidações adicionais relativas aos exercícios de 2018 e 2019 (com exceção da verba referente a umas portadas que não estavam nas suas instalações por se terem revelado ineficientes).

 

No que ao direito concerne são os seguintes os artigos relevantes para análise desta matéria:

Os n.ºs 1 e 4 do artigo 45.º.

1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.

(…)

4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.

A alínea c) do n.º 2 do artigo 46.º:

2 - O prazo de caducidade suspende-se ainda:

c) Em caso de benefícios fiscais de natureza condicionada, desde a apresentação da declaração até ao termo do prazo legal do cumprimento da condição.

 

Ora, conforme o estabelecido na alínea c) do n.º 2 do art.º 46.º da Lei Geral Tributária (LGT), o prazo geral de caducidade de quatro anos suspende-se “em caso de benefícios fiscais de natureza condicionada, desde a apresentação da declaração até ao termo do prazo legal do cumprimento da condição”.

 

No caso dos benefícios fiscais, a alínea c) do n.º 4 do art.º 22.º do CFI, impõe como requisito que os sujeitos passivos: “mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis nºs 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras prevista no artigo 31.º-B do Código do IRC”.

 

Por outro lado, a alínea f) do mesmo número do dito artigo determina que os sujeitos passivos são obrigados a efetuar “investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c)”, sendo que, como vimos, esta alínea estabelece um período mínimo de três anos para as PME’s.

 

Ora, assim sendo, no que concerne ao investimento efectuado em 2018 e em 2019, o termo do prazo legal de manutenção dos activos e dos postos de trabalho (3 anos) terminou a 31 de dezembro de 2021 e a 31 de dezembro de 2022, respectivamente.

 

Ora, sendo o RFAI um regime de “benefícios fiscais de natureza condicionada”, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 46.º da LGT, o prazo de caducidade da liquidação de IRC encontra-se suspenso desde a apresentação da declaração do período de tributação do exercício (no caso de 2018 - 28 de junho de 2019) e até ao termo do prazo legal do cumprimento da condição. Neste caso 31 de dezembro de 2021, tendo decorrido 917 dias (2 anos, 6 meses e 2 dias), durante os quais o prazo de caducidade se encontrou suspenso.

 

Ora, a isto deverá acrescer o prazo normal da caducidade previsto no n.º 1 do art.º 45.º da LGT - 4 anos, que sem mais terminaria a 31 de dezembro de 2022. Acrescidos os 917 dias (2 anos, 6 meses e 2 dias) da suspensão da caducidade, resulta evidente que a notificação de liquidação do IRC relativo ao período de 2018 foi feita atempadamente (data limite: 5 de julho de 2025).

 

Quanto às correções efetuadas no ano de 2019, e pelo mesmo racional acima, é manifesto que, à data em que a Requerente foi notificada da liquidação de IRC do exercício de 2019, não se havia completado o prazo de caducidade de quatro anos previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT, conjugado com o art.º 46.º, nº 2, al. c) do mesmo diploma legal.

 

Perante o exposto, improcede o pedido de anulação das ditas liquidações apresentado pela Requerente com base na caducidade do direito à liquidação respeitante aos exercícios de 2018 e de 2019.

 

Falta de fundamentação

 

Quanto à falta de fundamentação das liquidações adicionais em crise, alega a Requerente que os atos contestados são insuficientes quanto à necessária fundamentação, vício que impede ao destinatário compreender a base da decisão da entidade que praticou o acto.

 

Ora, nos termos do estatuído no artigo 77.º da LGT, a decisão de qualquer procedimento deve ser fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da inspeção tributária, que constituirão neste caso, parte integrante do respetivo ato, equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.

 

De acordo com o n.º 2 daquele artigo, a fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.

 

A fundamentação do ato de liquidação mais não é do que a forma de a “AT exteriorizar os motivos por que procedeu àquela liquidação e não a qualquer outra, de uma forma clara, congruente e racional de molde a constituir a base que suporta a decisão” (Ac. TCA Sul de 25.01.2011 – Proc. 04410/10. Como se diz no Ac. STA de 02.07.2014 - Proc. nº 01074/13: “É inquestionável que a Administração tem o dever de fundamentar os actos que afectem os direitos ou os legítimos interesses dos administrados – em harmonia com o princípio plasmado no artigo 268º da CRP e acolhido nos artigos 124º do CPA e 77º da LGT”.

 

Ora, como a doutrina e a jurisprudência têm vindo exaustivamente a repetir, a fundamentação há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do ato; e congruente, de modo que a decisão constitua a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação.

 

É também incontroverso que as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de ato e as circunstâncias concretas em que este foi proferido, bastando-se com a expressão clara das razões que levaram a determinada deliberação decisória.

 

A determinação do âmbito da declaração fundamentadora pressupõe, portanto, a busca de um conteúdo adequado, que há-de ser, num sentido amplo, o suficiente para suportar formalmente a decisão administrativa.

 

Deste modo, os atos estarão suficientemente fundamentados quando o sujeito passivo, colocado na sua posição de destinatário normal - o bonus pater familiae de que fala o artigo 487º, nº 2, do Código Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, por aceitar, ou não, os atos.

 

Parece, pois, evidente que a Requerente pode não concordar com a fundamentação apresentada, mas é indesmentível que ela existe, é clara, não contraditória e congruente. Acresce que “não ocorre o vício formal de falta de fundamentação se a própria Impugnante revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do acto e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido” (Ac. STA de 01.01.2013 – Proc. n.º 0105/12).

 

Ora, analisando o pedido de pronúncia arbitral, é inquestionável que a Requerente não teve quaisquer dúvidas quanto aos pressupostos e fundamentos subjacentes aos atos de liquidação que contesta.

 

Estando os atos em crise devidamente fundamentados estão aptos a produzir os seus efeitos, não lhes podendo ser apontada quaisquer ilegalidades desse jaez. Improcede, assim, o invocado vício de falta de fundamentação.

 

RFAI

 

O Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“TFUE”) consagra nos seus artigos 107.º a 109.º, o regime jurídico que regula os auxílios de Estado, cuja finalidade é proibir os Estados Membros de conceder auxílios que ponham em perigo a concorrência dentro da União Europeia.

 

Nos termos do artigo 3.º, n.º 1, b) do mesmo Tratado, a determinação das regras de concorrência, necessárias ao funcionamento do mercado interno, fazem parte da reserva de competência exclusiva da União Europeia. Ao que acresce que, em matérias de competência exclusiva da União, só esta pode legislar e adotar atos juridicamente vinculativos. Os Estados-Membros apenas poderão legislar em circunstâncias especiais, se habilitados pelo direito europeu ou com o objetivo de executar atos da União.

 

Neste âmbito surge o RGIC, cujo primeiro capítulo, sob a epígrafe “Disposições comuns”, dispõe sobre as normas comuns a todas as categorias de auxílios aí abrangidas, e consagra “a obrigatoriedade de os Estados respeitarem certos princípios quando se decidem a implementar auxílios…”, de acordo com as diretrizes que os auxílios devem respeitar para serem considerados compatíveis com o mercado interno.

 

Assim, o RGIC vem definir os princípios e diretrizes que devem servir de enquadramento à ação legislativa dos Estados Membros nestas matérias, os quais, ao constarem de um regulamento adoptado pela Comissão Europeia, são obrigatórios em todos os seus elementos e diretamente aplicáveis em todos os Estados-Membros, como expressamente determina o artigo 288.º do TFUE e reitera o artigo 59.º do RGIC.

 

O RFAI é um benefício fiscal regulado no Código Fiscal de Investimento, o qual opera por dedução à coleta, sendo considerado um regime de auxílio com finalidade regional aprovado “nos termos do Regulamento (UE) nº651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, nº L 187, de 26 de junho de 2014…”. Assim, é no contexto normativo do RGIC que devem ser interpretados e aplicados o regime do RFAI e a Portaria nº 297/2015, de 21 de setembro.

 

É do RGIC que resulta que os auxílios com finalidade regional (como é o caso do RFAI) se destinam a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável, prevendo o seu Considerando 31 que “podem ser concedidos para promover a criação de novos estabelecimentos, a extensão da capacidade de um estabelecimento existente, a diversificação da produção de um estabelecimento ou uma mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”

 

E é nas definições aplicáveis aos auxílios com finalidade regional, e com relevância para estes autos, que, no artigo 49.º, n.º 2, a) do RGIC, encontramos o que se considera “investimento inicial”: “Um investimento em ativos corpóreos e incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, aumento da capacidade de um estabelecimento existente, diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento ou mudana fundamental do processo de produção global de um estabelecimento”.

 

O investimento, nomeadamente em sede de RFAI, tem de se materializar em ativos corpóreos e incorpóreos e estar relacionado com as seguintes condições não cumulativas:

(a) A criação de um novo estabelecimento;

(b) O aumento da capacidade de um estabelecimento existente;

(c) A diversificação da produção de um estabelecimento para produtos não produzidos anteriormente no estabelecimento; ou

(d) A mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento.

 

Por seu lado, o artigo 22.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b), do CFI determina o seguinte:

1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.

2 - Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:

a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:

i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;

ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;

iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;

iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;

v) Equipamentos sociais;

vi) Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;

b) Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.”

 

O RFAI permite às empresas deduzir à coleta apurada uma percentagem do investimento realizado em ativos não correntes (tangíveis e intangíveis) e está previsto nos artigos 22.º a 26.º do CFI, que é aplicável aos períodos de tributação iniciados em ou após 1 de janeiro de 2014, sendo regulado pela Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro e pelo RGIC.

 

Acresce que é um benefício aplicado pelos sujeitos passivos sem necessidade de autorização prévia da administração fiscal.

 

O artigo 2.º, n.º 2, d), da Portaria n.º 297/2015 estabelece o seguinte:

2 - Para efeitos do disposto no artigo 22.º do Código Fiscal do Investimento:

d) Os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

 

Apreciação da questão

 

A Requerente é uma sociedade PME que se dedica à atividade principal de “Fabricação de portas, janelas e elementos similares em metal” (CAE 25120), e realizou, nos anos de 2018, 2019 e 2020, os investimentos descritos acima.

 

Para a aplicação do RFAI, como vimos, os investimentos realizados têm de se enquadrar no conceito de “investimento inicial”, tendo a Requerente, dentro do conceito, fundamentado o mesmo com o aumento da sua capacidade produtiva.

 

De uma forma genérica, o RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores da indústria extrativa e transformadora, turismo, incluindo as atividades com interesse para o turismo, atividades e serviços informáticos, agrícolas, I&D, tecnologias da informação, defesa, ambiente, energia, telecomunicações e atividades de centros de serviços partilhados.

 

No caso em concreto, não se questiona a elegibilidade da actividade desenvolvida pela Requerente.

 

De acordo com o Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, para que um determinado sujeito passivo possa beneficiar do RFAI, é necessário que cumpra um conjunto de condições, cumulativas, nomeadamente:

a) Disponha de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;

b) O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;

c) Manutenção na empresa e na região dos bens objeto do investimento, durante um período mínimo de três anos, no caso de PME's, ou de cinco anos, nos restantes casos ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis n.º 64.º-B/2011, de 30 de dezembro, e n.º 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC;

d) Inexistência de dívidas ao Estado e à Segurança Social ou, caso existam, tenham o seu pagamento devidamente assegurado;

e) Não enquadramento das entidades no conceito de “empresa considerada em dificuldades”, nos termos das orientações comunitárias;

f) Efectuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo (cinco anos) de manutenção dos bens objeto de investimento, conforme análise à frente.

 

Destes requisitos, é colocado apenas em questão pela AT, o referido na alínea f) no que concerne ao que é investimento relevante.

 

Adicionalmente, nos termos da Portaria  297/2015, de 21 de setembro, com o objetivo assegurar a aplicação integral das regras previstas no RGIC, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado da União Europeia, bem como das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional, o RFAI apenas é aplicável relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC.

 

Considera-se como tal, um investimento em ativos corpóreos ou incorpóreos relacionado com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento ou, uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.

 

No caso concreto, o enquadramento dado é por referência à tipologia de “aumento da capacidade de um estabelecimento já existente”. Não definindo a legislação fiscal estes conceitos, entendemos que se poderá recorrer à legislação aplicável ao regime do Portugal 2020, que também os utiliza, designadamente à alínea d) do n.º 2 do artigo 26.º do RECI (Regime Específico do Domínio da Competitividade e Internacionalização), o qual refere o seguinte:

(…) Em relação aos incentivos destinados ao aumento da capacidade de estabelecimento já existente (…) esse aumento deve corresponder no mínimo a 20% da capacidade instalada em relação ao ano pré-projeto”.

 

Assim, no âmbito desta tipologia de investimento, entendemos que a empresa deverá aumentar a sua capacidade de produzir bens, sendo isso considerado como o aumento da sua capacidade instalada.

 

Considerando as aplicações relevantes, no âmbito do benefício fiscal do RFAI, elas são ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, bem como ativos intangíveis constituídos por despesas com transferência de tecnologia. No que se refere aos ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado novo, excepcionam-se da aplicabilidade do benefício:

i) Terrenos (salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa);

ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios (salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas);

iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;

iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;

v) Equipamentos sociais e outros bens de investimento que não afetos à exploração da empresa. 

 

Assim, acresce referir que um investimento de substituição que não satisfaça o requisito de investimento novo e adicional que seja, simultaneamente incremental em relação ao investimento já existente, em termos de capacidade instalada, não integra o conceito de investimento inicial, bem como as aquisições de activos isolados e as reparações e benfeitorias em activos existentes não constituem “activos adquiridos em estado de novo”, não cumprindo com os requisitos de acesso ao RFAI.

 

No concreto, há então que determinar, dentro do conjunto de investimentos apresentados pela Requerente, o que é relevante para efeitos de RFAI, dentro da referida tipologia: aumento da capacidade de um estabelecimento já existente. O que, como atrás se expôs, passa necessariamente pelo aumento da sua capacidade instalada, ao que acresce não se poder tratar de meros investimentos em bens em estado de uso, ou investimentos de substituição, ou reparações/benfeitorias em activos já existentes.

 

Então vejamos.

 

Resumidamente, entende este tribunal que os seguintes activos não têm enquadramento no regime do RFAI:

 

 

No que concerne à máquina de corte resulta provado que se trata de um bem adquirido em estado de uso, pelo que não se enquadra no regime do RFAI.

 

Não tem razão a Requerente ao argumentar que, tratando-se de uma PME, não se aplica o requisito do activo ter que ser adquirido em estado novo, “conforme o disposto no n.º 6 do artigo 14.º do RGIC”

 

O nº 2 do artigo 22º do CFI, acima transcrito, é claro e inequívoco ao considerar como aplicações relevantes os activos fixos tangíveis adquiridos em estado novo.

 

O RGIC é um Regulamento da União Europeia que visa estabelecer quais os auxílios de Estado compatíveis com o mercado interno. No seu artigo 14º estabelece os limites aos auxílios regionais ao investimento, categoria em que se insere o RFAI.

 

Ora, há que entender que o RGIC visa impor limites aos referidos auxílios, no sentido de que, para que sejam compatíveis com o mercado interno, os Estados-Membros não podem atribuir auxílios mais “favoráveis” dos que nele previstos.

 

Assim, no n.º 6 do artigo 14.º do RGIC estabelece-se que são apenas compatíveis com o mercado interno os auxílios regionais ao investimento que tenham como requisito os activos adquiridos serem novos. E, permite, que os Estados Membros abram uma excepção no caso das PME´s e no caso das aquisições de estabelecimentos. Ora, permite,  mas não obriga.

 

No caso de Portugal, o CFI vem estabelecer como requisito para que um investimento seja considerado relevante no âmbito do RFAI, que os ativos adquiridos sejam novos, sem excecionar os que sejam adquiridos por PMEs. Sendo em tese possível ao legislador nacional, porque essa latitude lhe é permitida pelo RGIC, considerar que os ativos adquiridos por PMEs podem ser usados, certo é que o CFI optou por não fazer uso dessa possibilidade, impondo que, no âmbito do RFAI, os ativos adquiridos sejam novos, independentemente da qualidade do adquirente.

 

O mesmo se diga da alteração e retificação de matrizes, que não qualificam como a aquisição de um bem novo, mas como trabalhos em ativos já existentes.

 

No que se refere à licença Shucal, resulta provado que da despesa em questão não resulta a transferência de tecnologia pelo que, igualmente, não tem enquadramento no regime.

 

A porta seccionada vem substituir uma porta já existente, sendo por isso enquadrável como um investimento de substituição. Ao que acresce não resultar provado, nem se vislumbrar como pode contribuir para o aumento da capacidade instalada.

 

Igualmente não resulta provado o contributo para o aumento da capacidade instalada de produção da Requerente dos restantes activos acima elencados, designadamente:

- computadores e impressoras – podem aumentar eficiência da empresa mas não a sua capacidade instalada de produção;

- portadas, decks e ar condicionado – não resulta provada qualquer relação com o aumento da capacidade instalada de produção.

 

A contrario, entende este tribunal que resulta provado que os seguintes investimentos são elegíveis para o regime do RFAI:

 

 

 

As matrizes são uma espécie de moldes necessários à produção pela Requerente de portas e janelas. A Requerente adquire as matrizes e coloca-as nos seus fornecedores de perfis, não deixando aquelas, contudo, de ser sua propriedade e de estar afetas à produção dos bens que comercializa, não podendo pelos seus fornecedores ser usadas em quaisquer outros processos alheios à produção dos bens a comercializar pela Requerente.

 

Entende assim este tribunal não ser relevante o facto das matrizes se encontrarem fora das instalações da empresa. Nada obriga a empresa a ter internalizadas todas as fases do seu processo produtivo. E, neste caso, resulta provado que as matrizes, ainda que estejam localizadas nos fornecedores têm uma ligação direta e exclusiva com a capacidade de produção da Requerente. Quer para a produção de modelos diferentes de produtos, quer para o incremento da sua produção, é necessário o investimento recorrente em matrizes.

 

Neste sentido, veja-se a decisão do processo arbitral n.º 726/2020-T, com a qual concordamos, que refere não existir suporte legal para se defender que a elegibilidade de um investimento no âmbito deste benefício depende de todo o processo de produção ser diretamente assegurado pela empresa que faz o investimento.  E refere ainda, e bem, que os ativos estão afetos à exploração da empresa, desde que sejam utilizados para fabricar os seus produtos, independentemente de quem utiliza e onde os equipamentos em causa.

 

Resultou ainda provado, com relevância para o tema, que as matrizes têm uma durabilidade significativa superior a 5 anos, pelo que o investimento constante em matrizes significa sobretudo mais capacidade de produção e novos produtos.

 

Por fim, é requisito que os investimentos relevantes proporcionem “a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo (cinco anos) de manutenção dos bens objeto de investimento”, de acordo com a referida alínea f) do Decreto-Lei n.º 162/2014.

 

Entende este tribunal, conforme acima referido, que o investimento em matrizes tem necessariamente uma ligação directa com o aumento da capacidade de produção da Requerente, quer para a produção de modelos diferentes de produtos, quer para o incremento da sua produção.

 

Da prova apresentada resulta que, na prática, e no período em análise, existiu aumento efectivo da produção da Requerente (VAB), assim como a criação de postos de trabalho, o que não só não foi contestado pela Requerida, como foi por ela aceite.

 

Entende este tribunal que existindo a relação acima referida entre o investimento em matrizes e a capacidade de produção da Requerente, não é relevante o facto das matrizes se encontrarem fora das instalações da empresa. O que importa é considerar-se provado, como se considera, que os investimentos estejam "relacionados" com aumento da capacidade de um estabelecimento existente.

 

Ora, assim sendo, esse aumento da capacidade de produção terá proporcionado o aumento de postos de trabalho que, de facto, ocorreu na Requerente.

 

Improcede, assim, parcialmente a pretensão da Requerente, no que ao RFAI concerne, dando-se provimento ao montante de 295.134,40 Euros relativo a matrizes para perfis. Este montante corresponde a uma dedução em sede de RFAI no montante de 73.783,61 Euros.

 

DLRR

 

No que à DLRR concerne, a AT nos RIT elaborados, descreveu os valores da DLRR considerados pela Requerente e os valores de investimento a considerar na sequência das correções que pretendeu efetuar ao nível do RFAI, apurando, assim, os valores que considerou não terem sido reinvestidos.

 

Contudo, estes montantes de correção não foram considerados nas liquidações em causa, dado que as correções só se poderão efetivar nas liquidações dos períodos de tributação dos anos de 2021, 2022 e 2023. E, assim sendo, este tribunal não se irá pronunciar sobre as mesmas.

 

CFEI II

 

O artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020 estabelece o seguinte:

 

1 - Para efeitos do presente regime, consideram-se despesas de investimento em ativos afetos à exploração as relativas a ativos fixos tangíveis e ativos biológicos que não sejam consumíveis, adquiridos em estado de novo e que entrem em funcionamento ou utilização até ao final do período de tributação que se inicie em ou após 1 de janeiro de 2021.

2 - São ainda elegíveis as despesas de investimento em ativos intangíveis sujeitos a deperecimento efetuadas nos períodos referidos nos n.os 1 e 4 do artigo anterior, designadamente:

a) As despesas com projetos de desenvolvimento;

b) As despesas com elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, adquiridos a título oneroso e cuja utilização exclusiva seja reconhecida por um período limitado de tempo.

3 - Consideram-se despesas de investimento elegíveis as correspondentes às adições de ativos verificadas nos períodos referidos nos n.os 1 e 4 do artigo anterior e as que, não dizendo respeito a adiantamentos, se traduzam em adições aos investimentos em curso iniciados naqueles períodos.

4 - Para efeitos do disposto número anterior, não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso.

5 - Para efeitos do n.º 1, são excluídas as despesas de investimento em ativos suscetíveis de utilização na esfera pessoal, considerando-se como tais:

a) As viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, barcos de recreio e aeronaves de turismo, exceto quando tais bens estejam afetos à exploração do serviço público de transporte ou se destinem ao aluguer ou à cedência do respetivo uso ou fruição no exercício da atividade normal do sujeito passivo;

b) O mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo quando afetos à atividade produtiva ou administrativa;

c) As incorridas com a construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas.

6 - São igualmente excluídas do presente regime as despesas efetuadas em ativos afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do sector público.

7 - Não se consideram despesas elegíveis as relativas a ativos intangíveis, sempre que sejam adquiridos em resultado de atos ou negócios jurídicos do sujeito passivo beneficiário com entidades com as quais se encontre numa situação de relações especiais, nos termos definidos no n.º 4 do artigo 63.º do Código do IRC.

8 - Para efeitos do n.º 1, os terrenos não são ativos adquiridos em estado de novo.

9 - Os ativos subjacentes às despesas elegíveis devem ser detidos e contabilizados de acordo com as regras que determinaram a sua elegibilidade por um período mínimo de cinco anos ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC”.

 

À declaração de 2020 da Requerente, em sede de CFEI II, foram corrigidos pela Requerida os investimentos elegíveis em 81.268,71 Euros, o que implicou uma correção à dotação de 16.253,74 Euros.

 

 

 

A manutenção de uma máquina de assemblagem não tem enquadramento no artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020. Não se trata de uma despesa com a aquisição de um activo tangível. Não se trata também de uma despesa com elementos da propriedade industrial, tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados, como argumenta a Requerente, mas sim com uma despesa com uma prestação de serviços de manutenção de um activo já existente.

 

Relativamente ao investimento em “matrizes, desenvolvimento de perfis”, remete-se para as conclusões acima no âmbito do RFAI e entende este tribunal que o investimento em questão deve ser considerado para efeitos de CFEI II, nos termos do número 1 do artigo 4.º do anexo V à Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, porque provado que relacionado com ativos afetos à atividade da Requerente.

 

Finalmente, quanto à grua de movimentação manual - GGR Liftboy 700, entende este tribunal que, não estando a grua nas instalações da Requerente, aquando da visita da inspecção tributária, a Requerente não conseguiu comprovar de forma cabal o local onde a mesma se encontrava nem, consequentemente, a afetação da mesma à sua actividade.

 

Improcede, assim, parcialmente a pretensão da Requerente, no que ao CFEI II concerne, dando-se provimento ao montante de 57.133,95 Euros relativo a matrizes para perfis. Este valor corresponde a uma dedução em sede de CFEI II no montante de 11.426,79 Euros.

 

Reembolso do imposto indevidamente pago e juros indemnizatórios

 

A Requerente pede, ainda, a condenação da Autoridade Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

 

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, neste caso parcial, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os actos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

Por efeito da reconstituição da situação jurídica da Requerente em resultado da anulação do ato tributário, há assim lugar ao reembolso parcial do imposto indevidamente pago, correspondente ao valor da dedução dos benefícios fiscais em questão que obtiveram decisão favorável deste tribunal.

 

Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.

 

Há assim lugar, na sequência de declaração de ilegalidade parcial dos atos de liquidação de IRC, ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das citadas disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).

 

III - Decisão

Termos em que se decide:

a) Julgar parcialmente procedente o pedido arbitral nos montantes de:

 

i) €16.302,01 - liquidação nº 2024 8..., referente ao ano de 2018;

ii) €31.189,83 - liquidação nº 2024..., referente ao ano de 2019;

iii) €37.718,56 - liquidação nº 2024... referente ao ano de 2020.

anulando os actos de liquidação de IRC impugnados, na parte a eles correspondentes, mantendo em vigor na ordem jurídica o remanescente dos actos de liquidação;

 

b) Condenar a Administração Tributária no reembolso do imposto indevidamente pago com base na procedência parcial do pedido, no montante total de €85.210,40 e pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.

 

Valor da causa

 

Fixa-se o valor do processo em €122.977,66, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do CPPT, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 3, do RJAT, e 5.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 3.060,00, suportados no valor de €939,75 pela Requerente e no valor de € 2.120,25 pela Requerida, correspondentes às percentagens de 30,71% e 69,29%, respectivamente, em função do decaimento parcial de cada uma das Partes.  

 

Notifique-se.

Lisboa, 2 de abril de 2025

                                     

 

                                           O Árbitro Presidente

 

 

Victor Calvete

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

Nuno Pombo

 

O Árbitro Vogal (Relatora)

 

Maria Antónia Torres