SUMÁRIO:
Nos procedimentos de liquidação da iniciativa da AT, impende sobre esta o ónus de demonstrar os factos e pressupostos da liquidação, bem como a qualificação e quantificação do facto tributário, não recolhendo a AT prova suficiente do facto tributário, capaz de afastar a presunção de veracidade das declarações do Contribuinte, a correção à matéria tributável e consequente liquidação é ilegal.
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
1. A..., com sede na..., contribuinte n.º ..., vem, na sequência da decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ..., deduzida contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) n.ºs ... e das demonstrações de acerto de contas n.ºs..., referentes ao ano de 2019, no montante de € 805,00 euros, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a), e 10.º, todos do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, na redação vigente, requerer a constituição de Tribunal Arbitral e apresentar pedido de pronúncia arbitral, com vista à declaração de ilegalidade da referida decisão de indeferimento e, mediatamente, dos atos tributários antecedentes que dela foram objeto.
2.O pedido de constituição do Tribunal Arbitral apresentado em 22 de julho de 2024 foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD, e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT” ou “Requerida).
3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou a signatária como árbitro do Tribunal Arbitral, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. As partes foram notificadas dessa designação, em 11 de setembro de 2024, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.
4. O Tribunal Arbitral coletivo ficou constituído em 1 de outubro de 2024, tendo sido a Requerida notificada, no dia 2 de outubro de 2024, para apresentar a sua resposta.
5. A Requerida apresentou, em 6 de novembro de 2024, resposta e juntou aos autos o processo administrativo (“PA”). Defendeu que as liquidações dever-se-ão manter na ordem jurídica, na medida em que a Requerente deduziu indevidamente o IVA relativo a serviços acessórios, incluindo despesas com a aquisição de serviços de publicidade.
6. O Tribunal Arbitral decidiu dispensar, por desnecessárias, a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT e notificou as partes para, querendo, apresentarem alegações finais escritas, por despacho datado de 13 de fevereiro de 2025.
II. POSIÇÕES DAS PARTES
7. A Requerente defende que as liquidações impugnadas devem ser anuladas por erro na qualificação do facto tributário e por violação dos artigos 19.º e 20.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (“CIVA”).
8. A pretensão anulatória alicerça-se nos seguintes fundamentos:
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Em 2019 a Requerente adquiriu serviços de publicidade e deduziu integralmente o IVA associado à aquisição destes nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA, dado que, por um lado, tais serviços se destinaram a fomentar a atividade tributada da Requerente e, por outro lado, não se vislumbra no catálogo de despesas cujo IVA se encontra excluído do direito à dedução, previsto no artigo 21.º do Código do IVA, qualquer menção a despesas de publicidade;
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No entanto, a Requerida considera que os serviços adquiridos pela Requerente não se reconduzem, na sua totalidade, a serviços de publicidade, existindo, no seu entender, um conjunto de serviços, ditos “acessórios”, cujo IVA não é passível de dedução, por tais serviços acessórios se subsumirem às alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA;
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Este entendimento da AT encontra apenas respaldo na Circular n.º 20/2009, que divulga instruções administrativas referentes ao enquadramento em IVA dos gastos suportados pelos sujeitos passivos com a «aquisição de direitos de utilização de camarotes nos estádios de futebol», e na alusão que o descritivo das faturas emitidas pela sociedade prestadora de serviços de publicidade faz a essa Circular, referindo que os serviços alegadamente acessórios representam 10% do valor da parceria publicitária;
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Para a Requerente, no caso vertente, a AT assumiu como bom o mencionado nas faturas emitidas pela prestadora de serviços (cujo conteúdo não é da responsabilidade da Requerente) e dispensou-se automaticamente de demonstrar que os serviços que a sociedade prestadora reputa de acessórios nas faturas configuram despesas abrangidas pelo artigo 21.º do Código do IVA;
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A Requerente esclarece que não quereria contratar independentemente os serviços reputados de acessórios pela AT e pela Circular se não tivesse acesso ao serviço de publicidade, sendo, portanto, o serviço de publicidade o fim em si mesmo prosseguido para a Requerente e, por conseguinte o IVA suportado pela Requerente na aquisição das prestações acessórias associadas ao serviço (principal) de publicidade prestado deve ser integralmente deduzido nas mesmas condições em que deve ser deduzido o IVA incorrido na aquisição da prestação principal, razão pela qual a correção em apreço é manifestamente ilegal, por violar o disposto nos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA.
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Sustenta a Requerente que a AT não fez prova dos factos constitutivos do seu direito a liquidar o Imposto - os factos, pressupostos da sua existência, qualificação e quantificação do facto tributário - dado que a AT não logrou provar que os serviços reputados de acessórios nas faturas emitidas consubstanciam, em primeiro lugar, despesas abrangidas pelo artigo 21.º do Código do IVA e, em segundo lugar, ainda que fossem abrangidas pelo artigo 21.º, que tipologia de despesas estariam em causa (i.e. se abrangidas pela alínea c), d) ou e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA).
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Acrescenta que, ao demitir-se de provar que os serviços reputados de acessórios nas faturas emitidas pela prestadora de serviços consubstanciam despesas abrangidas pelo artigo 21.º do Código do IVA e ao dispensar-se de concretizar a tipologia dessas despesas, a AT não cumpriu minimamente com os princípios a descoberta da verdade material, do inquisitório e da repartição do ónus da prova e do dever de fundamentação que se lhe impunha o que, desde logo, prejudica e limita as garantias de defesa da Requerente,
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Por conseguinte, a correção empreendida pela enferma de ilegalidade, porquanto viola o disposto nos artigos 58.º, 74.º e 77.º, todos da LGT;
9. Sem prescindir, face à insuficiência probatória e de fundamentação revelada pela AT, entende que sempre se estará perante uma situação de fundada dúvida sobre a existência do facto tributário, que se resolve a favor da Requerente, atento o disposto no n.º 1 do artigo 100.º do CPPT aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, da alínea a) do RJAT
10. Defende, ainda, que as liquidações de juros compensatórios devem ser expurgadas da ordem jurídica, perante a ilegalidade das liquidações de IVA.
11. A Requerida apresentou resposta, na qual sustenta, no essencial, que a Requerente deduziu indevidamente o IVA relativo aos serviços acessórios, incluindo nas despesas com a aquisição de serviços de publicidade.
12. Alega, em defesa da referida tese, o seguinte:
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Foi a própria emitente das faturas que faturou um “Pacote Corporate”, não discriminou as prestações de serviços incluídas e fez seu o enquadramento no âmbito da Circular n.º 20/2009 da DGCI, fazendo constar das mesmas que “Os serviços acessórios considerados em conformidade com o n.º 6 da Circular n.º 20/2009 da DGI representam 10% do valor da presente parceria. (….)”;
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Resulta inequívoco dos elementos reunidos que a prestadora de serviços faturou um “pacote”, e que os serviços em causa incluem os lugares sentados no camarote ou na bancada adjacente, o catering, os serviços de hospedeiras, os lugares de estacionamento e os convites para assistir aos jogos das competições europeias no estrangeiro, incluindo viagem, estadia e bilhetes, e ainda, os serviços conexos com a utilização dos camarotes (“espaço empresarial”), na medida em que consta das faturas o enquadramento das prestações de serviços no âmbito da referida Circular;
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De acordo com o artigo 20.º n.º 1 do CIVA só é dedutível o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados e que sejam pertinentes aos fins próprios da atividade do sujeito passivo;
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Já as despesas relativas aos serviços acessórios configuram despesas de representação, excluídas do direito à dedução nos termos do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA, nomeadamente as despesas referidas na da alínea d) “despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de receção, incluindo as relativas a acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinadas principalmente a tais recepções”.;
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As despesas relativas aos serviços acessórios configuram despesas de representação e o IVA contido nas mesmas encontra-se excluído do direito à dedução nos termos das alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA,
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Conforme resulta da análise conjugada dos artigos 19.º e 20.º do Código do IVA as despesas que tenham função publicitária são despesas cujo IVA liquidado confere direito à dedução, enquanto as despesas de representação estão excluídas do direito à dedução, pelo que a Requerente deduziu indevidamente o IVA nos períodos de janeiro, março, junho e outubro de 2019.
13.Conclui sustentando que não assiste razão à Requerente, devendo considerar-se indevidamente deduzido o IVA decorrente das despesas relativas aos serviços acessórias, devendo o pedido de pronuncia arbitral ser julgado improcedente.
III. SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral coletivo foi regularmente constituído e é, assim, materialmente competente para conhecer do pedido, que foi tempestivamente apresentado nos termos dos artigos 5.º e 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e estão regularmente representadas, em conformidade com o disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT.
Admite-se a cumulação de pedidos – estão em causa diversos atos tributários de IVA, sendo peticionada a declaração de ilegalidade e a anulação de cada um deles – em virtude de se verificar que a procedência dos pedidos formulados pela Requerente depende, essencialmente, da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito (artigo 3.º, n.º 1, do RJAT).
O processo não enferma de nulidades, nem existem outras exceções ou questões prévias que cumpram conhecer e que obstem à apreciação do mérito da causa.
IV. MATÉRIA DE FACTO
i. Fatos provados
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A Requerente pertence ao grupo farmacêutico […], dedicando-se, essencialmente, à atividade de comércio a retalho de produtos farmacêuticos. (cf. PA, facto não controvertido)
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A Requerente é um sujeito passivo enquadrado no regime normal de IVA, com periodicidade mensal, por opção. (Cf. PA)
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Tendo em vista a promoção e o desenvolvimento da sua atividade, a Requerente adquiriu, em 2019, serviços de publicidade à […], tendo deduzido integralmente o IVA associado à aquisição desses serviços. (cf. PA)
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No âmbito da Ordem de Serviço n.º […], foi realizada à Requerente uma ação de inspeção que incidiu sobre o exercício de 2019, tendo sido «(…) selecionado para análise, IRC ano de 2019, nomeadamente controlo das variações patrimoniais declaradas.» (cf. capítulo «II. Objetivos, âmbito, extensão e duração da ação de inspeção» do Relatório de Inspeção Tributária – RIT).
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Inicialmente, o procedimento era de âmbito parcial IRC, (…). No decurso do procedimento o respetivo âmbito foi alterado passando a incluir o IVA e RFIRS, tendo sido notificado o sujeito passivo nos termos do art.º 15º do RCPITA.» (cf. capítulo «II. Objetivos, âmbito, extensão e duração da ação de inspeção» do RIT).
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No decurso do procedimento de inspeção, em matéria de IVA, conforme vertido no capítulo «V. Descrição dos factos e fundamentos das correções/irregularidades» do RIT, os SIT constaram que:
«A – Parceria Publicitária
A […] tem registadas, na conta “6222 - Fornecimentos e serviços externos – Serviços especializados - Publicidade e propaganda” e “24323132311 - Iva – Dedutível - Outros Bens e Serviços - Outros Bens e Serviços-Continente - Obs - Taxa Normal - Obs - Taxa Normal-23% - Obs Tx. Nm. - Mercado Nacional - Obs - Tx. Nm. - MN-TT/Dedutivel”, as faturas a seguir identificadas emitidas pela sociedade […]. «imagem no original»
No descritivo das referidas faturas consta o seguinte “Os serviços acessórios considerados em conformidade com n.º 6 da circular n.º 20/2009 da DGI representam 10% do valor da presente parceria”. (cf. PA)
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No âmbito da ação inspetiva levada a cabo ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI2022..., os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto concluíram pela existência de deduções indevidas de IVA, por parte da Requerente, no montante global de € 805,00, associado à aquisição de serviços de publicidade à […]. (cf. PA)
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A AT escorou as correções aritméticas efetuadas no seguinte fundamento: «[n]o descritivo das referidas faturas [emitidas pela […] consta o seguinte “[o]s serviços acessórios considerados em conformidade com n.º 6 da circular n.º 20/2009 da DGI representam 10% do valor da presente parceria”. A […] fatura um “pacote”, sem discriminação das prestações de serviços incluídas, pelo que o gasto incorrido pela empresa com a sua aquisição não pode ser aceite para efeitos de IRC, na sua totalidade, como «despesas de publicidade», não podendo igualmente ser aceite a dedução integral do IVA suportado. (…) O IVA incluído nas despesas relativas aos serviços acessórios, encontra-se excluído do direito à dedução do IVA nos termos das alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA. Pelo que a […] deduziu indevidamente em cada um dos períodos de janeiro, março, junho e outubro € 201,25, respetivamente, no total de € 805,00.» (cf. capítulo “V. Descrição dos factos e fundamento das correções/irregularidades”- RIT).
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Na sequência da correção em IVA, a Requerente foi notificada das demonstrações de liquidação de IVA n.ºs 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023... e 2023... e das demonstrações de acerto de contas n.ºs 2023..., 2023..., 2023..., 2023..., 2023... e 2023... . (cf. RIT)
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A 26/06/2023 a Requerente foi notificada por transmissão eletrónica de dados, mediante notificação eletrónica ViaCTT, do projeto de conclusões do relatório de inspeção para exercer, querendo, o direito de participação na decisão na modalidade de audição prévia, previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) e no artigo 60.º do Regime Complementar do Procedimento da Inspeção Tributária e Aduaneira (RCIPTA); decorrido o prazo, a Requerente não se pronunciou. (cf. capítulo «X. Direito de Audição» do RIT)
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Por não concordar com as correções empreendidas pela AT, em 06/12/2023, a Requerente apresentou reclamação graciosa, peticionando a anulação dos atos de liquidação de IVA relativos ao ano de 2019. (cf. PA)
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A AT emitiu o projeto de decisão no âmbito do qual projetou indeferir a reclamação graciosa apresentada, argumentado para o efeito que:
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Notificada para exercer o direito de audição consignado no artigo 60.º da LGT a Requerente não se pronunciou. (cfr. PA)
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A reclamação graciosa foi indeferida por despacho que converteu o projeto de decisão em decisão definitiva. (cf. PA)
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A Requerente apresentou, no dia 22 de julho de 2024, pedido de pronúncia arbitral.
(Sistema informático do CAAD)
ii Factos não provados
Não se considerou provado que 10% do total do valor pago pelo Requerente, no âmbito das prestações de serviços de publicidade, fosse imputável a despesas de representação.
iii Fundamentação da fixação da matéria de facto provada
O Tribunal Arbitral tem o dever de selecionar os factos que interessam à decisão da causa e identificar os factos provados e não provados, não tendo de se pronunciar quanto a todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT.
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, determinada com base nas posições assumidas pelas partes e nas várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, conforme decorre do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme o n.º 5 do artigo 607.º do CPC.
Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, a prova documental junta aos autos, nomeadamente o processo administrativo constituído essencialmente pelas notificações efetuadas à Requerente, o projeto do RIT e o RIT final, sem qualquer outro suporte documental, mormente as faturas em que a AT alicerçou as correções impugnadas, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, nos quais se descreve a fonte utilizada para que se os dê como assentes.
Não se deram como provadas, nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.
V. MATÉRIA DE DIREITO
A Requerente entende que o IVA associado à aquisição de serviços de publicidade é integralmente dedutível, ao abrigo dos artigos 19.º e 20.º do CIVA, na medida em que tais serviços visem fomentar e incrementar uma atividade totalmente tributada do adquirente desses serviços.
Já a Requerida, pelo contrário, defende que, as despesas relativas aos serviços acessórios configuram despesas de representação e o IVA incluído nessas despesas encontra-se excluído do direito à dedução, nos termos das alíneas c) a e) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IVA.
O thema decidendum em causa nos presentes autos prende-se, em substância, com a aferição da dedutibilidade em IVA, nos termos do disposto no artigo 20.º do Código do IVA, dos referidos gastos.
No caso em análise, a efetiva prestação de serviços por parte da B..., S.A. à Requerente não vai questionada nos autos, nem nas liquidações controvertidas. Também não se manifestaram, ou foram sequer alegados quaisquer indícios de fraude ou de abuso por parte destas entidades.
Enquadramento legal
O IVA trata-se de um imposto indireto que tributa o consumo e que, em consequência, deve ser um imposto neutro para os operadores económicos, não devendo introduzir distorções na atividade económica, sendo unicamente suportado pelo consumidor final.
O sistema do imposto assenta, em grande medida, no funcionamento do mecanismo da dedução, ou seja, na subtração do IVA suportado nas aquisições efetuadas aos fornecedores ao IVA que é liquidado a clientes, de modo a apurar-se qual a situação perante o Estado (credora ou devedora) em cada período de imposto (mensal ou trimestral). É o chamado método do crédito de imposto, que permite assegurar a sua neutralidade, característica fundamental do sistema do IVA.
O mecanismo de crédito de imposto e o direito à dedução encontram-se previstos nos artigos 167.º a 192.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006 (Diretiva IVA) e, no direito nacional os princípios gerais subjacentes ao exercício do direito à dedução do IVA suportado pelos sujeitos passivos do imposto estão previstos nos artigos 19.º e 20.º do CIVA.
Nos termos da alínea a) do artigo 19.º do Código do IVA, «para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram (…) o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos.
De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 20.º do Código do IVA “[s]ó pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações seguintes: Transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.
No entanto, esta regra geral do direito à dedução, comporta algumas exceções, ou limites, resultantes da necessidade de evitar a fraude e evasão fiscais decorrentes da dedução do IVA incluído em despesas relacionadas com bens e serviços que, pela sua natureza e características, sejam identificados como não essenciais à atividade produtiva ou que, simplesmente, sejam suscetíveis de utilização em fins alheios a uma atividade tributada, visando-se, pela via da exclusão, obstar à dedução do IVA suportado com bens e serviços não essenciais à atividade produtiva ou facilmente desviáveis para consumos particulares.
O artigo 21.º do Código do IVA exclui à dedução o imposto contido, nomeadamente, nos termos da alínea d) nas seguintes despesas:
“(…) Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções;(…)”
Conforme tem sido entendimento da Jurisprudência, “O fundamento de tal exclusão do direito à dedução encontra-se no facto de muitas das situações ali previstas dizerem respeito a IVA suportado nos "inputs" em relação aos quais se configura difícil, ou mesmo impossível, controlar da sua bondade, visando-se, pela via da exclusão, obstar à dedução do imposto suportado com bens ou serviços não essenciais à actividade produtiva ou facilmente desviáveis para consumos particulares, não empresariais/profissionais. Esta norma é, no fundo, uma norma especial anti-abuso em sede de IVA, nos termos em que a doutrina as define.[1]
Relativamente aos “Pacotes Corporate” que forem comercializados, para efeitos do enquadramento dos gastos suportados pelos sujeitos passivos com a “aquisição de direitos de utilização de camarotes nos estádios de futebol”, a AT emitiu a Circular n.º 20/2009 da DGI, na qual se pode ler o seguinte:
(…) 4. Assim, relativamente aos «Pacotes Corporate» que forem comercializados sem discriminação dos serviços neles incluídos, de acordo com a sua natureza, compete ao titular adquirente autonomizar as despesas em função da utilização que lhes tiver sido dada e comprovar a sua indispensabilidade para efeitos do artigo 23° do Código do IRC, dando-lhes o enquadramento tributário que lhes corresponde à sua especificidade para efeitos de determinação do lucro tributável do IRC, bem como, para o exercício do direito à dedução do IVA (sublinhado nosso).
5. Reconhecendo-se a dificuldade quer para os titulares dos «Pacotes» quer para as entidades que os comercializam, em proceder à discriminação de todos os serviços neles incluídos, aceita-se que se proceda ao agrupamento dos serviços em dois conjuntos: um, para os serviços «principais», e outro, para os serviços ditos «acessórios», devendo essa repartição ser consistente com a natureza dos serviços incluídos em cada «Pacote».
6. Consideram-se serviços «principais» os serviços de «publicidade e de promoção da imagem» do titular do «Pacote». Os serviços «acessórios» incluem, nomeadamente, os lugares sentados no camarote ou na bancada adjacente, o catering, os serviços de hospedeiras, os lugares de estacionamento e, os convites para assistir aos jogos das competições europeias no estrangeiro, incluindo viagem, estadia e bilhetes, e ainda, os serviços conexos com a utilização dos camarotes («espaço empresarial»).
(…)
10. A repartição entre 80% respeitante aos serviços «principais» e de 20% para os serviços «acessórios» pode ser aceite para efeitos de enquadramento nas disposições aplicáveis em sede de IRC e de IVA para os «Pacotes» em que essa repartição percentual, tendo presente o que se refere ao «espaço empresarial», seja consistente com a natureza dos serviços efectivamente neles incluídos.
11. Para os «Pacotes Corporate», cuja repartição dos serviços neles incluídos não seja a referida no ponto anterior, os valores ou as percentagens de repartição que vierem a ser calculadas relativamente a cada «Pacote» podem ser igualmente aceites para efeitos de enquadramento nas disposições aplicáveis em sede de IRC e de IVA, desde que sejam consistentes com a natureza das prestações de serviços efectivamente incluídas em cada «Pacote».(…)
Da leitura integral da Circular verifica-se que quando se está perante um "pacote corporate" que engloba serviços que não podem ser distintamente repartidos por cada um dos conjuntos supra referidos (serviços principais e acessórios), a Circular dispõe que a repartição desses serviços pode ser feita em valor ou percentagem, que vierem a ser calculadas pelo titular do "pacote", desde que, mais uma vez, essa repartição seja consistente com a natureza das prestações de serviços efetivamente nele incluídas.
Valor das circulares administrativas
No caso sub judice, a AT considerou que como a prestadora dos serviços de publicidade atribuiu uma percentagem de 10% do valor das faturas a serviços acessórios, referindo ainda no descritivo das faturas a circular n.º 20/2009 da DGI, esses 10% correspondem à prestação serviços acessórios excluídos do direito à dedução do IVA nos termos das alíneas c) a e) do artigo 21.º do Código do IVA.
Ora, tanto na doutrina fiscalista, como na jurisprudência, a conclusão mais sufragada e difundida, aponta no sentido de que a interpretação da lei, realizada pela administração tributária e aduaneira (AT), através de circulares, não tem força de lei, nem possui o caráter de vinculação próprio das normas legais, bem como, não constitui interpretação autêntica e, por isso, a sua legalidade pode ser, sempre, questionada, destacadamente, pela via contenciosa[2].
As circulares são atos que contêm ordens genéricas de serviço que visam padronizar, racionalizar e simplificar o funcionamento dos serviços, no entanto, como se pode ler no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 583/2009, de 18 de novembro, “(…) A circunstância de a Administração Tributária ficar vinculada (n.º 1 do artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária) às orientações genéricas constante de circulares que estiverem em vigor no momento do facto tributário e de ter o dever de proceder à conversão das informações vinculativas ou de outro tipo de entendimento prestado aos contribuintes em circulares administrativas, em determinadas circunstâncias (n.º 3 do artigo 68.º da LGT), não altera esta perspectiva porque não transforma esse conteúdo em norma com eficácia externa.(…)”
Transpondo para o caso em apreço, atendendo a que a Circular refere que “(…) as percentagens de repartição devem ser consistentes com a natureza dos serviços(…)”, não pode a AT qualificar um conjunto de despesas como acessórias tendo apenas por base o descritivo das faturas emitidas pela prestadora, sem procurar perceber o racional subjacente ao apuramento dos 10% mencionado nas faturas.
Repartição do Ónus da Prova
No caso concreto, tendo por referência o que ficou dito, é no essencial uma a questão a decidir, qual seja a de saber a quem compete, para efeitos de aplicação do regime consagrado no 21.º do CIVA, o ónus da prova de que 10% dos serviços faturados pela emitente da fatura correspondem a despesas de representação.
Vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da presunção da verdade declarativa e de boa-fé dos Contribuintes, com base no estipulado no artigo 75.º da LGT, o qual estabelece:
"Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos."
Ora, está em causa o imposto sobre o valor acrescentado em que o ato de liquidação compete ao sujeito passivo, com base nas faturas emitidas e que posteriormente faz refletir nas declarações periódicas que apresenta perante a AT.
Daí resulta que, como regra, o fundamento da liquidação do IVA consta da própria documentação e declarações do contribuinte, apenas competindo à AT assegurar que a liquidação de imposto está em conformidade com as mesmas, as quais, nos termos do art.º 75.º, n.º 1, da LGT, se presumem verdadeiras.
E quando alguém tem a seu favor uma presunção legal não tem que provar o facto a que ela conduz. (artigo n.º 350.º, n.º 1, do Código Civil).
Sendo que o afastamento da presunção ocorre quando:
“as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável (artigo 75.º n.º 2 alínea a) da LGT).
Omissões, erros e inexatidões que não foram arguidas pela AT, mantendo-se incólume a presunção legal a favor da Requerente.
Com base no princípio da verdade declarativa a AT está vinculada a liquidar os impostos com base na declaração do Contribuinte, naturalmente sem prejuízo do direito de proceder, posteriormente, ao controlo dos factos declarados, admitindo-se o afastamento da veracidade de tais declarações se a AT demonstrar, inequivocamente, a existência de um facto tributário não refletido nas mesmas.
Resulta do artigo 74.º n.º 1 da LGT que: "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.", em consonância com o artigo 342.º n.º 1 do CC, " Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.”
Ou seja, sobre a administração tributária recai o ónus de provar os factos constitutivos do direito à liquidação adicional e sobre o sujeito passivo recai o ónus de provar os factos constitutivos do direito à anulação dessa liquidação.
Por força do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, no procedimento de liquidação da iniciativa da Administração Tributária, esta terá de demonstrar a ocorrência dos factos de que deriva o direito à liquidação (os factos, pressupostos da sua existência, qualificação e quantificação do facto tributário) e o sujeito passivo terá de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito.
Neste sentido atente-se na jurisprudência dos tribunais superiores, nomeadamente Acórdãos do STA de 26.02.2014, no Processo n.º 0951/11, Tribunal Central Administrativo Norte de 11.01.2024, Processo n.º 02799/09.0BEPRT, bem como nas decisões arbitrais proferidas nos processos 64/2018-T, de 22 de agosto, 48/2022-T, de 10-07-2022, e 182/2022-T, de 25-05-2023.
Ora, no exercício de 2019 a Requerente contabilizou a totalidade das faturas emitidas pela Prestadora de serviços na conta 6222 – Fornecimentos e serviços externos – Serviços Especializados – Publicidade e Propaganda e 24323232311 – Iva dedutível à taxa normal, sem qualquer discriminação dos serviços incluídos em tais faturas.
Verifica-se, através da prova documental apresentada, que inexiste outra documentação, para além da referência no RIT às faturas emitidas pela Prestadora, que possa comprovar quais os serviços compreendidos nos serviços de publicidade adquiridos pela Requerente, nomeadamente, se foram prestados serviços acessórios e, em caso afirmativo se tais serviços representam 10% do valor da parceria publicitária.
As faturas enquanto documentos particulares gozam, nos termos do disposto no artigo 376º, nº 1, do Código Civil, de força probatória plena quanto à materialidade das declarações atribuídas ao seu autor, se apresentados contra este, o que não é o caso, pois as faturas não foram emitidas pela Requerente.
Como referido por Gonçalves Sampaio, a propósito da força probatória dos documentos particulares[3]: “Na verdade, da conjugação dos normativos dos arts 374º/1 e 376º/1 e 2 resulta que só as declarações contrárias aos interesses dos declarantes se podem considerar plenamente provadas, ou, por outras palavras, que só os factos compreendidos nas subscritas declarações e na medida em que contrários aos interesses dos declarantes se podem considerar plenamente provadas.”
Estamos, pois, no âmbito da livre apreciação da prova pelo julgador, e ainda que não se vislumbre motivo para a prestadora emitir uma fatura respeitante aos denominados “Pacotes Corporate” com a imputação de uma percentagem a serviços acessórios, sem que que tenham sido prestados alguns destes serviços, na ausência da discriminação dos serviços prestados (principais e acessórios), e do critério que presidiu a tal repartição, este documento, por si só, não é suficiente para fazer prova de que foram disponibilizados lugares em camarotes ou na bancada adjacente, o catering, serviços de hospedeiras, lugares de estacionamento e convite para assistir aos jogos os serviços acessórios que, constituem despesas de representação excluídas do direito à dedução nos termos do Código do IVA.
Efetivamente, a AT deveria ter levado mais longe a sua atividade instrutória, ao invés de esgotar a investigação no descritivo das faturas emitidas pela prestadora, no sentido de apurar factos que permitissem tributar em termos diferentes dos declarados pelo Contribuinte, ou seja, a AT deveria ter em consideração outros elementos, nomeadamente, informações complementares do sujeito passivo, que permitissem identificar os serviços acessórios efetivamente prestados e mesmo aferir como foi determinada a percentagem de 10% pela emitente da fatura.
E da análise do RIT, resulta que a AT não procurou aprofundar a investigação sobre os serviços de publicidade efetivamente prestados, pois a Requerente não foi notificada para juntar os contratos (se os houvesse), nem tão pouco para prestar esclarecimentos relativos às faturas que sustentam as liquidações impugnadas ou para confirmar a percentagem atribuída aos serviços acessórios que, salienta-se, foi atribuída pela emitente da fatura e não pela Requerente.
A mera a alusão ao descritivo das faturas, autoria da emitente e não da Requerente, não é suficiente para que possa dar como provado quais os valores, dos serviços de publicidades faturados, que são imputáveis à presumida disponibilização de serviços acessórios como bilhetes, lugares de estacionamento, camarotes, catering subsumíveis à categoria de despesas de representação e, por isso, excluídas do direito à dedução.
E, nesta medida, não tendo sido realizadas outras diligências instrutórias pela AT no âmbito do procedimento tributário, como salienta a decisão arbitral no processo n.º 14/2021 de 21 de novembro de 2021: “(…) O principal efeito jurídico da insuficiência das diligências instrutórias a realizar pela Administração no âmbito do procedimento tributário traduz-se, em sede de impugnação judicial, num non liquet probatório sobre os factos materiais da causa, implicando que o tribunal emita uma pronúncia desfavorável em relação à parte a quem incumbia fazer a prova dos factos, à luz dos critérios de repartição do ónus da prova do artigo 74.º da LGT (Serena Cabrita Neto/Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, Vol. I, Coimbra, 2017). (…)”
Outrossim, considerando que o ónus da prova dos factos constitutivos do direito de liquidação adicional de IVA pertence à AT, caberia a esta provar a factualidade que a levou a não aceitar a respetiva dedução do imposto, factualidade essa que tem de ser suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) - (Vide Acórdão do TCA Norte, de 8.02.2018, proferido no âmbito do processo 01981/08.1BEPRT).
In casu, a AT assumiu como bom o mencionado nas faturas emitidas pela […] e dispensou-se de demonstrar que os serviços que a prestadora reputa como acessórios nas faturas consubstanciam, em primeiro lugar, despesas abrangidas pelo artigo 21.º do CIVA e, em segundo lugar, ainda que fossem abrangidas pelo artigo 21.º, em qual das alíneas do n.º 1, c), d) ou e) estavam abrangidas.
Em resumo, a prova produzida nos autos não permite concluir, sem qualquer margem de dúvida, pela existência de facto tributário e consequentemente, pela desconsideração do direito à dedução do IVA.
Conclui-se, assim, que as correções efetuadas e as consequentes liquidação enfermam de ilegalidade, por violação do disposto nos artigos 58.º, 74.º e 77.º todos da LGT.
Anulado o ato de liquidação de imposto, não pode deixar de ser decretada a anulação das liquidações de juros compensatórios, nos termos dos artigos 35º, nº 8, 100º, da LGT e 24º, nº 1, al. b), do RJAT.
QUESTÕES DE CONHECIMENTO PREJUDICADO
Na sentença, deve o juiz pronunciar-se sobre todas as questões que deva apreciar, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT).
As questões sobre que recaem os poderes de cognição do tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
Em face da solução dada à questão da repartição do ónus da prova relativa ao direito à dedução do IVA, no regime aplicável, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões incluídas no pedido de pronúncia arbitral
VI. DECISÃO
Termos em que se decide, julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, nessa medida:
-
Anular o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa, as liquidações de IVA e respetivas liquidações de juros compensatórios;
-
Condenar a Requerida nas custas do processo.
VII. VALOR DO PROCESSO
Atendendo ao disposto no artigo 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), fixa-se ao processo o valor de € 805,00.
VIII. CUSTAS
Nos termos da Tabela I, anexa ao RCPAT, as custas são no valor de € 306,00, a suportar pela Requerida, conforme o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, 28 de março de 2025
O Árbitro
Cristina Coisinha
[1] Cfr. Gustavo Lopes Courinha, “A Cláusula Geral Anti-Abuso no Direito Tributário - Contributos Para a Sua Compreensão”, Almedina, 2004, pág.91 e ss.; J. L. Saldanha Sanches, “Os limites do planeamento fiscal”, Coimbra Editora, 2006, pág.295 e ss.) – Vide Acórdão do TCA Norte, proferido no âmbito do processo n.º 1438/09.3BEBRG, de 21.12.2016.
[2] Acórdão do STA de 16-09-2020, no Processo n.º 1988/07.6BEPRT
[3] A Prova por Documentos Particulares na Doutrina, na Lei e na Jurisprudência», 2ª ed, pag 111