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SUMÁRIO
A suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação prevista no artigo 46º., nº. 1, da LGT, não se aplica quando a inspeção tenha uma natureza “interna”, o que sucede quando não ocorre qualquer diligência externa nos atos de inspeção realizados. Tal conclusão é reforçada pelo facto de o ajustamento em causa ter sido operado numa sociedade dominada integrada no RETGS, tendo sido a própria AT a qualificar como interna a inspeção realizada a esta sociedade.
DECISÃO ARBITRAL
A..., S.A., NIF..., com sede em ..., ...-... ...(«Requerente»), apresentou, nos termos legais, pedido de constituição de tribunal arbitral, sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.
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RELATÓRIO
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O pedido
A Requerente pede declaração da ilegalidade do ato de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) relativo ao exercício de 2019, identificado pelo n.º 2024..., bem como da respetiva liquidação de juros moratórios com o n.º 2024..., e, ainda, da demonstração de acerto de contas identificada pelo n.º 2024..., todas associadas à compensação n.º 2024... .
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O litígio
Posição da Requerente
A Requerente fundamenta o pedido nos seguintes termos:
A Requerente é uma sociedade anónima de Direito português, com sede e direção efetiva em território nacional, que exerce, a título principal, a atividade de gestão de participações sociais noutras sociedades, sendo a sociedade dominante do consolidado fiscal do grupo de sociedades do qual faz parte, ao qual é aplicável o Regime Especial de Tributação de Grupos de Sociedades («RETGS»).
No período de tributação de 2019, a Requerente era, (continuando a ser atualmente), a sociedade dominante do perímetro do grupo sujeito ao RETGS, o qual, incluía diversas sociedades dominadas.
Por referência ao período de tributação de 2019, em cumprimento das suas obrigações fiscais, a Requerente procedeu, a 31 de julho de 2020, à entrega da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC do Grupo.
Entre as várias entidades que compõem o RETGS da Requerente inclui-se a sociedade B... S.A. (“B...”), pessoa coletiva número ..., com sede em ..., ...-... ..., uma sociedade anónima que exerce a sua atividade no âmbito do CAE principal “10395 – Preparação e conservação de frutos e de produtos hortícolas por outros processos” e dos CAEs secundários “01130 – Cultura de produtos hortícolas, raízes e tubérculos” e “10893 –Fabricação de outros produtos alimentares diversos, não especializado”.
Esta sociedade dedica-se essencialmente à transformação em moldes industriais de tomate, submetendo-o a várias operações de base física e química, de modo a produzir produtos alimentares destinados ao consumo, dispondo de dois estabelecimentos produtivos em Portugal, na ... e em ... (sede social), enquadradas na NUT II ... e NUT III ... .
Em 2010, a B... deu início ao seu processo de expansão internacional com a aquisição de uma fábrica em Espanha (Sevilha), duplicando a capacidade de produção da empresa.
Posteriormente, em 2012, foram adquiridas mais duas unidades produtivas, no Chile, visando garantir mais uma colheita por ano, conseguindo assegurar a produção de produtos à base de tomate durante todo o ano.
No decurso do ano de 2022, os Serviços de Inspeção Tributária (“SIT”) deram início a um procedimento de inspeção tributária interna (ao abrigo da ordem de serviço OI2022...) que teve por objeto a validação dos requisitos subjacentes aos benefícios fiscais de SIFIDE e RFAI de que a B... beneficiou no período de tributação de 2019.
A inspeção tributária foi conduzida essencialmente à distância, dada a sua natureza interna, não tendo a AT visitado as instalações fabris em ... e na ... .
No seguimento da inspeção, e volvidos vários meses desde o seu início, a B... acabou por ser notificada do projeto de correções do relatório de inspeção em junho de 2023.
A Requerida propôs a desconsideração do montante total de RFAI de que a Requerente beneficiou em 2019, o qual se cifrou em € 222.581,28, tendo a Requerente tempestivamente exercido o seu direito de audição prévia.
No entanto, a Requerida viria a manter todas as correções no âmbito de relatório final de inspeção dirigido à B... em 20 de julho de 2023.
A 19 de julho, i.e., um dia antes de ter remetido à B... o relatório final referente à inspeção tributária que lhe dirigiu, a Requerida iniciou um novo procedimento de inspeção, desta feita dirigido à Requerente, enquanto entidade dominante do RETGS em que se integra a B..., o qual foi declarado encerrado pela Requerida a 21 de fevereiro de 2024, tendo sido tal procedimento classificado como externo.
O procedimento inspetivo à Requerente visou essencialmente dar corpo à correção ao RFAI de 2019 resultante do procedimento de inspeção previamente realizado à B..., tendo desembocado nos atos tributários agora em crise.
As correções foram posteriormente concretizadas, já em 2024, através da emissão de um ato de liquidação adicional de imposto, liquidação de juros moratórios e respetiva demonstração de acerto de contas, dirigidos à Requerente enquanto sociedade dominante do grupo, tendo sido disponibilizados à Requerente através da Via CTT a 09/03/2024, não tendo gerado IRC a pagar, atentos os prejuízos registados no RETGS da Requerente nesse período de tributação.
Não se conformando com o ato de liquidação em causa a Requerente interpôs o presente processo arbitral.
A Requerente entende que a Requerida suporta a sua atuação em duas linhas de argumentação a saber: i) alegada não elegibilidade da atividade da B... para o âmbito de aplicação do RFAI; e ii) suposta não elegibilidade dos investimentos que, em concreto, foram realizados para os benefícios do RFAI.
Refere que este entendimento da Requerida está em expressa oposição com o entendimento que esta mesma entidade já havia assumido anteriormente no âmbito de uma inspeção tributária ao RFAI de que a B... beneficiou no exercício de 2015, na qual a elegibilidade desta entidade para beneficiar do RFAI foi expressamente reconhecida por si.
No âmbito da segunda linha de argumentação, a Requerida procura descaraterizar a elegibilidade dos investimentos realizados para efeitos de RFAI, alegando, nomeadamente, que os mesmos não contribuíram para o aumento da capacidade produtiva ou correspondem a meras substituições de ativos.
O tema aqui em causa não é novo, tendo a AT, com uma atuação levada a cabo com os mesmos fundamentos e padecendo das mesmas ilegalidades, procurado desconsiderar o RFAI de que a B... nos exercícios de 2016, 2017 e 2018, tendo todos esses atos de liquidação daí decorrentes sido objeto de expressa e integral anulação no âmbito dos processos arbitrais n.º 447/2022-T, 203/2023-T e 510/2023-T, respetivamente.
A Requerente foi notificada do projeto de correções do relatório de inspeção em junho de 2023, tendo exercido o seu direito de audição prévia remetendo-a à AT a 14/07/2023, o qual foi tratado como um mero pro forma, pois o relatório final a 20/07/2023, reproduziu o projeto nos exatos termos do mesmo.
A 19/07/2023, a Requerida iniciou um novo procedimento de inspeção, dirigido à Requerente, na qualidade de entidade dominante do grupo, o qual foi declarado encerrado a 21/02/2024, tendo sido classificado como externo e notificado à Requerente antes de a B...ter sido notificada do relatório final de inspeção que desconsiderou o RFAI.
No entanto, o mesmo não envolveu a realização pela AT de qualquer diligência nas instalações da Requerente, pelo que as correções aqui em causa, integralmente resultantes de um procedimento de inspeção de natureza interna realizado à B..., foram posteriormente concretizadas, já em 2024, através da emissão de um ato de liquidação adicional de imposto, liquidação de juros moratórios e respetiva demonstração de acerto de contas.
Em virtude disso, não foi, e continua a não ser, sequer possível à ora Requerente apreender devidamente qual o íter cognoscitivo que foi seguido pela AT, tendo assim sido irremediavelmente prejudicado o seu direito de defesa, na medida em que a AT se limitou a conferir à sua atuação uma aparência vaga e difusa de fundamentação.
A Requerente de seguida discorre sobre o enquadramento fáctico: i) da atividade da B...; ii) do contexto em que foram realizados os investimentos elegíveis para RFAI; e iii) dos fundamentos de facto pelos quais cada investimento, em concreto, sempre terá de ser considerado elegível para efeitos de RFAI.
Menciona que fez investimentos nas diversas fases do seu processo produtivo, os quais contribuíram – e continuam a contribuir – para o aumento da sua capacidade produtiva instalada, a) Investimentos na melhoria de processo da fábrica de ..., b) Investimentos na segurança de processo da fábrica de ..., c) Investimentos na melhoria de processo da fábrica da ..., d) Investimentos nos edifícios e instalações de ..., e) Investimento em máquina para troca de bidons, f) Investimento em quadro elétrico para cozinha industrial – fase 2, g) Investimento em instalações para a linha de plástico, h) Investimentos no “projeto 20/2019 – máquina para fecho de caixas”, “projeto 23/2019 – Bomba para doseador do plástico”, e “projeto 24/2019 – sistema de visão”.
Invoca que apenas foi notificada dos atos tributários após se ter concretizado a caducidade do direito à liquidação, aspeto que sempre terá de implicar a imediata e integral anulação dos mesmos atos por violação das regras de caducidade, à semelhança do que se verificou já em relação ao ato de liquidação adicional de IRC de 2018, tal como expressamente reconhecido na decisão de 16 de maio de 2024, relativa ao processo arbitral n.º 510/2023-T.
Invoca igualmente a preterição de formalidades essenciais, uma vez que, não obstante a B...ter sido formalmente notificada para exercício do seu direito de audição prévia, a verdade é que a AT tornou tal momento procedimental num exercício completamente artificial e vazio, limitando-se a atribuir uma resposta genérica e padronizada ao mesmo que em momento algum refletiu verdadeiramente, e como se impunha, sobre as circunstâncias do caso concreto.
Invoca ainda a falta de fundamentação do ato tributário, em razão de a AT se ter limitado a tecer algumas conclusões no sentido de negar à entidade dominada o benefício do RFAI, nunca concretizando nem esclarecendo devidamente as razões pelas quais entende não ser o mesmo aplicável nem nunca tendo esclarecido, como lhe competia, com que tipo de elementos e documentação adicional pretendia ser provida, de forma a clarificar as suas questões.
Por último discorre sobre uma pretensa não inclusão da atividade da B... no âmbito de aplicação do RFAI, da elegibilidade dos seus investimentos e da criação de postos de trabalho.
Termina por pedir que o pedido de pronúncia arbitral seja julgado completamente procedente por provado, e, consequentemente, ser declarada a ilegalidade do ato tributário de liquidação adicional de IRC relativo ao exercício de 2019.
A Requerente inclui no pedido de anulação o valor liquidado de juros moratórios de € 1.172,98.
Posição da Requerida
Por sua vez a Requerida na sua Resposta fundamenta a sua posição da seguinte forma:
Face ao teor da petição inicial da Requerente, a Requerida acompanha integralmente a posição assumida no relatório de inspeção tributária que conduziu à emissão dos atos tributários o qual consta do processo administrativo, sendo assumido como Resposta, nos termos e para os efeitos do artigo 17.º do RJAT, dando-se por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
Impugna os factos alegados pela Requerente que se encontrem em oposição com o referido relatório, considerado no seu conjunto, assim como impugnados vão os documentos juntos à sua petição inicial.
Conclui pela improcedência do pedido, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os atos tributários impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a Requerida do pedido.
Em sede de alegações, a Requerida veio acrescentar um conjunto de considerações, conforme segue:
Quanto à alegada caducidade do direito à liquidação, a Requerida sustenta que a Requerente pretende fazer vingar a tese de que a inspeção realizada foi exclusivamente interna, assentando esse seu entendimento na circunstância de que os SIT não terão realizado qualquer visita às instalações da Requerente e, por conseguinte, não terão sido realizadas quaisquer diligências externas. Quando, de facto, o que releva para a qualificação da inspeção como interna ou externa, não é tanto se os SIT visitam fisicamente as instalações da Requerente, mas sim qual a origem da informação e da documentação que está na base das conclusões inspetivas e investigatórias realizadas pelos SIT. Cita o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.º 292/12.2BELRA datado de 04-05-2023, em que se esclarece que: “Uma ação inspetiva interna abrange os casos em que a AT leva a efeito toda a sua atividade nos seus serviços, ou seja, os casos em que atua com base na informação de que dispõe, fruto, designadamente, das obrigações declarativas a cargo dos contribuintes. São ações inspetivas externas aquelas em que existe alguma atividade da inspeção que revele um cariz investigatório que extravasa os tais dados de que a AT dispõe nas suas bases de dados.”
Tal faz soçobrar a linha argumentativa da Requerente ao querer fazer valer a tese de que como não terá sido visitada pelos SIT, então a inspeção realizada foi interna. A inspeção realizada foi externa porque os elementos utilizados para fundamentar as conclusões dos SIT não resultam apenas dos elementos declarativos apresentados pela Requerente e já na posse da administração fiscal, mas, antes, dos elementos solicitados e apresentados pela Requerente no âmbito da inspeção realizada pelos SIT.
No que se refere à matéria em discussão, alega que a Requerente não logrou provar, quer na fase inspetiva, quer no PPA, quer na inquirição, quais os investimentos específicos que cumprem os requisitos de serem (i) novos, (ii) impliquem aumento de capacidade instalada de produção e (iii) que fundamentem o aumento de número de trabalhadores em relação direta com o investimento realizado em ativo tangível imobilizado.
O RFAI é, segundo a Requerida, um regime de auxílios de base comunitária, com finalidade regional âmbito sectorial, que pode ser usufruído no âmbito de um projeto de investimento inicial gerador de novos postos de trabalho.
Como tal, consideram-se investimentos iniciais, um investimento em ativos corpóreos ou incorpóreos relacionado com: (i) a criação de um novo estabelecimento, (ii) no aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, (iii) a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou (iv) uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.
A simples substituição de ativos individuais sem alterar fundamentalmente o processo de produção global constitui um investimento de substituição que não é elegível para auxílios ao investimento regional, uma vez que não se qualifica como uma mudança fundamental de um processo de produção global, e, portanto, não é considerado como constituindo um investimento inicial. Isso também se aplica se itens individuais de equipamento forem substituídos por outros que têm maior desempenho, a menos que isso leve a uma alteração fundamental no processo de produção global.
Com efeito, por força da sua incompatibilidade com o conceito de investimento inicial, este tipo de apoios de Estado sempre esteve e está vedado a investimentos de substituição pelas normas europeias, e tal figurava explicitamente no parágrafo 34 das Orientações Relativas aos Auxílios Estatais com Finalidade Regional para o período 2007-2013 (OAR 2007-2013), e no ponto 4.4 das OAR de 1998.
Concluindo a Requerida que a aceitação de investimento de substituição e modernização (sem ser uma alteração fundamental do processo de produção global), que são investimentos correntes de manutenção da operacionalidade e competitividade de um qualquer sistema produtivo, colide com o objetivo de crescimento económico e criação de emprego, razão pela qual, são afastados do conceito de investimento inicial na vertente de expansão, isto é, da criação de um novo estabelecimento, aumento ou extensão da capacidade do estabelecimento já existente ou diversificação da produção (produtos não fabricados anteriormente).
Segundo a Requerida esta é, aliás, a única interpretação do conceito de investimento inicial que tem potencial para concretizar o objetivo de criação de emprego, articulando-se perfeitamente com aquele conceito que consta das OAR 2014-2020, alíneas k) e o) das definições, e cujo elemento comum e fundamental radica precisamente na sua natureza incremental, isto é, mantendo simultaneamente os postos de trabalho pré-existentes o os novos criados em razão do investimento. Ou dito de outro modo, se o conceito de investimento inicial fosse compatível com investimento de substituição de máquinas, equipamentos ou processos pré-existentes, não teria capacidade para incrementar o crescimento económico e criar emprego.
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Tramitação processual
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 24/06/2024.
Os árbitros que constituem este Tribunal foram designados, nos termos legais, pelo CAAD, aceitaram tempestivamente as nomeações, as quais não foram objeto de impugnação.
O tribunal arbitral ficou constituído em 28/08/2024.
A Requerida apresentou resposta e juntou o PA em 30/9/2024.
Por despacho arbitral de 14/10/2024, foi notificada a Requerente parta indicar os factos essenciais de entre os alegados que considera ainda controvertidos e passíveis de prova ou contraprova testemunhal, tendo a mesma dado cumprimento em 28/10/2024.
Foi agendado o dia 13/12/2024 para a reunião do art.º 18.º do RJAT, mas por impossibilidade da Requerente foi a mesma reagendada para o dia 11/12/2024, a qual veio a ter lugar, tendo sido produzida prova testemunhal e ordenado que processo seguisse para alegações, o que se encontra devidamente documentada em ata constante do sistema processual da CAAD.
Requerente e Requerida apresentaram alegações em 01/01/2025 e 09/01/2025, respetivamente.
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SANEAMENTO
O tribunal arbitral foi regularmente constituído. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas (artigos 4º. e 10º., nº. 2, do mesmo diploma e artigo 1º. da Portaria nº. 112-A/2011, de 22 de março) e estão devidamente representadas.
O processo não enferma de nulidades ou revela a existência de outras questões de conhecimento
Antes de passarmos à fixação da matéria de facto, pelo facto de a Requerida na sua Resposta ter impugnado os documentos juntos à petição inicial, torna-se necessário apreciar esta questão.
A Requerida não invoca minimamente onde se arrima para impugnar os documentos juntos com a petição inicial, sendo que, não se compreende como podem ser impugnados os documentos n.ºs 1 a 5, que correspondem às liquidações, acertos, juros, declarações fiscais e certidão da Conservatória Registo Comercial, além de outros nas mesmas circunstâncias.
Só por essa razão a impugnação “vazia”, desprovida de conteúdo, seria imediatamente de improceder.
O artigo 444.º do Código de Processo Civil regula a impugnação da genuinidade do documento e o artigo 446.º a ilisão da autenticidade ou da força probatória de documento. Repare-se que a Requerida não nos diz se argui um, ou outro. Seja como for, ambas as situações são seguidas de potestativa produção de prova, o que no presente processo arbitral não foi requerido, nem produzido. A questão será então avaliada segundo as regras gerais da produção de prova e não de uma putativa arguição ou impugnação da genuinidade do documento ou da ilisão da autenticidade ou força probatória de documento.[1]
Considerando os articulados das partes, os documentos juntos, o processo administrativo, junto pela AT e a prova produzida em reunião do artigo 18º. do RJAT, são considerados provados os factos que a seguir se indicam.
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PROVA
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Factos provados:
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A Requerente é uma sociedade anónima de Direito português, com sede e direção efetiva em território nacional, que exerce, a título principal, a atividade de gestão de participações sociais noutras sociedades, sendo a sociedade dominante do consolidado fiscal do grupo de sociedades do qual faz parte, ao qual é aplicável o RETGS – (provado pelo relatório da Inspeção tributária junto sob o nº. 9 com o PPA).
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No período de tributação de 2019, a Requerente era a sociedade dominante do perímetro do grupo sujeito ao RETGS, o qual, incluía diversas sociedades dominadas – (provado pelo relatório da Inspeção tributária junto sob o nº. 9 com o PPA).
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Por referência ao período de tributação de 2019, em cumprimento das suas obrigações fiscais, a Requerente procedeu, a 31 de julho de 2020, à submissão da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC do Grupo – (provado pelo doc. 4 junto com o PPA).
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Entre as várias entidades que compõem o RETGS da A... inclui-se a B..., S.A. (doravante “B...”), com NIF ... com sede em ..., ...-... ..., uma sociedade anónima com o objeto no campo do CAE principal “10395 – Preparação e conservação de frutos e de produtos hortícolas por outros processos” e dos CAEs secundários “01130 – Cultura de produtos hortícolas, raízes e tubérculos” e “10893 – Fabricação de outros produtos alimentares diversos, não especializado” (como demonstram os CAE na sua certidão permanente – cf. doc. n.º 5, junto com o PPA).
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A B... dedica-se essencialmente à transformação em moldes industriais de tomate, submetendo-o a várias operações de base física e química de modo a produzir produtos alimentares destinados ao consumo, desde concentrados de tomate até produtos pré‑cozinhados (e.g., molho de tomate com legumes, ketchup, molho de francesinha, entre outros), para posterior venda a segmento de retalho ou a segmento industrial, dispondo de dois estabelecimentos produtivos em Portugal, sitos na ... e em ... (sede social), inseridas na NUT II ... e NUT III ..., (provado pelo doc. 4 junto com o PPA e pelo relatório da Inspeção tributária junto sob o nº. 9 com o PPA).
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Esta atividade pode ser resumida em quatro etapas, a saber: i) a etapa de receção, avaliação e tratamento primário da matéria-prima; ii) a etapa de processamento e transformação para venda; iii) a etapa do enchimento, embalamento e rotulagem; e iv) a etapa de armazenagem – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA)
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No âmbito da primeira etapa, a matéria-prima é sujeita a uma linha de processamento de produção de tomate industrial, no âmbito do qual o mesmo é objeto de receção, classificação e validação de qualidade – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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Posteriormente, a matéria-prima é sujeita a um tratamento primário de lavagem, trituração, aquecimento e refinação para obtenção de sumo de tomate – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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De seguida, o tomate é submetido a um processo de evaporação (ou corte e pelagem), para a obtenção do extrato de tomate – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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Por último, o tomate é submetido a processos de pasteurização e enchimento asséptico dos sacos – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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Desta primeira etapa resultam três tipos de produto: i) concentrado de tomate (“hot-break” e “cold-break”); ii) molho de pizza; e iii) tomate em cubos; sendo os mesmos sujeitos a novos momentos de transformação na segunda etapa de produção – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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Seguidamente, no âmbito da segunda etapa, a matéria-prima é encaminhada para uma linha de processamento de transformação para retalho e “food servisse” onde é misturado e cozido o tomate industrial com outros ingredientes, dando-se nova pasteurização – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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Os produtos obtidos no final desta segunda etapa correspondem essencialmente a: i) polpas e concentrados; ii) molhos e ketchup; e iii) tomate pelado e em pedaços. Posteriormente, os produtos produzidos passam para as suprarreferidas etapas de embalamento, rotulagem e armazenamento em paletes – (provado pelos docs. 14 a 24 juntos com o PPA).
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Em 2019, a B.. efetuou os seguintes investimentos nas diversas fases do seu processo produtivo, a saber:
i) «Melhoria de processo de ...»;
ii) «Segurança de processo de ...»;
iii) «Melhoria de processo de ...»;
iv) «Edificios e instalações de ...»;
v) «Máquina para troca de bidons*;
vi) «Quadro elétrico para cozinha industrial - Fase 2»;
vii) «Instalações para linha do plástico»;
viii) «Projeto 20/2019 - Máquina para fecho de caixas»;
ix) «Projeto 23/2019 - Bomba para doseador de plástico»; e
x) «Projeto 24/2019 - Sistema de visão».
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A B... foi objeto de uma ação de inspeção classificada pela AT de “interna de âmbito parcial” levada a cabo pela Direção de Finanças de Santarém, (ao abrigo da ordem de serviço OI2022...) que teve por objeto a validação dos requisitos subjacentes aos benefícios fiscais de SIFIDE e RFAI de que a B... beneficiou no período de tributação de 2019, (provado pelo doc. 6 junto com o PPA).
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A inspeção tributária foi conduzida à distância, dada a sua natureza interna, não tendo a AT visitado as instalações fabris da Requerente – (provado pelo documento nº. 6 junto com o PPA).
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No seguimento da inspeção, foi notificada à B... o projeto de correções do relatório de inspeção em junho de 2023 (provado pelo doc. 6 junto com o PPA, bem como pelo depoimento das testemunhas).
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A B..., exerceu o seu direito de audição prévia, remetendo-a à AT a 14 de julho de 2023, (provado pelo doc. 7 junto com o PPA).
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A Requerida por ofício número ..., de 2023/07/20, notificou a B...l do relatório de inspeção final, onde por despacho do Exmo. Senhor Chefe de Divisão foi validado o parecer do Chefe de equipa:
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A 31/10/2023 foi iniciado um novo procedimento de inspeção, desta feita dirigido à Requerente enquanto sociedade dominante do RETGS em que se integra a B..., para aplicar no RETGS as correções na esfera da B..., procedimento credenciado pela ordem de serviço n.º OI2022..., tendo o mesmo sido classificado pela AT como “externo”, o qual foi declarado encerrado pela AT a 21/02/ 2024 (provado pelo doc. 9 junto com o PPA).
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Esta inspeção designada como “externa” não envolveu a realização pela AT de qualquer diligência nas instalações da Requerente ou de terceiros, mas apenas diligências puramente internas da AT – (provado pelo doc. n.º 9 junto ao PPA, bem como pelo depoimento das testemunhas).
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As correções foram posteriormente concretizadas, através da emissão de um ato de liquidação adicional de imposto de IRC a 06/03/2024, liquidação de juros compensatórios e respetiva demonstração de acerto de contas emitidas a 08/03/2024, dirigidos à Requerente enquanto sociedade dominante do grupo, notificado via CTT a 09/03/2024, visando a incorporação das correções feitas ao RFAI da B... no RETGS do Grupo, não tendo gerado IRC a pagar, atentos os prejuízos registados no RETGS da Requerente nesse período de tributação– (provado pelos docs. 1,2 e 3 juntos com o PPA).
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A B... foi objeto de inspeção tributária com referência ao RFAI do exercício de 2015, tendo a AT reconhecido nesse âmbito que “após análise aos elementos recebidos e respeitantes ao benefício fiscal RFAI parecem-nos estar cumpridas as condições para o sujeito passivo poder beneficiar da dedução à coleta, no ano 2015, não nos oferecendo também dúvidas quanto aos cálculos efetuados relativos a essa mesma dedução” – (provado pelo relatório final de inspeção ao exercício de 2015 junto com o PPA. como doc. n.º 10).
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De modo diverso, a AT desconsiderou o RFAI de que a B... beneficiou em 2016, tendo esse ato de liquidação adicional de imposto relativo a 2016 sido objeto de integral anulação em sede de arbitragem tributária, mais concretamente no processo n.º 447/2022-T, o qual, entretanto, já transitou em julgado – (provado pelo doc. 11 junto com o PPA).
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No decurso do ano de 2021, a AT deu início a um procedimento de inspeção tributária interna à B... (ao abrigo da ordem de serviço OI2020...) que teve por objeto a validação dos requisitos subjacentes aos benefícios fiscais de SIFIDE e RFAI de que esta entidade beneficiou no período de tributação de 2017, tendo sido objeto de integral anulação em sede de arbitragem tributária, mais concretamente no processo n.º 203/2023-T, o qual, entretanto, já transitou em julgado – (provado pelo doc. 12 junto com o PPA).
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No decurso do ano de 2020, a AT deu início a um procedimento de inspeção tributária interna à B... (ao abrigo da ordem de serviço OI2020...) que teve por objeto a validação dos requisitos subjacentes aos benefícios fiscais de SIFIDE e RFAI de que esta entidade beneficiou no período de tributação de 2018, tendo sido objeto de integral anulação em sede de arbitragem tributária, mais concretamente no processo n.º 510/2023-T, o qual, entretanto, já transitou em julgado – (provado pelo doc. 13 junto com o PPA).
Os factos dados por provados resultam da prova testemunhal, bem como da documentação junta aos autos, nos que constam do processo administrativo, apreciados na perspetiva formal que foi dilucidada supra e essencialmente porque se está perante documentos de origem da própria Requerida e todos já considerados e relevados como factos em todos os processos mencionados na matéria de facto dada como provada.
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Factos não provados
Não existem factos não provados com relevância para a decisão da causa.
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O DIREITO
As questões a resolver no presente processo são as seguintes:
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Alegada caducidade do direito de liquidação;
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Alegada falta de fundamentação do ato de liquidação;
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Alegada preterição de formalidades legais no que se refere ao exercício do direito de audição no RIT emitido para a B...;
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Elegibilidade da atividade da B...para o âmbito de aplicação do RFAI;
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Elegibilidade dos investimentos que, em concreto, foram realizados para os benefícios do RFAI.
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Da alegada caducidade do direito de liquidação
Deve analisar-se em primeiro lugar a arguida caducidade do direito de liquidação, uma vez que a eventual procedência prejudicaria a análise das restantes questões.
Para efeitos de caducidade, rege o disposto no artigo 45.º, n.º 1 da LGT: “o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”. Nos termos do n.º 4 daquele mesmo artigo prevê-se que “o prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário”.
O artigo 8.º, n.º 9 do Código do IRC, determina que “o facto gerador do imposto considera-se verificado no último dia do período de tributação”.
Conforme preceitua o artigo 46.º, n.º 1, da LGT, “O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da ação de inspeção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo desde o seu início, caso a duração da inspeção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação, acrescido do período em que esteja suspenso o prazo para a conclusão do procedimento de inspeção”.
No presente caso, resulta do RIT que o período de tributação da Requerente coincide com o ano civil, o que significa que, relativamente ao IRC do período de tributação de 2019, o facto tributário verificou-se no dia 31.12.2019. Por conseguinte, o direito de liquidação de imposto pela Requerida caduca no dia 31.12.2023.
Resulta dos autos que foi emitido um ato de liquidação adicional de imposto de IRC a 6/3/2024, liquidação de juros compensatórios e respetiva demonstração de acerto de contas emitidas a 8/3/2024, dirigidos à Requerente, enquanto sociedade dominante do grupo.
Conforme provado, a AT iniciou o procedimento de inspeção à Requerente em 31/10/2023, o qual foi declarado encerrado pela AT a 21/02/2024, pelo que a Requerida alega ter ocorrido a suspensão do prazo de caducidade, sendo, na sua visão, a liquidação tempestiva.
Conforme se alcança da citada regra de suspensão, esta só opera quando se trate de inspeção “externa”. Assim, enquanto a Requerente alega de que se trataram de inspeções internas, logo, não se verificou qualquer suspensão do prazo de caducidade, a Requerida pugna em sentido contrário.
Com interesse para o caso, importa referir que a natureza da inspeção, externa ou interna, tem também relevância para o que preceitua o artigo 63.º, n.º 4, da LGT, de que só pode “haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço (…).
De onde se conclui que a inspeção, quando qualificada como “externa”, tem, entre outras, duas consequências muito importantes na relação jurídico-tributária: (i) implica a suspensão do prazo de caducidade e (ii) impossibilita, por regra, a realização de nova inspeção.
Vejamos então os conceitos previstos na lei, em concreto no artigo 13.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária (RCPIT):
Quanto ao lugar da realização, o procedimento pode classificar-se em:
a) Interno, quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos por esta detidos ou obtidos no âmbito do referido procedimento;
*A frase sublinhada foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 1 de julho
b) Externo, quando os atos de inspeção se efetuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso
Face à factualidade dada como provada e ao direito aplicável, desde já se adianta que deve ser dada razão à Requerente, conforme se explana de seguida.
Realça-se que a natureza da ação de inspeção se reporta, segundo a letra da lei, “ao lugar da (sua) realização”, sendo que, no caso da inspeção externa, a lei prevê que os atos se realizem, total ou parcialmente, nas instalações dos sujeitos passivos ou terceiros, o que reforça a necessidade de haver deslocação por parte dos inspetores.
Conforme assinala José Maria Pires, em anotação ao citado artigo 46.º, n.º 1, da LGT (LGT anotada e comentada): “a ratio deste n° 1 é a de estabelecer um período tido por razoável pelo legislador para a duração da ação de inspeção externa. No âmbito deste tipo de inspeções, a administração tributária desloca-se junto dos sujeitos passivos ou outros obrigados, ou de terceiros com os quais aqueles mantenham relações económicas, ou a qualquer local a que tenha acesso (alínea b; do artigo 13ª do RCPIT), para a prática de atos de inspeção, que incluem a recolha e consulta de documentos, informações ou outros elementos, a verificação de sistemas informáticos, o controlo de bens em circulação, etc., de modo a esclarecer a situação tributária do inspecionado. Durante este período, a administração tributária está impossibilitada de praticar atos de liquidação, já que se encontra numa fase de recolha de elementos de prova e de verificação da existência de pressupostos de facto e de direito susceptíveis de fundamentar, ou não, correções fiscais, e a consequente liquidação. Neste circunstancialismo, e em sintonia com o referido na anotação supra, não se justifica que o prazo de caducidade corra contra a AT e a favor do contribuinte, razão pela qual a lei determinou a sua suspensão”. (sublinhado nosso)
Ou seja, no caso de a inspeção se realizar exclusivamente nos serviços da AT com base nos elementos que a AT possui, esta qualifica-se como interna. E note-se, conforme regula o citado artigo 13.º do RCPIT (com a redação em dada pelo Decreto-Lei n.º 36/2016, de 1 de julho), os elementos podem ser “obtidos no âmbito do referido procedimento”. Assim, não é o facto de a AT solicitar elementos ao contribuinte que a inspeção deixará de ser qualificada como interna, caso se realize exclusivamente nos serviços da AT.
Na sua argumentação, a AT desvaloriza a presença física nas instalações da Requerente, pondo a tónica na origem da informação e da documentação que está na base das conclusões inspetivas e investigatórias realizadas pelos SIT. Cita o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.º 292/12.2BELRA datado de 04-05-2023, em que se esclarece que: “Uma ação inspetiva interna abrange os casos em que a AT leva a efeito toda a sua atividade nos seus serviços, ou seja, os casos em que atua com base na informação de que dispõe, fruto, designadamente, das obrigações declarativas a cargo dos contribuintes. São ações inspetivas externas aquelas em que existe alguma atividade da inspeção que revele um cariz investigatório que extravasa os tais dados de que a AT dispõe nas suas bases de dados.”
Porém, refira-se que, no caso citado pela AT, o TCA também diz que: “a circunstância de todo o trabalho ser feito nas instalações da AT não implica, necessariamente, que uma determinada ação inspetiva seja de âmbito interno, questão sobretudo relevante quando a AT se socorre de elementos coligidos em ações de âmbito externo junto de outros sujeitos passivos, evidenciando uma atividade de verdadeira investigação por parte dos serviços inspetivos. (….) Portanto, considerando que toda a ação inspetiva se sustentou em elementos obtidos no âmbito da ação inspetiva externa realizada à V., nos termos que já explanamos, concluímos que a inspeção realizada à Recorrente, não obstante ter sido classificada como ação interna, tratou-se de verdadeira ação externa”.
Assim, no caso a que se refere o TCA, houve inspeção externa realizada nas instalações de terceiros, pelo que julgamos que a jurisprudência citada não sustenta a posição da Requerida, na medida em que no caso concreto tal não se verificou.
Ficou provado que os atos inspetivos, quer à B..., quer à Requerente, não foram realizados, nem que seja parcialmente, fora das instalações da AT, o que aliás nem sequer foi contraditado pela Requerida na sua resposta. Daí que a inspeção tenha de ser qualificada como “interna”.
De notar ainda que, conforme a jurisprudência do STA, “um procedimento inspetivo que se reconduza à análise interna de elementos colhidos em diligências inspetivas externas de outros procedimentos é também um procedimento externo” (Acórdão de 17.12.2019, processo n.º 072/13.8BEMDL). Sucede que o procedimento inspetivo realizado B... foi interno (aliás foi qualificado enquanto tal pela própria AT), pelo que não é de aplicar a referida jurisprudência.
Em termos formais, a AT qualificou a inspeção à B... como “interna” e a inspeção à Requerente como “externa”.
Admite-se que qualificação atribuída pela AT ao procedimento inspetivo não é decisiva, uma vez que a sua qualificação depende sempre da sua integração nos já referidos conceitos do RCIPT. O acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 27.01.2022, no âmbito do processo n.º 290/08.0BEFUN, expressamente refere que a “qualificação dada pela Administração a um procedimento não tem carácter vinculativo se vier a revelar-se que o conteúdo dos atos praticados for contrário à qualificação dada, isto é, a classificação formal do procedimento será, posteriormente, validada, ou não, pelos atos que a Administração praticar”.
Sem prejuízo desta conclusão, e pensando no caso que nos ocupa, importa notar que a ação de inspeção relevante para o caso concreto foi a que se realizou à B..., na medida em que é esta entidade que beneficiou do RFAI e era sobre esta entidade que impendia a verificação dos pressupostos da sua atribuição.
Conforme ficou provado, foi a própria AT que classificou essa inspeção como “interna”. Atendendo às muito relevantes consequências legais, nomeadamente no que se refere ao instituto da caducidade, não pode deixar de atribuir-se relevância à qualificação dada pela AT.
No caso concreto a liquidação de imposto em causa resultou da inspeção à B..., a qual foi qualificada pela AT como “interna”. A Requerente foi depois alvo de inspeção tributária, que a AT qualificou como “externa”, mas na verdade já nada havia a investigar ou acrescentar em relação à liquidação feita à B..., porque se tratou de mero procedimento formal, na medida em que a B... faz parte de um grupo sujeito ao RETGS, em que a sociedade dominante é a Requerente.
Desta forma, a qualificação formal dada pela AT tem de ter relevância para o direito aplicável, o que, a juntar à já demonstrada inexistência de deslocação para fora das instalações da AT, leva este tribunal a concluir que a liquidação de imposto foi emitida já depois de operada a caducidade.
Fica, assim, prejudicado o conhecimento dos restantes vícios invocados pela Requerente.
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Pedido de anulação da liquidação de juros moratórios
A Requerente inclui no pedido de anulação o valor liquidado de juros moratórios de € 1.172,98, atribuindo uma relação direta entre a liquidação desses juros e a matéria em discussão (artigos 320 e seguintes do PPA).
Porém, analisada a nota de liquidação dos juros de mora, verifica-se que não há qualquer relação entre a sua liquidação e a matéria em discussão, sendo que as informações fornecidas são as seguintes: (i) refere-se ao exercício de 2019 (ii) incide sobre um valor base de € 73.325,05 (iii) o período de contagem é de 2020-08-04 a 2020-12-03.
De facto, o ajustamento em disputa não originou imposto a pagar, nem há qualquer relação com os valores em disputa, assim como os períodos indicados, pelo que a decisão de anulação não abrange o valor de juros de mora liquidados.
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Decisão
Nestes termos, decide o tribunal arbitral julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, anular a liquidação adicional de IRC n.º 2024 ... .
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Valor do processo
De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 223.754,26, indicado pela Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira. Este valor corresponde ao somatório dos seguintes pedidos: (i) a anulação do ajustamento referente ao RFAI, que é de € 222.581,28, e (ii) anulação de juros moratórios de € 1.172,98. Nos termos do artigo 32.º, n.º 7, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral (artigo 29.º, n.º 1, c), do RJAT), “quando sejam cumulados, na mesma ação, vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles (…)”, pelo que se admite o valor da causa indicado.
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Custas
Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante total das custas a pagar em
€ 4.284,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, ficando a cargo da Requerida o valor de € 4.261,54 e da Requerente o valor de € 22,46, em função do respetivo decaimento.
Lisboa, 21 de fevereiro de 2025
Juiz José Poças Falcão
(Presidente)
Jorge Belchior de Campos Laires
António Pragal Colaço
Com a Declaração de Voto que segue
DECLARAÇÃO DE VOTO DE VENCIDO
Nos termos do artigo 45.º, n.º 1 da LGT, “[o] direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro”.[2]
Nos termos do n.º 4 daquele mesmo artigo se prevê que “[o] prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário”.
Já no artigo 8.º, n.º 9 do CIRC determina-se que “[o] facto gerador do imposto considera-se verificado no último dia do período de tributação”.
Estabelecendo-se no artigo 101.º do CIRC que “A liquidação de IRC, ainda que adicional, só pode efetuar-se nos prazos e nos termos previstos nos artigos 45.º e 46.º da Lei Geral Tributária.”, pelo que se aplica o prazo geral de caducidade de 4 anos.
É este o entendimento defendido na jurisprudência arbitral, citando-se a mero título de exemplo, o acórdão arbitral proferido em 13 de Outubro de 2023, no âmbito do processo n.º 746/2022-T, que tem o seguinte sumário:
“Nos impostos periódicos, como o IRC, o prazo de quatro anos previsto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT começa a contar a partir do termo do ano fiscal, ou seja, do último dia do período de tributação relevante, nos termos do n.º 4 do mesmo artigo. O conceito de “termo do ano” neste preceito refere-se ao termo do ano fiscal, e não ao termo do ano civil.”.[3]
No presente caso, resulta do RIT que o período de tributação da Requerente coincide com o ano civil, o que significa que relativamente ao IRC do período de tributação de 2019, o facto tributário verificou-se no dia 31.12.2019. Por conseguinte, o direito de liquidação de imposto pela Requerida caducava no dia 31.12.2023.
Resulta dos autos que foi emitido um ato de liquidação adicional de imposto de IRC a 6/3/2024, liquidação de juros compensatórios e respetiva demonstração de acerto de contas emitidas a 8/3/2024, dirigidos à Requerente enquanto sociedade dominante do grupo, e notificado via CTT a 9 de Março de 2024, cfr. factos provados na alínea v).
Aparentemente, a notificação da liquidação adicional de IRC dar-se-ía já para além do prazo de caducidade da liquidação do imposto. A Requerente coloca em crise a qualificação da inspeção tributária quanto ao lugar da sua realização, bem como os efeitos que lhe estão associados.
Diz a Requerida que a inspecção tributária é de natureza externa e que por não ter ultrapassado o período de seis meses, suspendeu a contagem do prazo de caducidade do direito à liquidação pelo período em que a mesma se verificou, art.º 46.º, n.º 1 da LGT.
O que releva para a qualificação da inspeção como interna ou externa, não é tanto se os SIT visitam fisicamente as instalações da Requerente, mas sim qual a origem da informação e da documentação que está na base das conclusões inspetivas e investigatórias realizadas pelos SIT. A inspeção realizada foi externa porque os elementos utilizados para fundamentar as conclusões dos SIT não resultam apenas dos elementos declarativos apresentados pela Requerente e já na posse da administração fiscal, mas, antes, dos elementos solicitados e apresentados pela Requerente no âmbito da inspeção realizada pelos SIT à sociedade dominada, conforme Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.º 292/12.2BELRA datado de 04-05-2023.
A “vexato quaestio” está então na qualificação do procedimento de inspecção tributária como interno, ou externo, sendo que a mesma é extensível ao mundo jurisprudencial jurídico-tributário, bastando para isso consultar o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido em 27.01.2022, no âmbito do processo n.º 290/08.0BEFUN, que propugna em sentido contrário.
Diz-nos este pronunciamento decisório que, “[a] qualificação dada pela Administração a um procedimento não tem carácter vinculativo se vier a revelar-se que o conteúdo dos atos praticados for contrário à qualificação dada, isto é, a classificação formal do procedimento será, posteriormente, validada, ou não, pelos atos que a Administração praticar”.[4]
O procedimento será interno “quando os atos de inspeção se efetuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos por esta detidos ou obtidos no âmbito do referido procedimento”, conforme previsto na alínea a) do artigo 13.º do RCPITA (sublinhado nosso).
No douto Acórdão Arbitral que fez maioria e de que o signatário relator foi vencido, alude-se ao Acórdão do STA de 17.12.2019, processo n.º 072/13.8BEMDL, lendo-se “um procedimento inspetivo que se reconduza à análise interna de elementos colhidos em diligências inspetivas externas de outros procedimentos é também um procedimento externo” (Acórdão de 17.12.2019, processo n.º 072/13.8BEMDL). Sucede que o procedimento inspetivo realizado à B... foi interno (aliás foi qualificado enquanto tal pela própria AT), pelo que não é de aplicar a referida jurisprudência.” Em bom rigor careceria de análise se a inspecção tributária à sociedade dominada B...foi mesmo interna, pois só assim poderemos ter unidade jurídica.
Mas o caso dos presentes autos é diferente. É distinto desde logo, porque estamos perante a figura da tributação em sede de grupos de sociedade.[5]
Nos termos do número 3 do art.º 2.º do RCPITA, “O procedimento de inspecção pode abranger, em simultâneo com os sujeitos passivos e demais obrigados tributários cuja situação tributária se pretenda averiguar, os substitutos e responsáveis solidários ou subsidiários, as sociedades dominadas e integradas no regime especial de tributação dos grupos de sociedades, os sócios das sociedades transparentes ou quaisquer outras pessoas que tenham colaborado nas infracções fiscais a investigar.” (sublinhado nosso). Ou seja, as sociedades dominadas e não a sociedade dominante. E porquê?
Nos termos do art.º 69.º do IRC, “1 — Existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante pode optar pela aplicação do regime especial de determinação da matéria colectável em relação a todas as sociedades do grupo.” A lei fala em matéria colectável e não em lucro tributável. E porquê?
A Modelo 22 da sociedade dominante apenas se começa a preencher no campo 380 e não antes, como em todas as Modelos 22 das sociedades dominadas.
Não há preenchimento anterior para a determinação do lucro tributável, mas existe apenas a soma algébrica dos resultados fiscais, como dispõe o art.º 70.º do CIRC. Daí que em bom rigor não poderá existir inspecção tributária sequer à sociedade dominante, pois o grupo é uma mera unidade jurídico-funcional.[6]
Reconfirma o que vem sendo dito que, devendo ainda todas as sociedades que integram o respectivo perímetro (dominante e dominadas) apresentar as respectivas declarações periódicas de rendimentos individuais, onde seja determinado o imposto que seria devido na ausência de tal regime especial de tributação (arts. 117.º, n.º 1, b), 120.º, n.º 6 e 130.º, n.º 3 do CIRC), a alteração do lucro tributável de uma sociedade dominada não implica alteração da declaração periódica individual da sociedade dominante, mas apenas da declaração de consolidação.
O que a Requerida bastava ter feito era aplicar o art.º 99.º do CIRC e proceder a uma liquidação adicional de imposto à sociedade dominante, aliás como no caso do regime da transparência fiscal reza o art.º 100.º. Tinha também essa possibilidade, porquanto o próprio número 6, do art.º 2.º do RCPITA o permitia.[7]
É verdade que a Requerida não optou por “lançar mão” dessa correcção simples e ao “invés” optou pelo procedimento de inspecção tributária e logo “sib imputate”.Mas não deixa de ser também relevante para o signatário, que estamos perante uma situação de tributação especial de grupos de sociedades e por conseguinte, a Requerida ao ter classificado uma correcção adicional de imposto pela via do procedimento inspectivo externo, não pode o mesmo ser considerado interno, aplicando-se a jurisprudência sobre a qualificação da mesma que se encontra reservada a outros casos que não estes.
Acresce ainda como nos diz o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 2022-01-27
processo 290/08.0BEFUN, Catarina Almeida e Sousa, II - Ainda que o procedimento de inspeção tenha sido erradamente qualificado como interno, quando o deveria ter sido como externo, esse erro irreleva para a decisão a proferir se não puder concluir-se ter sido preterida qualquer formalidade essencial imposta por esta última modalidade de inspeção.”
Não foi preterida qualquer formalidade essencial imposta pela opção da modalidade do procedimento externo de inspecção.
Decidiria assim pela improcedência da caducidade do direito à liquidação apreciando subsequentemente a questão de fundo.
António Pragal Colaço
[1] Quanto aos documentos particulares estabelece o artigo 374º nº 1 do Código Civil que “a letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando este declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras”.
A força probatória dos documentos particulares está regulada no artigo 376º do mesmo código que dispõe: “o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações nele atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento”, sendo que “os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante”.
Tal como ensina Lebre de Freitas “A força probatória do documento particular circunscreve-se, assim, no âmbito das declarações (de ciência e de vontade) que nele constam como feitas pelo respetivo subscritor” (A Falsidade no Direito Probatório, Livraria Almedina, Coimbra, 1984, pág. 55).
A parte contra a qual o documento particular é apresentado pode impugnar a veracidade da letra ou da assinatura ou declarar que não sabe se aquelas são verdadeiras, não lhe sendo imputadas. Caso não fique estabelecida a genuinidade do documento particular, porque impugnado e não demonstrada a sua veracidade pelo apresentante, o mesmo constitui apenas um meio de prova livremente apreciado pelo julgador, sem força probatória plena.
[2] Existem várias excepções, como a da mera interposição de um processo criminal independentemente da constituição de alguém como arguido, e em matéria de imposto de selo que são 8 anos, o que não são o caso;
[3] O CIRC nos termos dos números 2 e 3 do artigo 8.º, permite aos sujeitos passivos adoptarem um período de tributação diferente do ano civil;
[4] Se a suspensão da liquidação se dá com a notificação da ordem de serviço e se no desenvolvimento da inspecção se vem a verificar pelos actos praticados pela Administração que não é externa, parece que se produz um efeito retroactivo de invalidade da suspensão, que o era mas afinal deixou de o ser!
[5] “Os arts. 69.º e segs. do CIRC são os sobreviventes históricos de uma longa odisseia legislativa, iniciada com o Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, que introduziu a chamada “tributação pelo lucro consolidado”, a qual foi mais tarde retomada pelos arts. 59.º do CIRC (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro) e seguida por numerosas e significativas alterações, introduzidas pelos Decreto-Lei n.º 251-A/91, de 16 de Julho, Lei n.º 71/93, de 26 de Novembro, Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro, Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, Lei n.º 53-A/2006, 29 de Dezembro, e DecretoLei n.º 159/2009, de 13 de Julho). Na versão actualmente em vigor, os preceitos têm por epígrafe “regime especial de tributação dos grupos de sociedades”: como veremos, esta alteração não é apenas de nomenclatura, dado que a determinação do lucro tributável do grupo, que outrora era realizada mediante a aplicação do método da consolidação integral (sobre este método, vide ANTUNES, José Engrácia, A Consolidação de Contas), passou a ser obtida mediante a mera soma algébrica dos lucros tributáveis e prejuízos fiscais individuais das sociedades agrupadas.”, in. A tributação dos grupos de sociedades, José Engrácia Antunes, Instituto Superior de Gestão, p.3;
[6] No direito comparado, é possível divisar dois modelos regulatórios fundamentais em sede da tributação dos grupos societários. O primeiro consiste em tratar o grupo societário como um verdadeiro sujeito jurídico-tributário autónomo, sendo a matéria colectável das sociedades componentes determinada conjuntamente e havendo lugar a uma única liquidação de imposto: este o modelo adoptado pelo próprio legislador português através da chamada “tributação pelo lucro consolidado”, consagrada no pretérito art. 59.º do CIRC (cf. ANTUNES, J., Os Grupos de Sociedades, cit., 1ª edição, 171 e ss.; LOUSA, M., A Tributação pelo Lucro Consolidado, cit., 59 e ss.). O segundo modelo reconhece o grupo como uma mera unidade jurídico-tributária funcional, onde a matéria colectável das diferentes sociedades agrupadas é apurada autonomamente mas permite-se a respectiva compensação para efeitos do apuramento do imposto global a pagar: este o modelo actualmente em vigor no art. 69.º do CIRC português, tal como também o seguido em vários outros países europeus, v.g., França (art. 223- A e 223-B do “Code Général des Impôts” e arts. L.233-16 e segs. do “Code de Commerce”: cf. JADAUD, B., L’Impôt et les Groupes de Sociétés, cit.; GASTINEAU, P., La Fiscalité des Groupes de Sociétés, cit.), Espanha (arts. 64.º e segs. Da “Ley del Impuesto sobre Sociedades”: cf. ALBERS, Herman López, Consolidación Contable y Fiscal de los Grupos de Sociedades, Cisspraxis Editorial, Valencia, 2003), etc. Finalmente, é ainda possível divisar modelos híbridos ou alternativos: particular destaque merece o chamado Organschaft alemão, previsto nos §§ 14 e ss. da “Körperschaftsteuergesetz”, que trata o grupo societário (“Konzern”) como unidade jurídico-fiscal para efeitos da tributação do rendimento, ao reconhecer à respectiva sociedade-mãe (“Organträger”) a possibilidade de compensação interna de lucros e perdas do conjunto das sociedades agrupadas (“Organgesellschaften”), ao mesmo tempo que trata o grupo como um único sujeito fiscal para efeitos da tributação de consumo ou em IVA (cf. SONNENSCHEIN, Jürgen, Organschaft und Konzerngesellschaftsrecht unter Berücksichtigung des Wettbewerbsrechts und des Mitbestimmungsrechts, Nomos, Baden-Baden, 1976). Em todo o caso, falta hoje um regime europeu ou mesmo internacional de tributação dos grupos de sociedades: sobre a questão, vide entre nós SANTIAGO, B., O Futuro da Tributação Directa dos Grupos de Sociedades na União Europeia, cit., 93 e ss.; noutros quadrantes, para maiores desenvolvimentos, vide WENDT, Carsten, A Common Tax Base for Multinational Enterprises in the European Union, Gabler Verlag, Wiesbaden, 2009.
[7] 6 - Não se compreende no procedimento de inspeção tributária a mera confirmação de dados constantes de declaração entregue:
a) Que apenas apresente erros formais, de natureza aritmética ou exija a mera clarificação ou justificação de elementos declarados;
b) Cujos dados não coincidam com os constantes de outras declarações do sujeito passivo ou de um terceiro em poder da administração tributária, não relacionados com o exercício de uma atividade económica, In.Ibidem;