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SUMÁRIO:
I – EMERGINDO DA PROVA QUE A ATIVIDADE DO SUJEITO PASSIVO REQUERENTE NÃO É UMA ATIVIDADE DE LOCAÇÃO DE CURTA DURAÇÃO DE UM MEIO DE TRANSPORTE E QUE O LUGAR DA COLOCAÇÃO DO BEM LOCADO À DISPOSIÇÃO DO DESTINATÁRIO NÃO SE SITUA NO TERRITÓRIO NACIONAL NÃO HÁ LUGAR A TRIBUTAÇÃO DAS OPERAÇÕES POR SI REALIZADAS AO ABRIGO DO PRECEITUADO NA ALÍNEA F) DO Nº 8 DO ARTIGO 6º DO CIVA.
II - A FALTA DE AUDIÇÃO PRÉVIA DO CONTRIBUINTE, NOS CASOS PREVISTOS NO Nº.1 DO ARTIGO 60.º, DA LGT E NO N.º 1 DO ARTIGO 60.º DO RCPITA, CONSTITUI UM VÍCIO DE PROCEDIMENTO SUSCEPTÍVEL DE CONDUZIR À ANULAÇÃO DA DECISÃO QUE VIER A SER TOMADA, NOS TERMOS DO ARTIGO 163.º, DO C. P. ADMINISTRATIVO.
DECISÃO ARBITRAL
I. RELATÓRIO
A..., LDA, com o NIPC ..., com sede na Rua ..., ..., ... ... ..., notificada das liquidações abaixo identificadas e respetivas demonstrações de acerto de contas e liquidação de juros, referentes aos exercícios de 2022 e 2023 (Doc. 1), veio, nos termos do artigo 2º, nº1, al. a), e 10º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária e artigo 99º, al. a), do CPPT, requerer a constituição do Tribunal Arbitral, peticionando a anulação das correcções e das respetivas liquidações adicionais de IVA e de de juros compensatórios identificadas naquele documento, a devolução das quantias pagas com juros compensatórios até ao reembolso integral e a condenação da AT nas custas processuais.
A Requerente elenca as liquidações, demonstrações de acerto de contas e liquidações de juros a que se refere do modo seguinte:
1 Demonstração de liquidação de IVA 2023 Período 202303T:
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Número Documento: 2023 ...
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Número liquidação – 2023 ...;
2 Demonstração de liquidação de IVA 2023 Período 202306T:
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Número Documento: 2023 ...
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Número liquidação – 2023 ...;
3 Demonstração de liquidação de IVA - Período 202212T:
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Número Documento: 2023 ...
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Número liquidação – 2023 ...
4 Demonstração de liquidação de IVA - Período 202212T:
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Número Documento: 2023 ...
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Número liquidação – 2023 ...
5 Demonstração de liquidação de IVA - Período 202203T:
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Número Documento: 2023 ...
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Número liquidação – 2023 ...
6 Demonstração de liquidação de IVA - Período 202206T:
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Número Documento: 2023 ...
-
Número liquidação – 2023 ...
7 Demonstração de liquidação de IVA - Período 202209T:
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Número Documento: 2023 ...
-
Número liquidação – 2023 ...
8 Liquidação adicional - Período 202209T:
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Número Documento: ...
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Número liquidação – ...
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N.º documento correção - ...
9 Liquidação adicional - Período 202206T:
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Número Documento: ...
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Número liquidação – ...
-
N.º documento correção - ...
10 Liquidação adicional - Período 202212T:
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Número Documento: ...
-
Número liquidação – ...
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N.º Documento correção: ...
11 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-10-2023 a 31-03-2023
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ID Documento: 2023 ...
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Estorno Liq. de 2023 – Liq. 2023 ...
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Acerto Liq. de 2023- Liq. 2023...
12 IVA – Demonstração de Liquidação de Juros de IVA - Período 202303T
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Número de Documento: 2023...
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Liquidação nº 2023 ...
13 IVA – Demonstração de acerto de contas – Período 01-01-2023 a 31-03-2023
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ID: 2023 ...
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Juros de mora, Liq. 2023 ...
14 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-04-2023 a 30-06-2023
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ID Documento: 2023 ...
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Estorno Liq. de 2023 – Liq. 2023 ...
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Acerto Liq. de 2023- Liq. 2023 ...
15 IVA – Demonstração de Liquidação de Juros de IVA - Período 202306T
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Número de Documento: 2023 ...
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Liquidação nº 2023 ...
16 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-04-2023 a 30-06-2023
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ID: 2023 ...
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Juros de mora, Liq. 2023 ...
17 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-01-2022 a 31-03-2022
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ID Documento: 2023 ...
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Estorno Liq. de 2022 – Liq. 2022 ...
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Acerto Liq. de 2022- Liq. 2023...
18 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-04-2022 a 30-06-2022
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ID Documento: 2023...
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Estorno Liq. de 2022 – Liq. 2022 ...
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Acerto Liq. de 2022- Liq. 2023 ...
19 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-07-2022 a 30-09-2022
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ID Documento: 2023 ...
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Estorno Liq. de 2022 – Liq. 2022 ...
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Acerto Liq. de 2022- Liq. 2023 ...
20 IVA – Demonstração de acerto de contas - Período 01-10-2022 a 31-12-2022
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ID Documento: 2023 ...
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Estorno Liq. de 2022 – Liq. 2023 ...
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Acerto Liq. de 2022- Liq. 2023 ...
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.
Em 21 de Fevereiro de 2024, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e, automaticamente, notificado à AT.
Em conformidade com o disposto nos artigos 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT, o Exmo. Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o árbitro deste Tribunal Arbitral, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável. As Partes, notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar (artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e c), do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD).
O Tribunal Arbitral ficou constituído em 02 de Maio de 2024.
Notificada para o efeito, a Requerida apresentou Resposta, em 06-06-2024, na qual se defende por impugnação e protesta juntar PA. O Processo Administrativo foi junto em 04-09-2024.
Após múltiplas vicissitudes relacionadas com a forma de inquirição pretendida pela Requerente e posteriormente alterada, por mais que uma vez, a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, inicialmente agendada para 05 de Setembro de 2024, decorreu, finalmente, no dia 07 de Outubro de 2024, por vídeoconferência quanto às declarações de parte do representante legal da Requerente, B..., e do depoimento da testemunha C..., ambos ausentes do território nacional, e presencialmente da testemunha D... . A final, foram as partes notificadas de que lhes era concedido o prazo de 15 dias para apresentarem alegações escritas e para procederem ao pagamento da taxa arbitral subsequente, bem como lhes foi solicitado o envio das peças processuais em formato editável.
Atendendo à inusitada dificuldade em realizar a mencionada reunião, cujo agendamento inicial teve que ser adiado – o que motivou atrasos na tramitação -, e à interposição de férias judiciais, por despacho de 21-10-2024, prorrogou-se prazo para a prolação da Decisão Arbitral, por dois meses, nos termos do n.º 2 do artigo 21.º do RJAT.
A Requerente apresentou alegações, em 23-10-2024, não as tendo apresentado a Requerida.
II. Saneamento
O Tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria para conhecer das liquidações aqui postas em crise, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, e 11.º, n.º 1, alínea a), todos do RJAT.
As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
A acção é tempestiva, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, de acordo com a remissão operada para o artigo 102.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”).
III. Fundamentação de Facto
1. Matéria de Facto Provada
Com relevo para a decisão, importa atender aos seguintes factos que se julgam provados:
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A Requerente exerce a atividade de Aluguer de veículos automóveis ligeiros e motocicletas, atividades de agências de viagem, tours de motos, operador de turismo e pilotagem para motociclos, locais de alojamento de curta duração, organização de feiras, congressos e outros eventos, comércio por grosso e a retalho de motociclos, de suas peças e acessórios sua manutenção e reparação, transporte de veículos ligeiros até 2500kg (Doc. 2 junto com o PPA, que se dá por integralmente reproduzido).
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No âmbito da sua atividade, a ora Requerente requereu o reembolso de IVA no montante de € 46.180,79, respeitante ao período 202212T, pedido este que provocou o início de um procedimento inspetivo externo com o n.º OI2023..., para o exercício de 2022, de âmbito univalente/parcial, tendo os actos de inspecção sido iniciados em 16/06/2023 e ficado concluídos em 07/11/2023 (PA).
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Os fins, o âmbito e a extensão do procedimento de inspecção não foram alterados durante a sua execução, mediante despacho fundamentado da entidade que o ordenou, devidamente notificado à Requerente (PA).
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No âmbito do procedimento inspetivo entendeu a Autoridade Tributária (AT) que a atividade da Requerente é uma atividade de locação de curta duração de um meio de transporte e que o lugar da colocação à disposição do destinatário se situa no território nacional, como consta do Relatório da Inspecção Tributária (Doc. 3 junto com o PPA, que se dá por integralmente reproduzido).
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A Requerente celebrou, em 22 de dezembro de 2021, com a sociedade E... CNPJ sob n° ... e Inscrição Municipal sob n°..., com sede em Condomínio ..., Rua..., ..., ... Paulista/SP, Brasil, um Contrato de prestação de serviços de consultoria e suporte de turismo (Doc. 4 junto com o PPA, que se dá por integralmente reproduzido).
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No âmbito desse contrato a Requerente obriga-se a disponibilizar estrutura física, logística e administrativa no período de 2 de janeiro de 2022 a 31 de dezembro de 2022, nomeadamente “na realização de atividades de viagens internacionais em motocicleta a serem comercializadas pela Contratante, ou seja, a mencionada E... (cit. Doc. 4).
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Com a celebração desse contrato a Requerente obrigou-se a ter disponível para a sua cliente E... a frota de motocicletas “premium” novas, matriculadas no ano vigente do contrato e nele identificadas, bem como de veículos de transporte para a frota e um veículo convencional de transporte de passageiros e ainda a manutenção completa de todos esses veículos (cit. Doc. 4).
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A Requerente não poderia alugar tal equipamento a outra entidade, uma vez que o mesmo se encontrava alugado, pelo período de 1 (um) ano, e adstrito somente à sociedade E... (cit. Doc. 4, depoimentos das testemunhas C... e D... e declarações de parte de B...);
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Os alugueres de curta duração são disponibilizados pela E... aos seus clientes finais, brasileiros, e não pela Requerente (cit. Doc. 4, Doc. 5 junto com o PPA, que aqui se dá por reproduzido, depoimentos das testemunhas C... e D... e declarações de parte de B...).
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As rotas são planeadas pela E... LTDA, com mais de 6 meses de antecedência e por essa razão é que é possível ter conhecimento, em dezembro 2021, das rotas do ano seguinte (depoimentos das testemunhas C... e D... e declarações de parte de E...).
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A obrigação contratual da Requerente era, apenas e só, com a E..., a qual, por sua vez, celebrou os contratos de prestação de serviços com os clientes finais, conforme estabelecido no mencionado contrato, designadamente na “Cláusula 2ª. O CONTRATANTE declara revender os pacotes e disponibilizar motocicletas para clientes portadores de habilitação categoria A (motociclos) há pelo menos 02 (dois) anos, válida, e confirma que seus clientes estão aptos a realizar viagem de moto de longa distância conduzindo motocicleta de 1250cc, e/ou motocicletas correlatas” (cits. Docs. 4 e 5 e declarações de parte de B...).
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A Requerente não alugou o meio de transporte a esses clientes finais, alugou-o sim, o ano inteiro, à empresa E... (cit. Doc. 4, depoimentos das testemunhas C... e D... e declarações de parte de B...).
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Por sua vez, a E... disponibilizava o serviço de aluguer de curta duração mediante a subcontratação dos serviços da Requerente que já se encontravam adjudicados para o todo ano civil de 2022 (cit. Doc. 4, depoimento da testemunha D... e declarações de parte de B...).
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De acordo com o contrato de prestação de serviços entre ambas celebrado, a Requerente obriga-se a entregar e a colocar o bem à disposição da E..., em determinado local indicado por esta, como consta da “Cláusula 5ª. O CONTRATANTE se obriga a com prazo mínimo de 30 (trinta) dias, indicar o local e data a ser entregue a frota, respeitando as distâncias máximas detalhadas neste contrato, previamente estipulados a fim de não causar(em) inconvenientes e prejuízos à CONTRATADA” (cit. Doc. 4, depoimentos das testemunhas C... e D... e declarações de parte de B...).
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No contrato celebrado entre a Requerente e a sociedade E... é estabelecido, desde logo, na cláusula 18.ª, que para a viagem a Marrocos, o início de disponibilização das motocicletas ocorre em Sevilha, no dia 10/05/2022 e termina na Grécia, em 06/11/2022, mais acrescentando: “Nenhum veículo será disponibilizado para viagens incidentais, pessoais ou de lazer desligado de um grupo guiado para nenhum operador, funcionário, cliente ou proprietário da CONTRATANTE” (cit. Doc. 4).
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A disponibilização das motas ocorre nos países indicados pela E..., sendo a Requerente quem procede ao transporte das motas, nos seus próprios veículos de transporte de mercadorias, suportando os respetivos custos associados ao transporte para os respetivos países onde são disponibilizadas (cit. Doc. 4, depoimentos das testemunhas C... e D...).
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As motas são adquiridas no início do ano em que os tours vão ser realizados e têm de ser preparadas antes de serem entregues à E..., nomeadamente com a revisão dos 1.000km (depoimento da testemunha D... e declarações de parte de B...).
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As motas podiam ficar parqueadas caso os tours não fossem realizados, mas apenas a E... poderia dar algum destino a essas motocicletas e nunca a Requerente, porque era aquela que tinha a disponibilidade exclusiva das mesmas (depoimentos das testemunhas C... e D... e declarações de parte de E...).
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Os tours são realizados, normalmente, no período de maio a outubro por questões climáticas, mas podem ocorrer tours fora do período “normal” de rodagem, nomeadamente em Novembro, em Marrocos (depoimento da testemunha D... e declarações de parte de B...).
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Os tours eram realizadas com carros de apoio e no final de cada tour a Requerente transportava as motas para o local indicado pela E..., não tendo havido qualquer tour com início ou fim em Portugal (depoimento da testemunha D... e declarações de parte de B...).
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Após terminar a época dos tours as motocicletas são vendidas ou entregues à concessionária como retoma na aquisição de novas motocicletas (depoimento da testemunha D... e declarações de parte de B...).
-
Do Relatório da Inspecção Tributária ficou a constar, além do mais, o seguinte:
V.1.3.4. OPERAÇÕES ATIVAS/REGIME IVA
(…)
«Não obstante, conforme informações do CC e declarado pelo sócio gerente em termo de declarações as prestações de serviços evidenciadas nas faturas consistem no aluguer de motas, combustível e alojamento para os clientes da empresa brasileira “E..., Ltda”, sendo que estas operações de acordo com o nº 1 do artigo 4º do CIVA, “São consideradas como prestações de serviços as operações efetuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens” e estão sujeitas a imposto nos termos do artigo 6º do CIVA, atendendo a:
Refere o nº 6 do artigo 6º “São tributáveis as prestações de serviços efetuadas a:
a) Um sujeito passivo dos referidos no n.º 5 do artigo 2.º, cuja sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, se situe no território nacional, onde quer que se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador;
b) Uma pessoa que não seja sujeito passivo, quando o prestador tenha no território nacional a sede da sua atividade, um estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, a partir do qual os serviços são prestados”
O nº 8, alínea f) do artigo 6º do CIVA, dispõe:
“Não obstante o disposto no n.º 6, são tributáveis as seguintes operações:
f) Locação de curta duração de um meio de transporte, quando o lugar da colocação à disposição do destinatário se situe no território nacional.”
Também, o oficio ... no seu ponto V, nº 1, considera: “Para efeitos das disposições do artigo 6.º, considera-se locação de curta duração de um meio de transporte a sua locação por um período não superior a 30 dias ou, quando se trate de uma embarcação, não superior a 90 dias.”
(…)
Os restantes serviços faturados à sociedade brasileira, “E..., Ltda”,
eventualmente poderiam ser enquadrados no âmbito do Decreto-Lei n.º 221/85, contudo, dado não reunir as condições estipuladas no referido Decreto-Lei e como tal não pode beneficiar do regime especial de IVA aplicável às agências e viagens, pelo que, consideramos que as mesmas são tributáveis em Portugal, nos termos da alínea f) do n.º 8 do artigo 6.º do CIVA, uma vez que os serviços prestados não se encontram discriminados e a atividade principal é o aluguer de curta duração de motos.
(…)
Relativamente à fundamentação da correção proposta em sede de projeto de relatório de inspeção, o sujeito passivo vem alegar que a sua atividade não se trata de um, aluguer de curta duração, de acordo com o contrato e tabelas de itinerários agora entregues, bem como, os documentos de suporte da contabilidade, pelo que, no seu entender, não estão sujeitas a imposto nos termos da alínea f) do n.º 8 do artigo 6.º do CIVA, mas sim isentas, nos termos da alínea a) do número 6) do artigo 6.º do CIVA.
Segundo a tabela de itinerários que o sujeito passivo apresentou, a sua frota (motos e automóveis) foi disponibilizada ao seu cliente nos seguintes períodos e locais:
(…)
X.3. CONCLUSÃO
Pelo exposto no ponto anterior, mantemos a fundamentação apresentada em sede de projeto de relatório, relativamente à tributação do aluguer da frota do sujeito passivo, sujeitas a imposto nos termos da alínea f) do n.º 8 do artigo 6.º do CIVA, em face de:
Ficou demonstrado que as motos nunca foram disponibilizadas aos utilizadores por um período superior a 30 dias; e
Em caso algum, o sujeito passivo comprova que o inicio do transporte das motos não é no território nacional.
Contudo, considerando que a atividade de operador turístico está enquadrada no Decreto-Lei nº 221/85, de 3 de julho, mesmo não cumprindo o estipulado no artigo 5.º desse decreto, propomos que os gastos incorridos para a organização dos circuitos nos diversos países (em que o IVA suportado não foi deduzido), seja retirado do aluguer das motos e que o imposto seja apurado nos termos do artigo 3.º do referido decreto lei (neste caso será zero, uma vez que vamos considerar o preço de venda igual ao de custo).
(…)
X.4. Análise do pedido de reembolso solicitado
Consequentemente ao atrás referido, relativamente ao pedido do reembolso de IVA, solicitado pelo sujeito passivo na declaração periódica respeitante ao período 2022-12T, no montante de € 46.180,79, face às correções propostas neste relatório, no montante de € 38 967,24, verificamos que o sujeito passivo, na DP de IVA do período 2022-12T, tem direito a um crédito de imposto no montante de € 50 947,63, pelo que o pedido de reembolso solicitado nos termos do nº 5 do artigo 22º do CIVA, deverá ser deferido totalmente.»
-
A Requerente foi notificada das liquidações supra identificadas, respetivas demonstrações de acerto de contas e liquidação de juros, referentes aos exercícios de 2022 e 2023 (Doc. 1 junto com o PPA, que aqui se dá por reproduzido)
-
Em 09-01-2024, a Requerente procedeu ao pagamento das seguintes liquidações adicionais e respetivos juros de mora, conforme comprovativos que junta:
- DEMONSTRAÇÃO DE ACERTO DE CONTAS - ID. DOCUMENTO: 2023 ... – valor € 395,54 (Juros de mora)
- DEMONSTRAÇÃO DE ACERTO DE CONTAS - ID. DOCUMENTO: 2023 ... – valor € 190,51 (Juros de mora)
- DEMONSTRAÇÃO DE ACERTO DE CONTAS - ID. DOCUMENTO: 2023 ... – valor € 19.652,34 (IVA 01/04/2023 a 30/06/2023)
- DEMONSTRAÇÃO DE ACERTO DE CONTAS - ID. DOCUMENTO: 2023 ... – valor € 13.227,48 (IVA 01/01/2023 a 31/03/2023) - (Doc. n.º 6 junto com o PPA, que aqui se dá por reproduzido).
-
Em 20-02-2024, deu entrada o presente PPA (SGP do CAAD).
2. Factos não Provados
Não há factos relevantes para decisão da causa que não se tenham provado.
3. Motivação da Decisão de Facto
Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, em face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2 do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, não tendo o Tribunal de se pronunciar sobre todas as alegações das Partes.
Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.
A convicção do Tribunal fundou-se na análise dos documentos juntos com o Pedido de Pronúncia Arbitral (PPA) e no Processo Administrativo (PA), bem assim nos depoimentos testemunhais e declarações de parte, dado que tanto uns como outro evidenciaram espontaneidade e aparentaram depor com verdade, merecendo, pois, o crédito do Tribunal, conforme está refectido em relação a cada facto considerado provado.
IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
1. QUESTÕES A DECIDIR
O dissídio em presença convoca a resposta às questões suscitadas pela Requerente, a saber:
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Se praticou “Aluguer de Curta Duração”;
2. Onde se localizou “A Colocação à Disposição do Bem”;
3. Se são ilegais “As Liquidações de Iva de 2023”, em função do âmbito e extensão temporal da Acção Inspectiva.
2 - APRECIAÇÃO
2.1 – ALUGUER DE CURTA DURAÇÃO
Estabelece a alínea a) do nº 6 do artigo 6º do CIVA que
“São tributáveis as prestações de serviços efetuadas a:
-
Um sujeito passivo dos referidos no n.º 5 do artigo 2.º, cuja sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio, para o qual os serviços são prestados, se situe no território nacional, onde quer que se situe a sede, estabelecimento estável ou, na sua falta, o domicílio do prestador;
(…)
Acrescenta a alínea f) do nº 8, do mesmo artigo 6º do CIVA:
“Não obstante o disposto no n.º 6, são tributáveis as seguintes operações:
f) Locação de curta duração de um meio de transporte, quando o lugar da colocação à disposição do destinatário se situe no território nacional.”
O Decreto-Lei n.º 186/2009, de 12 de Agosto, transpõe para a ordem jurídica interna as alterações introduzidas na Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, pelo artigo 2.º da Directiva 2008/8/CE do Conselho, de 12 de Fevereiro de 2008, no que diz respeito ao lugar das prestações de serviços, adaptando em conformidade as disposições do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA).
Em cumprimento do Despacho n.º 938/2009 XVII, de 29 de Junho, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a Direcção de Serviços do IVA veio, através do Ofício 30115, de 29-12-2099, proceder à divulgação de instruções administrativas, entre as quais, no seu ponto V, nº 1, considera:
“Para efeitos das disposições do artigo 6.º, considera-se locação de curta duração de um meio de transporte a sua locação por um período não superior a 30 dias ou, quando se trate de uma embarcação, não superior a 90 dias.”
Resulta da prova, entre o mais, o seguinte:
- A Requerente celebrou, em 22 de dezembro de 2021, com a sociedade E... um Contrato de prestação de serviços de consultoria e suporte de turismo mediante o qual se obrigou a disponibilizar estrutura física, logística e administrativa no período de 2 de janeiro de 2022 a 31 de dezembro de 2022, nomeadamente na realização de atividades de viagens internacionais em motocicleta a serem comercializadas pela Contratante ou seja, a mencionada E... (Factos E e F);
- Com a celebração desse contrato a Requerente obrigou-se a ter disponível para a sua cliente E... a frota de motocicletas “premium” novas, matriculadas no ano vigente do contrato e nele identificadas, veículos de transporte para a frota e um veículo convencional de transporte de passageiros e a manutenção completa de todos esses veículos, bem assim não poderia alugar tal equipamento a outra entidade, uma vez que o mesmo se encontrava alugado, pelo período de 1 (um) ano, e adstrito somente à dita cliente (Factos G e H);
- Os alugueres de curta duração são disponibilizados pela E... aos seus clientes finais, brasileiros, e não pela Requerente, sendo as rotas planeadas por aquela sociedade brasileira e tendo sido a mesma quem celebrou os contratos de prestação de serviços com os clientes finais, conforme estabelecido no contrato celebrado (Factos I, J e K);
- A Requerente não alugou o meio de transporte a esses clientes, alugou-o sim, o ano inteiro, à empresa E..., sendo esta quem disponibilizava o serviço de aluguer de curta duração mediante a subcontratação dos serviços da Requerente que já se encontravam adjudicados para o todo ano civil de 2022 (Factos L e M).
Tanto é o bastante para se concluir, com segurança, que a Requerente não praticou qualquer aluguer de curta duração, à luz das citadas normas legais e instruções da competente Direcção de Serviços do IVA, uma vez que o contrato mencionado foi celebrado por um ano e com total exclusividade para a referida sociedade brasileira E..., razão pela qual a AT não deveria ter cometido as liquidações sub judice, submetidas ao dispositivo da al. f) do n.º 8 do artigo 6.º do CIVA – norma que, nessa medida, foi violada.
2.2 – LOCAL DA COLOCAÇÃO DO BEM À DISPOSIÇÃO
Recorda-se o preceituado na alínea f) do nº 8, do artigo 6º do CIVA:
“Não obstante o disposto no n.º 6, são tributáveis as seguintes operações:
f) Locação de curta duração de um meio de transporte, quando o lugar da colocação à disposição do destinatário se situe no território nacional.”
A Direcção de Serviços do IVA, no já mencionado Ofício..., de 29-12-2099, concretamente no seu ponto V, nº 3, divulga a seguinte instrução:
“Considera-se que o meio de transporte é «efectivamente colocado à disposição do locatário» no local da entrega física do mesmo, não sendo relevante o lugar onde se verifica a posse jurídica (assinatura do contrato).”
De novo há que recorrer à prova para se evidenciar o seguinte:
- De acordo com o contrato de prestação de serviços entre ambas celebrado, a Requerente obriga-se a entregar e a colocar o bem à disposição da E..., em determinado local indicado por esta, como consta da “Cláusula 5ª. O CONTRATANTE se obriga a com prazo mínimo de 30 (trinta) dias, indicar o local e data a ser entregue a frota, respeitando as distâncias máximas detalhadas neste contrato, previamente estipulados a fim de não causar(em) inconvenientes e prejuízos à CONTRATADA” (Facto N).
- No contrato celebrado entre a Requerente e a sociedade E... é estabelecido, desde logo, na cláusula 18.ª, que para a viagem a Marrocos, o início de disponibilização das motocicletas ocorre em Sevilha, no dia 10/05/2022 e termina na Grécia, em 06/11/2022, mais se acrescentando: “Nenhum veículo será disponibilizado para viagens incidentais, pessoais ou de lazer desligado de um grupo guiado para nenhum operador, funcionário, cliente ou proprietário da CONTRATANTE” (Facto O);
- A disponibilização das motas ocorre nos países indicados pela E..., sendo a Requerente quem procede ao transporte das motas, nos seus próprios veículos de transporte de mercadorias, suportando os respetivos custos associados ao transporte para os respetivos países onde são disponibilizadas (Facto P);
- As motas podiam ficar parqueadas caso os tours não fossem realizados, mas apenas a E... poderia dar algum destino a essas motocicletas e nunca a Requerente, porque era aquela que tinha a disponibilidade exclusiva das mesmas (Facto R);
- Os tours eram realizados com carros de apoio e no final de cada tour a Requerente transportava as motas para o local indicado pela E..., não tendo havido qualquer tour com início ou fim em Portugal (Facto T).
Donde, ressalta à evidência que o lugar da colocação dos bens locados à disposição do destinatário nunca se situou no território nacional, porquanto o local da entrega física dos mesmos sempre ocorreu no estrangeiro (irrelevando, como se viu do citado Ofício..., a localização da respectiva posse jurídica) pelo que, também nesta álea da questão não andou bem a AT ao aplicar a alínea f) do nº 8, do artigo 6º do CIVA, em lugar da al. a) do n.º 6 do mesmo dispositivo legal, assim tendo violado estas normas.
2.3 – DA ILEGALIDADE DAS LIQUIDAÇÕES DE IVA DE 2023, EM FUNÇÃO DO ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA
Alega a Requerente, em síntese:
- O RIT apenas abrange o período de 2022, decorrendo do ponto II.1 que a credencial da inspeção foi emitida no “procedimento inspetivo interno aberto com o objetivo de aferir a legitimidade do reembolso de IVA, solicitado pelo sujeito passivo na declaração periódica respeitante ao período 202212T”.
- A inspeção foi ordenada em sede de IVA àquele exercício e imposto, sendo assim parcial nos termos do artigo 14.º, n.º 1 b) do RCPITA e ponto II.1 do RIT e, assim, não pode a AT emitir liquidações adicionais de imposto sem antes proceder ao processo inspetivo que as justifica nem pode emitir liquidações sem que o sujeito passivo conheça a fundamentação das mesmas, sobretudo, não pode preterir o direito de participação do sujeito passivo na formação da decisão, em violação frontal e inequívoca do artigo 60.º da LGT e 60.º do RCPITA.
- A AT ao emitir liquidações adicionais de IVA referente ao ano de 2023, sem que esse ano estivesse a ser alvo de inspeção, impediu que a Requerente exercesse o seu direito de defesa constitucionalmente consagrado, nos termos do artigo 267.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa.
- O direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objeto do procedimento, tal como ele surge após a instrução e antes da decisão.
- Estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve dar-lhe conhecimento do projeto da mesma decisão, a sua fundamentação, o prazo em que o mesmo direito pode ser exercido e a informação relativa à possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita, o que no presente caso não aconteceu relativamente ao ano de 2023.
- Não tendo o legislador cominado com a nulidade a falta de audição prévia, a mesma constitui vicio de forma do procedimento que afeta não só a validade das conclusões da ação de fiscalização, mas também das consequentes liquidações.
A Requerida nada pronunciou sobre esta matéria.
Dispõe o artigo 267.º, n.º 5, da Constituição da RP: “O processamento da actividade administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.”
Sobre o Princípio da participação, estabelece o n.º 1 do artigo 60.º da LGT: “1 - A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação; (...)
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
Em harmonia com as disposições antes mencionadas, e sob a exigência de audição prévia, preceitua o n.º 1 do artigo 60.º do RCPITA: “Caso os atos de inspeção possam originar atos tributários ou em matéria tributária desfavoráveis à entidade inspecionada, esta deve ser notificada do projeto de conclusões do relatório, com a identificação desses atos e a sua fundamentação”
Acerca do âmbito e extensão, colhe-se do n.º 1 do artigo 14.º deste diploma legal:
“1 - Quanto ao âmbito, o procedimento de inspecção pode ser:
a) Geral ou polivalente, quando tiver por objecto a situação tributária global ou conjunto dos deveres tributários dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários;
b) Parcial ou univalente, quando abranja apenas algum ou alguns tributos ou algum ou alguns deveres dos sujeitos passivos ou dos demais obrigados tributários.” (...)
Alcançando-se do subsequente artigo 15.º:
“1 - Os fins, o âmbito e a extensão do procedimento de inspecção podem ser alterados durante a sua execução mediante despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado, devendo ser notificado à entidade inspeccionada.” (...)
No caso em apreço, emerge da prova colhida no PA que, no âmbito da sua atividade, a ora Requerente requereu o reembolso de IVA no montante de € 46.180,79, respeitante ao período 202212T, pedido este que provocou o início de um procedimento inspetivo externo com o n.º OI2023..., para o exercício de 2022, de âmbito univalente/parcial, tendo os actos de inspecção sido iniciados em 16/06/2023 e ficado concluídos em 07/11/2023. Os fins, o âmbito e a extensão do procedimento de inspecção não foram alterados durante a sua execução, mediante despacho fundamentado da entidade que o ordenou, devidamente notificado à Requerente (Factos B e C).
Enquanto tal, não há como não reconhecer a plena razão da Requerente quando defende que ao emitir liquidações adicionais de IVA referentes ao ano de 2023, sem que esse ano estivesse a ser alvo de inspeção, impediu que a Requerente exercesse o seu direito de defesa constitucionalmente consagrado, em violação do disposto nos artigos 267.º, n.º 5, da CRP, 60.º da LGT, 14.º, 15.º e 60.º do RCPITA, nos segmentos supra citados.
Além da legislação acima brevemente transcrita, a Jurisprudência tem vindo a pronunciar que “A falta de audição prévia do contribuinte, nos casos consagrados no artº. 60, nº.1, da Lei Geral Tributária, constitui um vício de procedimento susceptível de conduzir à anulação da decisão que vier a ser tomada (cfr.artº.163, do C.P.Administrativo)” – Acórdão do TCAS, de 11-10-2018, no P. 1600/17.5BELRA.
A este aresto pode acrescentar-se, entre outros, o prolado pelo TCAN, em 14-04-2026, no P. 00071/07.9BEPNF, segundo o qual “Enquanto manifestação do direito de participação, constitucionalmente consagrado (cfr. artigo 267.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa), a audiência prévia destina-se a assegurar esse direito, que deve poder exercer-se não só sobre a quantificação da matéria tributável, mas também sobre todas as outras questões de facto e de direito susceptíveis de influir na decisão do procedimento.”
Decorre do exposto que as liquidações de IVA e juros aqui impugnadas, constantes do Doc. 1 junto com o PPA (Facto provado W), devem ser anuladas, por vícios de facto e de Direito, ao abrigo do disposto no artigo 163.º do CPA. Acrescendo que as liquidações respeitantes ao ano de 2023 padecem de vício procedimental, por terem excedido o âmbito e extensão do procedimento inspectivo, com total preterição do direito de audição prévia e defesa da Requerente, o que sempre lhes acarretaria o destino da anulabilidade, com tal fundamento.
3. DEVOLUÇÃO DO IMPOSTO INDEVIDAMENTE COBRADO E JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Na sequência da anulação das liquidações, a Requerente tem direito a ser reembolsada das quantias indevidamente cobradas, designadamente as constantes dos comprovativos de pagamento que integram o Doc. 6 junto com o PPA (Facto provado X), o que é consequência da anulação.
Quanto aos juros indemnizatórios, de harmonia com o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
E, nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.
O conceito de “erro imputável aos serviços” tem sido abundantemente interpretado pelos tribunais, entendendo-se que a actuação ilegal da Administração constitui sempre erro imputável aos serviços (acórdão STA, de 21-01-2015, proc. n.º 632/14). Assim, tendo a Administração Tributária errado nos pressupostos de facto e de Direito, como ficou demonstrado no caso presente, tal erro é imputável aos serviços, para efeitos da citada norma.
O artigo 100.º da LGT estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”
Têm, portanto, a Requerente o direito a ser reembolsada da quantia de € 33.465,87 (soma das quantias integradas no cit. Doc. 6) que pagou indevidamente (artigos 100.º da LGT e 24.º, n.º 1, do RJAT) por força dos actos anulados e, ainda, a ser indemnizada, através de juros indemnizatórios, desde a data do pagamento indevido de tais quantias até à data do processamento da respectiva nota de crédito, em que são incluídos, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.
V. Decisão
Decorrendo do exposto, decide este Tribunal julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, consequentemente:
- I) Determinar a anulação das liquidações adicionais de IVA e de juros impugnadas no pedido;
- II) Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a devolver as quantias indevidamente pagas, no montante de € 33.465,87 (conforme cit. Doc. 6), acrescido de juros indemnizatórios, nos termos acima indicados;
- III) Condenar a Requerida nas custas do processo.
VI. Valor do Processo
Fixa-se o valor do processo em € 38.967,23 (trinta e oito mil, novecentos e sessenta e sete euros e vinte e três cêntimos), indicado pela Requerente e não impugnado pela AT, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e do artigo 306.º, n.º 2, do CPC, ex vi artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”).
VII. Custas
Custas no montante de € 1.836,00 (mil oitocentos e trinta e seis euros), a cargo da Requerida, de acordo com a Tabela I anexa ao RCPAT e com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.º 5, do RCPAT e 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 10 de Dezembro de 2024.
O Árbitro,
(A. Sérgio de Matos)