SUMÁRIO:
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A Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) é um imposto, não se verificando, nem a incompetência do tribunal em razão da matéria, nem a falta de vinculação prévia da Autoridade Tributária à jurisdição arbitral.
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As entidades utilizadoras da rede rodoviária nacional que suportam o encargo tributário da Contribuição de Serviço Rodoviário por efeito da repercussão, não obstante terem legitimidade processual (activa) para impugnar judicialmente os actos de liquidação do imposto que incidam sobre combustíveis que tenham adquirido, como meio de reagirem contra a ilegalidade da repercussão, devem efectuar prova da mesma.
DECISÃO ARBITRAL[1]
Requerente – A... S.A.
Requerida - Autoridade Tributária e Aduaneira
Os árbitros Fernanda Maçãs (Árbitro-Presidente), Sílvia Oliveira (Árbitro Vogal e Relatora) e António Alberto Franco (Árbitro Vogal), designados pelo CAAD para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 29-04-2024, decidiram o seguinte:
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RELATÓRIO
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A... S.A, titular do Número de Identificação de Pessoa Coletiva..., com sede na Rua do ..., n.º ..., ...-... ..., Porto (adiante designada por “Requerente”), apresentou pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, no dia 16-02-2024, ao abrigo do disposto no artigo 2, nº 1, alínea a) e do disposto no artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], na sequência de decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado relativamente aos atos tributários de ISP dos períodos que identifica, veio apresentar pedido de pronúncia arbitral “(…) com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa: a) das liquidações de IEC cuja anulação se peticionou no pedido de revisão oficiosa apresentado cujo indeferimento tácito constitui o objeto imediato da presente ação arbitral, relativas aos períodos de 01/2019, 02/2019, 03/2019, 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/2020, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021 , 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022 e 12/2022, liquidadas e pagas pela B..., S.A. (…) na parte correspondente à Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) que foi paga (através do mecanismo de repercussão), pela aqui Requerente (…) b) e das liquidações de IEC relativas aos períodos de 01/2023, 02/2023, 03/2023, 04/2023 e 05/2023, liquidadas pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. (…) suportada pela aqui Requerente (…)”, peticionando a inerente devolução dos montantes suportados, acrescidos de juros indemnizatórios a calcular desde o momento do seu pagamento até à sua integral devolução.
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É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).
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O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 19-02-2024 e notificado, na mesma data, à Requerida.
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Em 26-02-2024, a Requerida apresentou requerimento, dirigido ao Senhor Presidente do CAAD, no sentido de “(…) informar, que analisado o pedido, não detetou a identificação de qualquer ato tributário (…) que, aliás, também não consta da plataforma do Centro de Arbitragem Tributária. Tendo em conta, que (…) a competência dos tribunais arbitrais, que funcionam no CAAD, abrange exclusivamente a apreciação direta da legalidade de ato(s) de liquidação ou de atos de segundo ou terceiro grau que tenham por objeto a apreciação da legalidade de ato(s) daquele tipo (…), do requerimento em que é formulado o pedido de constituição de tribunal arbitral deve constar a identificação do ato ou atos tributários objeto do pedido de pronúncia arbitral (…)”, sendo que “(…) sem a identificação, por parte dos interessados, do ato ou atos tributários, cuja ilegalidade é invocada, não pode o dirigente máximo da AT exercer a faculdade prevista no artigo 13.º do RJAT”. Assim, a Requerida veio solicitar “(…) que seja(m) identificado(s) o(s) ato(s) de liquidação cuja legalidade o requerente pretende ver sindicada, entendendo-se que o termo inicial do prazo para o exercício da faculdade prevista no artigo 13º do RJAT só ocorre após a notificação, à Autoridade Tributária e Aduaneira, da identificação, em concreto, do(s) ato(s) de liquidação cuja ilegalidade é suscitada”.
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Na mesma data, a Requerente foi notificada de despacho proferido pelo Senhor Presidente do CAAD no sentido de informar que “(…) na sequência da comunicação da Autoridade Tributária envie-se a mesma ao Tribunal Arbitral a constituir, por ser esse o órgão competente para a sua apreciação. (…)”. Em 29-02-2024, a Requerente apresentou requerimento no sentido de se pronunciar sobre o requerimento apresentado pela Requerida.
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Em 08-04-2024, dado que a Requerente não procedeu à nomeação de árbitros, foram os signatários designados como árbitros pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 2 do RJAT, tendo as nomeações sido aceites, no prazo e termos legalmente previstos.
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Na mesma data, foram as Partes devidamente notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de as recusar, nos termos do disposto no artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.
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Em 29-04-2024, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído, tendo sido proferido despacho arbitral, em 01-05-2024, no sentido de mandar notificar “(…) nos termos do previsto nos n.ºs 1 e 2 do art. 17.º do RJAT, (…) o dirigente máximo do serviço da administração tributária, para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, caso [quisesse], solicitar a produção de prova adicional, acrescentando que [deveria] ser remetido ao tribunal arbitral cópia do processo administrativo dentro do prazo de apresentação da resposta, aplicando-se, na falta de remessa, o disposto no n.º 5 do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
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A Requerida, em 03-06-2024, apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por excepção e por impugnação e concluído que deverá “a) Ser extinta a instância arbitral, e absolvida da mesma a Requerida, face à verificação da exceção da incompetência em razão da matéria, e/ou da exceção da ilegitimidade processual, e/ou da exceção da ineptidão da petição inicial/pedido arbitral, b) Caso assim não se entenda, ser a Requerida absolvida do pedido, face à verificação da exceção de caducidade do direito de ação, e/ou da exceção de falta de legitimidade substantiva; Ou, caso assim não se entenda, c) Ser o pedido de pronúncia arbitral julgado totalmente improcedente, por infundado e não provado”.
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Na mesma data, a Requerida anexou ao processo cópia do Processo Administrativo.
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Por despacho arbitral de 03-06-2024, foi a Requerente notificada para exercer, querendo, no prazo de 10 dias, contraditório sobre as excepções suscitadas pela Requerida na Resposta, tendo apresentado, em 17-06-2024, defesa às excepções, reiterando o vertido no pedido de pronúncia arbitral e concluindo que “(…) improcedem as exceções alegadas, e subsidiariamente (…)” veio requerer “(…) só e somente na medida em que este Tribunal considere necessário ao diferimento da posição da Requerente: 1. Ordenar à Requerida a junção dos autos das liquidações em causa; 2. Chamada aos autos das entidades identificadas como tendo repercutido o imposto ilegal tendo em vista demonstrarem a repercussão; 3. Oportunidade para produção de prova testemunhal arrolando-se, nos termos do artigo 392.º do Código Civil, o Diretor Financeiro da Requerente, tendo em vista demonstrar a repercussão”.
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Por despacho arbitral de 07-07-2024, foram as ambas as Partes notificadas de despacho arbitral no sentido de a) dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, b) notificar as Partes para produzirem alegações escritas, no prazo de quinze dias a partir da notificação do (…) despacho, sendo que foi concedida à Requerida a faculdade de, caso assim o entendesse, juntar as suas alegações com carácter sucessivo relativamente às produzidas pelo sujeito passivo, c) designar o dia 29-10-2024 como prazo limite para a prolação de decisão arbitral, d) no mesmo prazo ser processado o pagamento da taxa de arbitragem subsequente (o que veio a ser comunicado ao CAAD em 16-07-2024). Por despacho arbitral de 25-09-2024, foi a Requerida notificada para, querendo, exercer contraditório, no prazo de dez dias, quanto ao teor dos documentos juntos aos autos pela Requerente na resposta à matéria de excepção.
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A Requerente e a Requerida não apresentaram alegações no prazo concedido.
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Em 07-10-2024, foi notificado às Partes Despacho do Presidente do Conselho Deontológico, nos termos do qual se aceitou a renúncia às funções arbitrais de um dos Árbitro do Tribunal (atentas as razões invocadas) e se determinou a sua substituição.
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Por despacho arbitral de 15-10-2024, foi prorrogado o prazo da arbitragem por dois meses e foi indicada como data limite para ser proferida a decisão o dia 28-12-2024.
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Por despacho arbitral de 16-10-2024, e em virtude de se ter verificado a substituição de um dos Árbitros do Tribunal Arbitral foi decidido, tendo em consideração as especificidades do processo que não se justificava a repetição de quaisquer actos processuais, prosseguindo a instância os seus demais e regulares termos.
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CAUSA DE PEDIR
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A Requerente começa por esclarecer que “o presente pedido de pronúncia arbitral tem como objeto imediato a declaração de ilegalidade e subsequente anulação do ato tácito de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente (…) e, como objeto mediato, a declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos atos tributários de liquidação de IEC acima indicados, cuja legalidade constituiu objeto do pedido de revisão oficiosa”.
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Refere a Requerente que “o pedido de revisão oficiosa em causa foi remetido à Divisão do Imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos da Direção de Serviços de Impostos Especiais de Consumo no dia 19.07.2023 (…)” e que “até à data da submissão do (…) Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente não obteve qualquer resposta por parte da AT quanto ao pedido (…) apresentado” pelo que não tendo o procedimento tributário sido concluído no prazo de quatro meses, entende a Requerente que “(…) o pedido de revisão oficiosa presume-se tacitamente indeferido para efeitos de impugnação judicial e/ou submissão do Pedido de Pronúncia Arbitral em 20.11.2023, pelo que o pedido de constituição de tribunal arbitral poderia ser apresentado até ao dia 18.02.2024”.
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Assim, conclui a Requerente que “(…) o presente Pedido de Pronúncia Arbitral [é] tempestivo” e que “(…) dispõe de legitimidade processual para o efeito, atento o artigo 9.º, n.º 1, do CPPT (…)” sendo que entende ainda que é “(…) o presente pedido de pronúncia arbitral um meio de reação admissível face à pretensão formulada, tendo o douto Tribunal Arbitral a constituir a necessária competência para apreciar e decidir do mérito da causa”.
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Quanto à factualidade subjacente ao pedido, alega que “no âmbito da aquisição de gasóleo rodoviário à B..., a Requerente procedeu ao pagamento da CSR e ISP [na parcela da Consignação do serviço rodoviário]”, tendo suportado (entre o dia 01-01-2019 e 31-05-2023), “(…) na sequência destas aquisições, (…) um montante de 96.013,64 € relativo à CSR e ao ISP, na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário (…)”, anexando cópia das facturas, confirmação dos pagamentos e declaração de repercussão emitida pela fornecedora de combustíveis.
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Entende a Requerente que “(…) os atos de liquidação, na parte correspondente à CSR suportada pela Requerente entre os períodos de 01.01.2019 e 31.12.2022 e ao ISP suportado entre 01.01.2023 e 31.05.2023 na parcela relativa à Consignação de serviço rodoviário, resultantes das declarações de introdução no consumo submetidas pela B... e por esta pagas (…), são (…) ilegais” pelas razões que apresenta, concluindo que “(…) sendo a CSR criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, deve considerar-se um imposto desconforme ao artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2008/118”, enquanto imposto que vigorou até 31-12-2022, bem como o regime da “Consignação de serviço Rodoviário” que passou a vigorar a partir de 01-01-2023, “devendo ser anuladas e a CSR e o ISP, na parcela relativa à Consignação de Serviço Rodoviário, indevidamente suportadas pela Requerente reembolsadas, acrescidos dos respetivos juros indemnizatórios”.
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A Requerente começa por esclarecer que, quanto à revisão do acto tributário, “(…) não restam dúvidas que a AT está obrigada à revisão do ato tributário, já que entendimento contrário sempre colidiria com princípios constitucionalmente consagrados, hipótese plenamente inadmissível num Estado de Direito como aquele à luz do qual se molda toda a justiça tributária”, citando decisões de Tribunais superiores, entendendo que “é inquestionável afirmar que a CSR paga pela Requerente enferma de um erro de direito imputável aos serviços da AT por se encontrarem em violação do direito comunitário, o que pode ser reconduzido à segunda parte do n.º 1 do artigo 78.º da LGT”.
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Já no que diz respeito à legitimidade da Requerente para apresentar o pedido, entende que “(…) os repercutidos (consumidores) dos combustíveis rodoviários – gasolina, gasóleo e gás de petróleo liquefeito (GPL) sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (IPS) e dele não isentos – têm legitimidade processual ativa para solicitar o reembolso da CSR”.
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No que diz respeito às desconformidades que a Requerente aponta ao regime da CSR e ISP-Consignação de serviço rodoviário, refere, em síntese, que “para prevenir que seja posto em causa o sistema harmonizado dos IEC, a Diretiva 2008/118/CE subordina a criação destes impostos não harmonizados à dupla condição de respeitarem a estrutura essencial dos IEC e Imposto sobre o valor acrescentado (“IVA”) – no que diz respeito à determinação da base tributável, bem como à liquidação, à exigibilidade, ao controlo do imposto; e terem como fundamento um “motivo específico”” sendo que, “de acordo com a jurisprudência consolidada do TJUE, este “motivo específico” não pode corresponder a uma finalidade puramente orçamental de obtenção de receita, (cf. Acórdão de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 37)”.
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Neste âmbito, alega a Requerente que “o legislador português também não dotou a CSR de uma estrutura que comprove que a sua criação tenha sido ditada por “motivo específico” distinto de uma finalidade orçamental” pelo que, “(…) sendo a CSR criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, deve considerar-se um imposto desconforme ao artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2008/118”, citando jurisprudência do TJUE que defende que “(…) o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo e que revoga a Diretiva 92/12/CEE, deve ser interpretado no sentido de que não prossegue «motivos específicos», na aceção desta disposição, um imposto cujas receitas ficam genericamente afetadas a uma empresa pública concessionária da rede rodoviária nacional e cuja estrutura não atesta a intenção de desmotivar o consumo dos principais combustíveis rodoviários”.
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Segundo alega a Requerente, “(…) é interpretação do TJUE que a CSR serve, portanto, para financiar despesas suscetíveis de serem custeadas pelo “produto de impostos de qualquer natureza”, como o são a manutenção e alargamento da rede nacional de estradas, não se verificando a afetação adequada da receita que o TJUE exige para concluir pela presença de um “motivo específico”” pelo que “(…) deve ser interpretada no sentido de que não prossegue “motivos específicos”, na aceção da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008” e, “por conseguinte, a CSR introduzida por meio da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, deve considerar-se um imposto ilegal, desconforme ao artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2008/118, de 16 de dezembro de 2008” no que diz respeito ao regime em vigor até 31-12-2022.
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No que diz respeito ao regime em vigor desde 01-01-2023, data a partir da qual “(…) o Estado português financia a Infraestruturas de Portugal com as receitas decorrentes da CSR através da consignação em seu favor de parte da receita do ISP: a “consignação de serviço rodoviário””, alega a Requerente que “(…) sendo calculada exatamente nos mesmos termos e visando os mesmos fins (ilegais) passou, sob a forma de “Consignação de serviço Rodoviário,”, a constituir receita “direta” do ISP, consignada nos precisos montantes ao financiamento da Infraestruturas de Portugal” e, por isso, entende que “(…) as liquidações de ISP, na parcela correspondente à receita consignada ao serviço rodoviário – correspondente, em substância, à CSR, e apurada nos termos do disposto do n.º 2 do artigo 4.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, na sua redação atual – padecem de ilegalidade, nos mesmos termos em que a CSR vigente até 31 de dezembro de 2022 padecia”.
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Adicionalmente, e em caso de dúvida, “(…) considera a Requerente que, em face das matérias aqui em contenta, sempre deverá este douto Tribunal Arbitral suspender a presente instância arbitral e sujeitar quaisquer questões ao Tribunal de Justiça, nos termos previstos no instituto do reenvio prejudicial (…), a que o Estado Português se vinculou nos termos do TFUE, previamente à emissão de qualquer decisão – o que desde já se peticiona para os devidos efeitos legais”.
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RESPOSTA DA REQUERIDA
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A Requerida, na Resposta apresentada, apresentou defesa por excepção e por impugnação, começando por referir que “(…) carece o presente pedido de pronúncia arbitral (…) de qualquer fundamento de facto ou de direito, devendo, consequentemente, ser declarado totalmente improcedente, por não fundado e não provado”.
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Preliminarmente, alega a Requerida que “vem a Requerente no seu pedido de pronúncia arbitral (PPA) requerer a anulação das liquidações identificadas de CSR e de ISP-Consignação de Serviço Rodoviário, com o fundamento de ter (…) “suportado” na íntegra a CSR e a Consignação de Serviço Rodoviário, apurando o (alegado) valor de reembolso com base em faturas” entendendo a Requerida que “são, assim, chamados à colação dois tipos de documentos distintos: (a) a liquidação de CSR, que é apurada através do Documento de Introdução ao Consumo (DIC), que contem todos os elementos que permitem o cálculo e a liquidação do tributo aplicável, (…) bem como a liquidação do imposto correspondente, o qual a Requerente pretende a sua anulação, e (b) a fatura, um documento fiscalmente relevante (…)”, realçando a Requerida que “da DIC resulta um ato tributário stricto sensu, a liquidação de CSR da competência da AT e impugnável nos termos do artigo 51º (…) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (…)” mas “já da fatura não resulta qualquer ato imputável à AT, quer tributário, quer administrativo em matéria tributária”.
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Alega ainda a Requerida que “é doutrinaria e jurisprudencialmente pacífico que o intérprete deve presumir que o legislador soube consagrar na lei o seu pensamento e não pode retirar do elemento literal aquilo que lá não consta”, “o que significa, que não sendo o legislador tributário alheio ao regime da repercussão, (…), não deve a Requerente, uma vez mais de forma equívoca, vir fundamentar a sua legitimidade em interpretações sem correspondência na letra da lei”.
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Prossegue a Requerida efectuando o enquadramento fáctico-normativo da CSR e o contexto actual, concluindo que “(…) a questão jurídica relacionada com a alegada ilegalidade da liquidação da CSR, (…), por ser um tributo desconforme ao Direito da União Europeia, (…), tendo por base o entendimento sufragado pelo despacho proferido pelo TJUE em 07/02/2022, no Proc.º C-460/21, tem vindo a ser suscitada junto do CAAD por diversos sujeitos passivos de ISP/CSR” suscitando, em seguida, matéria de excepção.
Defesa por excepção
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No que diz respeito à defesa por excepção, suscita a Requerida a excepção da incompetência do Tribunal em razão da matéria, a excepção da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, a excepção da ineptidão da Petição inicial por falta de objecto e por ininteligibilidade do pedido e a contradição entre este e a causa de pedir e a excepção da caducidade do direito de acção, a qual será analisada no Capítulo 6. desta decisão arbitral.
Defesa por impugnação
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Adicionalmente, a Requerida apresenta defesa por impugnação, alegando que “(…) não logra a Requerente fazer prova do que alega, designadamente que (…) pagou e suportou integralmente o encargo do pagamento da CSR e do ISP – Consignação de Serviço Rodoviário por repercussão” sendo que “(…) o ónus da prova de factos constitutivos de direito recai sobre quem os invoque”, “pelo que, exigir que seja a Requerida a fazer prova de que não houve repercussão, isto é, fazer prova de facto negativo, configura uma exigência (…) inconstitucional por violação dos princípios da proporcionalidade, da tutela jurisdicional efetiva e do processo equitativo, preceituados nos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa, e do direito ao contraditório e à ampla defesa”.
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Prossegue a Requerida referindo que não se pode “(…) igualmente, presumir a existência de repercussão quando, (…), estamos perante uma repercussão que não é legal, mas meramente económica ou de facto”, “pelo que não se aceita e se impugna, (…), o vertido nos artigos do pedido relativos ao pagamento da CSR, colocando-se em causa e não se podendo dar como provado que a Requerente pagou na integra a CSR alegadamente repercutida na aquisição das quantidades de combustível em apreço e a correspondência dos documentos juntos com o pedido arbitral com a realidade dos factos”, impugnando “(…) o teor do pedido arbitral, porquanto do mesmo não se retiram os factos que a Requerente pretende dar como provados” e impugnando “(…) igualmente o teor dos documentos anexos ao pedido arbitral, porquanto não servem como prova dos factos alegados pela Requerente”.
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Assim, segundo alega a Requerida, “(…) considera-se que nenhum dos elementos de prova apresentados, sustentam qualquer alegado facto invocado no pedido arbitral, nomeadamente que o valor pago pelos combustíveis que o Requerente adquiriu, tem incluída a totalidade (ou sequer, parte) da CSR paga pelo sujeito passivo de ISP/CSR, nem constitui prova bastante quanto aos valores alegadamente pagos/suportados a título de CSR, o que deve ser devidamente valorado em termos de prova (…)”, reiterando que impendia sobre a Requerente “(…) o ónus de provar que o preço dos serviços prestados aos seus clientes, não comportou, a jusante, a repercussão da CSR, por forma a poder sustentar que suportou de forma efetiva o encargo daquele tributo” porquanto “sendo (…) a prova de pagamento da CSR (…) um facto positivo (…) não é prova suficiente justificar a ocorrência de uma efetiva repercussão desse tributo, assente em meros juízos presuntivos, sem efetuar a demonstração objetiva da realidade dos factos através de elementos de prova que se relacionem com os fatores inerentes às transações comerciais que foram realizadas”, citando para este efeito o teor da decisão arbitral proferida, em 15/02/2024, no âmbito do processo n.º 452/2023-T.
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Por outro lado, alega a Requerida que “afirma, a Requerente, que adquiriu combustível aos seus fornecedores, mas não identifica quaisquer atos de liquidação de CSR e/ou datas em que aqueles teriam sido efetuados, em decorrência das DIC submetidas pelo sujeito passivo de ISP/CSR, que possa permitir estabelecer uma qualquer relação entre o combustível por adquirido pela Requerente à sua fornecedora e as liquidações de CSR suportadas, a montante, pelo sujeito passivo” reiterando que “(…) essa identificação seria essencial”, “(…) porque, nos processos em que os sujeitos passivos de ISP/CSR têm vindo, eles próprios, a impugnar, administrativa e judicialmente, as liquidações de CSR, aqueles têm apresentado as DIC, e/ou os DUC e/ou documento comprovativo do pagamento do ISP”.
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Segundo alega a Requerida, “(…) a admitir-se a condenação da AT à restituição dos montantes que a Requerente alegadamente suportou, a título de CSR, sem a exata identificação do ato tributário em causa, poderia conduzir ao absurdo de a AT vir a ser, sucessivamente, condenada a pagar os mesmos montantes de CSR, mais do que uma vez (…)” e, “admitindo (…) que o valor pago pelo combustível adquirido engloba as imposições pagas, os montantes referenciados no requerimento, que a Requerente entende que pagou em sede de CSR são incorretos, uma vez que se limitou a aplicar à quantidade de litros fornecidos (…) a taxa de CSR que se encontrava em vigor (…)” mas, “(…) não tendo existido certificação da medição da temperatura na descarga do combustível adquirido (…), não é possível (…) determinar a unidade tributável para efeitos de determinação da CSR e, consequentemente, saber, a eventual parte da CSR incluída no preço pago pelo combustível adquirido”.
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Entende ainda a Requerida ser “(…) relevante atender ao teor da redação dos pontos 33.º e 34.º do despacho do douto TJUE datado de 7 de fevereiro de 2022 no âmbito do processo n.º C-460/21”, porquanto “(…) em momento algum o TJUE considera ilegal a CSR” e, “não existindo qualquer decisão judicial nacional transitada em julgado que declare a CSR ilegal”, não está “(…) o ordenamento jurídico português em contradição (…) com o Direito da União Europeia”, “inexistindo uma desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva Europeia (…)”.
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Adicionalmente, defende a Requerida que “(…) agindo (…) em conformidade com a legislação nacional e europeia em vigor”, não se verifica “(…) no caso em apreço qualquer tipo de erro imputável aos serviços” porquanto “(…) no caso sub judice, há que considerar que o pedido arbitral foi efetuado na sequência do pedido de revisão oficiosa apresentado em 19-07-2023 junto da Autoridade Tributária e Aduaneira” e, “neste âmbito, a alínea c), do n.º 3, do artigo 43.º da LGT, consagra um critério especial para os casos em que seja apresentado pedido de revisão oficiosa da liquidação, dispondo que são também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias: a) (…); b)(…); c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária. (…)”.
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“Deste modo, seguindo a abundante e consolidada jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, mormente a vertida nos Acórdãos de 28-01-2015, no Processo n.º 0722/14, de 11-12-2019, no Processo n.º 058/19.9BALSB, de 20-05-2020, no Processo n.º 05/19.8BALSB, de 26-05-2022, no Proc. n.º 159/21.3BALSB, entende-se que os juros indemnizatórios só serão devidos depois de decorrido um ano após a apresentação dos pedidos de revisão oficiosa, e não desde a data do pagamento do imposto”.[2]
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Nestes termos, segundo entende a Requerida, “(…) dado que no caso concreto o pedido de revisão oficiosa foi apresentado em 19-07-2023, só haveria lugar, em sintonia com a jurisprudência citada, ao pagamento de juros indemnizatórios um ano após a apresentação daquele pedido, face ao estabelecido na alínea c), do n.º 3, do artigo 43.º da LGT”.
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Adicionalmente, em matéria de pedido de reembolso, refere ainda a Requerida, citando jurisprudência do TJUE, que “(…) ainda que se verificassem os pressupostos legais e processuais, e se considerasse efetuada a prova da repercussão económica da CSR, o Estado-Membro, pode recusar/opor-se a um pedido de reembolso, apresentado pelo comprador repercutido, com o fundamento de não ter sido esse comprador que o pagou às autoridades fiscais, desde que, nos termos do direito interno, esse comprador possa exercer uma ação civil de repetição do indevido contra o sujeito passivo, tal como ocorre no direito nacional”, “pelo que, nessa medida, se impugna igualmente o alegado pela Requerente no pedido arbitral” e, “(…) por mero dever de cautela e raciocínio, (…), se impugna para os devidos efeitos legais o invocado no pedido arbitral que esteja em contradição com o teor da (…) Resposta”.
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Nestes termos, conclui a Requerida a sua Resposta, defendendo que “face a todo o exposto, deve o Tribunal arbitral decidir como aqui propugnado pela Requerida, no sentido da improcedência do pedido de anulação do indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa, bem como da anulação parcial da(s) liquidação(ões) de ISP/CSR, não havendo, consequentemente, lugar ao reembolso da CSR alegadamente repercutida, nem ao pagamento de juros indemnizatórios” pelo que “nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá deverá: a) Ser extinta a instância arbitral, e absolvida da mesma a Requerida, face à verificação da exceção da incompetência em razão da matéria, e/ou da exceção da ilegitimidade processual, e/ou da exceção da ineptidão da petição inicial/pedido arbitral, b) Caso assim não se entenda, ser a Requerida absolvida do pedido, face à verificação da exceção de caducidade do direito de ação, e/ou da exceção de falta de legitimidade substantiva; Ou, caso assim não se entenda, c) Ser o pedido de pronúncia arbitral julgado totalmente improcedente, por infundado e não provado”.
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SANEADOR
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O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT e é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente.
Nesta matéria, tendo em consideração que a Requerida veio suscitar, na Resposta apresentada, a excepção da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria, desde já se adianta que se irá considerar a mesma como improcedente na análise que irá ser realizada, preliminarmente, no Capítulo 6. desta decisão arbitral.
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As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.
Neste âmbito, tendo em consideração que a Requerida veio suscitar, na Resposta apresentada, a excepção da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, desde já se adianta que se irá considerar a mesma como improcedente na análise que irá ser realizada, preliminarmente, no Capítulo 6. desta decisão arbitral.
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O pedido de pronúncia arbitral é parcialmente tempestivo tendo em conta a sua apresentação no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.
Nesta matéria, tendo em consideração que a Requerida veio suscitar, na Resposta apresentada, a excepção da caducidade do direito de acção suportado na intempestividade do pedido arbitral e do pedido de revisão oficiosa previamente apresentada, desde já se adianta que se irá considerar a mesma como parcialmente procedente na análise que irá ser realizada, preliminarmente, no Capítulo 6. desta decisão arbitral.
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A Requerida veio ainda suscitar, na Resposta apresentada, e para além das acima já referidas, a excepção da ineptidão da Petição Inicial pela alegada falta de objecto e por ininteligibilidade do pedido e contradição entre este e a causa de pedir, a qual será também considerada como improcedente na análise que irá ser realizada, preliminarmente, no Capítulo 6. desta decisão arbitral.
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Não foram suscitadas quaisquer outras excepções de que cumpra conhecer nem se verificam nulidades.
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MATÉRIA DE FACTO
5.1. Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas Partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].
5.2. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito.
Dos factos provados
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No âmbito da sua actividade, a Requerente adquiriu à B... S.A. (B...) gasóleo rodoviário (769.093,10 litros) e gasolina (11.531,41 litros), nos anos de 2019 a 2022, tendo suportado CSR no montante de EUR 86.372,57 (em conformidade com o doc. nº 1 e doc. nº 5 anexados com o ppa).
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Tendo em consideração a procedência da caducidade do direito de acção quanto ao período 01/2019 (vide Capítulo 6. desta decisão), o montante de CSR sindicável quanto aos anos de 2019 a 2022 ascende a um total de EUR 95.216,98, porquanto tem de ser retirado do valor indicado no ponto anterior, o montante total de EUR 796,66, que respeita à CSR suportada nas aquisições efectuadas em Janeiro/2019 (em conformidade com o doc. nº 1 e doc. nº 5 anexados com o ppa).
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No âmbito da sua actividade, a Requerente adquiriu à B... gasóleo rodoviário (77.751,15 litros) e gasolina (11.617,14 litros), no período de 01/2023 a 05/2023, tendo suportado ISP (na parcela da Consignação do Serviço Rodoviário), no montante de
EUR 9.641,07 (em conformidade com o doc. nº 2 e doc. nº 5 anexados com o ppa).
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A Requerente anexou para cada um dos períodos sindicáveis objecto do pedido, cópia das facturas emitidas pela fornecedora dos combustíveis (B...), nas quais não há evidência de qualquer repercussão de CSR (02/2019 a 12/2022) ou de pagamento de ISP – Consignação do Serviço Rodoviário (01/2023 a 05/2023), em conformidade com o doc. nº 5 anexado com o ppa.
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Consideraram-se provados os pagamentos referentes às facturas apresentadas, porquanto:
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Não se vislumbra qualquer razão para duvidar da correspondência das facturas apresentadas aos respectivos originais e
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No que diz respeito à prova dos pagamentos das facturas apresentadas, a Requerente apresentou, com a resposta às excepções, cópia de email de 07-06-2024, enviado por Key Account Manager da C... (responsável pelo Cliente A...– aqui Requerente), no qual se refere que a Requerente não tem, a 31-12-2023, qualquer dívida em conta corrente, não tendo este documento sido impugnado pela Requerida (apesar de esta ter sido devidamente notificada para exercer contraditório).
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O montante da CSR quantificada no pedido teve por base o rácio de EUR 111 por cada 1.000 litros de gasóleo (artigo 4º, nº 2 da Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto, em vigor à data dos factos).
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A Requerente enviou, em 19-07-2023, à Direção de Serviços dos Imposto Especiais sobre o Consumo e do Imposto sobre Veículos, por correio registado (RF ... PT), pedido de revisão oficiosa abrangendo a) os actos de liquidação de ISP relativas aos períodos de 01/2019, 02/2019, 03/2019, 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/2020, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021 , 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022 e 12/2022, liquidadas e pagas pela B... na parte correspondente à CSR alegadamente paga (através do mecanismo de repercussão), pela Requerente e b) as liquidações de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário relativas aos períodos de 01/2023, 02/2023, 03/2023, 04/2023 e 05/2023, liquidadas pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. alegadamente suportada pela Requerente.
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A Direção de Serviços dos Imposto Especiais sobre o consumo não se pronunciou, dentro do prazo de quatro meses, sobre o pedido de revisão oficiosa tendo, em consequência, se formado, em 19-11-2023, a presunção de indeferimento tácito ao abrigo do disposto 57º, nº 1 da LGT.
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A Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral, em 16-02-2024, com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação do acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa identificado no ponto anterior, bem como dos actos de liquidação de CSR relativos aos períodos de Janeiro de 2019 (31/01) a Dezembro de 2022 (31/12) e actos de liquidação de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário relativos aos períodos de Janeiro/2023 (31/01) a Maio/2023 (31/05), liquidados pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. e suportada pela Requerente, peticionando a inerente devolução dos montantes suportados, acrescidos de juros indemnizatórios a calcular desde o momento do seu pagamento até à sua integral devolução.
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O montante total de imposto suportado ascendeu, em conformidade com o alegado no PPA, a um total de EUR 96.013,64, sendo EUR 86.372,57 relativos ao período de Janeiro/2019 a Dezembro/2022 e EUR 9.641,07 relativos ao período de Janeiro a Maio/2023.
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A Requerente, no decurso do processo arbitral, juntou ao processo cópia de declaração de repercussão de CSR, para os anos de 2019 a 2022, emitida pela entidade fornecedora de combustíveis (B...), em papel timbrado desta empresa, assinada por “D...”, com o seguinte teor:
“B..., S.A., pessoa coletiva n.º..., com sede na Rua..., ..., ...-... Lisboa, pela presente declara, para os devidos efeitos, que a Contribuição de Serviço Rodoviário por si entregue, na qualidade de sujeito passivo, junto dos cofres do Estado, por referência ao combustível rodoviário fornecido à empresa A..., S.A. com o número de identificação de pessoa coletiva ..., nos anos de 2019 a 2022, foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa”.
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A Requerida não impugnou o teor do documento referido no ponto anterior apesar de ter sido devidamente notificada para exercer contraditório.
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Foi dado como provada a intempestividade do pedido de revisão oficiosa quanto às liquidações de CSR que a Requerente suportou, via mecanismo de repercussão, nas às facturas emitidas, em 31-12-2019, pela B..., pelos fundamentos apresentados no Capítulo 6. desta decisão.
Motivação quanto à matéria de facto
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No tocante à matéria de facto provada, a convicção do Tribunal Arbitral fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes e no teor dos documentos juntos aos autos pela Requerente e pela Requerida (processo administrativo).
Dos factos não provados
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Não se provou que a Requerida tenha efectuado qualquer diligência na sequência da apresentação do pedido de revisão oficiosa, designadamente, tendo em vista apurar junto da entidade emitente das facturas de venda de combustíveis à Requerente quais as liquidações de CSR de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário que lhe estavam subjacentes.
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Não se provou quais as liquidações que a Requerida emitiu relativamente ao combustível fornecido à Requerente pela B..., nem se provou que a Requerida não pudesse apurar quais as liquidações relacionadas com as vendas de combustíveis à Requerente.
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Não se provou que a Requerente pudesse identificar essas liquidações de CSR e de ISP – Consignação de Serviços Rodoviário, pois não é sujeito passivo e não tinha de ser notificada das liquidações.
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Não se verificaram quaisquer factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.
6. MATÉRIA DE DIREITO
6.1. Nos autos, a Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral, “com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, a) das liquidações de IEC cuja anulação se peticionou no pedido de revisão oficiosa apresentado cujo indeferimento tácito constitui o objeto imediato da presente ação arbitral, relativas aos períodos de 01/2019, 02/2019, 03/2019, 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/2020, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021 , 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022 e 12/2022, liquidadas e pagas pela B..., S.A. (…) na parte correspondente à Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) que foi paga (através do mecanismo de repercussão), pela (…) Requerente (…)” e “b)E das liquidações de IEC relativas aos períodos de 01/2023, 02/2023, 03/2023, 04/2023 e 05/2023, liquidadas pela B..., na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, S.A. (designada por “Consignação de serviço rodoviário”) suportada pela aqui Requerente (…)”, peticionando a “(…) inerente devolução daqueles montantes, acrescidos de juros indemnizatórios a calcular deste o momento do seu pagamento até à sua integral devolução”.
6.2. A Requerida, na Resposta, apresentou defesa por excepção e por impugnação, concluindo que deverá “(…) a) Ser extinta a instância arbitral, e absolvida da mesma a Requerida, face à verificação da exceção da incompetência em razão da matéria, e/ou da exceção da ilegitimidade processual, e/ou da exceção da ineptidão da petição inicial/pedido arbitral, b) Caso assim não se entenda, ser a Requerida absolvida do pedido, face à verificação da exceção de caducidade do direito de ação, e/ou da exceção de falta de legitimidade substantiva; Ou, caso assim não se entenda, c) Ser o pedido de pronúncia arbitral julgado totalmente improcedente, por infundado e não provado”.
Matéria de excepção suscitada pela Requerida
6.3. Preliminarmente à apreciação do mérito do pedido importa apreciar as excepções suscitadas pela Requerida (da incompetência do Tribunal em razão da matéria, da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, da ineptidão da petição inicial por falta de objecto, da ininteligibilidade do pedido e a contradição entre este e a causa de pedir e da caducidade do direito de acção), começando pela excepção da incompetência, que é de conhecimento prioritário [artigo 13º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea c), do RJAT].
Excepção da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria
6.4. A Requerida, na sua Resposta, suscitou a excepção da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria porquanto alega, em conformidade com o acima já sintetizado no Capítulo 3. deste Acórdão, que “a Autoridade Tributária está vinculada à jurisdição dos Tribunais arbitrais nos termos da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, sendo o objeto desta vinculação definido pelo artigo 2º que dispõe que os serviços e organismos (…) vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro” e “daqui decorre que foi intenção do legislador restringir a vinculação dos serviços e organismos ao CAAD no âmbito de pretensões que dizem respeito, especificamente, a impostos, aqui não se incluindo tributos de outra natureza, tais como as contribuições” pelo que, estando “(…) no caso em apreço (…) em causa a apreciação da legalidade da (…) (CSR) e respetivas liquidações”, bem como das liquidações de ISP na parcela da receita da Consignação de serviço Rodoviário à Infraestruturas de Portugal, e “(…) tratando-se de uma contribuição e não um imposto, as matérias sobre a CSR encontram-se (…) excluídas da arbitragem tributária, por ausência de enquadramento legal”.
6.5. Assim, segundo entende a Requerida, “(…) independentemente do nomen iuris ou da natureza jurídica da CSR, a verdade é que não é (…) um imposto e, portanto, o CAAD não tem competência para decidir sobre esta matérias” pelo que, “(…) encontrando-se a CSR excluída da arbitragem tributária (…), não se encontra verificada a arbitrabilidade do thema decidendum” e, “não sendo os tribunais arbitrais do CAAD materialmente competentes para conhecer do mérito do pedido em apreço”, conclui a Requerida que “(…) estamos perante uma exceção dilatória (...), a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa”.
6.6. Mas, “ainda que assim não se entenda, [alega a Requerida que] (…) sempre existiria a incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria (…)” porquanto, “(…) resulta do teor do pedido de pronúncia arbitral, e sua fundamentação, que o que a Requerente suscita junto desta instância arbitral é a legalidade do regime da CSR, no seu todo” mas, “(…) conforme decorre do RJAT, a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação” “e este contencioso não consente nem o escrutínio sobre a integridade de normas emanadas no exercício da função político-legislativa do Estado, nem a pronúncia sobre a restituição de valores/montantes, por conta da declaração de ilegalidade ou anulação de atos de liquidação” pelo que, “não sendo da competência do tribunal arbitral nem a fiscalização da legalidade de normas em abstrato, sem enquadramento processual impugnatório de ato concreto de liquidação, nem a execução de sentenças/decisões”, entende a Requerida que se afigura “(…) inconstitucional uma interpretação que determine que o artigo 2.º do RJAT inclui a apreciação dos pedidos aqui formulados pela Requerente, quando a letra e o espírito da norma não o permitem”.
6.7. E, acrescenta, “ainda que se considerasse a competência do tribunal arbitral para a apreciação da ilegalidade dos atos de liquidação de ISP/CSR, nunca poderia o tribunal arbitral pronunciar-se sobre atos de repercussão da CSR, subsequentes e autónomos dos atos de liquidação de ISP/CSR, e que, para mais, não correspondem a uma repercussão legal, mas a uma repercussão meramente económica ou de facto (…)”, concluindo que “(…) o pedido arbitral da Requerente extravasa e excede a competência do (…) tribunal arbitral em razão da matéria”, “o que consubstancia uma exceção dilatória (…), a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa” sendo assim “(…) forçoso concluir que deve o (…) tribunal arbitral declarar-se incompetente em razão da matéria e, consequentemente, absolver a Requerida da instância”.
6.8. A Requerente, na resposta às excepções suscitadas veio, no que diz respeito à da incompetência do Tribunal Arbitral, referir que “(…) à luz do regime jurídico (…) descrito, dificilmente se poderia concluir que a CSR constitui uma contribuição financeira” sendo que “segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a qualificação de uma contribuição, um imposto, uma taxa ou um direito, à luz do Direito da União Europeia, compete ao Tribunal de Justiça, em função das caraterísticas objetivas de imposição, independentemente da qualificação que lhe é dada pelo direito nacional” e, “para o Tribunal de Justiça, o tributo instituído pela lei portuguesa – e que este designou por “contribuição” – constitui um imposto porquanto, em virtude do desenho escolhido pelo legislador português, representa uma imposição indireta sem motivo específico e como tal suscetível de frustrar os desideratos de harmonização positiva subjacentes à Diretiva 2008/118”.
6.9. “Portanto, mesmo que, à luz da jurisprudência nacional, a CSR houvesse de ser qualificada como uma contribuição financeira (inconstitucional, desde já se avança), nem por isso ela – tal como está desenhada – deixaria de ser um imposto indireto na aceção da Diretiva”
6.10. Adicionalmente, refere a Requerente que “(…) atentos os princípios da interpretação conforme e do primado do Direito da União Europeia (consagrado no artigo 8, n.º 4 da CRP) há que considerar que os dispositivos legais que regulam a CSR devem ser interpretados no sentido de que consagram um imposto indireto sobre o consumo de produtos petrolíferos” e, “em consequência, entende a Requerente que se impõe concluir que todos os atos tributários relacionados com a CSR serão plenamente arbitráveis nos termos dos artigos 2.º da Portaria n.º 112- A/2011, de 22 de março, e artigo 2.º do RJAT, improcedendo, em conformidade, a exceção de incompetência material invocada pela AT”.
6.11. Cumpre analisar a eventual procedência/improcedência desta excepção.
6.12. A este respeito, e seguindo de muito perto a posição assumida no Acórdão proferido no âmbito do processo P 113/2023-T, de 15-07-2023 e P 410/2023-T, notificada a
15-11-2023, adianta-se, desde já, que entende este Tribunal Arbitral que improcede a excepção da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria para apreciar o mérito do pedido arbitral, tendo em consideração os argumentos que, a seguir, se apresentam.
6.13. Com efeito, a competência contenciosa dos Tribunais Arbitrais em matéria de arbitragem tributária, tal como resulta do artigo 2º do RJAT, compreende a apreciação de pretensões que visem a “declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta” e a “declaração de ilegalidade de atos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de atos de determinação da matéria coletável e de atos de fixação de valores patrimoniais”.
6.14. O artigo 4º, nº 1, do RJAT faz ainda depender a vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos Tribunais Arbitrais de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das Finanças e da Justiça, que deverá estabelecer, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos e, o diploma que, em execução desse preceito, define o âmbito e os termos da vinculação da Autoridade Tributária à jurisdição dos Tribunais Arbitrais que funcionam no CAAD é a Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março, que no seu n.º 2, sob a epígrafe “Objeto de vinculação”, e com a alteração resultante da Portaria nº 287/2019, de 3 de setembro, dispõe o seguinte:
“Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objeto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com exceção das seguintes:
a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
b) Pretensões relativas a atos de determinação da matéria coletável e atos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indiretos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;
c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indiretos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação;
d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efetuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira;
e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo”.[3]
6.15. A Portaria n.º 112-A/2011, também chamada Portaria de vinculação, fixa um segundo nível de delimitação das pretensões que poderão ser sujeitas à jurisdição arbitral, mas tratando-se de um mero regulamento de execução, a Portaria não poderia ir além do estabelecido na lei quanto ao âmbito de competência material dos Tribunais Arbitrais, podendo estabelecer restrições quanto ao âmbito da vinculação à arbitragem tributária, mormente por referência ao tipo de litígios e ao valor do processo.
6.16. A este propósito, o acórdão proferido no Processo n.º 48/2012-T, de 06-07-2012, depois seguido por diversos outros arestos, consignou que “a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do [RJAT]. Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o artigo 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos. Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele artigo 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este tribunal arbitral”.
6.17. Assim, a Portaria de vinculação, aparentemente, estabelece duas limitações: (i) refere-se a pretensões “relativas a impostos”, de entre aquelas que se enquadram na competência genérica dos Tribunais Arbitrais e (ii) a impostos cuja administração esteja cometida à Autoridade Tributária.
6.18. Nestes termos, terá assim de se concluir que a vinculação se reporta a qualquer das pretensões mencionadas no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT que respeitem a impostos (com a exclusão de outros tributos) e a impostos que sejam geridos pela Autoridade Tributária.
6.19. Note-se que a constitucionalização das contribuições financeiras resultou da alteração introduzida no artigo 165º, nº 1, alínea i), da Lei Fundamental, pela revisão constitucional de 1997, que autonomizou as contribuições financeiras a favor das entidades públicas como uma terceira categoria de tributos.
6.20. Por outro lado, a LGT passou a incluir, entre os diversos tipos de tributos, os impostos e outras espécies criadas por lei, designadamente as taxas e as contribuições financeiras a favor das entidades públicas, definindo, em geral, os pressupostos desses diversos tipos de tributos (artigo 4º da LGT)
6.21. Neste âmbito, a doutrina tem caracterizado as contribuições financeiras como um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas como taxas colectivas, na medida em que visam retribuir os serviços prestados por uma entidade púbica a um certo conjunto ou categoria de pessoas.
6.22. A este respeito, como referem Gomes Canotilho/Vital Moreira, “a diferença essencial entre os impostos e estas contribuições bilaterais é que aqueles visam financiar as despesas públicas em geral, não podendo, em princípio, ser consignados a certos serviços públicos ou a certas despesas, enquanto que as segundas, tal como as taxas em sentido estrito, visam financiar certos serviços públicos e certas despesas públicas (responsáveis pelas prestações públicas de que as contribuições são contrapartida), aos quais ficam consignadas, não podendo, portanto, ser desviadas para outros serviços ou despesas”.
6.23. Neste sentido, as contribuições são tributos (com uma estrutura paracomutativa), dirigidos à compensação de prestações presumivelmente provocadas ou aproveitadas pelos contribuintes, distinguindo-se das taxas que são tributos rigorosamente comutativos e que se dirigem à compensação de prestações efetivas.
6.24. Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem também reconhecido a existência dessas diferentes categorias jurídico-tributárias (designadamente para efeito de extrair consequências quanto à competência legislativa), admitindo que as taxas e outras contribuições de carácter bilateral só estão sujeitas a reserva parlamentar quanto ao seu regime geral, mas não quanto à sua criação individual e quanto ao regime concreto, podendo portanto ser criadas por diploma legislativo governamental e reguladas por via regulamentar desde que observada a lei-quadro.
6.25. Ou seja, não há dúvida que as contribuições financeiras se distinguem dos impostos.
6.26. Analisando a contribuição em apreço (CSR), criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, a mesma visa financiar a rede rodoviária nacional [a cargo da EP - Estradas de Portugal, E. P. E. (artigo 1º), que, entretanto, passou a denominar-se Infraestruturas de Portugal, S.A. (IP)], sendo que o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo desta entidade é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável (artigo 2º).
6.27. A referida contribuição corresponde à contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis, e constitui uma fonte de financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da IP no que respeita à respetiva conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento, ainda que a exigência da contribuição não prejudique a eventual aplicação de portagens em vias específicas ou o recurso da entidade concessionária a outras formas de financiamento (artigo 3º).
6.28. Esta contribuição incide sobre a gasolina e o gasóleo rodoviário sujeitos ao imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos e dele não isentos (artigo 4º, n.º 1) e é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo (artigo 5º, nº 1), sendo que o produto da CSR constitui receita própria da denominada IP (artigo 6º).
6.29. Adicionalmente, a actividade de conceção, projecto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional, que é objecto de financiamento através da CSR foi atribuída, em regime de concessão, à EP - Estradas de Portugal, E. P. (agora denominada IP) e, pelo Decreto-Lei nº 380/2007, de 13 de Novembro, que aprovou as bases da concessão e nas quais se prevê que, entre outros rendimentos, essa contribuição constitui receita própria dessa entidade (Base 3, alínea b)) sendo que naquelas bases da concessão é estabelecido, como uma das obrigações da concessionária, a prossecução dos “objetivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental” (Base 2, n.º 4, alínea b)).
6.30. Assim, à luz do regime jurídico sucintamente descrito, dificilmente se poderia concluir que a CSR constitui uma contribuição financeira.
6.31. Com efeito, como se refere no Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 304/2022-T, de 05-01-2023, a CSR não tem como pressuposto uma prestação, a favor de um grupo de sujeitos passivos, por parte de uma pessoa coletiva, sendo estabelecida a favor da EP - Estradas de Portugal, E. P. E. (artigo 3º, nº 2), agora denomina IP, entidade titular da receita correspondente (artigo 6º).
6.32. No entanto, os sujeitos passivos da contribuição (as empresas comercializadoras de produtos combustíveis rodoviários) não são os destinatários da actividade desenvolvida por aquela entidade, a qual consiste na “conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento” da rede de estradas (artigo 3º, nº 2).
6.33. Por outro lado, nada permite afirmar que a responsabilidade pelo financiamento da actividade administrativa (que se encontra atribuída à IP) é imputável aos sujeitos passivos da contribuição (que são as empresas comercializadoras de combustíveis rodoviários) porquanto, o artigo 2º da Lei n.º 55/2007 declara expressamente que o “financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E.P. E. (...) é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável”, sendo que o financiamento da rede rodoviária nacional é assegurado pelos respectivos utilizadores, que são os beneficiários da actividade pública desenvolvida pela agora denominada IP, verificando-se, no entanto, que a contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, que, nos termos do artigo 4º, nº 1, alínea a), do Código dos IEC, são os “depositários autorizados” e os “destinatários registados”, não existindo, deste modo, qualquer nexo específico entre o benefício emanado da actividade da entidade pública titular da contribuição e o grupo dos sujeitos passivos.
6.34. Adicionalmente, refira-se ainda que o regime jurídico da CSR não é equiparável ao previsto para a Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético (CESE) porquanto:
6.34.1. A CESE (criada pela Lei do Orçamento do Estado para 2014), é considerada como uma contribuição extraordinária que tem “por objetivo financiar mecanismos que promovam a sustentabilidade sistémica do sector energético, através da constituição de um fundo que visa contribuir para a redução da dívida tarifária e para o financiamento de políticas sociais e ambientais do sector energético”, incidindo sobre as pessoas singulares ou coletivas que integram o sector energético nacional;
6.34.2. A receita obtida é consignada ao Fundo para a Sustentabilidade Sistémica do Sector Energético (FSSSE), criado pelo Decreto-Lei n.º 55/2014, de 9 de Abril, com o objectivo de estabelecer mecanismos que contribuam para a sustentabilidade sistémica do sector energético, designadamente através da contribuição para a redução da dívida e ou pressão tarifárias e do financiamento de políticas do sector energético de cariz social e ambiental, de medidas relacionadas com a eficiência energética, de medidas de apoio às empresas e da minimização dos encargos financeiros para o Sistema Elétrico Nacional (artigo 11º);
6.34.3. A CESE tem por base uma contraprestação de natureza grupal, na medida em que constitui um preço público a pagar pelo conjunto de pessoas singulares ou colectivas que integram o sector energético nacional à entidade à qual são consignadas as receitas;
6.34.4. A CESE não se reconduz à taxa stricto sensu, visto que não incide sobre uma prestação concreta e individualizada que a Administração dirija aos respectivos sujeitos passivos, nem preenche o requisito de unilateralidade que caracteriza o imposto, uma vez que não tem como finalidade exclusiva a angariação de receita, nem se destina à satisfação das necessidades financeiras do Estado, antes se pretendendo que o sector energético contribua para a cobertura do risco sistémico que é inerente à sua actividade.
6.35. Nestes termos, a CESE trata-se de um tributo de carácter comutativo, embora baseado numa relação de bilateralidade genérica ou difusa que, interessando a um grupo homogéneo de destinatários e visando prevenir riscos a este grupo associados, se efectiva na compensação de eventual intervenção pública na resolução de dificuldades desse sector, assumindo assim a natureza jurídica de contribuição financeira.
6.36. E, tendo em consideração o acima exposto, essa caracterização não é extensiva à CSR, pelo que não é aplicável, ao caso em análise, a jurisprudência arbitral que veio declarar a incompetência do Tribunal Arbitral ratione materiae para a apreciação de litígios que tinham como objeto a CESE (como é o caso do Acórdão proferido no âmbito do Processo nº 714/2020-T, de 12-07-2021).
6.37. Aos argumentos acima apresentados, acresce ainda o relativo ao facto de, segundo a jurisprudência do TJUE, a qualificação de uma tributação, um imposto, uma taxa ou um direito, à luz do Direito da União Europeia, competir ao Tribunal de Justiça, em função das características objectivas de imposição, independentemente da qualificação que lhe é dada pelo direito nacional. [4]
6.38. Não obstante, refira-se que, no processo arbitral que motivou o pedido de reenvio prejudicial ao Tribunal de Justiça (Processo nº 564/2020-T, de 30-03-2022), o Tribunal qualificou a CSR como um imposto, formulando as questões prejudiciais com base nesse pressuposto mas, na decisão em que culminou esse pedido de reenvio (o Despacho do Tribunal de Justiça de 07-02-2022 Vapo Atlantic, processo C-460/21), o TJUE, para além de não colocar em causa essa qualificação, assume, para efeitos do artigo 1 da Diretiva 2008/118, um conceito funcional ou autónomo de imposto indireto, nos termos do qual ficam abrangidas quaisquer “imposições” indiretas que, pelas suas caraterísticas estruturais e teleológicas, não tenham um “motivo específico” na aceção da diretiva e possam, por conseguinte, privar o imposto especial de consumo harmonizado de “todo o efeito útil”. [5]
6.39. Ou seja, para o TJUE, o tributo instituído pela lei portuguesa (e que esta designou por “contribuição”) constitui um imposto porquanto, em virtude do desenho escolhido pelo legislador português, representa uma imposição indireta sem motivo específico e como tal suceptível de frustrar os desideratos de harmonização positiva subjacentes à Diretiva 2008/118 porquanto foi o legislador português que, não obstante classificar o tributo como “contribuição”, definiu a respectiva incidência subjetiva em termos análogos à do ISP (artigo 5 da Lei nº 55/2017, de 31 de Agosto), colocando-se assim, independentemente da qualificação para que eventualmente apontasse a (inconstante) jurisprudência constitucional nacional, no âmbito de aplicação do artigo 1º, nº 2 da Diretiva 2008/118.[6]
6.40. Assim, atentos os princípios da interpretação conforme e do primado do Direito da União Europeia (consagrado no artigo 8º, nº 4 da CRP, tal como interpretado pelo Tribunal Constitucional, no acórdão nº 422/2020), há que considerar que os dispositivos legais que regulam a CSR devem ser interpretados no sentido de que consagram um imposto indireto sobre o consumo de produtos petrolíferos.
6.41. Nestes termos, face ao acima exposto, improcede a alegada excepção da incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria suscitada pela Requerida quanto ao pedido de declaração de ilegalidade das liquidações de ISP/CSR relativas aos períodos de 01/2019 a 12/2022, bem como quanto ao pedido de declaração de ilegalidade das liquidações de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário relativas aos períodos de 01/2023 a 05/2023, pelas mesmas razões.
6.42. Por outro lado, tendo em consideração que a Requerente formulou um pedido de pronúncia arbitral [na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado em 19-07-2023, relativo à declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de CSR praticados pela Requerida, consubstanciados nos consequentes actos de repercussão da referida CSR (facturas referentes aos combustíveis adquiridos, pela Requerente, à B...), no período compreendido entre Janeiro/2019 e Dezembro/2022, bem como nos actos de liquidação de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário relativos aos períodos de Janeiro/2023 a Maio/2023, invocando a Requerente como causa de pedir, (i) a desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva 2008/118, do Conselho, considerando que a CSR é um tributo ilegal e, em consequência, considera que as liquidações de CSR padecem do vício de ilegalidade abstracta, e que (ii) as liquidações de ISP, na parcela correspondente à receita consignada ao serviço rodoviário (correspondente, em substância, à CSR), padecem de ilegalidade, nos mesmos termos em que a CSR vigente até 31 de dezembro de 2022 padecia, não se pode deixar de concluir pela competência contenciosa do Tribunal Arbitral para a apreciação do litígio (ainda que por via de apreciação dos actos de repercussão da CSR).[7]
Questão da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente
6.43. Neste âmbito, a Requerida refere que “(…) desde logo é importante salientar que - ao contrario do que entende a ora Requerente - a “Consignação de Serviço Rodoviário” não corresponde à “Contribuição de Serviço Rodoviário”, nem houve um mero exercício legislativo de “redenominação” e de incorporação direta no ISP [art.º 137º do PPA]” porquanto “a Lei nº 24-E/2022, de 30 de dezembro (que entrou em vigor em 01-01-2023) veio introduzir profundas alterações nesta matéria, as quais, fundamentalmente, se traduziram na extinção da CSR e, concomitantemente, na previsão de consignação parcial da receita do ISP ao serviço rodoviário” e, “por via dessa lei, passou a vigorar um novo regime, nos termos do qual, o ISP passou a compreender o montante das taxas unitárias do imposto, no qual está integrado o montante consignado ao serviço rodoviário em território continental, e o montante cobrado a título de adicionamento sobre as emissões de CO2 (…)”.
6.44.“Ou seja, por via dessas alterações, ocorreu a extinção da CSR (enquanto contribuição autónoma que incidia sobre determinados produtos sujeitos a ISP) e, simultaneamente, um aumento da taxa do ISP correspondente ao montante consignado ao serviço rodoviário em território continental”, pelo que “daqui decorre que, a partir de 01-01-2023: • não há lugar a cobrança de quaisquer quantias a titulo de CSR (extinta em 31-12-2022); • as liquidações efetuadas ao abrigo do novo regime fiscal, decorrente da Lei n.º 24-E/2022 (tendo por base o montante das taxas unitárias do imposto, no qual está integrado o montante consignado ao serviço rodoviário em território continental, e o montante cobrado a título de adicionamento sobre as emissões de CO2 (…), não enfermam de ilegalidade”, “nos mesmos termos em que a CSR vigente até 31 de Dezembro de 2022”, como alegado, nem violam o artigo 1º, n.º 2 da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008”.
6.45. E, segundo entende a Requerida “acresce ainda que, estando em causa, face às alterações introduzidas pela Lei n.º 24-E/2022, liquidações de ISP (e já não de CSR), independentemente dos demais fundamentos que têm vindo a ser suscitados nestas ações, é manifesto que a requerente (que não foi o sujeito passivo da liquidação) carece de legitimidade para solicitar a revisão das mesmas e consequente reembolso com fundamento em erro, por força do disposto nos artigos 15º n.º 2 e 16º do CIEC (neste mesmo sentido, se pronunciou o tribunal arbitral em relação à CSR propriamente dita quando esta ainda estava autonomizada em relação ao ISP– cfr. Processos do CAAD 332/2023 e 409/2023)”.
6.46. Assim, refere a Requerida que, tendo em consideração o teor do pedido apresentado pela Requerente, “(…) procede-se à análise do PPA em conjunto para a CSR e para a Consignação de Serviço Rodoviário, ressalvando-se, sempre que se justifique, a diferença entre os dois regimes”, salientando que “(…) apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago” pelo que considera “(…) importante salientar que, apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento dos respetivos ISP/CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago” sendo que “no caso concreto, não se encontram reunidos os pressupostos para a revisão dos atos tributários, porquanto tal direito não se encontra incluído na esfera jurídica do repercutido económico ou de facto, não podendo a entidade em que alegadamente teria sido repercutido o imposto apresentar pedido de revisão ou de reembolso por erro”.
6.47. “Ou seja, não sendo a Requerente sujeito passivo (…) não tem legitimidade (…) nem para apresentar pedido de revisão oficiosa nem, consequentemente, o presente pedido arbitral”, porquanto entende a Requerida que “(…) não pode (…) vir a Requerente pedir à AT o reembolso de um tributo que nunca entregou ao Estado”, “considerando-se, assim, que a repercussão económica ou de facto, a não prevista na lei e contabilisticamente prevista no PVP, não atribui legitimidade procedimental e processual a quem venha eventualmente a suportar o encargo do imposto”, concluindo que a Requerente carece de “legitimidade para solicitar a anulação das referidas liquidações”.
6.48. Prossegue a Requerida referindo que “(…) contrariamente ao que a Requerente alega, não existe no âmbito da CSR um ato tributário de repercussão legal, subsequente e autónomo do(s) ato(s) de liquidação de ISP/CSR, sendo que as faturas não corporizam atos de repercussão de CSR, apenas titulando operações de compra e venda de combustíveis, e que o valor pago a título de CSR pelo sujeito passivo de ISP/CSR, pode, ou não, ter sido repercutido, no preço pago pelos adquirentes dos combustíveis”.
6.49. Assim, conclui a Requerida que “(…) inexistindo efetiva titularidade do direito a que se arroga, carece a Requerente de legitimidade processual, o que consubstancia uma exceção dilatória (…), a qual prejudica o conhecimento do mérito da causa, devendo (…) a Requerida ser absolvida da instância” ou, caso assim não se entenda, “(…) carece a Requerente de legitimidade substantiva, o que consubstancia uma exceção perentória (…), devendo a Requerida ser absolvida do pedido”.
6.50. E, reitera, “não obstante não ter sido a Requerente a operacionalizar a entrega do imposto ao Estado, certo é que foi aquela que o pagou e, como tal, a sua legitimidade surge salvaguardada pelo artigo 18.º da LGT e artigo 9.º do CPPT” pelo que afirma a Requerente que “o que não pode é a Requerida (…) vedar o reembolso de um tributo a quem, de facto, o liquidou”.
6.51. A Requerente, citando jurisprudência arbitral, refere que “(…) no âmbito de processo judicial tributário, não são só os sujeitos passivos da relação tributária stricto sensu que têm legitimidade para intervir” “tendo também legitimidade a pessoa singular ou coletiva, o património ou a organização de facto ou de direito, que está vinculado ao cumprimento da prestação tributária – incluindo o contribuinte direto, o substituto ou responsável, e, ainda, quem suporte o encargo económico do imposto através do mecanismo da repercussão legal (entre outros, aspeto a que se voltará)”.
6.52. Segundo alega a Requerente, “(…) têm legitimidade para intervir no processo tributário todos aqueles que demonstrem ter um interesse legalmente protegido cuja tutela dependa desse processo, ainda que não sejam legalmente responsáveis pelo cumprimento de quaisquer obrigações tributárias” sendo que “a legitimidade no processo tributário não se confunde com a qualidade de sujeito passivo, sendo certo que, é atribuída legitimidade processual a entidades que não se qualificam como sujeitos passivos, designadamente em situações de repercussão do pagamento do imposto, como sucede na presente situação”, pelo que entende que “(…) deverá improceder a exceção da ilegitimidade”.
6.53. Cumpre analisar.
6.54. O regime da CSR, na versão anterior à Lei n.º 24-E/2022, de 30 de Dezembro, foi criado tendo em vista a repercussão nos consumidores das quantias cobradas a esse título pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos sendo que, no artigo 2.º da Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto (nas datas a que se reporta o pedido - anos de 2020 a 2022) estabelece-se que “o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da IP, S. A., tendo em conta o disposto no Plano Rodoviário Nacional, é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável» e no n.º 3 do mesmo artigo (…) estabelece-se que «a contribuição de serviço rodoviário constitui a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis”.
6.55. Como se refere no despacho do TJUE de 07-02-2022, processo n.º C-460/21, “39 A obrigação de reembolsar os impostos cobrados num Estado-Membro em violação das disposições da União conhece apenas uma exceção. Com efeito, sob pena de conduzir a um enriquecimento sem causa dos titulares do direito, a proteção dos direitos garantidos na matéria pela ordem jurídica da União exclui, em princípio, o reembolso dos impostos, direitos e taxas cobrados em violação do direito da União quando seja provado que o sujeito passivo responsável pelo pagamento desses direitos os repercutiu efetivamente noutras pessoas. (…) 42 Por conseguinte, um Estado-Membro só se pode opor ao reembolso de um imposto indevidamente cobrado à luz do direito da União quando as autoridades nacionais provarem que o imposto foi suportado na íntegra por uma pessoa diferente do sujeito passivo e quando o reembolso do imposto conduzisse, para este sujeito passivo, a um enriquecimento sem causa. Daqui resulta que, se só tiver sido repercutida uma parte do imposto, as autoridades nacionais só estão obrigadas a reembolsar o montante não repercutido. 43 (...) a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos” (sublinhado nosso).
6.56. Como decorre desta jurisprudência, há uma obrigação de a Administração Tributária reembolsar os tributos cobrados em violação do Direito de União a quem efectivamente os suportou, pelo que no caso de tributos susceptíveis de repercussão, a titularidade do direito ao reembolso dependerá de ela ter sido ou não concretizada.
6.57. Assim, não se coloca a questão da possibilidade de pedidos de reembolso sucessivos pela Autoridade Tributária e Aduaneira pois, no caso de ter havido repercussão, apenas o repercutido tem direito ao reembolso.
6.58. Com efeito, é corolário da jurisprudência do TJUE que, no caso de ter havido repercussão, apenas o repercutido tem legitimidade para impugnar os actos que a concretizem ou os que a antecedam, pois apenas o repercutido é afectado na sua esfera jurídica pelo acto lesivo e o substituto só terá legitimidade na medida em que não tenha repercutido integralmente o tributo que suportou nessa qualidade (é essencialmente este o regime que no artigo 132.º do CPPT se prevê para os casos de impugnação em caso de substituição com retenção na fonte, que deve considera-se aplicável, por analogia, a todos os casos de substituição).[8]
6.59. Assim, no caso em análise, se se concluir que houve repercussão do tributo, será a entidade repercutida quem tem legitimidade para impugnar os actos que afectaram a sua esfera jurídica, no exercício do direito de impugnação de todos os actos lesivos que lhe é constitucionalmente garantido (artigos 20º e 268º, nº 4, da CRP), sendo essa legitimidade assegurada, a nível do direito ordinário, tanto a nível procedimental como processual, pelos artigos 18º, nº 4, alínea a), 54º, nº 2, 65º e 95º, nº 1, da LGT, conjugados com os nºs 1 e 4 do artigo 9º do CPPT, aplicáveis aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29º, n.º 1, alínea c), do RJAT, na medida em que reconhecem legitimidade procedimental e processual a quem for titular de um interesse legalmente protegido.
6.60. Analisando a questão de que apenas os sujeitos passivos que declararam a introdução dos produtos para consumo e efetuaram o pagamento do imposto, podem solicitar (segundo entende a Requerida) a anulação das liquidações e o reembolso por erro na liquidação, cabe começar por referir que, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do CPTA (subsidiariamente aplicável), e da correspondente disposição do artigo 30.º, n.º 3, do CPC, a legitimidade processual é aferida pela relação jurídica controvertida tal como é apresentada pelo autor.
6.61. Deste modo, há que atender à relação jurídica tal como o Requerente a apresenta e configura, isto é, à pretensa relação jurídica, e não à relação jurídica material, tal como ela se constituiu na realidade, sendo por isso indiferente, para a verificação da legitimidade, a questão de saber se o direito existe na titularidade de quem o invoca ou contra quem é feito valer, matéria que diz antes respeito à questão de fundo e poderá, quando muito, determinar a improcedência da acção.[9]
6.62. Alegando a Requerente, no pedido, que pretende impugnar os actos tributários de liquidação da CSR incidentes, em determinado período de tempo (Janeiro/2019 a Dezembro/2022), sobre os sujeitos passivos de ISP, cujo encargo tributário se repercutiu na sua esfera jurídica, bem como impugnar actos tributários de liquidação de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário, na parte a esta respeitante e que a Requerente alega ter suportado, no período de Janeiro/2023 a Maio/2023, não pode deixar de entender-se que o contribuinte dispõe de legitimidade processual para deduzir o pedido, independentemente de, no caso da CSR se saber (previamente) se houve uma efectiva repercussão ou se as faturas de aquisição de combustível corporizam o valor pago a título de CSR, assumindo no caso do ISP – Consignação de Serviço Rodoviário que a repercussão existe legalmente.[10]
6.63. A propósito da questão que assim vem colocada, cabe recordar a norma do artigo 18.º, n.º 4, alínea a), da LGT, que refere que “não é sujeito passivo quem (…) suporte o encargo do imposto por repercussão legal, sem prejuízo do direito de reclamação, recurso ou impugnação nos termos das leis tributárias”.
6.64. Ainda segundo o disposto no n.º 3 desse artigo, como sujeito passivo entende-se “a pessoa singular ou coletiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável”.
6.65. Como se depreende do transcrito artigo 18.º, n.º 4, alínea a) da LGT, o preceito recusa a qualidade de sujeito passivo a quem não estiver sujeito diretamente a uma obrigação fiscal, como é o caso do consumidor final de bens ou serviços, mas admite que da repercussão do imposto possa resultar a violação de um interesse legalmente protegido, e, nesse sentido, confere ao repercutido o direito à impugnação administrativa ou judicial como meio adequado de reação contra a repercussão ilegal do imposto, o que se justifica, no plano de política legislativa, por razões de similitude com a lesão que seja causada por um acto ilegal de liquidação.[11]
6.66. Como resulta da redação originária do artigo 2.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de Agosto, que regula o financiamento da rede rodoviária nacional e cria a contribuição de serviço rodoviário, o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP – Estradas de Portugal “é assegurado pelos respetivos utilizadores”, e, nos termos do subsequente artigo 3.º, “a contribuição de serviço rodoviário constitui a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis”.
6.67. E, por outro lado, segundo o disposto no artigo 2.º do Código dos Impostos Especiais do Consumo (CIEC), na redação da Lei n.º 24-E/2022, de 30 de Dezembro (disposição essa a que foi atribuída natureza interpretativa - artigo 6.º dessa Lei), “os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública, sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária”.
6.68. Quer as disposições da Lei n.º 55/2007, especificamente aplicáveis à contribuição de serviço rodoviário, quer a disposição geral do artigo 2.º do CIEC, consagram um princípio de repercussão legal do imposto, significando que o encargo do imposto não seja suportado pelo sujeito passivo, mas pelo contribuinte que intervém no processo de comercialização dos bens ou serviços.
6.69. Havendo de admitir-se, por efeito da norma do artigo 18.º, n.º 4, alínea a), da LGT, que as entidades repercutidas dispõem de legitimidade procedimental e processual para deduzirem reclamação graciosa ou recurso hierárquico ou impugnação judicial contra o acto tributário de liquidação do imposto que é objecto de repercussão.[12]
6.70. Para além da legitimidade activa da Requerente se encontrar coberta pela referida disposição da LGT, essa legitimidade é também reconhecida pela regra geral do artigo 9.º, n.º 1, do CPPT, segundo a qual “têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido”.
6.71. Ou seja, ainda que se entendesse que a situação do caso não corresponde a repercussão legal, mas a mera repercussão económica ou de facto, não pode deixar de considerar-se que a entidade que suporta o imposto no âmbito da cadeia de comercialização dispõe de legitimação para impugnar o acto de liquidação com fundamento em ilegalidade.
6.72. Alega ainda a Autoridade Tributária que, face ao regime especial dos artigos 15º e 16º do Código dos IEC, apenas os sujeitos passivos que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do ISP e da CSR possuem legitimidade para solicitar o reembolso do valor pago, e, como tal, os adquirentes dos produtos não têm legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do acto tributário e consequente pedido de reembolso do imposto.
6.73. Há que fazer notar, a este propósito, que o artigo 5.º, n.º 1, da Lei n.º 55/2007 apenas remete para o Código dos IEC o procedimento de liquidação e cobrança do imposto, remissão que igualmente é efetuada para a LGT e o CPPT, significando que, nesse âmbito, haverá de ter-se em consideração as disposições conjugadas do Código dos IEC e demais legislação aplicável.
6.74. Por outro lado, o regime específico previsto nos artigos 15º e seguintes do Código dos IEC abrange o reembolso com fundamento em erro na liquidação ou em caso de expedição ou exportação, ao passo que o que está em causa no presente processo arbitral não é um qualquer pedido de reembolso, mas a declaração de ilegalidade dos actos tributários de repercussão do imposto por violação do direito europeu.
6.75. E, nesses termos, a questão da legitimidade activa terá de ser analisada à luz das regras processuais aplicáveis, e não do regime específico do reembolso do imposto que consta das citadas disposições do Código dos IEC.
6.76. Por todo o exposto, a alegada excepção de ilegitimidade activa, tal como se encontra formulada, é improcedente e nada obsta ao prosseguimento do processo no que diz respeito aos alegados actos de liquidação como meio de obter a consequente anulação dos actos de repercussão (01/2022 a 12/2022) e de consignação de serviço rodoviário (01/2023 a 05/2023).
6.77. A Autoridade Tributária refere ainda que a Requerente, não sendo sujeito passivo do imposto, carece não apenas de ilegitimidade processual, mas também de ilegitimidade substantiva, que constitui uma exceção perentória e conduz à absolvição do pedido.
6.78. Como é entendimento corrente, a chamada a legitimidade substancial ou substantiva tem a ver com a efectividade da relação material, interessando já ao mérito da causa e, nesse sentido, constitui um requisito da procedência do pedido.[13]
6.79. Não é possível considerar verificada liminarmente a inviabilidade da pretensão deduzida em juízo com base em meras alegações da parte contra quem vem deduzido o pedido, quando essa é a questão de fundo que carece de ser analisada em função do direito aplicável face aos factos que venham a ser dados como provados ou não provados.
6.80. Nem a alegação aduzida pela Requerida poderá caracterizar uma excepção perentória porquanto as excepções perentórias consistem na invocação de factos que, em face da lei substantiva, possam integrar uma causa impeditiva, extintiva ou modificativa do direito invocado pelo autor na ação e que assim determinem a improcedência total ou parcial do pedido.
6.81. São impeditivos os factos que excluem ou impedem a eficácia do direito alegado (incapacidade, falta ou vícios de vontade), modificativos os que alteram a relação jurídica modificando a natureza da prestação ou as condições da sua exigibilidade (alteração das circunstâncias em que foi celebrado um contrato), extintivos os que fazem cessar o direito tornando inviável o respetivo exercício (caducidade, prescrição, cumprimento da obrigação).
6.82. Assim sendo, o que vem alegado quanto à legitimidade substantiva não integra a defesa por excepção e apenas poderá relevar em sede de apreciação do mérito.
Excepção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral – da falta de objecto
6.83. A Requerida defende que se verifica a ineptidão da petição inicial por falta de objecto porquanto “(…) a Requerente limita-se a identificar faturas de aquisição de combustíveis aos seus fornecedores (…) sem (…) identificar os atos de liquidação de ISP/CSR (…) nem as DIC submetidas pelos (…) sujeitos passivos do imposto”, pelo que “(…) o pedido arbitral não preenche nem satisfaz quais quer os pressupostos legais de aceitação (…), devendo, consequentemente, ser declarado inepto” porquanto “(…) sem a identificação (…) dos atos tributários, cuja legalidade pretende ver sindicada, e não sendo possível à AT, (…), identificar os atos de liquidação em crise, o dirigente máximo da AT não pôde exercer a faculdade prevista no artigo 13.º do RJAT, antes da constituição do tribunal arbitral, questão que, aliás, a AT suscitou liminarmente (…)”.
6.84. Neste âmbito, reitera a Requerida que “(…) não é (…) possível à Requerida identificar factos essenciais omitidos pela Requerente”, “pelo que, é totalmente impossível à AT identificar o ato de liquidação subjacente à declaração dos produtos para o consumo, que vão sendo transacionados ao longo da cadeia de comercialização”.
6.85. Assim, conclui a Requerida que “(…) verifica-se a exceção de ineptidão da petição inicial, (…), o que determina a nulidade de todo o processo, e, obstando a que o tribunal conheça do mérito da causa, dá lugar à absolvição da instância, (…), devendo, consequentemente, determinar-se a nulidade de todo o processo e a absolvição da Requerida da instância”.
6.86. Neste contexto, veio a Requerente apresentar defesa à excepção, referindo que, no pedido de pronúncia arbitral “(…) veio requerer a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação da CSR praticadas pela AT com base nas Declarações de Introdução no Consumo, e, bem assim, dos consequentes atos de repercussão consubstanciados nas faturas referentes à gasolina e gasóleo rodoviário” tendo estes actos sido “(…) devidamente identificados (…), e dos mesmos tem pleno conhecimento a Requerida, podendo a mesma proceder à sua identificação junto do (…) Tribunal, seja no âmbito da sua obrigação de juntar o processo administrativo (…), seja ao abrigo dos deveres de boa-fé na relação (…), o que desde já se requer que este Tribunal ordene”.
6.87. Acrescenta a Requerente que, “(…) no pedido arbitral, mediante a remissão para os documentos juntos ao pedido arbitral, não só identifica as faturas emitidas pelos fornecedores de combustíveis em que houve lugar à repercussão da CSR, como indica a quantia global suportada a esse título, juntando prova do seu pagamento (…)” mas, “não sendo a Requerente o sujeito passivo do imposto, nem o direto responsável pela sua liquidação, mas apenas a entidade que suporta o encargo por efeito da repercussão, não lhe compete o ónus de identificação e de comprovação dos atos de liquidação repercutidos, nem a prova da conexão entre os atos de liquidação e as faturas de compra que revelam a repercussão do imposto”.
6.88. Prossegue a Requerente referindo que “(…) AT está vinculada, ao nível do procedimento, ao princípio da verdade material, pelo qual lhe cabe o poder-dever de realizar todas as diligências que entenda serem úteis para a descoberta da verdade (…)”, sendo que “(…) os órgãos da Administração Pública estão sujeitos a um princípio de colaboração, e, como tal, devem atuar em estreita colaboração com os particulares, cumprindo-lhes, designadamente, prestar aos particulares, as informações e os esclarecimentos de que careçam, apoiar e estimular as suas iniciativas e receber as suas sugestões e informações” pelo que entende que “no caso vertente, a AT, no âmbito do procedimento de revisão oficiosa, omitiu quaisquer diligências que permitissem verificar a existência dos atos de liquidação de imposto e a sua correlação com as faturas onde o imposto se encontra repercutido”.
6.89. Nestes termos, defende a Requerente que “(…) não pode ver agravada a sua situação fiscal pelo facto de não lhe ser possível apresentar uma prova documental específica a que não pode ter acesso, quando a AT se absteve de obter essa mesma prova pelos seus próprios meios” pelo que conclui que “(…) não só os atos de liquidação do imposto se encontram identificados, ainda que por remissão para documentos juntos, como também não seria exigível que a Requerente efetuasse a prova da sua conexão com as faturas de aquisição de combustível” mas, “caso se considere necessário, o que não se concede e se equaciona por mero dever de patrocínio, desde já se requer que se notifique a B... para que (i) melhor identifiquem / juntem os atos de liquidação e (ii) para se pronunciarem sobre a repercussão da CSR na Requerente, arrolando-se as referidas entidades (…) como testemunhas”.
Excepção da ineptidão do pedido de pronúncia arbitral – Da ininteligibilidade do pedido e a contradição entre este e a causa de pedir
6.90. Nesta matéria, alega a Requerida que “a Requerente estrutura o seu pedido (…) pretendendo a declaração de ilegalidade dos atos de repercussão de CSR consubstanciados na obrigação de pagamento de preço de combustível adquirido, acrescido de respetivos impostos, titulado pelas faturas infra elencadas”.
6.91. Assim, segundo a Requerida, “a Requerente formula um pedido de anulação de liquidações que não identifica através da mera impugnação de alegadas repercussões, sem sequer identificar o nexo entre estas e aquelas (…)”, “e fá-lo, com assento na ideia errada de que vigora para a CSR um regime de repercussão legal e de que, a referida repercussão [(que (…) é meramente económica] possa ser presumida”, “apresentando depois como causa de pedir a desconformidade da CSR ao Direito da União”.
6.92. Contudo, entende a Requerida que “(…) não podemos inferir, da alegada ilegalidade das liquidações, a ilegalidade das alegadas repercussões”, pelo que “(…) ainda que a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial seja de conhecimento oficioso (…), invoca-se a mesma na presente sede por uma dupla razão: a não identificação do ato ou atos tributários objeto do pedido de pronúncia arbitral, o que compromete irremediavelmente, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 10.º, a finalidade da petição inicial, e a contradição entre o pedido e a causa de pedir, levando à nulidade de todo o processo (…)”.
6.93. Neste âmbito, a Requerente veio defender-se referindo que “não existe, porém, qualquer ininteligibilidade do pedido formulado, nem contradição entre este e a causa de pedir: a Requerente alega a ilicitude do tributo repercutido, a qual se traduz na ilicitude da repercussão. A ilegalidade do imposto repercutido torna ilegal a sua repercussão. Tal consta, aliás, expresso no pedido de pronúncia arbitral, não existindo qualquer ambiguidade no que toca à delimitação do pedido e elementos estruturantes da causa de pedir”.
6.94. Acrescenta a Requerente que “o pedido formulado nos autos dirige-se, conforme descrito, à declaração da ilicitude da liquidação, cuja anulação, na parte referente à Requerente, i.e., sobre ela repercutida, se requer”, sendo que “a repercussão constitui parte da causa pedir: é pelo facto de a liquidação ter sido repercutida que a Requerente tem legitimidade para agir” e, “qualquer pedido destinado à anulação dos efeitos da repercussão mais não é que consequência do conhecimento da ilicitude da liquidação e declaração da sua anulação, devendo o tribunal arbitral constituído condenar a Requerida AT nos atos necessários à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, mormente na restituição à Requerente do imposto ilegalmente repercutido”.
6.95. Cumpre analisar e decidir.
6.96. O RJAT não contém regime próprio em matéria de exceções e nulidades processuais, aplicando-se, nesta matéria, a título subsidiário, o disposto no CPPT, no CPTA e no CPC, como decorre do previsto no artigo 29º, n.º 1, a), c) e) do RJAT.
6.97. A ineptidão da petição inicial é uma exceção dilatória cuja verificação conduz à abstenção de conhecimento do mérito da causa e à absolvição do réu da instância.
6.98. O artigo 98º, nº 1, alínea a), do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea c), do RJAT, indica como uma das nulidades insanáveis em processo judicial tributário, a ineptidão da petição inicial mas, não indicando o CPPT as situações em que se deve entender que ocorre ineptidão da petição inicial, há que fazer apelo ao CPC, que é de aplicação subsidiária, nos termos do artigo 2º, alínea e), daquele Código, e também o é no âmbito do processo arbitral tributário, por força do disposto no artigo 29º, nº 1, alínea e), do RJAT.
6.99. Assim, no artigo 186º, nº 1, do CPC, indicam-se como situações de ineptidão da petição inicial, (i) Quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir; (ii) Quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir; (iii) Quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis, sendo que o nº 3 do mesmo artigo estabelece que “se o réu contestar, apesar de arguir a ineptidão com fundamento na alínea a) do número anterior, a arguição não é julgada procedente quando, ouvido o autor, se verificar que o réu interpretou convenientemente a petição inicial”.
6.100. No caso, a exceção relacionada com a ineptidão da petição inicial não procede, porquanto não se verifica nenhuma das situações elencadas no artigo 186º do CPC, nem a Requerida identifica, na sua resposta, qual das situações elencadas naquele normativo é geradora da nulidade de todo o processo.
6.101. E ainda que se considerasse que a situação se pudesse subsumir à al. a), do nº 1, do nº 2 do artigo 186º do CPC, o certo é que cotejadas as posições das partes expressas nos articulados, verifica-se que a Requerida interpretou convenientemente a petição inicial, tendo apresentado a sua resposta sem qualquer dúvida quanto à pretensão da Requerente, pelo que o nº 3 do artigo 186º do CPC sempre determinaria a improcedência da exceção em causa.
6.102. A eventual dificuldade que a Requerida possa ter na identificação das liquidações a que ela própria procedeu junto dos fornecedores de combustíveis é um problema de organização dos seus serviços, que não pode ser imputado, nem trazer desvantagem à Requerente.
6.103. A Requerente fez tudo quanto poderia ter feito, juntando os documentos que tinha à sua disposição, pelo que exigir à Requerente a identificação dos actos de liquidação numa situação com este recorte, constituiria uma interpretação dos normativos sob apreciação em desalinho com o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, consagrado nos artigos 20º, nº 1 e 268º, nº 4 da CRP.
6.104. Com efeito, considerando o regime legal aplicável aos IEC e, em especial, o regime da CSR e do ISP – Consignação de Serviço Rodoviário, estes são devidos pelos sujeitos passivos de ISP, que são os operadores económicos identificados no artigo 4º do Código dos IEC sendo que, o facto gerador é a introdução no consumo de produtos sujeitos a imposto e o imposto é exigível aquando da introdução no consumo (vide artigos 7º, 8º e 9º do Código dos IEC) sendo esta formalizada pelos sujeitos passivos de imposto (que declaram para introdução no consumo grandes quantidades de produtos petrolíferos e energéticos, sujeitos a imposto) através de uma DIC, processada por transmissão eletrónica de dados, a qual contém todos os elementos que permitem o cálculo e a liquidação do tributo aplicável.
6.105. As introduções no consumo efectuadas num determinado mês pelos sujeitos passivos que detenham um dos estatutos previstos no Código dos IEC são globalizadas no mês seguinte, numa única liquidação, processada de forma automática (artigo 10º-A do Código dos IEC) sendo que, neste caso, os sujeitos passivos são notificados da liquidação do imposto até ao dia 15 (quinze) do mês da globalização e o imposto deve ser pago até ao último dia útil do mês em que foi notificada a liquidação (artigos 11º e 12º do Código dos IEC).
6.106. Nestes termos, a falta de indicação das liquidações pela Requerente está perfeitamente justificada, pois as liquidações foram emitidas pela Requerida às empresas (sujeitos passivos) que apresentaram as DIC’s e não foram (nem tinham de ser) notificadas à Requerente, não sendo por isso exigível à Requerente que identificasse as liquidações que a Requerida emitiu com base nas vendas de combustíveis em causa (posição esta que resulta expressamente em vários processos arbitrais, cujo teor decisório se acompanha).[14]
6.107. Nestes termos, improcede a exceção de ineptidão do pedido de pronúncia arbitral em cada uma das vertentes suscitadas.
Excepção da caducidade do direito de acção
6.108. Neste âmbito, a Requerida veio defender “a falta de identificação do ato de liquidação em discussão impede a aferição da tempestividade dos pedidos de revisão oficiosa das liquidações formulados pela Requerente”, porquanto “(…) a contagem do prazo para a apresentação dos referidos pedidos, inicia-se a partir do termo do prazo de pagamento do imposto, tendo por referência a data do ato de liquidação (global)”.
6.109. No caso, segundo refere a Requerida, “(…) constata-se que a Requerente apresenta impugnação no tribunal arbitral em 16-02-2024, do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado em 19-07-2023 junto da Autoridade Tributária e Aduaneira”, “e para a apreciação da tempestividade da apresentação do pedido arbitral não pode deixar de ser previamente apreciada a questão da tempestividade do pedido de revisão, o que, como supra se demonstrou (face à não identificação do ato tributário em litígio) é impossível” sendo que “(…) caso assim não se entenda, (…), tudo leva a crer que, o pedido de revisão oficiosa e, consequentemente, o pedido arbitral, são intempestivos”.
6.110. Com efeito, segundo entende a Requerida, “(…) tomando por referência o alegado pela Requerente, aquisições nos anos de 2019 e 2022, em 19-07-2023, há muito que se encontrava ultrapassado o prazo da reclamação graciosa de 120 (cento e vinte) dias a contar do termo do prazo do pagamento do ISP/ CSR, previsto no artigo 78.º, n.º 1, primeira parte da LGT”, “razão pela qual a Requerente fundamenta o pedido de revisão oficiosa em erro imputável ao serviço, de modo a fazer valer-se do prazo de 4 anos previsto no artigo 78.º nº 1, segunda parte da LGT”.
6.111. Mas, “(…) estando a Requerida vinculada ao princípio da legalidade e tendo efetuado a liquidação em estrita observância dos normativos legais em vigor à data dos factos, não existe qualquer erro imputável aos serviços” e, “(…) a acrescer ao facto de a Requerente não ser sujeito passivo de ISP/CSR e ao facto de não lograr provar o pagamento dos respetivos valores, em 19-07-2023, já teria terminado o prazo de 3 (três) anos previsto no nº 3 do artigo 15.º do CIEC para requerer o reembolso do alegado valor pago por alegada repercussão económica de CSR, pelo menos no que se refere a todas as aquisições efetuadas pela Requerente em datas anteriores a 19-07-2020 (…)” pelo que entende a Requerida que se verifica “(…) que o vício do pedido arbitral decorrente da falta de identificação do(s) ato(s) tributário(s) em crise tem, entre outros, como efeito a impossibilidade de se aferir em pleno da tempestividade dos pedidos de revisão oficiosa e de reembolso por alegado pagamento de valores a título de alegada repercussão económica da CSR, e, consequentemente, da tempestividade do pedido arbitral”.
6.112. Assim, conclui a Requerida que “(…) mesmo que apenas parcialmente, constata-se a caducidade do (alegado) direito de ação por parte da Requerente, o que consubstancia uma exceção perentória, devendo, nessa medida, a Requerida ser absolvida do pedido” ou, “(…) ainda que assim não se entenda, sempre consubstanciará uma exceção dilatória por assim ser qualificada especialmente (…), devendo, nessa medida, ser a Requerida absolvida do pedido ou da instância”.
6.113. Neste âmbito, veio a Requerente, na defesa à excepção da caducidade do direito de acção pugnar pela sua improcedência, alegando que “(…) os atos de liquidação estão devidamente identificados por data (…), dos quais, (…), tem a Requerida perfeito conhecimento, sendo emissora dos mesmos” e que “conforme é (…) jurisprudencialmente **aceite, existindo um erro de direito numa liquidação efetuada pela AT, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão é imputável aos serviços, em resultado da obrigação genérica da AT atuar em plena conformidade com a lei”.
6.114. Por outro lado, veio a Requerente reiterar que “(…) como é evidente, a existência do erro que constitui fundamento do pedido de revisão é aferida com base nos vícios de ilegalidade que tenham sido arguidos pelo contribuinte na formulação do pedido de impugnação judicial” pelo que “(…) tendo sido invocado um erro imputável aos serviços e verificando-se que o pedido de revisão oficiosa deu entrada em 20.07.2023 e reporta-se a atos de repercussão da CSR e de ISP (consignado ao Serviço Rodoviário) no período compreendido entre janeiro de 2019 e maio de 2023, no momento da apresentação do pedido de revisão oficiosa não tinha ainda decorrido o prazo de quatro anos a que se refere o artigo 78.º, n.º 1, da LGT”, concluindo pela tempestividade do pedido de revisão oficiosa.
6.115. E, conclui a Requerente, “tendo sido apresentado o pedido arbitral em 16.02.2024, dentro do prazo de 90 dias após o decurso do prazo para a apreciação do pedido de revisão oficiosa, o pedido arbitral é igualmente tempestivo”.
6.116. Cumpre uma vez mais, analisar e decidir.
6.117. No caso em apreço, é manifesto que os erros imputados aos actos impugnados (desconformidade da CSR e do ISP – Consignação de Serviço Rodoviário), face ao disposto na Directiva nº 2008/118, de 16 de Dezembro) não são imputáveis à Requerente, pois não teve qualquer intervenção no procedimento de criação da CSR, enquanto imposto, nem no procedimento de liquidação da CSR.
6.118. E tendo sido invocado um erro imputável aos serviços, o prazo para apresentação do pedido de revisão oficiosa era o de quatro anos, com fundamento em erro imputável aos serviços, previsto na parte final do nº 1 do artigo 78º da LGT.
6.119. Na verdade, como há muito entende o Supremo Tribunal Administrativo, “havendo erro de direito na liquidação, por aplicação de normas nacionais que violem o direito comunitário e sendo ela efectuada pelos serviços, é à administração tributária que é imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte. Por outro lado, esta imputabilidade aos serviços é independente da culpa de qualquer dos seus funcionários ao efectuar liquidação afectada por erro” já que “a administração tributária está genericamente obrigada a actuar em conformidade com a lei (arts. 266°, n.° 1 da CRP e 55° da LGT), pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços”. [15]
6.120. Na verdade, como há muito vem entendendo uniformemente o Supremo Tribunal Administrativo, constitui erro imputável aos serviços qualquer ilegalidade não imputável ao contribuinte, isto é, qualquer ilegalidade para a qual não tenha contribuído, por qualquer forma, o contribuinte através de uma conduta activa ou omissiva, determinante da liquidação, nos moldes em que foi efectuada.
6.121. Como referido na decisão arbitral nº P 676/2023-T, “(…) a revisão oficiosa, (…), pode ser desencadeada pelo sujeito passivo mediante requerimento dirigido ao órgão competente da Administração Tributária e com base nos mesmos pressupostos legais: no prazo de quatro anos e com fundamento em erro imputável aos serviços. (…). Conforme é também jurisprudencialmente aceite, existindo um erro de direito numa liquidação efetuada pelos serviços da administração tributária, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão é imputável aos serviços, em resultado da obrigação genérica de a administração tributária atuar em plena conformidade com a lei. Por outro lado, como é evidente, a existência do erro que constitui fundamento do pedido de revisão não pode ser aferida a partir da posição jurídica que tenha sido assumida pela Autoridade Tributária na apreciação do pedido de revisão, mas com base nos vícios de ilegalidade que tenham sido arguidos pelo contribuinte na formulação do pedido de impugnação judicial. Sendo que o processo arbitral foi deduzido precisamente para discutir a validade do entendimento adotado pela Administração na decisão de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa” (sublinhado nosso).[16]
Do pedido de revisão oficiosa dos actos de liquidação de CSR repercutida na Requerente no período entre 01/2019 e 12/2022
6.122. A Requerente pediu a revisão oficiosa de actos de liquidação de CSR que lhe foram repercutidos através de facturas emitidas entre 31-01-2019 e 31-12-2022.
6.123. No caso, verificando-se que o pedido de revisão oficiosa foi recebido pela Requerida em 19-07-2024 (reportando-se a actos de repercussão da CSR, efectuada através de facturas emitidas no período compreendido entre Janeiro/2019 e Dezembro de 2022), no momento da apresentação daquele pedido de revisão oficiosa já tinha decorrido, quanto às faturas emitidas em Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio e Junho de 2019, o prazo de quatro anos a que se refere o artigo 78º, nº 1, da LGT.
6.124. Nestes termos, tendo em consideração que a Requerente apresentou pedido de pronúncia arbitral relativo à impugnação do acto de indeferimento tácito do pedido de Revisão Oficiosa, haverá que aferir das consequências daquele neste processo, quanto à caducidade (ainda que parcial) do direito de ação identificado no ponto anterior porquanto, a tempestividade do pedido de revisão oficiosa é condição necessária para a tempestividade (no caso) da impugnação judicial.[17]
6.125. Sendo de 4 anos, a contar da liquidação, o prazo de revisão oficiosa, por erro imputável aos serviços, previsto na parte final do n.º 1 do artigo 78.º da LGT, e tendo sido apresentado o pedido de revisão em 19-07-2023, não poderia abranger (em condições normais) liquidações anteriores a 19-07-2019 (4 anos) mas dado que o prazo para pedir a revisão oficiosa é um prazo de caducidade, haverá que atender a eventuais períodos de suspensão aplicáveis aos prazos dessa natureza.[18]
6.126. Na verdade, a Lei nº 1-A/2020, de 19 de Março, que aprovou «medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2, agente causador da doença COVID-19», estabelece no seu artigo 7º, n.º 3, que «a situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos».
6.127. Este artigo 7º da Lei n.º 1-A/2020 produziu efeitos a partir de 09-03-2020, por força do disposto no nº 2 do artigo 6º da Lei nº 4-A/2020, de 6 de Abril, e a sua revogação ocorreu em 03-06-2020, por força do disposto no artigo 8º da Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, que entrou em vigor no quinto dia seguinte ao da sua publicação, nos termos do seu artigo 10º.
6.128. Como determina o artigo 6º desta Lei nº 16/2020, os prazos de "caducidade que deixem de estar suspensos por força das alterações introduzidas pela presente lei são alargados pelo período de tempo em que vigorou a sua suspensão" sendo que, por isso, o prazo de caducidade do direito de pedir a revisão oficiosa, esteve suspenso durante o período de vigência daquela norma, ou seja, entre 09-03-2020 e 03-06-2020 (87 dias).
6.129. Para além disso, nos termos do artigo 6º-C, nºs 1, alínea c) e 2, daquela Lei nº 1-A/2020, aditado pela Lei nº 4-B/2021, de 01 de Fevereiro, os prazos para a prática de actos por particulares em procedimentos tributários, inclusivamente os prazos de interposição de procedimento de impugnação de actos tributários [entre os quais se inclui o pedido de revisão oficiosa (procedimento de «natureza idêntica» à reclamação graciosa)] estiveram suspensos a partir de 22 de Janeiro de 2021, nos termos do artigo 4º daquela Lei nº
4-B/2021, até 6 de Abril de 2021 por força da revogação daquele artigo 6º-C, pelo artigo 6º da Lei nº 13-B/2021, de 05 de Abril, com entrada em vigor em 06-04-2021, e o prazo de caducidade foi alargado «pelo período correspondente à vigência da suspensão», nos termos do artigo 5º desta mesma Lei.
6.130. Isto é, o prazo para pedir a revisão oficiosa esteve suspenso também entre 22-01-2021 e 04-04-2021, ou seja, durante mais 75 dias.
6.131. Não obstante, os referidos preceitos legais que estabeleceram a prorrogação dos prazos de caducidade e de prescrição [cujo decurso fora suspenso ao abrigo das medidas legislativas excepcionais adoptadas durante a pandemia (artigo 6º da Lei nº 16/2020 e artigo 5º da Lei n.º 13-B/2021)] foram, entretanto, revogados pelas alíneas o) e ll) do artigo 2º da Lei nº 31/2023, de 4 de Julho, a qual determinou, quanto à produção de efeitos (e no que aqui interessa) que “a revogação das alíneas b) a e) do nº 7 e do n.º 8 do artigo 6º-E da Lei nº 1-A/2020, de 19 de março, produz efeitos 30 dias após a publicação da presente lei”, ou seja, a 05-07-2023.
6.132. Nestes termos, os efeitos da revogação da suspensão das medidas excepcionais no que diz respeito à caducidade afectam a aferição da tempestividade do pedido de revisão oficiosa deduzido pela Requerente porque, por força do nº 2 do artigo 3º desta Lei, se refere que a revogação «não prejudica a produção de efeitos no futuro de factos ocorridos durante o período de vigência dos respetivos atos legislativos».
6.133. Assim, no total, o prazo de quatro anos de caducidade do direito de pedir a revisão oficiosa foi alargado por 162 dias (87+75) e, por isso, o prazo de caducidade do direito de pedir a revisão oficiosa que terminaria em 31-01-2023 (4 anos), se não houvesse suspensão, para a liquidação mais antiga, referente às facturas emitida em 31-01-2019, passou a terminar em 12-07-2023 (ou seja, 162 dias depois).
6.134. Neste contexto, há que notar, embora não se tenham apurado as datas das liquidações de imposto subjacentes às facturas que são objecto do processo, como a Requerente não tinha de ser e não foi notificada dessas liquidações, o prazo para as impugnar administrativamente apenas começou com o conhecimento da sua existência [como decorre do artigo 188º, nº 2, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2º, alínea c), da LGT], que não chegou à Requerente antes de lhe terem sido emitidas as facturas anexadas ao PPA [em sintonia, aliás, com o que, paralelamente, se estabelece na alínea f) do nº 1 do artigo 102º, para a impugnação contenciosa] relativas às aquisições de combustíveis efectuadas.
6.135. Nestes termos, é inequívoco que, no caso em análise, tendo o pedido de revisão sido apresentado em 19-07-2023, à data da apresentação tinham decorrido, face ao período de Janeiro/2019, mais de quatro anos ainda que acrescidos dos acima referidos 162 dias totais de suspensão do referido prazo, contados da data das liquidações (que no caso, é do seu conhecimento através das respectivas facturas) sendo que, por isso, a excepção tem de ser julgada procedente quanto às facturas de 31-01-2019 (período de Janeiro/2019) e improcedente quanto a todos os restantes períodos (Fevereiro/2019 a Dezembro/2022), com reflexos no valor de CSR cujo reembolso se solicita no pedido.
Do pedido de revisão oficiosa dos actos de liquidação de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário na parte suportada pela Requerente no período entre 01/2023 e 05/2023
6.136. A Requerente pediu, de igual modo, a revisão oficiosa de actos de liquidação de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário suportada pela Requerente relativamente ao período entre 31-01-2023 e 31-05-2023.
6.137. No caso, verificando-se que o pedido de revisão oficiosa foi recebido pela Requerida em 19-07-2024, reportando-se a imposto alegadamente suportado (por via de facturas emitidas à Requerente) no período compreendido entre Janeiro/2023 e Maio/2023, no momento da apresentação daquele pedido de revisão oficiosa ainda não tinha decorrido, o prazo de quatro anos a que se refere o artigo 78º, nº 1, da LGT, tendo em consideração o acima exposto nos pontos 6.122. a 6.135.
6.138. Assim, a excepção da caducidade do direito de acção tem de ser julgada improcedente quanto ao pedido de revisão oficiosa relativa aos 5 períodos de 2023 (Janeiro a Maio de 2023).
6.139. Por outro lado, no que diz respeito ao pedido de pronúncia arbitral, este foi apresentado em 16-02-2024, ou seja, no prazo de 90 dias a contar do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa (presumido a 19-11-2023), em conformidade com o previsto na alínea f) do nº 2 do artigo 102º do CPPT, para que remete o artigo 10º, nº 1, alínea a), do RJAT.
6.140. Mas, por referência ao Acórdão do TCAS proferido em 23-03-2017, no processo n.º 07644/14 (com as necessárias adaptações), considerando-se fora de prazo, à data em que foi apresentado, o pedido de revisão oficiosa quanto aos actos de liquidação/repercussão de CSR relativos ao período de Janeiro/2019, o pedido de pronúncia arbitral deverá também ser considerado intempestivo quanto a esse período porquanto a decisão que recaiu sobre aquele procedimento administrativo não é susceptível de conferir à Requerente a abertura do prazo para requerer a constituição do Tribunal Arbitral, tudo se passando como se o pedido de revisão oficiosa não tivesse existido.[19]
6.141. Pelo exposto, procede parcialmente a excepção da caducidade do direito de acção quanto ao período de Janeiro de 2019.
6.142. Analisadas as excepções suscitadas pela Requerida, e improcedendo a maioria das excepções (excepto a da caducidade do direito de acção relativamente ao período de Janeiro/2019, em conformidade com o acima exposto nos pontos 6.122. e seguintes), será agora o momento de analisar o mérito do pedido, ou seja, se os actos de liquidação de CSR que deram origem à repercussão do imposto (na esfera da Requerente), nos períodos de Fevereiro/2019 a Dezembro /2022 e se os actos de liquidação de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário, nos períodos de Janeiro a Maio/2023, enfermam de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, nomeadamente, a de se saber se a CSR é ou não compatível com o Direito da União Europeia (designadamente se tem um “motivo específico” na acepção do artigo 1º, nº 2, da Diretiva nº 2008/118/CE, do Conselho, de 16 de Dezembro), e, por via disso, se deverão tais actos de liquidação ser ou não anulados na parte que respeitam à repercussão de CSR à Requerente, no montante de
EUR 85.575,91 e na parte que respeitam ao ISP - Consignação de Serviço Rodoviário suportada pela Requerente, no montante de EUR 9.641,07, no total de EUR 95.216,98.[20]
Da questão da violação do Direito da União
6.143. A Directiva nº 2008/118/CE, do Conselho, de 16 de Dezembro, que estabelece o regime geral dos impostos especiais de consumo que incidem directa ou indirectamente sobre o consumo de produtos energéticos (além de doutros), determina no n.º 2 do seu artigo 1º que “os Estados-Membros podem cobrar, por motivos específicos, outros impostos indirectos sobre os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo, desde que esses impostos sejam conformes com as normas fiscais da Comunidade aplicáveis ao imposto especial de consumo e ao imposto sobre o valor acrescentado no que diz respeito à determinação da base tributável, à liquidação, à exigibilidade e ao controlo do imposto, regras estas que não incluem as disposições relativas às isenções” (sublinhado nosso)
6.144. A Requerente, baseando-se em jurisprudência do TJUE, alega que o “(…) motivo específico não pode corresponder a uma finalidade puramente orçamental de obtenção de receita (…)” sendo que “o legislador português também não dotou a CSR de uma estrutura que comprove que a sua criação tenha sido ditada por motivo específico distinto de uma finalidade orçamental”.
6.145. Assim, alega a Requerente que, “(…) sendo a CSR criada pela Lei n.º 55/2007 (…), deve considerar-se um imposto desconforme ao artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2008/118”, citando jurisprudência do TJUE que se pronúncia no sentido de que “(…) o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo e que revoga a Diretiva 92/12/CEE, deve ser interpretado no sentido de que não prossegue «motivos específicos», na aceção desta disposição, um imposto cujas receitas ficam genericamente afetadas a uma empresa pública concessionária da rede rodoviária nacional e cuja estrutura não atesta a intenção de desmotivar o consumo dos principais combustíveis rodoviários” porquanto “(…) é interpretação do TJUE que a CSR serve, portanto, para financiar despesas suscetíveis de serem custeadas pelo “produto de impostos de qualquer natureza”, como o são a manutenção e alargamento da rede nacional de estradas, não se verificando a afetação adequada da receita que o TJUE exige para concluir pela presença de um motivo específico” pelo que “(…) deve ser interpretada no sentido de que não prossegue “motivos específicos”, na aceção da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de dezembro de 2008” e, “por conseguinte, a CSR introduzida por meio da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, deve considerar-se um imposto ilegal, desconforme ao artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva n.º 2008/118, de 16 de dezembro de 2008” no que diz respeito ao regime em vigor até 31-12-2022.
6.146. Por outro lado, no que diz respeito ao regime em vigor desde 01-01-2023, data a partir da qual “(…) o Estado português financia a Infraestruturas de Portugal com as receitas decorrentes da CSR através da consignação em seu favor de parte da receita do ISP: a consignação de serviço rodoviário”, alega a Requerente que “(…) sendo calculada exatamente nos mesmos termos e visando os mesmos fins (ilegais) passou, sob a forma de “Consignação de serviço Rodoviário,”, a constituir receita “direta” do ISP, consignada nos precisos montantes ao financiamento da Infraestruturas de Portugal” e, por isso, entende que “(…) as liquidações de ISP, na parcela correspondente à receita consignada ao serviço rodoviário – correspondente, em substância, à CSR, e apurada nos termos do disposto do n.º 2 do artigo 4.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, na sua redação atual – padecem de ilegalidade, nos mesmos termos em que a CSR vigente até 31 de dezembro de 2022 padecia”.
6.147. A Requerida impugna a posição assumida pela Requerente no pedido, porquanto entende que “(…) não logra a Requerente fazer prova do que alega (…)” e que “(…) em momento algum o TJUE considera ilegal a CSR” e, “não existindo qualquer decisão judicial nacional transitada em julgado que declare a CSR ilegal”, não está “(…) o ordenamento jurídico português em contradição (…) com o Direito da União Europeia”, “inexistindo uma desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva Europeia (…)”, concluindo que não se verifica “(…) no caso em apreço qualquer tipo de erro imputável aos serviços”.
6.148. Neste âmbito, refira-se que a questão da compatibilidade da CSR com o Direito da União Europeia foi apreciada no Despacho do TJUE de 07-02-2022, proferido no caso Vapo Atlantic, Processo C-460-21, no âmbito de um reenvio prejudicial, sendo que, como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que substituiu o artigo 234º do Tratado de Roma, anterior artigo 177º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais Nacionais, quando tem por objecto questões de Direito da União Europeia.[21]
6.149. A supremacia do Direito da União sobre o Direito Nacional tem suporte no nº 4 do artigo 8º da CRP, em que se estabelece que “as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”.
6.150. Assim, há que acatar o decidido no Despacho do TJUE de 07-02-2022, proferido no caso Vapo Atlantic acima já identificado, o qual constitui a mais recente decisão do TJUE sobre os requisitos do «motivo específico» a que alude o artigo 1º, n° 2, da Diretiva 2008/118/CE e nos termos do qual se refere que “(...).19 Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118 deve ser interpretado no sentido de que prossegue «motivos específicos», na aceção desta disposição, um imposto cujas receitas ficam genericamente afetadas a uma empresa pública concessionária da rede rodoviária nacional e cuja estrutura não atesta a intenção de desmotivar o consumo dos principais combustíveis rodoviários. 20 Há que começar por salientar que esta disposição, que visa ter em conta a diversidade das tradições fiscais dos Estados-Membros nesta matéria e o frequente recurso às imposições indiretas para a execução de políticas não orçamentais, permite que os Estados-Membros estabeleçam, além do imposto especial de consumo mínimo, outras imposições indiretas que prossigam uma finalidade específica (Acórdãos de 4 de junho de 2015, Kernkraftwerke Lippe-Ems, C-5/14, EU:C:2015:354, n.º 58, e de 3 de março de 2021, Promóciones Oliva Park, C-220/19, EU:C:2021:163, n.º 48). 21 Em conformidade com a referida disposição, os Estados-Membros podem cobrar outros impostos indiretos sobre os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo desde que estejam preenchidos dois requisitos. Por um lado, estes impostos devem ser cobrados por motivos específicos e, por outro, estas imposições devem ser conformes com as normas fiscais da União aplicáveis ao imposto especial de consumo e ao imposto sobre o valor acrescentado no que diz respeito à determinação da base tributável, bem como à liquidação, à exigibilidade, ao controlo do imposto, regras estas que não incluem as disposições relativas às isenções. 22 Estes dois requisitos, que visam evitar que outras imposições indiretas entravem indevidamente as trocas comerciais, revestem assim caráter cumulativo, como decorre da própria redação do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118 (v. Acórdão de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 36, e, por analogia, Acórdão de 25 de julho de 2018, Messer France, C-103/17, EU:C:2018:587, n.º 36). 23 No que respeita ao primeiro dos referidos requisitos, único visado pela primeira questão prejudicial, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um motivo específico na aceção desta disposição não é uma finalidade meramente orçamental (Acórdão de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 37). 24 No entanto, uma vez que qualquer imposto prossegue necessariamente uma finalidade orçamental, o simples facto de um imposto ter um objetivo orçamental não é suficiente, enquanto tal, sob pena de esvaziar de substância o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, para excluir que se possa considerar que esse imposto tem também um motivo específico, na aceção da referida disposição (Acórdão de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 38 e jurisprudência referida). 25 Assim, para se considerar que prossegue um motivo específico, na aceção da referida disposição, um imposto deve visar, por si só, assegurar a finalidade específica invocada, de tal forma que exista uma relação direta entre a utilização das receitas e a finalidade da imposição em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 41, e de 25 de julho de 2018, Messer France, C-103/17, EU:C:2018:587, n.º 38). 26 Além disso, embora a afetação predeterminada do produto de um imposto ao financiamento do exercício, pelas autoridades de um Estado-Membro, de competências que lhes foram atribuídas possa constituir um elemento a tomar em consideração para identificar a existência de um motivo específico, essa afetação, que decorre de uma simples modalidade de organização interna do orçamento de um Estado-Membro, não pode, enquanto tal, constituir uma condição suficiente, uma vez que qualquer Estado-Membro pode decidir impor, independentemente da finalidade prosseguida, a afetação do produto de um imposto ao financiamento de determinadas despesas. Se assim não fosse, qualquer finalidade poderia ser considerada específica, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, o que privaria o imposto especial de consumo harmonizado instituído por esta diretiva de qualquer efeito útil e violaria o princípio segundo o qual uma disposição derrogatória, como a do artigo 1.º, n.º 2, deve ser objeto de interpretação estrita (Acórdão de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 39 e jurisprudência referida). 27 Por último, não existindo semelhante mecanismo de afetação predeterminada das receitas, só se pode considerar que um imposto que incide sobre produtos sujeitos a impostos especiais de consumo prossegue um motivo específico, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, se esse imposto for concebido, no que respeita à sua estrutura, nomeadamente, à matéria coletável ou à taxa de tributação, de modo a influenciar o comportamento dos contribuintes num sentido que permita realizar o motivo específico invocado, por exemplo, através da tributação significativa dos produtos considerados para desencorajar o respetivo consumo (Acórdão de 5 de março de 2015, Statoil Fuel & Retail, C-553/13, EU:C:2015:149, n.º 42 e jurisprudência referida). 28 Quando é submetido ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial por meio do qual se pretende que seja declarado se uma imposição instituída por um Estado-Membro prossegue um motivo específico, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, a função do Tribunal de Justiça consiste mais em esclarecer o órgão jurisdicional nacional sobre os critérios cuja aplicação permitirá a este último determinar se essa imposição prossegue efetivamente essa finalidade do que em proceder ele próprio a essa avaliação, e isto tanto mais quando o Tribunal de Justiça não dispõe necessariamente de todos os elementos indispensáveis para esse efeito (v., por analogia, Acórdãos de 7 de novembro de 2002, Lohmann e Medi Bayreuth, C-260/00 a C-263/00, EU:C:2002:637, n.º 26, e de 16 de fevereiro de 2006, Proxxon, C-500/04, EU:C:2006:111, n.º 23). 29 No caso em apreço, importa salientar, em primeiro lugar, como resulta da jurisprudência referida no n.º 26 do presente despacho, que, embora a afetação predeterminada do produto da CSR ao financiamento, pela concessionária da rede rodoviária nacional, das competências gerais que lhe são atribuídas possa constituir um elemento a tomar em consideração para identificar a existência de um motivo específico, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, essa afetação não pode, enquanto tal, constituir um requisito suficiente. 30 Em segundo lugar, para se considerar que prossegue um motivo específico, na aceção desta disposição, a CSR deveria destinar-se, por si só, a assegurar os objetivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental que foram atribuídos à concessionária da rede rodoviária nacional. Seria esse o caso, nomeadamente, se o produto deste imposto devesse ser obrigatoriamente utilizado para reduzir os custos sociais e ambientais especificamente associados à utilização dessa rede que é onerada pelo referido imposto. Seria então estabelecida uma relação direta entre a utilização das receitas e a finalidade da imposição em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 27 de fevereiro de 2014, Transportes Jordi Besora, C-82/12, EU:C:2014:108, n.º 30, e de 25 de julho de 2018, Messer France, C-103/17, EU:C:2018:587, n.º 38). 31 Em terceiro lugar, como resulta do n.º 14 do presente despacho, é certo que a Autoridade Tributária sustenta que existe uma relação entre a afetação das receitas geradas pela CSR e o motivo específico que levou à instituição deste imposto, uma vez que o decreto-lei que atribuiu a concessão da rede rodoviária nacional à IP impõe a esta última que trabalhe em prol, por um lado, da redução da sinistralidade nessa rede e, por outro, da sustentabilidade ambiental. 32 No entanto, como foi salientado no n.º 15 do presente despacho, resulta da decisão de reenvio que o produto do imposto em causa no processo principal não se destina exclusivamente ao financiamento de operações que supostamente concorrem para a realização dos dois objetivos mencionados no número anterior do mesmo despacho. Com efeito, as receitas provenientes da CSR destinam-se, mais amplamente, a assegurar o financiamento da atividade de conceção, projeto, construção, conservação, exploração, requalificação e alargamento da rede rodoviária nacional. 33 Em quarto lugar, os dois objetivos atribuídos à concessionária da rede rodoviária nacional portuguesa estão enunciados em termos muito gerais e não deixam transparecer, à primeira vista, uma real vontade de desencorajar a utilização quer dessa rede quer dos principais combustíveis rodoviários, como a gasolina, o gasóleo rodoviário ou o gás de petróleo liquefeito (GPL) automóvel. A este respeito, é significativo que o órgão jurisdicional de reenvio destaque, na redação da sua primeira questão prejudicial, que as receitas geradas pelo imposto são genericamente afetadas à concessionária da rede rodoviária nacional e que a estrutura deste imposto não atesta a intenção de desmotivar um qualquer consumo desses combustíveis. 34 Em quinto lugar, o pedido de decisão prejudicial não contém nenhum elemento que permita considerar que a CSR, na medida em que incide sobre os utilizadores da rede rodoviária nacional, foi concebida, no que respeita à sua estrutura, de tal modo que dissuade os sujeitos passivos de utilizarem essa rede ou que os incentiva a adotar um tipo de comportamento cujos efeitos seriam menos nocivos para o ambiente e que seria suscetível de reduzir os acidentes. 35 Por conseguinte, sem prejuízo das verificações que caberá ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar atendendo às indicações que figuram nos n.ºs 29 a 34 do presente despacho, as duas finalidades específicas invocadas pela Autoridade Tributária para demonstrar que a CSR prossegue um motivo específico, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, não se distinguem de uma finalidade puramente orçamental (v., por analogia, Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Transportes Jordi Besora, C-82/12, EU:C:2014:108, n.ºs 31 a 35). 36 Atendendo às considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118 deve ser interpretado no sentido de que não prossegue «motivos específicos», na aceção desta disposição, um imposto cujas receitas ficam genericamente afetadas a uma empresa pública concessionária da rede rodoviária nacional e cuja estrutura não atesta a intenção de desmotivar o consumo dos principais combustíveis rodoviários” (sublinhado nosso).
6.151. Regressando ao ordenamento jurídico nacional, verifica-se que a CSR, na versão introduzida pela Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto, visa financiar a rede rodoviária nacional a cargo da EP - Estradas de Portugal, E. P. E. (actual IP.), sendo o financiamento assegurado primacialmente pelos respetivos utilizadores, como contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, utilização essa que é verificada pelo consumo dos combustíveis (artigos 2º e 3º da Lei nº 55/2007).
6.152. Assim, como se concluiu no referido Despacho do TJUE de 07-02-2022, proferido no caso Vapo Atlantic, Processo C-460-21, as receitas provenientes da CSR destinam-se essencialmente a assegurar o financiamento da rede rodoviária e têm uma finalidade puramente orçamental.
6.153. Como se refere no acórdão arbitral de 14-06-2023, proferido no âmbito do processo n.º 24/2023-T, “nem a estrutura do tributo permite concluir pela existência de intenção de desmotivar o consumo dos combustíveis. E, por outro lado, a finalidade específica que poderia justificar a criação da CSR de modo a poder considerar-se conforme o direito europeu é apresentada em termos muito genéricos, não tendo sido sequer feita a prova – que incumbia à Autoridade Tributária - de que tenham sido cumpridos os objetivos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental, que se encontram definidos no quadro II do anexo às bases da concessão”.
6.154. Pelo exposto, a CSR “não prossegue motivos específicos, na acepção do artigo 1.°, n.° 2, da Diretiva 2008/118, na medida em que as suas receitas têm essencialmente como fim assegurar o financiamento da rede rodoviária nacional, não podendo considerar-se como suficiente, para estabelecer uma relação direta entre a utilização das receitas e um motivo específico, os objetivos genéricos de redução da sinistralidade e de sustentabilidade ambiental” (acórdão arbitral citado no ponto anterior) (sublinhado nosso).
6.155. Assim, entende este Tribunal Arbitral que a CSR é uma imposição indireta que não prossegue um motivo específico na aceção da Diretiva 2008/118/CE. 17 pelo que será necessário agora analisar a pretensão da Requerente, à luz da matéria de facto dada como provada, para decidir se assiste razão à Requerente no que respeita às pretensões deduzidas.
6.156. Tendo em consideração os factos provados com relevo para a decisão, estes assentam na prova produzida pelas Partes e na ausência de controvérsia entre ambas, com base nos documentos anexados ao processo, nomeadamente pela Requerente e que não foram postos em causa pela Requerida.
6.157. Relativamente aos factos não provados, a decisão assenta na ausência de produção de prova pela Requerente em grau suficiente para firmar a convicção do Tribunal sobre a verificação dos factos em causa.
6.158. Assim, verifica-se que, no caso, a Requerente não se limitou a apresentar as facturas de compra do combustível emitidas pela sua fornecedora (B...)) e anexos referentes aos consumos de combustível por mês e ano, por si elaborados, tendo ainda apresentado declaração de repercussão, emitida pela B..., respeitante aos anos de 2019 a 2022, como prova de repercussão de CSR e comprovativo de pagamento das facturas.
6.159. Na verdade, sendo de admitir à luz do normal acontecer ser verosímil que os sujeitos passivos de CSR repercutam o valor do imposto no preço de venda do combustível tal não basta para que se considere feita a prova da repercussão, tanto mais que também é verosímil que os mesmos sujeitos passivos possam, por razões comerciais (pelo menos em parte), incorporar nos seus custos o imposto, sendo facto conhecido que também alguns sujeitos passivos do tributo têm deduzido pretensões anulatórias quanto ao imposto em causa, com mesmos fundamentos jurídicos referentes à ilegalidade das liquidações, não existindo consenso social de que a repercussão total tenha sempre lugar.
6.160. Nestes termos, tendo em consideração que, em concretização do princípio do dispositivo, é compreensível que a lei faça recair o ónus da prova sobre quem exerce o impulso processual nessa medida, o cumprimento deste ónus é processualmente valorado a favor da Requerente por ser esta que tem de demonstrar os factos constitutivos dos seus direitos (artigo 74º, nº 1 da LGT) porquanto é à Requerente que incumbe trazer ao processo os elementos que possibilitem confirmar o direito a que se arroga (prova da respercussão).
6.161. Com efeito, decorre do artigo 349º do Código Civil que a presunção legal é a ilação que a lei tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido e, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 350º do mesmo Código, é referido que “quem tem a favor a presunção legal escusa de provar o facto a que ela conduz”.
6.162. Ainda nesta matéria, cite-se o artigo 2º da Lei nº 24-E/2022 nos termos do qual se refere que “os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública, sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária” não podendo deixar de se concluir que a norma do artigo 2º da Lei nº 24-E/2022 não consagra uma presunção legal porquanto, em rigor, esta norma não tira uma ilação dum facto conhecido para firmar um facto desconhecido o que, de resto, teria de ser estabelecido de forma clara, atentas as consequências probatórios das presunções legais.
6.163. A expressão “sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária” deve ser entendida como indicação programática do legislador no âmbito dum princípio jurídico e não como aquilo que inexoravelmente ocorre.
6.164. Na verdade, como se pode no despacho do TJUE de 7 de fevereiro de 2022, proferido no Processo n.º C-460/21: “44(…), ainda que, na legislação nacional, os impostos indiretos tenham sido concebidos de modo a serem repercutidos no consumidor final e que, habitualmente, no comércio, esses impostos indiretos sejam parcial ou totalmente repercutidos, não se pode afirmar de uma maneira geral que, em todos os casos, o imposto é efetivamente repercutido. A repercussão efetiva, parcial ou total, depende de vários fatores próprios de cada transação comercial e que a diferenciam de outras situações, noutros contextos. Consequentemente, a questão da repercussão ou da não repercussão em cada caso de um imposto indireto constitui uma questão de facto que é da competência do órgão jurisdicional nacional, cabendo a este último apreciar livremente os elementos de prova que lhe tenham sido submetidos (v., neste sentido, Acórdãos de 25 de fevereiro de 1988, Les Fils de Jules Bianco e Girard, 331/85, 376/85 e 378/85, EU:C:1988:97, n.o 17, e de 2 de outubro de 2003, Weber’s Wine World e o., C-147/01, EU:C:2003:533, n.o 96)” (sublinhado nosso).[22]
6.165. A conclusão a que se acaba de chegar não significa a irrelevância do sistema interno do imposto que efectivamente aponta, nos termos referidos, para que o imposto seja repercutido no consumidor/utilizador.
6.166. Ao nível da apreciação da matéria de facto produzida pelos adquirentes de combustível, a indicação legislativa deve ser ponderada pelo Tribunal, à luz da globalidade da prova produzida.
6.167. O que aqui não se entende é que a compra do combustível seja, só por si e sem necessidade de produção de qualquer outra prova no sentido da ocorrência da repercussão, suficiente para se considerar esta automaticamente provada.
6.168. Nestes termos, o Tribunal entende, pois, que a referida a indicação da lei não vai ao ponto suprimir a necessidade de prova, uma vez que, como resulta do supra exposto, a lei não consagrou uma presunção legal, não estabelecendo, por esta via, a inversão do ónus da prova.
6.169. Ora, constituindo a repercussão fiscal da CSR um facto positivo, o ónus da prova impende sobre quem o invoca, nos termos do artigo 74º, nº 1, da Lei Geral Tributária pelo que, tendo sido feita a prova da repercussão relativos períodos que vão desde Fevereiro/2019 a Dezembro/2022, procede a pretensão anulatória das liquidações das CSR dos períodos identificados, bem como do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa daquelas liquidações na parte que respeite aos mesmos períodos.
6.170. Consequentemente, considera o Tribunal que as liquidações emitidas pela Requerida ao sujeito passivo do imposto (B...), que estão subjacentes à cobrança de CSR à Requerente (por repercussão), nos períodos de Janeiro/2019 a Dezembro/2022, enfermam de vício de violação de lei, decorrente da ilegalidade, por incompatibilidade das normas dos artigos 1º, 2º, 3º, 4º e 5º da Lei n 55/2007, de 31 de Agosto (nas redação vigente à data das mesmas), com o artigo 1º, nº 2, da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, sendo que esta ilegalidade justifica a anulação das liquidações, nos termos do artigo 163º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo (CPA), subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2º, alínea c), da LGT, bem como do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa daquelas liquidações na parte que respeite aos mesmos períodos.
6.171. Quanto ao ano de 2023, verifica-se que por via da Lei nº 24-E/2022, de 30 de Dezembro (que entrou em vigor a 01-01-2023), a CSR foi extinta, tendo ocorrido, simultaneamente, um aumento da taxa do ISP correspondente ao montante da CSR que foi naquele incorporada.
6.172. Com efeito, a referida Lei veio proceder a várias alterações à Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto, passando os artigos 1º, 2º, 3º, 4º e 8º a ter a seguinte redação:
“Artigo 1.º [...] A presente lei consigna parcialmente a receita do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos ao serviço rodoviário, tendo em vista financiar a rede rodoviária nacional a cargo da Infraestruturas de Portugal, S. A. (IP, S. A.). Artigo 2.º [...] 1 - O financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da IP, S. A., tendo em conta o disposto no Plano Rodoviário Nacional, é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado, nos termos da lei e do contrato de concessão aplicável. 2 - [...]. Artigo 3.º Consignação de serviço rodoviário 1 - Parte da receita do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos é transferida do orçamento do subsetor Estado para a IP, S. A., constituindo receita própria desta. Artigo 4.º Montante da consignação 1 - O montante a consignar ao serviço rodoviário corresponde a parte da receita efetiva de imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos cobrado sobre a gasolina, o gasóleo rodoviário e o gás de petróleo liquefeito (GPL auto) em território continental” (sublinhado nosso).
6.173. Note-se que o ISP nasceu das preocupações ambientais surgidas do Protocolo de Kyoto em 1997 e do Acordo de Paris de 2015 sendo que os “impostos ambientais” visam esbater a produção de gases de efeitos de estufa produzidos pela UE.
6.174. Dado que cerca de 60% da poluição está relacionada com a indústria, produção de energia e os transportes, este tipo de impostos são uma importante fonte de receita para vários países da União Europeia, nomeadamente, para Portugal.
6.175. Em Portugal, o Decreto-Lei nº 73/2010, 21 de Junho veio aprovar o Código dos Impostos Especiais de Consumo, transpondo a Directiva n.º 2008/118/CE, do Conselho, de 16 de Dezembro, nos termos do qual se regula, nomeadamente, a tributação dos produtos petrolíferos e energéticos.
6.176. De acordo com o preambulo do referido Código “a simplificação e a desburocratização constituem um dos objectivos a prosseguir pelo Governo em todas as áreas das políticas públicas. (…). No seguimento destas orientações, o novo Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC) clarifica as regras de tributação e procede à simplificação das normas e procedimentos relativos ao acompanhamento da circulação dos produtos sujeitos a imposto, bem como da autorização dos entrepostos fiscais previstos no CIEC. Trata-se, em grande medida, de dar continuidade ao esforço de simplificação também desenvolvido ao nível da União Europeia, no que, em particular, respeita a impostos harmonizados pelo Direito Comunitário, no caso, aos impostos especiais de consumo incidentes sobre o álcool e bebidas alcoólicas, os produtos petrolíferos e energéticos e os tabacos manufacturados. Esta harmonização jurídica, inicialmente decorrente da Directiva n.º 92/12/CEE, do Conselho, de 25 de Fevereiro, surge agora fundada na Directiva n.º 2008/118/CE, de 16 de Dezembro, relativa ao regime geral dos impostos especiais de consumo, que revoga a Directiva n.º 92/12/CEE, e cuja transposição para o ordenamento jurídico nacional importa promover. A perspectiva central das alterações ora promovidas foi, sobretudo, a de uma maior simplificação e desburocratização dos procedimentos aplicáveis, dispensando os operadores económicos de intervenções evitáveis ou não imprescindíveis. Aproveitou-se também para contemplar no texto normativo, enquanto princípio legitimador destes impostos, o princípio da equivalência, distinto do da capacidade contributiva, e que dita a respectiva adequação ao custo provocado pelos contribuintes nos domínios da saúde pública ou do ambiente. Quanto às inovações em concreto, o CIEC, mantendo inalterada a estrutura dos impostos especiais de consumo, introduz novos conceitos, define novos sujeitos passivos do imposto, o destinatário registado, o destinatário registado temporário e o expedidor registado, e clarifica, entre outros aspectos, as condições de exigibilidade do imposto e o momento da introdução no consumo. (…)” (negrito nosso).
6.177. No âmbito do princípio da equivalência, consagrado no artigo 2º do Código dos IEC (na redação dada pelo artigo 3º da Lei nº 24-E/2022, de 30 de Dezembro e que entrou em vigor a 01-01-2023), “os impostos especiais de consumo obedecem ao princípio da equivalência, procurando onerar os contribuintes na medida dos custos que estes provocam, designadamente nos domínios do ambiente e da saúde pública, sendo repercutidos nos mesmos, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária” (sublinhado nosso).
6.178. Neste âmbito, como explica SÉRGIO VASQUES, “a repercussão (…) pod[e] operar por mais que uma forma sobre os preços. A forma mais comum é a da repercussão descendente, que se verifica quando o vendedor soma o tributo ao preço de um bem, fazendo com que o comprador o suporte: por exemplo, quando se dá um aumento do imposto sobre a cerveja e os comerciantes sobem o preço na mesma medida, fazendo com que os consumidores o suportem. (…). A repercussão constitui um fenómeno que depende em larga medida das condições económicas que rodeiem uma transacção”.[23]
6.179. Desde 01-01-2023, como acima referido, com o novo modelo de financiamento estabelecido pela Lei nº 24-E/2022, de 30 de Dezembro, o Estado ao integrar no ISP a CSR e através das receitas assim geradas continuou a financiar a IP, através da consignação ao serviço rodoviário de uma parte da receita do imposto (que foi aumentado na mesma medida), com o objectivo de financiar a rede rodoviária nacional (a cargo da IP), assegurando-se esse financiamento é assegurado pelos respetivos utilizadores e, subsidiariamente, pelo Estado.
6.180. Mas, a questão que aqui importa responder é se esta “integração” dos montantes da antiga CSR no ISP, através da Consignação de Serviço Rodoviário, está em conformidade com os requisitos a que alude o artigo 1º, n° 2, da Diretiva 2008/118/CE, nomeadamente, quanto à existência de “motivos específicos” que assegurem a legalidade da cobrança?
6.181. Nesta matéria refira-se que o ISP tem uma dupla função a saber, por um lado, gerar receitas fiscais e incentivar a redução do consumo de combustíveis considerados poluentes e, por outro lado, o ISP é utilizado para apoiar compromissos ambientais, sendo por isso um imposto indirecto que prossegue motivos específicos.
6.182. Recorrendo, uma vez mais, à posição do TJUE na jurisprudência já acima citada, que serviu para decidir que a CSR vigente até 31-12-2022 não prosseguia “motivos específicos” (não estando por isso em conformidade com o direito da EU), verifica-se que, para efeitos de aferição da conformidade do ISP - Consignação de Serviço Rodoviário quanto ao disposto no artigo 1º, nº 2, da Diretiva 2008/118/CE, o seguinte:
“(…). 20 Há que começar por salientar que esta disposição, que visa ter em conta a diversidade das tradições fiscais dos Estados-Membros nesta matéria e o frequente recurso às imposições indiretas para a execução de políticas não orçamentais, permite que os Estados-Membros estabeleçam, além do imposto especial de consumo mínimo, outras imposições indiretas que prossigam uma finalidade específica (…). 21 Em conformidade com a referida disposição, os Estados-Membros podem cobrar outros impostos indiretos sobre os produtos sujeitos a impostos especiais de consumo desde que estejam preenchidos dois requisitos. Por um lado, estes impostos devem ser cobrados por motivos específicos e, por outro, estas imposições devem ser conformes com as normas fiscais da União aplicáveis ao imposto especial de consumo e ao imposto sobre o valor acrescentado no que diz respeito à determinação da base tributável, bem como à liquidação, à exigibilidade, ao controlo do imposto (…). 22 Estes dois requisitos, que visam evitar que outras imposições indiretas entravem indevidamente as trocas comerciais, revestem assim caráter cumulativo, como decorre da própria redação do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118 (…). 23 No que respeita ao primeiro dos referidos requisitos (…) decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um motivo específico na aceção desta disposição não é uma finalidade meramente orçamental (…). 24 No entanto, uma vez que qualquer imposto prossegue necessariamente uma finalidade orçamental, o simples facto de um imposto ter um objetivo orçamental não é suficiente, enquanto tal, sob pena de esvaziar de substância o artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, para excluir que se possa considerar que esse imposto tem também um motivo específico, na aceção da referida disposição (…). 25 Assim, para se considerar que prossegue um motivo específico, na aceção da referida disposição, um imposto deve visar, por si só, assegurar a finalidade específica invocada, de tal forma que exista uma relação direta entre a utilização das receitas e a finalidade da imposição em causa (…). 26 Além disso, embora a afetação predeterminada do produto de um imposto ao financiamento do exercício, pelas autoridades de um Estado-Membro, de competências que lhes foram atribuídas possa constituir um elemento a tomar em consideração para identificar a existência de um motivo específico, essa afetação, que decorre de uma simples modalidade de organização interna do orçamento de um Estado-Membro, não pode, enquanto tal, constituir uma condição suficiente, uma vez que qualquer Estado-Membro pode decidir impor, independentemente da finalidade prosseguida, a afetação do produto de um imposto ao financiamento de determinadas despesas. Se assim não fosse, qualquer finalidade poderia ser considerada específica, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, o que privaria o imposto especial de consumo harmonizado instituído por esta diretiva de qualquer efeito útil e violaria o princípio segundo o qual uma disposição derrogatória, como a do artigo 1.º, n.º 2, deve ser objeto de interpretação estrita (…). 27 Por último, não existindo semelhante mecanismo de afetação predeterminada das receitas, só se pode considerar que um imposto que incide sobre produtos sujeitos a impostos especiais de consumo prossegue um motivo específico, na aceção do artigo 1.º, n.º 2, da Diretiva 2008/118, se esse imposto for concebido, no que respeita à sua estrutura, nomeadamente, à matéria coletável ou à taxa de tributação, de modo a influenciar o comportamento dos contribuintes num sentido que permita realizar o motivo específico invocado, por exemplo, através da tributação significativa dos produtos considerados para desencorajar o respetivo consumo (…)” (destaque nosso).
6.183. Nestes termos, entende o Tribunal que dado que o ISP prossegue “motivos específicos” (vide ponto 6.184., supra), de acordo com o disposto no artigo 1º, nº 2 da Diretiva 2008/118/CE e a consignação parcial de parte da receito daquele imposto foi autorizada por Lei da Assembleia da República, com vista a financiar a rede rodoviária nacional a cargo da IP, sendo este financiamento da rede rodoviária nacional assegurado pelos respetivos utilizadores( e, subsidiariamente, pelo Estado), entende o Tribunal Arbitral que o ISP – Consignação de Serviço Rodoviário não apresenta qualquer ilegalidade porquanto o ISP foi concebido de modo a influenciar o comportamento dos contribuintes/utilizadores num sentido que permita realizar um motivo específico (tributação significativa dos combustíveis motivada por preocupações ambientais com o objectivo de desencorajar o respetivo consumo).
6.184. Nestes termos, considera o Tribunal que as liquidações emitidas pela Requerida ao sujeito passivo do imposto (B...), que estão subjacentes à cobrança de ISP – Consignação de Serviço Rodoviário, à Requerente (por repercussão), nos períodos de Janeiro/2023 a Maio/2023, não enfermam de qualquer vício de violação de lei, dado que não se concluiu pela incompatibilidade da Lei nº 55/2007, de 31 de Agosto, na redação dada pela Lei nº 24-E/2022, de 30 de Dezembro, com o artigo 1º, nº 2, da Diretiva 2008/118/CE do Conselho, de 16 de Dezembro de 2008, pelo que não se justifica a anulação das mesmas.
6.185. Em consequência, não será de anular o acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa daquelas liquidações na parte que respeite aos referidos períodos de 2023.
Do pedido de reenvio prejudicial
6.186. A Requerente, no pedido arbitral, veio referir que “(…) considera (…) que, em face das matérias aqui em contenta, sempre deverá este douto Tribunal Arbitral suspender a presente instância arbitral e sujeitar quaisquer questões ao Tribunal de Justiça, nos termos previstos no instituto do reenvio prejudicial (…) o que desde já se peticiona para os devidos efeitos legais”.
6.187. A este respeito, refira-se que, face ao acima exposto nesta decisão, não subsistem dúvidas a este Tribunal quanto ao sentido e alcance das disposições do direito da União Europeia analisadas, pelo que não se justifica o reenvio prejudicial, indeferindo-se o respectivo pedido.
Do pedido de reembolso e juros indemnizatórios
6.188. A Requerente suportou CSR no valor de EUR 85.575,91, incluída no preço dos combustíveis que adquiriu, à B..., entre Fevereiro/2019 e Dezembro/2022 e, EUR 9.641,07 a título de Consignação de Serviço Rodoviário incluído no ISP suportado nas aquisições de combustíveis efectuadas também à B..., no período de Janeiro a Maio de 2023.
6.189. Como consequência do pedido arbitral quando à anulação das liquidações em que se baseou a cobrança da CSR do período de Fevereiro/2019 a Dezembro/2022, a Requerente tem direito ao reembolso da quantia de EUR 85.575,91 acrescida de juros indemnizatórios.
6.190. Com efeito, o TJUE tem decidido que a cobrança de impostos em violação do direito da União tem como consequência não só direito ao reembolso como o direito a juros, como pode ver-se pelo acórdão de 18-04-2013, processo n.º C-565/11 (e outros nele citados), em que se refere:
“21 Há que lembrar ainda que, quando um Estado-Membro tenha cobrado impostos em violação do direito da União, os contribuintes têm direito ao reembolso não apenas do imposto indevidamente cobrado, mas igualmente das quantias pagas a esse Estado ou por este retidas em relação direta com esse imposto. Isso inclui igualmente o prejuízo decorrente da indisponibilidade de quantias de dinheiro, devido à exigibilidade prematura do imposto (v. acórdãos de 8 de março de 2001, Metallgeselischaft e o., C-397/98 e C-410/98, Colet., p. I-1727, n.ºs 87 a 89; de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation, C-446/04, Colet., p. I-11753, n.º 205; Littlewoods Retail e o., já referido, n.º 25; e de 27 de setembro de 2012, Zuckerfabrik Jülich e o., C-113/10, C-147/10 e C-234/10, n.º 65). 22 Resulta daí que o princípio da obrigação de os Estados-Membros restituírem com juros os montantes dos impostos cobrados em violação do direito da União decorre desse mesmo direito da União (acórdãos, já referidos, Littlewoods Retail e o., n.º 26, e Zuckerfabrik Jülich e o., n.º 66). 23 A esse respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu que, na falta de legislação da União, compete ao ordenamento jurídico interno de cada Estado-Membro prever as condições em que tais juros devem ser pagos, nomeadamente a respetiva taxa e o modo de cálculo. Essas condições devem respeitar os princípios da equivalência e da efetividade, isto é, não devem ser menos favoráveis do que as condições relativas a reclamações semelhantes baseadas em disposições de direito interno, nem organizadas de modo a, na prática, impossibilitar ou dificultar excessivamente o exercício dos direitos conferidos pelo ordenamento jurídico da União (v., neste sentido, acórdão Littlewoods Retail e o., já referido, n.ºs 27 e 28 e jurisprudência referida)” (sublinhado nosso).
6.191. No entanto, como se refere neste n.º 23, cabe a cada Estado-Membro prever as condições em que tais juros devem ser pagos, nomeadamente a respetiva taxa e o modo de cálculo.
6.192. O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, que “1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido. 2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas. 3. São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias: a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos; b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito; c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária. d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução. 4. A taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios. 5. No período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas” (negrito nosso).
6.193. Assim, o n.º 1 do artigo 43.º da LGT reconhece o direito como quando se determinar em processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial que houve erro imputável aos serviços.
6.194. O pedido de revisão do acto tributário é equiparável a reclamação graciosa quando é apresentado dentro do prazo da reclamação administrativa, que se refere no n.º 1 do artigo 78.º da LGT, como se refere nos citados acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 12-7-2006, processo n.º 0402/06; de 14-11-2007, processo 0565/07; de 30-09-2009, processo n.º 0520/09; de 12-09-2012, processo n.º 0476/12; do Pleno de 03-06-2015, processo n.º 0793/14; de 18-11-2015, processo n.º 01509/13.
6.195. Quando o pedido de revisão oficiosa é apresentado após o termo do prazo da reclamação graciosa, os juros indemnizatórios não são regulados pelo n.º 1 do artigo 43º da LGT, mas sim pela alínea c) do n.º 3 do mesmo artigo, só sendo devidos decorrido um ano após o pedido de promoção da revisão oficiosa e até à data da emissão das respetivas notas de crédito, como decidiu o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo no acórdão uniformizador n.º 4/2023, de 30-09-2020, proferido no processo n.º 040/19.6BALSB, publicado no Diário da República, I Série, de 16-01-2023.
6.196. Como se referiu sobre a questão da legitimidade, na esteira do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 06-09-2023, processo n.º 67/09.6BELRS, deve entender-se que o regime do artigo 132º do CPPT é aplicável a todos os casos de substituição tributária.
6.197. Assim, o prazo da reclamação graciosa de actos de liquidação praticados pelo substituído é o de dois anos, a contar do termo do ano em que for efectuado o pagamento indevido, como resulta dos nºs 2 e 3 do artigo 132º do CPPT, aplicável por remissão do seu nº 4.
6.198. Quanto aos pagamentos efectuados no ano de 2019, o prazo de dois anos a contar do termo desse ano terminaria em 31-12-2021, pelo que com os acréscimos resultantes da suspensão decorrente das leis sobre a pandemia, que se referiram nos pontos 6.126. a 6.133., supra, passou a terminar em 11-06-2022, ou seja, antes da apresentação do pedido de revisão oficiosa (que ocorreu em 19-07-2023).
6.199. Quanto aos pagamentos efectuados no ano de 2020, o prazo de dois anos a contar do seu termo terminaria em 31-12-2022. Mas, com os acréscimos decorrentes das suspensões referidas relacionadas com a pandemia (vide pontos 6.126. a 6.133., supra), o prazo de dois anos para reclamação graciosa passou a terminar em 11-06-2023, ou seja, antes da apresentação do pedido de revisão oficiosa (que ocorreu em 19-07-2023).
6.200. Por isso, relativamente à CSR referente aos anos de 2019 e 2020, o pedido de revisão oficiosa foi apresentado para além do prazo da reclamação graciosa.
6.201. Nos casos em que é apresentada pedido de revisão oficiosa para além do prazo da reclamação graciosa, o direito a juros indemnizatórios só existe decorrido um ano após o pedido de promoção da revisão oficiosa, nos termos do artigo 43º, nº 3, alínea c), da LGT, como decidiu o Pleno do Supremo Tribunal Administrativo no acórdão uniformizador n.º 4/2023, de 30-09-2020, proferido no processo n.º 040/19.6BALSB, publicado no Diário da República, I Série, de 16-01-2023.
6.202. Assim, aplicando esta jurisprudência, tendo decorrido na presente data mais de um ano desde a data em que foi apresentado o pedido de revisão oficiosa (19-07-2023), a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, relativamente às quantias a reembolsar referentes às facturas relativas aos anos de 2019 (Fevereiro a Dezembro) e 2020 (Janeiro a Dezembro).
6.203. No que concerne à CSR relativa aos anos de 2021 e 2022, o termo do prazo de dois anos a contar dos seus termos são, respectivamente, em 31-12-2023 e 31-12-2024, pelo que o pedido de revisão oficiosa foi apresentado (19-07-2023) no prazo da reclamação graciosa (em qualquer dos casos), referido no nº 3 do artigo 132º do CPPT), pelo que é equiparável a esta.
6.204. A este respeito, refira-se a decisão do Pleno do Supremo Tribunal Administrativo que uniformizou jurisprudência, especificamente para os casos de retenção na fonte seguida de reclamação graciosa, no acórdão de 29-06-2022, processo n.º 93/21.7BALSB, nos termos do qual se refere que “Em caso de retenção na fonte e havendo lugar a impugnação administrativa do acto tributário em causa (v.g. reclamação graciosa), o erro passa a ser imputável à A. Fiscal depois de operar o indeferimento do mesmo procedimento gracioso, efectivo ou presumido, funcionando tal data como termo inicial para cômputo dos juros indemnizatórios a pagar ao sujeito passivo, nos termos do artº. 43, nºs. 1 e 3, da L.G.T”.
6.205. Note-se que esta jurisprudência, emitida relativamente a situação de substituição tributária com retenção na fonte, é transponível para todos os casos de substituição tributária, por evidente analogia.
6.206. De resto, a situação de a Autoridade Tributária e Aduaneira manter uma situação de ilegalidade, quando devia repô-la deverá ser enquadrada, por mera interpretação declarativa, no nº 1 do artigo 43º da LGT, pois trata-se de uma situação em que há nexo de causalidade adequada entre um erro imputável aos serviços e a manutenção de um pagamento indevido e a omissão de reposição da legalidade quando se deveria praticar a acção que a reporia deve ser equiparada à acção.[24]
6.207. Assim, na linha daquela jurisprudência, é de concluir que, relativamente aos pagamentos efectuados em 2021 e 2022, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios calculados sobre a quantia que deve ser reembolsada relativamente ao período de Janeiro/2021 a Dezembro/2022, contados desde a data em que se formou o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa (19-11-2023) até integral reembolso, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43º, nº 4, e 35º, nº 10, da LGT, do artigo 61º do CPPT, do artigo 559º do Código Civil e da Portaria nº 291/2003, de 8 de Abril.
Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais
6.208. De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral” sendo que:
6.208.1. Nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito;
6.208.2. Nos termos do nº 2 do referido artigo concretiza-se a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
6.209. No caso em análise, tendo em consideração o acima exposto, o princípio da proporcionalidade impõe que seja integralmente atribuída a responsabilidade por custas à Requerente e à Requerida, de acordo com o disposto no artigo 12º, nº 2 e 22º, nº 4 do RJAT e artigo 4º, nº 5 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, em função do respectivo decaimento (11% e 89%, respectivamente), com as consequências daí decorrentes.
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DECISÃO
7.1. Nestes termos, tendo em consideração as conclusões apresentadas no Capítulo anterior, decidiu este Tribunal Arbitral Colectivo:
7.1.1. Julgar improcedentes as excepções da incompetência do Tribunal em razão da matéria, da ilegitimidade processual e substantiva da Requerente, da ineptidão da petição inicial por falta de objecto e da ininteligibilidade do pedido e a contradição entre este e a causa de pedir, suscitadas pela Requerida;
7.1.2. Julgar parcialmente procedente a excepção da caducidade do direito de acção no que diz respeito às liquidações de CSR repercutida na Requerente no período de Janeiro de 2019, consubstanciadas nas facturas emitidas no mesmo período à Requerente, no montante total de EUR 796,66;
7.1.3. Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto aos pedido de anulação de liquidações de CSR repercutida na Requerente nos períodos de 02/2019, 03/2019, 04/2019, 05/2019, 06/2019, 07/2019, 08/2019, 09/2019, 10/2019, 11/2019, 12/2019, 01/2020, 02/2020, 03/2020, 04/2020, 05/2020, 06/2020, 07/2020, 08/2020, 09/2020, 10/2020, 11/2020, 12/2020, 01/2021, 02/2021, 03/2021, 04/2021, 05/2021, 06/2021, 07/2021, 08/2021, 09/2021 , 10/2021, 11/2021, 12/2021, 01/2022, 02/2022, 03/2022, 04/2022, 05/2022, 06/2022, 07/2022, 08/2022, 09/2022, 10/2022, 11/2022 e 12/2022 (liquidadas e pagas pela B..., S.A.), no montante de EUR 85.575,91 e, consequentemente, anular o acto de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentada, na parte a que a elas respeita;
7.1.4. Julgar improcedente o pedido de anulação de liquidações de ISP suportadas pela Requerente, relativas aos períodos de 01/2023, 02/2023, 03/2023, 04/2023 e 05/2023, na parcela relativa à receita consignada à Infraestruturas de Portugal, no montante de EUR 9.641,07;
7.1.5. Indeferir o pedido de reenvio prejudicial;
7.1.6. Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso das quantias pagas na parte que respeitam aos anos de 2019 a 2022 e condenar a Requerida a reembolsar à Requerente o montante de EUR 85.575,91;
7.1.7. Julgar parcialmente procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Requerida a pagá-los à Requerente nos termos referidos no ponto 6. desta decisão arbitral.
7.1.8. Condenar a Requerente e a Requerida no pagamento das custas, em função do respectivo decaimento (11% e 89%, respectivamente).
Valor do processo: Tendo em consideração o acima exposto nesta decisão, bem como o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 95.216,98.
Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 2.754,00, a cargo da Requerente (11%) e da Requerida (89%), de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 10 de dezembro de 2024
Árbitro Presidente
Fernanda Maçãs
(vencida porque julgaria procedente a matéria de exceção suscitada pela Requerida, em particular quanto à incompetência em razão da matéria e à ilegitimidade conforme demonstrado nas Decisões Arbitrais processos n.ºs 863/2023-T, 1064/2023-T, 62/2024-T, 105/2024-T).
Árbitro Vogal
DECLARAÇÃO DE VOTO
Subscrevemos a decisão, mas não podemos deixar de referir que entendemos, na linha do defendido, entre outros, pelo acórdão arbitral 1015/2023-T, que a repercussão da CSR se deve presumir, por recurso à livre apreciação dos factos, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção dos árbitros [artigo 16º, e) do RJAT e artigo 607º, n.º 5 do CPC].
Acresce que, sendo o afastamento da obrigação de restituição do imposto indevidamente pago algo que apenas pode ter lugar a título estritamente excecional, competiria sempre à AT demonstrar, nos procedimentos administrativos ou nas acções processuais instauradas pelos sujeitos passivos da CSR, que, tendo-se verificado a repercussão efectiva do imposto nos utilizadores da rede rodoviária nacional – consumidores - o reembolso daria lugar a um enriquecimento sem causa (veja-se, por exemplo, Acórdão 304/2022-T).
O Árbitro Adjunto
(António A. Franco)
[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto transcrições efectuadas.
[2] No mesmo sentido se tem vindo a pronunciar, segundo refere a Requerida, o Tribunal Arbitral, nomeadamente nas decisões proferidas nos Processos n.º 296/2020-T, 18/2021-T, 785/2020-T e 271/2021-T.
[3] Note-se que, a referência a serviços e organismos que se vinculavam à jurisdição arbitral era feita para a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, que foram, entretanto, extintas, tendo-lhes sucedido a Autoridade Tributária e Aduaneira (aqui designada por Requerida).
[4] Neste âmbito, vide Istituto di Ricovero e Cura a Carattere Scientifico (IRCCS) — Fondazione Santa Lucia (processo C-189/15, Acórdão de 18 de Janeiro de 2017, §29) e Test Claimants in the FII Group Litigation (processo C-446/04, Acórdão de 12 de Dezembro de 2016, §107), entre outros.
[5] Neste sentido, vide par. 26 do Despacho Vapo Atlantic, já mencionado.
[6] E, mesmo que, à luz da jurisprudência do Tribunal Constitucional português, a CSR viesse a ser qualificada como uma contribuição financeira, nem por isso ela deixaria de ser um imposto indireto (tal como está desenhada) na acepção da Diretiva, isto sob pena de os Estados-membros poderem, em função da maior ou menor criatividade constitucional (em termos de tributos públicos), frustrar os propósitos de harmonização e de neutralidade no plano dos impostos indiretos sobre o consumo.
[7] Na verdade, as normas de direito europeu derivado, como normas de direito internacional convencional, vigoram diretamente na ordem jurídica interna com a mesma relevância das normas de direito interno, vinculando imediatamente o Estado e os cidadãos (artigo 8º da CRP) pelo que a impugnação judicial de um acto de liquidação pode ser deduzida com fundamento em qualquer ilegalidade (artigo 99º do CPPT), nada permitindo distinguir entre a ilegalidade resultante de normas de direito interno ou de direito internacional convencional. Nestes termos, torna-se claro que não existe qualquer obstáculo a que o Tribunal Arbitral se pronuncie sobre o fundamento de ilegalidade dos actos de liquidação (subjacentes aos actos de repercussão) baseado em desconformidade do regime da CSR com o previsto na Diretiva Europeia acima referida pelo que, em consequência, considera-se improcedente a alegada excepção de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral em razão da matéria.
[8] Na verdade, como foi esclarecido na redacção do nº 2 do artigo 20º da LGT (introduzida pela Lei nº 7/2021, de 26 de Fevereiro, ao referir que “a substituição tributária é efetivada, designadamente, através do mecanismo de retenção na fonte do imposto devido”), a retenção na fonte do imposto devido é apenas uma das formas de substituição tributária (sublinhado nosso).
[9] Nesta matéria, cfr. LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, Coimbra, 1999, págs. 45 e segs.
[10] Note-se que de acordo com o PPA, “o presente pedido de pronúncia arbitral tem como objeto imediato a declaração de ilegalidade e subsequente anulação do ato tácito de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado pela Requerente (…)”, sendo que tem, “(…) como objeto mediato, a declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial dos atos tributários de liquidação (…) indicados, cuja legalidade constituiu objeto do pedido de revisão oficiosa”.
[11] Neste âmbito, cfr. ANTÓNIO LIMA GUERREIRO, Lei Geral Tributária Anotada, Lisboa, 2001, págs. 116-117.
[12] Cfr. LOPES DE SOUSA, Código de Processo e Procedimento Tributário Anotado e Comentado, vol. I, Lisboa, 2011, pág. 115, e SERENA CABRITA NETO/CARLA CASTELO TRINDADE, Contencioso Tributário, vol. I, Coimbra, 2017, pág. 98.
[13] Neste sentido, cfr. acórdão da Relação do Porto de 4 de outubro de 2021, Processo n.º 10910/20.
[14] Em termos gerais, a exigência de identificação das liquidações, numa situação em que o Repercutido não tem possibilidade de as identificar, seria incompaginável com o princípio constitucional da proporcionalidade e o direito à tutela judicial efectiva garantido pelos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP, pois inviabilizaria a possibilidade prática de a Requerente impugnar contenciosamente actos que lhe aplicam tributação e lesam a sua esfera jurídica.
[15] Neste âmbito, vide Acórdão de 12-12-2001 (processo n.º 026.233), cuja jurisprudência é reafirmada nos Acórdãos de 06-02-2002 (processo n.º 026.690), de 13-03-2002 (processo n.º 026765), de 17-04-2002 (processo n.º 023719), de 08-05-2002 (processo n.º 0115/02), de 22-05-2002 (processo n.º 0457/02), de 05-06-2002 (processo n.º 0392/02), de 11-05-2005 (processo n.º 0319/05), de 29-06-2005 (processo n.º 9321/05), de 17-05-2006 (processo n.º 016/06) de 26-04-2007 (processo n.º 039/07), de 21-01-2009 (processo n.º 771/08), de 22-03-2011 (processo n.º 01009/10), de 14-03-2012 (processo n.º 01007/11), de 05-11-2014 (processo n.º 01474/12), de 09-11-2022 (processo n.º 087/22.5BEAVR), de 12-04-2023 (processo n.º 03428/15.8BEBRG).
[16] Neste sentido, o que se tem entendido como uma decorrência do princípio da justiça e da verdade material (cfr., neste sentido, Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento Tributário, 5.ª edição, Coimbra, págs. 227-228; Serena Cabrita Neto/Carla Castelo Trindade, Contencioso Tributário, vol. I, Coimbra, 2017, pág. 605, e Leonardo Marques dos Santos, “A revisão do ato tributário, as garantias dos contribuintes e a fiscalidade internacional”, in Estudos de Homenagem ao Professor Doutor Alberto Xavier, Economia, Finanças Públicas e Direito Fiscal, Vol. II, págs. 14 e segs.).
[17] Neste sentido, e com as necessárias adaptações, vide, nomeadamente, o Acórdão do TCAS proferido em 23-03-2017, no processo n.º 07644/14, nos termos do qual se refere que “estando a reclamação graciosa fora de prazo à data em que foi apresentada, em consequência e independentemente da mesma ter sido ou não decidida, a impugnação judicial também será intempestiva”, bem como o acórdão do STA proferido em 02-04-2009, no processo n.º 0125/09, nos termos do qual “só a tempestividade da reclamação graciosa abre à impugnante, neste caso, a possibilidade de discutir a legalidade das liquidações impugnadas, pois a sua extemporaneidade da reclamação ainda que não consequencie a extemporaneidade da impugnação conduz à sua necessária improcedência, por se reagir, então, contra um caso decidido ou resolvido” e “só a tempestividade da reclamação graciosa abre à impugnante, neste caso, a possibilidade de discutir a legalidade das liquidações, pois a confirmar-se a intempestividade da reclamação tudo se passa como se esta não tivesse existido”. Ou seja, “sendo intempestiva a reclamação graciosa, a decisão final que recaiu sobre este procedimento administrativo não é susceptível de conferir à Requerente a abertura do prazo para, na sequência, requerer a constituição do tribunal arbitral, tudo se passando como se a reclamação graciosa não tivesse existido”.
[18] Neste sentido, vide decisão arbitral proferida no âmbito do processo nº 1015/2023, de 28-05-2024 (Relator Conselheiro Jorge Lopes de Sousa), a qual se acompanha nesta matéria.
[19] Neste sentido, vide Acórdão do STA proferido em 02-04-2009, no âmbito do processo nº 0125/09, com as necessárias adaptações.
[20] Ao montante total de reembolso de CSR pedido pela Requerente (EUR 96.013,64) foi deduzido o montante da CSR alegadamente suportada com referência ao mês de Janeiro/2019, no montante total de EUR 796,66.
[21] Neste sentido, entre muitos, podem ver-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo - de 25-10-2000, processo nº 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, p. 3757; de 7-11-2001, processo nº 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2602; de 7-11-2001, processo nº 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2593.
[22] In “A INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA NO DIREITO CIVIL PORTUGUÊS”, Lex, Lisboa, 2001, pág. 34, e Luís Filipe Pires de Sousa in “DIREITO PROBATÓRIO MATERIAL COMENTADO”, Almedina, 2020, reimpressão, pág. 41.
[23] Vide “Manual de Direito Fiscal”, 2.ª Edição, Almedina, 2019, página 399.
[24] ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, 10.ª edição, página 528, nos termos da qual se refere que “a omissão, como pura atitude negativa, não pode gerar física ou materialmente o dano sofrido pelo lesado; mas entende-se que a omissão é causa do dano, sempre que haja o dever jurídico especial de praticar um acto que, seguramente ou muito provavelmente, teria impedido a consumação desse dano”.