Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 345/2024-T
Data da decisão: 2024-11-13  IRC  
Valor do pedido: € 157.148,70
Tema: IRC – benefício fiscal do RFAI – investimento elegível – transformação de produtos agrícolas.
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SUMÁRIO

  1. O Tribunal Arbitral a funcionar no CAAD é competente, em razão da matéria, para apreciar o peticionado pela Requerente, por se tratar de matéria contemplada no n.º 1 do artigo 2.º do RJAT;
  2. A Portaria n.º 282/2014, que exclui do âmbito de aplicação do RFAI os projetos de investimento que tenham por objeto a transformação produtos agrícolas, não pode relevar para a não aplicação do benefício fiscal que permite a dedução de uma percentagem dos valores dos investimentos realizados pela Requerente;
  3. Resulta do artigo 1.º, n.º 3, alínea c), do RGIC, que só não é permitida a concessão de auxílios estatais à atividade de transformação e de comercialização de produtos agrícolas se se verificar qualquer das situações indicadas nas suas subalíneas i) ou ii), isto é, “sempre que o montante dos auxílios for fixado com base no preço ou na quantidade dos produtos adquiridos junto de produtores primários ou colocados em empresas no mercado pelas empresas em causa” ou “sempre que o auxílio for subordinado à condição de ser total ou parcialmente repercutido nos produtores primários”;
  4. Os investimentos realizados pela Requerente no exercício de 2021 na sua atividade de produção de vinhos comuns e licorosos (atividade enquadrada no CAE 11021) devem ser considerados para aplicação da dedução do benefício fiscal constante do RFAI na dedução ao IRC do exercício fiscal de 2021 e seguintes, por via do consequente reporte.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

  1. Relatório

A..., sociedade comercial por quotas, com o número de identificação fiscal ..., com sede em Rua ..., nº ..., ...-...,  ..., ..., “Requerente”, ao abrigo do disposto nos artigos 10.º, nº1, alínea a) e 5.º, n.º 3, alínea a), ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (de ora em diante, “Regime Jurídico da Arbitragem Tributaria” ou “RJAT”) e da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, bem como no artigo 102.º, nº1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, requereu a constituição de Tribunal Arbitral, para se pronunciar sobre o despacho de indeferimento, proferido no âmbito do processo nº ...2023... .

 

O processo em causa refere-se à reclamação graciosa apresentada pela Requerente relativa à liquidação de IRC nº 2023..., a liquidação de IRC n.º 2023..., referente ao período de tributação de 2021referente ao exercício de 2021, emitida pela Autoridade Tributária (AT), da qual resultou um valor total a receber de € 51.863,88, reembolsado em 25/01/2023.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, AT.

 

1.1. Do pedido

A Requerente peticiona, a final, ao tribunal que:

  1. Ordene a anulação total da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada pela Requerente, proferida no âmbito do processo nº ...2023...;
  2. Ordene a anulação parcial da liquidação de IRC nº 2023..., referente ao exercício de 2021, determinando, em consequência, a reposição da adequada situação tributária da Requerente com todas as consequências legais, designadamente, a possibilidade de dedução (e reporte) do montante apurado para efeitos de RFAI;
  3. Ordene o reembolso do montante pago em excesso pela Requerente (€ 740,03) pela impossibilidade de dedução do crédito relativo ao RFAI, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos;
  4. Ordene que seja reconhecido, por parte da AT, que a atividade da Requerente, no âmbito do CAE 11021, é uma atividade elegível no âmbito do RFAI com a consequente eliminação do bloqueio automático que a AT se encontra a aplicar no seu sistema de validação central quanto à inclusão daquele CAE na Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC;
  5. Condene a AT no pagamento das custas processuais.

 

1.2. Tramitação processual

O pedido de constituição do Tribunal foi entregue no dia 11-03-2024 e foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 13-03-2024, tendo em 19-03-2024 confirmando a notificação da AT.

A Requerente não nomeou árbitro e em 06-05-2024, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitros do Tribunal Arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

As partes, devidamente notificadas dessa designação, não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do disposto no artigo 11.º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico, pelo que em conformidade com o preceituado na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 24-05-2024, tendo na mesma data dado cumprimento ao disposto no artigo 17.º do RJAT.

Em 26-06-2024 a AT apresentou a Resposta e juntou aos autos o Processo Administrativo.

Em 08-07-2024 a Requerente apresentou requerimento em que se pronunciou sobre as exceções alegadas pela AT na Resposta.

Em 08-07-2024 foi proferido despacho arbitral em que foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e concedido prazo para alegações escritas.

A Requerida apresentou as suas alegações escritas a 17/09/2024.

 

  1. Saneamento

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas.

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

 

  1. Matéria de facto

3.1. Factos provados

O Tribunal Arbitral, com base nos documentos juntos pelas partes considera provados os seguintes factos relevantes para a decisão:

 

  1. A Requerente é uma sociedade, constituída sob a forma jurídica de sociedade por quotas, cujo objeto social consiste em “Viticultura, Produção de Vinhos Comuns e Licorosos, Comércio por Grosso de Bebidas Alcoólicas, Fruticultura e Outra Produção Agrícola, Atividades dos Serviços Relacionados com a Agricultura, Compra, venda e arrendamento de bens imobiliários, a mediação e avaliação imobiliária e a administração de imóveis, Atividades de arrendamento e exploração de bens imobiliários (próprios ou arrendados), nomeadamente, edifícios residenciais e não residenciais, Aluguer de espaços, Aluguer de veículos, Organização de eventos através de atividades que compreendam o planeamento de espetáculos de natureza diversa (desportiva, recreativa, social, cultural)”; (cfr. certidão de registo permanente junta com o PA).
  2. A Requerente, encontra-se registada com os seguintes Códigos de Atividade Económica (“CAE”):

- CAE Principal:

01210

-CAE Secundários:

11021; 46341; 01240; 01610 ;68100

68200; (cfr. certidão de registo permanente junta com o PA).

  1. O período de tributação da Requerente não é coincidente com o ano civil. O período de tributação de 2021 iniciou-se a 01-08-2021 e terminou a 31-07-2022; (cfr. PA).
  2. No âmbito da sua atividade, no período de tributação de 2021, a Requerente, efetuou investimentos (em 2021 e 2022) que se destinaram, concretamente, à atividade de produção de vinhos comuns e licorosos (atividade enquadrada no CAE 11021), os quais ascenderam a € 628.594,81; (cfr. doc. 3 junto com o PPA e PA).
  3. A Requerente, afirma que entendendo que a atividade objeto dos aludidos investimentos se enquadrava num dos CAEs elegíveis no âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (“RFAI”), concretamente o CAE 11021, pretendeu aceder ao correspondente benefício fiscal, para efeitos de IRC, cujo enquadramento legal se encontra previsto no Código Fiscal do Investimento (“CFI”), por via do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, benefício esse previsto, em concreto, nos artigos 22.º a 26.º do Capítulo III do aludido Código e apurou um crédito fiscal de RFAI, em sede de IRC, no montante de € 157.148,70 (i.e., € 628.594,81 x 25%) que, no momento da submissão da Declaração de Rendimentos Modelo 22 do IRC, incluiu nos respetivos campos daquela Declaração. Considerou também uma dedução do período de 740,03 € e um saldo que transitar para o exercício seguinte de 156,408.67 €. Em 2022-12-29, dentro do prazo legal para o efeito, submeteu a declaração nº...-2022-...-..., em que declarou o resultado líquido do exercício no montante de €362.069,30, apurou um lucro tributável no montante de €333.968,70 e coleta no valor de €69.133,43, a qual foi liquidada e transferida para cobrança e emitida a nota de reembolso no 2023..., no montante total de €51.863,88.
  4. Na declaração de rendimentos modelo 22 de IRC (Autoliquidação), identificada, considerou o montante a deduzir à coleta, a título de benefícios fiscais, no campo 355 do quadro 10, no montante de €68.393,40, os quais se encontram discriminados/identificados no Anexo D - campos 076-01 – “CFEI” o montante de €48.393,40 e no campo 076 Outras deduções à coleta – “DLRR” – campo 727, o montante de €20.000,00, da mesma declaração.
  5. A Requerente deduziu, no campo 355 do Quadro 10 da aludida declaração, um valor de crédito de RFAI no valor de € 20.740,03; (cfr. PA).
  6. Ademais, espelhou também no respetivo Quadro 074 do Anexo D:
  1. a dotação do período (i.e., € 157.148,70);

ii)        a já referida dedução do período (i.e., € 20.740,03) e

  1. o saldo que transitaria para o período seguinte (i.e., € 136.408,67); (cfr. PA).

 

  1. Em resultado da submissão da Declaração de Rendimentos Modelo 22 do IRC, foi a Requerente notificada de um erro de validação central, através da qual a AT informou que o CAE 11021 não seria elegível no âmbito do RFAI, pelo que a Requerente deveria proceder à correção solicitada pela AT, ou seja, eliminação do crédito do RFAI da referida Declaração; (cfr. Doc. 4 junto com o PPA e PA).
  2. A Requerente, discordando do entendimento da AT sobre o supramencionado erro de validação central, partilhou, através do e-balcão, a sua versão e posição técnica (acompanhada de jurisprudência sobre a matéria em causa), no sentido de solicitar que o respetivo erro fosse eliminado.
  3. A AT manteve a posição inicialmente firmada na notificação relativa ao erro de validação central, baseando a mesma numa Ficha Doutrinária emitida em 2019 (Despacho de 2019-10-03, da Subdiretora Geral).
  4. Face à posição da AT, a Requerente corrigiu a Declaração de Rendimentos Modelo 22 do IRC previamente submetida, eliminando a inclusão do RFAI, tendo por base o entendimento que, caso não o fizesse, o sistema da AT desconsideraria automaticamente a Declaração previamente submetida, considerando-se a declaração como não entregue, com todas as consequências legais daí decorrentes; (cfr. doc. 4 e PA).
  5. Como resultado da submissão da Declaração de Rendimentos Modelo 22 do IRC previamente submetida, eliminando, por conseguinte, a inclusão do RFAI, no montante relativo ao exercício de 2021 de € 740,03 Euros, a Requerente teve direito ao um reembolso de € 51.863,87 em vez de € 52.603,90 que seriam reembolsados se o dito RFAI fosse considerado; (cfr. PA).
  6. Ficou excluída da Declaração de Rendimentos Modelo 22 do IRC submetida relativamente ao exercício de 2021 a informação relativa ao RFAI que constaria do Quadro 074 do anexo D, e que indicaria a Dotação do Período no montante de € 157.148,70 (campo 714), a Dedução do Período no montante de € 740,03 (campo 715) e o Saldo que Transita para o Período Seguinte no montante de € 156.408,67; (cfr. PA).
  7. A Requerente apresentou o pedido de reclamação graciosa em 17-04-2024 no qual pediu a validação e utilização dos montantes a seguir discriminados: 

i) €157.148,70 valor/crédito a reconhecer em 2021 e considerar o reporte para os exercícios seguintes;

ii) €740,03, valor a deduzir à coleta de 2021, referente a créditos gerados no próprio exercício, reportar para períodos seguintes o valor de €156.408,67, e reconhecer o direito à sua dedução.

  1. Reclamação graciosa que foi indeferida por despacho de 12-12-2023.

 

3.2. Factos não provados

Não há factos não provados que se considerem relevantes para a decisão da causa.

 

3.3. Fundamentação da Decisão sobre a Matéria de Facto

A convicção deste Tribunal Arbitral sobre os factos dados como provados fundou-se, para além da livre apreciação das posições assumidas pelas Partes, no teor dos documentos juntos aos autos pelas mesmas.

 

  1. Defesa por exceção

A Requerida vem suscitar uma exceção que poderá obstar ao conhecimento do mérito da causa, por via da incompetência do Tribunal Arbitral, em razão da matéria, para validar os valores de RFAI apurados pela Requerente que, a confirmar-se, deve determinar a absolvição da entidade Requerida da instância.

 

  1. Da Incompetência do Tribunal em razão da matéria para validar os valores de

RFAI apurados pela requerente

A Requerida alega a incompetência do Tribunal em razão da matéria, por considerar que o âmbito de competência dos Tribunais Arbitrais constituídos ao abrigo do disposto no RJAT, não contempla a possibilidade de apreciação de pedidos tendentes ao peticionado pela Requerente, sendo tal competência circunscrita às matérias indicadas no n.º 1 do artigo 2.º do mesmo diploma.

 

Complementa, alegando que como decorre do previsto no artigo 24.º do RJAT, a definição dos atos em que se deve concretizar a execução de julgados arbitrais compete, em primeira linha, à AT, com possibilidade de recurso aos tribunais tributários para requerer coercivamente a execução, no âmbito do processo de execução de julgados, previsto no artigo 146.º do CPPT e artigos 173.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

 

Para a Requerida, admitir que o Tribunal Arbitral tem competência para a apreciação deste pedido representaria a substituição do presente Tribunal Arbitral nas competências próprias da AT.

 

E, consequentemente, defende a Requerida que não poderá ser proferida decisão pelo Tribunal Arbitral que, na prática, reconheça o direito da Requerente a obter uma decisão que lhe atribua um determinado direito ou que implique a condenação da AT a validar um determinado entendimento ou cálculo efetuado pela Requerente quanto aos montantes do RFAI que, pretende, tem direito a deduzir.

 

Defende ainda a Requerida que não resulta provado nos autos que todos os demais pressupostos do benefício se encontrem verificados no caso. Mais, a Requerida contesta que os demais pressupostos constitutivos do benefício do RFAI se encontrem preenchidos.

 

Conforme explicitado também nas alegações apresentadas pela Requerida, esta entende que “o Tribunal Arbitral não detém competência para apreciar e decidir sobre a questão de saber se a requerente tem direito a ver-lhe ser reconhecido o direito a deduzir à coleta um determinado montante de RFAI ou que implique a condenação da AT a validar um determinado entendimento ou cálculo efetuado pela requerente quanto aos montantes do RFAI que, pretende, tem direito a deduzir”.

 

E que, atendendo ao exposto, a Requerida reitera que se verifica a existência de uma exceção dilatória, consubstanciada na incompetência, em razão da matéria, do Tribunal Arbitral, a qual obsta ao conhecimento do pedido, e, por isso, deve determinar a sua absolvição da instância.

 

A Requerente, em sede de contraditório, veio contestar a posição da Requerida, alegando que no caso em análise não se está perante um pedido de reconhecimento de um direito, nem perante um ato de indeferimento de um pedido de reconhecimento de um direito.

A Requerente evidencia que o objeto imediato do pedido de pronúncia arbitral reconduz-se à apreciação da legalidade do despacho que indeferiu a reclamação graciosa, proferida no âmbito do processo n.º ...2023..., e o seu objeto mediato é a liquidação de IRC n.º 2023... .

 

E assim, na perspetiva da Requerente, é forçoso concluir que no que tange ao pedido por ela formulado não se verifica o extravasar do âmbito da competência material do Tribunal Arbitral, mas antes que constitui, de facto, o meio processual idóneo.

 

Em conclusão, a Requerente defende, ao contrário do que afirma a Requerida, que não se verifica existir qualquer exceção dilatória, consubstanciada na incompetência, em razão da matéria, do presente Tribunal Arbitral. Defendendo a este respeito que cumpre decidir pela competência dos Tribunais Arbitrais que funcionam no CAAD.

 

Vejamos:

 

A competência dos Tribunais Arbitrais que funcionam no CAAD, encontra-se limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT.

 

Resulta, em concreto, do artigo 2.º n.º 1 do RJAT que:

1 - A competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões:

a) A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, e retenção na fonte e de pagamento por conta;

b) A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais;”

 

Importa contextualizar. A realização da justiça tributária alicerça-se num direito constitucional consubstanciado no acesso ao direito, e pela tutela jurisdicional efetiva no que à relação jurídica concerne, e que, em concreto, se materializa na possibilidade de acionar, para cada situação de conflito, o meio processual idóneo e em obter, num prazo razoável, uma decisão que aprecie em termos definitivos e com força de caso julgado, a pretensão adequadamente deduzida, com possibilidade da sua execução em tempo útil.

 

Tratando-se de um meio alternativo de resolução jurisdicional de conflitos no domínio jurídico-tributário, existem limitações à arbitragem tributária, nomeadamente as que decorrem do regime de vinculação dos organismos do Ministério das Finanças consagrado na Portaria nº 112-A/2011 de 22 de março, se vincula a AT, com as seguintes exclusões:

 

  1. As relativas à declaração da ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa, nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e Processo Tributário;
  2. As relativas a atos de determinação da matéria coletável e de atos de determinação da matéria tributável por métodos indiretos, incluindo a decisão do processo de revisão;
  3. As relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indiretos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação;
  4. As relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efetuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira.

 

Por ser relevante para a análise da exceção arguida pela Requerida, importa salientar que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão, uma vez transitada em julgado, vincula a AT, cumulativa ou alternativamente a:

 

  1. Praticar o ato tributário legalmente devido em substituição do ato objeto da decisão arbitral;
  2. Restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessárias para o efeito;
  3. Rever os atos tributários que se encontrem numa relação de prejudicialidade ou de dependência com os atos tributários objeto da decisão arbitral, designadamente por se inscreverem no âmbito da mesma relação jurídica de imposto, ainda que correspondentes a obrigações periódicas distintas, alterando-as ou substituindo-os, total ou parcialmente;
  4. Liquidar as prestações tributárias em conformidade com a decisão arbitral ou abster-se de as liquidar.

 

Cumpre apreciar, em conformidade, se o tribunal está a ser convocado a apreciar um ato de liquidação enquadrado pelo regime legal aplicável às suas competências.

 

As normas de liquidação de imposto disciplinam as operações de liquidação dos impostos no sentido de tornar certa e líquida a prestação tributária. Essa liquidação tem assim em vista o apuramento do imposto a pagar, processo que tem o seu início com a determinação da coleta, apurada através da aplicação de uma taxa à matéria coletável.

 

A liquidação é efetuada nos termos previstos nos artigos 89.º a 103.º do CIRC, tendo por base os pressupostos fiscais relativos ao apuramento do imposto a liquidar, os quais, em última instância, determinam o pagamento da prestação tributária.

 

Discute-se, em concreto, se o Tribunal Arbitral está legalmente habilitado a reconhecer o direito da Requerente a obter uma decisão que lhe atribua um determinado direito ou que implique a condenação da Autoridade Tributária (AT) a validar um entendimento ou cálculo efetuado pela Requerente quanto aos montantes do RFAI que pretende deduzir.

 

Na consideração deste Tribunal, o processo de autoliquidação do imposto levado a cabo pela Requerente seguiu a tramitação normal, sendo, no entanto, sujeito a uma limitação imposta pelo próprio sistema informático da AT.

 

Este sistema negou a pretensão da Requerente de ver reconhecido o seu crédito no âmbito do RFAI, devido à não aceitação da Declaração inicialmente submetida, na qual constava o CAE 11021 que, na perspetiva da AT, não seria elegível para aquele benefício fiscal.

 

Tal procedimento obrigou a Requerente a proceder à correção solicitada pela AT, que consistia na eliminação do crédito do RFAI da referida Declaração. Este facto levanta questões sobre a legalidade do procedimento adotado pela AT, uma vez que a Requerente foi forçada a alterar a sua Declaração inicial para evitar sanções por incumprimento.

 

Restavam à Requerente duas opções:

 

  1. Conformar-se com a posição defendida pela AT, aceitando a não consideração dos créditos fiscais no âmbito do RFAI;
  2. Agir conforme as instruções recebidas, para evitar incorrer em incumprimento por falta de entrega da Declaração, e posteriormente reagir, nos termos legais, contra os efeitos dessa segunda declaração, que, no entender da Requerente, lesa os seus direitos.

 

A Requerente optou pela segunda via, submetendo uma Declaração corrigida conforme solicitado pela AT, mas reservando-se o direito de contestar, posteriormente, os efeitos dessa correção. Esta decisão da Requerente levanta a questão de saber se o Tribunal Arbitral pode ser chamado a validar as consequências decorrentes da mesma.

 

Ou, dito de outra forma, se pode validar um procedimento que visou ultrapassar uma limitação imposta pela própria AT que, se não tivesse existido, permitiria à Requerente ver a sua declaração ser aceite pelo sistema da AT.

 

Não se pode omitir que, ao condicionar a possibilidade inicial de submissão da Declaração com a dedução do crédito do RFAI, como pretendia a Requerente, a AT também, nesta fase, prescindiu da faculdade de verificar as demais condições necessárias à consideração fiscal do dito benefício.

Em caso de discordância com os pressupostos utilizados pela Requerente para reconhecer o crédito relacionado com o RFAI, a AT poderia, no âmbito de um processo inspetivo, proceder às correções apropriadas, abrindo campo à Requerente para acionar os meios de defesa de natureza administrativa ou judicial previstos na Lei. Este procedimento garantiria uma análise mais justa e completa das condições de elegibilidade do crédito fiscal, respeitando os direitos da Requerente.

 

Não oferece dúvida ao Tribunal que a pretensão da Requerente tem por base um ato de autoliquidação de tributos, precedido de todas as formalidades legais exigidas para o efeito e, portanto, enquadrável nas competências genéricas dos Tribunais Arbitrais que funcionam no CAAD. Em concreto, também não se verifica nenhuma das situações que configuram limitações à arbitragem tributária, decorrentes do regime de vinculação da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI); e Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DGAIEC) conforme o artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

 

Perante o exposto, não assistindo razão à Requerida nesta matéria, julga-se desprovida de provimento a exceção arguida, improcedendo-a.

 

  1. Impugnação

 

A Requerida apresentou a sua defesa por meio de impugnação, alegando a existência de factos que, segundo a sua interpretação, impediriam a apreciação do mérito da causa.

 

No entanto, no caso em apreço, a Requerida limitou-se a expor uma interpretação factual e jurídica divergente daquela apresentada pela Requerente, sem, contudo, invocar factos concretos que pudessem efetivamente obstar ao conhecimento do mérito da causa.

 

Além disso, não foram apresentados factos novos que pudessem extinguir ou impedir o efeito jurídico pretendido pela Requerente.

 

É importante salientar que, de acordo com o princípio da substanciação, cabe à parte que alega um facto o ónus de prová-lo.

 

A mera divergência interpretativa não é suficiente para afastar a apreciação do mérito da causa, sendo necessário que a parte impugnante apresente elementos concretos e relevantes que possam alterar o desfecho do litígio.

 

Neste contexto, entende este Tribunal que a Requerida não conseguiu demonstrar factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito da Requerente, limitando-se a uma contestação genérica.

 

Dessa forma, considerando todos os argumentos expostos e a ausência de fundamentos sólidos por parte da Requerida, conclui-se que a impugnação apresentada carece de base jurídica substancial e, por conseguinte, deve ser julgada improcedente e desprovida de provimento.

 

  1. Matéria de Direito

 

A questão decidenda no caso em apreço consiste em saber se a atividade exercida pela Requerente se insere nos sectores de atividade elegíveis para a concessão do benefício fiscal do RFAI, à luz da interpretação dos artigos 2.º e 22.º do Código Fiscal ao Investimento (CFI), e demais legislação aplicável, e das exclusões previstas no RGIC (Regime Geral de Isenção por Categoria - Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014) e nas OAR (Orientações Relativas aos Auxílios com Finalidade Regional).

 

Em face do pedido e da fundamentação das Partes, entende-se que se pretende saber se o ato de liquidação impugnado é ilegal, considerando, em concreto, se o CAE 11021 é elegível para efeitos do RFAI, cujo enquadramento legal se encontra previsto no CFI, nos artigos 22.º a 26.º do Capítulo III do aludido Código.

 

 

  1.  Posição da Requerente

 

Alega a Requerente que a atividade objeto dos investimentos realizados se enquadra num dos CAEs elegíveis no âmbito do RFAI, especificamente o CAE 11021.

 

Acrescenta que o artigo 2.º do CFI, lista, no seu n.º 2, as atividades económicas enquadráveis no RFAI referindo-se, especificamente, à atividade da indústria transformadora.

 

Alega também que o n.º 3 do mesmo artigo, preconiza que os CAEs correspondentes às atividades previamente listadas no n.º 2 devem ser definidos por Portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia

 

E que foi publicada a Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, que, no seu artigo 2.º, inclui os CAEs elegíveis da indústria transformadora, fazendo referência às divisões 10 a 33.

 

E que, face ao exposto, deveria concluir-se que o CAE 11021 da Requerente, através do qual se qualifica a atividade objeto dos investimentos já referidos, é um dos CAEs mencionados na aludida Portaria, e representa uma atividade económica incluída no artigo 2.º do CFI, em concreto, a atividade da indústria transformadora.

 

Sustenta a sua posição a Requerente no entendimento que o legislador remeteu para regulamentação através de Portaria a definição dos CAEs correspondentes às atividades referidas no n.º 2 do aludido artigo, e não a definição das atividades económicas que se enquadram no âmbito setorial de aplicação do benefício e, consequentemente, não pode uma Portaria excluir um setor de atividade que o legislador fiscal consagrou que devia ser elegível e não alterou a sua decisão através de um procedimento legislativo de igual valor (in casu, Lei ou Decreto-Lei autorizado).

 

Por outro lado, e quanto ao afastamento do benefício fiscal com fundamento nas atividades excluídas do âmbito de aplicação das OAR, entende a Requerente que as liquidações adicionais emitidas pela AT enfermam de um erro de direito quanto à invocação das OAR como obstáculo à aplicação do benefício fiscal, pois era primacialmente com base nas específicas “Orientações para os auxílios estatais no setor agrícola (…)” que a questão deveria de ser apreciada.

 

E que resulta do próprio teor das Orientações específicas relativas a auxílios nos setores agrícola e florestal que, embora as OAR não se apliquem aos auxílios à produção de produtos primários, aplicam-se, no entanto, à transformação de produtos agrícolas e à comercialização de produtos agrícolas, dentro dos limites fixados naquelas orientações.

 

E, logo, que a atividade de transformação e comercialização de produtos agrícolas (na qual a Requerente realizou os investimentos elegíveis para o RFAI) não é uma das atividades excluídas do âmbito setorial de aplicação das OAR, pelo que seria permitida a utilização de auxílios estatais com finalidade regional naquela atividade, em concreto a utilização do RFAI.

 

Quanto ao afastamento do benefício fiscal com fundamento nas atividades excluídas do âmbito de aplicação do RGIC, baseado no entendimento da AT que a atividade de transformação de produtos agrícolas não é elegível para o RFAI, por via da circunstância  do n.º 1 do artigo 22.º do CFI determinar que que não poderão ser elegíveis para efeitos deste benefício “as atividades excluídas do âmbito sectorial (…) do RGIC” a requerente considera que a atividade por ela realiza não se encontra excluída deste regulamento.

 

E fundamenta a sua convicção no facto do n.º 3 do artigo 1.º do RGIC, só não permitir a concessão de auxílios estatais, como é o caso do RFAI, no setor da transformação e comercialização de produtos agrícolas nos casos enumerados na alínea c), do n.º 3, do aludido artigo. Ou seja, (i) sempre que o montante dos auxílios for fixado com base no preço ou na quantidade dos produtos adquiridos junto de produtores primários ou colocados no mercado pelas empresas em causa ou (ii) sempre que o auxílio for subordinado à condição de ser total ou parcialmente repercutido nos produtores primários.

 

Conclui a Requerente que o RFAI, configurando um auxílio de Estado, não se enquadra nos únicos dois casos excluídos do RGIC em relação à atividade de transformação e comercialização de produtos agrícolas e, logo, que o RGIC é aplicável aos auxílios de Estado concedidos no sector da transformação e comercialização de produtos agrícolas em todos os outros casos cuja exclusão não esteja prevista.

 

  1.  Posição da Requerida

 

A Requerida, por seu lado, defende que a remissão legal expressa tanto no CFI como na Portaria para as OAR e o RGIC permite concluir que o legislador quis, acima de tudo, no exercício das suas competências legislativas e regulamentares, cumprir plenamente todas as obrigações resultantes do espírito e da letra das mesmas OAR e do RGIC em consonância com os princípios, intimamente relacionados, da primazia de aplicação do direito da União Europeia e da interpretação do direito nacional em conformidade com o direito da União Europeia, sob pena de o Estado incorrer em infração ao direito da União Europeia.

 

No que tange em concreto à questão do investimento realizado pela Requerente e da correspondente eventual não elegibilidade para efeitos de RFAI, a Requerida defende que tal  investimento, que teve por objeto uma atividade económica enquadrada no setor da transformação e comercialização de produtos agrícolas, enumerados no anexo I do tratado sobre o funcionamento da União Europeia, encontra-se expressamente excluído do âmbito de aplicação das OAR, logo não sendo elegível para efeitos de RFAI como decorre diretamente da lei, pois esta exclui do âmbito de aplicação do RFAI perentoriamente as atividades excluídas do âmbito setorial de aplicação das OAR e não outras Orientações.

 

E complementa argumentando que será desajustado enquadrar a atividade em causa no âmbito do RFAI, com o fundamento de se encontrar abrangida pelas OAR, por força da imposição das Orientações específicas relativas a auxílios nos setores agrícola e florestal, conforme entende a Requerente, quando a Requerida considera que as próprias OAR excluem aquela atividade por se tratar de uma atividade de transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

 

  1. Enquadramento Legislativo

 

  1. A legislação nacional

 

Na parte relevante para a questão a decidir, o CFI, aprovado pelo decreto-lei n.º 162/2014, de 31 de outubro determina o seguinte:

 

“Artigo 1º

Objeto

 

n.º 2  “O regime de benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo e o RFAI constituem regimes de auxílios com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC).”

 

Artigo 2.º

Âmbito objetivo

 

nº 1 - Até 31 de dezembro de 2020, podem ser concedidos benefícios fiscais, em regime contratual, com um período de vigência até 10 anos a contar da conclusão do projeto de investimento, aos projetos de investimento, tal como são caracterizados no presente capítulo, cujas aplicações relevantes sejam de montante igual ou superior a 3 000 000 €. 

 

nº 2 - Os projetos de investimento referidos no número anterior devem ter o seu objeto compreendido, nomeadamente, nas seguintes atividades económicas, respeitando o âmbito sectorial de aplicação das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 209, de 23 de julho de 2013 (OAR) e do RGIC:

 

a) Indústria extrativa e indústria transformadora;

 

(…)

 

d) Atividades agrícolas, aquícolas, piscícolas, agropecuárias e florestais;

 

nº 3 - Por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia são definidos os códigos de atividade económica (CAE) correspondentes às atividades referidas no número anterior.”

 

Artigo 22.º

Âmbito de aplicação e definições

 

1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.

 

2 - Para efeitos do disposto no presente regime, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos à exploração da empresa:

  1. Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
  1. Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;
  2. Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;
  3. Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;
  4. Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
  5. Equipamentos sociais;
  6. Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa;

 

  1. Ativos intangíveis, constituídos por despesas com transferência de tecnologia, nomeadamente através da aquisição de direitos de patentes, licenças, «know-how» ou conhecimentos técnicos não protegidos por patente.

 

3 - No caso de sujeitos passivos de IRC que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, as aplicações relevantes a que se refere a alínea b) do número anterior não podem exceder 50 % das aplicações relevantes.

4 - Podem beneficiar dos incentivos fiscais previstos no presente capítulo os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:

  1. Disponham de contabilidade regularmente organizada, de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade;
  2. O seu lucro tributável não seja determinado por métodos indiretos;
  3. Mantenham na empresa e na região durante um período mínimo de três anos a contar da data dos investimentos, no caso de micro, pequenas e médias empresas tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, ou cinco anos nos restantes casos, os bens objeto do investimento ou, quando inferior, durante o respetivo período mínimo de vida útil, determinado nos termos do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, alterado pelas Leis n.os 64-B/2011, de 30 de dezembro, e 2/2014, de 16 de janeiro, ou até ao período em que se verifique o respetivo abate físico, desmantelamento, abandono ou inutilização, observadas as regras previstas no artigo 31.º-B do Código do IRC;
  4. Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer contribuições, impostos ou quotizações ou tenham o pagamento dos seus débitos devidamente assegurado;
  5. Não sejam consideradas empresas em dificuldade nos termos da comunicação da Comissão - Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade, publicada no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 249, de 31 de julho de 2014;
  6. Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c).

5 - Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.

6 - Para efeitos do disposto no número anterior, não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso transitado de períodos anteriores, exceto se forem adiantamentos.

7 - Nas regiões elegíveis para auxílios nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 107.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia constantes da tabela do artigo 43.º, no caso de empresas que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, apenas podem beneficiar do RFAI os investimentos que respeitem a uma nova atividade económica, ou seja, a um investimento em ativos fixos tangíveis e intangíveis relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento, na condição de a nova atividade não ser a mesma ou uma atividade semelhante à anteriormente exercida no estabelecimento.”

 

A Portaria para a qual remete o n.º 3 do artigo 2.º do CFI veio a ser a Portaria n.º 282/2014, de 30 setembro, a qual refere no seu Preâmbulo:

 

“Atendendo à necessidade de observar as normas e demais atos emanados das instituições, órgãos e organismos da União Europeia em matéria de auxílios estatais, nomeadamente as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209/1, de 27 de julho de 2013 e o Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, que aprovou o Regulamento Geral de Isenção por Categoria, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187/1, de 26 de junho de 2014, são também definidos na presente portaria os setores de atividade excluídos da concessão de benefícios fiscais.”

 

E quanto ao enquadramento comunitário e âmbito setorial, estabelecem os artigos 1.º e 2.º o seguinte:

 

“Artigo 1.º

Enquadramento comunitário

Em conformidade com as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209, de 27 de julho de 2013 e com o Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187, de 26 de junho de 2014 (Regulamento Geral de Isenção por Categoria), não são elegíveis para a concessão de benefícios fiscais os projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas dos setores siderúrgico, do carvão, da pesca e da aquicultura, da produção agrícola primária, da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo i do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, da silvicultura, da construção naval, das fibras sintéticas, dos transportes e das infraestruturas conexas e da produção, distribuição e infraestruturas energéticas.

Artigo 2.º

Âmbito setorial

Sem prejuízo das restrições previstas no artigo anterior, as atividades económicas previstas no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, correspondem aos seguintes códigos da Classificação Portuguesa de Atividades Económicas, Revisão 3 (CAE-Rev.3), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 381/2007, de 14 de novembro:

(…)

b) Indústrias transformadoras - divisões 10 a 33;

 

  1. A legislação da UE

 

O RGIC (Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014), no Considerando (10) dispõe:

 

O presente regulamento deve aplicar-se, em princípio, à maioria dos setores económicos. No entanto, em alguns setores, como a pesca e a aquicultura e a produção agrícola primária, o âmbito de aplicação deve ser limitado à luz das regras especiais aplicáveis.”

O artigo 1.º, n.º 3 a), b) e c), determina que o regulamento não é aplicável a determinados auxílios, que compreendem genericamente os relacionados com o setor da pesca e da aquicultura, produção agrícola primária e transformação e comercialização de produtos agrícolas (com diversas exceções).

E este artigo 1.º estabelece a final: “Sempre que uma empresa exercer atividades nos setores excluídos, referidos nas alíneas a), b) ou c) do primeiro parágrafo, bem como em setores abrangidos pelo âmbito de aplicação do presente regulamento, este apenas se aplica aos auxílios concedidos a esses últimos setores ou atividades, desde que os Estados-Membros assegurem, através de meios adequados como a separação das atividades ou a distinção dos custos, que as atividades nos setores excluídos não beneficiam dos auxílios concedidos em conformidade com o presente regulamento”.

Considerando os investimentos em causa neste processo, temos de atender ao regime estabelecido nas OAR 2014-2020, que foram adotadas pela Comissão em 19 de junho de 2013, tendo entrado em vigor a 1 de julho de 2014.

Na introdução no paragrafo 1. é mencionado que “Com base no artigo 107.º, n.º 3, alíneas a) e c), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), a Comissão pode considerar compatíveis com o mercado interno os auxílios estatais destinados a facilitar o desenvolvimento económico de certas regiões desfavorecidas da União Europeia. Este tipo de auxílios estatais é designado por auxílios com finalidade regional”.

 

É mencionado no ponto 10 das OAR que:

A Comissão aplicará os princípios estabelecidos nas presentes orientações aos auxílios com finalidade regional em todos os setores de atividade económica, com exceção da pesca e da aquicultura, da agricultura e dos transportes que estão sujeitos a regras especiais previstas em instrumentos jurídicos específicos, suscetíveis de derrogar total ou parcialmente as presentes orientações. A Comissão aplicará estas orientações à transformação e comercialização de produtos agrícolas em produtos não agrícolas. As presentes orientações aplicam-se a medidas de auxílio em apoio de atividades fora do âmbito do artigo 42.º do Tratado, mas abrangidas pelo regulamento relativo ao desenvolvimento rural, e cofinanciadas pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural ou concedidas como um financiamento nacional em suplemento dessas medidas cofinanciadas, salvo previsão em contrário das regras setoriais.”

 

Importa também salientar o conteúdo da nota de rodapé 11 respeitante ao ponto 10 das OAR, que determina:

“(11) Os auxílios estatais à produção primária, transformação e comercialização de produtos agrícolas que deem origem a produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado e à silvicultura estão sujeitos às regras estabelecidas nas Orientações para os auxílios estatais no setor agrícola”.

 

No ponto (33) das OAR do setor agrícola refere-se que:

“Em virtude das especificidades do sector, não se aplicam aos auxílios à produção de produtos primários as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020. Aplicam-se, no entanto, à transformação de produtos agrícolas e à comercialização de produtos agrícolas, dentro dos limites fixados nas presentes orientações”.

 

Por fim, e na secção 1.1.1.4., ponto (168), das OAR do setor agrícola, determina-se que:

“Os Estados-Membros podem conceder auxílios a investimentos relacionados com a transformação de produtos agrícolas e a comercialização de produtos agrícolas, desde que satisfaçam as condições de um dos seguintes instrumentos de auxílio:

(a) Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 17 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílios compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado;

(b) Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020;

(c) As condições estabelecidas na presente secção”.

 

Tudo visto, e face à posição das partes, importa decidir.

 

O RFAI, enquanto benefício fiscal concedido pelo legislador português comporta limites na sua aplicação como é estabelecido no mencionado artigo 22.º, n.º 1 do CFI.

 

A Portaria n.º 282/2014, que exclui do âmbito de aplicação do RFAI os projetos de investimento que tenham por objeto a transformação produtos agrícolas, não pode relevar para a não aplicação do benefício fiscal que permite a dedução de uma percentagem dos valores dos investimentos realizados.

 

E, isto porque este Tribunal entende que o legislador remeteu para a Portaria apenas a definição dos códigos de atividade económica (CAE) correspondentes às atividades referidas no n.º 2 do artigo 2.º do CFI, tal como, aliás, tem vindo a ser decidido pela jurisprudência maioritária do CAAD.

 

É de salientar que a definição do âmbito objetivo dos benefícios fiscais é matéria da reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República, como decorre dos artigos 103.º n.º 2 e 165.º, n.º 1 alínea i) e 198.º da CRP.

 

Assim, assiste razão à Requerente quando defende que as suas atividades, no âmbito da qual foram realizados os investimentos considerados como deduções à coleta ao abrigo do RFAI, se enquadram num setor de atividade previsto no artigo 2.º, n.º 2, alínea a), do CFI, e, bem assim, num dos Códigos CAE previstos no artigo 2.º, alínea b), da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro.

 

O direito nacional nesta matéria dos auxílios estatais às indústrias transformadoras de produtos provenientes da agricultura está submetido à legislação da União Europeia, pelo que este Tribunal Arbitral não pode prescindir de analisar essa legislação com vista a determinar se a atividade da Requerente em que foi realizado o investimento está ou não excluída do RFAI e/ou do âmbito setorial de aplicação do RGIC e das OAR.

 

O Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) consagra, nos seus artigos 107.º a 109.º, o regime jurídico que regula os auxílios de Estado, com a finalidade de proibir a concessão de auxílios por parte dos Estados que ponham em perigo a concorrência dentro da União Europeia.

 

Nos termos do artigo 3.º, n.º 1, b) do TFUE, a determinação das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno integra a reserva de competência exclusiva da União Europeia.

 

Em matérias de competência exclusiva da União, só esta pode legislar e adotar atos juridicamente vinculativos. Os Estados-Membros apenas poderão fazê-lo se habilitados pelo direito europeu ou a fim de dar execução aos atos da União (v. artigo 2.º, n.º 1 do TFUE).

 

Neste âmbito, a Comissão Europeia, adotou em 2014, o RGIC (que sucedeu ao anterior regulamento geral de isenção por categoria, o Regulamento n.º 800/2008, de 6 de agosto de 2008), e continuou a simplificação do procedimento de autorização relativo aos auxílios, dispensando os Estados-Membros da obrigação de notificação, desde que verificados determinados pressupostos, orientando-os no sentido de dirigirem os recursos públicos para a realização de objetivos europeus comuns.

 

É importante destacar que o primeiro capítulo do RGIC, intitulado 'Disposições comuns', estabelece as normas aplicáveis a todas as categorias de auxílios abrangidas pelo regulamento. Este capítulo consagra a obrigatoriedade de os Estados-Membros respeitarem certos princípios ao decidirem implementar auxílios sob a sua égide, incorporando diretrizes sobre os elementos que os auxílios devem observar para serem considerados compatíveis com o mercado interno, e estabelecendo expressamente a obrigação de que os auxílios tenham um efeito de incentivo (conforme o artigo 6.º do RGIC).

 

Dessa forma, o RGIC, além de isentar certos auxílios de Estado da obrigação de notificação, define os princípios e diretrizes que devem orientar a ação legislativa dos Estados-Membros nesta área, integrando-se no respetivo quadro regulatório. Os referidos princípios e diretrizes, por constarem de regulamento adotado pela Comissão Europeia, são obrigatórios em todos os seus elementos e diretamente aplicáveis em todos os Estados-Membros, conforme determina expressamente o artigo 288.º do TFUE e reitera o artigo 59.º do RGIC.

 

O RFAI integra um benefício fiscal regulado no CFI que opera por dedução à coleta, sendo enquadrado, no seu artigo 1.º, n.º 2, como um regime de auxílio com finalidade regional aprovado “nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC)”.

O artigo 1.º, n.º 2, faz referência explícita aos “termos do Regulamento”, ainda que tal menção pudesse ser considerada redundante. Esta referência sublinha a necessidade de interpretar e aplicar o CFI, o RFAI e a Portaria n.º 282/2014, de 30 setembro, dentro do quadro institucional e normativo estabelecido pelo RGIC.

 

Determina o RGIC que os auxílios com finalidade regional destinam-se a contribuir para o desenvolvimento das regiões mais desfavorecidas, apoiando o investimento e a criação de emprego num contexto sustentável, prevendo o seu Considerando 31 que “podem ser concedidos para promover a criação de novos estabelecimentos, a extensão da capacidade de um estabelecimento existente, a diversificação da produção de um estabelecimento ou uma mudança fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”

 

As “Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020” (OAR), publicadas no Jornal Oficial da União Europeia C 209, de 23 de julho de 2013, são um diploma legal no qual “a Comissão enuncia as condições ao abrigo das quais os auxílios com finalidade regional podem ser considerados compatíveis com o mercado interno, definindo os critérios para a identificação das regiões que preenchem as condições previstas no artigo 107.º, n.º 3, alíneas a) e c), do Tratado”, no período temporal indicado.

 

Considerando a legislação mencionada, entende este Tribunal Arbitral que resulta do artigo 1.º, n.º 3, alínea c), do RGIC, que só não é permitida a concessão de auxílios estatais à atividade de transformação e de comercialização de produtos agrícolas se se verificar qualquer das situações indicadas nas suas subalíneas i) ou ii), isto é, “sempre que o montante dos auxílios for fixado com base no preço ou na quantidade dos produtos adquiridos junto de produtores primários ou colocados em empresas no mercado pelas empresas em causa” ou “sempre que o auxílio for subordinado à condição de ser total ou parcialmente repercutido nos produtores primários”.

 

Como não se verifica qualquer uma destas situações no presente caso, temos de concluir que a aplicação do benefício fiscal RFAI aos investimentos realizados pela Requerente também não é afastada pelo RGIC.

 

De salientar ainda que o artigo 13.º, alínea b), do RGIC, que define o “âmbito de aplicação dos auxílios com finalidade regional”, confirma a sua aplicação à atividade de transformação e comercialização de produtos agrícolas, ao excluir do seu âmbito de aplicação os “auxílios com finalidade regional sob a forma de regimes orientados para um número limitado de setores específicos de atividade económica”.

 

Decide assim este Tribunal Arbitral que os investimentos realizados pela Requerente na sua atividade à atividade de produção de vinhos comuns e licorosos (atividade enquadrada no CAE 11021) devem ser considerados para aplicação da dedução do benefício fiscal constante do RFAI na dedução ao IRC do exercício fiscal de 2021.

 

  1. Impugnação do valor da causa

 

A Requerente indica como valor da causa o montante de € 157.148,70, o qual a Requerida contesta.

 

De acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem (RCPA), a taxa de arbitragem é calculada em função do valor da causa.

Caso a pretensão da Requerente seja a declaração da ilegalidade do ato de liquidação (alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT), o “valor da causa é determinado nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário” (n.º 2 do artigo 3.º do RCPA).

 

Ora, de acordo com alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT, o valor da causa, no caso de impugnação do ato de liquidação é “o da importância cuja anulação se pretende”.

 

E, de facto, o valor que se pretende anular corresponde ao montante não aceite como relevante para efeitos de aplicação do RFAI, que ascendeu a € 157.148,70, que terá efeitos, em termos de imposto a deduzir, no ano de 2021 (parcialmente) e nos anos seguintes, através do reporte do correspondente crédito.

 

Face a estas circunstâncias, seria inexato considerar €740,03 como o correspondente ao valor da causa, pois o mesmo valor resulta, exclusivamente, do diferencial correspondente à dedução do período que teria tido lugar caso a declaração original submetida pela Requerente tivesse sido processada pelo sistema informático da AT.

 

Ficando por reconhecer, naturalmente, se possível, nos exercícios fiscais subsequentes, o remanescente crédito associado ao RFAI.

 

Não se encontra também cabimento legal para considerar como valor da causa o montante de €51.863,88. Este valor corresponde ao reembolso efetivado pela AT na sequência da não aceitação da declaração original submetida pela Requerente. Entender que este seria o valor da causa seria alicerçar a determinação desse mesmo valor expurgado da dedução do imposto que a Requerente vem contestar, não se afigura de modo algum consistente com o disposto alínea a) do n.º 1 do artigo 97.º-A do CPPT.

 

Desta forma, o único valor que poderá ser considerado no âmbito da interpretação do dito artigo do CPPT será o que corresponde ao real valor económico do processo, o qual no caso se subsume no valor da autoliquidação inicial antes de ser corrigida e que posteriormente foi objeto do Processo de Reclamação Graciosa indeferida pela Requerida.

Tendo por base este enquadramento, o tribunal entende dar provimento ao valor da causa determinado pela Requerente.

 

  1. Juros indemnizatórios

 

O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, na parte relevante para o caso em apreço, que:

 

  1. São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido (artigo 43.º n.º 1 a) da LGT.
  2. Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efetuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

 

Não oferece dúvidas a este tribunal que, tendo a liquidação sido efetuada com base na declaração do contribuinte, mas contra a vontade deste no que respeita ao efeito da desconsideração do impacto do RFAI nessa mesma declaração, e seguindo as orientações recebidas da própria administração tributária via e-balcão (e alicerçadas no entendimento administrativo que a AT faz, baseando a mesma numa Ficha Doutrinária emitida em 2019 que este tribunal já considerou, em circunstâncias semelhantes, desconforme com a Lei, do alcance da Portaria n.º 282/2014, de 30 setembro), estão reunidas as condições para se atribuir à Requerente, por existir erro imputável aos serviços, juros indemnizatórios nos termos previstos na legislação aplicável.

 

  1.  Decisão

 

Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados e, nos termos do artigo 2.º do RJAT, decide-se julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral:

  1. Julgar procedente o pedido de anulação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2023...;
  2. Declarar a ilegalidade parcial da autoliquidação do IRC n.º 2023..., referente ao exercício de 2021, considerando a não dedução à coleta do valor do benefício fiscal do RFAI nos termos suprarreferidos;
  3. Determinar o reembolso do montante pago em excesso pela Requerente (€ 749,03) pela impossibilidade de dedução do crédito relativo ao RFAI, acrescido dos correspondentes juros indemnizatórios, contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos.
  4. Condenar a Requerida nas custas do processo.

 

  1. Valor da causa

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 157.148,70 (cento e cinquenta e sete mil, cento e quarenta e oito euros e setenta cêntimos) indicado no pedido de pronúncia arbitral.

 

  1.  Custas

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em €  3.672,00 nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo Requerida.

Notifique-se

 

Lisboa, 13 de Novembro de 2024

 

 

Os Árbitros

 

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(Regina de Almeida Monteiro – Presidente)

 

 

(Paulo Mendonça – Adjunto e Relator)

 

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(Luís Ricardo Farinha Sequeira – Adjunto)