Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 297/2024-T
Data da decisão: 2024-11-06  IRC  
Valor do pedido: € 102.519,05
Tema: IRC- Fundos de investimento não residentes - Liberdade de circulação de capitais.
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SUMÁRIO:

1 - Quando um Estado Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos Organismos de Investimento Colectivo (OIC) beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do carácter discriminatório, ou não, da referida regulamentação; 2 - O art.º 63, do TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objecto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção; 3 - A interpretação do art.º 63, do TFUE, acabada de mencionar é incompatível com o art.º 22, do EBF na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13/01, na medida em que limita o regime de isenção nele previsto aos OIC constituídos segundo a legislação nacional, dele excluindo os OIC constituídos segundo a legislação de outros Estados Membros da União Europeia”.[1]

 

DECISÃO ARBITRAL

 

Os  árbitros, José Poças Falcão (Árbitro Presidente), Pedro Guerra Alves e Sofia Ricardo Borges, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 14-5-2024 acordam o seguinte:

 

I - RELATÓRIO

A..., sociedade de investimento mobiliário constituída ao abrigo da lei irlandesa, com sede em ..., ..., Irlanda, contribuinte fiscal número ..., contribuinte fiscal português número..., em representação dos subfundos B... e C..., na sequência do despacho de indeferimento proferido pela Chefe de Divisão da Direção de Finanças de Lisboa, datado de 28.11.2023, no âmbito do processo de reclamação graciosa n.º ...2022..., relativo aos atos de retenção na fonte respeitantes a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) de 2020, consubstanciados nas guias n.º... e n.º ..., referentes aos períodos de maio e dezembro de 2020, que incidiram sobre os dividendos auferidos em território nacional melhor identificados infra, veio, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea a), 6.º, n.º 2, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL COLETIVO com vista à declaração de ilegalidade daquela decisão e dos atos tributários que daquela foram objeto.

 

Fundamentou o pedido, alegando, no essencial e em síntese que as liquidações de IRC por retenção na fonte,  identificadas supra são ilegais por injustificada discriminação entre OIC’s residentes e não residentes em Portugal, operada por via do artigo 22º-1, 3 e 10, do EBF, em violação da livre circulação de capitais prevista no artigo 63º, do TFUE e, consequentemente, do princípio do primado do Direito da União Europeia sobre o Direito Interno, consagrado no artigo 8º-4, da Constituição.

Alegou, concreta e designadamente:

  • A Requerente é uma sociedade de investimento mobiliário constituída e a operar de acordo com o direito irlandês (Doc 1);
  • encontra-se organizada em subfundos ou compartimentos patrimoniais autónomos;
  • são subfundos da Requerente: B... e C…;
  • em 2020 a Requerente era residente, para efeitos fiscais, na Irlanda, conforme certificado de residência que se junta como documento n.º 2.
  • através dos identificados subfundos, investiu em participações sociais de sociedades com sede em Portugal;
  • em 2020 foram auferidos dividendos da participação no capital social daquelas sociedades, conforme se extrai de cópia dos documentos que se juntam como documento n.º 3;
  • Os dividendos auferidos pela Requerente foram objeto de retenção na fonte a título definitivo, à taxa de 15% (cf. artigo 94.º do Código do IRC e artigo 10.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre o Estado Português e os e a Irlanda), como melhor se discrimina na tabela que junta;
  • A Requerente não deduziu na Irlanda, Estado da residência, o imposto retido na fonte em Portugal;
  • os atos de retenção na fonte em apreço têm como fundamento jurídico normas que, como se verá, estabelecem uma distinção do regime fiscal aplicável a fundos de investimento residentes e não residentes e que configuram, por isso, uma restrição à livre circulação de capitais que está a ser exercida por um residente de um Estado terceiro;
  • por esta razão, em 19.04.2022, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra o ato de retenção na fonte melhor identificado supra;
  • Em 06.11.2023, a Requerente foi notificada do projeto de indeferimento da reclamação graciosa, conforme cópia que se junta como documento n.º 4.
  • Posteriormente, em 04.12.2023, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, conforme cópia que se junta como documento n.º 5.
  • Por não se conformar com esta decisão a Requerente deduz o presente pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral.
  • Como decorre da factualidade supra, os dividendos auferidos em território nacional pelos subfundos da Requerente foram sujeitos a retenção na fonte a título definitivo, à taxa de 15% [cf. artigos 4.º, n.º 2, 94.º, n.º 1, alínea c) e n.º 3, alínea c), e 87.º, n.º 4, todos do Código do IRC e artigo 10.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre o República Portuguesa e a Irlanda].
  • No entanto, tais dividendos, se auferidos por um Organismo de Investimento Coletivo (OIC) constituído e a operar de acordo com a legislação nacional, estariam excluídos de tributação [cf. artigo 22.º, n.º 3 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF)].
  • Entende a Requerente que o tratamento fiscal conferido pela legislação nacional, que distingue o tratamento a conferir aos dividendos auferidos por fundos de investimento ou sociedades de investimento consoante a residência tributária destes, configura, como de seguida se evidencia, uma restrição à liberdade de circulação de capitais, a qual é proibida pelo artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
  • Neste mesmo sentido, se pronunciou recentemente o Tribunal de Justiça da União Europeia no acórdão AllianzGI-Fonds AEVN, processo C-545/19.
  • De facto, tendo sido chamado a pronunciar-se sobre a compatibilidade do regime previsto no artigo 22.º do EBF com o artigo 63.º do TFUE, o TJUE respondeu que “O artigo 63.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção”.
  • Assim, na senda daquela decisão do TJUE, não poderá deixar de ser determinada a anulação do ato de retenção na fonte em apreço, com fundamento em violação do disposto no artigo 63.º do TFUE.
  • Em 01.07.2015 entrou em vigor o novo regime de tributação dos OIC, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro.
  • De acordo com o artigo 22.º, n.º 1 e n.º 2, do EBF, na redação conferida pelo referido Decreto-Lei, os “(…) os fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional (…)” são tributados em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), correspondendo o lucro tributável ao “(…) resultado líquido do exercício, apurado de acordo com as normas contabilísticas legalmente aplicáveis (…).”
  • Contudo, o n.º 3 do artigo 22.º do EBF dispõe que “ para efeitos do lucro tributável, não são considerados os rendimentos referidos nos artigos 5.º  , 8.º e 10.º do Código do IRS, exceto quando tais rendimentos provenham de entidades com residência ou domicílio em país, território ou região sujeito a um regime claramente mais favorável (…) os gastos ligados àqueles rendimentos ou previstos no artigo 23.º-A do Código do IRC, bem como os rendimentos, incluindo os descontos, e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões (…).” (sublinhado nosso).
  • À luz do disposto no citado artigo não são considerados para efeitos de apuramento do lucro tributável dos OIC (i) os rendimentos de capitais, rendimentos prediais e mais-valias (exceto se provenientes de entidades “offshore”); (ii) os gastos relacionados com estes rendimentos; (iii) os encargos não dedutíveis para efeitos fiscais nos termos do artigo 23.º-A do Código do IRC; e (iv) os rendimentos e gastos relativos a comissões de gestão e outras comissões que revertam para os OIC.
  • Na Circular n.º 6/2015, de 17 de junho, esclarece-se que “Esta exclusão [prevista no artigo 22.º, n.º 3, do EBF] abrange todos os rendimentos, realizados ou potenciais, que tenham a natureza de rendimentos de capitais, prediais ou mais-valias, incluindo, nomeadamente, as menos-valias realizadas ou potenciais, os rendimentos vencidos e ainda não recebidos, os rendimentos e gastos decorrentes da aplicação do justo valor a instrumentos financeiros e imóveis que integram o património do fundo, bem como os gastos ou perdas associados a variações cambiais, os quais consubstanciam, por natureza, rendimentos daquelas categorias e, de acordo com o normativo contabilístico aplicável aos OIC, devem ser contabilizados conjuntamente com os ativos que lhes deram origem.” (sublinhado nosso).
  • À matéria coletável apurada é aplicável a taxa geral de IRC prevista no artigo 87.º, n.º 1 do Código do IRC (atualmente de 21%) estando, no entanto, isentos de derrama municipal e de derrama estadual (cf. artigo 22.º, n.º 5 e n.º 6 do EBF).
  • Os OIC estão, ainda, sujeitos às taxas de tributação autónoma em IRC (cf. artigo 22.º, n.º 8 do EBF).
  • Os OIC podem deduzir os prejuízos fiscais apurados, de um ou mais de doze períodos de tributação, contudo, a dedução a efetuar em cada um dos períodos não pode exceder o montante correspondente a 70% do lucro tributável (cf. artigo 22.º, n.º 4 do EBF e artigo 52.º do Código do IRC).
  • Por seu turno, no que concerne à tributação dos investidores, prescreve o artigo 22.º-A do EBF que os rendimentos de unidades de participação ou participações sociais são tributados em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou de IRC.
  • Este regime, aprovado pelo referido Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13 de janeiro, substituiu o anterior regime de tributação “à entrada” por um regime de “tributação à saída”, i.e., em que a tributação tem essencialmente impacto na esfera dos investidores.
  • Cumpre sublinhar que o regime introduzido pelo referido Decreto-Lei apenas é aplicável a “(…) fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional.” (cf. artigo 22.º, n.º 1 do EBF) (sublinhado nosso).
  • Em caso de inobservância deste requisito, o regime previsto no artigo 22.º do EBF, designadamente a exclusão de tributação dos rendimentos previstos no n.º 3, não é aplicável.
  • Quer isto dizer que, os rendimentos de capitais, rendimentos prediais e mais-valias, a que acima se aludiu, auferidos em território nacional por fundos de investimento ou sociedades de investimento que não tenham sidos constituídos nem operem de acordo com a legislação nacional, e por essa razão sejam não residentes, não estão excluídos de tributação.
  • Prevê o artigo 4.º, n.º 2, do Código do IRC que “As sociedades e outras entidades que não tenham sede nem direção efetiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos.”
  • De acordo com o artigo 94.º, n.º 1, do Código do IRC que “O IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português: (…) c) Rendimentos de aplicação de capitais (…) tal como são definidos para efeitos de IRS, quando o seu devedor seja sujeito passivo de IRC (…).” 
  • Os fundos de investimento e as sociedades de investimento não residentes, como é o caso da Requerente, são tributados pelos rendimentos obtidos em Portugal, por retenção na fonte a título definitivo [cf. artigo 94.º, n.º 1, alínea c) e n.º 3, alínea c), e artigo 87.º, n.º 4 do Código do IRC].
  • O regime supra descrito que exclui de tributação os dividendos auferidos por “(…) fundos de investimento mobiliário (…) sociedades de investimento mobiliário (…) que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional (…)” (cf. artigo 22.º do EBF) e por isso residentes em território nacional, mas que sujeita a retenção na fonte os dividendos auferidos por fundos que não tenham sido constituídos nem operem de acordo com a legislação nacional, e por isso não residentes, colide com o princípio da não discriminação em razão da residência e consubstancia uma restrição a uma das liberdades fundamentais previstas no TFUE.
  • De acordo com o disposto no artigo 8.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (CRP), o Direito Comunitário é aplicável na ordem interna nos termos do Direito da União Europeia, isto é, por força do primado da legislação comunitária sobre o Direito interno, conforme se infere igualmente do disposto no artigo 8.º, n.º 2 da CRP e do artigo 1.º, n.º 1 da LGT.
  • Na senda da Diretiva 88/361/CEE do Conselho de 24.06.1988, tem-se entendido que a livre circulação de capitais, liberdade consagrada no citado preceito, abrange todas as formas de investimento direto, incluindo, no que ora releva, o investimento em valores mobiliários.
  • Analisando a jurisprudência do TJUE (em concreto os acórdãos Orange Smallcap, processo C-194/06, de 20.05.2008; Aberdeen Property Fininvest Alpha Oy, processo C-303/97, de 18.06.2009; Santander, processo C-338/11 a C-347/11, de 10.05.2012; Emerging Markets Series, processo C-190/12, de 10.04.2014; e Miljoen, processo C-10/14, C-14/14 & C-17/14, de 17.09.2015), KEITH O’DONNELL e ULJANA MOLITOR-MARCH, “O artigo 63 do TFUE obriga de forma efetiva os Estados-membros que estabelecem uma isenção de tributação dos dividendos pagos às sociedades residentes por outras sociedades residentes no mesmo Estado-membro, a dar um tratamento equivalente aos dividendos pagos a sociedades residentes noutro Estado-membro e a sociedades residentes em Estados não membros.” (cf. Funds Taxation and the Third-Country Dimension, Investment Fund Taxation: Domestic Law, EU Law, and Double Taxation Treaties, Wolters Kluver, 2018; tradução nossa; sublinhado nosso).
  • Citando múltipla jurisprudência nacional e do TJUE, conclui a Requerente que a legislação nacional em apreço traduz um tratamento desvantajoso das sociedades de investimento não residentes, como é o caso do Requerente.
  • Assim é que, a legislação nacional, concretamente o artigo 22.º, n.º 3 do EBF, consente efetivamente um tratamento desvantajoso dos fundos de investimento e sociedades de investimento não residentes porquanto a  a carga fiscal aplicada aos dividendos auferidos por um fundo de investimento ou por uma sociedade de investimento não residente, não é idêntica à aplicada aos dividendos (da mesma origem) auferidos por um fundo de investimento ou por uma sociedade de investimento residente.
  • O artigo 63.º n.º 1 do TFUE proíbe “(…) todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.” (sublinhado nosso).
  • E, na densificação do conceito de “movimentos de capitais” tem sido observada a enumeração de movimentos constante do Anexo I da Diretiva 88/361/CEE do Conselho de 24.06.1988.
  • A livre circulação de capitais abrange assim todas as formas de investimento direto, incluindo o investimento imobiliário, estabelecimento, prestação de serviços financeiros ou admissão de valores mobiliários em mercados de capitais, o que motiva que a doutrina venha considerando que a mesma engloba “(…) qualquer transferência de valores de um Estado para outro ou, no interior de cada Estado, qualquer transferência para um não residente” (cf. MOTA DE CAMPOS, Manual de Direito Comunitário, Volume III, Lisboa, 2004, Edições Fundação Calouste Gulbenkian, página 397).
  • O artigo 65.º, n.º 1 do TFUE consagra, no entanto, uma derrogação ao princípio da livre circulação de capitais nos seguintes casos:
  1. Se a diferença de tratamento se verificar em relação a situações não objetivamente comparáveis;
  2. Se a restrição se justificar por uma razão imperiosa de interesse geral.
  • O TJUE tem sublinhado que “esta disposição, na medida em que constitui uma derrogação ao princípio fundamental da livre circulação de capitais, deve ser objeto de interpretação estrita  (cf. acórdão Pensioenfonds Metaal en Techniek, processo C-252/14, de 02.06.2016).
  • Por conseguinte, tem o TJUE defendido que esta derrogação não pode ser interpretada no sentido de permitir que uma regulamentação que distinga entre os contribuintes em função do lugar onde residem ou do Estado membro onde investem, seja considerada compatível com o TFUE (cf. acórdão Emerging Markets Series, processo C-190/12, de 10.04.2014 e acórdão Pensioenfonds Metaal en Techniek, processo C-252/14, de 02.06.2016).
  • De notar, aliás, que a derrogação consagrada no n.º 1 do artigo 65.º do TFUE é desde logo limitada pelo n.º 3 do mesmo normativo que prevê que a derrogação à livre circulação de capitais não pode “(…) constituir um meio de discriminação arbitrária, nem uma restrição dissimulada (…).”
  • No caso sob análise, não se verifica qualquer uma das situações previstas no artigo 65.º, n.º 1 do TFUE.
  • No que concerne à alínea a) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE, como decorre de todo o exposto supra quanto à comparabilidade, a situação da Requerente é objetivamente comparável à de uma sociedade de investimento residente.
  • Com efeito, como concluiu o TJUE no acórdão AllianzGI-Fonds AEVN  o tratamento conferido em sede de Imposto do Selo e a sujeição a tributação autónoma não colocam os fundos de investimentos residentes numa situação objetivamente diferente dos fundos de investimento não residentes (cf. parágrafos 53 a 58 do acórdão).
  • A verba 29 da Tabela Geral do Imposto do Selo determina que se encontra sujeito a Imposto do Selo o “valor líquido global dos organismos de investimento coletivo abrangidos pelo artigo 22.º do EBF: 29.1 Organismos de investimento coletivo que invistam, exclusivamente, em instrumentos do mercado monetário e depósitos-sobre o referido valor, por cada trimestre 0,0025%; 29.2 Outros organismos de investimento coletivo-sobre o referido valor, por cada trimestre 0,0125%.”.
  • Para este efeito “(…) o valor líquido global das entidades previstas na alínea x) do n.o 3 do artigo 3.º [fundos de investimento] corresponde à média dos valores comunicados à CMVM ou divulgados pelas entidades gestoras, com exceção do valor correspondente aos ativos relativos a unidades de participação ou participações sociais detidas em organismos de investimento coletivo abrangidos pelo regime estabelecido no artigo 22.º do EBF, no último dia de cada mês do trimestre. (…)” (cf. artigo 9.º, n.º 5, do Código do Imposto do Selo).
  • De acordo com os citados preceitos legais, os OIC estão sujeitos a Imposto do Selo pelo valor líquido global dos ativos.
  • Deste modo e como constatou o TJUE, o Imposto do Selo não visa tributar o rendimento, “(…) é um imposto sobre o património, que não pode ser equiparado a um imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas.” (cf. acórdão AllianzGI-Fonds AEVN, parágrafo 53).
  • Por outro lado, como salienta o TJUE “(…) mesmo considerando que esse mesmo imposto do selo possa ser equiparado a um imposto sobre os dividendos, um OIC residente pode escapar a tal tributação dos dividendos procedendo à sua distribuição imediata, ao passo que esta possibilidade não está aberta a um OIC não residente.” (cf. acórdão AllianzGI-Fonds AEVN, parágrafo 55).
  • No que respeita à tributação autónoma, dispõe o artigo 88.º, n.º 11, do Código do IRC que “são tributados autonomamente, à taxa de 23%, os lucros distribuídos por entidades sujeitas a IRC a sujeitos passivos que beneficiam de isenção total ou parcial, abrangendo, neste caso, os rendimentos de capitais, quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.”
  • Tendo em conta que a tributação autónoma apenas incide sobre os dividendos quando as partes de capital não tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante o período previsto, “(…) não pode ser equiparado ao imposto geral de que são objeto os dividendos de origem nacional recebidos pelos OIC não residentes.” (cf. acórdão AllianzGI-Fonds AEVN, parágrafo 53).
  • Relativamente à alínea b) do n.º 1 do artigo 65.º do TFUE, não se pode considerar que a restrição à livre circulação de capitais resultante da legislação nacional esteja justificada por uma razão imperiosa de interesse geral, caso em que, além do mais, deveria não apenas ser adequada a garantir a realização do objetivo que prossegue mas também não ultrapassar o que é necessário para atingir esse objetivo, respeitando um princípio de proporcionalidade.
  • Não se pode justificar a restrição em causa pelo risco de evasão fiscal uma vez que decorre de jurisprudência constante que esse fundamento não justifica, por si só, uma restrição fiscal à livre circulação de capitais, se não for invocado em ligação com um objetivo específico de luta contra expedientes puramente artificiais, desprovidos de realidade económica, cujo objetivo é de eludir o imposto normalmente devido.
  • Refira-se a este respeito que para prevenção da evasão fiscal vigora a Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Irlanda, a qual permite a troca de informações (cf. artigo 26.º).
  • Por outro lado, também não estão presentes quaisquer razões relacionadas com a preservação da coerência do sistema fiscal.
  • Com efeito, basta recordar que, conforme o TJUE decidiu nos acórdãos Aberdeen Property Fininvest Alpha Oy (processo C- 303/07, de 18.06.2009) e acórdão Santander Asset Management SGIIC SA (processo C 338/11 a C 347/11, de 10.05.2012), para que um Estado membro possa invocar a necessidade de preservar a coerência do seu sistema fiscal é necessário que exista um nexo direto (por estar em causa o mesmo contribuinte ou a mesma tributação) entre a isenção de tributação concedida e uma concreta oneração fiscal.
  • Como refere o TJUE “(…) há que demonstrar a existência de uma relação directa entre o benefício fiscal em causa e a compensação desse benefício através de uma determinada cobrança fiscal” (cf. acórdão Meilicke, processo C-292/04, de 06.03.2007).
  • No caso em apreço, é evidente a inexistência do referido nexo direto entre a exclusão de tributação da retenção na fonte dos dividendos de origem nacional recebidos por uma sociedade de investimento residente e a tributação na esfera dos participantes, quando da “redistribuição” desses mesmos dividendos.
  • Nem se invoque como razão imperiosa de interesse geral a necessidade de evitar a perda de receitas fiscais pois, a este respeito, importa recordar a jurisprudência constante do TJUE segundo a qual “(…) a redução de receitas fiscais não pode ser considerada uma razão imperiosa de interesse geral, suscetível de ser invocada para justificar uma medida, em princípio, incompatível com uma liberdade fundamental.” (cf. acórdão Emerging Markets Series, processo C-190/12, de 10.04.2014).
  • Deste modo, considera a Requerente que inexistem quaisquer razões ou fundamentos justificativos do tratamento discriminatório operado e por conseguinte da restrição à livre circulação de capitais (sublinhado do Tribunal)
  • Resulta das considerações precedentes que os artigos 63.º e 65.º do TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado-membro, nos termos da qual os dividendos pagos por uma sociedade residente nesse Estado-membro a um fundo de investimento ou sociedade de investimento não residente estão sujeitos a tributação, mas que exclui de tributação esses mesmos dividendos se pagos a um fundo de investimento ou sociedade de investimento residente. 
  • No sentido que ora se vem propugnando se pronunciou a jurisprudência arbitral nas decisões arbitrais proferidas nos processos n.º 202/2019-T, n.º 11/2020-T e n.º 166/2021-T, que se debruçaram sobre os atos de retenção na fonte de 2016, 2017 e 2018, respetivamente, que incidiram sobre os dividendos auferidos pela Requerente e cujas cópias se juntam como documento n.º 6.
  • Concluindo: devem os atos tributários em apreço ser anulados e a devolução do imposto pago com juros indemnizatórios, nos termos peticionados

Da questão prejudicial a submeter ao TJUE

  • Caso se entenda não proceder o supra exposto, porque está em causa uma questão de interpretação de Direito da União Europeia que suscita dúvidas, deverá submeter-se a respetiva interpretação ao TJUE competente para decidir a título prejudicial sobre a interpretação do Direito da União Europeia, ao abrigo do disposto no artigo 267.º do TFUE.
  • A questão a apreciar pelo TJUE seria a seguinte: “É compatível com os artigos 63.º e 65.º do TFUE disposição de direito nacional em causa nos presentes autos (cf. artigo 22.º, n.º 3, do EBF) que prevê um tratamento fiscal diferenciado para os dividendos distribuídos por uma sociedade residente nesse mesmo Estado-membro em função da residência do Organismo de Investimento Coletivo (OIC) que os aufere, excluindo de tributação os dividendos pagos por uma sociedade residente nesse Estado-membro a um OIC residente, mas sujeitando a tributação os mesmos dividendos quando pagos a um OIC não residente?”

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Requerida nos termos regulamentares.

Foram depois as partes devidamente notificadas da designação dos árbitros, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos do disposto no artigo 11º nº 1 alíneas a) e b) do RJAT e nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

Em 14-05-2024, em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído, tendo sido proferido despacho arbitral a determinar a notificação da Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.

Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.

 

Resposta da AT

A Requerida apresentou tempestivamente a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação e suscitando o que designou por “questão prévia: informação da DSIRC”, traduzida na omissão da Requerente na relação dos beneficiários nas Declarações modelo 30 submetidas por “BNP Paribas Securities Services”, “(...) na qualidade de entidade registadora e depositária de valores mobiliários referentes aos rendimentos (dividendos) pagos em maio e dezembro de 2020, alegadamente sujeitos a retenção na fonte de IRC à taxa de 15%, identificados no § 8º, do pedido de pronúncia arbitral(...)”.

Alega, concreta e designadamente a  Requerida  que a Requerente é um OIC e sujeito passivo não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável; por outro lado, não demonstra os factos constitutivos e legitimadores da sua pretensão; as alegadas diferenças de tratamento entre OIC residente e OIC não residente encontram-se plenamente justificadas; a tributação na esfera do imposto do selo com aditamento à TGIS da verba 29, de que resulta uma tributação, por cada trimestre, à taxa de 0,0025% do valor líquido global dos OIC  aplicado em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e à taxa de 0,0125% sobre o valor liquido global dos restantes OIC (neste caso a base tributável pode incluir dividendos distribuídos), exclui os OIC constituídos e que operem ao abrigo de legislação estrangeira; por outro lado, está prevista a tributação autónoma à taxa de 23% nos termos do artigo 88º-11, do CIRC e 22º-8, do EBF, dos dividendos pagos a OIC com sede em Portugal, quando as partes sociais a que respeitem os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período; a Requerente não prova se, no caso, existiu ou não um crédito de imposto por dupla tributação internacional na esfera da própria Requerente ou dos investidores; ou seja: a Requerente não fez prova da discriminação proibida e conclui pela manutenção das retenções mencionadas em consequência da improcedência do pedido.

 

Por despacho arbitral, foi decidido dispensar da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT e notificar as partes para apresentação de alegações finais escritas.

Apenas a Requerente apresentou alegações e não foi junto o processo administrativo

 

SANEADOR

 

O Tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos do artigo 2º, nº 1, alínea a), artigos 5º e 6º, todos do RJAT e é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pelo Requerente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.[2]

Não foram suscitadas excepções de que cumpra conhecer.

Não se verificam nulidades pelo que se impõe, agora, conhecer do mérito do pedido.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

Os factos

Preliminarmente, e no que diz respeito à matéria de facto, importa salientar que o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão do pedido e discriminar a matéria provada da matéria não provada [cfr. artigo 123º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e artigo 607º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29º, nº 1, alíneas a) e), do RJAT].

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito suscitadas e/ou de que deva o Tribunal conhecer oficiosamente

No caso, analisadas as posições das partes e toda a prova documental produzida, resultam os seguintes

Factos provados

  1. A Requerente é uma sociedade de investimento mobiliário constituída e a operar de acordo com o direito irlandês (Doc 1)...
  2. ... que se encontra organizada em subfundos ou compartimentos patrimoniais autónomos;
  3. São subfundos da Requerente: B... e C…;
  4. Em 2020 a Requerente era residente, para efeitos fiscais, na Irlanda, conforme certificado de residência que se junta como documento n.º 2;
  5. Através dos identificados subfundos, investiu em participações sociais de sociedades com sede em Portugal;
  6. Em 2020 foram auferidos dividendos da participação no capital social daquelas sociedades, conforme se extrai de cópia dos documentos que se juntam como documento n.º 3;
  7. Os dividendos auferidos pela Requerente foram objeto de retenção na fonte a título definitivo, à taxa de 15% (cf. artigo 94.º do Código do IRC e artigo 10.º da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada entre o Estado Português e os e a Irlanda), como melhor se discrimina na tabela que junta;
  8. A Requerente não deduziu na Irlanda, Estado da residência, o imposto retido na fonte em Portugal;
  9. Em 19.04.2022, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra o ato de retenção na fonte melhor identificado supra pelas razões aí invocadas, invocando designadamente a ilegalidade dessas retenções na consideração de que o  tratamento fiscal conferido pela legislação nacional -  que distingue o tratamento a conferir aos dividendos auferidos por fundos de investimento ou sociedades de investimento consoante a residência tributária destes – configura alegada restrição à liberdade de circulação de capitais, proibida pelo artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
  10. Em 06.11.2023, a Requerente foi notificada do projeto de indeferimento da reclamação graciosa, conforme cópia que se junta como documento n.º 4;
  11. E em 04.12.2023, a Requerente foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, conforme cópia que se junta como documento n.º 5;
  12. Por não se conformar com esta decisão a Requerente deduziu o presente pedido de constituição de tribunal arbitral e de pronúncia arbitral.

 

Factos não provados

Não se surpreende a existência de quaisquer outros factos, provados ou não provados,

Motivação ou fundamentação de facto

O Tribunal, para fixação do quadro factual supra, baseou-se nos documentos juntos aos autos pelo Requerente e não impugnados, analisando-os, numa perspetiva crítica, com as posições das partes espelhadas nos articulados e nas alegações da Requerente (a Requerida não apresentou alegações nem juntou cópia do processo administrativo, pese embora ter sido notificada para o fazer conforme estatui o artigo 17º, do RJAT)

III - FUNDAMENTAÇÃO (cont.)

O Direito

A questão decidenda no presente processo já foi analisada e decidida por vários Tribunais constituídos no âmbito do CAAD[3] e  reconduz-se a saber se a comparabilidade do regime de tributação de OIC residentes e não residentes deve ser aferida apenas por referência à fiscalidade aplicável ao nível do veículo de investimento ou se, pelo contrário, deve ser considerada a situação fiscal dos detentores de participações, tudo visando averiguar da conformidade da legislação interna em causa com o Direito Europeu.

A questão da compatibilidade ou não do regime previsto no artigo 22º, nº 1, do EBF com o Direito da União Europeia, designadamente o artigo 63º do TFUE, foi apreciada no citado acórdão do TJUE de 17-03-2022, proferido no processo n.º C-545/19, no qual se concluiu que “o artigo 63.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento colectivo (OIC) não residente são objecto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção”.

No texto do acórdão, para cuja fundamentação se remete, abordam-se as questões relevantes para atingir esta conclusão.

Como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que substituiu o artigo 234º do Tratado de Roma, anterior artigo 177º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões de Direito da União Europeia. [4]

A supremacia do Direito da União sobre o Direito Nacional tem suporte no nº 4 do artigo 8.º da CRP, em que se estabelece que “as disposições dos tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições, no exercício das respectivas competências, aplicáveis na ordem interna, nos termos definidos pelo direito da União, com respeito pelos princípios fundamentais do Estado de direito democrático”.

Em conformidade com o vertido no recente Acórdão para Uniformização de Jurisprudência prolatada pelo STA (nº 7/2024, de 26 de Fevereiro), “(…) compete a este Tribunal aferir da compatibilidade entre os normativos nacionais que isentam de tributação, na cédula de IRC, os dividendos pagos por entidades com sede em Portugal a OIC com sede neste país, constituídos e a operar de acordo com a legislação portuguesa, mais tributando, por retenção na fonte a título definitivo, os dividendos distribuídos por entidades residentes a OIC com sede em outro Estado Membro da União Europeia, no caso, a Alemanha e, portanto, não constituídos de acordo com a legislação nacional, com as disposições do Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), especialmente, com o seu artº.63, normativo que consagra a liberdade de circulação de capitais. A necessidade de o Direito Europeu ser aplicado de modo uniforme em todo o território da União não se compadece com a aplicação discrepante das suas normas pelos diferentes Estados-Membros. Como o próprio Tribunal de Justiça salientou logo nos primeiros anos da sua actuação, o reenvio tende a assegurar a aplicação do Direito Comunitário, abrindo ao Juiz nacional um meio de eliminar as dificuldades que poderia trazer a exigência de atribuir ao Direito Europeu o seu pleno efeito, no quadro dos sistemas jurisdicionais dos mesmos Estados-Membros. Recorde-se que o direito europeu, originário ou derivado, vigora directamente na ordem jurídica interna portuguesa e a aplicação do mesmo está balizada pelos princípios do primado, da aplicabilidade directa e do efeito directo” (sublinhado nosso). [5]

E, prossegue, referindo que “por força dos citados princípios da aplicabilidade directa e do primado, qualquer parte num litígio pode invocar em juízo, em apoio da sua pretensão, uma disposição comunitária e, se necessário, solicitar a desaplicação de norma nacional com ela incompatível. No caso "sub iudice", está em causa a apreciação de normas de direito interno (cf.v.g. artºs.22, do E.B.F.) e a sua compatibilidade com a liberdade de circulação de capitais, estatuída no artº.63, do Tratado Sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE). O citado artº.63, do TFUE, normativo que consagra o Princípio da Liberdade de Circulação de Capitais, tanto entre Estados-Membros da UE, como entre estes e Países Terceiros, tem como antecedente o artº.67, do TCE. Ora, para aferir se existe, ou não, uma situação de discriminação é necessário determinar, desde logo, se as duas situações são, ou não, comparáveis. Depois, partindo do princípio que, de facto existe comparabilidade entre as duas situações, impõe-se verificar se diferentes regras se aplicam a situações comparáveis, ou se as mesmas regras se aplicam a situações diferentes, dado que ambos os casos podem levar a uma discriminação no que diz respeito às liberdades económicas fundamentais (cf.v.g. acórdão Kerckhaert e Morres, do T.J.U.E., de 14/11/2006, Processo C-513/04, § 19; João Sérgio Ribeiro, Direito Fiscal da União Europeia, Tributação Direta, Almedina, 2018, pág.74). Mais, como regra, a condição de residente não é comparável com a de não residente, sendo este facto geral veiculado pelas decisões do Tribunal de Justiça Europeu. Contudo, em muitos casos, tendo como referência, nomeadamente, o elemento teleológico da disposição de direito interno, o Tribunal de Justiça Europeu entendeu que residentes e não residentes podem estar em situações comparáveis. Esta tendência foi iniciada com o caso Avoir Fiscal (cf. acórdão Avoir Fiscal, do T.J.C.E., de 28/01/1986, Processo 270/83, § 20; João Sérgio Ribeiro, ob. cit., pág.74 e seg.). Revertendo ao caso dos autos, deve considerar-se decisivo, para efeitos de comparabilidade, o facto de a lei portuguesa diferenciar expressamente, para efeitos de retenção na fonte, entre fundos de investimento residentes e não residentes, que não a situação fiscal, mais ou menos vantajosa, que os fundos não residentes possam gozar nos respectivos Estados da residência ou ainda a situação fiscal individual dos seus investidores. Do ponto de vista do Estado-Membro que se considere, fundos residentes e não residentes estão numa situação comparável se ambos estão sujeitos à mesma tributação. Como sublinhou o TJUE no caso Santander Asset Management, quando um Estado Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos OIC beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do carácter discriminatório, ou não, da referida regulamentação (cf. acórdão Santander Asset Management SGIIC, do T.J.U.E., de 10/05/2012, Processo C-338/11 e apensos, § 28). Chamando, agora, à colação o acórdão do TJUE de 17/03/2022, processo C-545/19 (cf. fls. 225 a 235-verso do processo físico) (…) do mesmo se podem retirar as seguintes conclusões, com interesse para a decisão do mérito deste recurso: a) Perante o órgão jurisdicional de reenvio, a A (…) alega que, nos anos de 2015 e 2016, os OIC constituídos e que operam de acordo com a legislação portuguesa estavam sujeitos a um regime fiscal mais favorável do que aquele a que foi sujeita em Portugal, na medida em que, relativamente aos dividendos pagos por sociedades estabelecidas em Portugal, esses organismos estavam isentos, ao abrigo do artigo 22.º, n.º 3, do EBF, do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas. A A (…) considera que, sendo tributada à taxa de 25 % sobre os dividendos que lhe são pagos por sociedades estabelecidas em Portugal, é objeto de um tratamento discriminatório proibido pelo artigo 18.º TFUE, bem como de uma restrição à liberdade de circulação de capitais proibida pelo artigo 63.º TFUE. (§ 17); b) Uma vez que a legislação nacional em causa no processo principal tem, assim, por objeto o tratamento fiscal de dividendos recebidos pelos OIC, deve considerar-se que a situação em causa no processo principal é abrangida pelo âmbito de aplicação da livre circulação de capitais (§ 33); c) Por conseguinte, a circunstância de os OIC não residentes não estarem sujeitos ao imposto do selo e ao imposto específico previsto no artigo 88.º, n.º 11, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas não os coloca numa situação objetivamente diferente em relação aos OIC residentes no que se refere à tributação dos dividendos de origem portuguesa. (§ 57); d) Um OIC não residente pode ter detentores de participações sociais que tenham residência fiscal em Portugal e sobre cujos rendimentos este Estado-Membro exerce o seu poder de tributação. Nesta perspetiva, um OIC não residente encontra-se numa situação objetivamente comparável à de um OIC residente em Portugal (§ 69); e) Por conseguinte, o critério de distinção a que se refere a legislação nacional em causa no processo principal, que tem por objeto unicamente o lugar de residência dos OIC, não permite concluir pela existência de uma diferença objetiva de situações entre os organismos residentes e os organismos não residentes. Atendendo a todos os elementos precedentes, há que concluir que, no caso em apreço, a diferença de tratamento entre os OIC residentes e os OIC não residentes diz respeito a situações objetivamente comparáveis. (§ 73 e 74); f) No entanto, como o Tribunal de Justiça também já declarou, quando um Estado-Membro tenha optado, como na situação em causa no processo principal, por não tributar os OIC residentes beneficiários de dividendos de origem nacional, não pode invocar a necessidade de garantir uma repartição equilibrada do poder de tributar entre os Estados-Membros para justificar a tributação dos OIC não residentes beneficiários desses rendimentos (§ 83); g) Atendendo a todas as considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 63.º TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção. (§ 85). Em consequência, o TJUE expressa a seguinte declaração final: O artigo 63.º TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um EstadoMembro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção. Nestes termos, concluindo-se pela incompatibilidade do artº.22, do E.B.F., na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13/01 (a aplicável ao caso "sub iudice"), com o disposto no artº.63, do TFUE, na medida em que limita o regime de isenção nele previsto aos OIC constituídos segundo a legislação nacional, dele excluindo os OIC constituídos segundo a legislação de outros Estados Membros da União Europeia, impõe-se a não aplicação do referido normativo nacional, de onde se deve concluir que a decisão arbitral recorrida não poderá manter-se, dado enfermar de erro de julgamento de direito, determinante da sua anulação, mais sendo a posição adoptada na decisão arbitral fundamento a que se encontra em conformidade com o direito e jurisprudência, europeus” (sublinhado nosso).

 

Transpondo agora o exposto para o caso sub juditio:

Concluiu-se, no Acórdão do STA acima identificado, que “(…) 1 - Quando um Estado Membro escolhe exercer a sua competência fiscal sobre os dividendos pagos por sociedades residentes unicamente em função do lugar de residência dos Organismos de Investimento Colectivo (OIC) beneficiários, a situação fiscal dos detentores de participações destes últimos é desprovida de pertinência para efeitos de apreciação do carácter discriminatório, ou não, da referida regulamentação; 2 - O artº.63, do TFUE, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um EstadoMembro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objecto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção; 3 - A interpretação do artº.63, do TFUE, acabada de mencionar é incompatível com o artº.22, do E.B.F., na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 7/2015, de 13/01, na medida em que limita o regime de isenção nele previsto aos OIC constituídos segundo a legislação nacional, dele excluindo os OIC constituídos segundo a legislação de outros Estados Membros da União Europeia. (…)” (sublinhado nosso).

Pois bem, tendo em consideração a assinalada incompatibilidade do artigo 22º, nº 1, do EBF, com o artigo 63º do TFUE, na parte em que limita o regime nele previsto a sociedades constituídas segundo a legislação nacional, dele excluindo as sociedades constituídas segundo legislações de Estados Membros da União Europeia, forçosos será concluir que, no caso,  a retenção e o indeferimento da reclamação graciosa interposta contra aquele acto de retenção na fonte, enfermam de vício de violação de lei, tudo justificando a sua anulação de harmonia com o disposto no artigo 163º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2º, alínea c), da Lei Geral Tributária (LGT), com o reembolso do imposto indevidamente retido.[6]

Em consequência do acima exposto, não se toma conhecimento dos vícios de prova suscitados pela Requerida na sua Resposta, por ser inútil e fica também prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas.

 

Do reembolso do imposto pago com juros indemnizatórios

A Requerente pede o reembolso do imposto retido indevidamente, no montante de €102.519,05, acrescido de juros indemnizatórios.

A procedência do pedido de anulação dos atos de retenção na fonte o objeto do presente pedido de pronúncia arbitral tem por consequência vincular a AT nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 24º, do RJAT e, até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, a “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, o que inclui, para além da restituição do indevido, “o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário.”

Igual consequência decorre do disposto no n.º 1 do artigo 100.º, da Lei Geral Tributária (LGT), aplicável ao processo arbitral tributário por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, que estabelece “1 - A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”

O regime dos juros indemnizatórios consta do artigo 43.º, da LGT, que fixa o momento a partir do qual os mesmos são devidos, por erro imputável aos serviços (n.ºs 1 e 2) ou por “outras circunstâncias” (n.º 3), bem como a respetiva taxa (n.º 4) e a consequência do atraso na execução da sentença transitada em julgado (n.º 5).

Nos termos da alínea d) do n.º 3 do artigo 43.º, da LGT, aditada pela Lei n.º 9/2019, de 1 de fevereiro, com entrada em vigor no dia imediato ao da sua publicação e com efeitos retroativos a 1 de janeiro de 2011, “são também devidos juros indemnizatórios (…) d) Em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respetiva devolução”.

No caso dos autos, estando em causa a declaração de ilegalidade da legislação nacional, maxime, do n.º 1 do artigo 22.º, do EBF, por violação do disposto no artigo 63.º, do TFUE, e, reflexamente, do n.º 4 do artigo 8.º, da CRP, há que reconhecer o direito da Requerente a juros indemnizatórios, nos termos do citado artigo 43.º, n.º 3, alínea d), da LGT.

 

III - DECISÃO

Face ao exposto, decide este Tribunal:

  1. Julgar totalmente procedente o pedido de pronúncia arbitral formulado e, em consequência,
  2. Anular as retenções na fonte impugnadas no montante de € 102.519,05;
  3. Anular o sobredito e identificado  despacho de indeferimento da reclamação graciosa;
  4. Julgar procedente o pedido de reembolso à Requerente da importância retida no montante de €102.519,05 e
  5. Condenar a Requerida nas custas deste processo atento o seu total decaimento.

 

Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 102.519,05, correspondente ao valor da liquidação/retenção.

Custas: Nos termos do artigo 22º, nº 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas na importância de EUR 3.060,00, nos termos da Tabela I, anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

  • Notifiquem-se as partes bem como o Ministério Público nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 280º-3, da Constituição, 72º, nº 3, da Lei do Tribunal Constitucional e 185º-A, nº 2, do CPTA subsidiariamente aplicável e 17º-3, do RJAT

 

Lisboa, 06 de novembro de 2024

 

O Tribunal Arbitral Coletivo,

 

José Poças Falcão

(Árbitro Presidente e Relator)

 

 

Sofia Ricardo Borges

(Árbitro Vogal)

 

 

Pedro Guerra Alves

 

(Árbitro Vogal)

 

 



 

[1] Sumário em conformidade com o Acórdão do STA para uniformização de jurisprudência nº 7/2024, de 26 de Fevereiro.

[2] Nesta matéria, refira-se que o Requerente por não concordar com a retenção na fonte efetuada apresentou reclamação graciosa (ao abrigo do artigo 132º nºs 3 e 4 do CPPT e do artigo 137º do Código do IRC) em 19-04- 2022 (dentro do prazo de dois anos a contar do termo do prazo de entrega, pelo substituto tributário, do imposto retido na fonte), para apreciação da legalidade dos atos de retenção na fonte de IRC relativos ao ano de 2020 (identificados neste processo), na qual solicitou a anulação dos mesmos por vício de ilegalidade por violação direta do Direito da UE, bem como o reconhecimento do seu direito à restituição do imposto indevidamente suportado em Portugal. Esta reclamação foi indeferida poer despacho notificado em 4-12-2023, tendo o Requerente apresentado o pedido de pronúncia arbitral que dá origem a este processo, em 1-3-2024, ou seja, no prazo de 90 dias a contar da notificação do sobredito despacho de indeferimento

[3] Cfr., v.g., entre outras, as decisões arbitrais sobre a matéria - Cfr, de acordo com o meu apontamento,  decisões  nos Processos n.º 528/2019-T, n.º 548/2019-T, n.º 926/2019-T, n.º 11/2020-T, n.º 922/2019-T, n.º 68/2020-T, n.º 716/2020-T, n.º 166/2021-T, n.º 32/2021-T, n.º 215/2021-T, n.º 345/2021-T, n.º 133/2021-T, n.º 214/2021-T, n.º 127/2021-T, n.º 821/2021-T, n.º 593/2021-T, n.º 134/2021-T, n.º 382/2021-T, n.º 368/2021-T e n.º 817/2021-T, n.º 370/2021-T, n.º 623/2021-T, n.º 622/2021-T, n.º 621/2021-T, n.º 734/2021-T e n.º 129/2022-T, n.º 115/2022-T, n.º 620/2021-T, n.º 121/2022-T, n.º 545/2021-T, n.º 624/2021-T, n.º 816/2021-T, n.º 83/2021-T, n.º 746/2021-T, n.º 128/2022-T, n.º 135/2022-T, n.º 116/2022-T, n.º 114/2022-T e 658/2022-T, entre outras

 

[4] Neste sentido, podem ver-se os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 25-10-2000 (processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, p. 3757), de 07-11-2001 (processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2602), de 07-11-2001 (processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10- 2003, p. 2593).

[5] Cf. artº.8, n.º 4, da CRP; ac. STA - 2.ªSecção, 3/06/2020, rec. 688/11.7BECBR; ac. STA - 2.ªSecção, 3/05/2023, rec. 998/12.6BELRS; João Mota de Campos e João Luiz Mota de Campos, Manual de Direito Comunitário, 5.ª Edição, Coimbra Editora, 2007, pág.405 e seg.; Ana Maria Guerra Martins, Manual de Direito da União Europeia, 2.ª Edição, Almedina, 2018, pág.540 e seg.; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4.ª Edição, 1.º Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.264 e seg.

[6] A este respeito refira-se que, de acordo com o teor do Acórdão do TCAS (processo nº 410/15.9BEFUN, de
15-12-2021, "o indeferimento tácito, por ser ficção de ato, não tem fundamentação, destinando-se tal presunção a facultar ao lesado o acesso à via judicial perante a omissão do dever de decisão”, pelo que se entende que há adequação do meio processual para reagir contra o indeferimento tácito da reclamação graciosa porquanto aquele indeferimento (tácito) comporta em si mesmo uma tomada de posição sobre a (alegada) ilegalidade, razão pela qual tem os mesmos efeitos que resultariam de um indeferimento expresso.