Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 69/2024-T
Data da decisão: 2024-09-24  IVA  
Valor do pedido: € 128.460,86
Tema: IVA – Introdução no consumo de veículo ligeiro de passageiros novo – artigo 6.º do R.I.T.I.
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SUMÁRIO:

  1. Se no momento em que ocorrer a transmissão - (e ela não pode deixar de ocorrer no momento em que o direito de propriedade do veículo se transfere para o adquirente – neste sentido veja-se o disposto no art.º 3.º do CIVA) não se verificarem cumulativamente as duas condições referidas no o n.º 2 do artigo 6.º do RITI e no n.º 2 do artigo 2.º da Diretiva IVA, o veículo é considerado novo e, consequentemente, tributado no Estado-Membro de destino a titulo da aquisição intracomunitária, na aceção do artigo 20.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho de 28 de dezembro, independentemente do estatuto e qualidade do transmitente e/ou do adquirente do veículo.
  2. Caindo a presunção de veracidade das declarações do Contribuinte, estabelecida no artigo 75.º da LGT, recai sobre este o ónus de esclarecer, comprovar e documentar a operação em causa, inclusive de demonstrar e justificar a sua relevância e consistência tributárias, com recurso a meios de prova documental e complementá-los com prova testemunhal.
  3. O Requerente não cumpriu o ónus da prova dos factos suscetíveis de gerar dúvidas fundadas sobre os factos afirmados pela Administração Tributária Neerlandesa, não contrariado assim a força probatória das informações oficiais fornecidas por esta ao abrigo da Convenção Internacional sobre Assistência Mútua em Matéria Fiscal a que o Estado Português está vinculado.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

Os árbitros Profª. Doutora Regina de Almeida Monteiro (Presidente), Dr. Fernando Marques Simões e Dra. Cristina Coisinha (Adjuntos), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem este Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

I. Relatório

A..., a seguir designado por “Requerente”, Contribuinte n.º ..., residente na ..., ..., ...-... Porto, ao abrigo dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20.01, com as alterações subsequentes (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, RJAT), apresentou, em 15.01.2024, pedido de pronúncia arbitral, em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (a seguir, Requerida ou AT), no qual peticionou a declaração de ilegalidade e a anulação da liquidação de IVA n.º 2023/..., emitida pela Alfândega do Freixeiro, em 20-11-2023, no valor de € 125.463,49 e inerentes juros compensatórios no montante de € 2.997,37, bem como a restituição ao Requerente das importâncias por ele pagas acrescidas dos juros indemnizatórios devidos a taxa legal.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do presente tribunal arbitral coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no competente prazo.

Em 03-06-2024, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, à qual não opuseram recusa nos termos conjugados dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas b) e c) e 8.º do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

Em consonância com a al. c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, conforme comunicação do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, o tribunal arbitral coletivo ficou constituído em 26-03-2024.

Por despacho de 08-05-2024 do Tribunal Arbitral, foi fixado o dia 25 de junho às 14:30 horas para efeitos da realização da reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT. Neste despacho foram as partes notificadas para informar o CAAD, com a antecedência de, pelo menos, 5 dias úteis da diligência agendada, sobre a vontade de deslocação às instalações do CAAD, em Lisboa, ou no Porto, e se as testemunhas seriam apresentadas nas instalações do CAAD no Porto ou em Lisboa, presumindo-se, na ausência tempestiva em sentido contrário, que as partes e as testemunhas se apresentariam nas instalações do CAAD em Lisboa.

Em tempo, a Requerida requereu ao Tribunal que a presença da jurista designada fosse assegurada por videoconferência através da plataforma webex e informou que as testemunhas arroladas pela AT se apresentariam nas instalações do CAAD no Porto.

O Requerente manteve-se silente.

No dia e hora aprazados para a reunião de inquirição de testemunhas, estiveram presentes os árbitros que compõe o presente Coletivo, a jurista em representação da AT e as testemunhas arroladas pela Requerida. Não compareceram o Exmo. Representante do Requerente e as testemunhas indicadas pelo mesmo, tendo o Tribunal diferido para momento posterior a definição da subsequente tramitação processual.

Nesse mesmo dia, 25 de junho de 2024, foi o Requerente notificado na pessoa do seu representante legal do conteúdo da Ata da reunião.

Por e-mail de 25 de junho de 2024, o advogado do Requerente veio justificar a falta de comparência com fundamento num lapso, involuntário, no agendamento da diligência, requerendo ao Tribunal a relevação do lapso bem como o adiamento da diligência para outra data a designar.

Em 04 de julho de 2024, o Tribunal Arbitral proferiu despacho mediante o qual decidiu que o motivo indicado pelo Requerente para a remarcação da inquirição de testemunhas não era atendível e, em consequência decidiu não remarcar a diligência.

No mesmo despacho o Tribunal Arbitral dispensou a inquirição das testemunhas apresentadas pela AT, salvo oposição expressa da Requerida no prazo de 5 dias; convidou o Requerente para, igualmente no prazo de 5 dias, juntar aos autos procuração forense com a identificação completa do Requerente; facultou às partes a possibilidade de, querendo, apresentarem alegações escritas no prazo simultâneo de 20 dias e indicou o dia 20 de setembro como data previsível para a prolação da decisão arbitral.

Por requerimento de 05-07-2024, o Requerente pediu ao Tribunal para informar os elementos de identificação que devem ser considerados para identificar de forma completa o Requerente na procuração forense.

Em 09-07-2024 o Tribunal Arbitral proferiu despacho informando o Requerente para cumprir com a legislação, nomeadamente com o disposto: artigo 262.º do CC e artigo 46.º n.º 1 c) do CN.

O Requerente veio juntar procuração por requerimento submetido no dia 25-07-2024.

A AT apresentou as suas alegações escritas em 13-09-2024, nas quais desenvolveu e reiterou o alegado na Resposta.

 

II. Saneamento

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, em conformidade com o preceituado na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, na alínea a) do n.º 3 do artigo 5.º, na alínea a) do n.º 2 do art.º 6.º e do n.º 1 do artigo 11.º, todos do RJAT.

 

Da regularidade do mandato

Suscitada a questão da regularidade do mandato forense, uma vez que da procuração junta com o PPA, para além da identificação do mandante, só constava o NIF e o local da residência daquele[1] - o que levou à notificação do mandatário do Requerente para juntar procuração com a identificação completa do Requerente - impõe-se, prévia e liminarmente, fazer uma breve alusão à regularidade do mandato conferido pelo Requerente ao seu mandatário.

Assim, o mandato forense deve ser reduzido a escrito e emitido por meio de uma correta, clara e legível identificação de quem confere os respetivos poderes forenses ao mandatário ali identificado.

Estatui o art.º 262 do Código Civil como segue: “1. Diz-se procuração o acto pelo qual alguém atribui a outrem, voluntariamente, poderes representativos. 2. Salvo disposição legal em contrário, a procuração revestirá a forma exigida para o negócio que o procurador deva realizar.”

Quanto a formalidades comuns, diz o n.º 1 do art.º 46º do Código do Notariado o seguinte:

“1 - O instrumento notarial deve conter: a) A designação do dia, mês, ano e lugar em que for lavrado ou assinado e, quando solicitado pelas partes, a indicação da hora em que se realizou; b) O nome completo do funcionário que nele interveio, a menção da respectiva qualidade e a designação do cartório a que pertence; c) O nome completo, estado, naturalidade e residência habitual dos outorgantes, bem como das pessoas singulares por estes representadas, a identificação das sociedades, nos termos da lei comercial, e das demais pessoas colectivas que os outorgantes representem, com menção, quanto a estas últimas, das suas denominações, sedes e números de identificação de pessoa colectiva; d) A referência à forma como foi verificada a identidade dos outorgantes, das testemunhas instrumentárias e dos abonadores; e) A menção das procurações e dos documentos relativos ao instrumento que justifiquem a qualidade de procurador e de representante, mencionando-se, nos casos de representação legal e orgânica, terem sido verificados os poderes necessários para o acto; f) A menção de todos os documentos que fiquem arquivados, mediante a referência a esta circunstância, acompanhada da indicação da natureza do documento, e, ainda, tratando-se de conhecimento do imposto municipal de sisa, a indicação do respectivo número, data e repartição emitente; g) A menção dos documentos apenas exibidos com indicação da sua natureza, data de emissão e entidade emitente e, ainda, tratando-se de certidões de registo, a indicação do respetivo número de ordem ou, no caso de certidão permanente, do respetivo código de acesso; h) O nome completo, estado e residência habitual das pessoas que devam intervir como abonadores, intérpretes, peritos médicos, testemunhas e leitores; i) A referência ao juramento ou compromisso de honra dos intérpretes, peritos ou leitores, quando os houver, com a indicação dos motivos que determinaram a sua intervenção; j) As declarações correspondentes ao cumprimento das demais formalidades exigidas pela verificação dos casos previstos nos artigos 65.º e 66.º; l) A menção de haver sido feita a leitura do instrumento lavrado, ou de ter sido dispensada a leitura pelos intervenientes, bem como a menção da explicação do seu conteúdo; m) A indicação dos outorgantes que não assinem e a declaração, que cada um deles faça, de que não assina por não saber ou por não poder fazê-lo; n) As assinaturas, em seguida ao contexto, dos outorgantes que possam e saibam assinar, bem como de todos os outros intervenientes, e a assinatura do funcionário, que será a última do instrumento.”

Já quanto à verificação da identidade, refere o art.º 48.º do Código do Notariado o seguinte:

“1 - A verificação da identidade dos outorgantes pode ser feita por alguma das seguintes formas: a) Pelo conhecimento pessoal do notário; b) Pela exibição do bilhete de identidade, de documento equivalente ou da carta de condução, se tiverem sido emitidos pela autoridade competente de um dos países da União Europeia; c) Pela exibição do passaporte; d) Pela declaração de dois abonadores cuja identidade o notário tenha verificado por uma das formas previstas nas alíneas anteriores, consignando-se expressamente qual o meio de identificação usado. 2 - Não deve ser aceite, para verificação da identidade, documento cujos dados não coincidam com os elementos de identificação fornecidos pelo interessado ou cujo prazo de validade tenha expirado, admitindo-se a alteração da residência e do estado civil, se, quanto a este, for exibido documento comprovativo da sua alteração não ocorrida há mais de seis meses. 3 - Nos actos notariais devem ser mencionados o número e a data dos documentos exibidos para a identificação de cada outorgante, bem como o respectivo serviço emitente. 4 - As testemunhas instrumentárias podem servir de abonadores.”

A alínea c) do n.º 2 do art.º 90.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, previsto na Lei n.º 145/2015, dispõe:

Em especial, constituem deveres do advogado para com a comunidade: a) (...); b) (...); c) Verificar a identidade do cliente e dos representantes do cliente, assim como os poderes de representação conferidos a estes últimos; (...)”

O art.º 3.º do Decreto-lei n.º 14/2013, de 28 de janeiro, refere que “O NIF é obrigatório para as pessoas singulares e coletivas ou entidades legalmente equiparadas que, nos termos da lei, se encontrem sujeitas ao cumprimento de obrigações ou pretendam exercer os seus direitos junto da Administração Tributária e Aduaneira (AT)”.

Do quadro normativo traçado, pode intuir-se no sentido de que, no que respeita a mandantes pessoas singulares, tal identificação completa exige que das procurações forenses conste: o nome completo, o estado civil, o NIF, a naturalidade e a residência habitual do(s) outorgante(s). Exige-se ainda a designação do dia, mês, ano e lugar em que o instrumento procuração forense foi lavrado ou assinado pelo mandante.

Quanto à questão de saber se a procuração forense deve conter uma referência, aposta na procuração pelo próprio advogado constituído mandatário, à forma como, por si próprio, foi verificada a identidade do(s) outorgante(s) e ainda quanto à eventual exigência da assinatura do próprio advogado mandatado na qualidade (notarial) de certificante do referido modo de verificação da identidade do mandante, importa ter em conta o disposto no artigo único do Decreto-lei n.º 267/92, de 28 de novembro: “1 - As procurações passadas a advogado para a prática de actos que envolvam o exercício do patrocínio judiciário, ainda que com poderes especiais, não carecem de intervenção notarial, devendo o mandatário certificar-se da existência, por parte do ou dos mandantes, dos necessários poderes para o acto. 2 - As procurações com poderes especiais devem especificar o tipo de actos, qualquer que seja a sua natureza, para os quais são conferidos esses poderes”.

Da letra daquele artigo único do Decreto-lei n.º 267/92, de 28 de novembro, consta a dispensa de reconhecimento notarial quanto às procurações forenses, mas já não que os advogados passariam a intervir nas procurações forenses nos mesmos moldes que interviriam os Notários caso a dispensa não houvesse sido ali concretizada.

Assim sendo, a lei não exige que do texto da procuração forense conste qualquer referência à forma como, por si próprio, o mandatário (advogado) verificou a identidade do mandante. A procuração forense deve estar assinada pelo mandante, não exigindo a lei que o mandatário igualmente a assine na qualidade de certificante do referido modo de verificação da identidade do mandante.

Para que a procuração forense seja legalmente válida, o mandatário (advogado) a quem os poderes forenses são conferidos deve certificar-se da identidade do mandante e dos poderes para o ato, não exigindo a lei que tal informação conste expressamente do texto da procuração.

Na primeira procuração junta e para além da identificação do mandante, só constava o NIF e o local da residência daquele. Na segunda procuração junta pelo Requerente já constam, para além daqueles elementos, a naturalidade e o estado civil do mandante, respeitando o conteúdo formal legalmente exigível para que as procurações forenses se apresentem como válidas. Ademais, a lei confere ao mandatário (advogado) competência para, por si, empreender a certificação da identidade do mandante, ou seja, só àquele compete certificar-se da identificação do mandante, não exigindo a lei, sequer, que tal informação conste expressamente do texto da procuração, competindo, tão-só, ao mandatário a certificação da identidade do mandante e dos poderes para o ato, pelo que, decide-se, em conformidade com o exposto, que o Requerente está devidamente representado.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e estão devidamente representadas (artigo 4.º e artigo 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22.03).

O processo não enferma de nulidades e não foram identificadas questões que obstem ao conhecimento do mérito.

 

  1. posição das partes
  1. posição do requerente

 

No pedido de pronúncia arbitral, o Requerente alegou, em sustentação da peticionada anulação da liquidação de IVA e juros compensatórios, que a mesma é ilegal por contrariar o disposto no n.º 2 do artigo 6.º do Regime do IVA nas Transações Intracomunitárias (RITI), com os seguintes fundamentos essenciais:

i) no ano de 2023, o Requerente decidiu comprar um veículo usado, desportivo e de gama alta, no mercado alemão atendendo às melhores condições que este mercado tem face ao nacional, informando-se previamente à aquisição que para beneficiar da isenção de IVA, o veículo teria de possuir mais de 6.000 km à data da compra. Identificado o veículo, no site de uma sociedade alemã, que tinha apenas percorrido 3.500 km, nos primeiros contactos com o representante da empresa o Requerente informou que era condição para a aquisição do veículo que este, à data da compra, tivesse uma quilometragem superior a 6.000 Km, tendo a vendedora garantido que esse não era um problema uma vez que a viatura podia circular até que essa quilometragem fosse atingida;

ii) estabelecidas as condições da venda, em 28.02.2023 celebrou um contrato promessa de compra e venda do veículo, que teve por objeto uma viatura, usada, com quilometragem superior a 6.000 km, pelo preço de € 490.250,00 e pagou o sinal no montante de € 25.000,00, mediante transferência bancária;

(iii) informado pela vendedora que o veículo já tinha percorrido os 6.150 km, e na convicção de que essa informação era verdadeira, em 21.03.2023 adquiriu o veículo ligeiro de passageiros usado, marca Ferrari, modelo 812 GTS, originário da Alemanha, matriculado neste país com a matrícula..., tendo o Requerente pago a diferença do preço no montante de € 465.250,00 no dia 21.03.2024;

(iv) quando o veículo chegou a Portugal e foi descarregado do camião que efetuou o seu transporte registava a quilometragem de 6.150 km conforme resulta dos documentos legais, mormente da fatura de venda, da inspeção técnica da assistência do veículo efetuada na oficina da Ferrari, e não sabem nem tem que saber como é que o veículo adquirido percorreu e chegou aos 6.150 km;

(v) A AT não fez prova, como lhe competia ao abrigo das regras sobre o ónus da prova, de que a quilometragem do veículo, à data da sua aquisição, não corresponde à que se encontrava registada no conta-quilómetros, nem à indicada na fatura de venda e, para o Requerente não podem os dados constantes de documentos oficiais, com valor probatório, serem infirmados por declarações do vendedor, que reputa como falsas, nem tão pouco com base na ficha técnica relativa ao transporte do veículo cujo preenchimento pode não ter sido feito com base no visionamento da quilometragem.

 

O Requerente arrolou prova testemunhal.

 

  1. Posição da Requerida

A Requerida, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do RJAT, juntou aos autos o processo administrativo (a seguir PA), constituído pelo procedimento inspetivo (a seguir PI) e apresentou resposta, na qual, convocando e dando por reproduzida a argumentação constante da fundamentação do Relatório de Inspeção Tributária (a seguir RIT), solicitou a improcedência do pedido de pronúncia arbitral, por não provado, com base, em síntese, no seguinte:

(i) Em 03-04-2023 foi apresentado, na Alfândega do Freixieiro, a declaração aduaneira de veículo (DAV) n.º 2023/..., no âmbito da introdução ao consumo do veículo ligeiro de passageiros, marca Ferrari, matrícula Alemã ..., tendo o mesmo sido considerado meio de transporte usado porque o Requerente declarou na DAV que o veículo ostentava 6.166 km percorridos e, por isso, não foi tributado em IVA;

(ii) Existindo duvidas relativamente ao efetivo número de quilómetros percorridos pelo veículo até à data em que foi adquirido pelo Requerente, foi, através do e-mail nº 2023... de 10-04-2023, solicitado à Direção de Serviços de Investigação da Fraude e das Ações Especiais (DSIFAE) que, no âmbito do Regulamento (UE) n.º 904/2010 do Conselho, de 7 de outubro de 2010, fosse efetuado pedido de cooperação administrativa junto das autoridades neerlandesas, no sentido de ser averiguada junto da empresa vendedora a autenticidade da fatura apresentada e a quilometragem real do veículo no momento da transação;

(iii) da análise dos elementos obtidos no âmbito do procedimento de cooperação administrativa junto das autoridades neerlandesas, resulta que o veículo em causa:

-           Possuía, em 27-02-2023, 3.675 Kms percorridos, de acordo com o histórico de manutenção, emitido pelo representante da marca Ferrari;

- Na fatura nº 13000223, emitida, em 21-03-2023, pela empresa neerlandesa B... B.V., consta que o veículo foi vendido pelo valor total de 490.250,00 euros, com a quilometragem de 6.150 Kms;

-           No âmbito do seu carregamento no camião que o transportou para Portugal, foi elaborada uma ficha de controlo onde são indicadas as condições do veículo, bem como os documentos e acessórios que o acompanharam. Nesse documento consta que o conta-quilómetros do veículo ostentava, em 23-03-2023, quando foi carregado, 3.684 Kms percorridos;

- Da Declaração de Expedição Internacional (CMR) nº ..., emitida pela empresa C..., Lda, NIF..., elaborada em 23-03-2023, consta que o veículo acima referenciado foi recebido pelo destinatário, em 24-03-2023;

- No Certificado de aprovação em inspeção técnica já em Portugal, emitido pela empresa D..., S.A., em 31-03-2023, consta que o veículo foi sujeito a uma inspeção realizada num centro dessa empresa (334) e o seu conta-quilómetros apresentava 6.166 Km percorridos.

-           Na assistência do veículo, efetuada numa oficina especializada da Ferrari, para efeitos de legalização, refletida na fatura nº 2023/..., datada de 28/04/2023, o registo da quilometragem era de 6.191 Km;

- Na Alemanha, foi atribuída uma matrícula provisória que, com o seguro que lhe está associado, permitiu, ao referido veículo, circular durante o período compreendido entre 17-03-2023 e a data em que foi sujeito à inspeção técnica para atribuição da matrícula portuguesa, cerca de 2.482Km, número que resulta da diferença entre os quilómetros ostentados na referida inspeção (6.166) e em 23-03-2023, quando foi carregado no camião que o transportou com destino a Portugal (3.684)

(iv) Resultou também da informação transmitida pelas autoridades neerlandesas que, de acordo com o responsável pela venda do veículo nos Países Baixos, o titular da DAV pediu para colocar, na fatura, 6.150 Km, porque senão iria ter problemas com a homologação em Portugal;

(v) Das declarações do vendedor e da documentação recebida, decorre que o veículo em causa não foi adquirido com mais de 6.000 km percorridos, ao invés do declarado pelo Requerente na DAV, pelo que à luz do previsto no artigo 6º do RITI, devia ter sido considerado meio de transporte novo e, nos termos do previsto na al. b) do artigo 1º e nº 3 do artigo 22º do referido Diploma, sujeito ao pagamento do IVA na Alfândega.

(vi), o Requente foi notificado do projeto do Relatório Inspetivo para o exercício de audição prévia, tendo-se pronunciado no prazo conferido para o efeito, e em 27-09-2023 foi notificado para pagar o IVA liquidado no montante de € 128.460,86.

 

A Requerida arrolou duas testemunhas.

 

IV. Thema Decidendum

A matéria objeto do litígio concerne à (i)legalidade da liquidação de IVA emitida pela Alfândega do Freixeiro respeitante à introdução no consumo, por parte de um Requerente, de um veículo ligeiro de passageiros originário da Alemanha.

Trata-se de saber se o veículo automóvel adquirido pelo Requerente num país membro da União Europeia foi introduzido no consumo em Portugal no estado de usado, ao abrigo do disposto no artigo 6.º do RITI, devendo, por isso, ficar isento do pagamento do IVA na Alfândega, ao abrigo do previsto na alínea b) do artigo 1.º e n.º 3 do artigo 22.º do RITI.

 

V. Fundamentação de Facto

A. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão:

a) Em 21-03-2023, o Requerente adquiriu à empresa neerlandesa, B... B.V., pelo preço de € 490.250,00, o veículo automóvel de passageiros, marca Ferrari, modelo 812 GTS, originário da Alemanha e matriculado neste país com a matrícula ... (doravante designado de “veículo”); (cfr. fatura junta como documento n.º 3 ao PPA e PA-PI).

b) Em 27-02-2023 o veículo tinha percorrido 3.675 Km.; (cfr. PA-PI vide histórico de manutenção emitido pelo representante da marca Ferrari).

c) A fatura emitida pelo vendedor em 21-03-2023 refere que o veículo, à data da emissão da fatura, tinha 6.150 km.; (cfr. fatura junta como documento n.º 3 ao PPA e PA-PI).

d) O veículo foi matriculado provisoriamente na Alemanha, ficando sujeito à matrícula provisória ..., emitida em nome do Requerente; (cfr. PA-PI)

e) Foi emitido um certificado de seguro de veículo para o período de 17-03-2023 a 15-04-2023; (cfr. PA-PI).

f) Na ficha de controlo efetuada aquando do carregamento do veículo, no camião que o transportou para Portugal, em 23-03-2023, consta que o conta-quilómetros ostentava 3.684 Km.; (cfr. PA-PI).

g) No certificado de aprovação em inspeção técnica, realizado em Portugal em 31-03-2023, pela D..., S.A., consta que o conta quilómetros do veículo apresentava 6.166 km percorridos; (cfr. PA-PI).

h) A 03-04-2023 o Requerente apresentou a Declaração Aduaneira de Veículo (DAV) n.º 2023/... na Alfândega do Freixeiro, na sequência do que foi atribuída a matrícula nacional em 05.04.2023; (cfr. DAV junta documento n.º 1 ao PPA e PA-PI).

i) Juntamente com a DAV foram apresentados os seguintes documentos:

- fatura n.º 13000223 emitida pela empresa B... B.V., com sede nos países baixos, no valor de € 490.250,00. Nesta fatura consta que o conta-quilómetros do veículo indicava 6.150 kms percorridos;

- Declaração de expedição internacional (CMR) n.º ... – documento de transporte rodoviário do veículo emitido pela empresa transportadora – no qual consta que o veículo adquirido pelo Requerente foi por ele recebido em 23-03-2024;

- Fatura emitida pela empresa transportadora em 17-03-2024 na sequência do serviço de transporte de um Ferrari 812 GTS com o quadro ..., de ..., Alemanha, até ao Porto;

- Livrete e título de registo de propriedade do veículo, onde consta que o veículo foi sujeito, na Alemanha, à matrícula provisória ..., emitida em nome de A..., para o período compreendido entre 17-03-2023 e 15-04-2023;

- Certificado de aprovação em inspeção técnica, emitido pela empresa D..., S.A., em 31-03-2023, no qual consta que o veículo foi sujeito a uma inspeção realizada num centro dessa empresa e o seu conta-quilómetros apresentava 6.166 Km percorridos; (cfr. fls.10 e fls.14 a 26 do PA-RI).

j) Na regularização da situação fiscal e aduaneira do veículo foi pago o montante de € 55.243,35, a título de imposto sobre veículos (ISV); (cfr. Documento n.º 2 junto com o PPA e PA-RI).

k) Na DAV apresentada o Requerente declarou que o veículo ostentava 6.166 Kms percorridos; (cfr. DAV junta documento n.º 1 ao PPA e PA-PI).

l) Por e-mail nº 2023... de 10-04-2023, a AT solicitou à Direção de Serviços de Investigação da Fraude e das Ações Especiais (DSIFAE) que, no âmbito do Regulamento (UE) n.º 904/2010 do Conselho, de 7 de outubro de 2010, fosse efetuado pedido de cooperação administrativa junto das autoridades neerlandesas, no sentido de ser averiguada junto da empresa vendedora a autenticidade da fatura apresentada e a quilometragem real do veículo no momento da transação. (Cfr. PA-RI)

m) As autoridades neerlendesas responderam através do e-mail n.º DSIFAE/.../2023, da DSIFAE, de 25-06-2023. (Cfr. PA-RI)

n) No âmbito do procedimento de cooperação administrativa junto das autoridades neerlandesas, consta que o veículo:

- Foi vendido pela empresa E... GmbH & Co à empresa, também alemã, F... GmbH, em... . Esta operação foi realizada em junho de 2022, tendo, para efeitos de IVA, sido utilizado o regime da margem;

-           No âmbito da legislação em vigor, a empresa F... GmbH, em ..., solicitou às autoridades fiscais alemãs, o reembolso do IVA cobrado na primeira venda, por se tratar de um veículo novo, tendo, para o efeito, apresentado a fatura de compra.

-           Foi, em 25-08-2022, vendido pela empresa F... GmbH em ..., Alemanha, à empresa B... B.V. em ..., Países Baixos. Estas duas empresas possuem os mesmos proprietários e a sua administração localiza-se em ..., Alemanha;

-           Possuía, em 27-02-2023, 3.675 Kms percorridos, de acordo com o histórico de manutenção, emitido pelo representante da marca Ferrari;

-           No âmbito do seu carregamento no camião que o transportou para Portugal, foi elaborada uma ficha de controlo onde são indicadas as condições do veículo, bem como os documentos e acessórios que o acompanharam. Nesse documento consta que o conta-quilómetros do veículo ostentava, em 23-03-2023, quando foi carregado, 3.684 Kms percorridos.

Resultou também da informação transmitida pelas autoridades neerlandesas que, de acordo com o responsável pela venda do veículo nos Países Baixos, o titular da DAV pediu para colocar, na fatura, 6.150 Km, porque senão iria ter problemas com a homologação em Portugal.

Resultou, ainda, da documentação recebida, que o veículo foi transportado para Portugal num camião. No entanto, foi-lhe atribuída, na Alemanha, uma matrícula provisória que, com o seguro que lhe está associado, permitiu, ao referido veículo, circular durante o período compreendido entre 17-03-2023 e 15-04-2023. Ou seja, esse veículo estava em condições legais de poder circular durante aquele período e poder ter perfeitamente percorrido, após a sua chegada ao território nacional e antes de 31-03-2023, data em que foi sujeito à inspeção técnica para atribuição da matrícula portuguesa, 2.482Km, número que resulta da diferença entre os quilómetros ostentados na referida inspeção (6.166) e em 23-03-2023, quando foi carregado no camião que o transportou com destino a Portugal (3.684); (cfr.PA-PI).

o) Em 27-09-2023 o Requerente foi notificado do Projeto de Relatório Inspetivo n.º OI2023... para o exercício do direito de audição prévia em 12-10-2023, através de e-mail remetido à Alfândega pelo mandatário do Requerente; (Cfr. PA-RI).

p) Analisadas as alegações proferidas em sede de audição prévia pelo Requerente, a AT referiu o seguinte:

 

 

 

q) No âmbito da ação inspetiva a AT concluiu como se segue:

 

r) O Requerente foi notificado para pagar o montante de € 128.460,86 constante do registo de liquidação n.º 2023/..., de 20-11-2023; (cfr.PA-RI)

s) O Requerente pagou o montante liquidado em 27-11-2023; (cfr. documento n.º 2-A junto com o PPA)

t) Em 15-01-2024 conforme consta do sistema de gestão processual, o Requerente submeteu junto do CAAD o presente pedido de pronúncia arbitral, requerendo a declaração da ilegalidade da liquidação.

 

B. Factos não Provados

Com relevo para a decisão da causa em face das alegações das partes, o Tribunal julga como não provada a seguinte factualidade:

a) No primeiro contacto com um representante da empresa alemã F..., o Requerente informou a vendedora que estaria interessado na aquisição a viatura, mas só a poderia concretizar se a mesma, à data da compra, tivesse uma quilometragem superior a 6.000 Km.

b) Em 21.03.2023, à data da aquisição do veículo, o seu odómetro registava a quilometragem de 6.150 km.

 

C. Motivação da Decisão da Matéria de Facto

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

A matéria de facto foi fixada por este Tribunal e a sua convicção relativamente à matéria de facto resultou da análise crítica dos documentos e informações constantes dos autos, do processo administrativo apenso, bem assim como da posição assumida pelas partes nas respetivas peças processuais.

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC. Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 317.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas Partes e a prova documental junta aos autos, consideram-se provados com relevo para esta decisão arbitral, os factos acima elencados.

Quanto aos factos dados como não provados tal resulta inequivocamente da falta de prova idónea por parte do Requerente, sem prejuízo da prova efetuada pela Requerida, nomeadamente, a que resulta das informações prestadas pelas autoridades neerlandesas no âmbito da assistência mútua.

Não se deram como provados nem não provadas alegações feitas pelas partes e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insuscetíveis de prova e cuja validade terá de ser aferida em relação à concreta matéria de facto consolidada.

 

VI. Do Mérito.

Fundamentação de Direito

Apreciando agora, em atenção ao thema decidendum acima descrito, os argumentos trazidos aos autos centram-se no ónus da prova dos factos alegados, no valor probatório dos documentos juntos, nomeadamente das informações transmitidas pelas autoridades neerlandesas.

 

A. Sobre a questão do ónus da prova

Resulta do artigo 74.º n.º 1 da LGT que: "o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.", em consonância com o artigo 342.º n.º 1 do CC, "Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.”

Por força do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, no procedimento de liquidação da iniciativa da Administração Tributária, esta terá de demonstrar a ocorrência dos factos de que deriva o direito à liquidação (os factos, pressupostos da sua existência, qualificação e quantificação do facto tributário) e o sujeito passivo terá de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito.

 

Sobre a questão do ónus da prova, a nossa doutrina e jurisprudência são unânimes no sentido de que cabe à AT o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais legitimadores da sua atuação e, em contrapartida, cabe ao Contribuinte apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato impugnado.

Neste sentido atente-se na jurisprudência dos tribunais superiores, nomeadamente Acórdãos do STA de 26.02.2014, no Processo n.º 0951/11, Tribunal Central Administrativo Norte de 11.01.2024, Processo n.º 02799/09.0BEPRT, bem como nas decisões arbitrais proferidas nos processos 64/2018-T, de 22 de agosto, 48/2022-T, de 10-07-2022, e 182/2022-T, de 25-05-2023.

No âmbito da jurisprudência, com relevo para a presente decisão arbitral, foi decidido no Processo 236/2014-T de 4 de maio de 2015, o seguinte:

Em consequência, cabe à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos legitimadores da sua actuação, para o que deve provar os factos constitutivos de que legalmente depende a decisão administrativo-tributária com certo conteúdo e com certo sentido. Pelo seu lado, cabe ao contribuinte provar os factos que operam como suporte das pretensões e direitos que invoca...” (…) “Como tal, em conformidade com o disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT, cabe à Requerente a demonstração das bases e situações fácticas em que se sustentam os ajustamentos, desconhecimentos e regularizações que, por ela, foram promovidos e cuja relevância e consistência tributárias afirma, recaindo, pois, sobre a Requerente o ónus de esclarecer, comprovar e documentar as operações em causa e sua justificação.

(…) Nesta sequência, deve, ainda, assinalar-se que resulta do artigo 75.º, n.º 1 da LGT que as declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, se presumem verdadeiras. Porém, esta presunção cessa nomeadamente se essas declarações, contabilidade ou escrita, ou os respectivos dados de suporte, apresentarem omissões, erros e inexactidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (art. 75.º, n.º 2, al. a) da LGT). Recorde-se ainda que, nos termos do n.º 3 do art. 75.º da LGT, “[a] força probatória dos dados informáticos dos contribuintes depende, salvo o disposto em lei especial, do fornecimento da documentação relativa à sua análise, programação e execução e da possibilidade de a administração tributária os confirmar”. (…) Ora, sempre que se aplique a al. a) do n.º 2 do art. 75.º da LGT, “será sobre o contribuinte que recai o ónus de prova dos factos declarados ou inscritos na sua contabilidade ou escrita sobre que existam dúvidas probatórias”, pelo que “as dúvidas que no processo judicial subsistam sobre a matéria de facto, não podem considerar-se dúvidas fundadas” para os efeitos do n.º 1 do art. 100.º do CPPT (vd. assim Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, vol. II, 6ª ed, 2011, p. 133).”

 

Efetivamente vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da presunção da verdade declarativa e de boa-fé dos Contribuintes, com base no estipulado no artigo 75.º da LGT, o qual estabelece:

“Presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos.”

Sendo que o afastamento da presunção ocorre quando:

“as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável” (artigo 75.º n.º 2 alínea a) da LGT).

 

Com base no princípio da verdade declarativa a AT está vinculada a liquidar os impostos com base na declaração do Contribuinte, sem prejuízo do direito de proceder, posteriormente, ao controlo dos factos declarados.

Efetivamente, tomando como boa a DAV apresentada pelo Requerente na Alfândega do Freixieiro, na qual foi declarado que o veículo ostentava 6.166 kms percorridos, o veículo foi considerado meio de transporte usado, pelo que, a AT não liquidou o IVA.

Sucede que, consultado o sítio da internet da empresa vendedora, que anunciava a venda de um veículo igual/idêntico ao adquirido pelo Requerente, suscitaram-se duvidas quanto à quilometragem declarada, tendo a AT efetuado um pedido de cooperação administrativa junto das autoridades tributárias e aduaneiras neerlandesas.

 

Em resultado da ação de fiscalização efetuada pelas autoridades neerlendesas resulta que:

(i) de acordo com o histórico de manutenção, em 27/02/2023, o veículo tinha percorridos 3.700 Km;

(ii) o veículo foi sujeito a matrícula provisória na Alemanha e foi emitido um certificado de seguro do veículo, que lhe permitiu circular durante o período compreendido entre 17-03-2023 e 15-04-2023;

(iii) na ficha de controlo preenchida aquando do carregamento do veículo, em 23-03-2023, consta que o veículo ostentava 3.684 kms percorridos; (iv) o responsável pela venda do veículo declarou que à data da venda a quilometragem do veículo era de 3.675 kms e que só não colocou a quilometragem real do veículo a pedido do comprador, porque senão teria problemas com a homologação em Portugal;

(iv) na fatura emitida em 21-03-2023 pela vendedora consta que o veículo foi vendido com a quilometragem de € 6.150 kms.

Ou seja, a AT demonstrou indícios sérios de que o veículo em causa não teria percorrido os 6.166 Km aquando da sua transmissão para o adquirente (e aqui Requerente), caindo assim a presunção de veracidade da declaração (DAV) do Requerente.

 

Já o Requerente não logrou demonstrar que estabeleceu como condição essencial para adquirir o veículo, que o mesmo, à data da venda tivesse percorrido 6.000 km, e face à prova documental junta, (pelo Requerente e pela AT) o único documento que poderia comprovar tal facto era a fatura emitida pela empresa que vendeu o veículo, datada de 21-03-2024, facto contrariado pelas declarações do representante desta empresa e pela ficha de controlo preenchida quando o veículo foi carregado no camião que fez o transporte da Alemanha para Portugal, na qual consta que o veículo ostentava 3.684 km, datada de 23-03.2024.

Na linha do que foi dito, pela sua identidade com o objeto dos presentes autos, convoca-se a decisão arbitral proferida no Processo n.º 48/2022-T, de 07-10-2022:

“(…) Cai assim a presunção de veracidade das declarações do Requerente constante do artigo 75.º da LGT e, perante a prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária cabia ao Requerente, nos termos do artigo 74.º da LGT, a contraprova de que o veículo em questão apenas foi introduzido em Portugal com vista à sua introdução no consumo em julho de 2021 com a quilometragem de 6.261 e ser tratado como isento de IVA.(…)”

Assim sendo, cai a presunção de veracidade das declarações do Requerente e, nesta medida cabia ao Requerente o ónus de esclarecer, comprovar e documentar a operação em causa, inclusive demonstrar e justificar a sua relevância e consistência tributárias, com recurso a meios de prova documental e complementá-los com prova testemunhal.

 

B. Valor probatório das informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras

Relativamente ao valor probatório das informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras prevê o n.º 1 e 4 do artigo 76.º da LGT:

1 - As informações prestadas pela inspeção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, nos termos da lei.

(…)

4 - São abrangidas pelo n.º 1 as informações prestadas pelas administrações tributárias estrangeiras ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua a que o Estado Português esteja vinculado, sem prejuízo da prova em contrário do sujeito passivo ou interessado.”

Como escreve LOPES DE SOUSA, Jorge, in Código do Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Volume II, 6.ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 260:

“7 - Informações de administrações tributárias estrangeiras

No n.º 4 do art. 76.º da LGT estende-se o valor probatório reconhecido às informações oficiais produzidas pela administração tributária portuguesa às fornecidas por administrações tributárias estrangeiras, ao abrigo de convenções internacionais de assistência mútua.

Este reconhecimento de valor probatório deve ser reconhecido também no processo judicial pois as garantias de correspondência das informações com a realidade que podem justificar que se lhes atribua esta força probatória no procedimento tributário não deixam de valer também no processo de impugnação judicial.

Na parte final daquele n.º 4 do art. 76.º, refere-se que não fica prejudicada a possibilidade de prova em contrário por parte do sujeito passivo ou interessado.

Pelo que atrás se disse, para contrariar a força probatória das informações oficiais fornecidas pela administração tributária portuguesa, não é necessário fazer a prova do contrário, pois a lei não lhes atribui força probatória plena, bastando gerar dúvidas fundadas sobre os factos nelas afirmados, como resulta do preceituado no art. 346.º do CC.

Sendo esta a força probatória atribuída às informações oficiais produzidas pela administração tributária portuguesa, será de reconhecer a mesma às informações das administrações tributárias estrangeiras, já que seria incompreensível que se atribuísse maior força probatória a estas que àquelas.

Por isso, deverá entender-se o referido n.º 4 com o sentido de que a atribuição de força probatória às informações de administrações tributárias estrangeiras não prejudica a possibilidade de prova em contrário nem a de gerar dúvidas sobre os factos nelas afirmados, como meios de contrariar a sua força probatória.”

Também a jurisprudência sufraga o entendimento acima vertido, referindo-se o Acórdão do TCAN, de 28-02-201, no processo 7/03.9BEMDL, cujo sumário se transcreve:

“I – As informações prestadas pela Administração Tributária Holandesa ao abrigo de convenção internacional de assistência mútua a que o Estado Português está vinculado fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objetivos, nos termos da lei, sem prejuízo da prova em contrário do sujeito passivo ou interessado.

II - Para contrariar a força probatória das informações oficiais fornecidas pela administração tributária portuguesa, não é necessário fazer a prova do contrário, pois a lei não lhes atribui força probatória plena, bastando gerar dúvidas fundadas sobre os factos nelas afirmados, como resulta do preceituado no art. 346.º do CC.

III – Não tendo o Recorrido cumprido o ónus da prova dos factos suscetíveis de gerar dúvidas fundadas sobre os factos afirmados nas informações oficiais fornecidas pela Autoridade Tributária Holandesa, contra o mesmo deve ser decidida a impugnação.”

 

A propósito deste tema, referem LEITE DE CAMPOS, Diogo; SILVA RODRIGUES, Benjamim; LOPES DE SOUSA, Jorge, in Lei Geral Tributária, Anotada e Comentada, 4.ª Edição 2012, pág. 670 e 671:

Relativamente a factos a (…) força probatória (das informações oficiais) existe quanto aos afirmados como sendo praticados pela administração tributária ou com base na perceção dos seus órgãos ou agentes, ou factos determinados a partir dessa perceção com base em critérios objetivos.

No que concerne aos factos afirmados com base em juízos formulados pela administração tributária a partir dos factos materiais apurados que não sejam determinados com base em critérios objetivos não existe aquela especial força probatória, valendo as informações como elementos sujeitos à livre apreciação da entidade competente para a decisão. (…)”

Na verdade, o facto controvertido e determinante para o desfecho da presente ação, consiste na determinação do número de quilómetros percorridos pelo veículo à data da sua transmissão para o Requerente.

Ora, não só as autoridades fiscais dos Países Baixos (no âmbito da cooperação administrativa) dizem que o vendedor da B... afirmou que o Requerente terá pedido para colocar na fatura 6.150 Km percorridos, e que esta (B...) não conduziu qualquer km com o veículo após 27.2.2023, como a ficha de controlo para transporte do veículo para Portugal diz que o mesmo saiu da Alemanha com 3.684Km.

A prova recolhida pela AT permite constatar que o veículo saiu da Alemanha com 3.684 Km, quando já era propriedade do Requerente, tendo percorrido cerca de 2.484 Km (diferença entre 6.166 km e os 3684 Km) entre 24.03.2023 e 31.03.2023, ou seja, após a viatura chegar a Portugal até à data da inspeção técnica para atribuição da matrícula.

Posta em causa a veracidade da fatura emitida pela vendedora do veículo, mero documento particular, bem como as alegadas condições em que foi celebrada a compra e venda do veículo, competia ao Requerente provar a sua autenticidade, não o tendo feito, a mesma constitui um meio de prova livremente apreciado pelo julgador.

E, na verdade, os 2.482 Km de diferença (6.166 Km – 3684 KM) podem ter sido percorridos (com a matrícula provisória alemã e o seguro válido) após a chegada da viatura a Portugal em 24-3-2023 e até 31-03-2023, ou seja, até à data da inspeção técnica para atribuição de matrícula, sendo que, nesse momento, já a viatura era propriedade do Requerente. 

Por seu turno, o Requerente não logrou fazer prova, como lhe competia, de que os 2.484 km de diferença foram percorridos entre a data do pagamento do sinal 28-02-2024 e a data transmissão a propriedade do veículo que ocorreu em 21-03-2024, ou seja, o Requerente não cumpriu o ónus da prova dos factos suscetíveis de gerar dúvidas fundadas sobre os factos afirmados pela Administração Tributária Neerlandesa, não contrariado assim a força probatória das informações oficiais fornecidas por esta ao abrigo da Convenção Internacional sobre Assistência Mútua em Matéria Fiscal a que o Estado Português está vinculado.

 

Atendendo a tudo quanto acima se expendeu, o Tribunal entende que à data da transmissão da propriedade do veículo para o Requerente este tinha menos de 6.000 Km.

 

  1. Regime de tributação do IVA aplicável a veículos adquiridos num Estado Membro e expedidos para Portugal

Nos termos da subalínea ii) da alínea b) do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva IVA (Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado), estão sujeitas ao IVA as “(…) aquisições intracomunitárias de bens efetuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro”, “quando se trate de meios de transporte novos, por um sujeito passivo ou por uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, cujas outras aquisições não estejam sujeitas ao IVA por força do disposto no n.º 1 do artigo 3.º, ou por qualquer outra pessoa que não seja sujeito passivo”.

O n.º 2 do mesmo artigo tem a seguinte redação:

a) Para efeitos da subalínea ii) da alínea b) do n.º 1, entende-se por «meios de transporte» os meios de transporte a seguir enumerados, destinados ao transporte de pessoas ou de mercadorias:

i) Os veículos terrestres a motor com cilindrada superior a 48 centímetros cúbicos ou potência superior a 7,2 quilowatts;

ii) (…);

iii) (…).

b) Estes meios de transporte são considerados «novos» nos seguintes casos:

i) Relativamente aos veículos terrestres a motor, quando a entrega for efetuada no prazo de seis meses após a primeira entrada em serviço ou o veículo tiver percorrido um máximo de 6 000 quilómetros;

ii) (…);

iii) (…).

c) Os Estados-Membros estabelecem as condições em que podem considerar-se verificados os dados referidos na alínea b)”.

De harmonia com o disposto no artigo 68.º da Diretiva IVA, “(…) facto gerador do imposto ocorre no momento em que é efetuada a aquisição intracomunitária de bens”, considerando que “(…) a aquisição intracomunitária de bens é efetuada no momento em que se considera efetuada a entrega de bens similares no território do Estado-Membro”.

Transpondo para o direito nacional, o regime particular de tributação em sede do IVA para as operações relativas a meios de transporte novos, o artigo 6.º do RITI estatui que:

1 - Para efeitos deste diploma, entende-se por:

a) (…);

b) «Meios de transporte» as embarcações com comprimento superior a 7,5 m, as aeronaves com peso total na descolagem superior a 1550 kg e os veículos terrestres a motor com cilindrada superior a 48 cc ou potência superior a 7,2 kW, destinados ao transporte de pessoas ou de mercadorias, que sejam sujeitos a registo, licença ou matrícula no território nacional, com exceção das embarcações e aeronaves mencionados nas alíneas d), e) e g) do n.º 1 do artigo 14.º do Código do IVA.

2 - Não são considerados novos os meios de transporte mencionados na alínea b) do número anterior desde que se verifiquem simultaneamente as seguintes condições:

a) A transmissão seja efetuada mais de três ou seis meses após a data da primeira utilização, tratando-se, respetivamente, de embarcações e aeronaves ou de veículos terrestres;

b) O meio de transporte tenha percorrido mais de 6000 km, tratando-se de um veículo terrestre, navegado mais de cem horas, tratando-se de uma embarcação, ou voado mais de quarenta horas, tratando-se de uma aeronave.

3 - Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, a data da primeira utilização é a constante do título de registo de propriedade ou documento equivalente quando se trate de bens sujeitos a registo, licença ou matrícula, ou, na sua falta, a da fatura emitida aquando da aquisição pelo primeiro proprietário”.

De acordo com o preceituado no n.º 1 do artigo 12.º do RITI “nas aquisições intracomunitárias de bens, o imposto é devido no momento em que os bens são colocados à disposição do adquirente, sendo aplicável, em idênticas condições, o previsto no artigo 7.º do Código do IVA para as transmissões de bens”.

Ora, nos termos da alínea b) do artigo 1.º do RITI, estão sujeitas a IVA “as aquisições intracomunitárias de meios de transporte novos efetuados no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo, ainda que se encontre abrangido pelo disposto no n.º 1 do artigo 5.º, ou por um particular”.

Pretendeu-se assegurar com este regime que a tributação do meio de transporte novo no Estado-Membro de destino e, para o efeito, houve que qualificar os sujeitos passivos que efetuam transmissões e aquisições intracomunitárias de meios de transporte novos como sujeitos passivos, tal como resulta do artº.2, nº.2, do R.I.T.I..[2]

Conforme anotações de António Carlos dos Santos (in Código do IVA e RITI, Notas e Comentários, Coordenação e Organização: Clotilde Celorico Palma e António Carlos dos Santos, 2014, p. 548):

As AIB (aquisições intracomunitárias de bens) que sejam considerados como MTN (meios de transporte novos) quando efetuadas por um sujeito passivo com direito à dedução são tributadas no destino por aplicação do regime geral. Aqui prevê-se um regime especial de tributação da aquisição de MTN efetuada em outro EM por um particular (pessoa singular ou coletiva residente em Portugal), por um sujeito passivo sem direito à dedução (por aplicação dos arts. em 9º ou 53° do CIVA) ou pelo Estado e demais pessoas coletivas de direito público que realizem operações no exercício dos seus poderes de autoridade. Sendo a aquisição de MTN efetuada noutro EM com destino a Portugal por estas entidades (particulares ou equiparadas a consumidores finais), ela deveria, segundo as regras gerais das AIB, ser tributada na origem. No entanto, como os MTN são bens de elevado preço e de fácil deslocalização, foi instituído um regime especial, comum aos vários EM, de tributação no destino, também nestes casos. Este regime especial tem por objetivo evitar ou limitar desvios de procura e riscos de distorção de concorrência proporcionados por um défice de harmonização das taxas do IVA e pela existência de regimes não harmonizados de impostos sobre os veículos. (…)”.

Assim, se no momento em que ocorrer a transmissão, e esta dá-se no momento em que a propriedade do veículo se transfere para o adquirente[3], e que nos presentes autos está incontornavelmente demonstrado ter ocorrido em 21-03-2023, o veículo não reunia as duas condições referidas no n.º 2 do artigo 6.º do RITI e no n.º 2 do artigo 2.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho de 28 de dezembro o veículo é considerado novo e, consequentemente, tributado no Estado-Membro de destino a titulo da aquisição intracomunitária, na aceção do artigo 20.º da Diretiva 2006/112/CE do Conselho de 28 de dezembro, independentemente do estatuto e qualidade do transmitente e/ou do adquirente do veículo.

Nos presentes autos, face às regras sobre o ónus da prova acima enunciadas, à prova produzida, bem como ao princípio da livre apreciação da prova é convicção do Tribunal que o veículo adquirido pelo Requerente era um meio de transporte novo ao abrigo do artigo 6.º do RITI, uma vez que não tinha percorrido mais de 6.000 km na data da sua transmissão, estando assim sujeito ao pagamento do IVA na Alfândega, nos termos do previsto na alínea b) do artigo 1.º e n.º 3 do artigo 22.º do mesmo diploma.

 

Atendendo a tudo quanto acima fica expendido decide-se pela improcedência do pedido formulado pelo Requerente.

 

VII. Decisão

 

Pelo exposto decide-se:

a) julgar improcedentes os pedidos formulados pelo Requerente e absolver a Requerida de todos os pedidos, tudo com as devidas e legais consequências;

b) Condenar o Requerente no pagamento das custas do processo.

 

VIII. Valor do Processo

Fixa-se, em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, no artigo 97.º-A, n.º 1, al. a), e n.º 3 do Código de Procedimento e Processo Tributário, aplicáveis por força das alíneas a), c) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT, o valor do processo em € 128.460,86 (cento e vinte e oito mil quatrocentos e sessenta euros e oitenta e seis cêntimos), que constitui a importância do imposto objeto de impugnação nas liquidações sindicadas.

 

IX. CUSTAS

De harmonia com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e nos artigos 3.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 e 4.º, n.º 5 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 3.060,00 (três mil e sessenta euros), nos termos da Tabela I do mencionado Regulamento, a cargo do Requerente.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 24 de setembro de 2024

 

Os Árbitros

 

___________

(Regina de Almeida Monteiro - Presidente)

 

 

___________________

(Fernando Marques Simões - Adjunto)

 

 

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(Cristina Coisinha – Adjunta e Relatora)

 



[1] A morada indicada nas procurações forenses juntas aos autos coincide com a referida no PPA e acima indicada. Não obstante, nos documentos juntos ao PPA, entre outros, na Declaração Aduaneira do Veículo, n.º 2023/..., de 5.4.2023, ali junta como doc. n.º 1, consta como morada do Requerente a seguinte: Rua ... n.º ..., ...-... Porto, Portugal. Notando-se, assim, uma evidente divergência em relação às moradas indicadas pelo Requerente como sendo a da sua residência.  

[2] Neste sentido veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 24-04-2012, no processo n.º 04446/11

[3] Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º do Código do IVA, conjugada com o artigo 3.º do mesmo Código, resulta que estão sujeitas a IVA as transmissões de bens, considerando-se, como tal, por via de regra, a transferência onerosa de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade.