Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 67/2024-T
Data da decisão: 2024-09-16  IRC  
Valor do pedido: € 148.015,56
Tema: IRC. Variações patrimoniais positivas. Coberturas de prejuízos. Regularizações Contabilísticas. Ónus da Prova.
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SUMÁRIO

  1. Os incrementos patrimoniais que não se encontrem reflectidos num resultado de exercício e cuja sustentação não seja subsumível a nenhuma das excepções do artigo 21º, 1 do Código do IRC são tributados enquanto variações patrimoniais positivas.
  2. A excepção do artigo 21º, 1, a) do Código do IRC admite uma grande amplitude de formas de cobertura de prejuízos, quando realizadas por iniciativa dos sócios.
  3. As prestações suplementares têm de ser efectivadas em dinheiro; e esse seu traço distintivo torna imprescindível a prova da materialidade dessa efectivação: prova da entrada desse dinheiro nas contas bancárias exclusivamente afectas à actividade empresarial.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – Relatório

 

  1. A... Lda., com o NIF..., doravante “a Requerente”, apresentou, no dia 14 de Janeiro de 2024, um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, nos termos dos artigos 2º, 1, a), e 10º, 1 e 2 do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, com as alterações por último introduzidas pela Lei nº 7/2021, de 26 de Fevereiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), e dos arts. 1º e 2º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”).
  2. A Requerente pediu a pronúncia arbitral sobre a ilegalidade da liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2019 – liquidação nº 2023..., com a correspondente demonstração de acerto de contas, documento nº 2023..., de 2023-08-29; peticionando a restituição do imposto indevidamente suportado, e demais efeitos legais.
  3. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT.
  4. O Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação (ocorreu mais tarde a substituição de um dos Árbitros Vogais).
  5. As partes não se opuseram, para efeitos dos termos conjugados dos arts. 11º, 1, b) e c), e 8º do RJAT, e arts. 6º e 7º do Código Deontológico do CAAD.
  6. O Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 22 de Março de 2024; foi-o regularmente, e é materialmente competente.
  7. Por Despacho de 27 de Março de 2024, foi a AT notificada para, nos termos do art. 17º do RJAT, apresentar resposta.
  8. Já depois de constituído o Tribunal Arbitral Colectivo, foi proferido pela Subdirectora-Geral da Área de Gestão Tributária do IR o Despacho datado de 1 de Abril de 2024, a determinar a revogação parcial do acto impugnado, com reflexo nas correcções à matéria colectável, especificamente: a) a anulação parcial da correcção referente à variação patrimonial positiva, no montante de €3.399,70; b) a manutenção da correcção fiscal respeitante à variação patrimonial positiva, no montante de €740.000,00.
  9. A AT apresentou a sua Resposta em 2 de Maio de 2024.
  10. Por Despacho de 7 de Maio de 2024, foi dispensada a realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT, e convidadas as partes a apresentar alegações escritas.
  11. A Requerente apresentou alegações em 16 de Maio de 2024.
  12. A Requerida apresentou alegações em 29 de Maio de 2024.
  13. As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, e têm legitimidade.
  14. A AT procedeu à designação dos seus representantes nos autos e a Requerente juntou procuração, encontrando-se assim as Partes devidamente representadas.
  15. O processo não enferma de nulidades.

 

II – Matéria de Facto

 

II. A. Factos provados

 

Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

  1. A Requerente é uma sociedade por quotas, uma microempresa no sector agropecuário (CAE Principal 01500), com 3 sócios e 3 trabalhadores. Está sujeita a IRC desde início de 2009, e possui contabilidade organizada, em conformidade com o art. 123º do CIRC.
  2. Em Assembleia Geral de 27 de Setembro de 2019, os sócios da Requerente deliberaram por unanimidade no sentido de que “os valores de que o sócio B... era credor, no montante de 800.000 euros, fossem transferidos para prestações suplementares de capital, para regularização dos prejuízos acumulados”.
  3. Tratava-se de reduzir o passivo total, seja a dívida por financiamentos, sejam outros passivos correntes, e simultaneamente aumentar os capitais próprios, que eram negativos no início do exercício de 2019.
  4. Na sequência, a Requerente registou contabilisticamente, em 30 de Setembro de 2019, o lançamento da constituição das prestações suplementares de capital, por transferência dos débitos que tinha ao seu sócio (a conta SNC 25321 – Suprimentos, no valor de €300.000,00, e a conta SNC 27803, no montante de €500.000,00), e procedeu à transferência das referidas prestações suplementares (por débito da conta SNC 5311 no valor de €800.000,00) para a conta de resultados transitados, perdendo o sócio o direito ao reembolso das prestações suplementares.
  5. A Requerente procedeu, posteriormente, à transferência parcial das referidas prestações suplementares para a conta de resultados transitados (através do crédito das contas 561 e 562, respectivamente, pelos montantes de €23.054,95 e €716.945,00) e à regularização de inventários (através do lançamento a crédito na conta 33.1 no valor de €644.996,01, por contrapartida do débito da conta de resultados transitados, conta 562, no valor de €644.996,01).
  6. Quanto ao capital próprio:

 

  1. Quanto ao passivo:

 

  1. Quanto ao apuramento do Custo das Mercadorias Vendidas e das Matérias Consumidas (CMV), destacando-se, pelo montante, a rubrica de reclassificação e regularização de inventários:

 

  1. Foi realizada, a partir de 18 de Novembro de 2022, uma Inspecção Tributária à Requerente, relativa ao exercício de 2019 (Ordem de Serviço Interna nº OI2022...), na qual se concluiu que a operação de Setembro desse ano configurava uma variação patrimonial positiva sujeita a IRC, por se enquadrar no art. 21º, 1, do CIRC – do que resultou a liquidação adicional de IRC no valor de €148.015,56, sem recurso a avaliação indirecta, por acrescer ao resultado tributável o montante de €743.399,70, alterando o prejuízo fiscal declarado de €19.210,72, para um resultado tributável de €724.188,98:

 

  1. A ora Requerente não exerceu o seu direito de audição no seio do procedimento de Inspecção Tributária, não obstante ter sido notificada para o efeito em 18 de Março de 2023..
  2. No dia 14 de Janeiro de 2024 a Requerente apresentou o pedido de pronúncia que deu origem ao presente processo.
  3. Para efeitos do disposto no art. 13º do RJAT, mas já depois de constituído o Tribunal Arbitral Colectivo, foi proferido pela Subdirectora-Geral da Área de Gestão Tributária do IR o Despacho datado de 1 de Abril de 2024, a determinar a revogação parcial do acto impugnado, com reflexo nas correcções à matéria colectável, especificamente: a) A anulação parcial da correcção referente à variação patrimonial positiva, no montante de €3.399,70, em resultado do lapso na quantificação efectuada no RIT, porquanto o valor do crédito detido pelo sócio, que foi anulado (lançamento a crédito conta 56 por débito da conta 53) e veio a ser utilizado para suportar a supressão injustificada de activos da empresa, ascende ao montante de €740.000.00, e não a €743.399,70; b) Manutenção da correcção fiscal respeitante à variação patrimonial positiva, no montante de €740.000,00.

 

II. B. Factos não-provados

 

Com relevância para a questão a decidir, ficou por provar, para efeitos do disposto no art. 63º-C da LGT, o ingresso de dinheiro nas contas bancárias da Requerente que correspondesse exactamente à efectivação das prestações suplementares de capital, em cumprimento do disposto no art. 210º do CSC, por transferência efectiva para os cofres da Sociedade dos débitos para com o seu sócio, apesar de tal prova ter sido solicitada, no âmbito da Inspecção Tributária, por email de 10 de Fevereiro de 2023 dirigido ao contabilista certificado da Requerente:

 

 

II. C. Fundamentação da matéria de facto

 

  1. Os factos elencados supra foram dados como provados com base nas posições assumidas pelas partes nos presentes autos e nos documentos juntos ao PPA.
  2. Cabe ao Tribunal Arbitral seleccionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica, considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. art. 123º, 2, do CPPT e arts. 596º, 1 e 607º, 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi art. 29º, 1, a) e e) do RJAT), abrangendo os seus poderes de cognição factos instrumentais e factos que sejam complemento ou concretização dos que as Partes alegaram (cfr. arts. 13.º do CPPT, 99º da LGT, 90º do CPTA e arts. 5º, 2 e 411.º do CPC).
  3. Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação aos factos alegados pelas partes, na sua íntima e prudente convicção formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. art. 16º, e) do RJAT, e art. 607º, 4, do CPC, aplicável ex vi art. 29º, 1, e) do RJAT).
  4. Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (por exemplo, quanto aos documentos autênticos, por força do artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação das provas produzidas, o referido princípio da livre apreciação (cfr. art. 607º, 5 do CPC, ex vi art. 29º, 1, e) do RJAT).
  5. Além disso, não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada, nem os factos incompatíveis ou contrários aos dados como provados.
  6. Relativamente aos factos não-provados, há que ter em conta que a Requerente sustenta que o que foi deliberado e executado em Setembro de 2019 foram prestações suplementares: só que estas, a terem existido, têm necessariamente de efectivar-se em dinheiro, nos termos do art. 210º, 2 do CSC. Pelo que a prova de tal efectivação é indispensável.

 

III. Sobre o Mérito da Causa

 

III. A. Posição da Requerente

 

  1. A Requerente contesta a fundamentação do RIT, assente no argumento de que a conversão do crédito do sócio em prestações suplementares de capital não terá consistido numa verdadeira operação de cobertura de prejuízos e de aumento dos capitais próprios – alegando que essas conclusões não se encontram devidamente fundamentadas, nem o estão os valores calculados para a liquidação adicional, o que constituiria, por si mesmo, falta de fundamentação do acto tributário.
  2. A Requerente contrapõe que está feita a prova de que estamos perante uma cobertura de prejuízos acumulados, na acepção do disposto no art. 21º, 1, a) do CIRC, e que, portanto, se trata de uma variação patrimonial positiva excepcionada do regime geral do nº 1 do art. 21º do CIRC; e isto por estarem comprovadas as operações que determinam que aquela variação patrimonial positiva não concorra para a formação do lucro tributável.
  3. Sustenta ainda a Requerente que é porque, no início do exercício de 2019, o seu capital próprio era negativo que se impunha (nos termos do art. 35º do CSC, que determina que seja efectuado o saneamento financeiro da sociedade) a convocação da Assembleia Geral, como a que reuniu em 27 de Setembro de 2019, para deliberação da realização, pelos sócios, de entradas para reforço da cobertura do capital – equiparada a entradas / aumentos de capital ex vi art. 21º, 1, a) do CIRC.
  4. A Requerente destaca a expressão “a qualquer título” usada no art. 21º, 1, a) do CIRC – expressão que, no seu entender, evidencia a amplitude pretendida pelo legislador, no sentido de incluir na previsão normativa, todas as coberturas de prejuízos, independentemente da sua natureza, desde que efectuadas pelos detentores do capital, incluindo, entre elas os perdões de dívida, como aquele que terá ocorrido em Setembro de 2019.
  5. Por isso, a Requerente acha ilegal que se pretenda tributar em IRC a cobertura de prejuízos através da conversão, em prestações suplementares, de créditos de um seu sócio – porque uma tal operação se subsume perfeitamente ao disposto no art. 21º, 1, a) do CIRC.
  6. Invoca em seu apoio algumas decisões arbitrais que explicitamente equiparam a realização, pelos sócios, de entradas para reforço do capital, determinadas pelo art. 35º do CSC, às entradas de capital que, por não influenciarem o resultado líquido do exercício, se subsumem à alínea a) do nº 1 do art. 21º do CIRC.
  7. Em alegações, a Requerente manifesta a sua indignação perante uma situação da qual pode resultar aquilo que, nos seus cálculos, é o pagamento de um imposto que tem um valor 12 vezes superior ao valor da facturação do exercício, e superior ao total de facturação dos últimos 10 anos da empresa – e que, portanto, conclui, nada tem a ver com a capacidade contributiva do sujeito passivo, ou o seu rendimento real.
  8. Reitera que se tratou de uma cobertura de prejuízos (decomposta em perda total do capital social, seguida de conversão do crédito do sócio em prestações suplementares, da transferência para resultados transitados e da anulação do crédito do sócio sobre a sociedade), prevista, “a qualquer título”, no art. 21º, 1, a) do CIRC.
  9. Nega que se tenha visado a regularização de inventários – tendo sido visada, antes, a anulação da dívida da empresa para com o sócio – o que acarretou uma variação patrimonial positiva que claramente não contribuiu para a formação do lucro tributável.
  10. Acrescenta que a regularização de inventários é posterior à anulação da dívida da sociedade ao sócio, e que ela não teve qualquer relevância para a matéria de IRC.

 

III. B. Posição da Requerida

 

  1. Na sua resposta, a Requerida sublinha o facto de estarem em causa prestações suplementares, e não suprimentos ou prestações acessórias – o que implica que as prestações suplementares se efectivem em dinheiro, nos termos do art. 210º, 2 do CSC, e não noutra qualquer outra coisa fungível, como pode suceder nas prestações acessórias e nos suprimentos (arts. 209º, 2 e 243º, 1 do CSC), visto que as prestações suplementares não configuram empréstimos dos sócios à sociedade nem constituem elementos do passivo, antes passam a ser elementos integrantes do capital.
  2. Daí retira a Requerida o argumento da necessidade de especial cuidado na indagação da legalidade da operação de conversão de suprimentos em prestações suplementares, sob pena de confusão entre estas e meros suprimentos, ou meras prestações acessórias em dinheiro: pelo que, no seu entender, os suprimentos que sejam convertidos em prestações suplementares deverão ter natureza pecuniária originária, com adequada documentação de suporte, tal como a existência de documentos que titulem as entradas dos respectivos valores monetários, a fim de a AT conhecer a efectiva natureza dos valores em causa.
  3. Ora, no entender da Requerida, a não-disponibilização durante a IT, e a não-junção aos presentes autos, dos documentos de suporte dos alegados suprimentos, impede que a AT, e o próprio Tribunal, conheçam a efectiva natureza dos valores em causa – o que, além de tudo o mais, viola o art. 123.º, 2, a) do CIRC, e não permite acatar o princípio da dependência dos resultados fiscais perante os contabilísticos, estabelecido no art. 17º, 1 do CIRC.
  4. Lembra a Requerida que, nesse ponto da documentação da origem dos fluxos e da fonte das entradas financeiras nas contas bancárias da empresa, é sobre a Requerente que recai o ónus da prova, nos termos do art. 74º, 1 da LGT e do art. 342.º do Código Civil.
  5. Especificamente quanto à execução da deliberação de conversão de suprimentos em prestações suplementares, a Requerida faz notar que, no que diz respeito à entrada em dinheiro na esfera da empresa proveniente do seu sócio e gerente, sr. B..., a Requerente nunca fez prova, nem em sede de procedimento inspectivo nem agora de processo arbitral, e nos moldes exigidos pelo art. 63.º-C da LGT, de que tais montantes tivessem efectivamente entrado na empresa.
  6. Em suma, conclui a Requerida que não está feita a prova de que se trate de suprimentos efectuados pelo sócio.
  7. Por outro lado, a Requerida chama a atenção para o facto de, na mesma data de registo em que a Requerente constituiu as prestações suplementares por transferência dos débitos que tinha ao seu sócio, em 30 de Setembro de 2019, ela ter procedido à transferência parcial das referidas prestações suplementares (débito da conta 53 pelo valor de €740.000,00), para a conta de resultados transitados através do crédito das contas 561 e 562, respectivamente, pelos montantes de €23.054,95 e €716.945,00; e de, na mesma data, a Requerente ter procedido à regularização dos activos por inventários, através do lançamento a débito na conta 33.1 no valor de €644.996,01, por contrapartida do crédito da conta de resultados transitados, conta 562 no valor de €644 996,01, que comportava saldo suficiente para esta regularização – sem que, todavia, se conheça, ou possa descortinar-se, uma motivação deste lançamento de regularização de inventários, uma vez que não se mostra comprovado, pela Requerente, qualquer abate ou inutilização de existências, nem o consumo das mesmas, ou venda – novamente em violação do estatuído no art. 123.º, n.º 2 do CIRC.
  8. Ou seja, também não está devidamente documentado se a conversão dos suprimentos em prestações suplementares, com o aparente objectivo de cobertura de prejuízos acumulados, teve efectivamente por destino a regularização de inventários do ano de 2019, no montante de €644.996,01, não obstante ter sido relevado contabilisticamente.
  9. Conclui a Requerida que não está de modo algum comprovado, de forma minimamente adequada, o argumento-base da Requerente, de que se teria tratado de uma conversão de suprimentos em prestações suplementares para a cobertura de prejuízos transitados, susceptível de enquadramento na exclusão prevista na alínea a) do n.º 1 do art. 21.º do CIRC – e que, na convicção da Requerida, é inequívoco que o que se visou foi a regularização de inventários, e não, como a Requerente alega, essa cobertura de prejuízos.
  10. Sublinha a Requerida que, durante a IT, a Requerente não conseguiu justificar a regularização / redução de inventários que estava contabilizada nos anos de 2018 e 2019, não fornecendo qualquer informação ou explicação relativas a ela.
  11. A Requerida admite que a transferência de créditos de um sócio para resultados transitados, com vista à anulação desses créditos sobre a empresa, representa uma cobertura de parte dos prejuízos acumulados, configurando, portanto, uma variação patrimonial positiva que não influencia o resultado líquido do exercício, sendo enquadrável na excepção contemplada na alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do CIRC, daí resultando a não-sujeição a tributação em sede de IRC.
  12. Só que – insiste – não foi isso que se passou no caso em apreço, e, se fosse isso, tal não estaria minimamente documentado.
  13. Pelo contrário, segundo a Requerida a operação de conversão de alegados suprimentos em prestações suplementares que depois serviram para cobertura de prejuízos (crédito conta 56 por débito da conta 53), efectivamente teve por fim dar suporte a um ilegítimo desreconhecimento de activos no montante de €644.996,01 (débito da conta 56 por crédito da conta de inventários 33), relevado contabilisticamente sem qualquer suporte ou justificação legal.
  14. Ou seja, no entendimento da Requerida a anulação do crédito detido pelo sócio, no montante de €740.000.00 (crédito conta 56 por débito da conta 53), não serviu para cobertura de prejuízos acumulados, mas tão somente para suportar a supressão injustificada de ativos da empresa no montante de €644.990,01, não correspondendo esta variação patrimonial positiva de €740.000,00 à exclusão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do CIRC.
  15. Não deixa a Requerida de assinalar a incongruência e o contraste que se abrigam na invocação de que a Requerente é uma microempresa de facturação muito diminuta, ao mesmo tempo que o sócio tem aparentemente de financiá-la com valores tão elevados – o que, no seu entender, mais uma vez aponta no sentido de haver uma falta de registo de consumo ou venda de inventários em anos anteriores, gerando uma distorção que se pretendeu remediar de uma vez só no exercício de 2019, numa operação que de modo algum cabe na previsão do art. 21.º, n.º 1, a) do CIRC.
  16. A Requerida defende-se também da alegação de que haveria falta de fundamentação da sua parte, sustentando que preencheu os critérios estabelecidos no art. 77º da LGT, e o standard de fundamentação defendido uniformemente pela jurisprudência.
  17. Em alegações, a Requerida retoma os argumentos apresentados na sua Resposta, de novo enfatizando que, dada a invocação de que se tratou de prestações suplementares, era imperativa a exibição de documentos que titulassem as entradas dos respectivos valores monetários nos cofres da empresa, devendo os montantes envolvidos nas operações em causa estar devidamente comprovados mediante documentação relativa a transferências bancárias ou cheques, para cumprimento do disposto no art. 63º-C da LGT.
  18. Na ausência dessa prova, nem sequer pode concluir-se que se trata realmente de suprimentos efectuados pelo sócio.
  19. E insiste que está por explicar a coincidência temporal entre a constituição das prestações suplementares e a regularização dos activos por inventários – desconhecendo-se, em particular, a motivação deste lançamento de regularização de inventários, uma vez que não se mostra comprovado pela Requerente qualquer abate ou inutilização de existências, nem o consumo das mesmas ou venda, constituindo a falta de suporte documental dos registos contabilísticos uma violação do disposto no art. 123º, 2 do CIRC.
  20. Daí inferir que a operação de conversão de alegados suprimentos teve como finalidade inequívoca a regularização de inventários, conforme se constata nos registos contabilísticos e na justificação apresentada pela Requerente em sede de IT.
  21. Conclui a Requerida estarmos na presença de movimentos contabilísticos que foram efectuados por forma a beneficiarem do estipulado no art. 21º, 1, a) do CIRC, mas que de facto procuraram apenas evitar a tributação em IRC. Acrescentando que a Requerida fundamentou como devia as correcções que determinou, e foi a Requerente que deixou de fazer prova dos factos que alegou, incumprindo o ónus da prova.

 

IV. Fundamentação da decisão

 

IV. 1. O enquadramento no art. 21º, 1, a) do CIRC

 

A Requerente entendeu que a operação de Setembro de 2019 não constituiu variação patrimonial positiva para determinação da matéria tributável, por ser enquadrável na alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do CIRC; ou seja, no tratamento contabilístico que lhe foi conferido, a operação não teria concorrido para o apuramento do resultado líquido do exercício de 2019, tendo antes contribuído para o aumento dos capitais próprios da Requerente, em resultado do movimento a crédito dos resultados transitados.

Há que reconhecer que o facto de o capital próprio da Requerente ser, no início de 2019, inferior a metade do capital social, tornava obrigatória, à face do artigo 35.º do CSC, a convocação de uma assembleia geral para deliberação das medidas necessárias.

E há que reconhecer, também, que a redacção do art. 21º, n.º 1, a) do CIRC dá grande amplitude a tais medidas, visto que admite todo o tipo de cobertura de prejuízos dentro do âmbito da excepção à relevância das variações patrimoniais positivas para formação do lucro tributável, visto que esta expressamente abarca:

As entradas de capital, incluindo os prémios de emissão de ações ou quotas, as coberturas de prejuízos, a qualquer título, feitas pelos titulares do capital, bem como outras variações patrimoniais positivas que decorram de operações sobre ações, quotas e outros instrumentos de capital próprio da entidade emitente, incluindo as que resultem da atribuição de instrumentos financeiros derivados que devam ser reconhecidos como instrumentos de capital próprio” (sublinhado nosso)

E é igualmente evidente que o regime de excepção não se restringe a entradas de capital, visto que, se assim fosse, não seria necessária, nem a especificação das “coberturas de prejuízos (…) feitas pelos titulares do capital” “a qualquer título”, nem a extensão a “outras variações patrimoniais positivas que decorram de operações sobre ações (…)”.

E “a qualquer título” significa que é irrelevante a qualificação do crédito com que se cobre os prejuízos, se suprimentos, prestações suplementares, acessórias ou qualquer outro, conquanto o credor seja sócio da sociedade beneficiária.

Esse entendimento é acolhido em acórdão do TCAS de 14 de Abril de 2012 (Proc. nº 05315/12):

No sistema do C.I.R.C., a cobertura de prejuízos (entradas de capital a qualquer título), são fiscalmente neutras no momento da sua realização, quer para a empresa que a realiza, quer para a empresa que a recebe. Nesse sentido vai o art.º 21, nº.1, al. a), do C.I.R.C., ao consagrar que as coberturas de prejuízos não concorrem para a determinação do lucro tributável, ou seja, não aumentam o valor da dívida de imposto da sociedade que os recebe, o mesmo se passando na esfera da entidade que efectua a cobertura de prejuízos, ou seja, a cobertura de prejuízos não tem qualquer relevância fiscal e, portanto, trata-se de uma variação patrimonial negativa não reflectida nos resultados mas apenas em capital e excluída de relevância tributária. O sócio efectuou um certo desembolso, mas a saída de fundos foi compensada pela entrada na sua esfera jurídica de direitos, mais precisamente de um direito de crédito (se for um suprimento) ou do reforço da sua participação social (se for uma qualquer forma de aumento de capital) sobre a sociedade participada e que recebe a cobertura de prejuízos

E na informação vinculativa constante do Processo n.º 3330/04, de 13 de Outubro de 2005, a AT, a propósito do enquadramento em IRC da transferência de crédito do sócio para capital próprio (capital social ou resultados transitados), veio esclarecer que:

A transferência do crédito de um sócio para Capital Social ou para Resultados Transitados com vista à anulação do crédito que detém sobre a empresa representa, no primeiro caso, uma entrada de capital em espécie, com o correspondente aumento do capital social e, no segundo caso, a cobertura de parte dos prejuízos acumulados. [§] Assim, num e noutro caso, a transferência configura uma variação patrimonial positiva que não influencia o resultado líquido do exercício enquadrável na excepção contemplada na alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do Código do IRC, pelo que não está sujeita a tributação em sede de IRC”.

A solução legislativa faz sentido: os aumentos de capitais a título de entradas de capital ou cobertura de prejuízos realizados pelos sócios não concorrem para a formação do lucro, não obstante se traduzirem em alterações do capital próprio das sociedades – o mesmo sucedendo com as variações negativas decorrentes de levantamentos feitos pelos mesmos sócios a título de remuneração ou de redução do capital ou partilha do património social. Daí que uns e outros devam simetricamente ser excluídos do concurso para a formação do lucro, como sucede nos arts. 21º, 1, a) e 24º, 1, c) do CIRC.

Como se refere no acórdão arbitral do Proc. 213/2018-T, do CAAD (Jorge Lopes de Sousa, Rui Duarte Morais e Sérgio Vasques),

a opção legislativa de excepcionar da relevância para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais positivas resultantes de coberturas de prejuízos constitui um incentivo imediato ao saneamento financeiro da sociedade participada e à sua subsistência, mas não afasta necessariamente a relevância tributária da operação, antes se limita a diferir para momento ulterior da transmissão ou extinção das partes sociais a apreciação da sua eventual relevância fiscal, na esfera da sociedade que beneficia da cobertura de prejuízos.”

Se não existissem essas excepções plasmadas na letra da lei, a regra seria a da tributação de qualquer variação no capital próprio (positiva ou negativa), pois tais variações, apesar de não influírem no resultado contabilístico, implicam um acréscimo ou uma diminuição do património da empresa, constituindo, por isso, uma componente do lucro tributável, a par dos rendimentos e dos gastos: tal o princípio-regra que resulta das disposições conjugadas dos arts. 17º, 1, 21º, 1 e 24º, 1 do CIRC, segundo o qual as variações patrimoniais positivas ou negativas verificadas no mesmo período, e não reflectidas no resultado contabilístico do exercício, concorrem para a formação do lucro tributável.

Em tese geral, podem considerar-se variações patrimoniais positivas as ocorrências que fazem aumentar o património líquido de uma empresa sem que esse aumento tenha passado a integrar os capitais próprios pela via do resultado líquido do período: traduzindo-se, nomeadamente, num aumento dos capitais próprios, ou seja, num rendimento obtido ou numa anulação de um gasto, que é contabilizado numa conta dos capitais próprios, e não numa conta de rendimentos ou numa conta de redução de gastos.

Ocorrendo, neste ponto, uma prevalência de critérios tributários sobre critérios estritamente contabilísticos:

"Na formação do lucro tributável começa por concorrer a diferença entre os valores do património líquido e no fim do período da tributação, afinal, o resultado extraído da contabilidade, coincidente, no início, com o resultado fiscal (artigo 3.º, n.º 2) e que pode ser positivo ou negativo. O que denuncia o acolhimento pelo legislador da teoria do incremento patrimonial, sendo a extensão da noção de rendimento bem como o alargamento da base tributável uma evidência na profunda reforma legislativa empreendida pelo Código, em linha com a evolução registada em grande parte das legislações de outros países conforme se alcança do seu preâmbulo. Ao resultado líquido do período (positivo ou negativo), estribado na contabilidade do sujeito passivo, serão de somar as variações patrimoniais - positivas e negativas - verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, conforme previsto nos artigos 21.º e 24.º. Ora é, justamente, sobre o valor resultante da aludida soma (de resultado positivo e negativo) que, eventualmente, vão ter lugar as correções fiscais com o propósito de ser apurado o lucro tributável. São assim introduzidas, extra contabilisticamente - isto é, fiscalmente, - correcções evidenciadas na lei, tendo em conta os objectivos e as especificidades próprias da fiscalidade. Tais correcções, positivas ou negativas, ao resultado líquido fazem-se, respectivamente, por acréscimo ou por dedução, conforme surjam, respectivamente, em desfavor ou favor do sujeito passivo". (Rui Marques, Código do IRC Anotado e Comentado, 2.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2020, p. 166).

Dentro das entradas de capital e coberturas de prejuízos e demais variações patrimoniais positivas excepcionadas pelo art. 21º, n.º1, a) do CIRC, aquelas que ocorrem “a título” de prestações suplementares não constituem sequer verdadeiras variações patrimoniais, pois o património da sociedade antes e depois da operação é idêntico: elas constituem capital próprio da sociedade e a sua ablação tem efeitos apenas na esfera patrimonial do sócio, não dando lugar a nenhum ganho patrimonial na demonstração de resultados, constituindo uma reafectação de valores dentro dos instrumentos de capital próprio – na medida em que não existe uma obrigação de as restituir, e essa restituição só ocorrerá por deliberação dos sócios, “desde que a situação líquida não fique inferior à soma do capital e da reserva legal e o respectivo sócio já tenha liberado a sua quota”, por força dos arts. 213º, 1 e 2, e 246º, 1, a), do CSC.

 

IV. 2. A falta de prova

 

Todavia, a prova produzida no processo, tal como a prova produzida no âmbito da Inspecção Tributária, não aponta com verosimilhança para a materialidade das operações.

Para constituir uma variação patrimonial positiva excepcionada pelo art. 21º, n.º 1, a) do CIRC, a Requerente deliberou proceder a prestações suplementares, e foi referindo-se a prestações suplementares que elaborou a sua contabilidade. Mas não lhe fez corresponder um documento de suporte que seria essencial para atestar a materialidade e natureza dessa operação: um comprovativo (cheques, extractos de transferências bancárias) de que os montantes mencionados e contabilisticamente referenciados tivessem efectivamente saído das contas bancárias do sócio B... e entrado nos cofres da empresa, nas contas bancárias exclusivamente afectas à actividade empresarial, a que se refere o art. 63.º-C da LGT.

No momento em que identificou tais operações como “prestações suplementares”, era imperativo que a Requerente tivesse junto essa documentação – fosse no momento em que, no procedimento inspectivo, lhe foi expressamente solicitado que o fizesse; fosse nos presentes autos, nos quais essa falta voltou a ser-lhe repetidamente assinalada.

Na falta dessa prova, não pode sustentar-se, com um grau mínimo de certeza, que tenham ocorrido materialmente “prestações suplementares”; e nem sequer é possível dar suporte à contabilização de suprimentos alegadamente efectuados pelo referido sócio: pois, se revestiram materialmente uma outra natureza (suprimentos? prestações acessórias? meras regularizações contabilísticas?), essa natureza ficaria oculta, por detrás da designação adoptada de “prestações suplementares”.

E é a Requerente, que invocou essa natureza e essa designação para tais operações, que tem de fazer a prova necessária, sob pena de a falta de tal prova ser valorada processualmente contra ela.

Como bem assinala a Requerida, nas prestações suplementares tem de haver efectivação em dinheiro, e é essa efectivação, imposta pelo do art. 210.º, n.º 2 do CSC, que permite distinguir as prestações suplementares de outras figuras, com regimes e implicações muito distintos.

Sem prova cabal e inequívoca dessa efectivação – nem sequer se sabendo a origem dos fluxos e da fonte das entradas financeiras nas contas bancárias da empresa, e muito menos se sabendo se houve, ou não, entrada desses montantes nos cofres da empresa –, não é possível descortinar, com um mínimo de segurança, a materialidade das operações contabilisticamente registadas em Setembro de 2019: com todas as consequências, nomeadamente a impossibilidade de caracterização das variações  patrimoniais para efeitos da aplicação, ou não, da excepção contida na alínea a) do n.º 1 do artigo 21.º do CIRC.

Nem sequer há prova de que os suprimentos tenham sido materialmente efectuados pelo sócio, e não há prova de que eles tenham revestido uma das características indispensáveis de verdadeiras prestações suplementares.

Daí que se afigurem como legítimas as dúvidas formuladas pela AT:

  • Ter-se-á tratado de cobrir prejuízos, ou antes de regularizar inventários?
  • Ter-se-á procurado dar suporte a um ilegítimo desreconhecimento de activos relevado contabilisticamente sem qualquer justificação legal?
  • Que justificação há para um financiamento tão elevado numa microempresa de facturação tão diminuta?

Ainda que tais dúvidas não sejam decisivas para o mérito da causa, visto que se colocam a jusante de um problema de ónus da prova que, no entender deste Tribunal, é o decisivo.

A alegada cobertura de prejuízos acumulados através de um perdão de dívida, consubstanciado em prestações suplementares, tal como contabilisticamente consignado, por ter estado nas intenções da Requerente, pode vir acompanhada de uma dose considerável de verosimilhança; sucede, contudo, que, por um lado, a Requerente não fez prova bastante da materialidade subjacente àquilo que invoca; e que, por outro lado, tal prova é, no caso, absolutamente indispensável para se conhecer a natureza daquilo que verdadeiramente se passou.

 

IV. 3. O ónus da prova

 

Em suma, a tese da Requerente não pode considerar-se provada.

O art. 74.º, 1 da LGT estabelece que “o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”, em consonância com o art. 342.º, n.º 1 do Código Civil.

E lembremos que, nos termos do art. 75.º, n.º 2 da LGT, a presunção de veracidade das declarações dos contribuintes deixa de aplicar-se quando “As declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não refletem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo” (sublinhado nosso).

Assim, é sobre a Requerente, que alega que ocorreu uma cobertura de prejuízos através da conversão, em prestações suplementares, de créditos de um seu sócio, que recai o ónus da prova, o que se reconduz a que a falta de prova da natureza dessa operação tenha de ser valorada processualmente contra a Requerente.

Afigura-se ocorrer, no caso, a violação do art. 123.º do CIRC, quando estabelece que:

As sociedades (…) são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei que, além dos requisitos indicados no n.º 3 do art.º 17.º, permita o controlo do lucro tributável. […] 2. Na execução da contabilidade deve observar-se em especial o seguinte: a) Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e suscetíveis de serem apresentados sempre que necessário; b) As operações devem ser registadas cronologicamente, (…)”.

E a violação do art. 31.º, n.º 2 da LGT, que determina que:

são obrigações acessórias do sujeito passivo, designadamente, as que visam possibilitar o apuramento da obrigação de imposto, nomeadamente a apresentação de declarações, a exibição de documentos fiscalmente relevantes, incluindo a contabilidade ou escrita, e a prestação de informações.”

Como lapidarmente se estabeleceu na decisão arbitral do Proc. nº 184/2021-T do CAAD (Alexandra Coelho Martins, Jónatas Machado e João Pedro Rodrigues):

Essas obrigações assessórias devem ser cumpridas no quadro de um dever geral de boa prática tributária, revelando-se a apresentação, atempada e rigorosa, da contabilidade financeira, nos termos dos artigos 120.º e 121.º do Código do IRC, necessária à publicidade e disponibilidade de toda a informação financeira sobre o histórico das operações da empresa, devidamente identificadas, reconhecidas e mensuradas. (…) Sendo esta informação contabilística indispensável para a tomada de decisões esclarecidas e racionais de investidores, financiadores, trabalhadores, fornecedores ou clientes, é também com base nela que as entidades públicas em geral levam a cabo as suas funções de regulação e controlo da atividade económica e que a AT, em especial, realiza a sua indeclinável missão de verificação da ocorrência de factos tributários e liquidação e cobrança dos impostos legalmente correspondentes. Compreende-se, pois, que as demonstrações financeiras da Requerente assumam, para AT, uma relevância primordial.

Convoca-se igualmente o acórdão do STA de 26 de Fevereiro de 2014 (Proc. nº 0951/11):

Em consequência, cabe à Administração Tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais vinculativos legitimadores da sua actuação, para o que deve provar os factos constitutivos de que legalmente depende a decisão administrativo-tributária com certo conteúdo e com certo sentido. Pelo seu lado, cabe ao contribuinte provar os factos que operam como suporte das pretensões e direitos que invoca. (…) Daí que incida sobre a Requerente o ónus da demonstração efectiva dos factos inscritos e das razões na base dos ajustamentos realizados na contabilidade, não bastando ficar a dúvida sobre a viabilidade da respectiva justificação, porquanto o disposto no n.º 1 do art. 110.º do CPPT tem a sua aplicação fulcral quando é a Administração Tributária a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação (cfr., assim, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26.2.2014, proc. n.º 0951/11). Deste modo, a prova produzida deve assegurar, com a certeza exigível, que as regularizações e ajustamentos realizados possuem consistência e materialidade bastante em face das justificações que lhe presidem.”

Releva ainda o acórdão do STA de 27 de Fevereiro de 2019, (Proc. n.º 01424/05.2BEVIS):

para que a AT proceda à correção do lucro tributável por desconsideração dos custos suportados por faturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efetivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240.º do CC) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende. (…) basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar esses custos, factualidade essa que tem de ser suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito de deduzir os custos ao lucro tributável) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus da prova de que as operações se realizaram efetivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.”

Recaindo o ónus da prova sobre a Requerente, competia-lhe demonstrar e comprovar as operações subjacentes que se encontram escrituradas na contabilidade no ano de 2019.

Esse ónus não é da AT; não obstante, relembre-se que a AT desenvolveu actividade instrutória, procurando obter esclarecimentos sobre esses documentos em falta no decurso da acção inspectiva, sem que lhe fosse apresentada uma prova minimamente objectiva do que então foi alegado – isto apesar de não se descortinar qualquer especial dificuldade ou impossibilidade de prova, razão pela qual é perfeitamente exigível que demonstre adequadamente a factualidade que invoca.

 

IV. 4. O problema da fundamentação

 

A Requerente utiliza o argumento da falta de fundamentação – o que parece manifestamente inadequado, dada a extensão da fundamentação que consta do RIT, e dada a articulação das peças processuais apresentadas pela Requerida com esse mesmo RIT.

Trata-se, contudo, de um argumento difícil de rebater, pelo que se justifica uma fundamentação mais extensa da parte do Tribunal, a dissipar dúvidas quanto a existência e suficiência da fundamentação – aferida em termos gerais e abstractos.

Comecemos por destacar-lhe a dupla função, nas palavras de um ilustre cultor do Direito Fiscal:

A exigência de fundamentação (a exposição dos motivos por que se decidiu de um certo modo e não de outro) existe também como condição de racionalidade e de criação de condições materiais para o exercício das competências administrativas e judiciais de re-exame de uma decisão e de uma situação jurídica tributária[1].

Por força dessa dupla função, exige-se que a fundamentação revista as seguintes características:

  1. Oficiosidade: deve partir sempre da iniciativa da administração, não sendo admissíveis fundamentações a pedido;
  2. Contemporaneidade: deve ser coeva da prática do acto, não podendo haver fundamentações diferidas ou supervenientes;
  3. Clareza: deve ser acessível e compreensível por um destinatário médio, evitando tecnicismos e ambiguidades, e mais ainda obscuridades, erros, contradições ou insuficiências, na enunciação dos pressupostos e, no que respeita à liquidação, na explicitação dos montantes calculados e das formas de cálculo;
  4. Suficiência ou plenitude: deve permitir identificar todos os elementos determinantes da decisão tomada (as disposições legais aplicáveis, a qualificação dos factos tributários, a quantificação dos factos tributários, as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo), e nomeadamente a justificação encontrada no quadro normativo – o domínio da legalidade –, e, quando intervenham margens de discricionariedade ou oportunidade, a motivação e as valorações prevalecentes[2].

A inexistência ou insuficiência da fundamentação torna, assim, o acto tributário (maxime a liquidação) anulável por vício de forma, porque materialmente ficaram comprometidas a racionalidade da decisão e a criação das condições materiais para o adequado exercício dos direitos de defesa por parte dos contribuintes.

Essa fundamentação não deve, nem pode, ser abstractamente apreciada – porque será sempre funcionalizada à situação concreta e ao tipo de acto, servindo em primeira linha para remover, junto do destinatário da decisão, qualquer impressão de que houve arbítrio nessa decisão: “Fundamentar um ato, uma decisão, uma deliberação, consiste em indicar, concretamente, as razões de direito e de facto por que se tomou uma decisão em determinado sentido[3].

As características da fundamentação concorrerão para que, numa liquidação de imposto, seja “compreensível, para um destinatário médio colocado na posição do real destinatário, face aos elementos efectivamente notificados, o porquê da inscrição nos cálculos apresentados daqueles valores, e não de outros quaisquer”; não bastando, para convalidá-lo, que as motivações de um acto tributário impugnado possam ser, ou tenham sido, intuídas pelo contribuinte: “não será aceitável que, perante uma fundamentação inexistente ou insuficiente, se ponha a cargo do contribuinte o ónus de adivinhar aquela, atribuindo ao palpite certeiro um efeito convalidante do défice de cumprimento dos respectivos deveres pela Administração Tributária[4].

O art. 77.º, 1 da LGT estabelece que “a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária”.

É um princípio genérico, que não se cinge aos actos “em série”, ou “de massa”, alargando-se, antes, a todos os tipos de actos tributários o dever de fundamentação sucinta, e a faculdade de remissão, com mera declaração de concordância com fundamentações precedentes, bastando que se identifique claramente, sem obscuridade ou ambiguidade, quais os documentos ou peças para que se remete – como o estabelecia já o Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do STA, de 19 de Janeiro de 1993: “A fundamentação, mesmo por remissão, deve ser expressa no próprio acto, por indicação da peça do processo cujas razões o acto assume, não podendo na ausência dessa indicação no próprio acto, ser buscada em qualquer peça do processo administrativo.”

Em suma, como há muito se tem por estabelecido,

A jurisprudência dos nossos Tribunais superiores tem consagrado o entendimento de que um acto se encontra suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. É também pacificamente aceite que não preenche a exigência legal de fundamentação o recurso a meras fórmulas tabelares que não esclareçam devidamente a motivação de facto e de direito que presidiu ao acto da administração. Ponto é que a fundamentação responda às necessidades de esclarecimento do contribuinte informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto de liquidação, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática. Acresce dizer, na senda do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.12.2007, recurso 615/04 «que a lei exige uma exposição apenas sucinta dos fundamentos da decisão a fundamentar; que, por isso, não deve ser um “máximo” o conteúdo exigível da declaração fundamentadora; e que o grau de fundamentação há-de ser o adequado ao tipo concreto do acto e das circunstâncias em que o mesmo foi praticado, de molde a satisfazer a divergência existente entre a posição da Administração Fiscal e a do contribuinte».”[5]

E a doutrina converge com esse entendimento:

Como o STA vem entendendo, a exigência legal e constitucional de fundamentação visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do acto e a sua impugnação contenciosa. Para ser atingido tal objectivo a fundamentação deve proporcionar ao destinatário do acto a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente.”[6]

Decorre das considerações precedentes que a fundamentação, até por causa do imperativo da clareza, deve ser simples – sem deixar de ser plena –.

Se a fundamentação se encontra já formulada completamente num determinado passo de um procedimento ou processo, é mais do que desnecessário, por redundância, repeti-la: pode ser até contraproducente, convertendo-se numa penosa reformulação de tudo o que já foi dito, de tudo o que já foi argumentado, de tudo o que já foi documentado – contribuindo presumivelmente para a entropia informativa por excesso, redundando, no final, em desinformação e vulnerabilização daquele a quem a informação deveria precipuamente aproveitar, que é o seu destinatário.

É, como vimos, o que acabou consagrado no nº 1 do art. 77.º da LGT.

Nesse mesmo sentido reconheceu-se já, em sede de arbitragem tributária, que “quando o ato tributário (liquidação adicional de imposto, por exemplo) surge na sequência e em consequência dum procedimento inspetivo levado a cabo pela Administração Fiscal, a dialética ou diálogo que necessariamente se estabelece entre o contribuinte e a inspeção tributária, hão-de tornar difícil, em princípio, o não cumprimento ou até o cumprimento deficiente desse ónus de fundamentação na medida em que a decisão final se vai construindo ao longo desse processo com a participação do contribuinte[7].

Essa edificação “dialógica” de uma fundamentação tem acolhimento crescente na doutrina e na jurisprudência, embora não tenha ainda o reconhecimento que lhe seria devido, em todas as suas implicações – pioneiramente formuladas, de modo lapidar, por Saldanha Sanches: “Ao co-responsabilizar o sujeito passivo pela decisão final, a participação deste na audição prévia pode também contribuir para uma distinção entre as suas posições que merecem e não merecem tutela jurídica[8].

Um outro corolário da edificação “dialógica” de uma fundamentação é a admissão de uma possibilidade que de outro modo se entenderia como uma derrogação do princípio da contemporaneidade: a possibilidade de a cumulação de informação ao longo do processo deixar transparecer de forma mais completa uma fundamentação inicial, sem que isso constitua uma fundamentação sucessiva ou a posteriori de actos tributários ou administrativos. Como se lê numa decisão arbitral,

decorre do pedido de pronúncia arbitral e das impugnações administrativas que o precederam que a Requerente se apercebeu de que o Relatório da Inspecção Tributária estava subjacente às correcções efectuadas, cuja fundamentação foi expressamente assumida nas decisões da reclamação graciosa e do recurso hierárquico, que precederam a apresentação do pedido de pronúncia arbitral. […] No caso em apreço, apesar da falta de referência expressa à fundamentação no acto de liquidação, a Requerente impugnou-o através de reclamação graciosa e de recurso hierárquico, em cujas decisões ficou claro que a fundamentação do acto de liquidação é a que consta do Relatório da Inspecção Tributária que antecedeu a liquidação, que foi adoptada, no essencial, por último, na decisão do recurso hierárquico […] Por outro lado, quanto ao IRS, a quantia liquidada é exactamente a que foi indicada no Relatório da Inspecção Tributária, pelo que não há razão para duvidar que foi com base neste Relatório que foi efectuada a liquidação e, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado na sequência da notificação da decisão do recurso hierárquico, tem de se concluir que pode considerar-se convalidado o acto de liquidação do IRS, na linha da jurisprudência citada. Para além disso, esta fundamentação foi levada ao conhecimento da Requerente a tempo de exercer adequadamente o direito de impugnação contenciosa, que a Requerente efectivamente exerceu, como se constata pelo pedido de pronúncia arbitral.[9]

O contexto procedimental / processual não é, em suma, indiferente para se aferir em concreto a adequação da fundamentação produzida. Como se conclui numa outra decisão arbitral,

Deverá, desde logo, ser afastada a hipótese de existência de nulidade por falta de fundamentação, já que é bem patente a existência de um processo administrativo com junção de elementos probatórios, funcionamento do contraditório, fundamentação, conclusões […] Ou seja, todos os despachos decisórios que conduziram à liquidação contestada ou à confirmação da sua correcção, foram precedidos de informações dos serviços contendo todos os fundamentos, de facto e de direito, necessários à plena compreensão de como foi calculado o valor [§] Assim, verifica-se que o acto foi praticado num contexto procedimental susceptível de permitir ao seu destinatário ficar a saber as razões de facto e de direito […]”[10].

Por outro lado, é a desnecessidade, ou até mesmo a inconveniência da repetição de fundamentações que ditam a possibilidade de fundamentação “por relação”, “por remissão” ou “por referência”, tal como elas encontram tradução no art. 77º da LGT. Daí infere a doutrina:

devem ter-se por fundamentadas as liquidações derivadas das correcções da inspecção quando do relatório constam as razões dessa correcção e posterior liquidação. Nesse caso, para se saber se o acto da liquidação está ou não fundamentado, não pode o intérprete alhear-se do relatório da inspecção, uma vez que este constitui o culminar de um procedimento que um conceito amplo de liquidação necessariamente comporta. […] No plano do procedimento inspectivo tributário, admitindo a modalidade de fundamentação «per relationem» ou «per remissionem», o artigo 63.º, n.º 1, do RCPIT prevê que os actos tributários ou em matéria tributária que resultem do relatório poderão fundamentar-se nas suas conclusões, através da adesão ou concordância com estas, devendo em todos os casos a entidade competente para a sua prática fundamentar a divergência face às conclusões do relatório.[…] A importância da motivação de facto e de direito constante do procedimento de inspecção tributária, posteriormente absorvida pela decisão tributária, compreende-se tendo em vista que o acto de liquidação stricto sensu representa o culminar e um extenso e complexo procedimento administrativo assente nos actos preparatórios praticados pelos serviços de inspecção tributária que integram o procedimento de liquidação lato sensu (artigo 11.º do RCPIT)[11].

A repetição, se fosse exigida, suscitaria até novas dificuldades, forçando à detecção da mais pequena divergência, mesmo por lapso, entre fundamentações completas e sucessivas – gerando ruído, e até possivelmente litigância, à margem da apreciação directa do mérito das decisões fundamentadas. A clareza, a acessibilidade, da fundamentação ficariam comprometidas – novamente por excesso.

Daí que seja entendimento firmado na própria jurisprudência arbitral que a alusão a “sucinta exposição” no art. 77.º, n.º 1 é para ser tomada à letra.

As mesmas razões de economia e racionalidade de meios, aditadas à consciência de que a fundamentação se vai, não raro, adensando “dialogicamente” ao longo do processo, têm levado a jurisprudência a reconhecer que a fundamentação excessivamente minuciosa pode ser o contrário daquilo que teleologicamente se visa com uma verdadeira fundamentação – dispensando minúcias ainda onde elas notoriamente não contribuíssem já para a partilha de informação entre administração e contribuintes, numa espécie de efeito de “rendimento marginal decrescente” da própria informação. Daí que a referência a princípios, a regimes, ou a quadros normativos, possa dispensar a enunciação completa de tudo o que corresponde a esses princípios ou a esses regimes ou a esses quadros normativos.

Assim, por exemplo, para que a fundamentação de direito se considere suficiente, o Supremo Tribunal Administrativo tem decidido que

não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível – entre tantos outros, os acórdãos proferidos pela 1ª Secção do STA […] Conforme se dá nota no acórdão da Secção do Contencioso Administrativo proferido em 27/05/2003, no proc. n.º 1835/02, «tem sido entendimento deste Supremo Tribunal Administrativo que, na fundamentação de direito dos actos administrativos não se exige a referência expressa aos preceitos legais, bastando a referência aos princípios jurídicos pertinentes, ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado […]. Mais do que isto, tem sido dito que em sede de fundamentação de direito, dada a funcionalidade do instituto da fundamentação dos actos administrativos, ou seja, o fim meramente instrumental que o mesmo prossegue, se aceita um conteúdo mínimo traduzido na adução de fundamentos que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, possibilitem a referência da decisão a um quadro legal perfeitamente determinado […] Orientação que, aliás, foi acolhida pelo Pleno daquela Secção, no acórdão de 25/03/93, no proc. n.º 27387, no qual se afirma que o dever de fundamentação fica assegurado sempre que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, a decisão se situe num determinado e inequívoco quadro legal, perfeitamente cognoscível do ponto de vista de um destinatário normal, concluindo-se, assim, que haverá fundamentação de direito sempre que, face ao texto do acto, forem perfeitamente inteligíveis as razões jurídicas que o determinaram.[12].

No mesmo sentido da fundamentação sucinta, minimalista até, contra a fundamentação “quilométrica”[13], tem-se entendido que os requisitos da fundamentação devem ser reponderados face às necessidades dos “processos de massa”, compreendendo-se e aceitando-se que a fundamentação associada a tal produção de actos em massa se faça em moldes crescentemente padronizados, aproveitando-se as possibilidades tecnológicas, desde que, por essa via, não se coloque em causa o disposto no art. 77.º da LGT ou as finalidades que se visam com o direito à fundamentação.

Admite-o com grande amplitude a doutrina e a jurisprudência, referindo-se à massificação genérica do fenómeno tributário e à padronização e informatização implicadas nessa massificação:

“Nos actos de liquidação de IRS, atenta a sua natureza de “processo de massa”, o dever de fundamentação é cumprido pela Administração fiscal de forma “padronizada” e “informatizada”, mas sem que possa deixar de observar o disposto no n.º 2 do artigo 77.º da LGT ou de pôr em causa as finalidades do direito à fundamentação.”[14].

Admite-o também a Lei. Lembremos a consagração desse mesmo princípio no nº 3 do art. 153.º do CPA:

Na resolução de assuntos da mesma natureza, pode utilizar-se qualquer meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que tal não envolva diminuição das garantias dos interessados.

Por uma questão de igualdade de armas, o conhecimento do itinerário cognoscitivo, valorativo e volitivo que culminou na escolha dos valores da liquidação, e não de outros quaisquer, incumbe à entidade autora do acto, não sendo concebível que recaia sobre o contribuinte o ónus de enunciar ele próprio os argumentos fundamentadores do acto impugnado, para de seguida os poder aceitar ou contradizer[15]: esse o sentido do dever de fundamentação consagrado genericamente no art. 268.º da Constituição e no art. 77.º da LGT.

Nem se aceitará que o dever de fundamentação seja tão atenuado na presença de um destinatário sofisticado que isso levasse a entender-se que caberia a esse destinatário convalidar a ausência de fundamentação através da sua própria iniciativa: mesmo que o contribuinte seja uma estrutura organizativa de grande dimensão e tecnicamente muito sofisticada, é de entender-se “que o cumprimento deficiente do dever de fundamentação a cargo da AT não pode ser convalidado pela acção do contribuinte, independentemente da dimensão organizativa ou da sofisticação dos seus serviços[16]

Em contrapartida, não poderá deixar de se levar em conta que o discernimento do concreto destinatário da fundamentação é um elemento a ser ponderado para se aferir se, sim ou não, a fundamentação lhe propiciou a ele, em concreto a ele e naquelas precisas circunstâncias – e não noutras mais remotas ou abstractas – a formulação de um juízo consciente sobre a conveniência de aceitar ou impugnar, graciosa ou contenciosamente, o acto.

Na verdade, a fundamentação envolve também uma aferição pela sua eficácia, ou seja, pela “impressão do destinatário” – não no sentido de ela dispensar a verificação dos requisitos objectivos da sua verificação (até porque, lembremos, não é somente da protecção dos interesses do destinatário, da “função garantística” da fundamentação, que se trata, estando também em jogo a própria transparência e correcção objectiva do processo decisório, a “função endógena” da fundamentação), nem no sentido psicologista de se remeter a uma indagação dos estados subjectivos de convicção do destinatário (o que seria impossível), mas sim no sentido de essa fundamentação ter a respectiva clareza avaliada pelo padrão do declaratário médio ou do declaratário concreto se este dispuser de mais informação do que o declaratário médio – como resulta do princípio geral consagrado no art. 236º, 1 e 2, do Código Civil.

É aliás esse princípio geral da “impressão do destinatário” que confere autonomia à questão formal da fundamentação, que é essencialmente uma questão de acesso à informação relativa aos motivos que levaram a Administração a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação – e que tem que ser separada dessa outra dimensão material da fundamentação, que se refere à validade substancial do acto, respeitante à correspondência desses motivos à realidade, e à suficiência dessa correspondência para legitimar a concreta actuação administrativa.

Sendo que é no plano formal – demarcando-o por sua vez do tema da notificação, que não se confunde com ele[17] – que se indaga autonomamente sobre o cumprimento do dever de fundamentação, remetendo as questões materiais para a apreciação do mérito.

Como lapidarmente se estabelece numa decisão arbitral,

No caso em apreciação, verifica-se que a Requerida Autoridade Tributária deu a conhecer, através do relatório de inspeção, a fundamentação pela qual, na perspetiva daquela, a Requerente não podia deixar de incluir no valor tributável para efeitos de IVA o valor relativo à subvenção em apreço. [§] Ora, do teor do relatório de inspeção que subjaz à liquidação de IVA e JC, resultam de forma expressa, suficiente e congruente as razões de facto e de direito em que se respalda tal posicionamento da Autoridade Tributária. [§] Se estes pressupostos e razões aportados pela Autoridade Tributária para o relatório inspetivo são ou não substantivamente válidos é questão que tem a ver com o mérito e já não com a forma e que, portanto, se coloca numa outra dimensão de que não cumpre, neste ponto, conhecer. [§] In casu, fica patenteado o critério (mal ou bem) trilhado pela Autoridade Tributária.”[18].

Por outras palavras, tem-se entendido que, no que concerne aos vícios de forma de actos administrativos – como o acto tributário – as irregularidades devem considerar-se como não essenciais desde que seja atingido o objetivo visado pela lei com a sua imposição.

Afigura-se pacífico na jurisprudência, assim, que

não ocorre o vício formal de falta de fundamentação se a própria impugnante expressamente revela ter compreendido perfeitamente o processo lógico e jurídico que conduziu à decisão de tributação, reconhecendo ter percebido os pressupostos concretamente levados em conta pelo autor do acto e as razões por que foram alcançados os valores tributados, denunciando o percurso cognoscitivo e valorativo percorrido[19].

E quando o STA estabelece que “Não vale como fundamentação a motivação apresentada posteriormente à prática do acto, nem a constante de peças instrutórias anteriores para as quais não tenha sido feita remissão, expressa ou implícita.[20], isso equivale a admitir-se que a remissão possa ser implícita, ou seja, decorrente do próprio contexto do acto tributário, ou do qual este emerge.

Admitamos, em contrapartida, que não seria razoável daí inferir que toda a reacção jurídica do contribuinte revelaria, ipso facto, a “impressão do destinatário” demonstrativa da suficiência da fundamentação – até pela elementar razão de que entender uma fundamentação não é aceitar essa fundamentação, nem considerá-la sequer verdadeira, adequada ou completa.

Como já se observou pelo já aludido prisma respeitante à correcção do próprio processo decisório,

o legislador quis que a administração não decidisse imponderadamente, obrigando-a a plasmar na fundamentação as razões da sua opção, de tal modo que a própria administração se aperceba, ao fundamentar, do bem ou mal fundado da sua escolha, a tempo de emendar a mão, se disso for caso, e que o acto se apresente transparente. Isto para concluir que não é decisivo o argumento, aliás, frequente, de acordo com o qual só o facto de o acto ter sido contenciosamente recorrido, com a decorrente imputação de vícios, já demonstra que ele estava devidamente fundamentado[21].

Mas, de acordo com o princípio geral da relevância do conhecimento, pelo declaratário, da vontade real do declarante, como estabelecido no n.º 2 do art. 236.º do Código Civil, não pode ser juridicamente indiferente, para a aferição da suficiência da fundamentação, a conduta do declaratário que seja reveladora da compreensão concreta, real, contextual, daquilo que foi transmitido juntamente com a decisão.

A doutrina afirma-o, aceitando que esteja cumprido o dever de fundamentação se, pela posição que toma e argumentos que utiliza, se evidencia que o contribuinte apreendeu as razões ou motivações, de facto e de direito, do autor do acto[22].

É da “impressão do destinatário”, para pedirmos emprestada a categoria civilística, que se trata neste critério de ponderação quanto ao preenchimento dos requisitos da fundamentação, ao menos na sua teleologia “garantística”; e isso fica perfeitamente plasmado na fórmula canónica da jurisprudência dos tribunais superiores:

Segundo a jurisprudência uniforme deste STA, e atendendo à funcionalidade do instituto da fundamentação dos actos administrativos, ou seja, ao fim instrumental que o mesmo prossegue, um acto estará devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade administrativa, e optar conscientemente entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação[23].

Da co-responsabilização que emerge de uma tal visão “dialógica” sobre a fundamentação, nos termos da qual a decisão final da Administração se vai construindo ao longo de um processo com a participação do contribuinte e em diálogo com ele, resultam corolários que, como dissemos, se encontram ainda insuficientemente explorados, como este que é apontado logo, de forma pioneira:

Na medida em que algum dos sujeitos tomar numa qualquer fase do processo uma posição claramente contraditória com a posição tomada anteriormente no mesmo processo, ele está pelo menos a venire contra factum proprium e a violar o princípio da boa fé[24].

Não se vislumbra, em suma, em que é que os critérios de existência e suficiência da fundamentação, acabados de enunciar em abstracto, não se encontram preenchidos no caso concreto dos presentes autos.

 

IV. 5. A justiça do caso concreto e a vedação da equidade

 

Nas suas alegações, a Requerente desdobra-se em apelos à justiça do caso concreto:

  1. Qualifica o processo como “um exemplo vivo e absurdo de uma tributação ilegal e injusta”.
  2. Sustenta que “a exigência, ilegal e injusta, de um pesado imposto que não é devido – sobretudo quando exigido de sujeitos passivos, sem capacidade contributiva, como é o caso – é mais do que uma ilegalidade. É uma espécie de bullying fiscal de uma máquina poderosa sobre pequenos contribuintes”.
  3. Refere que “o imposto é 12 x mais que o valor da facturação. Mais: o montante do IRC liquidado, adicionalmente pela AT, não é só, superior, em 12 vezes, à facturação do exercício. É, também, superior a todo o volume de facturação da empresa, no conjunto dos últimos 10 anos”.
  4. Alega que “O exorbitante montante deste IRC, relativamente à própria facturação (imagine-se a desproporção face ao lucro tributável!), é fortemente revelador de uma ostensiva violação do princípio da tributação das empresas, fundamentalmente, pelo seu rendimento real”.

Tudo convites à consideração da justiça do caso concreto, à justiça material em torno dos efeitos da liquidação (ainda que escamoteando o facto elementar de que os valores em causa resultam da aplicação da lei àquilo que a própria Requerente contabilizou, sendo bizarro que a Requerente queira abrigar-se, supervenientemente, em argumentos de (in)capacidade contributiva – o que pode até suscitar novas dúvidas quanto à fidedignidade dos valores contabilizados).

Caberia, eventualmente, perguntar: será este resultado, uma vez consolidado na ordem jurídica, materialmente injusto?

Não saberíamos dizê-lo, até pelas deficiências de prova da materialidade subjacente – o que não permite ter certezas sobre aquilo que objectivamente se passou – e se corresponde, ou não, àquilo que foi contabilizado.

Mas, mais importante, não poderíamos dizê-lo, porque a lei no-lo veda, nos termos do art. 2º, 2 do RJAT:

Os tribunais arbitrais decidem de acordo com o direito constituído, sendo vedado o recurso à equidade”.

E é de prevalência da equidade sobre a legalidade estrita que se trataria, se ousássemos embrenhar-nos em considerações de conveniência, de proporção ou de desproporção, ou de oportunidade, mesmo em casos em que a lei incluísse ponderações equitativas na própria norma[25] – como ocasionalmente o faz no Código Civil, por exemplo[26].

O art. 4.º do Código Civil está, portanto, vedado aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, e isto porque

A resolução dos casos segundo a equidade contrapõe-se à resolução dos casos segundo o direito estrito. Pode haver regras e haver equidade, quando o juiz estiver autorizado a afastar-se da solução legal e a decidir de harmonia com as circunstâncias do caso concreto[27].

Assim, não cabe a este tribunal ponderar, na sua decisão, “razões de conveniência e de oportunidade, principalmente de justiça concreta, em que a equidade se funda[28].

Isto mesmo que, em concreto, não se trate de corrigir uma norma inadequada, ou de afastar o critério legal, ou de testar os limites da plasticidade decisória, mas tão-somente de utilizar o ex aequo et bono como “instrumento de concretização de uma determinada quantificação, mediante a ponderação das circunstâncias do caso concreto[29].

Aliás, mesmo que a equidade estivesse autorizada pelo RJAT, isso não quer dizer que a decisão fosse necessariamente diversa daquela que, em estrito acatamento do direito constituído, este Tribunal toma, porque, na decisão de qualquer tribunal, em qualquer jurisdição,

a prevalência da equidade sobre a legalidade estreita, nas providências que o tribunal tome, não vai obviamente ao ponto de se permitir a postergação de normas imperativas aplicáveis à situação[30].

Em suma, também neste ponto não é possível atender às pretensões da Requerente.

 

Foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, ou cuja apreciação seria inútil (como o são, manifestamente, as alusões a inconstitucionalidades, que aparecem subordinadas aos apelos à equidade, aos quais não podemos atender) – art. 608.º do CPC, ex vi art. 29º, 1, e) do RJAT.

 

V. Decisão

 

Nos termos expostos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo na ordem jurídica a liquidação impugnada;
  2. Absolver do pedido a Autoridade Tributária e Aduaneira;
  3. Condenar a Requerente no pagamento das custas do processo.

 

VI. Valor do processo

 

Fixa-se o valor do processo em €148.015,56 (cento e quarenta e oito mil e quinze euros e cinquenta e seis cêntimos), nos termos do disposto no art.º 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi art.º 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e art.º 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

VII. Custas

 

Custas no montante de € 3.060,00 (três mil e sessenta euros) a cargo da Requerente (cfr. Tabela I, do RCPAT e artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, do RJAT).

 

Lisboa, 16 de Setembro de 2024

 

Os Árbitros

 

Fernando Araújo

 

Jorge Bacelar Gouveia

 

 

Jónatas Eduardo Mendes Machado

 



[1] J.L. Saldanha Sanches & João Taborda da Gama, “Audição-Participação-Fundamentação: A Co-Responsabilização do Sujeito Passivo na Decisão Tributária”, in Homenagem José Guilherme Xavier de Basto, p. 290.

[2] Acórdão do TCA-Sul de 4 de Dezembro de 2012, Processo nº 6134/12. Processos n.º 394/2014-T, n.º 703/2016-T, n.º 543/2017-T e n.º 10/2018-T do CAAD.

[3] Acórdão do STA de 6 de Fevereiro de 1991 (sublinhado nosso).

[4] Processo n.º 30/2012-T do CAAD.

[5] Acórdão do STA, Processo n.º 667/10; Proc. nº 109/2012 –T do CAAD.

[6] Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária. Anotada e Comentada, anotação ao art. 77º da LGT.

[7] Processo nº 131/2012 - T do CAAD.

[8] J.L. Saldanha Sanches & João Taborda da Gama, “Audição-Participação-Fundamentação: A Co-Responsabilização do Sujeito Passivo na Decisão Tributária”, in Homenagem José Guilherme Xavier de Basto, pp. 295ss., 304.

[9] Processo n.º 120/2015 -T do CAAD.

[10] Processo n.º 124/2015 - T do CAAD.

[11] Paulo Marques e Carlos Costa, A Liquidação de Imposto e a Sua Fundamentação, pp. 146ss.; Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e de Processo Tributário, 3.ª ed., pp. 113ss.. (sublinhado nosso)

[12] Acórdão do STA, de 17 de Novembro de 2010, Proc. n.º 01051/09; Processos n.º 394/2014 -T e n.º 10/2018-T do CAAD.

[13] J.L. Saldanha Sanches & João Taborda da Gama, “Audição-Participação-Fundamentação: A Co-Responsabilização do Sujeito Passivo na Decisão Tributária”, in Homenagem José Guilherme Xavier de Basto, p. 291.

[14] Acórdão do STA de 17 de Junho de 2009, Proc. n.º 0246/09. No mesmo sentido, os Acórdãos do TCA-Sul de 28 de Fevereiro de 2012, Proc. nº 4893/11, e de 16 de Novembro de 2004, Proc. nº 879/03.

[15] A fundamentação abrangerá tanto actos favoráveis como desfavoráveis para o contribuinte: “Esta exigência compreende-se em face da pluralidade de razões que impõem a exigência de fundamentação dos actos administrativos, que vão desde a necessidade de possibilitar ao administrado a formulação de um juízo consciente sobre a conveniência ou não de impugnar o acto, até à garantia da transparência e da ponderação da actuação da administração e à necessidade de assegurar a possibilidade de controle hierárquico e jurisdicional do acto” - Diogo Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada, 4ª ed., 675-676.

[16] Processo n.º 116/2012-T do CAAD.

[17] Estabelece-o o Supremo Tribunal Administrativo: “Como este Supremo Tribunal tem vindo a dizer, uma coisa é a fundamentação do acto e outra é a comunicação desses fundamentos ao interessado: enquanto aquela constitui um vício susceptível de determinar a anulação do acto que dela padeça, o incumprimento ou cumprimento defeituoso do dever de comunicação dos fundamentos não se podem reflectir na validade do acto comunicando” – Acórdão do STA de 16 de Novembro de 2016, Proc. n.º 0954/16.

[18] Processo n.º 338/2015-T do CAAD. E acrescenta-se nesse mesmo acórdão: “A fundamentação que o nosso ordenamento jurídico impõe como condição de validade do acto que se destine a suportar, reveste tão só uma dimensão formal, que não uma dimensão substancial e consubstancia-se na explanação dos motivos aptos a suportarem a decisão final.”

[19] Acórdão do STA de 30 de Janeiro de 2013, Proc. nº 0105/12.

[20] Acórdão do STA de 19 de Maio de 2004, Proc. nº 0228/03 (sublinhado nosso).

[21] Acórdão do TCA-Sul de 28 de Fevereiro de 2012, Proc. nº 4893/11.

[22] Diogo Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária – Comentada e Anotada, 3ª ed., pp. 381-382.

[23] Acórdão do STA de 2 de Dezembro de 2010, Processo n.º 0554/10.

[24] J.L. Saldanha Sanches & João Taborda da Gama, “Audição-Participação-Fundamentação: A Co-Responsabilização do Sujeito Passivo na Decisão Tributária”, in Homenagem José Guilherme Xavier de Basto, p. 302

[25] Cordeiro, António Menezes (1990), “A Decisão segundo a Equidade”, O Direito, 122/2, 270.

[26] Entre outros, artigos 72º, 283º, 339º, 2, 400º, 437º, 1, 462º, 489º, 1, 494º, 496º, 3, 566º, 3, 812º, 992º, 3, 993º, 1, 1158º, 2, 1215º, 2, 1407º, 2, 1675º, 3 e 2016º, 3.

[27] Ascensão, José de Oliveira (2008), O Direito - Introdução e Teoria Geral, 13.ª ed., Coimbra, Almedina, 247.

[28] Lima, Pires de & Antunes Varela (1987), Código Civil Anotado, 4.ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, I, 54.

[29] Ascensão, José de Oliveira (2008), O Direito - Introdução e Teoria Geral, 13.ª ed., Coimbra, Almedina, 251.

[30] Varela, João de Matos Antunes, J. Miguel Bezerra & Sampaio e Nora (1985), Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 72.