SUMÁRIO:
1. A competência dos tribunais arbitrais limita-se, nos termos do artigo 2.º, n.º 1do RJAT, à apreciação das pretensões de declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta. O presente Tribunal Arbitral não tem competência para se pronunciar sobre atos subsequentes a autónomos dos atos de liquidação de CSR.
2. A Requerente é parte ilegítima para questionar os atos de liquidação da CSR praticados pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela sua Fornecedora de Combustíveis, porque só a entidade responsável pela introdução dos produtos no consumo e pelo pagamento da CSR, tem legitimidade para solicitar a anulação das referidas liquidações com fundamento em erro e consequente reembolso do montante correspondente, conforme o artigo 16.º do CIEC.
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DECISÃO ARBITRAL
1. Relatório
1.1. A..., S.A., com o NIPC..., com sede na Rua ..., ...-... ..., Braga (doravante, “Requerente”) apresentou pedido de pronúncia arbitral para a apreciação dos atos de liquidação de CSR e dos consequentes atos de repercussão, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa apresentado em 13 de dezembro de 2022, junto da Alfândega de Aveiro, relativo às liquidações de Contribuição de Serviço Rodoviário (“CSR”) praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas Declarações de Introdução no Consumo (“DIC”) submetidas pela B..., S.A., (doravante, “fornecedora de combustíveis”) e, bem assim, relativo aos consequentes atos de repercussão da referida CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário àquela adquiridos pela Requerente durante os anos de 2020 e de 2021, apresentou, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 3.º-A, n.º 2, e 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária.
Concretizou o seu pedido do seguinte modo: “a declaração de ilegalidade dos atos de repercussão da CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquiridos pela Requerente no decurso dos anos de 2020 e 2021, bem assim das correspondentes liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela respetiva fornecedora de combustíveis, determinando-se, nessa medida, a anulação, com demais consequências legais, designadamente o reembolso à Requerente de todas as quantias suportadas a esse título acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios”.
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, AT.
1.2. Do requerimento da AT anterior à constituição do Tribunal Arbitral
Em 06-06-2023 a Requerida apresentou um Requerimento dirigido ao Exmo. Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa com o seguinte teor:
“A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT), notificada em 26/04/2023 do pedido de constituição de tribunal arbitral no processo supramencionado, apresentado por “A..., S.A.”, vem informar, que analisado o pedido não detetou a identificação de qualquer ato tributário. Identificação que, aliás, também não consta da plataforma do Centro de Arbitragem Tributária.
Tendo em conta, que
a) a competência dos tribunais arbitrais, que funcionam no CAAD, abrange exclusivamente a apreciação direta da legalidade de ato(s) de liquidação ou de ato(s) de segundo ou terceiro grau que tenham por objeto a apreciação da legalidade de ato(s) daquele tipo, conforme decorre do artigo 2.º, n.º 1, do RJAT e como se depreende das referências expressas que se fazem no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT ao n.º 2 do artigo 102.º do CPPT, e que,
b) sem a identificação, por parte dos interessados, do ato tributário, cuja ilegalidade invoca, o dirigente máximo da AT não pode exercer a faculdade prevista no artigo 13.º do RJAT.
Solicita-se que seja(m) identificado(s) os atos de liquidação cuja legalidade o requerente pretende ver sindicada, entendendo-se que o termo inicial do prazo para o exercício da faculdade prevista no artigo 13º do RJAT só ocorre após a notificação da identificação, em concreto, do(s) ato(s) de liquidação cuja ilegalidade é suscitada.”
Em 04-07-2023, o Tribunal Arbitral proferiu o seguinte despacho:
“Considerando o princípio da colaboração, e o disposto no artigo 590.º, n.ºs 2, alínea b), 3 e 4, do CPC do CPC ex vi artigo 29.º, n.º 1 d) do RJAT convida-se a Requerente para que no prazo de 10 dias aperfeiçõe o PPA, indicando nomeadamente os atos tributários que constituem o objeto mediato do PPA, identificando devidamente os atos de liquidação cuja legalidade a Requerente pretende ver sindicada e esclareça os factos que constituem o fundamento do PPA, dentro dos limites estabelecidos no citado artigo 590.º do CPC.”
Em Resposta, a sociedade Requerente apresentou requerimento em que alega:
“(...) todos os atos tributários cuja legalidade se contesta no âmbito do presente processo são passiveis de ser identificados através do pedido de pronúncia arbitral, dos documentos juntos pela Requerente e da plataforma do Centro de Arbitragem Tributária, estando a Requerida, por conseguinte, em totais condições de exercer todas as faculdades que lhe assistem, nomeadamente a prevista no artigo 13.º do RJAT.
Assim, no âmbito específico da CSR, as fornecedoras de combustíveis entregam ao Estado, enquanto sujeitos passivos da respetiva relação jurídico-tributária, os valores apurados nos atos de liquidação conjunta de ISP e de CSR praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira com base nas Declarações de Introdução no Consumo («DIC») por aquelas submetidas.
Neste contexto, emergem no âmbito da CSR, necessariamente, duas tipologias distintas de atos tributários:
i) os atos de liquidação de CSR, emitidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira com base na DIC apresentada pela fornecedora de combustível, na sequência dos quais esta entrega ao Estado o imposto aí apurado; e
ii) os atos de repercussão da CSR assim liquidada, corporizados nas faturas emitidas pela fornecedora de combustíveis (sujeito passivo da relação jurídico tributária) aos consumidores de combustível (os terceiros repercutidos sobre os quais deve legalmente recair o encargo económico deste imposto).
Assim, confrontando a identificada formulação legal da CSR com o pedido de pronúncia arbitral, verifica-se que a Requerente, entidade terceira sobre a qual a CSR foi legalmente repercutida, veio, através da presente ação arbitral - proposta na sequência da presunção de indeferimento tácito do pedido de promoção de revisão oficiosa apresentado junto da Alfândega de Aveiro -, contestar, em primeiro lugar, a legalidade dos referidos atos de repercussão da CSR (corporizados nas faturas que lhe foram emitidas pela fornecedora de combustível), e, em segundo lugar, em face da existente correlação causal entre os dois tipos de atos acima indicados, a legalidade dos antecedentes atos de liquidação de CSR (praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira e notificados, tão somente, à referida entidade repercutente), atos que estão na origem daquelas repercussões e sem os quais as mesmas não existiriam.
Significa o que antecede, portanto, que o objeto da presente ação arbitral comporta:
i) primordial e autonomamente, os atos de repercussão de CSR ínsitos nas faturas emitidas pela fornecedora do combustível adquirido pela Requerente;
e, bem assim, em face da correlação existente entre os dois tipos de atos acima identificados,
ii) as liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base e na sequência das DIC submetidas pela referida empresa fornecedora de combustível, ou seja, os atos de liquidação de CSR que deram origem aos atos de repercussão contestados (e sem as quais estes não existiriam).
Posto isto, sublinhe-se, então, que a Requerente juntou aos autos as faturas emitidas pela fornecedora do combustível por si adquirido - que corporizam os atos de repercussão cuja legalidade aqui se contesta (cf. documento 2 junto com o pedido pronúncia arbitral) - e, bem assim, uma listagem com todos os elementos identificativos de tais faturas (cf. documento 1 junto com o pedido pronúncia arbitral).
Consequentemente, no que aos atos de repercussão da CSR diz respeito - objeto principal do presente processo arbitral - nenhuma dúvida subsiste de que os mesmos se encontram plena e devidamente identificados, não sendo, ao que se julga, necessário tecer maiores considerações sobre esta concreta matéria.
Já no que se refere aos atos de liquidação de CSR, recorda-se que os mesmos foram praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira e notificados tão somente à fornecedora de combustível (enquanto sujeito passivo da relação tributária), não tendo a Requerente (terceira repercutida), por conseguinte, acesso aos mesmos.
Assim, além de não se encontrem na posse de tais atos de liquidação de CSR, a Requerente desconhece em absoluto - e não tem como conhecer - os elementos identificativos dos mesmos, sendo-lhe, por isso, impossível proceder à sua junção ou à sua específica identificação.
Com efeito, sendo a Autoridade Tributária e Aduaneira a autora das liquidações de CSR, é esta quem está, na verdade, em condições de identificar os atos de liquidação de CSR pressupostos pelos atos de repercussão que constituem o objeto do presente pedido, cabendo-lhe, portanto, através dos meios ao seu dispor e ao abrigo dos respetivos poderes de indagação, averiguar a correlação entre os identificados atos de repercussão da CSR e o imposto liquidado, e, assim, proceder à específica identificação dos atos de liquidação de CSR aqui em causa (promovendo, nessa sequência, a sua junção aos presentes autos – tal como, aliás, vem requerido no pedido de pronúncia arbitral).
Mais: ainda que a Requerida assim não proceda, a situação processual da Requerente não pode, em todo o caso, sair prejudicada pelo facto de não lhe ser possível apresentar uma prova documental específica a que não pode ter acesso.
(...) Dito de outro modo, a situação fiscal do contribuinte não pode ser agravada pelo facto de não lhe ser possível apresentar uma prova documental específica a que não pode ter acesso, quando a Autoridade Tributária se absteve de obter essa mesma prova pelos seus próprios meios» (cf. decisão arbitral de 14 de junho de 2021, proferida no processo n.º 467/2020).
Em suma, em situações como a presente, em que a Requerente suporte o imposto por via do mecanismo da repercussão legal e em que, atento esse contexto, não tenha na sua posse os respetivos atos de liquidação, desconhecendo, portanto, em absoluto, os elementos identificativos dos mesmos, caberá à Autoridade Tributária e Aduaneira (a aqui Requerida), através dos meios ao seu dispor e ao abrigo dos respetivos poderes de indagação, averiguar a correlação entre os respetivos atos de repercussão legal (in casu, devidamente identificados pela Requerente) e os atos de liquidação de CSR que os antecedem e que estão na sua origem, não podendo, em todo o caso, a situação processual da Requerente sair prejudicada pelo referido facto de não lhe ser possível apresentar uma prova documental específica a que não pode ter acesso.
Em conclusão:
i) Os atos de repercussão de CSR (e que constituem os principais atos objeto do presente processo arbitral) foram juntos aos autos com o pedido de pronúncia arbitral, encontrando-se os mesmos, por conseguinte, total e perfeitamente identificados pela Requerente;
ii) A Requerente, atenta a sua qualidade de entidade terceira repercutida, não tem acesso aos atos de liquidação de CSR (praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira e notificados tão somente à fornecedora de combustível), sendo-lhe, por isso, impossível proceder à sua junção ou à sua específica identificação;
iii) Contrariamente ao que sucede com a Requerente, é a Requerida que está em condições de proceder à concreta identificação de tais atos de liquidação de CSR, recaindo sobre a mesma, por conseguinte, esse ónus de identificação;
iv) A situação processual da Requerente não pode, em todo o caso, sair prejudicada pelo referido facto de não lhe ser possível apresentar uma prova documental específica a que não pode ter acesso.”
1.3. Tramitação processual
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 24-04-2023.
Os Árbitros designados em 12-06-2023 pelo Conselho Deontológico do CAAD aceitaram as designações.
Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 12-06-2023.
Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 30-06-2023.
A AT apresentou Resposta em que suscitou as exceções da Ineptidão da Petição Inicial - Da falta de objeto, da ilegitimidade da Requerente, da Incompetência relativa do Tribunal Arbitral e Incidente de intervenção provocada
Por despacho de 27-11-2023 foi decidido dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e alegações, com possibilidade de as Requerentes responderem às exceções.
A Requerente pronunciou-se sobre as exceções.
Requerente e Requerida apresentaram alegações escritas e a Requerente respondeu às exceções.
A 29-11-2023 a Requerente apresentou um Requerimento em que pediu a junção de uma declaração emitida pela B..., S.A, (B...) com o seguinte teor:
“B..., S.A., pessoa coletiva n.º ..., com sede em..., ..., ...-... ..., pela presente declara, para os devidos efeitos que “todos os impostos e taxas” por si entregues, na qualidade de revendedor de combustíveis, por referência ao combustível fornecido à empresa A.., S.A., pessoa coletiva n.º ..., foi por si integralmente repercutida na esfera da referida empresa.”
Na mesma data o Tribunal Arbitral proferiu um despacho arbitral notificando a AT para se pronunciar.
Em 05-12-2023 a Requerida apresentou um requerimento em que requereu o desentranhamento do documento junto em 29-11-2023.
Em 15-01-2024 a Requerida veio juntar a decisão arbitral no Processo 408/2023-T, e em 08-02-2024 a decisão arbitral proferida em 01-02-2024 proferida a decisão arbitral no Processo 332/2023-T.
2. Pressupostos processuais
Primeiro, porém, importa decidir sobre a juncão aos autos do documento apresentado pela Requerente no dia 29 de novembro de 2023 e dos documentos juntos pela Requerida em 17-01-2024 e 08-02-2024.
A declaração da sociedade B... limita-se a declarar que repercutiu no preço a Contribuição de Serviço Rodoviário, sem identificar as DICs e as liquidações a montante, nem em que períodos, no caso em que diz ter atuado como sujeito passivo de ISP/CSR, o que permitiria a respetiva conexão aos atos tributários que constituem objeto deste processo arbitral;
Considera este Tribunal Arbitral que a declaração emitida pela sociedade B... SA., não pode ser considerada como prova bastante para provar os factos alegados pela Requerente, designadamente que o sujeito passivo de ISP/CSR repercutiu a jusante a CSR que, alegadamente, foi “repassada” à Requerente.
Atendendo a que o n.º 2 do artigo 423.º do CPC consente a juncão de documentos “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” (ainda que sujeita à aplicação de uma multa, que seria de duvidosa aplicação na jurisdição arbitral), entende o Tribunal que, até pela sua nula importância para a solução do caso, nada de fundamental obsta à possibilidade de manter nos autos tal documento, em benefício do escrutínio público – e eventualmente jurisdicional – da presente decisão.
Quanto à junção das decisões arbitrais pela Requerida, entende o Tribunal que se trata de documentos disponíveis em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/, assim como muitas outras decisões arbitrais sobre os temas em análise neste processo, pelo que também nada obsta à sua manutenção nos autos.
3. Saneamento
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e estão regularmente representadas, em conformidade com o disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e nos artigos 1.º a 3.º da n.º 112- A/2011, de 22 de Março (Portaria de Vinculação).
Para efeitos de saneamento do processo há que apreciar as exceções invocadas pela Requerida, o que se fará infra.
4. Matéria de facto
4.1. Factos provados
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A Requerente é uma sociedade de Direito português com sede em Braga.
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Nos anos de 2020 e 2021 a Requerente, adquiriu à referida fornecedora de combustíveis, 2.774.232 litros de gasóleo rodoviário; (cfr. faturas - doc. 2 juntos com o PPA).
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A Requerente em 28-11-2023 juntou aos autos a declaração da B... SA.
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A Requerente apresentou em 13 de dezembro de 2022, junto da Alfândega de Aveiro pedido de revisão oficiosa com vista à anulação das referidas liquidações de CSR e dos consequentes atos de repercussão consubstanciados nas faturas emitidas pela fornecedora de combustíveis referentes ao gasóleo rodoviário à mesma adquirido pela Requerente do decurso dos anos de 2020 e de 2021; (cfr. Doc. 3 junto com o PPA).
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A AT até à data não decidiu o pedido de revisão oficiosa; (cfr. PA).
4.2. Factos não provados
Consideram-se não provado que:
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A fornecedora de combustíveis, a sociedade B..., entregou ao Estado, enquanto sujeito passivo da respetiva relação jurídico-tributária, os valores apurados nos atos de liquidação conjunta de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISP) e de CSR praticados pela Autoridade Tributária e Aduaneira com base nas DIC por aquela submetida.
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A mencionada fornecedora de combustíveis repercutiu nas respetivas faturas a CSR correspondente a cada um desses consumos, nem que a Requerente tenha suportado integralmente este imposto.
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Com a aquisição do referido combustível, a Requerente suportou a título de CSR, a quantia global de € 307.939,75.
4.3. Motivação da matéria de facto
O juiz (ou o árbitro) não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria de facto alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa à decisão, tendo em conta a causa de pedir que suporta o pedido formulado pelo autor, e decidir se a considera provada ou não provada (artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, a) e), do RJAT).
Por outro lado, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal deve basear a sua decisão em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas e da envolvência.
O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição inicial e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a Resposta.
Assim, e tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, o como prevê̂ o artigo 110.º do CPPT, a prova documental produzida, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
5. Das exceções
Nos presentes autos a Requerente invocando a qualidade de repercutida legal pede a declaração de ilegalidade:
- dos atos de repercussão da Contribuição de Serviço Rodoviário consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente à B..., S.A., nos anos de 2020 e 2021, e
- das subjacentes liquidações de CSR praticadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
A Requerida na Resposta invoca várias exceções que, a proceder alguma, obstam ao conhecimento do pedido – e que, por isso, são de decisão prévia e antecedente:
- Ineptidão da Petição inicial - Da falta de objeto;
- Da ilegitimidade da Requerente;
- Incompetência relativa do Tribunal Arbitral;
- Incidente de intervenção provocada.
Das exceções que se apreciarão previamente, começamos por analisar a exceção de incompetência relativa do Tribunal Arbitral, de harmonia com o disposto no artigo 13.º do CPTA, subsidiariamente aplicável, por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, porém não antes de determinar a natureza jurídica da CSR, relevante para determinar a competência material deste tribunal.
5.1. Da natureza jurídica da CSR
A Contribuição de Serviço Rodoviário (CSR) foi criada pela Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, e entrou em vigor em 01-01-2008. Teve alterações introduzidas pelas Lei n.ºs 67-A/2007, de 31 de dezembro, 64-A/2008, de 31 de dezembro, 64-B/2011, de 30 de dezembro, 66-B/2012, de 31 de dezembro, 83-C/2013, de 31 de dezembro, 82-B/2014, de 31 de dezembro, 7-A/2016, de 30 de março, sendo substituída pela “Consignação de serviço rodoviário”, pela Lei n.º 24-E/2022, de 30 de dezembro.
Considerando o disposto no artigo 1.º e no artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 55/2007, a CSR visava financiar a rede rodoviária nacional a cargo da Infraestruturas de Portugal, IP, S.A., constituindo a contrapartida pela utilização da rede rodoviária nacional, tal como esta é verificada pelo consumo dos combustíveis.
Como determina o artigo 5.º, n.º 1 da Lei n.º 55/2007, em vigor à data dos factos, a CSR é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP), estando estes identificados no artigo 4.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo (CIEC).
O Código dos Impostos Especiais de Consumo, na redação aplicável ao caso em concreto, define como sujeito passivo:
“Artigo 4.º - Incidência subjetiva
1 - São sujeitos passivos de impostos especiais de consumo:
a) O depositário autorizado e o destinatário registado;
(...).
Na tributação dos produtos petrolíferos e energéticos era aplicada uma taxa de ISP, a que acrescia o montante legalmente estabelecido a título de CSR.
O artigo 7.º da Lei 55/2007 determina que “As taxas do ISP são estabelecidas por portaria conjunta nos termos do Código dos Impostos Especiais de Consumo, por forma a garantir a neutralidade fiscal e o não agravamento do preço de venda dos combustíveis em consequência da criação da contribuição de serviço rodoviário.”.
Nos termos do artigo 7.º, n.º 1 do CIEC o facto gerador do ISP consiste: “A produção em território nacional dos produtos a que se refere o artigo 5.º”; “A entrada em território nacional, quando provenientes de outro Estado -Membro, dos produtos a que se refere o artigo 5.º, ainda que irregular”; e a “A importação dos produtos a que se refere o artigo 5.º, ainda que irregular”.
Os IEC, como o ISP, são exigíveis, conforme decorre do artigo 8.º do CIEC no momento da introdução no consumo de produtos sujeitos a imposto ou da constatação de perdas que devam ser tributadas em conformidade com o referido Código.
É considerando como introdução no consumo os factos descritos no n.º 1 do artigo 9.º, designadamente a saída dos produtos do regime de suspensão, a detenção e armazenagem fora do regime de suspensão sem pagamento do imposto, a produção fora do regime de suspensão, a importação, a entrada dos produtos no território nacional, ainda que em situação irregular, a cessação ou violação dos pressupostos de um benefício fiscal.
A introdução no consumo - é formalizada através da Declaração de Introdução no Consumo (DIC), processada por transmissão eletrónica de dados (e-DIC), cfr. artigo 10.º do CIEC.
De acordo artigo 10.º-A do CIEC, com as introduções no consumo efetuadas num determinado mês pelos sujeitos passivos que detenham um dos estatutos previstos CIEC são globalizadas no mês seguinte, numa única liquidação, processada de forma automática.
Nos termos dos artigos 11.º 2 12.º do CIEC os sujeitos passivos são notificados da liquidação do imposto, até ao dia 15 do mês da globalização, devendo aquele ser pago até ao último dia útil do mês em que foi notificada a liquidação.
Como é afirmado no preâmbulo, a CSR é atribuída pelo legislador a finalidade de financiar a Empresa Infraestruturas de Portugal I.P.
Uma vez descrito o regime jurídico da CSR, importa analisar se é um imposto, uma taxa ou uma contribuição especial.
Por concordamos com o que se afirma no Acórdão do STA, 2.ª Sec. de 04-07-2018, proferido no Processo n.º 01102/17, transcrevemos:
“(...) Dando por adquiridas as inúmeras reflexões doutrinárias e jurisprudenciais produzidas sobre a matéria atinente à distinção entre imposto e taxa [ou seja, que ambos constituem receitas públicas coactivamente impostas, mas enquanto o imposto «... é uma prestação pecuniária, coactiva e unilateral, sem carácter de sanção, exigida pelo Estado com vista à realização de fins públicos» (Cfr. Teixeira Ribeiro, Lições de Finanças Públicas, Coimbra, 1977, p. 262.) a taxa tem «carácter sinalagmático, não unilateral, o qual por seu turno deriva funcionalmente da natureza do facto constitutivo das obrigações em que se traduzem e que consiste ou na prestação de uma actividade pública ou na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares» (Cfr. Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, Lisboa, 1981, p. 42.) pressupondo, pois, uma contraprestação por parte do ente público que a exige, a verificar-se na respectiva génese, e que deve concretizar-se naquela prestação de serviço público, naquele acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção do obstáculo jurídico à actividade do particular] (Cfr. Casalta Nabais, Contratos Fiscais, Coimbra 1994, 236.) ressalta na definição legal e doutrinal da taxa a individualização de um aspecto estrutural da mesma (a supra apontada sinalagmaticidade ou bilateralidade) e, em consequência, os respectivos pressupostos da sua cobrança. (...)
Salientamos também, o decidido no Acórdão do TC n.º 232/2022 de 31-03-2022, Proc. 105/22, relator J.E. Figueiredo Dias:
“Esta linha divisória estabelece-se entre a existência ou não de um nexo de bilateralidade/causalidade entre o Estado e o sujeito passivo do tributo, ou seja, apenas se podem qualificar como contribuições financeiras a favor de entidades públicas os tributos que se possam reconduzir a uma prestação pecuniária coativa destinada a compensar prestações administrativas aproveitadas (bilateralidade) ou provocadas (causalidade) pelos respetivos sujeitos passivos (...)”
De mencionar também a posição do Tribunal de Contas, na Conta Geral do Estado de 2008, que afirma:
“Face ao conteúdo normativo das disposições legais aplicáveis aos vários aspectos de que se reveste a problemática da contribuição de serviço rodoviário e tendo em conta os artigos 103.º, 105.º e 106.º da Constituição, a Lei de enquadramento orçamental e a legislação fiscal aplicável, o Tribunal de Contas considera que a contribuição de serviço rodoviário tem as características de um verdadeiro imposto ou, pelo menos, que dada a sua natureza não pode deixar de ser tratada como imposto pelo que, sendo considerada como receita do Estado, não pode deixar de estar inscrita no Orçamento do Estado, única forma de o Governo obter autorização anual para a sua cobrança.
Com efeito, a contribuição de serviço rodoviário é devida ao Estado, na medida em que é este o sujeito activo da respectiva relação jurídica tributária, pelo que os princípios constitucionais e legais da universalidade e da plenitude impõem a inscrição da previsão da cobrança da sua receita na Lei do Orçamento do Estado de cada ano.
(...)
Face ao exposto, não se antevê suporte legal bastante, face à Constituição e à lei, para a contribuição de serviço rodoviário ser paga directamente a uma sociedade anónima, sem passar pelo Orçamento do Estado. Para além disso, o Tribunal de Contas não pode deixar de assinalar que esta situação leva a uma saída de receitas e despesas da esfera orçamental e, por consequência, da sua execução, o que conduz à degradação, nesta sede, do âmbito do controlo das receitas e despesas públicas.”
Conclui este Tribunal Arbitral que a Contribuição de Serviço Rodoviário é um imposto indireto.
5.2. Da incompetência do Tribunal Arbitral relativa do tribunal arbitral em razão da matéria
A AT suscita a questão da incompetência relativa do tribunal arbitral em razão da matéria por considerar, que não se encontra verificada a habitabilidade do thema decidendum e respetiva competência deste tribunal arbitral para a apreciação do presente litígio. Entende que a contribuição de serviço rodoviário deve ser qualificada como contribuição especial, e não como imposto, encontrando-se excluída da arbitragem tributária, por força do disposto nos artigos 2.º e 3.º do RJAT e do artigo 2.º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março.
Na resposta à matéria de exceção, a Requerente defendeu, a improcedência desta exceção:
“(...)
Porém, infirmando a indicada exceção de incompetência alegada pela AT, importa recordar que está em causa nos presentes autos a apreciação da ilegalidade de atos tributários de repercussão de CSR decorrentes da aplicação de um regime - o da CSR - comprovadamente desconforme com o direito da União, nos termos já decretados pelo TJUE.
No caso concreto, contrariamente ao que vem pressuposto nos artigos 119.º a 133.º da resposta da AT, a Requerente não visa através da presente ação arbitral a impugnação (ou, mais concretamente, a declaração da invalidade) de quaisquer atos legislativos, mas, tão-somente, suscitar a (in)validade dos atos de repercussão de CSR praticados à luz de um regime comprovadamente desconforme com o direito da União (o regime da CSR), configurando este um caso paradigmático de ilegalidade abstrata suscetível de ser apreciado por qualquer Tribunal, entre os quais o presente Tribunal Arbitral.”
É esta a questão que cabe agora analisar.
A competência dos tribunais arbitrais a constituir no âmbito do CAAD está estabelecida no artigo 2.º do RJAT, Portaria n.º 112-A/2011, e abrange nos temos do n.º 1 a) a “declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;”, porém o n.º 2 circunscreveu – ao menos literalmente – tal vinculação às “pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida”.
A Portaria de Vinculação limita deste modo a competência dos Tribunais Arbitrais usando o termo impostos e não tributos.
Como concluído em 5.1., que a CSR é um imposto não procede a exceção alegada da Requerida que parte do pressuposto que a contribuição de serviço rodoviário deve ser qualificada como contribuição especial, e não como imposto, encontrando-se excluída da arbitragem tributária, por força do disposto nos artigos 2.º e 3.º do RJAT e do artigo 2.º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março.
Porém, para se concluir pela competência material deste Tribunal Arbitral temos ainda de analisar os concretos pedidos da Requerente e verificar a sua inclusão ou não nas normas de competência previstas no RJAT e da Portaria de Vinculação.
Entendemos, e com respaldo na doutrina e jurisprudência relevante, que os atos de repercussão não são atos tributários em sentido lato, porque neles não é realizada qualquer atividade de apuramento da matéria tributável, quer pela Administração Tributária e Aduaneira quer por um particular.
Também não são atos tributários de liquidação stricto sensu, pois não consistem na determinação da obrigação tributária, não a tornam certa e exigível através da aplicação da taxa à matéria coletável previamente determinada.
Concordamos com a afirmação de SÉRGIO VASQUES, Manual de Direito Fiscal, 2.ª edição, Almedina, 2019, pág. 399, ao afirmar que os atos de repercussão consistem “(...) na transferência do peso económico de um tributo para pessoa diferente do sujeito passivo e com quem este está em relação, através da sua integração no preço de um qualquer bem”.
Assim, entende-se que os atos de repercussão não se podem subsumir nas previsões do artigo 2.º do RJAT, o que dita a incompetência dos Tribunais Arbitrais.
Este é o entendimento que vem sendo seguido por parte da jurisprudência arbitral, que se pronunciou sobre esta questão.
Porque concordamos, citamos com a devida vénia a decisão arbitral proferida em 01-02-2024, no processo n.º 296/2023-T:
“Como os Colectivos que decidiram os processos n.ºs 408/2023-T e 375/2023-T, o presente Tribunal arbitral entende que não tem competências para apreciar directamente – e sem mais – actos de repercussão. Ainda que se possam integrar numa relação tributária complexa, tais actos ocorrem a jusante dos actos de liquidação e a competência que o legislador atribuiu aos tribunais arbitrais esgota-se – no que ao caso importa – na sindicância dos actos de liquidação. Isso decorre directamente das normas legais, mas corresponde também ao ensinamento da doutrina: Alberto Xavier, distinguindo a substituição tributária da repercussão, escrevia que nesta temos “um devedor de imposto, que é do mesmo passo contribuinte, e um terceiro que não desempenha qualquer papel na obrigação tributária.
Para Leite de Campos/Benjamim Rodrigues/Lopes de Sousa, entre o terceiro repercutido “e o sujeito activo não existe vínculo jurídico, no sentido de que o repercutido não é devedor do sujeito activo. A sua obrigação não nasce da realização do facto tributário, mas sim da realização de um facto ao qual a lei liga o direito de o sujeito passivo de repercutir e a correlativa obrigação do repercutido de reembolsar o sujeito passivo quando este exerça o seu direito. Daqui decorre, nomeadamente, que as relações entre o sujeito passivo e o repercutido inadimplente se regem pelo Direito privado.”
Sendo isso assim em tese geral, face ao elenco das competências dos tribunais arbitrais constituídos no âmbito do CAAD, e que constam dos artigos 2.º a 4.º do RJAT, nem sequer é preciso discutir a natureza jurídica desses actos de repercussão porque, qualquer que seja, não estão contemplados na única potencial norma atributiva de competência a este Tribunal: a da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT: “A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;”. Quer dizer que este Tribunal se declara liminarmente incompetente para apreciar o primeiro pedido da Requerente (declarar a ilegalidade dos actos de repercussão da CSR consubstanciados nas facturas referentes ao gasóleo rodoviário e à gasolina adquiridos pela Requerente).”.
Pelo exposto, declara-se o presente Tribunal Arbitral incompetente para conhecer o pedido de apreciação da legalidade de atos de repercussão de CSR consubstanciados nas faturas referentes ao gasóleo rodoviário adquirido pela Requerente à B..., S.A., nos anos de 2020 e 2021, impondo-se a absolvição parcial da Requerida da instância quanto a este concreto pedido, em conformidade com o disposto nos artigos 278.º, n.º 1, alínea a), 576.º, n.ºs 1 e 2 e 577.º, alínea a) todos do CPC aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
5.3. - Da ilegitimidade da Requerente
A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que:
“apenas, o sujeito passivo que declarou os produtos para consumo a quem foi liquidado o imposto e que efetuou o correspondente pagamento, reúne condições (e pode identificar os atos de liquidação), para solicitar em caso de erro, a revisão desses atos de liquidação com vista ao reembolso dos montantes cobrados (artigo 15º e 16º do CIEC);
No âmbito dos impostos especiais de consumo, são sujeitos passivos, grosso modo, as entidades que, no exercício da sua atividade, são os responsáveis pelo cumprimento das obrigações de declaração e consequente pagamento do imposto correspondente, designadamente, os operadores económicos identificados no artigo 4.º n.º 1, alínea a) do CIEC.
Assim, os requerentes de reembolso que não correspondem à entidade responsável pela introdução dos produtos no consumo e pelo pagamento da CSR, carecem de legitimidade para solicitar a anulação das referidas liquidações com fundamento em erro e consequente reembolso do montante correspondente (artigo 16.º).
É o que resulta, de forma clara, do n.º 2, do artigo 15.º do CIEC, o qual estabelece que o reembolso só poderá ser solicitado pelos sujeitos passivos referidos no n.º 1 e na alínea a) do n.º 2 do artigo 4.º que tenham procedido à introdução no consumo dos produtos em território nacional e provem o pagamento do respetivo imposto, o que bem se compreende por força das caraterísticas dos impostos em causa.
Como tal, no âmbito destes impostos, de acordo com o estatuído no artigo 15.º e 16.º do CIEC, os múltiplos adquirentes dos produtos não são considerados com legitimidade para efeitos de solicitação da revisão do ato tributário e consequente reembolso do imposto, estando tal possibilidade restringida, independentemente do tipo de erro ou da situação que motive o reembolso, ao sujeito passivo (aquele que declara para consumo e paga o imposto que deve em nome e por conta próprios) e que poderá, ou não, no momento da venda, ter transferido parte ou a totalidade desse encargo para outros intervenientes na cadeia comercial (distribuidores, grossistas, retalhistas, consumidores finais).
Quem integra e é parte da relação tributária subjacente à liquidação contestada é o sujeito passivo, nos termos definidos nos artos 4.º, 15.º e 16.º do CIEC e do arto 5.º da Lei n.º 55/2007.
A Requerente quando adquire combustível ao seu fornecedor, que pode ser o sujeito passivo do ISP/CSR, estabelece uma relação comercial de direito privado entre empresas, à qual a administração tributária é estranha, para efeitos do que aqui se discute, que é a liquidação do ISP/CSR e o reembolso da CSR alegadamente repercutido no custo de aquisição de combustível.
A aceitar-se que a Requerente tenha legitimidade para efetuar o pedido de revisão e da anulação parcial da liquidação do ISP, reclamando o reembolso da CSR alegadamente suportada, o que não se concede, nem concebe e apenas por dever de patrocínio se equaciona, e a manterem-se na ordem jurídica as decisões proferidas pelos tribunais arbitrais, de anulação de liquidações de CSR, com a condenação da AT à restituição dos montantes de CSR cobrados aos sujeitos passivos do imposto, a AT poderia ver-se na contingência de:
- Para além de ter que restituir elevados montantes cobrados a título de CSR, bem como dos correspondentes juros, no período que medeia entre 2018 e 2022, aos sujeitos passivos/devedores de imposto;
- Ter ainda que entregar/restituir o mesmo montante a outras entidades que aleguem ter suportado a CSR por via da repercussão (que, inclusivamente, podem ter adquirido os produtos sobre os quais recaiu a contribuição a sujeitos passivos, a quem eventualmente tal contribuição pode já ter sido restituída ou pode vir a ser restituída na sequência de decisão arbitral, não havendo qualquer possibilidade de distinguir as situações, face à impossibilidade de identificar o ato de liquidação subjacente aos montantes de CSR suportados pela Requerente).”
A Requerente na Resposta a esta exceção defende a sua improcedência, alegando o seguinte:
“A propósito da ilegitimidade da Requerente para solicitar o reembolso da CSR sob apreciação, a AT começa por (re)afirmar, como já o fizera no âmbito da invocada exceção de intempestividade, que a contestação dos atos de liquidação de CSR se encontra, em face da norma remissiva constante do artigo 5.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, sujeita ao regime especificamente previsto nos artigos 15.º e 16.º do CIEC e que, portanto, apenas os sujeitos passivos da CSR teriam legitimidade para apresentar os respetivos pedidos de revisão atos de liquidação de CSR [e nunca as entidades que, por repercussão legal, acabaram por suportar o encargo económico da CSR (como se verifica ser o caso da Requerente, na sua qualidade de terceiro repercutido)].
De resto, e ainda em sustentação da aplicabilidade dos referidos artigos 15.º e 16.º do CIEC ao caso da Requerente - e, por essa via, a sua ilegitimidade - a AT defende, igualmente, que a «Requerente quando adquire combustível ao seu fornecedor, o sujeito passivo do ISP/CSR, estabelece uma relação comercial de direito privado entre empresas, à qual a administração tributária é estranha, para efeitos do que aqui se discute, que é a liquidação do ISP/CSR e o reembolso da CSR alegadamente repercutido no custo de aquisição de combustível» e que, a admitir-se a legitimidade da Requerente, «a AT poderia vir a ser sucessivamente condenada a pagar montantes de CSR, mais do que uma vez, a todos os diferentes operadores económicos intervenientes na cadeia comercial de combustíveis: desde o sujeito passivo de imposto, passando pelos grossistas, distribuidores, revendedores, etc., até ao consumidor final».
Ora, isto visto, a Requerente começa, então, por fazer recordar que o regime especial consagrado nos sobreditos artigos 15.º e 16.º do CIEC não é aplicável à CSR, pela simples, mas definitiva, razão de que que a remissão para o CIEC opera, exclusivamente, quanto às matérias de liquidação, cobrança e pagamento da CSR, deixando-se de fora – i.e., sujeitando ao respetivo regime geral – todas as restantes matérias, entre as quais as atinentes aos meios e prazos de reação para contestar este tributo (vide, a este propósito, todo o exposto no IV.3 supra)
Assim, sendo absolutamente claro que a matéria relativa aos meios de reação aplicáveis à CSR não integra a norma remissiva constante do artigo 5.º da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, sempre se terá de concluir, liminarmente e sem necessidade de ulteriores desenvolvimentos, pela improcedência do primeiro – e principal – argumento invocado pela AT, bem como, em consequência, de todas as considerações tecidas nesse domínio a propósito do âmbito subjetivo de aplicação do regime especial recortado pelos referidos artigos 15.º e 16.º do CIEC.
Em todo o caso, e não obstante se impor concluir, sem mais, em face do que vem exposto, pela inaplicabilidade do regime especial recortado pelos referidos artigos 15.º e 16.º do CIEC ao caso sob apreciação, a Requerente recorda ainda – a propósito dos demais argumentos que, a esse respeito, foram invocados pela AT –, o seguinte:
Embora o plano de incidência subjetiva da CSR recortado pelo artigo 5.º, n.º 1, 1.ª parte, da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto, compreenda apenas os sujeitos passivos de imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, o legislador determinou clara e expressamente que o encargo económico daquele imposto deve recair, por via de repercussão legal, nos utilizadores da rede rodoviária nacional, «tal como esta [utilização] é verificada pelo consumo dos combustíveis» (cf. artigo 3.º, n.º 1, in fine, da Lei n.º 55/2007, de 31 de agosto);
(...)”
Vejamos
O RJAT é omisso quanto à regulação do pressuposto processual da legitimidade, como possibilidade de intervenção num processo contencioso nos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD.
Temos de procurar a resposta nas normas de natureza processual do CPPT, do CPTA e do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1 do RJAT.
Do artigo 9.º, n.º 1 do CPTA resulta que: “Sem prejuízo do disposto no número seguinte e no capítulo II do título II, o autor é considerado parte legítima quando alegue ser parte na relação material controvertida”.
E, determina o artigo 30.º do CPC: “1 - O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer;
2 - O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha.
3 - Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor”.
Assim, a legitimidade processual é definida nestas normas, de aplicação subsidiária ao processo arbitral tributário, por referência à relação material controvertida que no caso dos Tribunais Arbitrais a funcionar no CAAD, terá na sua génese um ato tributário. O sujeito passivo dessa relação jurídica tem de se enquadrar no artigo 18.º, n.º 3 da LGT.
A LGT no artigo 1.º, n.º 2 estabelece que “Para efeitos da presente lei, consideram-se relações jurídico-tributárias as estabelecidas entre a administração tributária, agindo como tal, e as pessoas singulares e colectivas e outras entidades legalmente equiparadas a estas”.
No mesmo sentido, ainda que se refira somente à legitimidade no procedimento tributário, a LGT determina no artigo 65.º que “têm legitimidade no procedimento os sujeitos passivos da relação tributária e quaisquer pessoas que provem interesse legalmente protegido.” E o artigo 78.º da LGT assegura a mesma posição de legitimidade ou ilegitimidade conferida pelas regras gerais sobre o tema.
Por seu lado, o artigo 5.º, n.º 1 da Lei 55/2007 estipula: “A contribuição de serviço rodoviário é devida pelos sujeitos passivos do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos, sendo aplicável à sua liquidação, cobrança e pagamento o disposto no Código dos Impostos Especiais de Consumo, na lei geral tributária e no Código de Procedimento e Processo Tributário, com as devidas adaptações”. Consideramos que o legislador se limitou a identificar o sujeito passivo da CSR, nada acrescentando sobre a repercussão da mesma. O referido artigo 5.º, n.º 1 da Lei 55/2007, remete para o CIEC no que concerne às normas que regulam a liquidação, cobrança e pagamento do imposto pelo sujeito passivo.
A Requerente invoca a qualidade de repercutida legal para deduzir a declaração de ilegalidade das “liquidações de CSR praticadas pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela respetiva fornecedora de combustíveis, determinando-se, nessa medida, a anulação, com demais consequências legais, designadamente o reembolso à Requerente de todas as quantias suportadas a esse título acrescidas dos respetivos juros indemnizatórios”.
Entendemos que a figura do repercutido não se enquadra na categoria de sujeito passivo, nos termos do citado artigo 18.º, n.º 3 da LGT, a legitimidade, neste caso, só pode advir da comprovação de que é titular de um interesse legalmente protegido (vide artigo 9.º, n.ºs 1 e 4 do CPPT).
Neste sentido é de referir a decisão arbitral, de 01-02-2024, processo n.º 296/2023-T e Acórdão do STA de 28-10-2020, proferido no Proc. 0581/17.BEALM
(...)
V - “A repercussão fiscal consiste na transferência do imposto que legalmente incide sobre um sujeito passivo, para um terceiro, alheio à relação jurídica tributária, com quem aquele tem relações económicas. Nas palavras de alguns autores, o repercutido será um mero "contribuinte de facto" (titular da capacidade contributiva), por contraposição ao "contribuinte de direito", aquele a quem é juridicamente exigível o pagamento do tributo. De acordo com a doutrina pode fazer-se a distinção entre a repercussão obrigatória ou legal, a qual encontra consagração, por exemplo, em sede de I.V.A., por contraposição à repercussão voluntária (…)”.
Por seu lado, DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária, 3.ª edição, VISLIS Editores, 2003, pág. 121, afirmam: “A exclusão do terceiro repercutido do âmbito de sujeitos passivos tem larga consagração na doutrina (vd., DIOGO LEITE DE CAMPOS e MÓNICA HORTA NEVES LEITE DE CAMPOS, ob. Cit., 2.ª ed. Coimbra, 2000, Parte II, A obrigação tributária) entre ele repercutido e o sujeito activo não existe vínculo jurídico, no sentido de que o repercutido não é devedor do sujeito activo. A sua obrigação não nasce da realização do facto tributário, mas sim da realização de um facto ao qual a lei liga o direito de o sujeito passivo de repercutir e a correlativa obrigação do repercutido de reembolsar o sujeito passivo quando este exerça o seu direito. Daqui decorre, nomeadamente, que as relações entre o sujeito passivo e o repercutido inadimplente se regem pelo Direito privado.”
A legitimidade para requerer o reembolso do ISP e, inerentemente, da CRS pertence aos sujeitos passivos do imposto enunciados no n.º 1 e no n.º 1 a) do artigo 4.º do CIEC, ou seja, os operadores que introduzem no consumo os bens sujeitos a IEC e CSR, em virtude da remissão do n.º 1 do artigo 5.º da Lei nº 55/2007, com exclusão dos repercutidos.
A liquidação de CSR é apurada através do Documento de Introdução ao Consumo (e-DIC), que contem todos os elementos que permitem o cálculo e a liquidação do tributo aplicável, ou seja, é o documento que suporta as quantidades de produtos declaradas para consumo bem como a liquidação do imposto correspondente, o qual a Requerente pretende a sua anulação.
A Requerente não apresenta as DICs correspondentes ao combustível que adquiriu, e apresenta faturas emitidas pela fornecedora de combustíveis.
Ora, uma fatura é documento fiscalmente relevante, que consubstancia um “documento em papel ou em formato eletrónico que: i) Contenha os elementos referidos nos artigos 36.º ou 40.º do Código do IVA, incluindo a fatura, a fatura simplificada e a fatura-recibo; ii) Constitua um documento retificativo de fatura nos termos legais; Cfr artigo 2.º, c) do Decreto-Lei n.º 28/2019 de 15 de fevereiro.
Da fatura não resulta qualquer ato imputável à AT, quer tributário, quer administrativo em matéria tributária. É um documento que deve ser emitido pelo fornecedor ou prestador de serviços, sempre esteja em causa a prestação de um serviço ou aquisição de um bem ou prestação de um serviço sujeito a IVA e da DIC resulta um ato tributário stricto sensu, a liquidação de CSR da competência da AT e que é impugnável nos termos do artigo 51.º do CPTA.
Na DIC está em causa um Imposto Especial ao Consumo (IEC), o qual é devido pela introdução no consumo de produtos petrolíferos.
A fornecedora de combustíveis, a sociedade B... SA., é o sujeito passivo da CSR e assume a posição de entidade obrigada a proceder ao pagamento ao Estado, não a Requerente. E, com base nas faturas juntas com o PPA, não é possível comprovar se a B... SA., procedeu ou não a esse pagamento - não são fatura-recibo, nem recibo, nem nota de crédito, nem a conjugação de documentos (contabilísticos ou outros), que permitam comprovar o pagamento dos montantes alegados.
E, das faturas juntas pela Requerente como documentos n.º 2 constam valores referentes ao IVA, não contendo aquelas quaisquer referências a montantes pagos a título de ISP ou CSR, estando a € 0,00 o campo das faturas referentes a ISP/Outras contribuições pelo que não permitem provar quaisquer pagamentos ao Estado do ISP/CSR, consubstanciados pela apresentação dos respetivos Documentos Únicos de Cobrança (e-DUC).
De salientar que impostos especiais sobre o consumo (IECs) são impostos monofásicos e o facto tributário ocorre apenas na fase da declaração para consumo, o que, regra geral, ocorre uma única vez.
O regime previsto no CIEC (artigos 15.º a 20.º) é o aplicável quando se suscite a questão da revisão do ato tributário e consequente reembolso com os fundamentos previstos nas mesmas normas, incluindo o do erro na liquidação, como resulta do artigo 5.º, n.º 1 da Lei n.º 55/2007.
Como ocorre no âmbito dos IEC, e em outros tipos de impostos, as disposições especiais previstas nos respetivos códigos prevalecem sobre as normas gerais previstas na LGT e no CPPT.
A B..., S.A., fornecedora de combustíveis à Requerente é o sujeito passivo de ISP/CSR, com legitimidade para solicitar à AT o reembolso da CSR, (artigos 15.º e 16.º do CIEC), não a Requerente.
Pelo exposto, considera-se que a Requerente é parte ilegítima para questionar os atos de liquidação da CSR praticados pela Administração Tributária e Aduaneira com base nas DIC submetidas pela sociedade B..., S.A., pois no âmbito dos impostos especiais de consumo, só a entidade responsável pela introdução dos produtos no consumo e pelo pagamento da CSR, tem legitimidade para solicitar a anulação das referidas liquidações e consequente reembolso do montante correspondente, conforme o artigo 16.º do CIEC.
Considera-se, assim, verificada a exceção dilatória de ilegitimidade da Requerente, o que determina a absolvição da Requerida da instância nos termos do disposto nos artigos 9.º do CPPT, 65.º da LGT, da alínea a) do n.º 1 do artigo 55.º e do artigo 89.º, nºs 2 e 4 e) do CPTA, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas.
6. Decisão
a) Julgar procedente a exceção dilatória de incompetência material do Tribunal Arbitral para apreciar atos de repercussão de CSR;
b) Julgar procedente a exceção dilatória de ilegitimidade da Requerente quanto ao pedido de declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de CSR
c) Em consequência, absolver a AT da instância, condenando a Requerente nas custas.
7. Valor do Processo
Atendendo ao disposto no artigo 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 307.939,75.
8. Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de € 5.508,00, a suportar pela Requerente, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Notifique-se.
Lisboa, 28 de junho de 2024
Os Árbitros
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(Regina de Almeida Monteiro – Presidente e Relatora)
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(Amândio Silva – Adjunto)
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(Francisco Carvalho Furtado – Adjunto)
Voto de vencido pelo Árbitro Francisco de Carvalho Furtado
Na esteira do sustentado pela Requerida o Tribunal considerou procedentes as excepção de incompetência material do Tribunal e, bem assim, a excepção dilatória de ilegitimidade do Requerente. Não posso, contudo, seguir tal decisão.
Nos termos do disposto no artigo 9º, nº 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário "têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido".
O nº 4 da mesma disposição legal acrescenta que "têm legitimidade no processo judicial tributário, além das entidades referidas nos números anteriores, o Ministério Público e o representante da Fazenda Pública".
Por sua vez, o nº 3 do art.º 18.º da LGT refere que "o sujeito passivo [da relação jurídica tributária] é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte direto, substituto ou responsável".
Da conjugação das referidas disposições legais, julgo resultar que a Requerente é parte legítima, enquanto sujeita ao pagamento (quem suporta economicamente) da CSR, para impugnar as liquidações referentes à mesma.
O Tribunal considerou, ainda, procedente a excepção dilatória de incompetência material.
Com efeito, embora se conclua, na esteira de abundante jurisprudência, que a CRS é um imposto, e como tal, incluído no âmbito da arbitragem tributária, afirma-se que os atos de repercussão, estão fora do âmbito das realidades previstas na Portaria de Vinculação.
Como referido na decisão, os atos de repercussão materializam “um fenómeno que consiste na transferência do peso económico de um tributo para pessoa diferente do sujeito passivo e com quem este está em relação, através da sua integração no preço de um qualquer bem”, tal como evidencia SÉRGIO VASQUES, ob. cit., p. 399.
Ora, enquanto ato de transferência económica do imposto o que está verdadeiramente em causa é o acto originário de liquidação do imposto repercutido.
Com efeito, na sua causa de pedir o que os Requerentes sindicam é a legalidade do imposto e não se o mesmo poderia ter sido repercutido na sua esfera. E, esta conclusão resulta reforçada pelo artigo 18.º, n.º 3 da LGT acima citado.
Assim, e porque o que está em causa é a contestação da legalidade do acto de liquidação (e não de repercussão) do imposto, a causa de pedir e o pedido encontram-se no âmbito do definido na Portaria de Vinculação – Portaria 112-A/2011, de 22 de Março.
Consideraria, pois, a excepção da incompetência material do tribunal arbitral improcedente.
Por tudo isto, é meu entender que as excepções dilatórias invocadas deveriam improceder, conhecendo-se o mérito do pedido formulado pela Requerente.
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(Francisco Carvalho Furtado – Adjunto)