Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 968/2023-T
Data da decisão: 2024-05-30  IVA  
Valor do pedido: € 730.764,30
Tema: IVA. Isenção na exportação de bens para fora da União Europeia. Princípio da neutralidade. Exigência formal.
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Decisão Arbitral

 

 

          Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora e Dr. Arlindo José Francisco (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 20-02-2024, acordam no seguinte:

 

         

          1. Relatório

 

            A...– UNIPESSOAL, LDA., contribuinte fiscal n.º..., com sede na Rua ..., ...-... ..., doravante designada como “Requerente”), apresentou pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), tendo em vista a anulação das demonstrações de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”)  e de liquidação de juros compensatórios de IVA, e demonstrações de acerto de contas, referentes aos períodos de 201903T, 201906T, 201909T e 201912T.

            É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante também identificada por “AT” ou simplesmente “Administração Tributária”).

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 12-12-2023.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 02-02-2024, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em 14-02-2024, a Requerente apresentou um «articulado superveniente”, com junção de documentos.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral coletivo foi constituído em 20-02-2024.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, em que defendeu a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Em 13-05-2024 realizou-se uma reunião em que foi produzida prova testemunhal e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.

Apenas a Requerente apresentou alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado na alínea e) do n.º 1 do artigo 2.º, e do n.º 1 do artigo 10.º, ambos do RJAT, e é competente.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigo 4.º e n.º 2 do artigo 10.º, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos com relevo para a decisão:

 

  1. A Requerente é uma sociedade de direito português que tem como principal atividade a promoção e distribuição de produtos de cosmética, perfumaria e higiene, incluindo acessórios de moda, bijuteria, joalharia e relojoaria;
  2. No exercício da sua atividade, a Requerente utilizava, entre fevereiro de 2018 e março de 2020, uma loja, sita no Centro Comercial ..., em Lisboa, denominada “...”, onde vendia artigos adquiridos à B... S.A. (doravante B...) (Relatório da Inspecção Tributária e depoimentos das testemunhas C... e D...);
  3. No âmbito da sua atividade, entre março de 2017 e março de 2020, a Requerente vendeu mercadorias da referida marca B..., à E... GmbH (doravante designada simplesmente como E...), com sede na Alemanha (Relatório da Inspecção Tributária e depoimentos das testemunhas C... e D... e documentos n.ºs 12 a 75 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  4. A referida E... revendia os mesmos bens, que adquiria à Requerente, a Clientes seus, em especial a uma empresa, com sede em Hong Kong, para onde os referidos artigos eram expedidos pela ora Requerente (Relatório da Inspecção Tributária e depoimentos das testemunhas C... e D...);
  5. Entre as datas referidas, a E... recebia as encomendas do seu Cliente, com sede em Hong Kong, e passava as mesmas à ora Requerente que, por sua vez, enviava o pedido de encomenda à B... (Relatório da Inspecção Tributária e depoimentos das testemunhas C... e D...);
  6. Ao receber as notas de encomenda, a B... enviava a mercadoria pedida, ao cuidado da Requerente, para a morada por si indicada (Rua ..., n.º ..., ... Posterior, ...-... Viseu), onde os bens eram recebidos e preparados para serem expedidos (Relatório da Inspecção Tributária e depoimentos das testemunhas C... e D...);
  7. Naquele local não existia balança, pelo que a Requerente estimava o peso dos volumes a enviar, peso esse que era posteriormente confirmado pela transitária (depoimento da testemunha da Requerente, C...);
  8. Posteriormente, a mercadoria era exportada, por via área, diretamente de Lisboa para Hong Kong, sendo certo que as guias de transporte aéreo faziam menção ao expedidor e ao destinatário, atestando a sua saída do espaço comunitário em direção a Hong Kong (documento n.º 6 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, Relatório da Inspecção Tributária e depoimentos das testemunhas C... e D...);
  9. Os bens expedidos pela Requerente ao abrigo deste acordo comercial foram recebidos em Hong Kong pela F... CO., LIMITED, e G... Limited (Documento n.º 2 do articulado superveniente e depoimento da testemunha da Requerente, C...);
  10. Em 28-06-2022, a Autoridade Tributária deu início a uma acção de inspeção, de âmbito parcial, conforme a Ordem de Serviço n.º OI2022..., tendo a mesma sido dada como concluída em 14-07-2023, de acordo com os Ofícios n.º... e ...;
  11. Nessa inspecção foi elaborado, em 14-07-2023, o Relatório da Inspecção Tributária (“RIT”) que consta do documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

V. Descrição dos factos e fundamentos das correções/irregularidades

Segundo o SP, a mercadoria vendida à E... é adquirida à sociedade B... S.A., esta era recebida na Rua ..., nº..., ..., ...-... Viseu e segue a partir desta morada para Hong Kong, para o grupo H... Group Limited, essencialmente, via aeroporto de Lisboa.

A certa altura do ano deixa de constar nas faturas e nos documentos de exportação H... Group Limited, passando a referenciar F... CO., LIMITED, constando por vezes outra entidade para além de F... CO., LIMITED.

 

 

  1. O documento de base à exportação é a fatura emitida pela E... ao seu cliente em Hong Kong. O SP declara, que a mercadoria não ficava armazenada. Era recolhida e expedida no próprio dia, sendo a recolha e o transporte das mercadorias contratado pelo destinatário das mesmas em Hong Kong. Tal responsabilidade está expressa na fatura emitida pela E..., em língua inglesa. Não obstante, a A... fazia o contacto com a transportadora no que dizia respeito à parte organizacional (i.e., informava sobre dia da recolha, volumes a recolher, etc.).

 

Transações e circuito dos bens

 

(...)

Transmissões para a E... enviadas para Hong Kong e Itália a partir de Portugal

O valor total das Aquisições lntracomunitárias ao fornecedor B... S.A., foi de € 6.152.571,95, conforme listagem em anexo 3.

Como se pode ver na relação em anexo 3, da faturação emitida pela B..., a mercadoria adquirida à B... S.A. de Espanha, tem como principal destino Hong Kong e Itália, contudo, uma parte dos itens destinam-se à loja ... em Lisboa, representando, uma percentagem baixa do total faturado.

Sendo o total de itens faturados, pela B..., de 281.188 unidades e o total dos itens não faturados ao cliente E... de 6.007 unidades, em que 5.087 unidades respeita a sacos de compras, conforme quadro abaixo:

 

Esta análise mostra-nos que as mercadorias adquiridas através de Aquisições lntracomunitárias de Bens, à B... S.A. de Espanha, se destinam essencialmente a ser revendidas à sociedade E... Gmbh, não invalidando que as mercadorias vendidas no mercado nacional são essencialmente adquiridas no mercado nacional, conforme é referido anteriormente.

 

As mercadorias faturadas pela A... à E..., no montante total de€6.178.464,71, são maioritariamente vendidas pela E... para Hong Kong, nomeadamente para F..., LIMITED, N.º..., G... GROUP LIMITED, sendo que, o valor de €384.323,39 é faturado, pela E... para Itália, para J..., VAT: 04....

 

 

 

No caso das Transmissões para Itália, através das faturas emitidas pela E... a J..., VAT:04..., com morada em ..., ... Veneza, tratando-se de um destino Comunitário, não se aplica a obrigatoriedade de comprovação da Transmissão através de documentos alfandegários apropriados,

não se aplicando o disposto nos ns.º 8 e 9, do artigo 29.º do CIVA, bastando neste caso a comprovação através das faturas e respetivos documentos de transporte a saída das mercadorias de Portugal para um destino Comunitário, neste caso Itália.

Estas transmissões, da A... para a E... (com destino final Veneza) foram tratadas contabilisticamente, como Transmissões lntracomunitárias de bens isentas de IVA em Portugal, ao abrigo do artigo 14.° do RITL.

Foram analisados os documentos comprovativos do transporte da mercadoria de Portugal (Viseu) para Veneza, pelo que às Transmissões efetuadas pela A... para a E..., com destino final Veneza, aplica-se a isenção prevista no artigo 14.° do RITI, conforme documentos exemplificativos em anexo 4.

Importa assim, enquadrar as transmissões pela A..., da mercadoria adquirida à B... S.A. de Espanha, para a E..., e expedida para Hong Kong a partir de Portugal, no valor total de € 5.794.121,32.

Para tal, foram analisados os respetivos Documentos de Exportação, no caso os documentos facultados correspondem à Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador.

Todos os documentos facultados, conforme listagem em anexo 3, identificam como expedidor/exportador a sociedade E... GmbH, DE... e como destinatário G... Group Limited/ F..., LIMITED, em Hong Kong, conforme exemplo em print abaixo:

 

a listagem em anexo 3 é efetuada a relação dos documentos em cada operação realizada, desde a aquisição à B... à Exportação para Hong Kong.

Na Certificação de Saída para o Expedidor/Exportador, no campo 44 - Referências especiais/ Documentos apresentados/ Certificados e Autorizações, é identificado o documento de base à exportação, no caso a fatura n.º 12/2019 e no campo 46, consta o valor estatístico de € 72.342,75, que corresponde ao valor da fatura n.º 12/2019 emitida pela E... Gmbh.

 

 

 

 

Acima, expõe-se o print de parte da fatura n.º 12/2019 da E..., onde é possível verificar que é este o documento que consta indicado na Certificação de saída para o Expedidor/Exportador, o valor da fatura coincide com o valor que consta no Documento de Exportação.

O procedimento adotado no exemplo, nomeadamente a documentação que comprova a exportação, é comum ao total das transmissões relacionadas em anexo 3.

As guias de transporte, que atestam a recolha das mercadorias em Viseu e descarga em Pombal (Instalações do Schenker, Transitário), referem volumes, assim como os documentos de exportação apresentados também referem volumes. Não é possível a comparação entre os volumes referidos nos documentos de transporte e no documento de exportação (no caso o documento apresentado é a Certificação de saída para o expedidor/exportador) com as quantidades referidas nas faturas da A... para a E..., não permitindo concluir de forma inequívoca que os volumes recolhidos em Viseu e constantes nos respetivos Documentos de Exportação correspondem às quantidades (em unidades) constantes nas respetivas faturas;

A A... vende os bens à E...  e entrega-os em território nacional, esses mesmos bens são expedidos/exportados pela E..., a partir de Portugal para Hong Kong.

Como já foi referido, os bens vendidos pela A... à E..., são adquiridos no mercado Comunitário, à sociedade B... S.A., com sede em ... Barcelona e entregues em Viseu, conforme consta nas Guias de Remessa enviadas a titulo de exemplo.

A transmissão de bens da A... não configura exportação, não se aplicando a isenção da alínea a) do n.° 1 do artigo 14.° do CIVA, dado que o requisito essencial desta, é a expedição ou transporte para fora da comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.

Poderia aplicar-se a isenção da alínea b) do n.° 1 do artigo 14.° do CIVA, desde que comprovadas através de documentos alfandegários apropriados, conforme o n.º 8 do artigo 29.º do mesmo Código.

A este propósito, há que ter em conta as seguintes instruções administrativas com referência a Ofício-Circulado n.° 15309/2014, de 10.11.2014, Oficio Circulado n.° 15327/2015 de 09.01.2015 e a Circular n.° 8/2005 de 27.07.2015 (que revoga o Oficio-Circulado n.° 15309/2014):

"4.Para este efeito, na declaração aduaneira de exportação, para além da fatura comercial do exportador (OE-COM), é necessário que seja identificado o vendedor nacional (OS-P7) e a sua fatura comercial, o que deverá ser feito da seguinte forma na Casa n.º 44:

Código n.º 380;

Referência: N.º da fatura do OE-PT;

Data de emissão: Data de emissão do OE-PT;

Tipo de entidade emissora:4;

Entidade emissora: Número de Identificação Fiscal do OE-PT;

5. Na sequência da certificação de saída, cabe à pessoa que entregou a declaração aduaneira de exportação entregar ao OE-PT o documento aduaneiro apropriado para efeitos de comprovação de isenção do IVA exigida pelo artigo 29. º, n.º 8 do CIVA;"

 

Circular n.º 8/2015_ge 27 de julho do Gabinete do Diretor-Geral

"3.2 Adquirente com sede, domicílio ou estabelecimento estável ou um registo para efeitos de IVA noutro Estado-Membro da UE (EU-COM).

Neste caso, o direito de propriedade é transferido, no território nacional, de um OE-PT para um sujeito passivo não residente e sem registo, para efeitos do IVA, em Portugal mas com sede ou estabelecimento noutro Estado-Membro (OE-COM) o qual determina que as mercadorias se destinam a ser expedidas para fora do TAC a partir de Portugal.

A legislação IVA prevê a isenção prevê a isenção do imposto na transmissão de mercadorias, quando a expedição ou transporte das mesmas para fora do TAC é efetuado pelo:

(...)

b) OE-COM "adquirente" ou por um terceiro por sua conta - "exportação indireta", ao abrigo na alínea b), do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA.

Nestes casos, as mercadorias são colocadas à disposição do OE-COM "adquirente" no território nacional, ficando a expedição e transporte das mercadorias para fora do TAC a seu cargo.

Quem é o exportador?

O exportador é o OE-COM "adquirente", conforme prevê o 788. º, n.º 1, das DACAC, pois tem o direito de propriedade sobre as mercadorias e o direito de dispor das mesmas por força de, contratualmente, lhe caber a responsabilidade pela expedição e transporte das mesmas para fora do TAC.

 

Comprovação da Transmissão isenta

A declaração aduaneira de exportação é entregue pelo OE-COM ou por um terceiro por sua conta.

Para efeitos de comprovação da transmissão isenta:

O OE-PT deve por força do n. º 8 do artigo 29. º do CIVA, ter na sua posse a certificação de saída que se materializa no documento «Certificação de saída para o fornecedor nacional», e o OE-COM tem ao seu dispor a certificação de saída a qual se materializa no documento - «Certificação de saída para o expedidor/exportador."

 

A circular n.º 8/2015, remete para os anexos ao Oficio-Circulado n.º 15/327 de 09-01-2015, onde são definidos quais os DOCUMENTOS DE AUTORIZAÇÃO E CERTIFICAÇÃO DE SAÍDA, nomeadamente, nos anexos 3 e 5, onde constam os modelos dos documentos para a Certificação de Saída para o Expedidor/ Exportador e a Certificação de Saída para o Fornecedor Nacional, respetivamente. Estes documentos, são os documentos apropriados, exigidos por força do n. 8 do artigo 29.° do CIVA para comprovar a exportação, conforme prevê a Circular 8/2015.

O SP, facultou também as cartas de porte assinadas pelo armazém de exportação, que é gerido pela K... pela L... . Contudo nestas, apenas consta a informação que consta na Certificação de Saída para o Exportador, não constando nestas, qualquer referência à A..., nem permitindo concluir de forma inequívoca que se trata das mesmas mercadorias.

O SP informou-nos que solicitaram a alteração dos documentos alfandegários, por forma a incluir a A... nestes:

"...o nosso requerimento para alteração dos documentos alfandegários deu entrada na Alfândega de Lisboa com os seguintes números de entrada:

• 2022... - para as exportações no período entre Janeiro 2019 e Junho 2019

• 2022... - para as exportações no período entre Julho 2019 e Setembro 2019

• 2022... - para as exportações no período entre Setembro 2019 e Julho 2020

Após sucessivos pedidos de informações sobre o nosso requerimento, e apesar da maioria das exportações se encontrarem dentro do prazo legalmente previsto para serem alterados, obtivemos a seguinte resposto pelo Diretor de Alfândega ...:

"a matéria em apreço encontra-se em análise pela Direção de Serviços do Imposto sobre o Valor Acrescentado (dsiva@at.gov.pt), estando esta Alfândega a aguardar esse parecer, para proceder em conformidade."

O Decreto-Lei que salvaguarda a alteração dos documentos alfandegários é o Artigo 173° do Código Aduaneiro da União (CAU) e estipula um prazo de 3 anos para este efeito, a contar da data de aceitação da declaração aduaneira.

(...)

Tendo em conta o exposto, analisaram-se todos os documentos de exportação, no sentido de atestar o cumprimento do disposto no n.° 8 do artigo 29.° do CIVA e das instruções administrativas acima referidas.

Em resultado, concluiu-se que não foram observados os requisitos essenciais para a isenção do IVA, nos termos da alínea b) do n.º. 1 do artigo 14.° do CIVA, para a totalidade das Transmissões tratadas como exportação para Hong Kong, pois nos documentos de exportação apresentados, não se encontram preenchidos com os elementos referidos na Circular n.° 8/2015, de 27 de julho, do Gabinete do Diretor-Geral, nomeadamente, não

constando nestes o OE-PT (A...), para as seguintes operações:

 

 

A

E

E...

 

 

 

 

 

Assim, por força do n.° 8 do artigo 29.° do CIVA, não tendo o SP na sua posse a certificação de saída, que se materializa no documento «Certificação de saída para o fornecedor nacional», daqui decorre que a falta dos documentos comprovativos determina a obrigação para o transmitente dos bens (A...) de liquidar o imposto correspondente, conforme prevê o n.º 9 do artigo 29.º do CIVA.

 

(...)

V.2.IVA

Decorre do exposto no ponto V a obrigatoriedade de liquidar imposto sobre as Transmissões efetuadas para o cliente E... GmbH, no valor total de € 2.766.068,62 (com destino a Hong Kong) e€ 3.785,59 (ficaram em Portugal), repartido pelos períodos a que respeita cada fatura, da seguinte forma:

 

Face ao exposto anteriormente, por critérios objetivos e meramente aritméticos, apurámos o seguinte imposto em falta, não entregue nos cofres do Estado (conforme art.ºs 18.°, 19°a 27°, 29.º, 41 º e 78° do CIVA), distribuído pelos períodos seguintes:

 

 

(...)

 

X. Direito de Audição

Foi remetida notificação ao sujeito passivo a 03/06/2023 por via CTT através do Código do Documento n.° T124897 do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária para, querendo, exercer no prazo de quinze dias, o respetivo direito de audição, nos termos do artigo 60.° da LGT e 60.° do RCPITA.

O SP foi considerado notificado a 08/06/2023. Decorrido o prazo legal, acima referido, o direito de audição não foi exercido, tendo sido realizada regularização parcial das correções propostas.

Quanto às restantes correções não regularizadas, mantêm-se os factos relatados, pelo que se mantêm as correções propostas no Projeto de Relatório, de acordo com o seguinte:

 

 

 

  1. Na sequência do pedido formulado pela E... GmbH, os serviços alfandegários corrigiram os documentos de exportação referentes ao período de 22/07/2019 em diante, colocando no campo 44 referência à Requerente e a faturas por si emitidas (documentos 8 a 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  2. Em 20-09-2023, a Requerente requereu à Direcção da Alfândega  do Aeroporto Sá Carneiro o requerimento que consta do documento n.º 8 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, relativo à rectificação de declarações aduaneiras de exportação, o que foi parcialmente deferido, por extemporaneidade parcial, quanto a declarações aduaneiras de exportação com datas de aceitação anteriores a 21-07-2019, nos termos do documento n.º 9 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido;
  3. Foram deferidos à Requerente pela Direcção da Alfândega do Aeroporto Sá Carneiro outros pedidos de rectificação de declarações aduaneiras de exportação (documento n.º 10 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  4. Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu:

– a demonstração de liquidação de IVA n.º 2023..., documento identificado com o n.º 2023..., a demonstração de liquidação de juros de IVA com o mesmo n.º de liquidação, documento n.º 2023..., e, as demonstrações de acerto de contas com os n.ºs de compensação 2023... e 2023..., no montante de € 226.783,66 e € 37.751,71, respetivamente, com data limite de pagamento em 11-09-2023, todos referentes ao período de 201903T as liquidações de IVA (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

– a demonstração de liquidação de IVA n.º 2023..., documento identificado com o n.º 2023..., a demonstração de liquidação de juros de IVA com o mesmo n.º de liquidação, documento n.º 2023..., e as demonstrações de acerto de contas com os n.ºs de compensação 2023... e 2023..., no montante de € 389.771,29 e € 60.911,10, respetivamente, ambos com data limite de pagamento em 11-09-2023, todos referentes ao período de 201906T (documento n.º 2 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

– a demonstração de liquidação de IVA n.º 2023..., documento identificado com o n.º 2023..., a demonstração de liquidação de juros de IVA com o mesmo n.º de liquidação, documento n.º 2023..., e as demonstrações de acerto de contas com os n.ºs de compensação 2023... e 2023..., no montante de € 9.978,55 e € 1.454,40, respetivamente, ambos com data limite de pagamento em 11-09-2023, todos referentes ao período de 201909T (documento .º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

– a demonstração de liquidação de IVA n.º 2023..., documento identificado com o n.º 2023..., a demonstração de liquidação de juros de IVA com o mesmo n.º de liquidação, documento n.º 2023..., e as demonstrações de acerto de contas com os n.ºs de compensação 2023 ... e 2023..., no montante de € 2.745,52 e € 368,87, respetivamente, ambos com data limite de pagamento em 11-09-2023, todos referentes ao período de 201912T (documento n.º 4 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

  1. A Requerente emitiu as facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 12 a 75 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;
  2. Em 2021, a Requerente foi alvo de um procedimento inspetivo, levado a cabo pela Direção de Serviços de Investigação Fraude e Ação Especial (“DSIFAE”), nos termos do qual tais serviços concluíram “que a omissão das AIC nas declarações do IVA de 2017 consubstanciou um lapso declarativo por parte da sociedade A... UNIPESSOAL LDA., NI..., lapso que, nos anos seguintes, e com novo contabilista certificado, foi integralmente suprido”, o que significa que foi afastado qualquer indício de fraude (Documento n.º 76, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  3. A Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a Circular n.º 8/2015, de 27-07-2025, que está publicitada em

https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/legislacao/instrucoes_administrativas/Documents/Circular_8_2015.pdf;

  1. Em 11-12-2023, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da matéria de facto

 

Os factos dados como provados baseiam-se nos documentos indicados e nos depoimentos das testemunhas C... e D..., que trabalhavam nas instalações da Requerente em Viseu e aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos que relataram,

Não se provou que existisse qualquer fraude ou evasão fiscal na actividade da Requerente em matéria de isenções de IVA, mas apenas não cumprimento de formalidades, a nível dos documentos exigidos por orientações administrativas.

Na verdade, em nenhum ponto do Relatório da Inspecção Tributária se faz referência a suspeitas de fraude ou evasão fiscal.

Por outro lado, o facto de serem aceites regularizações de documentos e as únicas recusas se basearem em intempestividade indicia que as deficiências apontadas no Relatório da Inspecção Tributária se baseiam apenas na falta de documentos exigidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

Finalmente, o relatório que consta do documento n.º 76 corrobora a conclusão de que o não cumprimento dos requisitos da isenção exigidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira se deveu a «lapso declarativo» e não qualquer fraude.

 

 

3. Matéria de direito

 

O artigo 14.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), em sintonia com o artigo 146º da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, prevê isenções de IVA nas exportações que se consubstanciem em transmissões de bens para fora da União Europeia.

O artigo 29.º, n.º 8, do CIVA estabelece, relativamente a essas exportações que «devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declarações emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado».

            O n.º 9 do mesmo artigo estabelece que «a falta dos documentos comprovativos referidos no número anterior determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente».

A Autoridade Tributária e Aduaneira, no Relatório da Inspecção Tributária, entendeu que as transmissões que estão subjacentes às liquidações impugnadas poderiam beneficiar da isenção prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA, mas era obstáculo a sua aplicação a falta dos «documentos alfandegários apropriados», a que se refere o n.º 8 do mesmo artigo, que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu terem de ser preenchidos «com os elementos referidos na Circular n.° 8/2015, de 27 de julho, do Gabinete do Diretor-Geral, nomeadamente, não constando nestes o OE-PT (A...)», isto é, a indicação da Requerente como exportador.

Da prova produzida conclui-se que as mercadorias em causa saíram do território da União Europeia, sendo entregues em Hong Kong.

A questão que é objecto do processo é a se saber se, na falta dos documentos alfandegários preenchidos com os requisitos exigidos por aquela Circular 8/2015 pode ser aplicada a isenção.

A Requerente defende o seguinte, em suma:

– Autoridade Tributária reconhece que o referido artigo 131.º da Diretiva IVA admite que os Estados-membro fixem condições de isenção “com vista a assegurar a sua aplicação correta e simples e prevenir possível fraude, evasão ou abuso”;

 – nunca foi alegado nem ficou demonstrado a ocorrência de um qualquer fator que pudesse levar a Autoridade Tributária a concluir que estamos perante uma situação de tal natureza;

– as orientações administrativas não vinculam os administrados;

– a exigência de “certificação de saída para o fornecedor nacional” não decorre da lei, nomeadamente da expressão “documentos alfandegários apropriados”, mas antes de instruções produzidas por autoridades administrativas;

– se a intenção do legislador nacional - e, sobretudo, do legislador europeu — fosse limitar a atribuição desta isenção à apresentação de um tipo de documento teria feito expressa menção a esse mesmo documento;

– a jurisprudência citada pela Autoridade Tributária e Aduaneira não é aplicável pois o caso em apreço, foi feita prova efectiva da saída das mercadorias do território da União Europeia, o que não foi refutado pela Autoridade Tributária e Aduaneira;

– nem a legislação nacional, nem a legislação europeia fazem qualquer referência à “certificação de saída para o fornecedor nacional”, único documento que a Autoridade Tributária aceitaria para efeitos da isenção;

–  a legislação citada também não exige que a “certificação de saída para o exportador” contenha expressa menção a ora Requerente, ao contrário do que a Autoridade Tributária defende;

– o disposto no n.º 9 do artigo 29.º do Código do IVA sé será aplicável quando se verifique total ausência de prova da saída dos bens do território comunitário e quando ocorra uma situação de fraude, abuso ou evasão.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira, na sua resposta, defende a posição assumida no RIT, invocando jurisprudência em abono da sua posição.

A jurisprudência do TJUE, citada pela Requerente, designadamente o acórdão de 07-09-2023, proferido no processo C-461/21, é no sentido de as isenções d eiva não deverem ser recusadas automaticamente «pelo facto de o devedor não ter apresentado os documentos específicos previstos na regulamentação nacional, apesar de ter apresentado outros documentos, dos quais nada permite duvidar da sua autenticidade e fiabilidade, suscetíveis de demonstrar que estão preenchidos os requisitos aos quais estas disposições subordinam o direito à isenção do IVA».

Embora esta acórdão tenha sido proferido a propósito de outra isenção, o essencial da sua fundamentação é manifestamente aplicável à generalidade das isenções, designadamente os seguintes parágrafos:

            38 Decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, na falta de uma disposição na Diretiva IVA quanto às provas que os sujeitos passivos devem fornecer para beneficiar da isenção de IVA, cabe aos Estados-Membros fixar, em conformidade com o artigo 131.° desta diretiva, aplicável ao seu artigo 144.° enquanto disposição que faz parte do capítulo 5 do título IX da referida diretiva, os requisitos que isentam as operações de importação com vista a assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e prevenir qualquer possível fraude, evasão ou abuso. Contudo, no exercício dos seus poderes, os Estados-Membros devem respeitar os princípios gerais de direito que fazem parte da ordem jurídica da União, entre os quais figura, designadamente, os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade (v., por analogia, Acórdão de 9 de outubro de 2014, Traum, C-492/13, EU:C:2014:2267, n.° 27 e jurisprudência referida).

 39  Quanto ao princípio da proporcionalidade, uma medida nacional vai além do necessário para assegurar a cobrança exata do imposto se fizer depender, no essencial, o direito à isenção de IVA do cumprimento de obrigações formais, sem ter em conta os seus requisitos materiais e, nomeadamente, sem se interrogar sobre se estes foram cumpridos. Com efeito, as operações devem ser tributadas tomando em consideração as suas características objetivas (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre, C-21/16, EU:C:2017:106, n.° 34 e jurisprudência referida).

 40 Quando aqueles requisitos materiais forem cumpridos, o princípio da neutralidade fiscal exige, além disso, que a isenção de IVA seja concedida mesmo que certos requisitos formais tenham sido preteridos pelos sujeitos passivos (v., neste sentido, Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre, C-21/16, EU:C:2017:106, n.° 36 e jurisprudência referida).

 41 Apenas existem dois casos em que o incumprimento de um requisito formal pode implicar a perda do direito à isenção de IVA (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre, C-21/16, EU:C:2017:106, n.° 38 e jurisprudência referida).

 42 Por um lado, o princípio da neutralidade fiscal não pode ser invocado, para efeitos da isenção de IVA, por um sujeito passivo que tenha participado intencionalmente numa fraude fiscal que pôs em perigo o funcionamento do sistema comum do IVA (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre, C-21/16, EU:C:2017:106, n.° 39 e jurisprudência referida).

 43 Por outro lado, a violação de um requisito formal pode levar a uma recusa da isenção de IVA se essa violação tiver por efeito impedir a produção da prova incontestável do cumprimento dos requisitos materiais (Acórdão de 9 de fevereiro de 2017, Euro Tyre, C-21/16, EU:C:2017:106, n.° 42 e jurisprudência referida).

 

Decorre desta jurisprudência que

»os requisitos que isentam as operações de importação com vista a assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e prevenir» (n.º 38);

– «uma medida nacional vai além do necessário para assegurar a cobrança exata do imposto se fizer depender, no essencial, o direito à isenção de IVA do cumprimento de obrigações formais, sem ter em conta os seus requisitos materiais e, nomeadamente, sem se interrogar sobre se estes foram cumpridos» (n.º 39);

– «quando aqueles requisitos materiais forem cumpridos, o princípio da neutralidade fiscal exige, além disso, que a isenção de IVA seja concedida mesmo que certos requisitos formais tenham sido preteridos pelos sujeitos passivos» (n.º 40);

– o princípio da neutralidade só não pode ser invocado «quando o sujeito passivo tenha participado intencionalmente numa fraude fiscal que pôs em perigo o funcionamento do sistema comum do IVA» ou «a violação de um requisito formal» «tiver por efeito impedir a produção da prova incontestável do cumprimento dos requisitos materiais «violação tiver por efeito impedir a produção da prova incontestável do cumprimento dos requisitos materiais» (n.ºs 41 a 43).

 

A esta luz, é manifesta a ilegalidade das correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois, por um lado, fez decorrer a não aplicação da isenção automaticamente da mera falta de preenchimento de um requisito formal, pois a Autoridade Tributária e Aduaneira nem sequer invocou a falta dos requisitos materiais da isenção e, por outro lado, está-se perante uma situação em que não há qualquer indício de fraude fiscal nem a satisfação desse requisito formal tem como efeito a inviabilidade de prova do cumprimento dos requisitos materiais que, aliás, foi feita, designadamente a saída dos bens do território da União Europeia.

Pelo exposto, é de concluir que as correcções efectuadas violam o princípio da neutralidade, pelo que enfermam de vício de violação de lei que justifica a anulação das liquidações que as tiveram como pressuposto, de harmonia com o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

A anulação dos liquidações de IVA reporta-se apenas às correcções relativas aos períodos 201903T, 201906T e 201909T, nos valores de € 226.783,66 + € 400.121,53 + € 9.290,59 = € 636.195,78 referidas 1.º quadro do ponto V.2.IVA do Relatório da Inspecção Tributária, já que a Requerente não impugna as restantes correcções no valor global de € 870,69 (€ 224,91 + € 115,48 + € 422,49 + € 107,80, relativas aos períodos 201903T, 201906T, 201909T e 201912T, respectivamente), referidas no mesmo quadro, como refere no artigo 14.º do pedido de pronúncia arbitral.

Isto é, são anuladas correcções de IVA no valor de € 636.195,78 de um total de € 637,066,47, o corresponde à percentagem de 99,86%.

As liquidações de juros compensatórios têm como pressupostos as liquidações de IVA, pelo que enfermam do mesmo vício, pelo que se justifica também a anulação das relativas aos períodos 201903T, 201906T e 201909T, na percentagem de 99,86%.

 

 

3.1. Questões de conhecimento prejudicado

 

Resultando do exposto a declaração de ilegalidade das liquidações que são objecto do presente processo, por vício que impede a renovação dos actos, fica prejudicado, por ser inútil (artigos 130.º e 608.º, n.º 2, do CPC), o conhecimento dos restantes vícios que lhes são imputados pela Requerente.

 Na verdade, o artigo 124.º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupõe que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer dos restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados ao acto impugnado, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.

 Pelo exposto, não se toma conhecimento dos restantes vícios imputados pela Requerente às liquidações impugnadas.

 

4. Decisão     

 

            De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em :

 

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Anular parcialmente, na percentagem de € 99,86% as autoliquidações de IVA n.ºs n.º 2023..., 2023 ... e 2023 ... relativas aos períodos 201903T, 201906T e 201909T, respectivamente, quanto ao valor global de € 636.195,78;
  3. Anular parcialmente as liquidações de juros compensatórios com os mesmos números, nas partes em que têm como pressupostos aquelas liquidações de IVA, na percentagem de 99,86%.

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 730.764,30., indicado pela Requerente e sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

6. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 10.710,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente na percentagem de 1,14% e a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira na percentagem de 99,86%, já que a Requerente não imputa qualquer ilegalidade quanto a correcções no valor de € 870,69, mas pede a anulação total das liquidações.

 

Lisboa, 30-05-2024

 

Os Árbitros

 

 

(Jorge Lopes de Sousa)

(relator)

 

(José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora)

 

(Arlindo José Francisco)