SUMÁRIO:
I – Estando em causa liquidações de IRC por retenção na fonte a título definitivo, relativamente às quais se colocam questões exclusivamente de Direito, conclui-se pela desnecessidade de recurso à reclamação graciosa prevista nos artigos 131.º a 133.º, do CPPT, como condição sine qua non da ação arbitral.
II – “O artigo 63.º TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção”.
III – O direito a juros indemnizatórios a que alude a LGT pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT.
Os Árbitros Guilherme W. d'Oliveira Martins, Filipa Barros e António de Barros Lima Guerreiro, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral Coletivo, decidem o seguinte:
DECISÃO ARBITRAL
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RELATÓRIO
A..., organismo de investimento colectivo em valores mobiliários ("OIC") constituído e a operar no Grão-Ducado do Luxemburgo sob supervisão da Commission de Surveillance du Secteur Financier, contribuinte fiscal luxemburguês n.º ... e português n.º ..., com sede em ..., Grão-Ducado do Luxemburgo (doravante "Requerente"), na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa por si apresentado a 17 de Abril de 2023, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 57.º, n.ºs 1 e 5, e 95.º, n.º 2, alínea d), da Lei Geral Tributária ("LGT"), 97.º, n.º 1, alínea a), 99.º, alínea a), e 102.º, n.º 1, alínea d), do Código de Procedimento e de Processo Tributário ("CPPT"), 137.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas ("CIRC"), 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ("RJAT"), requerer a CONSTITUIÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL tendo em vista a declaração de ilegalidade e consequente anulação do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa em referência e, bem assim, das liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas ("IRC") por retenção na fonte ocorridas em 2019, 2020 e 2021, aquando da colocação à disposição do Requerente de juros decorrentes de participações detidas em sociedades residentes em território português.
É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (“Autoridade Tributária” ou “AT").
O pedido de constituição do Tribunal Arbitral Coletivo (TAC) foi aceite pelo Senhor Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e automaticamente notificado à AT no dia 16 de novembro de 2023.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.° e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.° do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitros os signatários desta decisão, tendo sido notificadas as partes em 11 de janeiro de 2024, que não manifestaram vontade de recusar a designação, nos termos do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
O TAC encontra-se, desde 30 de janeiro de 2024, regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
Notificada para o efeito, a Requerida, apresentou a sua resposta a 4 de março de 2024.
Depois da Requerente apresentar Réplica, por despacho de 26 de abril de 2024, foi proferido o seguinte despacho:
“1. Pretende este Tribunal Arbitral, ao abrigo do princípio da autonomia na condução do processo, previsto no artigo 16.º, alínea c) do RJAT, dispensar a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT, por desnecessária, atendendo a que a prova produzida é meramente documental.
2. Por outro lado, notifica-se as partes para, querendo, produzirem alegações, no prazo de 10 dias, em simultâneo, podendo depois o processo prosseguir para a prolação da sentença.
3. Informa-se que a Requerente deverá proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, até a data limite de apresentação das alegações.
4. Em nome do princípio da colaboração das partes solicita-se o envio das peças processuais em versão word.
Notifiquem-se as partes do presente despacho.”
Ambas as partes apresentaram alegações escritas.
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DESCRIÇÃO SUMÁRIA DOS FACTOS
II.1 Posição da Requerente
A Requerente fundamenta o seu pedido nos seguintes termos:
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O Requerente é um OIC, com sede e direcção efectiva no Grão-Ducado do Luxemburgo, constituído e a operar ao abrigo da Loi du 17 décembre 2010 concernant les organismes de placement collectif, que transpõe para a ordem jurídica luxemburguesa a Directiva 2009/65/CE do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns OIC – cfr. cópias de certidão emitida pela Commission de Surveillance du Secteur Financier ao abrigo do artigo 2.º do Regulamento UE n.º 584/2010, da Comissão, de 1 de Julho de 2010, junta como documento n.º 2, do prospecto do Requerente, junta como documento n.º 3, e publicação do referido acto legislativo luxemburguês, disponível no sítio oficial na internet do Journal officiel du Grand-Duché de Luxembourg, em http://legilux.public.lu/eli/etat/leg/loi/2010/12/17/n9/jo.
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Tendo sido constituído e operando ao abrigo da Directiva 2009/65/CE, o Requerente cumpre no seu Estado de residência e constituição exigências equivalentes às estabelecidas na legislação portuguesa que regula a actividade dos OIC, também em transposição da referida Directiva – i.e., a Lei n.º 16/2015, de 24 de Fevereiro.
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O Requerente é administrado pela sociedade B..., S.A., entidade igualmente com residência no ..., ..., Grão-Ducado do Luxemburgo – cfr. documentos n.os 2 e 3 e cópia de certificado de residência fiscal da referida sociedade, junta como documento n.º 4.
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Em 2019, o Requerente auferiu juros pagos por entidades com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 144.000,00, os quais foram sujeitos a tributação em Portugal em sede de IRC através de retenção na fonte liberatória, nos seguintes termos:
Valores em EUR
Entidade
|
Data
|
Juros brutos
|
Retenção
na fonte
|
Juros líquidos
|
C...
|
18-04-2019
|
31.500,00
|
11.025,00
|
20.475,00
|
D...
|
09-12-2019
|
112.500,00
|
39.375,00
|
73.125,00
|
|
Totais:
|
144.000,00
|
50.400,00
|
93.600,00
|
– cfr. cópias das liquidações de IRC por retenção na fonte, juntas como documento n.º 5.
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Em 2020, o Requerente auferiu juros pagos por entidades com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 808.291,68, os quais foram sujeitos a tributação em Portugal em sede de IRC através de retenção na fonte liberatória, nos seguintes termos:
Valores em EUR
Entidade
|
Data
|
Juros brutos
|
Retenção
na fonte
|
Juros líquidos
|
D...
|
27-03-2020
|
50.047,92
|
17.516,77
|
32.531,15
|
C...
|
20-04-2020
|
31.500,00
|
11.025,00
|
20.475,00
|
D...
|
30-04-2020
|
41.625,00
|
14.568,75
|
27.056,25
|
C...
|
15-06-2020
|
9.750,00
|
3.412,50
|
6.337,50
|
E...
|
06-07-2020
|
450.500,00
|
157.675,00
|
292.825,00
|
F...
|
20-07-2020
|
68.743,76
|
23.965,82
|
44.507,94
|
D...
|
31-07-2020
|
41.625,00
|
14.568,75
|
27.056,25
|
C...
|
15-10-2020
|
57.500,00
|
20.125,00
|
37.375,00
|
C...
|
15-10-2020
|
57.500,00
|
20.125,00
|
37.375,00
|
|
Totais:
|
808.291,68
|
282.982,59
|
525.539,09
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– cfr. cópias das liquidações de IRC por retenção na fonte, juntas como documento n.º 6.
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Em 2021, o Requerente auferiu juros pagos por entidades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 274.746,00, os quais foram sujeitos a tributação em Portugal em sede de IRC através de retenção na fonte liberatória, nos seguintes termos:
Valores em EUR
Entidade
|
Data
|
Juros brutos
|
Retenção
na fonte
|
Juros líquidos
|
D...
|
29-03-2021
|
100.646,00
|
35.226,10
|
65.419,90
|
C...
|
19-04-2021
|
31.500,00
|
11.025,00
|
20.475,00
|
C...
|
15/06/2021
|
9.750,00
|
3.412,50
|
6.337,50
|
C...
|
15/10/2021
|
67.850,00
|
23.747,50
|
44.102,50
|
C...
|
15/10/2021
|
57.500,00
|
20.125,00
|
37.375,00
|
D...
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07-12-2021
|
4.500,00
|
1.575,00
|
2.925,00
|
|
Totais:
|
274.746,00
|
95.111,10
|
176.634,90
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– cfr. cópias das liquidações de IRC por retenção na fonte, juntas como documento n.º 7.
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As retenções na fonte de IRC em causa, no valor total de EUR 428.493,69, foram efectuadas e entregues junto dos cofres da Fazenda Pública pelo G... PLC, contribuinte fiscal português n.º..., e pelo H... AG, contribuinte fiscal português n.º..., na qualidade de entidades registadoras e depositárias de valores mobiliários, através das guias de retenção na fonte n.os ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., ao abrigo dos artigos 94.º, n.º 7, do CIRC – cfr. documentos n.os 5, 6 e 7.
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O Requerente não obteve qualquer crédito de imposto no seu Estado de residência relativo às retenções na fonte objecto do presente pedido de revisão oficiosa, seja ao abrigo da CEDT Portugal/Luxemburgo, seja ao abrigo da lei interna do Grão-Ducado do Luxemburgo – cfr. cópia de declaração da entidade gestora do Requerente, que se protesta juntar como documento n.º 8.
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Não se conformando com a tributação por retenção na fonte de IRC que incidiu sobre os juros de obrigações emitidas por sociedades residentes em território português, no dia 17 de Abril de 2023, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC acima identificadas, referentes aos anos de 2019, 2020 e 2021, abrigo do disposto nos artigos 78.º, n.º 1, da LGT e 137.º, n.os 1, 2 e 3, do CIRC – cfr. documento n.º 1.
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Em síntese, o Requerente sustentou no pedido de revisão oficiosa que os juros de fonte portuguesa por si auferidos não devem ser tributados em sede de IRC, ao abrigo do disposto no artigo 22.º, n.os 1, 3 e 10, do Estatuto dos Benefícios Fiscais ("EBF"), sob pena de tal consubstanciar uma discriminação injustificada entre OIC residentes e não residentes em Portugal, contrária ao princípio da livre circulação de capitais ínsito no artigo 63.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia ("TFUE") e, consequentemente, ao princípio do primado do Direito da União Europeia consagrado no artigo 8.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa ("CRP") – cfr. documento n.º 1.
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Na presente data, o referido procedimento de revisão oficiosa encontra-se pendente junto da Administração Tributária, correndo os seus termos sob o n.º ...2023... .
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Volvidos mais de quatro meses sobre a data de apresentação do referido pedido de revisão oficiosa, o Requerente não foi ainda notificado pela Administração Tributária de decisão final em sede do correspondente procedimento, verificando-se assim uma situação de indeferimento tácito.
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Neste contexto, o Requerente apresenta o presente requerimento de constituição de Tribunal Arbitral, em sede do qual explanará as razões de facto e de Direito que em seu entender determinam a ilegalidade do indeferimento tácito da reclamação graciosa em referência e, bem assim, das subjacentes liquidações de IRC por retenção na fonte.
II.2. Posição da Requerida
Por seu turno, a Requerida fundamenta a sua posição nos seguintes termos:
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O Requerente entende que as liquidações de IRC por retenção na fonte acima identificadas são ilegais, atenta a discriminação injustificada entre OIC residentes e não residentes em Portugal, operada por via do artigo 22º, nºs 1, 3 e 10, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), em violação da livre circulação de capitais, prevista no artigo 63º do TFUE e, consequentemente do primado do Direito da União Europeia sobre o Direito Interno, consagrado no artigo 8º, nº 4, da CRP.
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A título prévio, sempre se dirá que, sendo o Requerente um organismo de investimento coletivo e um sujeito passivo não residente para efeitos fiscais em Portugal, sem qualquer estabelecimento estável, deverá o peticionado ser julgado improcedente.
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Com efeito e recorrendo ao Acórdão Schumacker (processo C-279/03), o direito internacional admite que, em matéria de impostos diretos, as relações entre residentes e não residentes não são comparáveis, pois apresentam diferenças objetivas do ponto de vista do rendimento, da capacidade contributiva e da situação familiar ou pessoal.
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Importa referir que a situação dos residentes e dos não residentes não é, por regra, comparável e que a discriminação só acontece quando estamos perante a aplicação de regras diferentes a situações comparáveis ou de uma mesma regra a situações distintas.
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Atendendo a que é o Estado de residência que dispõe de toda a informação necessária para aferir um correto enquadramento contributivo e da sua capacidade contributiva global, a situação de um residente é, com certeza, distinta da de um não residente.
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Deste modo, tem o TJUE entendido que o facto de determinado Estado-membro não conceder a não residentes certos benefícios fiscais que concede a residentes, apenas pode ser discriminativo, na medida em que residentes e não residentes não se encontram numa situação comparável.
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No mesmo sentido, está o Acórdão Truck Center (C-282/07, de 22-12-2008), “cuja conclusão foi a de que sujeitos passivos residentes e não residentes não se encontram numa situação objetivamente comparável”.
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Pode assim dizer-se que, o princípio da não discriminação atende à necessidade de conferir tratamento igual ao que é igual e diferente àquilo que é diferente, na medida dessa diferença.
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De facto, resulta da jurisprudência do TJUE que determinada norma ou prática pode ser discriminatória, entrando em conflito com o Direito Comunitário, se não for objetivamente justificada.
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Ora, no caso em apreço, as alegadas diferenças de tratamento encontram-se plenamente justificadas dentro da sistematização e coerência do sistema fiscal português.
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Veja-se, aliás, que nos Acórdãos Bachman (C-204/90) e Comissão/Bélgica (C-300/90), e embora essa jurisprudência tenha sido objeto de aperfeiçoamento em decisões mais recentes, um tratamento discriminatório de entidades não residentes foi permitido pela razão de interesse geral e a coerência do sistema fiscal nacional.
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Ainda no Acórdão Marks & Spencer (C-446/03), o TJUE concluiu que a residência pode constituir um factor justificador das normas fiscais que implicam uma diferença de tratamento entre contribuintes residentes e não residentes.
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Aliás, “o TFUE refere expressamente que “a proibição de todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros (art. 63º, nº 1, do TFUE), não prejudica os Estados-Membros de “Aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em idêntica situação no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido” [art. 65º, nº 1, alínea a), do TFUE] ”(Acordão do STA 01435/12, de 20/02/2013).
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Contudo, paralela a esta opção legislativa de “aliviar” estes sujeitos passivos da tributação em IRC, é criada uma taxa em sede de Imposto do Selo incidente sobre o ativo global líquido dos OIC.
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Ou seja, optou-se por uma tributação na esfera do Imposto do Selo tendo sido aditada, à TGIS, a Verba 29, de que resulta uma tributação, por cada trimestre, à taxa de 0,0025% do valor líquido global dos OIC aplicado em instrumentos do mercado monetário e depósitos, e à taxa 0,0125%, sobre o valor líquido global dos restantes OIC, sendo que, neste caso, a base tributável pode incluir dividendos distribuídos.
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Esta reforma na tributação veio apenas a incidir sobre os OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF, dela ficando excluídos os OIC constituídos e que operem ao abrigo de uma legislação estrangeira.
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Por outro lado, está também prevista a tributação autónoma à taxa de 23%, nos termos do n.º 11 do artigo 88.º, do Código do IRC e do n.º 8 do artigo 22.º do EBF, dos dividendos pagos a OIC com sede em Portugal, quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período.
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Por isso, no presente caso, não parece estarmos em presença de situações objetivamente comparáveis, porquanto a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º, do EBF, possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pela Requerente.
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E ainda que o Fundo não consiga recuperar o imposto retido na fonte em Portugal no seu estado de residência, também não está demonstrado que o imposto não recuperado pelo Fundo não possa vir a ser recuperado pelos investidores.
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Ou seja, a aparente discriminação na forma de tributar os dividendos distribuídos por sociedades residentes a OIC não residentes, não pode levar a concluir, em nossa opinião, por uma menor carga fiscal dos OIC residentes, pois como se viu, embora o regime fiscal aplicável aos OIC constituídos ao abrigo da legislação nacional, consagre a isenção dos dividendos distribuídos por sociedades residentes, não afasta a tributação desses rendimentos, seja por tributação autónoma (IRC), seja em imposto do selo, quando os mesmos rendimentos integram o valor líquido destes organismos, logo, não pode afirmar-se que as situações em que se encontram aqueles OIC e os Fundos de Investimento constituídos e estabelecidos noutros Estados Membros que auferem dividendos com fonte em Portugal, sejam objetivamente comparáveis.
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E não sendo as situações comparáveis parece difícil de aceitar o argumento do Requerente de que a legislação nacional e particularmente o artigo 22.º do EBF está em desconformidade e contrariaria o disposto no TFUE, nomeadamente, quanto à liberdade de circulação de capitais, tendo em apreço a proibição geral de discriminação face a uma restrição injustificada à liberdade de estabelecimento prevista no artigo 63.º do referido TFUE.
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Conforme antedito, não compete à Administração Tributária avaliar a conformidade das normas internas com as do TFUE, não podendo aceitar de forma direta e automática as orientações interpretativas do TJUE, quando estas não têm, na sua origem, a apreciação de compatibilidade entre as disposições do direito interno português e o direito europeu.
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A administração tributária não pode deixar de aplicar as normas legais que a vinculam, porquanto está a mesma adstrita ao princípio da legalidade positivada.
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A administração tributária, como qualquer órgão da Administração Pública, encontra-se estritamente vinculada ao cumprimento da lei, de acordo com o artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), aplicável subsidiariamente às relações jurídico-tributárias [ex vi do artigo 2.º alínea c) da LGT.
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A administração tributária tem que aplicar o disposto nos códigos fiscais que se encontram em vigor e as disposições deles constantes que regulam determinada relação jurídico-tributária, de acordo com o artigo 2.º alínea b) da LGT, in casu, as normas constantes do Código do IRC e do EBF acima citadas.
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Na verdade, tem a administração tributária que considerar que no processo de elaboração das normas em questão, o legislador doméstico terá tido em atenção todo o ordenamento jurídico, quer nacional quer internacional, pelo que essas normas devem respeitar os mesmos, sendo certo, também, que não cabe à administração tributária a sindicância das normas no que concerne à sua adequação relativamente ao Direito da União Europeia.
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Ora, encontra-se consagrada no artigo 63.º do TFUE, a liberdade de circulação de capitais estabelece uma íntima relação com as demais liberdades fundamentais, a saber, de circulação de pessoas, de estabelecimento e de prestação de serviços, diferenciando-se delas na medida em que sem estende a terceiros Estados.
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A liberdade de circulação de capitais implica a proibição de discriminação entre capitais do Estado-Membro e capitais provenientes de fora.
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Os Estados-Membros podem regular em alguma medida a circulação de capitais, mas não podem discriminar.
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Quando se trata de densificar conceitualmente o âmbito normativo da liberdade de circulação de capitais observa-se a inexistência de uma definição deste conceito.
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Por este motivo, o TJUE tem sucessivamente acolhido e sublinhado o valor enumerativo e indicativo, mas não exaustivo, da Diretiva n.º 88/361/CEE, incluindo o respetivo Anexo I, nomeadamente o número IV, onde se subsumem ao conceito uma vasta constelação de operações e transações transfronteiriças sobre certificados de participação em organismos de investimento coletivo, em que se incluem os relevantes in casu.
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Com efeito, a distribuição de dividendos efetuada por sociedades residentes em Portugal ao ora Requerente é passível de ser qualificada como movimento de capital na aceção do artigo 63.º do TFUE e da própria Diretiva 88/361/CEE, de 24 de junho de 1988.
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Devem ser salientados, porque se revestem de grande relevância hermenêutica e metódica, pelo menos quatro aspetos fundamentais de regime jurídico.
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O primeiro diz respeito à aplicabilidade direta do artigo 63.º TFUE e da inerente proibição de restrições injustificadas da liberdade de circulação de capitais.
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O segundo refere-se ao facto de as liberdades fundamentais do mercado interno terem como principais destinatários os Estados-Membros, que devem abster-se de adotar medidas legislativas, administrativas e jurisdicionais de restrição das mesmas.
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O terceiro aspeto prende-se com a relação de complementaridade – e por vezes de sobreposição – que a liberdade de circulação de capitais estabelece com as liberdades de circulação de mercadorias e de pessoas, a liberdade de estabelecimento e a liberdade de prestação de serviços.
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O quarto aspeto tem que ver com o reforço progressivo da importância da liberdade de circulação de capitais no mercado interno, especialmente a partir da criação da União Económica e Monetária (UEM).
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Um dos principais objetivos da UEM consiste, precisamente, em facilitar a livre transferência de capital entre os Estados-Membros no quadro do mercado interno e das relações económicas e financeiras com Estados terceiros.
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A verdade é que o Requerente não esclareceu/provou (apenas alegou) se, no caso concreto, existiu ou não um crédito de imposto por dupla tributação internacional na esfera do próprio Requerente ou dos investidores.
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Assim, contrariamente ao afirmado pelo Requerente, não pode afirmar-se que se esteja perante situações objetivamente comparáveis, porquanto, a tributação dos dividendos opera segundo modalidades diferentes, e nada indica que a carga fiscal que onera os dividendos auferidos pelos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF possa ser mais reduzida do que a que recai sobre os dividendos auferidos em Portugal pela Requerente, antes, pelo contrário.
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Pois bem, o Requerente insiste na ideia de que a AT deveria aplicar a norma jurídica do artigo 63.º do TFUE em conformidade com as interpretações do TJUE proferidas até à presente data, todavia, isso equivale a remeter para a doutrina dos acórdãos que só pode ser entendida atendendo às circunstâncias dos casos concretos submetidos àquele Tribunal.
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E a prova é a de que o intérprete só pode vincular-se às decisões do TJUE, quando delas resultem orientações claras, precisas e inequívocas e que tenham resultado da apreciação da conformidade com o Tratado de realidades factuais e normativas idênticas, o que não sucede com as realidades subjacentes aos acórdãos relativos a processos que envolvem fundos de investimento.
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Ora, com o devido respeito, a jurisprudência do TJUE não autoriza o intérprete a extrair a conclusão, em abstrato, de que a mera existência de uma retenção na fonte de IRC incidindo apenas sobre os dividendos pagos por uma sociedade residente a um Fundo de Investimento estabelecido noutro Estado-Membro constitui por si só uma restrição à livre circulação dos fluxos de capital no espaço europeu, sem que seja feita uma apreciação global do regime fiscal aplicável aos Fundos de Investimento constituídos e estabelecidos em Portugal.
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Para efeitos de averiguar, em concreto, se as situações objetivas dos OIC abrangidos pelo artigo 22.º do EBF e dos Fundos de investimento estabelecidos noutros Estados-Membros são comparáveis, no tocante à tributação dos dividendos distribuídos por uma sociedade residente, necessário se torna comparar a carga fiscal que onera uns e outros em relação ao mesmo tipo de investimentos.
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SANEAMENTO
O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, admite-se a cumulação de pedidos e são legítimas e estão representadas (vide artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).
O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 2, alínea a), do RJAT.
O processo não enferma de nulidades.
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Fundamentação
IV.1. Matéria de facto
Factos dados como provados
Considera-se como provada a seguinte matéria de facto:
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O Requerente é um OIC, com sede e direcção efectiva no Grão-Ducado do Luxemburgo, constituído e a operar ao abrigo da Loi du 17 décembre 2010 concernant les organismes de placement collectif, que transpõe para a ordem jurídica luxemburguesa a Directiva 2009/65/CE do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 13 de Julho de 2009, que coordena as disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes a alguns OIC – cfr. cópias de certidão emitida pela Commission de Surveillance du Secteur Financier ao abrigo do artigo 2.º do Regulamento UE n.º 584/2010, da Comissão, de 1 de Julho de 2010, junta como documento n.º 2, do prospecto do Requerente, junta como documento n.º 3, e publicação do referido acto legislativo luxemburguês, disponível no sítio oficial na internet do Journal officiel du Grand-Duché de Luxembourg, em http://legilux.public.lu/eli/etat/leg/loi/2010/12/17/n9/jo.
-
Tendo sido constituído e operando ao abrigo da Directiva 2009/65/CE, o Requerente cumpre no seu Estado de residência e constituição exigências equivalentes às estabelecidas na legislação portuguesa que regula a actividade dos OIC, também em transposição da referida Directiva – i.e., a Lei n.º 16/2015, de 24 de Fevereiro.
-
O Requerente é administrado pela sociedade B..., S.A., entidade igualmente com residência no. ..., Grão-Ducado do Luxemburgo – cfr. documentos n.os 2 e 3 e cópia de certificado de residência fiscal da referida sociedade, junta como documento n.º 4.
-
Em 2019, o Requerente auferiu juros pagos por entidades com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 144.000,00, os quais foram sujeitos a tributação em Portugal em sede de IRC através de retenção na fonte liberatória, nos seguintes termos:
Valores em EUR
Entidade
|
Data
|
Juros brutos
|
Retenção
na fonte
|
Juros líquidos
|
C...
|
18-04-2019
|
31.500,00
|
11.025,00
|
20.475,00
|
D...
|
09-12-2019
|
112.500,00
|
39.375,00
|
73.125,00
|
|
Totais:
|
144.000,00
|
50.400,00
|
93.600,00
|
– cfr. cópias das liquidações de IRC por retenção na fonte, juntas como documento n.º 5.
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Em 2020, o Requerente auferiu juros pagos por entidades com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 808.291,68, os quais foram sujeitos a tributação em Portugal em sede de IRC através de retenção na fonte liberatória, nos seguintes termos:
Valores em EUR
Entidade
|
Data
|
Juros brutos
|
Retenção
na fonte
|
Juros líquidos
|
D...
|
27-03-2020
|
50.047,92
|
17.516,77
|
32.531,15
|
C...
|
20-04-2020
|
31.500,00
|
11.025,00
|
20.475,00
|
D...
|
30-04-2020
|
41.625,00
|
14.568,75
|
27.056,25
|
C...
|
15-06-2020
|
9.750,00
|
3.412,50
|
6.337,50
|
E...
|
06-07-2020
|
450.500,00
|
157.675,00
|
292.825,00
|
F...
|
20-07-2020
|
68.743,76
|
23.965,82
|
44.507,94
|
D...
|
31-07-2020
|
41.625,00
|
14.568,75
|
27.056,25
|
C...
|
15-10-2020
|
57.500,00
|
20.125,00
|
37.375,00
|
C...
|
15-10-2020
|
57.500,00
|
20.125,00
|
37.375,00
|
|
Totais:
|
808.291,68
|
282.982,59
|
525.539,09
|
– cfr. cópias das liquidações de IRC por retenção na fonte, juntas como documento n.º 6.
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Em 2021, o Requerente auferiu juros pagos por entidades comerciais com residência fiscal em território português, no montante total de EUR 274.746,00, os quais foram sujeitos a tributação em Portugal em sede de IRC através de retenção na fonte liberatória, nos seguintes termos:
Valores em EUR
Entidade
|
Data
|
Juros brutos
|
Retenção
na fonte
|
Juros líquidos
|
D...
|
29-03-2021
|
100.646,00
|
35.226,10
|
65.419,90
|
C...
|
19-04-2021
|
31.500,00
|
11.025,00
|
20.475,00
|
C...
|
15/06/2021
|
9.750,00
|
3.412,50
|
6.337,50
|
C...
|
15/10/2021
|
67.850,00
|
23.747,50
|
44.102,50
|
C...
|
15/10/2021
|
57.500,00
|
20.125,00
|
37.375,00
|
D...
|
07-12-2021
|
4.500,00
|
1.575,00
|
2.925,00
|
|
Totais:
|
274.746,00
|
95.111,10
|
176.634,90
|
– cfr. cópias das liquidações de IRC por retenção na fonte, juntas como documento n.º 7.
-
As retenções na fonte de IRC em causa, no valor total de EUR 428.493,69, foram efectuadas e entregues junto dos cofres da Fazenda Pública pelo G... PLC, contribuinte fiscal português n.º..., e pelo H... AG, contribuinte fiscal português n.º..., na qualidade de entidades registadoras e depositárias de valores mobiliários, através das guias de retenção na fonte n.os ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., ao abrigo dos artigos 94.º, n.º 7, do CIRC – cfr. documentos n.os 5, 6 e 7.
-
O Requerente não obteve qualquer crédito de imposto no seu Estado de residência relativo às retenções na fonte objecto do presente pedido de revisão oficiosa, seja ao abrigo da CDT Portugal/Luxemburgo, seja ao abrigo da lei interna do Grão-Ducado do Luxemburgo – cfr. cópia de declaração da entidade gestora do Requerente, que se protesta juntar como documento n.º 8.
-
Não se conformando com a tributação por retenção na fonte de IRC que incidiu sobre os juros de obrigações emitidas por sociedades residentes em território português, no dia 17 de Abril de 2023, o Requerente apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC acima identificadas, referentes aos anos de 2019, 2020 e 2021, abrigo do disposto nos artigos 78.º, n.º 1 da LGT e 137.º, n.os 1, 2 e 3, do CIRC, não tendo sido, até ao momento, notificada de qualquer decisão sobre o mesmo proferida.– cfr. documento n.º 1.
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Perante o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa o Requerente apresentou no CAAD, em 15 de novembro de 2023, o presente Pedido de Pronúncia Arbitral.
Factos dados como não provados
Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.
Fundamentação da matéria de facto provada e não provada
A matéria de facto foi fixada por este TAC e a convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes, bem como nos documentos juntos aos autos.
Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor, cfr. n.º 1 do artigo 596.º e n.ºs 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do CPC, aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, cfr. n.º 2 do artigo 123.º do CPPT.
Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do n.º 7 do artigo 110.º do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Acórdão do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo n.º 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspeção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a decisão, em relação às provas produzidas, na íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a experiência de vida e conhecimento das pessoas, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC.
Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
IV. 2. Matéria de Direito
IV. 2.A. Quanto à exceção de incompetência
Na sua Resposta, vem a Autoridade Tributária e Aduaneira defender-se que «a Requerente não identificou corretamente a guia de pagamento correspondente [ao acto tributário em referência]» e que «A guia identificada com o n.º ..., que supostamente seria a correspondente à entrega daquela retenção na fonte, não consta do sistema informático da AT», afirmando que «o pedido de revisão oficiosa não foi instaurado relativamente à retenção na fonte referente àquele período [Abril de 2020]».
Discordamos com o mencionado entendimento
Na verdade, e conforme bem assinalado pelo Requerente, em momento algum o legislador sequer prevê a possibilidade de, em alternativa a uma decisão de indeferimento (ou deferimento), a Administração Tributária proferir uma decisão de rejeição de instauração do pedido de revisão oficiosa ou a possibilidade de haver uma presunção de rejeição da instauração do pedido de revisão oficiosa.
Em segundo lugar, a suposta «rejeição de instauração» trata-se pois de uma decisão sem qualquer previsão legal e que, assim, nem sequer se poderia arrogar a caracterização como um acto administrativo em matéria tributária, mas tão-só como um acto simplesmente inexistente na ordem jurídica.
Em terceiro, também no caso dos autos e não obstante o pedido de revisão oficiosa ter sido apresentado para além do prazo da reclamação administrativa, mas dentro do prazo em que a AT poderia ter revisto os atos de retenção na fonte indevida, estamos perante uma situação de substituição tributária, concretizada através de retenção na fonte a título definitivo, em que não houve intervenção do Requerente, e em que o substituto atuou por imposição legal, devendo o erro na retenção na fonte e a prova da mesma ser imputado aos serviços.
Sem prejuízo do referido, cabe notar que ao Requerente, na qualidade de substituído tributário apenas incumbe fazer prova da ocorrência efectiva da retenção, encontrando-se tal prova realizada a partir dos elementos fornecidos pelo Requerente. Tal prova, demonstra inequivocamente que o substituído tributário suportou o encargo patrimonial do imposto, sendo incumbência da AT verificar a conformidade das guias de entrega e, na eventualidade do imposto retido não lhe ter sido entregue, diligenciar pela sua cobrança.
Em face de todo o exposto, é de concluir pela admissibilidade do pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC – retenção na fonte, dentro do prazo e com os fundamentos previstos no n.º 1 – 2.ª parte, do artigo 78.º, da LGT, independentemente de tal pedido ter sido expressa ou tacitamente indeferido, bem como pela arbitrabilidade da pretensão da Requerente e, consequentemente, pela improcedência da exceção da incompetência deste Tribunal Arbitral para dirimir o litígio em análise, invocada pela Requerida.
IV. 2.B. Enquadramento do Thema decidendum
A questão controvertida nos presentes autos é a de saber se a retenção na fonte de IRC, a título definitivo, sobre dividendos pagos a OICVM não residentes em Portugal viola o Direito da União e o Direito Constitucional.
De facto, o artigo 22.º, n.º 1. do EBF não dispensa de retenção na fonte a título definitivo os dividendos distribuídos por sociedades residentes a OICVM residentes noutros Estados Membros da União Europeia, enquanto o n.º 3 dispensa essa retenção quando esses dividendos sejam distribuídos a OICVM que atuem e operem de acordo com a legislação nacional.
Ora o artigo 63.º do TFUE proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados Membros da União Europeia ou entre estes e países terceiros, sendo que, tal como reconhece a Requerida, a distribuição de dividendos efetuada por sociedades residentes em Portugal a sociedades não residentes - como é o caso da ora Requerente - é passível de ser qualificada como movimento de capital na aceção do referido normativo convencional.
Ocorrendo um tratamento diferenciado, prejudicial para a Requerente enquanto OICVM não residente, constata-se uma contrariedade inequívoca do disposto no artigo 63.º TFUE, na medida em que é suscetível de dissuadir os não residente de investir num Estado-Membro (cf. ac. 21.6.2018, Fidelity Funds, proc.º C-480/16, n.os 40 e 44; ac. 10.5.2012, Santander Asset Management SGIIC, proc.os C‑338/11 a C‑347/11, n.º 15; ac 25.1.2007, Festersen, proc.º C‑370/05, n.° 24; ac. 18.12.2007, A, proc.º C‑101/05, n.° 40 e ac. 10.2.2011, Haribo Lakritzen Hans Riegele Österreichische Salinen, proc.os C‑436/08 e C‑437/08, n.° 50).
De facto, na situação em apreço – tal como acontecia na situação apreciada pelo TJUE no ac. Fidelity Funds, referido no parágrafo anterior – [a]o fazer uma retenção na fonte sobre os dividendos pagos aos OICVM não residentes e ao reservar aos OICVM residentes a possibilidade de obter a isenção de tal retenção na fonte, a regulamentação nacional em causa nos processos principais procede a um tratamento desfavorável dos dividendos pagos aos OICVM não residentes (n.º 43 do referido acórdão).
Constatando-se a existência de uma restrição, importa conferir se essa mesma restrição é justificável nos termos do artigo 65.º, n.º 1, alínea a) do TFUE, que afirma que o disposto no artigo 63.º do TFUE não prejudica o direito de os Estados‑Membros aplicarem as disposições pertinentes do seu direito fiscal que estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem em situação idêntica no que se refere ao seu lugar de residência ou ao lugar em que o seu capital é investido.
O Requerente entende que não e explica-o detalhadamente, socorrendo-se de inúmeras referências bibliográficas e jurisprudenciais (sendo que, em relação a estas, não pode deixar de se lamentar o carácter incompleto das mesmas, na medida em que, não apenas, por vezes, ignora a referência à data da decisão – o que seria compreensível quando se tratasse de repetições –, mas principalmente porque nunca refere o número ou parágrafo do aresto do qual retira a afirmação pretendida). Tão extensa é a explicação, que nos vemos obrigados a evitar segui-la (acolhendo ou afastando os argumentos, sendo caso disso), sob pena de prolongarmos a análise para lá do necessário.
A Requerida entende que sim – que se trata, portanto, de uma situação integrável no regime excecional do artigo 65.º, n.º 1, alínea a) do TFUE.
Explica, no essencial, que as situações – dos OICVM residentes e não residentes – não são comparáveis, já que, em relação ao regime aplicável aos primeiros, o legislador revela opções legislativas específicas que aliviam a tributação em IRC e derrama, estadual e municipal, deslocando-a para o imposto de selo, ao passo que em relação aos últimos (os não residentes) preferiu optar por uma retenção na fonte em sede de IRC.
A argumentação da Requerida, neste ponto, não colhe.
Desde logo porque, constituindo o artigo 65.º, n.º 1, alínea a) do TFUE uma exceção à regra geral da proibição das restrições à livre circulação de capitais fixada no artigo 63.º do mesmo tratado, ele é necessariamente de interpretação estrita, não podendo assumir-se que toda a distinção em função da residência seja automaticamente compatível (ac. 17.9.2015, Miljoen, proc.os C-10/14, C-14/14 e C-17/14, n.º 63; ac. 17.10.2013, Welte, proc.º C‑181/12, n.os 42, 43; ac, 17.1.2008, Jäger, proc.º C‑256/06, n.° 40; ac. 11.9.2008 , Eckelkamp e o., proc. C-11/07, n.° 57; ac. 11.9.2008, Arens‑Sikken, proc.º C-43/07, n.° 51; ac. 22.4.2010, Mattner, proc.º C-510/08, n.° 32).
Ora, o facto de reservar aos OICVM residentes a possibilidade de obter uma isenção da retenção na fonte não é justificado por uma diferença de situação objetiva entre esses OICVM e os não residentes, pelo que tal restrição apenas pode ser admitida se se justificar por razões imperiosas de interesse geral, se for adequada para garantir a realização do objetivo por ela prosseguido e se não for além do que é necessário para o alcançar (ac. Fidelity Funds, cit., n.ºs 63 e 64; ac. de24. 11.2016, SECIL, proc.º C‑464/14, n.º 56).
Nada disso é invocado ou explicado pela Requerida, que se limita a explicar a existência de regimes diferentes, não justificando essa diferença, e parecendo querer encontrar uma equivalência entre ambos.
Chegando mesmo a afirmar que a aplicação do imposto de selo, conjugada com a eventual aplicação do regime previsto no artigo 88.º CIRC, pode, em certos casos, exceder os 23% (o que ultrapassaria a taxa de 15% de retenção na fonte aplicada aos OICVM não residentes).
O argumento não colhe, porque aponta apenas a situações limite (em especial o caso da tributação autónoma de 23%, a qual ocorre apenas quando as partes sociais a que respeitam os lucros não tenham permanecido na titularidade do mesmo sujeito passivo, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e não venham a ser mantidas durante o tempo necessário para completar esse período). Ora a comparação não pode naturalmente fazer-se através de situações limite. E, por outro lado, o argumento cai por força dos factos, já que pretende afirmar um regime mais vantajoso para os OICVM não residentes, o qual, se existisse, não justificaria o pedido da Requerente.
A par desse argumento, a Requerida afirma (ou pretende concluir) que as situações não são comparáveis. Também esta pretensão não colhe.
De facto, a partir do momento em que um Estado‑Membro, de maneira unilateral ou por via convencional, sujeita ao imposto sobre o rendimento não só as sociedades residentes mas também as sociedades não residentes, relativamente aos rendimentos que recebem de uma sociedade residente, a situação das referidas sociedades não residentes assemelha‑se à das sociedades residentes (ac, Fidelity Funds, cit., n.º 54; ac. 25.10.2012, Comissão/Bélgica, proc.º C‑387/11, n.º 49; ac. 20.10.2011, Comissão/Alemanha, proc.º C-284/09, n.º 56), o que implica a comparabilidade.
Invoca ainda a Requerida o facto de o imposto retido ao Requerente poder eventualmente dar lugar a um crédito de imposto por dupla tributação internacional tanto na esfera do Requerente, bem como na esfera dos investidores, sendo que esta última questão o Requerente não esclareceu.
A demonstração de que o Requerente não poderia obter um crédito de imposto dedutível no país da sua residência ficou provada documentalmente. A Requerida não o contesta, acrescentando apenas que essa dedutibilidade poderá, todavia, surgir na esfera dos investidores, pelo que, no seu entender, deveria o Requerente demonstrar o contrário.
Sobre esta matéria bastará voltarmos, de novo, ao citado ac. Fidelity Funds, que, numa situação idêntica e face a esse mesmo argumento, esclarece que, se o objetivo da regulamentação em causa é deslocar o nível de tributação do veículo de investimento para o acionista desse veículo, então serão, em princípio, as condições materiais do poder de tributação sobre os rendimentos dos acionistas que devem ser consideradas determinantes, e não a técnica de tributação utilizada. Assim, a impossibilidade de tributar os participantes não residentes sobre os dividendos distribuídos pelos OICVM não residentes deve ser assumida por coerência com a lógica da deslocação do nível de tributação do veículo para o acionista (n.ºs 60 e 62).
Não tem, portanto, cabimento, a exigência da AT de que o Requerente teria de demonstrar a inexistência de um eventual crédito de imposto de que pudessem ser beneficiários os acionistas, até porque essa prova sempre seria impossível de produzir, na medida em que sendo o número destes indeterminado, podem, além disso, residir em qualquer ponto do planeta.
A requerida invoca ainda uma decisão do CAAD, favorável à AT, numa situação em tudo idêntica à do presente PPA.
O argumento é relevante, na medida em que, muito embora não existam propriamente precedentes judiciais, não é expectável ou desejável, por princípio, que as decisões do CAAD se contrariem. Essa circunstância impõe, por isso, uma ponderação especial.
Porém, analisada a decisão em causa (do proc. 96/2019-T) – nos termos aliás transcritos na Resposta – verifica-se que o sentido daquela não é replicável na situação sub judice. E isto porque, no caso, a decisão foi favorável à AT porque o tribunal entendeu que teria sido necessário à Requerente invocar e demonstrar a impossibilidade de dedução do imposto (no caso, na RFA), o que não terá acontecido.
Acontece que, na situação agora em apreço, essa invocação e demonstração ocorreram, pelo que, aparentemente, poderia mesmo ser invocado o argumento a contrario sensu, ou seja, em benefício do Requerente.
Não colhe, portanto, genericamente, a argumentação da Requerida.
E constatando-se que o regime aplicado envolve um tratamento discriminatório violador do artigo 63.º do TFUE, não justificável à luz do art.º 65.º, n.º 1, alínea a) do mesmo tratado, tem de considerar-se que o mesmo regime deve ser desaplicado, por força do artigo 8.º, n.º 4 da CRP, já que, sendo o Direito da União aplicado nos termos definidos por ele mesmo, o princípio do primado (cf. Declaração 17 anexa ao TFUE) impõe essa solução.
IV. 2.C. Juros indemnizatórios
O Requerente pede que, havendo provimento do pedido, seja a AT condenada no pagamento de juros indemnizatórios, o que a Requerida impugna, alegando que os erros que afetam as retenções na fonte não são lhe imputáveis, pois não foram por ela praticadas e, consequentemente, não há direito a juros indemnizatórios derivado da sua prática, à face do preceituado no artigo 43.º da LGT.
Não colhe, novamente, a argumentação da Requerida.
O direito a juros indemnizatórios a que alude a norma da LGT supra referida pressupõe que haja sido pago imposto por montante superior ao devido e que tal derive de erro, de facto ou de direito, imputável aos serviços da AT. Ora, no caso destes autos, é manifesto que, quanto às liquidações que, pelo acima exposto, se considera estarem feridas de ilegalidade, há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das disposições dos artigos 43.º, n.º 3, alínea c), da LGT e 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que a ora Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).
-
DECISÃO
Com base nos fundamentos de facto e de direito acima enunciados e, nos termos do artigo 2.º do RJAT, decide-se em, julgando improcedente a exceção da incompetência do Tribunal Arbitral e procedente o pedido de pronúncia arbitral:
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Declarar a ilegalidade e determinar a anulação das liquidações de IRC – Retenções na fonte –, referentes aos anos de 2019, 2020 e 2021 peticionadas, bem como da decisão tácita de indeferimento do pedido de revisão oficiosa das mesmas liquidações;
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Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira na restituição ao Requerente da quantia indevidamente paga, acrescida de juros indemnizatórios, a calcular nos termos do artigo 43.º, n.º 3, alínea c), da LGT.
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Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento das custas do processo.
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Valor do processo
Fixa-se o valor do processo em € 428.493,69, nos termos do disposto no artigo 32.º do CPTA e no artigo 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).
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Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de € 7.038,00, a pagar pela Requerida, uma vez que houve total procedência do pedido, conformemente ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do RCPAT.
Notifique-se.
Lisboa, 11 de junho de 2024
Os Árbitros,
(Guilherme W. d’Oliveira Martins)
(Filipa Barros)
(António Lima Guerreiro)
DECLARAÇÃO DE VOTO
Em minha opinião, o Tribunal Arbitral não deveria ter-se pronunciado sobre a pretensão da Requerente, relativamente à impugnação das retenções na fonte de 2019 e 2020, por a apreciação da legalidade destas estar excluída do âmbito da jurisdição arbitral.
Embora não havendo qualquer dúvida de que o art. 63.º do TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção, independentemente de essa retenção na fonte poder, ou não , ser neutralizada por convenção sobre dupla tributação internacional(Acórdão do TJUE no proc. C-545/19 e Acórdão do Pleno do STA de 28/9/2023, proc. 093.19.7 BALSB), como vem sustentado a IV.2.B desta Decisão Arbitral, a natureza desses impugnações não cabe no âmbito das competências do CAAD, mais especificamente, como vem definidas, no que interessa ao presente caso, pelo art. 2º da Portaria nº 112-A/2011, de 22/3, que exclui da vinculação da AT à jurisdição do CAAD os atos de retenção na fonte que não tiverem sido precedidos do recurso à via administrativa, nos termos do art. 132º do CPPT.
Com efeito, nos termos do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul , de 18/5/2023, proc. 151/19.8BCLSB, o conceito de “pronúncia indevida”, referido na alínea a) do nº 1 do art.º 28.ºdo RJAT, fundamento de recurso para esse Tribunal das decisões dos tribunais arbitrais, abrange a impugnação da decisão arbitral com fundamento na incompetência material do tribunal arbitral, vício , aliás, que, sendo de conhecimento oficioso, é causa de nulidade e não de mera anulabilidade das retenções.
Ainda que se admitisse , por simples hipótese, a competência material do Tribunal Arbitral para o conhecimento da causa, a pretensão da Requerente , como depois se explica, não tem enquadramento no nº 1 do art. 78º da LGT , já que se esgotou o prazo de reclamação administrativa (120 dias) ou impugnação judicial (90 dias), a que se referem a alínea a) do nº 1 do art. 10º do RJAT e, por remissão, a alínea e) do nº 1 do art. 102º do CPPT, aplicável a todos os atos suscetíveis de impugnação autónoma, como a retenção na fonte definitiva de IRC..
Acompanho, assim, integralmente a Declaração de Voto expressa na Decisão Arbitral nº 928/2023- T e divirjo das Decisões Arbitrais nºs -928/2023- T, 943/2023- T, 965/2023- T e 997/2023- T, as quais expressamente se pronunciaram sobre essa questão de direito em sentido convergente com o da presente Decisão Arbitral.
A impugnação na retenção na fonte pelo substituído tributário , no caso, a Requerente, é regulada pelo nº3 , por remissão, do subsequente nº 4, ambos fazendo parte do art. 132º do CPPT, dependendo o regime aplicável de a retenção na fonte ser definitiva ou por conta do imposto devido a final.
Com efeito, segundo esse nº4, à impugnação pelo substituído da retenção que lhe tiver sido efetuada, é aplicável o nº 3 anterior, salvo quando a retenção tiver a mera natureza de pagamento por conta do imposto devido a final, caso em que o erro na retenção deve ser impugnado, não autonomamente , mas no próprio ato tributário de liquidação.
É uma consequência lógica do princípio da impugnação unitária do ato tributário consagrado no art. 54º do CPPT, em que os vícios dos chamados atos interlocutórios são impugnados nessa liquidação.
A retenção efetuada à Requerente, não residente em território português, pelas sociedades devedoras dos dividendos pagos, tem natureza definitiva, estando, assim, abrangida pelos nºs 3 e 4 do art.132º.
Essa doutrina extrai-se do acórdão do STA de 4/5/2022. Proc. 03012/16.9BELRS, de acordo com o qual à reclamação graciosa deduzida pelo substituído contra o ato de retenção na fonte relativamente a rendimentos de dívida pública, que também constituem rendimentos de capitais, obtidos por não residentes, em território português, quando aquela retenção seja a título definitivo, aplica-se o mesmo regime previsto para a impugnação por parte do substituto, pelo que o prazo de dois anos de que dispõe o substituto, é igualmente o prazo aplicável ao substituído.
Segundo tal nº 3 do art. 132º, o substituto que quiser impugnar reclamará graciosamente para o órgão periférico regional da administração tributária competente no prazo de 2 anos a contar do termo do prazo no nº1 , que impõe ao substituto tributário o dever de descontar o imposto entregue a mais nas entregas seguintes da mesma natureza do ano do pagamento o indevido.
O nº 6 desse art. 132º determina, no entanto, a aplicação à impugnação da retenção na fonte do nº 3 do anterior art. 131º, nos termos do qual não há lugar à reclamação necessária quando estiver exclusivamente em causa matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária. Uma vez o topo da cadeia hierárquica da administração fiscal já se ter pronunciado sobre a questão de direito discutida no processo, não se justificaria , por presuntivamente carecer de utilidade, sujeitar o impugnante ao ónus de reclamação necessária.
A aplicação desse n.º 3 do art. 131º do CPPT, exceção à regra da reclamação prévia necessária dos atos de retenção na fonte, depende, assim, de dois requisitos cumulativos.
a) O erro na retenção ser somente de direito.
b) O contribuinte ter seguido na retenção as instruções genéricas da administração tributária, considerando-se para esse efeito, nos termos dos nºs 1 e 3 do art. 55º do CPPT, apenas as orientações necessariamente de carácter abstrato, sancionadas pelo seu dirigente máximo visando a uniformização da interpretação e aplicação das normas de direito tributário, constantes de circulares administrativas devidamente publicadas. O indeferimento anterior de reclamação graciosa com os mesmos fundamentos de direito da impugnação da retenção n fonte não pode ser considerado orientação genérica, já que o objeto do ato é a apreciação da legalidade de um concreto ato de liquidação, não vinculando os serviços a decidir ulteriormente do mesmo modo (nesse sentido, Acórdão do STA de 19/1/2023, no proc. 01917/214BELRS, ainda não publicado por, tendo sido admitido recurso de revista por Acórdão de 24/5/2023, não ter ainda transitado em julgado).
O legislador não admitiu, assim, em termos irrestritos, a impugnação dos atos de retenção da fonte: o regime- regra é o da impugnação prévia necessária, sem prejuízo da exceção do nº 6 do art. 132º. Tal reclamação prévia necessária deve ser apresentada nos dois anos posteriores ao termo do ano do pagamento indevido.
Os pagamentos indevidos datam dos anos de 2019, 2020 e 2021 tendo o pedido de revisão oficiosa, suscetível de convolação em reclamação graciosa nos termos do art. 52º do CPPT sido deduzido a 17/4/2023, pelo que o ónus de reclamação prévia necessária apenas foi cumprido relativamente às retenções efetuadas em 2021. Com efeito, os prazos de reclamação das retenções de 2019 e 202º terminaram respetivamente a 31/12/2021 e 31/12/2022, muito anteriormente a 17/2/2023.
Sendo verdade o erro na retenção ser exclusivamente de direito, nenhum elemento consta dos autos no sentido de que as entidades retentoras, as sociedades de direito nacional que pagaram dividendos ao OIC requerente, seguiram qualquer circular administrativa publicada no Portal das Finanças sobre o tema em causa, que, aliás não existe, e, por isso, não poderia ser invocada por esse OICs.
Como é sabido, as normas do TFUE (Tratado de Funcionamento da União Europeia) , em que se inclui o art. 63º que consagra o princípio da liberdade de circulação de capitais não têm aplicação direta (Patrícia Fragoso Martins. “O Princípio do Primado do Direito Comunitário sobre as Normas Constitucionais dos Estados Membros- Dos Tratados ao Projeto de Constituição Europeia”, Lisboa, 2005, pg. 29).
Podem, no entanto, tais normas, caso sejam invocadas perante tribunais nacionais, ter efeito direto, consequente do primado do Direito Comunitário, como seria desenvolvido pela jurisprudência do TJUE logo a partir do Tratado de Roma.
Com efeito, o conhecido Acórdão do TJUE C- 26/62, de 5/2/63, conhecido por Van Gend & Loos, tal art. 12º do Tratado de Roma reconheceu aos particulares, pela primeira vez, direitos individuais que as jurisdições internas dos Estados membros deveriam salvaguardar, incluindo os direitos inerentes à liberdade de circulação.
Segundo o posterior Acórdão do TJUE no proc, nº C- 166/77, de 9/3/78, conhecido por Simmenthal, a salvaguarda desses direitos não depende de o juiz solicitar ou esperar a prévia eliminação da norma interna incompatível, quer por via legislativa, quer por qualquer outro processo constitucional do Estado membro.
De acordo com essa jurisprudência comunitária, o princípio da legalidade impõe, aos tribunais nacionais, a interpretação das normas de direito nacional de acordo com o direito comunitário e, em caso de conflito, aplicar preferentemente as normas de direito comunitário..
A Circular nº 6/ 2015, de 7/2, que se pronunciaria sobre a interpretação e aplicação das normas do DL nº 7/2015, de 13/1,apenas visa a uniformização da interpretação e , aplicação do art. 22º do EBF , que, nos termos do nº 1 do art. 22º do EBF, apenas se aplica aos rendimentos obtidos por fundos de investimento mobiliário, fundos de investimento imobiliário, sociedades de investimento mobiliário e sociedades de investimento imobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional e não aos OICs constituídos de acordo com a legislação de outros países da União Europeia ou países terceiros.
De acordo com o mencionado Acórdão no processo nº C-545/19 do TJUE , o art. 63. do TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado‑Membro por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um OIC não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção.
Os efeitos desse Acórdão, como é sabido, nos termos do art. 267º do TFUE, circunscrevem –se ao processo em que foi proferido, carecendo de força obrigatória geral..
Por outro lado, como também é do conhecimento geral, não cabe ao TJUE interpretar as normas do direito nacional, competência que é dos Estados membros, através dos órgãos competentes.
As sociedades nacionais devedoras dos dividendos optaram legitimamente , no entanto, por não proceder a uma interpretação restritiva ou, se quiser, atualista da alínea c) do nº 1 do art, 94 º do CIRC, que a compatibilizasse com o princípio da liberdade de circulação de capitais como seria afirmado no proc. C-545/19, continuando a proceder a retenção na fonte nos termos anteriores à entrada em vigor da DL nº 7/2015.
O erro na retenção foi dos substitutos/retentores e não da administração fiscal junto da qual não há notícia que os primeiros tivessem solicitado informação vinculativa, caso em que a solução poderia ser outra.
Tão pouco há qualquer indicação de que os serviços tivessem coagido, a qualquer título, as sociedades devedoras dos dividendos á realização das retenções impugnadas ou provocado estas.
É certo que, segundo o acórdão do STA de 12/12/2001, proferido no rec. 26.233: “ havendo erro de direito na liquidação, por aplicação de normas nacionais que violem o direito comunitário e sendo ela efetuada pelos serviços, é à administração tributária que é imputável esse erro, sempre que a errada aplicação da lei não tenha por base qualquer informação do contribuinte.
Ainda segundo tal Acórdão, ,esta imputabilidade aos serviços seria “independente da culpa de qualquer dos seus funcionários ao efetuar liquidação afetada por erro» já que a administração tributária está genericamente obrigada a atuar em conformidade com a lei , nos termos do nº 1 do art. 266°, e do art. 55° da LGT), pelo que, independentemente da prova da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo será imputável a culpa dos próprios serviços”.
Essa jurisprudência pressupõe, no entanto, ao contrário do presente caso, uma liquidação efetuada pelos “serviços” e não necessariamente pela administração tributária, considerando-se serviços para esse efeito serviços os notários legalmente incumbidos da liquidação e cobrança dos emolumentos notariais e que não integram a organização da administração tributária( acórdãos do STA nºs 114/02, de 2975, e 772/04,de 11/7).
O substituto tributário que efetue indevidamente a retenção não, assim, é um “serviço”, por não integrar a administração pública nem qualquer outro organismo de direito público exercendo funções de administração tributária, nos termos do nº 2 do art. 1º da LGT.
Posteriormente, o Acórdão do STA de 21/5/2015, proc. 0843/14, pronunciar-se-ia no sentido em que , por a autoliquidação consistir em uma verdadeira liquidação tributária para todos os efeitos, na medida em que o cidadão é utilizado em funções que lhe não são próprias, mas próprias de um funcionário da Administração Tributária, nos casos em que o seu autor , ao mencionar os factos ou o subsumi-los ao direito, incorra em erro, esse erro não pode deixar de ser imputado à Administração Tributária.
D doutrina desse Acórdão, a não ser a partir de citações isoladas deslocadas do contexto, não se pode, no entanto, inferir uma pretensa responsabilidade objetiva, independente da culpa da administração fiscal pelos atos praticados pelos substitutos tributários, artificialmente transformados para o efeito em “serviços” ou funcionários desses “serviços”.
Diz-se, com efeito, também nesse Acórdão.
“Por isso se o contribuinte no cumprimento duma norma legal procede a uma liquidação que a lei lhe impõe e essa norma vem posteriormente a ser declarada inconstitucional todos os efeitos decorrentes de uma aplicação viciada apesar de serem obrigatoriamente anulados, o certo é que tal anulação não decorre de qualquer conduta da Administração Tributária nem de erro por si praticado que se refletiria na esfera da AT
Esse vício, reitera-se , não podendo ser atribuído ao contribuinte e consequentemente também o não podendo in casu ser atribuído à AT não pode legitimar a condenação nos juros indemnizatórios pedidos ao abrigo do art. 43 da LGT por se não verificar um pressuposto de facto constitutivo de tal direito – o erro imputável ao serviços da AT”.
Tal doutrina é aplicável aos atos de retenção na fonte , na medida em que comportam necessariamente uma liquidação provisória ou definitiva.
O art. 34º da LGT , ao definir as entregas pecuniárias efetuadas por dedução nos rendimentos pagos ou postos à disposição do titular pelo substituto tributário constituem retenção na fonte, distingue certamente essa figura da autoliquidação, como o fazem os arts. 131º e 132º do CPPT.
A retenção comporta, no entanto, uma liquidação efetuada ,provisória ou definitiva não pelo contribuinte a si próprio, como na autoliquidação, mas pelo substituto ao titular dos rendimentos sujeitos a imposto.
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Não é, assim, qualquer ilegalidade não resultante de uma atuação do sujeito passivo, contribuinte ou substituto, que pode ser imputada a culpa dos serviços.
Exige-se, pelo menos, uma conduta da administração fiscal, independentemente da individualização do funcionário que a praticou, que tenha concorrido para a liquidação ilegal, concretizada no indeferimento efetivo ou presumido da reclamação da autoliquidação( acórdãos do STA de 1871/2017, proc. 0890/16, de 11/1/2023, proc. 01844/09.3BELRS, de 22/1/2023, proc. 0125/23 4 BALSB( recurso de revista) e de 23/5/2024, proc, 0136/23.0BALSB(recurso para uniformização de jurisprudência votado unanimemente pelo coletivo de conselheiros do STA).
É certo que a presente Decisão Arbitral, ao recusar o direito da Requerente ao pagamento do juro indemnizatórios no período entre a retenção e o indeferimento presumido da reclamação, respeitou a jurisprudência uniformizada do STA.
O que é absurdo é o entendimento subjacente à Decisão Arbitral que o legislador, no mesmíssimo instrumento legislativo , tenha utilizado a mesma expressão “ erro imputável aos serviços” em sentido diferente, para efeitos do nº 1 do art. 43º e do nº 1 do art. 78º da LGT, num caso mais estrito, no outro caso, muito mais amplo, como se tal conceito pudesse ser adotado “a la carte”.
Com a revogação expressa, operada pela alínea h) do nº 1 do art. 215º da Lei nº 7-A/2016, de 30/3, do nº 2 do art. 78º da LGT que ficcionava como imputável aos serviços , sem prejuízo dos ónus legais de reclamação ou impugnação o erro na autoliquidação, operada, muito antes dos factos sobre que recai o presente pedido de pronúncia arbitral, pela alínea h) do nº 1 do art. 215º da Lei nº 7-A/2016, de 30/3, ficou nítido que o erro na autoliquidação passou a ser imputável ao contribuinte.
Não é recusável a possibilidade de o contribuinte poder provar o contrário, ou seja, que foi induzido pela administração tributária a uma retenção errada , mas sempre dentro dos prazos normais de reclamação ou impugnação, salvo em caso de documento superveniente, apenas na hipótese prevista no nº 4 do art. 70º da LGT, o qual não se verifica. .
A caracterização da autoliquidação como a utilização do contribuinte no desempenho de funções que não lhe seriam próprias , constituindo uma derrogação a um pretenso regime, . não traduz, por outro lado, os princípios do sistema fiscal português e, em geral, dos modernos sistemas fiscais, fundados no método declarativo, sem ou autoliquidação e do próprio papel que o contribuinte desempenha nos modernos sistemas fiscais, acentuado nas reformas do anos 90 da tributação direta e indireta.
A autoliquidação é uma caraterística de impostos inteiros, como o IVA e o imposto de selo e a retenção definitiva tem séculos.
O argumento defendido por alguns de que o nº 1 do art. 78º da LGT , interpretado no sentido de que exclui a possibilidade de revisão da autoliquidação findos os prazos normais de reclamação administrativa ou impugnação o judicial com fundamento em erro imputável aos serviços ou no prazo de 2 anos previsto no art. 131º do CPPT, colide com os princípios constitucionais da legalidade, da igualdade, da justiça e da proporcionalidade, bem como, do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, argumento, invocado no recurso de revista anteriormente identificado e por alguma doutrina ,após a Lei nº 7-A/2016. não parece relevante,
Com efeito as situações do contribuinte que, a quando da retenção suportada , dada a sua proximidade com o facto tributário, já dispõe dos elementos necessários para aferir se esta foi ou não corretamente efetuada e da administração fiscal, que atua reativamente “ex post” relativamente não apenas a um contribuinte específico mas ao universo indeterminado de sujeitos passivos. não são comparáveis
O prazo de reação de dois anos para reclamar da autoliquidação, bem como de retenção na fonte, já muito superior aos prazos normais de reclamação ou impugnação, não ofende, assim, qualquer princípio constitucional.
Ao contrário, a interpretação da lei sufragada nesta Decisão Arbitral incentiva a a que os contribuintes negligenciem o cumprimento dos prazos normais de reclamação e impugnação dos atos tributários como se a justiça fiscal não pudesse coexistir com os princípios de eficiência e efetividade do sistema fiscal que justificam o caráter perentório de tais prazos.
A 11/6/2024
O Árbitro-Adjunto
(António Lima Guerreiro)
[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.