Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 628/2023-T
Data da decisão: 2024-06-21  IRS  
Valor do pedido: € 8.452,03
Tema: Mais valias – Despesas e encargos que acrescem ao valor de aquisição – Determinação do seu valor
Versão em PDF

SUMÁRIO:

1. O artº. 51º., nº. 1 do CIRS define as despesas e os encargos que acrescem ao valor de aquisição para a determinação das mais-valias, pelo que o sujeito passivo não só deve comprovar a realização das obras, como também que dessas obras resulta uma valorização dos imóveis que foram alienados.

 

2. Não é suficiente para preencher tal ónus a simples junção de faturas ou recibos, que não descrevem as obras realizadas no prédio alienado, não sendo possível a demonstração de que as mesmas tenham valorizado a fracção vendida.

 

3. As despesas com aquisição e instalação do ar condicionado, móveis de cozinha, e electrodomésticos aceites pela AT, correspondem a uma “valorização «estrutural» do imóvel” e estão ligadas materialmente e com carácter de permanência ao imóvel, onde foram realizadas, por dele se não poderem separar sem a realização de obras de construção civil.

 

DECISÃO ARBITRAL

          O árbitro José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 14/11/2023, profere a presente decisão arbitral, nos termos seguintes:

         

1-Relatório

A…, contribuinte fiscal n.º …, com domicílio na Rua … , … Lisboa, tendo sido notificado da Liquidação Adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2023 … e de Juros Compensatórios n.º 2023 … e, bem assim, da Demonstração de Acerto de Contas n.º 2023 …, todos referentes ao ano de 2019, dos quais resultou o montante total a pagar de € 8.756,46 (oito mil setecentos e cinquenta e seis euros e quarenta e seis cêntimos), veio, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, no n.º 2 do artigo 5.º, no n.º 1 do artigo 6.º e no n.º 1 alínea a) e n.º 2 do artigo 10.º, 15.º e seguintes, todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ‒ “RJAT”) requerer a constituição de Tribunal Arbitral no sentido de ser anulada a referida liquidação adicional, incluindo a consequente anulação da liquidação de juros compensatórios, determinando-se o reembolso imposto indevidamente pago, acrescidos de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido até ao integral e efectivo reembolso.

 

1.1 Tramitação e constituição do Tribunal Arbitral:

O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado em 05/09/2023 e aceite no mesmo dia, nos termos regulamentares aplicáveis, tendo o Requerente optado pela não designação de árbitro.

É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.

Em 11/09/2023, o Requerente apresentou um requerimento a juntar procuração forense que protestara junta no requerimento inicial.

Por despacho do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD foi designado para árbitro o ora subscritor, tendo em 24/10/2023 sido comunicada essa designação às partes e, não tendo havido reclamação da mesma, em 14/11/2023 foi comunicada às partes a constituição do Tribunal Arbitral;

Por despacho arbitral de 16-11-2023, foi ordenada a notificação da Requerida para responder ao pedido de decisão arbitral, bem como para juntar o processo administrativo em 30 dias.

A 20/12/2023, a Requerida apresentou a sua Resposta e juntou aos autos o processo administrativo (PA), tendo o CAAD notificado, no mesmo dia, o Requerente da Resposta da AT e da junção do PA.

Por despacho arbitral de 12/03/2024, notificado às partes no dia seguinte, foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18º. do RJAT, por não existirem excepções ou questões prévias a apreciar nesta fase, bem como inexistir controvérsia relativamente aos factos essenciais para a boa decisão da causa, mais decidindo que, não tendo sido indicada prova testemunhal e não havendo outras diligências de prova a realizar, ordenou a notificação das partes para apresentarem, querendo, no prazo simultâneo de 10 (dez) dias, alegações escritas, de facto (factos essenciais que consideram provados e não provados) e de direito, com a obrigação do Requerente proceder, no mesmo prazo, ao pagamento do necessário complemento da taxa arbitral, nos termos do n.º 4 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

Apenas o Requerente apresentou alegações, em 27/03/2024, bem como comprovou nessa data o pagamento da taxa arbitral subsequente e comunicou esse pagamento ao CAAD.

Por despacho de 10/5/2024, foi prorrogado o prazo para proferir decisão final, por mais dois meses.

 

1.2 – Posição do Requerente

O Requerente vem pedir a declaração de ilegalidade e consequente anulação dos actos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) referentes ao ano de 2019, Invocando como fundamento erro nos pressupostos de facto e de direito quanto à não consideração de encargos de valorização do imóvel atendíveis na tributação de IRS (Mais Valias).

O Requerente é cidadão Inglês, residente em Portugal, nomeadamente para feitos fiscais, desde o ano de 2015.

Em 16 de Abril de 2018, o Requerente adquiriu, pelo valor de € 155.000,00, a fracção autónoma designada pela letra C, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do imóvel sito na Rua …, da União de Freguesias de Almada, Cova da Piedade, Pragal e Cacilhas, inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo …, fazendo constar que tal imóvel se destinava a ser a sua morada própria e permanente.

Após a data da respectiva aquisição, o Requerente procedeu, segundo alega, a profundas obras de reabilitação do imóvel, bem como à substituição e instalação de equipamentos (nomeadamente, armários de cozinha e sistema de ar condicionado), aumentando a qualidade e conforto proporcionado pelo imóvel­ que afectou à sua habitação própria e permanente.

Em 29 de Abril de 2019, o Requerente alienou o imóvel pelo montante de € 235.000,00.

Em 18 de Maio de 2020, apresentou a sua declaração de IRS – Modelo 3 referente ao ano de 2019, identificada como …-…-… -, a qual por erros no preenchimento veio a ser substituída em 23 de Março de 2023 – Declaração …-…-… - declarando a totalidade dos rendimentos por si auferidos nesse ano, incluindo os resultantes da venda do imóvel, tendo declarado no Anexo G, Quadro 4, campo 4001, os referidos valores de aquisição de realização, bem como o montante total de € 46.187,19 a titulo de despesas e encargos

Posteriormente, a declaração em causa foi objecto de análise por parte da Autoridade Tributária que projectou corrigir o montante declarado de € 46.187,19, para o montante de € 3.349,77 (correspondente à soma do Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (“IMT”) e Imposto do Selo (“IS”) suportados com a aquisição do imóvel)

Não se podendo conformar com o projecto notificado, por entender que as restantes despesas também deviam ser consideradas, o Requerente apresentou direito de audição, através do qual juntou ao procedimento, não só os comprovativos das despesas necessárias inerentes à aquisição e alienação (nomeadamente, impostos e despesas com a formalização dos negócios), mas também todos os elementos comprovativos dos encargos realizados com a valorização do imóvel objecto da venda, nomeadamente:

- Obras de reabilitação, no montante de € 29.540,07;

- Aquisição e instalação de sistema de ar condicionado, no montante de € 4.163,54;

- Aquisição e instalação de móveis de cozinha, no montante de € 6.308, 19;

- Aquisição e instalação de outros equipamentos, em particular cilindro de água quente, no montante de € 239,00.

Só que por ofício de 05/02/2023, a AT decidiu aceitar apenas despesas de 4.955,09€ (valores de IMT, IS, notário e câmara municipal) não aceitando as despesas de obras e equipamentos, daí a emissão das Liquidações acima mencionadas e que são objecto da presente impugnação, que se confina à questão de considerar o valor das obras e equipamentos acima mencionados como dedutíveis para efeito de cálculo de imposto de IRS (Mais Valias).

Entende o Requerente que os encargos acima indicados têm de ser considerados como despesas com a valorização do bem, nos termos e para os efeitos do artigo 51.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRS, porque todas aumentaram indiscutivelmente o valor do imóvel, resultando da experiência comum, que quer as obras de reabilitação, quer a substituição ou instalação de equipamentos como os que em causa nos presentes autos, resultam numa clara valorização (material, económica) dos imóveis objecto das mesmas.

Na verdade, quer os armários de cozinha, quer os sistemas de ar condicionado e cilindros de água, são equipamentos efectiva e fisicamente ligados ao imóvel, pelo que  finalisticamente, tais equipamentos apresentam carácter fixo e perene, como outros tipos de mobiliário/equipamentos, como sejam os de WC, por exemplo, equipamentos aqui em causa, são especificamente construídos, desenhados pelo menos escolhidos e adaptados, em função das características e necessidades específicas do imóvel e local onde serão instalados.

Por outro lado, quanto aos encargos suportados com as obras de reabilitação/ remodelação, entende o Requerente que é inequívoco e indiscutível que as facturas apresentadas em fase procedimental pelo Requerente cumprem com todos os requisitos e exigências legais, das mesmas constando uma descrição suficiente e usual do prestados, locais de carga e de execução/descarga dos serviços e bens.

Em face da exigência da AT, de que deveria haver um orçamento com o descritivo das intervenções realizadas, o Requerente entende que orçamentos são, na esmagadora maioria dos sujeitos a alterações, algumas de grande relevância, motivadas pelas variadas circunstâncias, mas, não obstante, o ora Requerente disponibilizou um orçamento prévio com a descrição das obras de reabilitação / remodelação.

Entende assim o Requerente que todas as despesas realizadas com a valorização do imóvel objecto da venda e já atrás referidas e que apresentou na declaração substitutiva cumprem todos os requisitos exigidos pelo artigo 51º n.º 1 do Código do IRS, pelo que devem ser acrescidas ao valor de aquisição do imóvel, conduzindo à anulação dos actos que são objecto do pedido, por erro nos pressupostos de facto e de direito.

O Requerente insurge-se ainda contra a liquidação de juros compensatórios acima identificada porque, entendendo que nada há a pagar de IRS (Mais Valias), então também não haverá lugar ao pagamento de juros por quantias que no seu entender não são devidas; para além de que o artigo 35º da LGT diz que apenas são devidos juros compensatórios quando “por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido”, o que não se verifica no caso concreto (nem imposto em falta, nem a culpa do Requerente na situação) pelo que a liquidação de juros compensatórios carece de fundamentação legal .

Termina pedindo que no caso de pronúncia favorável ao Requerente, como se espera, e tendo pago o valor liquidado pela AT, para evitar custos de execução, desde já requer o respectivo reembolso acrescido de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43 n.º 1 da LGT, e 61º n.º 5 do CPPT, por toda esta situação ser devida a erro imputável à AT.

 

 

1.3 – Posição da Requerida

 

Depois de alguma confusão nos pontos da matéria de facto da resposta apresentados pela Requerida, onde faz referências a um imóvel diferente, liquidações e valores diferentes dos do caso concreto, pelo que se não pode considerar uma verdadeira impugnação dos pontos de facto alegados pelo requerente, na sua argumentação de direito a Requerida contraria a posição manifestada pelo Requerente, começando logo pela interpretação que faz do artigo 51º do Código do IRS, concluindo que, tendo em conta a letra da lei, os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos doze anos têm de estar ligados à valorização do bem alienado e não à mera preservação do valor do bem, devendo ainda haver um nexo indissociável entre essas despesas e o aumento do preço bem, para se considerar que essa despesa esteve na origem ou contribuiu para a obtenção do próprio rendimento.

Assim, relativamente aos móveis da cozinha, ar condicionado e cilindro tratam-se, de coisas móveis e sendo-o, não têm qualquer ligação física com o imóvel, dele podendo ser retiradas a qualquer momento, pelo que nunca o encargo com o fornecimento destes eletrodomésticos/equipamentos poderia ser considerado como melhoramento de bem imóvel, confirmando assim a realização dessas obras.

Por outro lado, não se pode estabelecer uma correlação de equivalência direta entre o montante constante das faturas apresentadas e o aumento do valor do imóvel, porque não resulta provado que os encargos constantes das faturas foram suscetíveis de aumentar o valor do económico do imóvel alienado e além disso, os custos com a construção/melhoramento dum imóvel não foram devidamente comprovados, porque das facturas não constam elementos que inequivocamente associem a despesa com o imóvel alienado.

A Requerida questiona alguns dos documentos juntos pelo Requerente, nomeadamente o da compra do ar condicionado que não deve ser atendível, os documentos 1, 2 e 3 que têm uma morada diferente da do imóvel, a factura do Leroy Merlin que tem uma morada diferente, outros documentos que, sem identificar, diz estarem ilegíveis, tudo para concluir que as despesas atendíveis não estão provadas e por isso não devem ser atendidas.

Mantém que o acto tributário é válido e legal pelo que o Requerente não tem direito a juros e termina pedindo a improcedência do pedido arbitral.          

 

 

2. Despacho saneador:

O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do RJAT.

As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são as legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo de 90 dias previsto no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do RJAT.

Não existem excepções ou nulidades de conhecimento oficioso ou alegadas pelas partes que devam ser resolvidas previamente à apreciação do mérito do processo.

Não existem excepções ou nulidades de conhecimento oficioso ou alegadas pelas partes que devam ser resolvidas previamente à apreciação do mérito do processo.

 

3. Fundamentação de facto.

Considerando os articulados das partes, os documentos juntos e o processo administrativo, são considerados provados os factos que a seguir se indicam.

 

3.1 - Factos provados:

De acordo com a alegação das partes e dos documentos juntos, nomeadamente o processo administrativo junto pela AT e com interesse para a decisão final dos presentes autos, estão provados os seguintes factos:

a) – O Requerente é cidadão Inglês, residente não habitual em Portugal, nomeadamente para efeitos fiscais, desde o ano de 2015. – (provado por acordo das partes e doc. 2 junto com o PPA)

b) - Consta do dos dados cadastrais do Requerente que desde 17-02-2023, o Requerente tem domicílio fiscal em Lisboa, na freguesia de Santo António, com o código postal … Lisboa, da área do serviço de finanças 3247-Lisboa 2 – (provado por acordo das partes e doc. 2 junto com o PPA)

c) –Por Documento Particular Autenticado (DPA) de compra e venda e mútuo com hipoteca, exarado por …, advogada, portadora da cédula profissional …-l, em 16 de Abril de 2018, o Requerente, então residente na Rua …, em Lisboa, adquiriu, pelo valor de € 155.000,00, a fracção autónoma designada pela letra C, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do sito na Rua … e Avenida …, União de Freguesias de Almada, Cova da Piedade, Pragal e Cacilhas, inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo …, destinando-se o imóvel à sua habitação própria e permanente. - (provado por acordo das partes e doc. 3 junto com o PPA).

d) – Por escritura de compra e venda celebrada em 29 de Abril de 2019, no Cartório Notarial sito na Avenida …,  em Lisboa, o Requerente alienou o imóvel pelo montante de 235.000,00€ - (provado por acordo das partes e doc. 4 junto com o PPA).

e) - Em 23 de Março de 2023, o Requerente apresentou uma declaração de substituição de IRS – Modelo 3, referente ao ano de 2019 - a que foi dado o numero 2019-…-…-… declarando a totalidade dos rendimentos por si auferidos nesse ano, incluindo os resultantes da venda do imóvel e inserindo no Anexo G, Quadro 4, campo 4001, daquela declaração, os referidos valores de aquisição e de realização, bem como o montante total de € 46.805,99 a titulo de despesas e encargos com o imóvel - (provado por acordo das partes e docs. 5 e 5.1 juntos com o PPA)

f) – Foram apontadas pela Requerida diversas divergências quanto às despesas indicadas por falta de comprovativo e de orçamento, o que motivou a junção de documentos pelo Requerente no processo administrativo (provado por acordo das partes e docs. 6 e 7 juntos com o PPA)

g) – A Requerida notificou o Requerente que iria corrigir o valor das despesas para 4.955,09€, referentes ao IMT, IS, notário, câmara municipal, “não aceitando despesas com aquisição e instalação de ar condicionado, móveis de cozinha e electrodomésticos por não corresponderem a valorização “estrutural” do imóvel” e não aceitando “outras despesas por não terem sido comprovadas com respectivo orçamento, do descritivo das intervenções realizadas, não sendo possível efectuar o seu enquadramento em despesas de valorização do imóvel” (provado pelo doc. 8 junto com o PPA)

h) – O Requerente foi notificado da liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.° 2023 … e de Juros Compensatórios n.° 2023 …e, bem assim, da Demonstração de Acerto de Contas n.° 2023 …, todos eferentes ao ano de 2019, dos quais resultou, considerando o já anteriormente pago de IRS de 2019, o montante total a pagar de € 8.756,46, sendo a data limite de pagamento o dia 5/6/2023. - (provado pelos documentos 1 e 9 juntos com o PPA)

i) – O Requerente procedeu ao pagamento do valor de 8.756,46€, correspondente à notificação da liquidação que lhe foi efectuada. - (provado pelo doc. 9 junto com o PPA)

j) – Em 06/06/2018 foi emitida a factura nº. …/…, no valor de 12.531,28€, referente a materiais e mão de obra para reabilitação/remodelação de imóvel, emitida por B… – Unipessoal Lda, contribuinte …, a favor do Requerente, na morada Rua …. … Almada, constando na factura que o local de descarga é na mesma morada do Requerente.  - (provado pelo documento 7.4 junto com o PPA)

k) - Em 19/07/2018 foi emitida a factura nº. …/…, no valor de 7.698,21€, referente a materiais e mão de obra para reabilitação/remodelação de imóvel, emitida por B… – Unipessoal Lda, contribuinte …, a favor do Requerente, na morada Rua …. … Almada, constando na factura que o local de descarga é na mesma morada do Requerente; (provado pelo documento 7.4 junto com o PPA)

l) - Em 15/09/2018, foi emitida a factura nº. …/…, no valor de 2.566,69€, referente a materiais e mão de obra para reabilitação/remodelação de imóvel, emitida por B… – Unipessoal Lda, contribuinte …, a favor do Requerente, na morada Rua …, Almada, constando na factura que o local de descarga é na mesma morada do requerente (provado pelo documento 7.1 junto com o PPA)

m) - Em 07/02/2019, foi emitida a factura nº. …/…, no valor de 2.222,00€, referente a materiais e mão de obra para reabilitação/remodelação de imóvel, emitida por B… – Unipessoal Lda, contribuinte …, a favor do Requerente, na morada Rua …, Almada, constando na factura que o local de descarga é na mesma morada do Requerente. - (provado pelo documento 7.1 junto com o PPA)

n) – Em 18/03/2019, foi emitida a factura nº. …/…, no valor de 4.522,10€, referente a materiais e mão de obra para reabilitação/remodelação de imóvel, emitida por B… – Unipessoal Lda, contribuinte …, a favor do Requerente, na morada Rua …, Almada, constando na factura que o local de descarga é na mesma morada do Requerente; - (provado pelo documento 7.1 junto com o PPA)

o) – Em 08/07/2018, foi emitida a factura do C.. Alfragide, contribuinte …, com número ilegível, no valor de 59,00€, referente à compra de diversos móveis, na qual é mencionado o nome do Requerente e respectivo NIF mas com a morada, quer da factura, quer do local de descarga na Rua …, Lisboa; (provado pelo documento 7.3 junto com o PPA)

p) – Em 18/07/2018, foi emitida a factura do C… Alfragide, contribuinte …, com número ilegível, no valor de 6.249,19€, na qual é mencionado o nome do Requerente e respectivo NIF mas com a morada, quer da factura, quer do local de descarga na Rua …,  Lisboa, que não é a morada do imóvel adquirido. - (provado pelo documento 7.3 junto com o PPA)

q) – Em 27/09/2018 foi emitida a factura nº. …/…, no valor de 4.163,54€, referente a aparelhos de ar condicionado e colocação, emitida por D…, contribuinte …, a favor do Requerente, na morada Rua …, Almada, sem que conste na factura o local de descarga - (provado pelo documento 7.5 junto com o PPA)

s) Está junto com o PPA um orçamento feito por B… – Unipessoal Lda, com a indicação de trabalhos a realizar e ali discriminados no valor global de 27.790,80€, sem indicação do local de realização, nem o respectivo dono, nem do mesmo constam condições de pagamento. que se pudessem relacionar com as facturas emitidas pela mesma entidade, pelo que se não sabe sequer se foi executado, parcial ou totalmente. - (provado pelo documento 10 junto com o PPA)

t) Na decisão final do processo de liquidação do IRS ao ora requerente, a AT admitiu que o mesmo tenha feiro despesas com aquisição e instalação de ar condicionado, móveis de cozinha e electrodomésticos, mas entendeu que os mesmos não correspondem a valorização “estrutural” do imóvel, por não estarem ligados materialmente com carácter de permanência. - (provado pelo documento 8 junto com o PPA).

u) O valor da aquisição do ar condicionado e sua instalação, consta do facto provado na al. q), não sendo determinável os valores apresentados pelo requerente referentes aos móveis de cozinha e electrodomésticos. - (provado pelos documentos 7.3 e 7.5 junto com o PPA)

v) O presente PPA foi apresentado em 5/9/2023.

 

 

3.1 - Factos não provados

 

3.2 Factos não provados e fundamentação da matéria de facto considerada provada.

          Não existem outros factos não provados com interesse para a decisão deste processo.

          Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos pela requerente e no que consta do processo administrativo e também os factos que as partes estão de acordo em considerar provados, conforme resulta do por si alegado em sede de requerimento inicial e das respostas que lhe sucederam.

         

 

4. Matéria de direito

1. Como questões a resolver, temos desde logo, a determinação do que foi realizado pelo requerente na sua casa em Almada, de que foi proprietário pouco mais de 12 meses e na qual temos muitas dúvidas que alguma vez tenha tido a sua residência própria e permanente, conforme alegou no seu DPA de aquisição.

Nos termos do artº. 51º., nº. 1 do CIRS, são definidos as despesas e os encargos que acrescem ao valor de aquisição para a determinação das mais-valias.

Dispõe o referido normativo:

1- Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem: 

a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º;

b) As despesas necessárias e efetivamente suportadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas nas alíneas b), c) e k) do n.º 1 do artigo 10.º ​

Resulta da al. a) que o requerente não só deve comprovar a realização das obras, como também que dessas obras resulte uma valorização dos imóveis que foram alienados.

Por isso, além das despesas com a venda e a aquisição, podem ser apresentados montantes gastos com obras de manutenção e conservação, por forma a valorizar o imóvel, desde que estas tenham sido realizadas nos últimos 12 anos.

No caso dos presentes autos, temos de distinguir 3 situações, que são as questões a decidir.

A primeira diz respeito a que obras se deve atender dentro das que foram indicadas pelo requerente, ou seja, de entre as obras de reabilitação, as obras de aquisição e instalação de sistema de ar condicionado, as obras com a aquisição e instalação de móveis de cozinha e as obras de outros equipamentos, em particular um cilindro de água quente.

A segunda questão consiste em avaliar se as obras que se entendem provadas, podem ser consideradas obras que valorizam o imóvel que foi alienado pelo requerente.

Por fim, a terceira e última questão é a de saber se as obras de aquisição e instalação de sistema de ar condicionado, as obras com a aquisição e instalação de móveis de cozinha e as obras de outros equipamentos, em particular um cilindro de água quente, podem ser consideradas para efeitos de cálculo das mais valias, na perspectiva de não estarem ligadas materialmente com carácter de permanência ao imóvel.

 

2. O ganho sujeito a IRS é, constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição [al. a) do nº 4 do art. 10º) do CIRS], este calculado de acordo com o disposto nos artigos 46º e seguintes do CIRS. Acrescem ao valor de aquisição, por força do art.º 51.º do CIRS os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos doze anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º.

Porém, como referido no Acórdão do STA n.º 0585/09 de 18.11.2009” (…) Este conceito de «encargos com a valorização dos bens» encerra alguma margem de indeterminação e necessita de ser preenchido. (…)”

Mas, na verdade, atentando na letra da lei (encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos doze anos) não pode deixar de concluir-se, desde logo, que o encargo há-de estar ligado à valorização do bem alienado. Daquele bem específico e não de qualquer outro.

Assim, face à questão sob escrutínio competia ao Requerente provar, relativamente ao prédio alienado, não só que suportou custos, mas que as importâncias foram efectivamente despendidas em obras de valorização efetuadas naquele bem imóvel, não bastando, para o efeito que os custos e as despesas se mostrem devidamente comprovados.

Com efeito, considerando que as mais-valias são o saldo apurado pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição do imóvel não pode deixar de concluir-se, que o encargo há-de estar ligado à valorização do bem alienado. Não é suficiente para preencher tal ónus a simples junção de faturas ou recibos, sendo que teria de ser demonstrado que houve obras no rés-do-chão esquerdo, do novel sito na Rua … e Avenida …, Em Cacilhas.  Sendo imperioso ter comprovado que aqueles trabalhos foram efetivamente executados no rés-do-chão referido.

Não sendo possível extrair tal conclusão dos documentos juntos aos autos, nos quais não se encontra referência ao local/imóvel onde terão sido realizadas as obras, não se considerando suficiente para efeitos de prova o facto dos documentos se encontrarem endereçados aos Contribuintes para a morada do imóvel objecto dos autos, bem como que as mesmas tenham valorizado a referida fracção, deveria o requerente ter indicado, pelo menos, testemunhas que pudessem comprovar essa realização e o seu efeito sobre o valor da mesma fracção.

 

3. No mesmo sentido é a jurisprudência, como se alcança do acórdão do TCANorte de 22/6/2022, proferido no processo 01334/10.1BEBRG, disponível em http://www.gde.mj.pt/jtcn, onde se decidiu que:

- De acordo com o disposto no artigo 51.º do Código de IRS, para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem “os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos (hoje 12 anos).

 

E além disso, que esses encargos estejam intimamente ligados com a fracção alienada.

Na jurisprudência é este o sentido do Ac. do STA de 11/1/2024, proferido no processo 0243/18.0BESNT, disponível em http://www.gde.mj.pt/jsta, que decidiu:

Despesas inerentes à alienação são aquelas que são inseparáveis da alienação, que com esta têm uma relação intrínseca, que não meramente extrínseca e que dela são indissociáveis

 

            Bem como o acórdão citado do TCANorte, que decidiu que:

Estão aqui em causa encargos intrinsecamente ligados ao bem alienado, conducentes a uma valorização, quer material ou física, quer económica, do mesmo.

 

Delimitado juridicamente o problema em análise, vejamos se ao requerente assiste razão na impugnação que faz da recusa da AT em considerar como relevantes para a determinação das mais valias devidas as despesas apresentadas pelo ora requerente relativamente às obras alegadamente realizadas, bem como relativamente às de aquisição e instalação de sistema de ar condicionado, obras com a aquisição e instalação de móveis de cozinha e obras de outros equipamentos, em particular um cilindro de água quente

 

4. Começando pelas obras de construção que o requerente refere corresponderem às facturas juntas e dadas como provadas nas alíneas j), k), l), m) e n) não se comprova do teor das mesmas que se refiram a obras realizadas no rés-do-chão esquerdo, do novel sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas.

Ora, não resulta das facturas juntas essa realização na referida fracção, não se podendo utilmente concluir seja o que do orçamento referido na al. s) dos factos provados, pois o mesmo é totalmente omisso quanto ao local de realização das mesmas.

Por isso, como já se referiu deveria o requerente ter indicado pelo menos, prova testemunhal, para comprovar essa realização.

Além disso, também se não comprova que a terem existido qualquer obras de remodelação, as mesmas tenham valorizado a fracção correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do novel sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas.

Por isso, entendemos que não merece censura a recusa da requerida em aceitar para efeitos de cálculo de mais valias as obras de construção e remodelação a que se referem as faturas das alíneas j) a n) dos factos provados.

 

5. Do mesmo modo, não se provou que aos equipamentos e móveis comprados no C…, pelas facturas mencionadas nas alíneas o) e p) dos factos provados, se destinassem à fracção autónoma designada pela letra C, Rua …, Almada.

Pondo de lado, a questão de nem sequer se conseguir identificar o número da factura e sendo certo que, apesar de as facturas do C… acima mencionadas terem sido emitidas em nome do Requerente e de a morada que nelas consta, quer na morada do comprador, quer no local de descarga, não é a morada correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas, mas a anterior morada do requerente, pelo que, por si só, não se pode considerar que tais materiais tenham sido colocados nesta fracção.

Também aqui faltou a prova testemunhal para completar os documentos.

O facto de haver uma nota de crédito com data muito posterior (02/11/2018) que menciona a morada da fracção autónoma designada pela letra C, Rua …, Almada e parece fazer referência à factura de 18/07/2018 nada significa porque apenas poderá comprovar a devolução de bens e não a sua compra anterior (cfr. pag 2 do doc 7 parte 3.

Também se não provou que os aparelhos de ar condicionado tenham sido colocados na morada Rua …,  Almada, dado que na factura da sua aquisição, mencionada no ponto q) dos factos provados, não consta o respectivo local de descarga.

Por fim, não se provou que a aquisição de um termo de marca … feita no E…, contribuinte …, em 06-09-2018, no valor de 239,00€ se tenha destinado à fracção autónoma designada pela letra C, Rua …, Almada porque não tem o nome do comprador e nela consta uma morada de Matosinhos.

 

            6. Porém, resulta da fundamentação da decisão final do processo de divergências que a AT apenas considera não provadas por falta de orçamento, outras despesas, mas pode concluir-se que que relativamente às despesas com aquisição e instalação do ar condicionado, móveis de cozinha, e electrodomésticos o fundamento da sua não aceitação é apenas o facto de não corresponderem a uma “valorização «estrutural» do imóvel, porque não estão ligados materialmente com carácter de permanência”, podendo deduzir-se que a AT aceita a sua realização.

            Por isso, entendemos que estas despesas devem ser consideradas para efeitos de cálculo das mais valias devidas pelo requerente.

 

            7. Cabe agora referir se essas despesas com a aquisição e instalação do ar condicionado, móveis de cozinha, e electrodomésticos – no caso presente, apenas um cilindro de água quente - valorizaram ou não a fracção do rés-do-chão esquerdo, do imóvel sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas.

            Parece evidente, segundo as regras da experiência comum, que uma fracção mais antiga de um prédio, se receber uma instalação de ar condicionado, numa zona urbana se traduz numa valorização da referida fracção.

            Do mesmo modo, a colocação de móveis de cozinha novos, por mais vulgares que sejam, tal como a colocação de um cilindro – único electrodoméstico em causa -, trarão sempre uma valorização a essa fracção pela maior higiene da cozinha e pela maior comodidade que acarretarão a quem for habitar a referida fracção.

            Trata-se de uma presunção natural, obtida das regras da experiência comum, pelo que é admissível a sua utilização, nos termos do artº. 351º. do Cod.  Civil.

            Deste modo, conclui-se que se verificou a aquisição e instalação do ar condicionado, móveis de cozinha, e electrodomésticos – no caso presente, apenas um cilindro de água quente – e que essas benfeitorias valorizaram a fracção do rés-do-chão esquerdo, do imóvel sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas.

           

8. Por fim, há que analisar a última questão suscitada pela requerida, qual seja, a de que mesmo essas benfeitorias, que considerámos no número anterior terem sido realizadas e que valorizaram a fracção correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do imóvel sito na Rua …. e Avenida …, em Cacilhas, podem ser consideradas para efeitos de cálculo das mais valias, na perspectiva de não estarem ligadas materialmente com carácter de permanência ao imóvel.

Apelamos aqui também às regras da experiência comum e referimos que nunca se viu, nem temos conhecimentos que alguma vez alguém, após ter vendido um imóvel, sobretudo uma fracção autónoma, tenha levado consigo a instalação de ar condicionado que aí tenha realizado, que tenha levado consigo os móveis de cozinha, que nas fracções autónomas estão sempre ligados ou às paredes ou ao chão, por causa dos sistemas de canalização de água e esgotos a que estará naturalmente ligado ou tenha levado qualquer cilindro de água quente que está ligado aos sistemas de distribuição da água pela referida fracção.

Aliás, como alega o requerente e, nesse ponto, não foi contraditado pela requerida esta, este era o entendimento da requerida expresso na Informação Vinculativa prestada no Processo L121 2008413, por despacho do Subdirector-Geral dos Impostos, de 04 de Fevereiro de 2009), onde se escreveu:

9. Para esta classificação, interessa saber se os móveis são montados ou instalados com recurso a serviços de construção civil, de modo a ficarem a fazer parte integrante do imóvel com carácter de permanência.

Salvo melhor opinião, os móveis de cozinha preenchem aqueles requisitos.

Com efeito aqueles móveis são montados ou instalados nas paredes ou chão do imóvel através dos mais variados meios, com recurso a serviços de construção civil, fazendo, inclusivamente, parte dos imóveis quando são vendidos ao consumidor final.

Já o mesmo não acontece com os restantes móveis, como, por exemplo, sofás, camas, roupeiros e estantes (não embutidos nas paredes), mesas, cadeiras, etc.

O facto dos referidos móveis poderem ser removidos e levados para outro local, não pode, para este fim, ser relevante, uma vez que, também, são necessários serviços de construção civil para os retirarem.

Caso contrário poder-se-ia aplicar o mesmo raciocínio às telhas, à madeira dos soalhos, às torneiras, banheiras, etc. etc., uma vez que, com mais ou menos trabalho, se podem retirar todos dos imóveis.

 

É exactamente o que se deixa escrito e não pode deixar de merecer reparto o facto de a requerida como entidade pública emitir opiniões tão díspares.

Por isso, porque quer para retirar o ar condicionado instalado, quer os móveis de cozinha, quer os electrodoméstico, como cilindro de água quente são necessárias obras de construção civil que demonstram a sua ligação ao imóvel com caracter de permanência.

Por isso, não procede a argumentação da requerida de que falta a ligação material com carácter de permanência dessas benfeitorias ao imóvel que, na realidade existe de forma evidente, atendendo às funções que as mesmas desempenham na casa

 

9. Por fim, não tendo sido possível determinar com rigor os valores das obras de aquisição e instalação de sistema de ar condicionado, das obras com a aquisição e instalação de móveis de cozinha e das obras de outros equipamentos, em particular um cilindro de água quente, teremos de considerar os valores declarados pelo requerente na sua declaração Modelo 3.

Com efeito, o artigo 75.º da Lei Geral Tributária consagra uma presunção de verdade e de boa fé quanto às declarações apresentadas pelos contribuintes.

A mesma disposição legal estabelece, também, a mesma presunção de verdade e de boa-fé quanto aos elementos constantes da contabilidade ou escrita dos contribuintes.

O n.º 2 do referido artigo 75.º da Lei Geral Tributária afasta as referidas presunções em face de omissões, erros ou inexatidões das declarações, da contabilidade, da escrita ou, ainda, quando haja indícios fundados de que as declarações, a contabilidade ou a escrita que não refletem a situação real do contribuinte.

As mesmas presunções deixam também de existir sempre que o contribuinte não cumpra os deveres legais de esclarecimento da sua situação tributária e, ainda, quando a matéria tributável ou os rendimentos dos contribuintes se afastem, para menos, sem razão justificada, dos indicadores ou padrões estabelecidos na lei.

Ora, nenhum dos fundamentos descritos no nº. 2 foi invocado pela requerida ou consta dos autos a sua verificação.

Por isso, além dos valores já aceites pela requerida na liquidação notificada ao ora requerente e 4.955,09€, referentes ao IMT, IS, notário, câmara municipal, deve também considerar os valores de € 4163,54 da aquisição e instalação do ar condicionado, de € 6308,19 de móveis de cozinha, e € 239 de  electrodomésticos – no caso presente, apenas um cilindro de água quente – que valorizaram a fracção do rés-do-chão esquerdo, do imóvel sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas, como elementos do preço de aquisição do imóvel, para efeitos de cálculo das mais valias.

 

10. Deste moído, procede parcialmente a impugnação do requerente, anulando-se a liquidação ora impugnada, devendo a requerida proceder a nova liquidação no prazo de execução espontânea da presente decisão, a fim de se determinar rigorosamente o montante que é devido pelo requerente relativamente ao IRS de 2019.

 

 

5. Devolução do imposto pago, juros e custas, acrescido de juros indemnizatórios.

          1. Conforme vem provado na al. i) dos factos provados, a requerente procedeu ao pagamento atempado da quantia € 8.756,46€ e esse o valor que o requerente também peticiona como devendo ser-lhe devolvido em consequência da procedência do presente PPA.

          Porém, como a procedência do pedido é apenas parcial, terá de ser determinado pela requerida o valor final do imposto a pagar e só depois haverá lugar à devolução do que foi pago a mais.

 

          2. Além da restituição dessa quantia já paga a mais por força da anulação da liquidação ora anulada, pede ainda o requerente a condenação da requerida no pagamento dos juros indemnizatórios, calculados desde a data em que procedeu ao pagamento do imposto liquidado até à data em que vier a ser reembolsado ao requerente o indevidamente pago, juros esses vencidos e vincendos, desde aquela data.

          A propósito dos juros indemnizatórios, prescreve o artigo 43º nº 1 da LGT que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

          No caso ora em apreciação, o vício que afeta a liquidação impugnada na parte em que a mesma procedeu, é exclusivamente imputável à requerida AT, que reconheceu a realização das despesas com aquisição e instalação do ar condicionado, móveis de cozinha, e electrodomésticos no rés-do-chão esquerdo, do novel sito na Rua … e Avenida …, em Cacilhas, mas não as considerou na liquidação final do IRS, por manifesto erro imputável aos serviços.

          Por isso, tem o ora requerente direito não só à devolução do imposto pago a mais, mas também ao recebimento dos juros indemnizatórios do facto de ter feito esse pagamento indevido.

          É que, nos termos da alínea b) do artigo 24º do RJAT, 35º nº 10 e 43º nº 1 da Lei Geral Tributária e 61º nº 5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a requerida incorreu em erro que lhe é imputável ao proceder à liquidação adicional de IRS sem ter em conta as despesas que reconheceu, pelo que deve pagar ao Requerente juros indemnizatórios sobre a quantia paga a mais indevidamente, contados à taxa legal, desde o pagamento das quantias indevidamente exigidas até à sua restituição.

 

          3. Se a requerida não proceder a nova liquidação de IRS de 2019 do ora requerente, no prazo da liquidação espontânea e neste prazo a não notificar ao ora requerente, fica então obrigada à devolução de todo o imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios sobre a totalidade da quantia paga, também contados à taxa legal, desde o pagamento das quantias exigidas até à sua restituição.

 

         

 

6. Decisão

          Nestes termos, decide-se julgar totalmente procedente o presente pedido de pronúncia arbitral e consequentemente:

          a) Julgar-se parcialmente procedente a presente impugnação apenas quanto à obrigação de considerar no preço de aquisição, as despesas realizadas pelo requerente na aquisição e instalação do ar condicionado, dos móveis de cozinha, e electrodomésticos, pelos valores que se deixam julgados procedentes.

          b) Consequentemente, anular-se anular a Liquidação Adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.º 2023 … e de Juros Compensatórios n.º 2023 … e, bem assim, da Demonstração de Acerto de Contas n.º 2023 …, todos referentes ao ano de 2019, dos quais resultou o montante total a pagar de € 8.756,46 (oito mil setecentos e cinquenta e seis euros e quarenta e seis cêntimos), devendo a requerida proceder a nova liquidação no prazo de execução espontânea da presente decisão.

          c) Julgar-se procedente o pedido de condenação da requerida na restituição de imposto pago a mais, que resultar determinado da nova liquidação a realizar pela requerida nos termos da alínea anterior, acrescido de juros indemnizatórios, por parte da requerida, desde a data do pagamento dessa quantia, até efectivo reembolso, calculados à taxa legal supletiva que é actualmente de 4% ao ano.

          d) Caso a requerida não proceda a nova liquidação, no prazo referido na al. b) da presente decisão, julgar-se procedente o pedido de condenação da requerida na restituição de imposto pago na sua totalidade, no valor € 8.756,46 (oito mil setecentos e cinquenta e seis euros e quarenta e sei cêntimos), acrescido de juros indemnizatórios, por parte da requerida, desde a data do pagamento dessa quantia, até efectivo reembolso, calculados à taxa legal supletiva que é actualmente de 4% ao ano.

 

 

7. Valor do processo

          De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 8.756,46 (oito mil setecentos e cinquenta e seis euros e quarenta e seis cêntimos), assim se rectificando o valor dado pelo requerente à presente impugnação.

 

 

8. Custas

          Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante total das custas a pagar em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da requerente na proporção de 2/3 e a cargo da requerida na proporção de 1/3.

 

 

          Notifique-se, incluindo o Ministério Público.

 

 

Lisboa, 21-6-2024

O Árbitro

 

 

(José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora)

 

Texto elaborado com a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.