SUMÁRIO:
Não pode ser deduzido no IRC ao abrigo do RFAI o investimento realizado em atividades enquadradas no sector da transformação - preparação, congelação e transformação de produtos de pesca e aquicultura, que abrange o peixe, crustáceos e moluscos, a que correspondem os CAE’s 10201 e 10204, em resultado das normas do Direito da União Europeia (8.º n.º 4 CRP): RGIC, OAR, Regulamento (UE) n.º 1379/2013 e Regulamento (UE) n.º 508/2014.
DECISÃO ARBITRAL
Os Árbitros Regina de Almeida Monteiro (Presidente), Nuno Miguel Morujão e Martins Alfaro (Adjuntos) designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:
1- Relatório
1. A..., S.A., NIF..., com sede na ..., ...-... ... (adiante designado por “Requerente”), requereu a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo da al. a) e b) do n.º 2 do artigo 10.º do decreto-lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (adiante apenas designado por RJAT), em conjugação com o artigo 99.º e n.º 1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”).
É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (doravante “AT” ou “Requerida”).
1.1. Do objeto do Processo
O pedido de pronúncia arbitral tem por objeto o ato de indeferimento do procedimento de Reclamação Graciosa n.º ...2022... apresentado contra a autoliquidação de IRC consubstanciada na declaração de rendimentos Modelo 22 n.º ...- ...-... submetida em 14.05.2020, por referência ao período de tributação de 2019.
O pedido:
i.) Determine a anulação da autoliquidação de IRC sub judice e, bem assim, da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, nos termos do artigo 163.º, n.º 1, do CPA;
ii.) Na medida da procedência do pedido anterior, condene a Entidade Requerida no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto no artigo 43.º, n.º 1, da LGT;
e
iii.) Na medida da procedência dos pedidos anteriores, condene a Entidade Requerida nas custas do processo arbitral, tudo com as demais consequências legais.
1.2. Tramitação Processual
O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT, em 17 de julho de 2023.
A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico designou como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo os ora signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
Em 1 de junho de 2023, as partes foram notificadas da designação dos árbitros, não tendo arguido qualquer impedimento.
Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 17 de julho de 2023.
Em 25 de agosto de 2023 o Ex.mo Presidente do Conselho Deontológico determinou a substituição de um dos Árbitros Vogais inicialmente nomeado.
Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.
Notificada para o efeito, a Requerida, apresentou Resposta a 2 de outubro de 2023, acompanhada de um Processo Administrativo relativo a outro sujeito passivo.
Por despacho de 15 de março de 2024 foi notificada a Requerida para juntar o PA relativo à Requerente, o que fez em 18 de março de 2024.
A 31 de outubro de 2023, notificaram-se as partes de que, face ao requerimento apresentado pela Requerente em que identifica a matéria sobre a qual pretende produzir prova, revoga-se o despacho proferido no dia 6 de outubro de 2023 na parte em que prescindia da reunião, fixando o dia 27 de novembro de 2023 para a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.
As partes apresentaram alegações escritas no prazo legal, pugnando, no essencial, pelas posições inicialmente defendidas.
2. Saneamento
O Tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, como se dispõe no artigo 2.º, n.º 1, al. a) e 4.º, ambos do RJAT.
As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (artigos. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
O processo não enferma de nulidades.
Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.
3. Matéria de facto
3.1. Factos provados
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas quanto ao mérito, dão-se como assentes e provados os seguintes factos:
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A Requerente, com o NIF..., tem sede na ..., ...-... ...; (cf. RIT).
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Exerce, a título principal, uma atividade essencialmente ligada à preparação, congelação, transformação e comércio de peixe e outros produtos alimentares.
-
A classificação económica da atividade da Requerente é efetuada, nos termos da Classificação Portuguesa de Atividades Económicas em vigor, segundo os seguintes Códigos de Atividade Económica (“CAE” ou “CAE Rev.3”):
CAE
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Atividade
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46381
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Comércio por grosso de peixe, crustáceos e moluscos
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10201
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Preparação de produtos da pesca e da aquicultura
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47230
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Comércio a retalho de peixe, crustáceos e moluscos, em estabelecimentos especializados
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10204
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Salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura
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52101
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Armazenagem frigorífica
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46382
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Comércio por grosso de outros produtos alimentares, n.e
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47890
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Comércio a retalho em bancas, feiras e unidades móveis de venda, de outros produtos
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47910
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Comércio a retalho por correspondência ou via Internet
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A 14 de maio de 2020, a Requerente apresentou a sua declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC referente ao exercício de 2019, tendo apurado uma coleta de 819.533,17 EUR e um montante de imposto a recuperar de 759.922,38 EUR (cf. documento 1, junto com o PPA).
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Nessa declaração de rendimentos não inscreveu qualquer montante no Campo 355, do Quadro 10, nem nos Campos 714 e 716, do Quadro 074, do respetivo Anexo D (cf. documento n.º 1, junto com o PPA).
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Em 2019, a Requerente realizou um investimento em expansão e aumento da capacidade produtiva, no montante global de 4.038.439,32 €, afeto à atividade de transformação da sociedade enquadráveis nos CAE's 10201 e 10204; (cf. artigos 12.º, 13.º e 14.º do PPA, e documentos 4, 5, e 6 junto com o PPA e PA).
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A 5 de maio de 2022, a Requerente apresentou reclamação graciosa da sua autoliquidação de IRC 2019 (cf. cópia da reclamação graciosa, junta com o PPA como documento n.º 8), visando deduzir os créditos RFAI, no montante total de 925.830,57 € (25% do investimento elegível de 3.703.322,26 €); (cf. PA).
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Requereu o reconhecimento do direito ao benefício fiscal no âmbito do RFAI, por não ter sido declarado na Declaração Modelo 22 com o n.º ...-... -... submetida em 14-02-2020; (cf. PA).
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A Requerente peticiona ainda que lhe sejam feitos os ajustamentos em sede de autoliquidação de IRC 2019, sendo reconhecido o benefício fiscal associado ao RFAI, no valor de 409.766,58 €, a deduzir no período (correspondendo a 50% da coleta total) e reportar o excedente não usado, que ascende a 516.063,99 € (925.830,57 € - 409.766,58 €) para períodos seguintes; (cf. PA).
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O investimento em apreciação, está enquadrado ao abrigo da tipologia do aumento da capacidade de um estabelecimento já existente; (cf. PA).
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E, está relacionado com a preparação, congelação e transformação de produtos de pesca e aquicultura, que abrange o peixe, crustáceos e moluscos, a que correspondem os CAE’s 10201 e 10204; (cf. art.º 15 da Resposta e exposição apresentada pela Requerente na audiência prévia)
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Em sede de audiência prévia a Requerente juntou documentos relativos às aquisições dos equipamentos relativos ao investimento e outros; (cf. PA).
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A Requerente foi notificada do projeto de decisão da reclamação graciosa constante do projeto de despacho proferido em 28-11-2022 e para que no prazo de 15 dias, exercer, querendo, o direito de participação na decisão, sob a modalidade de audição prévia, previsto no artigo 60.º da LGT, tendo a Requerente solicitado a prorrogação do prazo o qual foi concedido; (cfr. PA – PRG).
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A 6 de fevereiro de 2023, a Requerente foi notificada da decisão final de indeferimento da reclamação graciosa; (cf. documento n.º 2 junto com o PPA).
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A Requerente estava enquadrada no regime geral de tributação em sede de IRC (cf. artigo 8.º do PPA, não contraditado pela Requerida).
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Os equipamentos objeto de investimento mantêm-se afetos à atividade da Requerente e estão alocados às mesmas unidades produtivas. (cf. artigo 15.º do PPA, PA e depoimento da testemunha).
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Em 31-12-2019 a Requerente não era devedora de quaisquer dívidas à Autoridade Tributária ou à Segurança Social; (cf. declaração do ISS de 07 de junho de 2021 – doc. 3 junto com o PPA)
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A Requerente não está enquadrada, no conceito europeu de “empresa em dificuldade” (cf. definido no ponto 20 das Orientações relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas não financeiras em dificuldade disponíveis). (cf. artigo 78.º do PPA, não contraditado pela Requerida).
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Entre dezembro de 2018 e dezembro de 2019, a Requerente aumentou o número de colaboradores; (cf. artigo 17.º e 85.º do PPA, e documentos juntos em sede de audiência prévia - PA).
3.2. Factos não provados
Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.
3.3. Fundamentação da matéria de facto
A factualidade provada teve por base a apreciação crítica da posição assumida por cada uma das partes, bem como a análise crítica dos documentos juntos aos autos, cuja autenticidade e veracidade não foram impugnadas por nenhuma das partes.
Assentou, por outro lado, na ponderada apreciação do teor do depoimento testemunhal produzido em julgamento, sendo que o depoente, embora prestando esclarecimentos de modo assertivo, referiu ter iniciado funções em 1 de dezembro de 2019, mediante contrato que se mantém até à data da audiência. Estas circunstâncias foram tidas em consideração pelo Tribunal em sede de julgamento da matéria de facto, designadamente concluindo que o conhecimento da testemunha quanto aos factos ocorridos antes do seu início de funções profissionais, não será totalmente direto.
4 - Matéria de Direito
A questão decidenda
O pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente tem por objeto imediato a apreciação da (i)legalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas do exercício de 2019 e, por objeto mediato, a declaração de ilegalidade e consequente anulação parcial da autoliquidação de IRC relativa ao exercício de 2019.
A questão decidenda consiste em decidir sobre a elegibilidade da atividade da Requerente desenvolvida no setor da transformação e comercialização de preparação de produtos de pesca e de aquicultura (CAE 10201) e salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos de pesca e aquicultura (CAE 10204) se enquadra no âmbito de aplicação do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), pode beneficiar da dedução à coleta do exercício de 2019, ou se este Regime não deve ser aplicado por se tratar de atividade excluída do âmbito setorial de aplicação das OAR e do RGIC e Regulamento (UE) 1379/2013.
4.1. Posição da Requerente
4.1. Da ilegalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa
Alega a Requerente que o despacho de indeferimento da reclamação graciosa não está devidamente fundamentado pelo que deve ser considerado ilegal e ser anulado.
Para tal defende:
“refira-se que importa também apelar à fundamentação dos atos tributário e decisório cuja anulação se requer, na medida em que a legalidade dos mesmos apenas pode ser aferida tendo em consideração a fundamentação que os integra e destes é contemporânea.
Com efeito, a concretização da fundamentação do ato decisório sub judice encontra-se vertida na decisão da reclamação graciosa (e no respetivo projeto de indeferimento), contendo um conjunto de considerações genéricas e abstratas relativas a várias disposições legais, sem qualquer concretização de qual é, de facto, a fundamentação do mesmo.
Ou seja, a Autoridade Tributária, numa tentativa de fundamentar a rejeição da reclamação graciosa, menciona todos os normativos legais (hipoteticamente) possíveis de (eventualmente) poder impactar a decisão a tomar em sede de processo arbitral, como se não lhe fosse exigível que se posicionasse, de forma clara, sobre qual o regime legal que, de facto, no seu entender, exclui as atividades concretamente desenvolvidas pela Requerente do âmbito de aplicação do RFAI.
Por outras palavras, e como afirma a jurisprudência dos tribunais superiores, ainda que não indicasse de forma clara e expressa os concretos preceitos legais que fundamentaram o ato em questão, sempre será́ exigível que a fundamentação faça referência expressa e clara ao regime legal aplicável ou a um quadro normativo determinado, não sendo admissível referências genéricas a vários regimes legais distintos, na tentativa de justificar a bondade da sua decisão.
No procedimento de reclamação graciosa após a audiência prévia da Requerente consta a seguinte informação datada de 19-01-2023, que mereceu despacho de concordância da Diretora de Finanças Adjunta em 30-01-2023:
“1.1. Resumo / Conclusão do Projeto de Decisão
Conforme consta do Projeto de Despacho, foi concluída pela manutenção da liquidação reclamada e projetado o indeferimento do pedido, por não estarem reunidos todos os requisitos para beneficiar do RFAI, pelos motivos que se resumem, transcritos do Projeto:
“- Não cumprimento do previsto no n.º 1 do art.º 22 do CFI, dado que as atividades com CAE 10201
- preparação de produtos da pesca e da aquicultura e CAE 10204-Salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura estão excluídas do âmbito de aplicação setorial das OAR e do RGIC e, consequentemente, do RFAI, não podendo assim, beneficiar do referido regime.
“1.3. Apreciação do Direito de audição
No Projeto de Despacho, foram apreciadas todas as condições exigidas pelo CFI, a preencher pela Reclamante, para poder beneficiar do RFAI. Em sede de direito de audição, a Reclamante pronunciou-se sobre as referidas condições impostas pelo CFI, exceto acerca do não cumprimento do previsto no n.º 1 do art.º 22 do CFI, decorrente do qual, as atividades objeto de investimento (CAE 10201 - preparação de produtos da pesca e da aquicultura e CAE 10204-Salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura), estão excluídas do âmbito de aplicação setorial das OAR e do RGIC e, consequentemente, do RFAI. Foram anexos ao direito de audição, 14 documentos relacionados com os restantes requisitos impostos pelo CFI, que serão integrados no presente PRG, contudo, nada foi referido sobre a atividade desenvolvida. Deste modo, não se encontrando verificado o requisito da Reclamante desenvolver uma atividade elegível para efeitos de RFAI, não é possível a aplicação do benefício fiscal em apreciação.
Conclusão:
Em face do exposto, não tendo sido apresentados, em sede de direito de audição, quaisquer factos novos, suscetíveis de alterar o exposto no Projeto de Despacho, acerca da não elegibilidade para efeitos do RFAI, das atividades em que se concretizou o investimento, não se encontram reunidas as condições para beneficiar do referido regime.
Assim, conclui-se pela manutenção da decisão de indeferimento, conforme projeto de decisão, devendo ser INDEFERIDA a pretensão da reclamante.”
Na informação constante do Procedimento de Reclamação Graciosa com a data de 23-11-2022 é referido acerca dos requisitos necessários para que as atividades em que foi realizado os investimentos para beneficiar do RFAI:
“Da apreciação do pedido
ENQUADRAMENTO LEGAL
O RFAI encontra-se previsto nos artigos 22.º a 26.º do novo Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, aplicável aos períodos de tributação iniciados em ou após 1 de janeiro de 2014, com ressalva da disposição transitória constante do art.º 6.º do referido decreto-lei.
Conforme estabelece o n.º 2 do art.º 1.º do CFI, o RFAI é um regime de auxílios do Estado, com finalidade regional, aprovado nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC).
A Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro procede à regulamentação do RFAI, assegurando a aplicação integral das regras previstas no RGIC e, quando aplicável, das Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 209, de 23 de julho de 2013 (OAR).
O n.º 1 do art.º 22.º do CFI remete para a Portaria n.º 282/2014 de 30 de dezembro, a qual define os códigos da Classificação Portuguesa de Atividades Económicas (CAE-Rev. 3) correspondentes a várias atividades objeto dos projetos de investimento produtivo.
Assim, as questões do RFAI têm que ser analisadas e enquadradas com base na legislação interna (CFI e Portarias), mas também, seguindo o Regulamento ao abrigo do qual foi criado – RGIC e das OAR.
B - Âmbito Objetivo - Setores Elegíveis
Conforme estipulado no n.º 1 do artº 22.º do CFI, o RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º do CFI, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo (Portaria 282/2014 de 30 dezembro), com exceção das atividades excluídas do âmbito setorial de aplicação das OAR e do RGIC.
Embora o art.º 2.º da Portaria 282/2014, de 30 dezembro, defina os CAE’s relativos aos setores de atividade elegíveis para efeitos do RFAI, porém, o artigo 1.º da referida portaria determina que, em conformidade com as OAR e com o RGIC, não são elegíveis para a concessão de benefícios fiscais os projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas dos setores (entre outros) da pesca e da aquicultura, da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no Anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
B1 - Atividades exercidas pela Reclamante
Conforme cadastro da AT em 2019-12-31, o sujeito passivo encontra-se registado para exercício do CAE principal 46381-comércio por grosso de peixe, crustáceos e moluscos e sete CAE’s secundários, entre os quais consta o CAE 10201 - preparação de produtos da pesca e da aquicultura e CAE 10204-Salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura, pertencentes à divisão 10.
B2 – Enquadramento e Elegibilidade da Atividade
- A atividade principal com o CAE 46381-comércio por grosso de peixe, crustáceos e moluscos, não se encontra prevista em nenhuma das alíneas do art.º 2.º da Portaria 282/2014 de 30 dezembro, encontrando-se assim, excluída do âmbito de aplicação do RFAI, nos termos do n.º 1 do art.º 22.º do CFI.
- Conforme referido pela Reclamante, o investimento realizado no exercício 2019, que considera ser elegível pelo RFAI, está diretamente relacionado com a atividade desenvolvida ao abrigo dos CAE’s 10201 e 10204, sendo que estes se encontram abrangidos pela alínea b) do art.º 2.º da Portaria 282/2014 de 30 dezembro, inseridos na divisão 10, incluída no grupo das Indústrias transformadoras.
- Contudo, há que ter em conta as restrições previstas no art.º 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 dezembro, que determinam que, em conformidade com as OAR e com o RGIC, não são elegíveis para a concessão de benefícios fiscais os projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas dos setores, nomeadamente da pesca e da aquicultura, da produção agrícola primária, da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no Anexo I do TFUE.
- Tendo em conta que as atividades objeto do investimento da Reclamante, são relacionadas com a preparação, congelação e transformação de produtos de pesca e aquicultura, que abrange o peixe, crustáceos e moluscos, que são produtos incluídos na Lista do Anexo I ao TFUE, apesar de enquadráveis nos CAE’s 10201 e 10204, não cumprem as restrições previstas no art.º 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 dezembro, não sendo por isso, atividades elegíveis para efeitos do RFAI.
- De acordo com o ponto 10 das OAR, conforme remete o art.º 1.º da Portaria n.º 282/2014, “A Comissão aplicará os princípios estabelecidos nas presentes orientações aos auxílios com finalidade regional em todos os setores de atividade económica, com exceção da pesca e da aquicultura (10), da agricultura (11) e dos transportes, que estão sujeitos a regras especiais previstas em instrumentos jurídicos específicos, suscetíveis de derrogar total ou parcialmente as presentes orientações.”
“(10) Abrangidos pelo Regulamento (CE) n. º 104/2000 do Conselho, de 17 de dezembro de 1999, que estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura (JO L 17 de 21.1.2000, p. 22). “
Este Regulamento foi revogado pelo Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de dezembro de 2013.
“(11) Os auxílios estatais à produção primária, transformação e comercialização de produtos agrícolas que deem origem a produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado e à silvicultura estão sujeitos às regras estabelecidas nas Orientações para os auxílios estatais no setor agrícola.”
- Além disso, de acordo com o n.º 3 do art.º 1.º do RGIC, “O presente regulamento não é aplicável aos seguintes auxílios: a) Auxílios concedidos no setor da pesca e da aquicultura, nos termos do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura (...)”
- Conforme exposto, as atividades de pesca e a aquicultura, encontram-se excluídas do âmbito setorial das OAR e do RGIC.
- Quanto à definição de pesca e aquicultura, esta não se encontra na Portaria 282/2014 de 30 dezembro nem na legislação do RFAI, encontrando-se, contudo prevista no Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, conforme art.º 5.º, alíneas a) b) e d) que se transcrevem:
“a) "Produtos da pesca", os organismos aquáticos resultantes de qualquer atividade de pesca ou os produtos deles derivados, indicados no Anexo I;
b) "Produtos da aquicultura", os organismos aquáticos resultantes de qualquer atividade de aquicultura, em qualquer estádio do seu ciclo de vida, ou os produtos deles derivados, indicados no Anexo I; (...)
d) "Setor da pesca ou da aquicultura", o setor da economia que inclui todas as atividades de produção, transformação e comercialização dos produtos da pesca ou da aquicultura;(...)”
Conforme definições, o setor da pesca e da aquicultura inclui todas as atividades de produção, transformação e comercialização dos produtos da pesca ou da aquicultura, abrangendo os produtos listados no Anexo I do Regulamento (UE) n.º 1379/2013, onde se encontram especificados diversos produtos da pesca e da aquicultura, designadamente peixes congelados, peixes secos, salgados ou em salmoura, moluscos, congelados, secos, salgados ou em salmoura.
B3 – Conclusão
Conforme exposto, encontrando-se as atividades objeto do investimento da Reclamante, com CAE 10201 - preparação de produtos da pesca e da aquicultura e CAE 10204-Salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura, enquadradas no setor da pesca e aquicultura, conforme produtos descritos no Anexo I do Regulamento (UE) n.º 1379/2013, então estas encontram-se excluídas do âmbito de aplicação setorial das OAR e do RGIC e, consequentemente, do RFAI, não podendo assim, beneficiar do referido regime. Sem prejuízo do facto do RFAI não poder ser aplicado ao sujeito passivo, desde logo por não cumprir o previsto no n.º 1 do art.º 22 do CFI, ainda assim, prosseguiu-se a análise, de verificação dos restantes pressupostos de elegibilidade do RFAI.
(...).”
Vejamos
Face ao teor do despacho de indeferimento da reclamação graciosa e à informação constante do referido procedimento entende este Tribunal Arbitral que a fundamentação do despacho de indeferimento impugnado afigura-se-nos suficiente, clara e congruente.
De acordo com o artigo 77.º da LGT, a decisão de indeferimento do procedimento reclamação graciosa deve ser fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
E nos termos do n.º 2 de a fundamentação dos atos tributários pode ser efetuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
De acordo com o artigo 153º, n.º 1 do CPA, a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato.
Neste sentido, é de referir o Acórdão de 10-02-2010, proferido no Processo n.º 01122/09:
“Este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender que a fundamentação do acto administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação só é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação.”
Pelo que se considera improcedente a alegação da ilegalidade defendida pela Requerente.
4.2. Da elegibilidade dos investimentos realizados pela Requerente para efeitos do RFAI
4.2.1. Posição da Requerente
A Requerente entende que ao não ter inscrito, na declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC referente ao exercício de 2019, qualquer montante no Campo 355, do Quadro 10, nem nos Campos 714 e 716, do Quadro 074, do respetivo Anexo D, não contabilizou os investimentos realizados, pelo que nasceu na sua esfera o direito a deduzir à coleta, ao abrigo do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento, créditos no montante total de € 925.830,57 (25% do investimento elegível de 3.703.322,26 EUR).
Com o intuito de retificar este lapso (e, consequentemente, deduzir os créditos RFAI a que tinha direito), a Requerente apresentou, a 5 de maio de 2022, reclamação graciosa da sua autoliquidação de IRC 2019 a qual foi indeferida pela AT.
A Requerente rejeita o entendimento preconizado pela Autoridade Tributária, por o mesmo colidir com o CFI, consubstanciando uma interpretação e aplicação do mesmo totalmente desconforme ao Direito da União Europeia, na medida em que a AT “estriba, assim, a decisão de indeferimento sob contenda (e a consequente manutenção na ordem jurídica da autoliquidação de IRC) no facto de a atividade prosseguida pela Requerente não ser elegível para efeitos de RFAI, por consistir numa atividade económica dos setores da pesca e aquicultura, alegadamente excluídos do âmbito de aplicação setorial das Orientações relativas a Auxílios Estatais com Finalidade Regional para 2014-2020 (“OAR 2014-2020”) e do Regulamento Geral de Isenção por Categoria (“RGIC”).
A Requerente considera que as atividades que desenvolve e subjacentes ao investimento em causa nestes autos – as atividades a que correspondem os códigos CAE 10201 e 10204 – são elegíveis para efeitos do incentivo fiscal em apreço, enquadrando-se na indústria transformadora (cfr. artigo 2.º, n.º 2, alínea a), do CFI, ex-vi artigo 22.º, n.º 1, do mesmo diploma).
Da negação à dedução do incentivo fiscal (RFAI) com fundamento na falta de enquadramento da atividade da requerente no âmbito setorial de aplicação das OAR 2014-2020 e no RGIC
A Requerente entende que no ato decisório sob contenda, a Autoridade Tributária sustentou que as atividades objeto do investimento sub judice encontram-se excluídas do âmbito de aplicação setorial das OAR 2014-2020 e do RGIC, circunstância supostamente impeditiva da aplicabilidade do RFAI.
E, defende que:
“Em teoria, o artigo 1.º, n.º 3, alínea a), do RGIC pode ser interpretado de duas formas distintas, podendo entender-se que o mesmo (i) pretende excluir o setor das pescas tal como definido no Regulamento (UE) n.º 1379/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11de dezembro de 2013 (doravante “Regulamento (UE) n.º 1379/2013”) – ou seja, concluindo-se pela inaplicabilidade total do RGIC a este setor –, ou (ii) pretende excluir o setor das pescas na estrita medida em que este beneficie de algum auxílio previsto no Regulamento (UE) n.º 1379/2013 – caso em que a transformação de produtos de pesca poderá ficar, ou não, excluída do âmbito de aplicação do RGIC.
Como auxiliar à interpretação do preceito, veja-se a redação do mesmo em inglês:
«This Regulation shall not apply to: (a) aid granted in the fishery and aquaculture sector, as covered by Regulation (EU) Nº 1379/2013 of the European Parliament and of the Council of 11 December 2013 on the common organisation of the markets in fishery and aquaculture products, amending Council Regulations (EC) Nº 1184/2006 and (EC) No 1224/2009 and repealing council Regulation (EC) No 104/2000 (1), with the exception of training aid, aid for SMEs' access to finance, aid in the field of research and development, innovation aid for SMEs and aid for disadvantaged workers and workers with disabilities» [sublinhados e realce nossos].
Ora, da tradução direta e literal para português do preceito acabado de transcrever resulta que o mesmo tão-somente exclui do âmbito de aplicação do RGIC «auxílios concedidos nos setores da pesca e da aquicultura conforme cobertos pelo Regulamento (UE) n.º 1379/2013» [tradução livre e realce nossos].
Este elemento interpretativo aponta claramente para a intenção do legislador europeu de excluir do âmbito do RGIC apenas os auxílios que já́ se encontrem abrangidos pelo Regulamento (UE) n.º 1379/2013.
A contrario sensu, não estarão excluídos do âmbito de aplicação do RGIC auxílios aos setores das pescas e da aquicultura quando o Regulamento (UE) n.º 1379/2013 não estabeleça um auxílio com a mesma tipologia e finalidade.
Neste contexto, importa aferir que benefícios se encontram previstos no Regulamento (UE) n.º 1379/2013 para as entidades que desenvolvem a sua atividade no setor da pesca e aquicultura para, subsequentemente, determinar a aplicabilidade do RGIC nesta matéria.
Ora, o Regulamento (UE) n.º 1379/2013 estabelece a organização comum dos mercados dos produtos da pesca e da aquicultura (“OCM”), remetendo a regulamentação da atribuição de quaisquer apoios à execução da OCM para diploma autónomo – o Regulamento (UE) n.º 508/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014 (doravante “Regulamento (UE) n.º 508/2014), que cria o Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (“FEAMP”), destinado a financiar a Politica Comum de Pescas (PCP) e a Politica Marítima Integrada (PMI).
Assim, a exclusão prevista no RGIC abrangerá apenas os auxílios concedidos no âmbito do Regulamento (UE) n.º 1379/2013, i.e., aqueles cujo financiamento resulta do FEAMP.
Ora, o RFAI é um incentivo fiscal que opera através de uma dedução à coleta de certas despesas elegíveis, não implicando qualquer transferência financeira para os seus beneficiários.
Assim, o RFAI não é financiado pelo FEAMP e, nessa perspetiva, não pode ser entendido como subsumível na realidade prevista pelo Regulamento (UE) n.º 1379/2013.
Em consequência, não pode senão concluir-se que, para efeitos de aplicação de um incentivo fiscal com as características do RFAI, o setor da aquicultura e pescas não é excluído pelo RGIC.
A isto acresce que, de uma análise às disposições do RGIC referentes aos auxílios com finalidade regional (Secção 1 do referido regulamento, onde se insere o RFAI), não decorre qualquer limitação à sua aplicação a incentivos ao investimento concedidos a entidades que operam no setor da pesca.
Pelo contrário, uma vez que o artigo 13.º do RGIC exclui do âmbito de aplicação desta secção os auxílios com finalidade regional «sob a forma de regimes que compensem os custos de transporte de mercadorias [...] concedidos a favor de atividades [...] como a agricultura, a silvicultura e a pesca (secção A da nomenclatura estatística das atividades económicas NACE Rev. 2)», necessariamente se conclui que nem todos os auxílios em matéria de pesca se encontram excluídos do RGIC.
(...)
Tudo ponderado, conclui-se que o RGIC não obsta à concessão de auxílios nos setores da aquicultura e pescas, desde que os mesmos não coincidam com outros concedidos ao abrigo do Regulamento (UE) n.º 1379/2013.
Por outro lado, e seguindo a mesma linha de raciocínio, a atividade exercida pela Requerente também não se encontra excluída do âmbito setorial de aplicação das OAR 2014-2020.
Com efeito, o parágrafo 10 das OAR 2014-2020 – mencionado pela Autoridade Tributária no projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa – estabelece o seguinte:
«A Comissão aplicará os princípios estabelecidos nas presentes orientações aos auxílios com finalidade regional em todos os setores de atividade económica (9), com exceção da pesca e da aquicultura (10), da agricultura (11) e dos transportes (12), que estão sujeitos a regras especiais previstas em instrumentos jurídicos específicos, suscetíveis de derrogar total ou parcialmente as
presentes orientações. A Comissão aplicará estas orientações à transformação e comercialização de produtos agrícolas em produtos não agrícolas. As presentes orientações aplicam-se a medidas de auxílio em apoio de atividades fora do âmbito do artigo 42.º do Tratado, mas abrangidas pelo regulamento relativo ao desenvolvimento rural, e cofinanciadas pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural ou concedidas como um financiamento nacional em suplemento dessas medidas cofinanciadas, salvo previsão em contrário das regras setoriais».
Na nota de rodapé (10), as OAR 2014-2020 densificam quais os auxílios em matéria de pesca e aquicultura excluídos do seu âmbito de aplicação, limitando-os aos auxílios «[abrangidos pelo Regulamento (CE) n.º 104/2000 do Conselho, de 17 de dezembro de 1999 [revogado e substituído pelo Regulamento (UE) n.° 1379/2013], que estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura (JO L 17 de 21.1.2000, p. 22)».
Ou seja, à semelhança do que sucede com o RGIC, também as OAR 2014-2020 são aplicáveis ao setor da agricultura e pescas, salvo quanto aos auxílios abrangidos pelo Regulamento (UE) n.º 1379/2013 (e, em última análise, regulados pelo Regulamento (UE) n.º 508/2014) – o que, como acima se demonstrou, não é o caso do RFAI.
Em consequência, conclui-se que a atividade exercida pela Requerente não está excluída nem do âmbito setorial de aplicação das OAR 2014-2020 nem do RGIC.
Perante o exposto, quer a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, quer a autoliquidação de IRC do exercício de 2019, afiguram-se desconformes ao regime ínsito no artigo 22.º, n.º 1, do CFI, padecendo por isso de ilegalidade, geradora de anulabilidade nos termos do artigo 163.º do CPA, o que se invoca perante esse Douto Tribunal Arbitral para os devidos efeitos legais.
Do inequívoco preenchimento dos demais pressupostos para aplicação do RFAI na situação sub judice (artigos 22.º do CFI e 2.º, n.º 2, alínea d) da portaria n.º 297/2017)
Como claramente resulta do enquadramento supra, o ato decisório sob contenda reconheceu, na sequência dos elementos apresentados pela Requerente em sede de exposição de audição prévia, o preenchimento dos pressupostos necessários à aplicação do RFAI, cingindo-se a discordância entre as partes tão-somente à exclusão do setor de atividade da Requerente deste incentivo fiscal por força do RGIC e das OAR 2014-2020 (cfr. ponto II.2. supra)”.
A Requerente defende que estão preenchidos todos os pressupostos legais de que depende a aplicação do RFAI.
E nas alegações a Requerente defende ainda:
“E nem se diga, como tenta a Autoridade Tributária em sede de Resposta, que o Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) já decidiu em sentido totalmente consonante com a posição por si defendida – cfr. Acórdão n.º C-23/22, de 15 de dezembro de 2022.
Na verdade, a pergunta que foi submetida à apreciação do TJUE foi a seguinte:
«A correta interpretação das Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, conjugadas com o disposto no Regulamento (EU) n.º 651/2014, da Comissão, de 16 de Junho de 2014, nomeadamente nos respetivos artigos 1.º, 2.º n.º 11, no Regulamento (EU) n.º 1379/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Dezembro de 2013, e com o disposto no Anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, permite a conclusão de que, nos termos do disposto nos n.º 2 do artigo 2.º e n.º 1 do artigo 22.º do Código Fiscal do Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de Outubro, e os artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de Dezembro, a atividade de transformação de produtos de pesca e aquicultura relativas a “bacalhau salgado”, “bacalhau congelado”, e “bacalhau demolhado”, compreendida no código CAE 10204, não é uma atividade de transformação de produto agrícola para efeitos da concessão dos auxílios fiscais contemplados?»”
Do referido Acórdão do TJUE resulta que: «uma atividade de transformação de produtos da pesca e da aquicultura, como a produção de bacalhau salgado, de bacalhau congelado e de bacalhau demolhado, não constitui uma atividade de transformação de produtos agrícolas, que está excluída do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 651/2014 por força do artigo 1.º , n.º 3, alínea c), deste regulamento, mas sim uma atividade pertencente ao setor da pesca e da aquicultura, que está excluída do âmbito de aplicação do referido regulamento por força do seu artigo .1º , n.o 3, alínea a)».
Ou seja, quando o TJUE foi chamado a pronunciar-se sobre um tema relacionado com a transformação de produtos da pesca e da aquicultura, foi concretamente para dirimir a questão de se estar (ou não) perante uma atividade de transformação de produtos agrícolas, na aceção do artigo 2.º, ponto 10, do Regulamento n.º 651/2014, lido em conjugação com o artigo 2.º , ponto 11, deste regulamento e com o anexo I do Regulamento n.º 1379/2013, podendo (ou não) ser excluída, a este título, do âmbito de aplicação do Regulamento n.º 651/2014 com fundamento no seu artigo 1.º , n.º 3, alínea c).
Seguidamente, o TJUE conclui que na situação submetida à sua apreciação, a atividade está excluída, não pelo artigo 1.º, n.º 3, alínea c), do RGIC mas sim pelo artigo 1.º, n.º 3, alínea do mesmo Regulamento, mas fazendo expressa ressalva «nos termos do seu artigo 1.º , n.º 3, alínea a), o Regulamento n.º 651/2014 também não é aplicável, sob reserva de uma série de exceções não pertinentes para o processo principal, aos auxílios concedidos ao «setor da pesca e da aquicultura, nos termos do Regulamento [n.º 1379/2013]». [sublinhado e realce nossos]
Ou seja, o TJUE decidiu que o referido Regulamento não será aplicável aos auxílios concedidos ao setor da pesca, sob reserva de várias exceções (que, como se vê, existem, sublinhe-se), as quais não foram densificadas por não relevarem no contexto concretamente submetido à apreciação do Tribunal.
Perante o exposto, quer a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, quer a autoliquidação de IRC do exercício de 2019, afiguram-se desconformes ao regime ínsito no artigo 22.º, n.º 1, do CFI, padecendo por isso de ilegalidade, o que naturalmente implica a sua anulação, nos termos do artigo 163.º do CPA, e a consequente restituição dos montantes indevidamente pagos pela Requerente, nos termos do artigo 100.º da LGT.”
4.2.2. Posição da Requerida
A Requerida alega que:
“Relembre-se que o presente ppa foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a “A..., SA” à Autoridade Tributária a respeito da retificação do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado na autoliquidação, por esta sociedade considerar que efetuou investimentos que são elegíveis para a concessão do benefício fiscal RFAI, e por lapso não o declarou.
Desse lapso, a Requerente, pretende o reconhecimento do direito a deduzir RFAI no valor de 925.830,57 €; bem como a dedução no período de 2019 de 409.766,58 € (limite de 50% da coleta apurada no período) e o direito a deduzir nos períodos seguintes o remanescente.
Em síntese, a Requerente alega que o investimento realizado em 2019, e que defende ser elegível para efeitos de RFAI, está diretamente relacionado com as atividades desenvolvidas ao abrigo dos CAEs 10201 e 10204, sendo que estes se encontram abrangidos pela alínea b) do artigo 2º da Portaria no 282/2014, de 30 de dezembro, inseridos na divisão 10, incluída no grupo das indústrias transformadoras.
Por seu lado a Direção de Finanças do Porto, concluiu que encontrando-se as atividades objeto do investimento da Reclamante, com CAE 10201 - preparação de produtos da pesca e da aquicultura e CAE 10204-Salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura, enquadradas no setor da pesca e aquicultura, conforme produtos descritos no Anexo I do Regulamento (UE) n.º 1379/2013, então estas encontram- se excluídas do âmbito de aplicação setorial das OAR e do RGIC e, consequentemente, do RFAI, não podendo assim, beneficiar do referido regime, desde logo por não cumprir o previsto no n.º 1 do art.º 22 do CFI.
Importa desde já precisar que, contrariamente ao defendido pela Requerente, nos termos do previsto no artigo 1°, n° 3, alínea a), do Regulamento n° 651/2014, este não é aplicável aos auxílios concedidos no setor da pesca e da aquicultura, nos termos do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura, com as exceções prevista e não pertinentes para o processo em causa.
Esta exclusão é, de resto e como vimos, recordada no ponto 10 das Orientações 2014-2020 e na nota de rodapé 10 para a qual esse ponto remete.
Saliente-se ainda que o ponto 11 do art.º 2. º do Regulamento n° 651/2014 contém uma definição própria do conceito de «produto agrícola» que exclui expressamente os produtos da pesca e da aquicultura que se encontram abrangidos pela OCM instituída pelo Regulamento n° 1379/2013.
Ora, resulta deste artigo 2° e do artigo 5°, alíneas a) e d), do Regulamento n° 1379/2013, lidos em conjugação com o anexo I do mesmo regulamento, que este Regulamento n° 1379/2013 é aplicável a todas as atividades de transformação relativas a organismos aquáticos provenientes da atividade da pesca e da aquicultura e, às atividades de preparação de produtos de pesca e da aquicultura transformação de que resulte a produção de bacalhau salgado, de bacalhau congelado e de bacalhau demolhado.
Daqui se conclui, inequivocamente que, as atividades de preparação de produtos de pesca e da aquicultura e, a salga, secagem e outras atividades de transformação de produtos da pesca e aquicultura, na medida em que fazem parte, do «setor da pesca e da aquicultura», na aceção do artigo 1°, n° 3, alínea a), do Regulamento n° 651/2014, lido em conjugação com o artigo 2.° e com o artigo 5.°, alíneas a) e d), bem como com o anexo I do Regulamento n° 1379/2013, estão , a este título, excluídas, em todo caso, do âmbito de aplicação do regulamento n° 651/2014, e consequentemente, do âmbito do RFAI. Considera-se estar suficientemente demonstrado que as atividades em que foram efetuados os investimentos e que a Requerente pretende ver considerados elegíveis para efeitos do benefício fiscal do RFAI, estão excluídas da aplicação do RFAI. Acrescentamos, em abono da posição defendida pela AT, o recente acórdão do tribunal de justiça (décima secção) de 15 de dezembro de 2022, no âmbito do processo C-23/22.
Deste modo, não se encontrando verificado o requisito de as atividades em que a Requerente efetuou os investimentos ser elegível, é dispensável avaliar do preenchimento das demais condições previstas no artigo 22º do CFI.”
C – Tipologia do Investimento inicial
Nos termos da alínea d) do n.º 2 do art.º 2.º da Portaria n. 297/2015 de 21 de setembro, “Os benefícios fiscais previstos no artigo 23.º do Código Fiscal do Investimento apenas são aplicáveis relativamente a investimentos iniciais, nos termos da alínea a) do parágrafo 49 do artigo 2.º do RGIC, considerando-se como tal os investimentos relacionados com a criação de um novo estabelecimento, o aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, a diversificação da produção de um estabelecimento no que se refere a produtos não fabricados anteriormente nesse estabelecimento, ou uma alteração fundamental do processo de produção global de um estabelecimento existente.”
O investimento em apreciação, foi considerado pela Reclamante, como enquadrado ao abrigo da tipologia do aumento da capacidade de um estabelecimento já existente.
Para justificar essa classificação, foi referido na p.i., que o investimento conduziu a um aumento inequívoco da capacidade de produção instalada, ilustrado através de um quadro com os valores da capacidade de produção instalada (ton.), por família de produto, com os respetivos valores em 2018 e 2019, que ascenderam a 24.400,00 ton. em 2018 e 28.350,00 ton. em 2019 (aumento de 16,19%).
De acordo com os elementos apresentados, o referido investimento, concretizou-se na aquisição de um conjunto de ativos, identificados através de listagem de bens de imobilizado, sem que fosse concretizado, de que forma a sua aquisição, se contextualiza, em termos de um plano de investimentos a implementar, constituído por atividades coordenadas entre si, atuando em determinadas áreas de intervenção, cuja realização visa um objetivo específico, a cumprir em determinado prazo.
Não foi apresentado qualquer programa de investimento definido e estruturado que permita a qualificação do investimento na alegada tipologia de aumento da capacidade de um estabelecimento já existente, obrigatória para a aplicação do benefício fiscal do art.º 23º do CFI.
A elegibilidade das aplicações relevantes para efeitos do RFAI, não se pode cingir à aquisição de bens de investimento, inerentes ao desenvolvimento normal da atividade, de forma isolada, sem ter subjacente um plano de investimento, que vá ao encontro da essência deste tipo de apoio, que tem finalidades de desenvolvimento económico regional. Por outro lado, encontrando-se o sujeito passivo registado para o exercício de diversas atividades económicas, desconhece-se em que termos o investimento em causa se encontra afeto a determinada atividade específica.
O enquadramento do investimento nas tipologias previstas, é uma questão prévia à análise da elegibilidade dos ativos subjacentes ao investimento, não tendo sido clarificado pela Reclamante, de que forma os bens em que se concretizou o investimento se integram num determinado plano de investimento”.
4.3. Legislação
A legislação nacional:
Código Fiscal do Investimento (“CFI”), aprovado pelo decreto-lei n.º 162/2014, de 31 de outubro - vigente em 2019
“Art.º 1º Objeto
n.º 2 “O regime de benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo e o RFAI constituem regimes de auxílios com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC)”.
“Artigo 2.º
Âmbito objetivo
1 - Até 31 de dezembro de 2020, podem ser concedidos benefícios fiscais, em regime contratual, com um período de vigência até 10 anos a contar da conclusão do projeto de investimento, aos projetos de investimento, tal como são caracterizados no presente capítulo, cujas aplicações relevantes sejam de montante igual ou superior a (euro) 3 000 000,00.
2 - Os projetos de investimento referidos no número anterior devem ter o seu objeto compreendido, nomeadamente, nas seguintes atividades económicas, respeitando o âmbito sectorial de aplicação das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 209, de 23 de julho de 2013 (OAR) e do RGIC:
a) Indústria extrativa e indústria transformadora;
(...)
d) Atividades agrícolas, aquícolas, piscícolas, agropecuárias e florestais;
3 - Por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia são definidos os códigos de atividade económica (CAE) correspondentes às atividades referidas no número anterior.
Artigo 22.º Âmbito de aplicação e definições
1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.
f) Efetuem investimento relevante que proporcione a criação de postos de trabalho e a sua manutenção até ao final do período mínimo de manutenção dos bens objeto de investimento, nos termos da alínea c).
5 - Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.
6 - Para efeitos do disposto no número anterior, não se consideram as adições de ativos que resultem de transferências de investimentos em curso transitado de períodos anteriores, exceto se forem adiantamentos.
7 - Nas regiões elegíveis para auxílios nos termos da alínea c) do n.º 3 do artigo 107.º, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia constantes da tabela do artigo 43.º, no caso de empresas que não se enquadrem na categoria das micro, pequenas e médias empresas, tal como definidas na Recomendação n.º 2003/361/CE, da Comissão, de 6 de maio de 2003, apenas podem beneficiar do RFAI os investimentos que respeitem a uma nova atividade económica, ou seja, a um investimento em ativos fixos tangíveis e intangíveis relacionados com a criação de um novo estabelecimento, ou com a diversificação da atividade de um estabelecimento, na condição de a nova atividade não ser a mesma ou uma atividade semelhante à anteriormente exercida no estabelecimento”.
A Portaria para a qual remete o n.º 3 do artigo 2.º do CFI veio a ser a Portaria n.º 282/2014, de 30 setembro, a qual refere no seu Preâmbulo:
“Atendendo à necessidade de observar as normas e demais atos emanados das instituições, órgãos e organismos da União Europeia em matéria de auxílios estatais, nomeadamente as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209/1, de 27 de julho de 2013 e o Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, que aprovou o Regulamento Geral de Isenção por Categoria, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187/1, de 26 de junho de 2014, são também definidos na presente portaria os setores de atividade excluídos da concessão de benefícios fiscais.”
E quanto ao enquadramento comunitário e âmbito setorial, estabelecem os artigos 1.º e 2.º o seguinte:
“Artigo 1.º
Enquadramento comunitário
Em conformidade com as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209, de 27 de julho de 2013 e com o Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187, de 26 de junho de 2014 (Regulamento Geral de Isenção por Categoria), não são elegíveis para a concessão de benefícios fiscais os projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas dos setores siderúrgico, do carvão, da pesca e da aquicultura, da produção agrícola primária, da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo i do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, da silvicultura, da construção naval, das fibras sintéticas, dos transportes e das infraestruturas conexas e da produção, distribuição e infraestruturas energéticas.
Artigo 2.º
Âmbito setorial
Sem prejuízo das restrições previstas no artigo anterior, as atividades económicas previstas no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, correspondem aos seguintes códigos da Classificação Portuguesa de Atividades Económicas, Revisão 3 (CAE-Rev.3), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 381/2007, de 14 de novembro:
b) Indústrias transformadoras - divisões 10 a 33;
A legislação da UE
O RGIC (Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014), no Considerando (10) dispõe:
“O presente regulamento deve aplicar-se, em princípio, à maioria dos setores económicos. No entanto, em alguns setores, como a pesca e a aquicultura e a produção agrícola primária, o âmbito de aplicação deve ser limitado à luz das regras especiais aplicáveis.”
O artigo 1.º, n.º 3 a), determina:
“O presente regulamento não é aplicável aos seguintes auxílios:
Auxílios concedidos no setor da pesca e da aquicultura, nos termos do Regulamento (UE) n.o1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura, altera os Regulamentos (CE) n.º 1184/2006 e (CE) n.º 1224/2009 do Conselho e revoga o Regulamento (CE) n.º104/2000 do Conselho, com exceção dos auxílios à formação, dos auxílios ao acesso das PME ao financiamento, dos auxílios à investigação e desenvolvimento, dos auxílios à inovação a favor das PME e dos auxílios a trabalhadores desfavorecidos e trabalhadores com deficiência.”
E este artigo 1.º estabelece a final: “Sempre que uma empresa exercer atividades nos setores excluídos, referidos nas alíneas a), b) ou c) do primeiro parágrafo, bem como em setores abrangidos pelo âmbito de aplicação do presente regulamento, este apenas se aplica aos auxílios concedidos a esses últimos setores ou atividades, desde que os Estados-Membros assegurem, através de meios adequados como a separação das atividades ou a distinção dos custos, que as atividades nos setores excluídos não beneficiam dos auxílios concedidos em conformidade com o presente regulamento”.
As OAR 2014-2020, que foram adotadas pela Comissão em 19 de junho de 2013, tendo entrado em vigor a 1 de julho de 2014.
Na introdução no paragrafo 1. é mencionado que “Com base no artigo 107.º, n.º 3, alíneas a) e c), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), a Comissão pode considerar compatíveis com o mercado interno os auxílios estatais destinados a facilitar o desenvolvimento económico de certas regiões desfavorecidas da União Europeia. Este tipo de auxílios estatais é designado por auxílios com finalidade regional”.
1. ÂMBITO DE APLICAÇÃO E DEFINIÇÕES
1.1. Âmbito de aplicação dos auxílios com finalidade regional
(...)
10. A Comissão aplicará os princípios estabelecidos nas presentes orientações aos auxílios com finalidade regional em todos os setores de atividade económica (9), com exceção da pesca e da aquicultura (10), da agricultura (11) e dos transportes (12), que estão sujeitos a regras especiais previstas em instrumentos jurídicos específicos, suscetíveis de derrogar total ou parcialmente as presentes orientações. A Comissão aplicará estas orientações à transformação e comercialização de produtos agrícolas em produtos não agrícolas. As presentes orientações aplicam-se a medidas de auxílio em apoio de atividades fora do âmbito do artigo 42.º do Tratado, mas abrangidas pelo regulamento relativo ao desenvolvimento rural, e cofinanciadas pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural ou concedidas como um financiamento nacional em suplemento dessas medidas cofinanciadas, salvo previsão em contrário das regras setoriais.
As OAR 2014-2020 densificam quais os auxílios em matéria de pesca e aquicultura excluídos do seu âmbito de aplicação, limitando-os aos auxílios «abrangidos pelo Regulamento (CE) n.º 104/2000 do Conselho, de 17 de dezembro de 1999 que foi revogado e substituído pelo Regulamento (UE) n.º 1379/2013, que estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura (JO L 17 de 21.1.2000, p. 22).
O regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do conselho de 11 de dezembro de 2013 que estabeleceu a organização comum dos mercados dos produtos da pesca e da aquicultura, altera os Regulamentos (CE) n.º 1184/2006 e (CE) n.º 1224/2009 do Conselho e revoga o Regulamento (CE) n.º 104/2000 do Conselho, no artigo 5.º elenca algumas definições de que destacamos:
“Para efeitos de aplicação do presente regulamento, são aplicáveis as definições referidas no artigo 4.o do Regulamento (UE) n.o1380/2013, bem como as referidas no artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 1224/2009 do Conselho (10), no artigo 2.o do Regulamento (UE) n.o 1169/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho (11), nos artigos 2.o e 3.o do Regulamento (CE) n.o 178/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho e no artigo 3.o do Regulamento (CE) n.o 1333/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho (13). São igualmente aplicáveis as seguintes definições:
a) "Produtos da pesca", os organismos aquáticos resultantes de qualquer atividade de pesca ou os produtos deles derivados, indicados no Anexo I;
b) Produtos da aquicultura", os organismos aquáticos resultantes de qualquer atividade de aquicultura, em qualquer estádio do seu ciclo de vida, ou os produtos deles derivados, indicados no Anexo I;
(...)
d) Setor da pesca ou da aquicultura", o setor da economia que inclui todas as atividades de produção, transformação e comercialização dos produtos da pesca ou da aquicultura
(...)”
- O Regulamento (UE) n.º 508/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014 no considerando 12 afirma: “É conveniente que as despesas da PCP e da PMI sejam financiadas pelo orçamento da União mediante um único fundo, o FEAMP, quer diretamente, quer em gestão partilhada com os Estados-Membros. Esta última deverá aplicar- -se não só às medidas de apoio à pesca, à aquicultura e ao desenvolvimento local de base comunitária, mas também à transformação e comercialização, à compensação para as regiões ultraperiféricas e às atividades de controlo e de recolha de dados, bem como à PMI. A gestão direta deverá aplicar-se aos pareceres científicos, às medidas específicas de controlo e execução, às contribuições voluntárias para as organizações regionais de gestão das pescas, aos conselhos consultivos, à informação sobre o mercado, às operações de execução da PMI e às atividades de comunicação. É conveniente especificar os tipos de operação que se qualificam para financiamento ao abrigo do FEAMP”.
E refere no Considerando (20):
“A fim de melhorar a coordenação e a harmonização da execução dos Fundos que prestam apoio no âmbito da política de coesão, a saber, o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), o Fundo Social Europeu (FSE) e o Fundo de Coesão (FC), com os fundos para o desenvolvimento rural e para o setor marítimo e das pescas, a saber, o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) e o FEAMP, respetivamente, foram estabelecidas disposições comuns para todos estes Fundos («Fundos FEEI») no Regulamento (UE) n.º 1303/2013. Além do Regulamento (UE) n.º 1303/2013, o presente regulamento contém disposições específicas e complementares, dadas as particularidades dos setores da PCP e da PMI.”
De mencionar ainda o disposto no considerando (61):
“A fim de garantir a viabilidade das pescas e da aquicultura num mercado altamente competitivo, é necessário estabelecer disposições que concedam apoio à execução do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho (1) e às atividades de comercialização e transformação realizadas pelos operadores para maximizar o valor dos produtos da pesca e da aquicultura. Convém dar especial atenção à promoção de operações que integrem as atividades de produção, transformação e comercialização na cadeia de abastecimento ou que representem processos ou métodos inovadores. Convém apoiar em prioridade as organizações de produtores e as associações de organizações de produtores aquando da concessão de apoio. No caso dos planos de produção e comercialização, apenas serão elegíveis para apoio essas organizações. Com vista à adaptação à nova política de proibição das devoluções, o FEAMP deverá igualmente apoiar a transformação das capturas indesejadas.
Relativamente às indústrias de transformação de produtos de pesca, o Regulamento (UE) n.º 508/2014, o artigo 6.º, n.º 5 determina:
“Promover a comercialização e a transformação, através dos seguintes objetivos específicos:
a) Melhoria da organização do mercado dos produtos da pesca e da aquicultura,
b) Incentivo ao investimento nos setores da transformação e da comercialização.”
4.4. Análise da questão decidenda
A questão a apreciar diz respeito ao enquadramento e abrangência do CAE’s 10201 e 10204 no âmbito de aplicação do RFAI, de acordo com a legislação supra mencionada, aplicável aos presentes autos e a legalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2022... .
1. A Requerente é uma empresa com sede no concelho da Trofa, distrito do Porto e exerce atividades qualificadas como de indústria de transformação, que são enquadráveis no artigo 2.º, n.º 2 a) do CFI, e os investimentos realizados no exercício de 2019 seriam dedutíveis no IRC, ao abrigo do RFAI, por estar em causa um investimento de aumento da capacidade produtiva de um estabelecimento já existente”, em harmonia com o disposto na alínea d) do n.º 2 da Portaria no 297/2015.
As atividades em que se realizou o investimento da Requerente, estão relacionadas com a transformação e comercialização de produtos da pesca e aquicultura, que na definição do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de dezembro de 2013, artigo 5.º d) estão enquadradas no setor da pesca ou da aquicultura, o setor da economia que inclui todas as atividades de produção, transformação e comercialização dos produtos da pesca ou da aquicultura.
2. O RFAI - Regime Fiscal de Apoio ao Investimento é um benefício fiscal que permite às empresas deduzir à coleta apurada uma percentagem do investimento realizado em ativos não correntes (tangíveis e intangíveis). Prevê-se a dedução à coleta de IRC (dedução que não pode exceder 50% da coleta do IRC, exceto nos casos de investimentos realizados no período de tributação do início de atividade e nos dois períodos de tributação seguintes) das seguintes importâncias:
No caso de investimentos realizados nas regiões Norte, Centro, Alentejo, Região Autónoma dos Açores e Região Autónoma da Madeira, 25% das aplicações relevantes, para o investimento realizado até ao montante de € 10.000.000,00, e de 10% das aplicações relevantes, relativamente à parte excedente;
No caso de investimentos nas regiões do Algarve, Grande Lisboa e Península de Setúbal, 10% das aplicações relevantes. Isenção ou redução de IMI, IMT e Imposto do Selo, relativamente aos prédios utilizados, factos ou atos inseridos no âmbito dos investimentos que constituam aplicações relevantes.
3. Porém, o RFAI, enquanto benefício fiscal concedido pelo legislador português comporta limites na sua aplicação e como esclarece o artigo n.º 22, n.º 1 do CFI: “o RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC”.
4. A Requerida defendeu no procedimento de reclamação graciosa que “Tendo em conta que as atividades objeto do investimento da ora Requerente, são relacionadas com a preparação, congelação e transformação de produtos de pesca e aquicultura, que abrange o peixe, crustáceos e moluscos, que são produtos incluídos na Lista do Anexo I ao TFUE, apesar de enquadráveis nos CAE’s 10201 e 10204, não cumprem as restrições previstas no artigo 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 dezembro, não sendo por isso, atividades elegíveis para efeitos do RFAI”.
5. O facto da Portaria n.º 282/2014, que expressamente exclui do âmbito de aplicação do RFAI os projetos de investimento que tenham por objeto a transformação de peixe, não pode relevar para a não aplicação do benefício fiscal que permite a dedução de uma percentagem dos valores dos investimentos realizados, e isto porque o legislador remeteu para a Portaria apenas a definição dos códigos de atividade económica (CAE) correspondentes às atividades referidas no n.º 2 do artigo 2.º do CFI, neste sentido a decisão arbitral proferida no processo n.º 220/2020-T.
Assim, assiste razão à Requerente quando defende que as atividades da Requerente, no âmbito da qual foram realizados os investimentos considerados como deduções à coleta ao abrigo do RFAI, se enquadram num setor de atividade previsto no artigo 2.º, n.º 2, alínea a), do CFI, e, bem assim, num dos Códigos CAE previstos no artigo 2.º, alínea b), da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro.
6. Porém, como o direito nacional nesta matéria dos auxílios estatais às indústrias transformadoras de produtos provenientes da pesca e da aquicultura está submetido à legislação da União Europeia, impõe-se que este Tribunal Arbitral análise essa legislação para determinar se a atividade da Requerente em que foi realizado o investimento está ou não excluída do RFAI e/ou do âmbito setorial de aplicação das OAR e do RGIC.
Desde logo, há que fazer referência ao Regulamento n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, (RGIC) que determina que categorias específicas de auxílios estatais são compatíveis com o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), desde que satisfaçam determinadas condições. Por conseguinte, isenta estas categorias do requisito de notificação prévia à Comissão e de aprovação por parte desta, autorizando os Estados-Membros a conceder o auxílio diretamente e a informar a Comissão apenas a posteriori.
7. O artigo 1.º, n.º 3 do RGIC determina: “O presente regulamento não é aplicável aos seguintes auxílios:
a) Auxílios concedidos no setor da pesca e da aquicultura, nos termos do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013 (...).
Sempre que uma empresa exercer atividades nos setores excluídos, referidos nas alíneas a), b) ou c) do primeiro parágrafo, bem como em setores abrangidos pelo âmbito de aplicação do presente regulamento, este apenas se aplica aos auxílios concedidos a esses últimos setores ou atividades, desde que os Estados-Membros assegurem, através de meios adequados como a separação das atividades ou a distinção dos custos, que as atividades nos setores excluídos não beneficiam dos auxílios concedidos em conformidade com o presente regulamento”.
8. A exclusão de um investimento no setor da indústria transformadora de produtos provenientes da pesca ou aquicultura, pode ser determinada nos termos da alínea a) do artigo transcrito, uma vez que os auxílios concedidos neste setor estão condicionados ao Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013. Este Regulamento estabelece a organização comum de mercado no setor dos produtos da pesca e da aquicultura, altera os Regulamentos (CE) n.º 1184/2006 e (CE) n.º 1224/2009 do Conselho e revoga o Regulamento (CE) n.º 104/2000 do Conselho.
9. De referir o Regulamento (UE) n.º 1379/2013 que estabelece a organização comum dos mercados dos produtos da pesca e da aquicultura (“OCM”), e remete a regulamentação da atribuição de quaisquer apoios à execução da OCM para diploma autónomo - o Regulamento (UE) n.º 508/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014 que cria o Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (“FEAMP”), destinado a financiar a Política Comum de Pescas (PCP) e a Política Marítima Integrada (PMI).
10. O Regulamento (UE) n.º 508/2014, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014 considera conveniente que as despesas da PCP e da PMI sejam financiadas pelo orçamento da União mediante um único fundo, o FEAMP, quer diretamente, quer em gestão partilhada com os Estados-Membros. E, considera englobadas no FEAMP a pesca, a aquicultura e as atividades de transformação e comercialização dos produtos resultantes dessas atividades e ainda apoiar a transformação das capturas indesejadas.
Menciona no Considerando (2): “O âmbito de aplicação do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas (FEAMP) deverá incluir o apoio à PCP para a conservação dos recursos biológicos marinhos, a gestão das pescas e das frotas que exploram esses recursos, os recursos biológicos de água doce e a aquicultura, bem como a transformação e a comercialização dos produtos da pesca e da aquicultura, sempre que essas atividades sejam exercidas no território dos Estados-Membros, por navios de pesca da União, ou por nacionais dos Estados-Membros, sem prejuízo da responsabilidade principal do Estado de pavilhão, tendo em conta o disposto no artigo 117.º da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 10 de dezembro de 1982 (2) (CNUDM)”.
11. E no Considerando (11): “O financiamento da PCP e da PMI através de um único fundo, o FEAMP, deverá satisfazer a necessidade de simplificação e deverá reforçar a integração das duas políticas. O alargamento da gestão partilhada à transformação e comercialização, incluindo a compensação para as regiões ultraperiféricas e as atividades de controlo, de recolha de dados e de gestão, bem como a PMI, deverá também contribuir para a simplificação e a redução dos encargos administrativos da Comissão e dos Estados-Membros e assegurar uma maior coerência e eficiência do apoio concedido.
(12) É conveniente que as despesas da PCP e da PMI sejam financiadas pelo orçamento da União mediante um único fundo, o FEAMP, quer diretamente, quer em gestão partilhada com os Estados-Membros. Esta última deverá aplicar- -se não só às medidas de apoio à pesca, à aquicultura e ao desenvolvimento local de base comunitária, mas também à transformação e comercialização, à compensação para as regiões ultraperiféricas e às atividades de controlo e de recolha de dados, bem como à PMI. A gestão direta deverá aplicar-se aos pareceres científicos, às medidas específicas de controlo e execução, às contribuições voluntárias para as organizações regionais de gestão das pescas, aos conselhos consultivos, à informação sobre o mercado, às operações de execução da PMI e às atividades de comunicação. É conveniente especificar os tipos de operação que se qualificam para financiamento ao abrigo do FEAMP”.
Considerando (61) “A fim de garantir a viabilidade das pescas e da aquicultura num mercado altamente competitivo, é necessário estabelecer disposições que concedam apoio à execução do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho (1) e às atividades de comercialização e transformação realizadas pelos operadores para maximizar o valor dos produtos da pesca e da aquicultura. Convém dar especial atenção à promoção de operações que integrem as atividades de produção, transformação e comercialização na cadeia de abastecimento ou que representem processos ou métodos inovadores. Convém apoiar em prioridade as organizações de produtores e as associações de organizações de produtores aquando da concessão de apoio. No caso dos planos de produção e comercialização, apenas serão elegíveis para apoio essas organizações. Com vista à adaptação à nova política de proibição das devoluções, o FEAMP deverá igualmente apoiar a transformação das capturas indesejadas”
12. Relativamente às indústrias de transformação de produtos de pesca, o Regulamento (UE) n.º 508/2014, no artigo 6.º, n.º 5 determina:
“Promover a comercialização e a transformação, através dos seguintes objetivos específicos:
a) Melhoria da organização do mercado dos produtos da pesca e da aquicultura,
b) Incentivo ao investimento nos setores da transformação e da comercialização.”
Artigo 8.º
“Auxílios estatais
1. Sem prejuízo do n.º 2 do presente artigo, os artigos 107.º, 108.º e 109.º do TFUE são aplicáveis aos auxílios concedidos pelos Estados-Membros a empresas do setor da pesca e aquicultura.
2. Todavia, os artigos 107.º, 108.º e 109.º do TFUE não são aplicáveis aos pagamentos efetuados pelos Estados-Membros em aplicação e nos termos do presente regulamento que se inscrevam no âmbito de aplicação do artigo 42.º do TFUE.
3. As disposições nacionais que prevejam um financiamento público que vá para além do disposto no presente regulamento relativamente aos pagamentos referidos no n.º 2, devem ser tratadas como um todo com base no n.º 1.
4. Para os produtos da pesca e da aquicultura enumerados no Anexo I do TFUE, aos quais se aplicam os artigos 107.º, 108.º e 109.º do mesmo, a Comissão pode autorizar, nos termos do artigo 108.º do TFUE, auxílios ao funcionamento nas regiões ultraperiféricas referidas no artigo 349.º do TFUE nos setores da produção, da transformação e da comercialização dos produtos da pesca e da aquicultura, a fim de atenuar os condicionalismos específicos dessas regiões, decorrentes do seu isolamento, insularidade e ultraperifericidade.”
Artigo 26.º
“Inovação
1. A fim de estimular a inovação nas pescas, o FEAMP pode apoiar projetos destinados a desenvolver ou introduzir produtos e equipamentos novos ou substancialmente melhorados, técnicas e processos novos ou melhorados, e sistemas de gestão e de organização novos ou melhorados, inclusive a nível da transformação e da comercialização.
2. As operações financiadas ao abrigo do presente artigo são efetuadas por um organismo científico ou técnico, reconhecido pelo Estado-Membro ou pela União, que valida os seus resultados, ou em colaboração com esse organismo”.
Pelo exposto, temos de concluir que as empresas que realizem investimentos nos setores de transformação e comercialização de produtos derivados da pesca e da aquicultura, nos territórios dos Estados Membros da União Europeia, podem beneficiar dos financiamentos atribuídos pelo FEAMP, através do Programa MAR 2020.
13. O Acórdão do TJUE C-23/22 de 15 de dezembro de 2022, (CAXAMAR).
“Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.o e o artigo 2.º, pontos 10 e 11, do Regulamento n.o 651/2014 e as Orientações 2014-2020, conjugados com as disposições do anexo I do Tratado FUE e do Regulamento n.o 1379/2013, devem ser interpretados no sentido de que uma atividade de transformação de produtos da pesca e da aquicultura, como a produção de bacalhau salgado, de bacalhau congelado e de bacalhau demolhado, constitui uma atividade de transformação de produtos agrícolas, que está excluída do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 651/2014 por força do artigo 1.o, n.o 3, alínea c), deste regulamento.”
Refere o TJUE:
“A este respeito, importa recordar que, em conformidade com o seu artigo 1.º, n.º 3, alínea c), o Regulamento n.º 651/2014 não é aplicável aos “auxílios concedidos no setor da transformação e comercialização de produtos agrícolas” nos casos especificados por esta disposição. Esta exclusão é retomada no ponto 10 das Orientações 2014-2020 e, em particular, na nota de rodapé 11, para a qual este ponto remete.
Por conseguinte, há que responder à questão prejudicial que o artigo 1.º e o artigo 2.º, pontos 10 e 11, do Regulamento n.º 651/2014, bem como as Orientações 2014-2020, lidos em conjugação com o artigo 2.º e com o artigo 5.º, alíneas a) e d), bem como com o anexo I do Regulamento n.º 1379/2013, devem ser interpretados no sentido de que uma atividade de transformação de produtos da pesca e da aquicultura, como a produção de bacalhau salgado, de bacalhau congelado e de bacalhau demolhado, não constitui uma atividade de transformação de produtos agrícolas, que está excluída do âmbito de aplicação do Regulamento n.º 651/2014 por força do artigo 1.º, n.º 3, alínea c), deste regulamento, mas sim uma atividade pertencente ao setor da pesca e da aquicultura, que está excluída do âmbito de aplicação do referido regulamento por força do seu artigo 1.º, n.º 3, alínea a).”
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:
O artigo 1.º e o artigo 2.º, pontos 10 e 11, do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 17 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílios compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.° e 108.° [TFUE], bem como as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014‑2020, lidos em conjugação com o artigo 2.º e com o artigo 5.º, alíneas a) e d), bem como com o anexo I do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que estabelece a organização comum dos mercados dos produtos da pesca e da aquicultura, altera os Regulamentos (CE) n.º 1184/2006 e (CE) n.º 1224/2009 do Conselho e revoga o Regulamento (CE) n.º 104/2000 do Conselho, devem ser interpretados no sentido de que: uma atividade de transformação de produtos da pesca e da aquicultura, como a produção de bacalhau salgado, de bacalhau congelado e de bacalhau demolhado, não constitui uma atividade de transformação de produtos agrícolas, que está excluída do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 651/2014 por força do artigo 1.º, n.º 3, alínea c), deste regulamento, mas sim uma atividade pertencente ao setor da pesca e da aquicultura, que está excluída do âmbito de aplicação do referido regulamento por força do seu artigo 1.º, n.º 3, alínea a).”
Pelo exposto, decide este Tribunal Arbitral que a Requerente não pode beneficiar da dedução no IRC do exercício de 2019 dos investimentos realizados nas atividades de preparação, congelação e transformação de produtos de pesca e aquicultura, que abrange o peixe, crustáceos e moluscos, a que correspondem os CAE’s 10201 e 10204, ao abrigo do RFAI em razão da exclusão setorial das atividades exercidas, enquadradas no setor da transformação e comercialização de produtos de pesca, pela aplicação das normas do Direito da União Europeia (8.º n.º 4 CRP): RGIC, OAR, Regulamento (UE) n.º 1379/2013 e Regulamento (UE) n.º 508/2014.
Assim a autoliquidação de IRC não enferma de qualquer ilegalidade, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica assim como o despacho de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2022... .
Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral, pelo que fica prejudicada o conhecimento das demais questões suscitadas nos autos
5. Decisão
Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral;
b) absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira de todos os pedidos.
6. Valor do Processo
De harmonia com o disposto nos artigos 296.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, al. a), do RJAT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 925.830,57 indicado pela Requerente e sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.
7. Custas
Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no montante de 13.158,00 €, a cargo da Requerente, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.
Notifique-se.
Lisboa, 06 de maio de 2024.
Os Árbitros
_____________________
(Regina de Almeida Monteiro – Presidente)
_____________________
(Nuno Miguel Morujão – Adjunto, com declaração de voto)
__________________
(Martins Alfaro – Adjunto)
Declaração de voto
Acompanho a decisão deste Tribunal Arbitral, considerando pertinente acrescentar a seguinte declaração de voto:
Quanto à matéria de facto
Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas quanto ao mérito, além do referido supra, teria considerado como não provados os seguintes factos:
-
Que a Requerente tenha demonstrado que o investimento realizado tinha finalidades de desenvolvimento económico regional[1] (cf. artigo 21 da resposta da Requerida, não contraditado).
-
Que a Requerente tenha recebido quaisquer auxílios à formação, auxílios ao acesso ao financiamento, auxílios à investigação e desenvolvimento, auxílios à inovação, auxílios a trabalhadores desfavorecidos e trabalhadores com deficiência, auxílios regionais ao investimento em regiões ultraperiféricas, ou auxílio regional ao funcionamento.
Quanto à matéria de Direito
Relativamente ao Acórdão Caxamar, em suma, releva para o nosso caso que:
“O artigo 1.º e o artigo 2.º, pontos 10 e 11, do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 17 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílios compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.° e 108.° [TFUE], bem como as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, lidos em conjugação com o artigo 2.º e com o artigo 5.º, alíneas a) e d), bem como com o anexo I do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, que estabelece a organização comum dos mercados dos produtos da pesca e da aquicultura, altera os Regulamentos (CE) n.º 1184/2006 e (CE) n.º 1224/2009 do Conselho e revoga o Regulamento (CE) n.º 104/2000 do Conselho, devem ser interpretados no sentido de que:
uma atividade de transformação de produtos da pesca e da aquicultura, como a produção de bacalhau salgado, de bacalhau congelado e de bacalhau demolhado, (…) constitui (…) uma atividade pertencente ao setor da pesca e da aquicultura, que está excluída do âmbito de aplicação do (…) Regulamento [n.º 651/2014] por força do seu artigo 1.º, n.º 3, alínea a)”.
Ou seja, nos termos da al. a) do n.º 3 do artigo 1.º do Regulamento n.º 651/2014, o mesmo não é aplicável aos auxílios concedidos no setor da pesca e da aquicultura, nos termos do Regulamento (UE) n.º 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, com exceção dos auxílios à formação, dos auxílios ao acesso das PME ao financiamento, dos auxílios à investigação e desenvolvimento, dos auxílios à inovação a favor das PME, dos auxílios a trabalhadores desfavorecidos e trabalhadores com deficiência, dos auxílios regionais ao investimento nas regiões ultraperiféricas e dos regimes de auxílio regional ao funcionamento.
O sentido do Acórdão do TJUE é claro, não tendo, de resto, merecido qualquer alegação pela Requerente, em sentido diverso do referido pela AT.
Não foi, nomeadamente, alegado e provado pela Requerente, ter beneficiado de qualquer auxílio à formação, ao acesso ao financiamento, à investigação e desenvolvimento, à inovação, a trabalhadores desfavorecidos e trabalhadores com deficiência, outros auxílios regionais ao investimento nas regiões ultraperiféricas, ou atinentes a regimes de auxílio regional ao funcionamento.
Por consequência, o investimento realizado pela Requerente em 2019, de aumento da capacidade produtiva de transformação, enquadrado no setor da pesca, não é elegível para efeitos de RFAI.
Nuno Miguel Morujão